P rojeto PERGUNTE E
RESPONDEREMOS ON-LINE
Apostolado Veritatis Spiendor com autorizacáo de Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (7n memoriam)
APRESBSTTAQÁO DA EDIQÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanca a todo aquele que no-la pedir (1 Pedro 3,15).
•,
-
Esta necessidade de darmos conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por numerosas correntes filosóficas e religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa crenga católica mediante um aprofundamento do nosso estudo. Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propóe aos seus leitores: aborda questoes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortalega no Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar este trabalho assim como a equipe de Veritatis Splendor respectivo site.
que
se
encarrega
do
Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Esteváo Bettencourt, OSB
NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico filosófica "Pergunte Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
e
A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaca depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.
ANOXXXVm SETEMBRO 1997 424 "Senhor, onde estás?" Pió XII e os Judeus
Sacerdotes casados celebrando a Santa Missa? "Caros Amigos" entrevista Leonardo Boff "Descasados com Fé"-
O Pentecostalismo protestante Freí Damiáo de Bozzano De "Rei do Aborto" a Defensor da Vida O Ensino Religioso e a Constituicáo do Brasil Dois depoimentos de um Confessor da Fé Que é a Moralogia?
PERGUNTE E RESPONDEREMOS Publicacáo Mensal
SETEMBRO 1997 N°424
SUMARIO
Diretor Responsável
Estéváo Bettencourt OSB Autor e Redator de toda a materia publicada neste periódico Diretor-Administrador:
D. Hildebrando P. Martins OSB
385
Novas Luzes sobre: Pió XII e os Judeus
386
Declaracáo da Santa Sé: Sacerdotes casados celebrando a Santa Missa?
390
Furor e Preconceito:
Administracáo e Distribuicáo: Edigóes "Lumen Christi"
Rúa Dom Gerardo, 40 - 5° andar-sala 501 Tel.: (021) 291-7122 Fax (021) 263-5679
"Caros Amigos" entrevista Leonardo Boff
394
Sensacionalismo: "Descasados com Fé"
398
Queé?
Endereco para Correspondencia: Ed.
"Senhor, onde estás"
"Lumen Christi"
Caixa Postal 2666
CEP 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ Visite o MOSTEIRO DE SAO BENTO e "PER
GUNTE E RESPONDEREMOS" na INTERNET: e-mail: lumen christi @ pemail.net.
ImpressSoe EncademacSo
O Pentecostalismo protestante
403
Quem foi? Freí Damiáo de Bozzano
415
Clamor significativo: De "Reí do Aborto" a Defensor da Vida... 418 Debate candente: O Ensino Religioso e a Constituicáo do Brasil
421
Emergem do Silencio: Dois depoimentos de um Confessor da Fé
424
Vem do Japáo:
Que é a Moralogia?
427
"marques sara.va - C0M APROVACÁO ECLESIÁSTICA GRÁFICOS E EDITORES Ltda. Tels.: (021) 273-9498 /273-9447
NO PRÓXIMO NÚMERO:
A Ciencia Sufoca a Religiáo? - María, Medianeira, Co-redentora e Advogada. - "O
Diabo no 'Reino de Deus1" (Margarida Oliva). - A Maconaria: um pouco de Historia. «O Evangelho de Tomé» - "Basiléia. O Reino de Deus" {D. Boaventura Kloppenburg).
(PARA RENOVACÁO OU NOVA ASSINATURA:
(NÚMERO AVULSO
R$ 25,00). R$ 2,50).
O pagamento poderá ser á su a escolha: 1. Enviar em Carta, cheque nominal ao MOSTEIRO DE SAO BENTO/RJ. 2. Depósito em qualquer agencia do BANCO DO BRASIL, para agencia 0435-9 Rio na C/C 31.304-1 do Mosteiro de S. Bento/RJ, enviando em seguida por carta ou fax comprovante do depósito, para nosso controle.
3. Em qualquer agencia dos Córrelos, VALE POSTAL, enderecado as EDICÓES "LUMEN CHRISTI" Calxa Postal 2666 / 20001-970 Rio de Janeiro-RJ
Obs.: Correspondencia para: Edicóes "Lumen Christi"
Caixa Postal 2666 20001-970 Rio de Janeiro
RJ
"SENHOR, ONDE ESTÁS?" O sofrimento é murtas vezes o grande enigma dos homens: por que...,
para que existe? Onde fica Deus?
Em vez de se deixar levar pelas emogSes, o cristáo, diante de tal questionamento, poe a razáo e a fé para funcionar. Estas ensinam que Deus nao pode ser o Autor dos males que afligem os homens, pois, por definicáo, Deus é o Santo e o Perfeito. O mal só pode provir das criaturas limitadas,... necessariamente limitadas, pois, se nao o fossem, seriam deuses. Cada qual é dotada da sua maneira própria de agir. O Senhor nao quis fazer um mundo artificial, policiado a todo momento, de modo que o homem seria urna marionete no teatro da historia teledirigida por um teatrólogo todo-poderoso. Essa pepa de teatro poderia ser bonita, mas teria urna nota negativa: a sufocacáo da liberdade de criaturas livres por sua
própria natureza e espontáneamente desejosas de exercer a sua liberdade.
Sendo assim, o Senhor Deus concebeu urna outra modalidade de enre do da historia. Sim; Ele deixa as criaturas agir segundo a sua natureza: as
irracionais, conforme as leis da Física; as racionáis, segundo as opcóes da sua liberdade. Isto é mais nobre e magnánimo do que esmagar a liberdade de
quem foi feito para ser livre. Como se compreende, porém, a liberdade da suas "mancadas" ou pratica lances falsos (é claro porém, que nem tudo é falho, mas muita coisa estupenda ocorre por opcáo das criaturas livres). O papel nobre de Deus, no caso, será o de fazer que os próprios males das
criaturas contribuam para o bem das mesmas. É S. Agostinho quem diz: "Deus
nunca permitiría o mal, se Ele nao tivesse recursos para tirar do mal bens ainda maiores". Com outras palavras: Ele preferiu utilizar o mal em favor do bem a impedir soberanamente o mal.
A S. Escritura é toda perpassada por esta concepgáo. Já em seu primei-
ro livro encontra-se a historia de José vendido por seus irmáos a estrangeiros
e condenado ao exterminio. Diz finalmente José, feito Primeiro-Ministro do
Faraó do Egito, aos seus irmáos que se Ihe apresentam como escravos: "Nao tenhais medo algum! O mal que tínheis a intencáo de fazer-me, o designio de
Deus o mudou em bem a fim de cumprir o que se realiza hoje: salvar a vida a um povo numeroso. Nao temáis; eu vos sustentarei, bem como a vossos filhos"(Gn 50,18-21).
Estas palavras sao como um cliché que percorre toda a mensagem bí blica e culmina na figura de Jesús Cristo. Este foi vendido por seus irmáos e condenado a morrer, mas Ele pode dizer: "Estive morto, mas eis que vivo pe
los séculos dos séculos e tenho as chaves da regiáo dos mortos" (Ap 1,17s). O mesmo cliché se aplica a cada discípulo de Cristo. A cruz que ele carrega, é parte da Cruz de Cristo; é o lenho da vida, que faz passar da morte para a plenitude bem-aventurada. Eis por que o cristáo nao se abate, mas sabe que nada Ihe acontece fora do sabio plano da Providencia, que nunca permitiría o mal se nao tivesse recursos para tirar do mal bens ainda maiores. E. B. 385
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" Ano XXXVIII -N° 424-Setembro de 1997 Novas Luzes sobre:
PIÓ XII E OS JUDEUS Em síntese: Dois liyros recentes contribuempara corroborara tese de que Pió XII muito se empenhou, sem alarde, em prol dos judeus e refugiados durante a guerra de 1939-45. Devem-se a Ir. Margherita Marchione, Professora Universitaria nos Estados Unidos, e ao Major bri tánico William Simpson, ex-prisioneiro de guerra, que refere suas Memo rias. Tratase de depoimentos colhidos diretamente de pessoas atingidas pela perseguigáo. Esses dois livros revelam que os judeus muito exaltaram Pió XII até 1963, quando Rolf Hochhut publicou a pega teatral "O Representante" (Der Stellvertreter), que desfigurou o Papa Pió XII. *
*
*
O Papa Pió XII tem sido acusado de conivéncia com o nacional socialismo de Adolf Hitler; ter-se-ia calado covardemente diante da per seguigáo movida contra os judeus, de modo que parece indiretamente co-responsável pelo massacre que estes sofreram.
Tais acusacóes já foram dissipadas; cf. PR 418/1997, pp. 118s. Ocorre, porém, que recentemente foi publicado nos Estados Unidos um livro que mais ainda esclarece a questáo, pois recolhe testemunhos de pessoas (inclusive numerosos judeus) que foram salvas pela acáo huma
nitaria do Papa Pió XII. É da autoría de Ir. Marguerita Marchione, Profes
sora Emérita de Língua e Literatura Italianas na Fairleigh Díckinson University em Madíson, N. J., tendo por título "Yours ¡s a Precious Wítness" (O seu Testemunho é precioso), Ed. Paulinas.
A seguir, proporemos os principáis tópicos dessa obra importante, á qual acrescentaremos o depoimento de um Major británico, prisíoneiro
de guerra socorrido pela Santa Sé.
1. O Conteúdo da Obra
A autora observa que 67% dos judeus da Europa foram mortos du rante o Holocausto; na Italia, porém, 85% de todos os judeus foram sal vos. A Irma Margherita atribuí este fato, em parte, ao temperamento itali386
PIÓ XII EOS JUDEUS
ano; julga, porém, que é também a conseqüéncia do tato de que Pió XII se achava nesse fundo (underground) italiano. Com efeito; em vez de levantar clamorosos protestos, o Papa recorreu a meios diplomáticos para contornar leis raciais e atentados destinados a liquidar os judeus e os simpatizantes dos semitas. Pió XII trabalhou discretamente, porque em
caso contrario teria sido cortado o abastecimento de agua, eletricidade e víveres que mantinham vivos milhares de judeus escondidos em conven
tos e mosteiros da Italia assim como dentro das muralhas mesmas da Cidade do Vaticano. Até mesmo a residencia de veráo dos Papas em Castel Gandolfo tornou-se abrigo para os que fugiam da barbarie nazista durante a guerra de 1939 a 1945.
Alias, os próprios judeus reconheceram a acáo benéfica de Pió XII e louvaram o Papa por isto. A autora do livro refere o depoimento de um comerciante judeu, que afirmava: "Sonriente os judeus estáo aptos a com-
preender por que o Santo Padre nao podia denunciar o Governo nacio nal-socialista"; "eles sabiam muito bem que, se o Papa acusasse o regime nazista, os judeus perderiam a esperanca de se salvar", diz Margherita Marchione.
Há, sim, documentos que mostram que o Papa protestou contra o
nacional-socialismo. "Mas cada vez que ele protestava, que acontecía? Os judeus e os cristáos que estavam nos campos de concentracáo, eram tratados muito, muito cruelmente... Em conseqüéncia, o Papa Pió XII convenceu-se de que devia utilizar meios diplomáticos - e, de fato, usou-os para tentar salvar milhares e milhares de pessoas". Em especial é citado o testemunho de um Bispo internado num campo de concentracáo: "Cada vez que a Igreja levantava protestos contra as atrocidades dos nazistas, milhares de sacerdotes estremeciam nos campos de concentracáo. O Bispo Jean Bernard, do Luxemburgo, internado em Dachau de fevereiro 1941 a agosto de 1942, declarou que o tratamento dos prisioneiros piorava ¡mediatamente".
A escassez de documentos papáis que testemunhem as intervencóes de Pió XII explica-se pelo fato de que os alemáes se apoderaram dos arquivos nao somente dos judeus, mas confiscaram qualquertipo de arquivo que Ihes caísse ñas máos; eles assim queriam descobrir nomes de judeus. A Irma Marchione, a principio, quería apenas pesquisar em Roma as atividades de sua Congregacáo Religiosa durante a segunda guerra
mundial. Varias das Irmas entáo Ihe contaram como haviam cuidado de 114 judeus {homens, mulheres e criancas). "Fiquei sabendo que o S. Pa dre deu ordens para que se abrissem as portas dos conventos e mostei ros; isto me levou a pesquisar mais a fundo". A autora observa que tal norma era totalmente alheia á praxe vigente, visto que nenhum convento
feminino permitía a entrada de estranhos na clausura. 387
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
"Logo após a guerra, os próprios judeus reconheceram quanto o Papa fizera por eles. Foi somente em 1963, quando o teatrólogo alemáo Rolf Hochhut escreveu a pega 'O Representante' (Der Stellvertreter), na qual Pió XII aparece como colaborador dos nazistas, que as coisas comegaram a mudar. O mundo inteiro pós-se a pensar que Pió XII realmente nada fizera; e, já que desejavam acusar alguém, o mais fácil era acusar o
Papa. Que fez Roosevelt em favor dos judeus? Que fez Churchill por eles? Estavam cientes do que ocorria. Em geral, o público naquela época nao podía acreditar que aconteciam coisas táo bárbaras e cruéis. Era difícil. Mesmo quando alguns conseguiam escapar e contavam o que tinham vivenciado, os próprios judeus nos Estados Unidos nao conseguiam acreditar". O livro da Ir. Margherita apresenta fotografías que mostram refugia dos debaixo da colunada da Praca de Sao Pedro á espera de ser introduzidos num salao de refeicóes do Vaticano e também judeus sem-teto abri gados em dormitorios improvisados em Castel Gandolfo. Outra fotografía mostra Pió XII numa padaria, onde as Irmas preparavam milhares de páes a ser distribuidos as vítimas da guerra.
Conta-se a historia de urna jovem judia chamada Enrichetta Levi, que suplicava a seu pai e a seu marido que fossem procurar refugio na clausura de um convento; ela ouvira os tiros que acompanhavam o aprisionamento de judeus ñas rúas de Roma. Eles arrumaram seus pertences e foram bater as portas de um mosteiro antes do despontar do dia. "Quan do a Ir. María Rita viu os refugiados, exprimiu-lhes a sua dísposicáo de os
ajudar. Ás pressas foi ter com a Madre Superiora e perguntou-lhe se o
convento tinha acomodagóes para mais tres pessoas. Embora conscien tes de que esses refugiados punham em perigo a vida de todas as Irmas
da comunidade, elas nao hesitaram em acolher os judeus. Algumas Irmas foram transferidas para outra ala do mosteiro, e a familia Levi ocupou os seus aposentos. Isto era totalmente insólito. Escreve a Ir. Marchíone: "Lem-
bre-se de que há cinqüenta ou sessenta anos nenhum convento ousaria permitir que estranhos penetrassem dentro da clausura... Mas o regimentó fora suspenso durante a guerra, coisa que somente o Papa podia permitir". O livro refere tambénvcomo os mosteíros e conventos ajudaram os judeus a conseguir nova carteira de identídade e como os filhos dos ju deus aprendiam a rezar o Pai-Nosso e a Ave-María, a fim de serem tidos
como católicos. Um dos sobreviventes narra que certa noite o seu quarto foí invadido por um estranho; estava entáo rezando em hebraico o Shema Israel; logo, porém, passou a dízer a Ave-María em latim. "Mu'ttos dos judeus sobreviventes foram salvos por causa das carteiras de identídade que os apresentavam como católicos. Julgo que o que há de mais importante é que os próprios judeus, desde os tempos da guerra até a morte de Pió XII, só tinham louvores para o Papa. Tenho 388
PIÓ XII E OS JUDEUS
documentos que atestam como eles diziam ao Santo Padre: 'Veja, estamos conscientes de que o Sr. salvou a vida de milhares de pessoas escondi das nos conventos, ñas igrejas e em diversos outros estabelecimentos
que pertenciam á Igreja Católica em todo o país. Ainda em nossos días, eles reconhecem o muito que foi feito sob a diregáo do Papa".
A Irma Marchione observou ainda que o único meio de evitar que as geracóes futuras se iludam a respeito do passado é ajudá-las a tomar consciéncia dos tatos reais atinentes aos tempos da guerra de 1939 a 1945. 2. Outro Subsidio
Outro livro interessante e oportuno é o do Major británico William Simpson, que, feito prisioneiro dos alemáes, escapou da prisáo e se escondeu nos sitios de camponeses italianos, enquanto os alemáes duran te oito meses vasculhavam ávidamente o territorio italiano. Foi ajudado por um sacerdote irlandés que trabalhava fora do Vaticano, assim como pelas boas disposicóes do povo italiano. Escreveu suas Memorias no li
vro "A Vatican Lifeline" (Um Salva-vidas do Vaticano), Ed. Sarpedon; é obra que narra "o mais gigantesco jogo de esconder-e-esconder que alguém jamáis tenha visto".
A respeito da conduta dos nazistas frente ao Vaticano diz ele: "Hitler dera ordens para que os comandantes alemáes nao hesitassem em inva
dir o Vaticano e levassem á forca o Papa, se o julgassem necessário. Se o Papa Pió XII dissesse algo em protesto, o impacto teria durado um dia e o Vaticano teria durado trinta minutos".
Presbiteriano escocés, Simpson refere, de primeira máo, que os
refugiados judeus e outros prisioneiros foragidos encontraram abrigo em muitos Seminarios e Universidades Católicas em Roma e fora de Roma, em virtude da assisténcia que Ihes deu Mons. Hugh O'Flaherty, do Corpo Diplomático do Vaticano.
Simpson rejeita a opiniáo de que o Papa devia ter clamorosamente
denunciado as brutalidades do nazismo, e julga que o papel discreto do Vaticano foi de ¡mensa ajuda á causa das vítimas da guerra. Simpson demonstra grande respeito pelo Vaticano e, em especial, pelo presbítero irlandés que assistiu a milhares de soldados, de judeus e
de refugiados de outros Credos e naturalidades escondidos em Roma e
no territorio italiano em geral. Urna organizacáo clandestina fomecia aos
refugiados alimentos, roupas e dinheiro para reembolsar os camponeses
que os hospedavam. É o que Simpson chama "Um Salva-vidas do Vaticano".
Faz-se oportuno divulgar tais testemunhos que dissipam mal-en tendidos e preconceitos a respeito do Papa Pió XII e da Santa Sé nos anos de atuacáo do nazismo na Europa e fora da Europa. 389
Declarado da Santa Sé:
SACERDOTES CASADOS CELEBRANDO A SANTA MISSA?
Em síntese: A Santa Sé, por intermedio do Pontificio Conselhopara
a Interpretagáo do Código de Direito Canónico, declarou que nao é lícito aos sacerdotes casados, com ou sem dispensa do celibato, celebrara S. Missa nem mesmo em caso de "justa causa" alegada pelos fiéis. Todavía fica-lhes permitido absolver de seus pecados qualquer fiel em perigo de morte.
Tendo recebido a noticia de que sacerdotes casados celebram a S. Missa quando solicitados por fiéis, o Pontificio Conselho para a Interpre tado dos Textos Legislativos da Igreja emitiu a seguinte Declaracáo da tada de 15/5/97:
«Visto que em alguma nacáo um grupo de fiéis, invocando o pres crito do can. 1335, segunda parte, do Código de Direito Canónico, pediu a celebracáo da Santa Missa a sacerdotes que atentaram matrimonio, perguntou-se a este Pontificio Conselho se é lícito a um fiel ou comunidade de fiéis pedir, por causa justa, a celebracáo dos sacramentos ou dos sa cramentáis a um clérigo que, tendo atentado matrimonio, tenha incorrido na pena de suspensáo latae sententiae (cf. can. 1394 § 4 CDC), a qual
porém nao foi declarada.
Este Pontificio Conselho, depois de atento e ponderado estudo da questáo, declara que tal modo de agir é totalmente ilegítimo e faz notar
quanto segué:
1) O atentado matrimonio, por parte de urna pessoa investida na Ordem sagrada, constituí grave violacáo de urna obrigacáo própria do estado clerical (cf. can. 1087 do Código de Direito Canónico e can. 804 do Código dos Cánones das Igrejas Orientáis) e, por isso, determina urna situacáo de objetiva inidoneidade para o desempenho do ministerio pas toral, segundo as exigencias disciplinares da comunháo eclesial. Tal acáo, além de constituir um delito canónico cuja perpetracáo faz com que o clérigo incorra ñas penas enumeradas no can. 1394 § 1 CDC e can. 1453 § 2 CCIO, comporta automáticamente a irregularidade para exercer as 390
SACERDOTES CASADOS CELEBRANDO A SANTA MISSA?
7
Ordens sagradas, nos termos do can. 1044 § 1, 3o CDC e can. 763, 2° CCIO. Esta irregularidade tem natureza perpetua e, portanto, é independente também da remissáo das eventuais penas.
Como conseqüéncia, fora da administracáo do sacramento da Pe
nitencia a um fiel que se encontré em perigo de morte (cf. can. 976 CDC e can. 725 CCIO), ao clérigo que tenha atentado matrimonio, nao é lícito
de modo algum exercer as Ordens sagradas, e nomeadamente celebrar a Eucaristía; nem os fiéis podem legítimamente pedir por qualquer moti vo, a nao ser em perigo de morte, o seu ministerio. 2) Além disso, mesmo que a pena nao tenha sido declarada - o que alias o bem das almas aconselha neste caso concreto, eventualmente através do procedimento abreviado estabelecido para os delitos certos
(cf. can. 1720, 3o CDC) -, no caso suposto nao existe a justa e razoável causa que legitima o fiel a pedir o ministerio sacerdotal. Com efeito, tendo
em conta a natureza deste delito que, independentemente das suas conseqüéncias penáis, comporta urna objetiva inidoneidade para exercer o
ministerio pastoral, e visto também que no caso concreto é bem conhecida a situacáo irregular e delituosa do clérigo, faltam condicóes para divi sar a causa justa a que se refere o can. 1335 CDC. O díreito dos fiéis aos bens espirituais da Igreja (cf. can. 213 CDC e 16 CCIO) nao pode ser concebido de modo a justificar urna semelhante pretensáo, a partir do momento que esses direitos devem ser exercidos dentro dos limites e no respeito das normas canónicas.
3) Quanto aos clérigos que perderam o estado clerical, segundo a
norma do can. 290 CDC e can. 394 CCIO, e que tenham ou nao contraído matrimonio após urna dispensa do celibato concedida pelo Romano Pon tífice, sabe-se que Ihes é proibido o exercício do poder de ordem (cf. can. 292 CDC e can. 395 CCIO). Portanto, e salvaguardada sempre a excecáo do sacramento da Penitencia em perigo de morte, nenhum fiel pode legí timamente pedir-lhes um sacramento.
O Santo Padre aprovou no día 15 de Maio de 1997 a presente Declaragáo e ordenou que fosse publicada. Vaticano, 19 de Maio de 1997.
* JULIÁN HERRANZ Arcebispo Tit. de Vertara Presidente
* BRUNO BERTAGNA Bispo Tit. de Drivasto Secretario» 391
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997 COMENTANDO...
1. Justa Causa
Supóe-se que os fiéis, por justa causa, pecam ao padre casado a celebracáo da S. Missa, valendo-se do canon 1335 do Código de Direito Canónico, que reza:
"Se a censura proibe a celebragáo dos sacramentos ou dos sacra mentáis ou a prática de ato de regime, a proibigáo é suspensa todas as vezes que isto seja necessárío para atenderá fiéis que se encontrem em
perigo de morte. Se a censura latae sententiae nao tiversido declarada, a proibigáo é suspensa sempre que um fiel pede um sacramento ou um sacramental ou um ato de regime; esse pedido é lícito porqualquer causa
justa".
Explicando: censura latae sententiae é a penalidade que ocorre desde que seja cometido o delito, sem necessidade de algum processo judiciário. Essa penalidade, porém, pode ser desconhecida dos fiéis; daí ter de ser declarada ou publicada, como diz o Canon 1335. Sacramental seria, por exemplo, a béncáo de urna casa ou de um objeto de piedade.
Como se vé, o canon admite excecáo para o atendimento em peri go de morte. Também admite que a censura latae sententiae nao tenha sido declarada ou tomada pública, caso em que o sacerdote penalizado pode atender a pedidos de atendimento movidos por justa causa. 2. Casados sem Dispensa
O sacerdote que se case sem dispensa do celibato, incorre em
penalidade enunciada pelo canon 1394:
"Canon 1394 - § 1. Salva a prescrigáo do canon 194, § 1, n" 3, o
clérigo que tenta matrimonio, mesmo só civilmente, incorre em suspensáo latae sententiae; e, se advertido, nao se arrepende e persiste em dar escándalo, pode ser gradativamente punido com privagóes e até com a
demissáo do estado clerical.
§ 2. O Religioso de votos perpetuos, nao-clérigo, que tenta matri monio, mesmo só civilmente, incorre em interdito latae sententiae, salva a prescrigáo do canon 694".
O mencionado canon 194 tem o seguinte teor:
"Canon 194-§1. Fica ipso iure destituido de um oficio eclesiástico: 1° quem tiver perdido o estado clerical;
2o quem tiver abandonado publicamente a fé católica ou a comu-
nháo da Igreja;
392
SACERDOTES CASADOS CELEBRANDO A SANTA MISSA?
9
3o o clérigo que tiver tentado o matrimonio, aínda que só civilmente". § 2. A destituigáo mencionada nos n° 2 e 3 só pode ser urgida se
constar déla por declaracáo da autoridade competente".
Por conseguinte, o sacerdote que se casa sem dispensa do celiba to, nao pode exercer seu ministerio sacerdotal a nao ser que, em perigo de morte, um fiel Ihe solicite o sacramento da Penitencia. 3. Casados com Dispensa
Quanto ao sacerdote que se casa com legítima dispensa do ce libato, fica privado do uso de ordens ao receber e aceitar a respectiva dispensa. Nao há justa causa que Ihe permita celebrar a Santa Missa, contrariando as determinacóes formuladas por ocasiáo da dispensa do celibato. Eis o que a propósito diz o canon 292:
"Canon 292 - O clérigo que perde o estado clerical, de acordó com
o Direito, com ele perde os direitos própríos do estado clerical, e nao está mais sujeito as obrigagoes desse estado, salva a prescrigao do canon 291; fica proibido de exercer o poder de ordem, salva a prescrigao do canon 976; fica privado, ipso facto, de todos os oficios, encargos e de todo poder delegado".
O canon 291 atrás mencionado determina que o clérigo dispensa
do das faculdades e obrigacóes sacerdotais (como seriam o exercício de Ordens sacras e o desempenho de funcóes eclesiásticas) nao fica, por isso, dispensado do celibato. A dispensa deste depende de concessáo explícita e exclusiva do Sumo Pontífice. 4. Em Perigo de Morte
Somente em perigo de morte pode o sacerdote casado, com ou sem dispensa da Santa Sé, absolver o fiel que Iho pega, mediante o sa cramento da Penitencia.
"Canon 976 - Qualquer sacerdote, mesmo que nao tenha faculda-
depara ouvir confissóes, absolve válida e licitamente de qualquer censu ra e de qualquer pecado qualquer penitente em perigo de morte, mesmo que esteja presente um sacerdote aprovado". O comentario do Pe. Jesús Hortal observa o seguinte:
"O perigo de morte pode provir de diversas causas: desastres naturais, agóes bélicas, doengas, etc. Já nao há limitagáo neste caso, nem
sequer quando se trata de absolver o próprio cúmplice. O texto do canon é bem claro: em perigo de morte, o ministerio da confissáo se exercita sempre válida e licitamente". 393
Furor e Preconceito:
"CAROS AMIGOS" ENTREVISTA LEONARDO BOFF
Em síntese: O ex-Frei Leonardo Boff concedeu urna entrevista a revista "Caros Amigos", em que ataca veementemente a Igreja, acusan do-a de cruel e corrupta. Quem lé serenamente os dizeres do ex franciscano, verifica que fala apaixonadamente, caricaturando a instituigáo que Ihe deu a ocasiáo de estudar e de se projetar no mundo inteiro. Na verdade, Leonardo Boff foi tratado com muita paciencia pela autoridade da Igreja, que Ihe outorgou longo prazo para que repensasse seus propósitos destoantes da fé católica, propósitos que nao Ihe tocava expri mir na qualidade de teólogo católico. Á Igreja compete zelarpelo depósito sagrado da fé, que Jesús Cristo Ihe confiou; daías advertencias feitas ao franciscano, que se mostrou recalcitrante até o dia em quejulgou melhor deixara Ordem Franciscana. As declaracóes de Leonardo a revista "Ca ros Amigos" tendem a propor o entrevistado como vítima inocente, ferida por algozes passionais. Todavía o final da entrevista revela suficiente mente quem é o autor: professa um conceito de Deus confuso, panteísta, que já nao corresponde a lucidez de mente de um intelectual serio. *
*
*
A revista "Caros Amigos", ano I, n° 3, junho de 1997, pp. 26-35, publica longa entrevista de Leonardo Boff, concedida a Freí Betto, Roberto Freiré e colegas. Versa sobre o currículo de vida e as experiencias do exfrade franciscano em tom altamente agressivo á Igreja, como se esta fosse mentirosa, corrupta e sem piedade. Quem lé o texto e conhece um pouco a materia de que trata, verifica, sem demora, que as declaracóes de L. Boff sao tendenciosas e caricaturáis, sem ter a devida fundamentacáo. Dir-se-ia que o entrevistado quer passar por vítima inocente, maltra tada pela autoridade da Igreja; as palavras de Boff pretendem exaltar o ex-franciscano; todavía o final da entrevista revela, antes, um pensamento confuso, perturbado, se nao doentio, bem distante do de Frei Leonardo em seus melhores anos.
Á guisa de comentario da entrevista, é oportuno, antes do mais,
apresentar breve quadro das peripecias teológicas de L. Boff. 1. As Peripecias Teológicas
Desde que comecou a escrever, L. Boff revelou tendencia a se afastar da doutrina oficial da Igreja. Expressáo muito nítida desta propensáo é o 394
"CAROS AMIGOS" ENTREVISTA LEONARDO BOFF
Vl_
livro "Jesús Cristo Libertador", publicado em 1972.0 autor segué, em boa parte, a exegese liberal alema, negando a plena fidelidade histórica dos Evangelhos; atribuí a Jesús a ignorancia do desfecho de sua vida, de modo que na Cruz ainda esperava que o Pai O salvasse; como nada acontecía, terá exclamado em desespero: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?" (SI 22,1 s). Em conseqüéncia, ao cear pela última vez
na quinta-feira santa, terá entregue o pao e o vinho aos seus discípulos sem saber que assim estava instituindo a Eucarista; os Apostólos é que teráo interpretado o gesto e as palavras de Jesús no sentido da teología posterior, ou seja, como instituicáo do sacramento que perpetua sobre os altares a Páscoa do Senhor Jesús. Em suma, o Jesús proposto pela fé dos primeiros cristáos terá sido diferente do Jesús real histórico. O livro deixou muitos leitores confusos; suscitou reacóes diversas no Brasil e no estrangeiro; a Santa Sé tomou conhecimento da obra, sem impor censura pública ao autor. Apesar das advertencias recebidas, Frei Leonardo continuou por vias estranhas, tornando-se no Brasil um dos pioneiros da Teología da Libertacáo. Esta utiliza principios do marxismo para elaborar sua síntese; dado, porém, que o marxismo é ateu e materi
alista, nao podia deixar de atetar o sistema que o tomava como ponto de partida; esvaziava as verdades da fé, deturpando a figura de Jesús Cristo e da Igreja, assim como as nocóes de pecado, redencáo, Eucaristía, etc. Sentindo-se contestado pela autoridade da Igreja, Leonardo Boff em 1981 publicou o livro "Igreja: Carisma e Poder", em que mais ainda se distanciava das verdades da fé; comparava a autoridade da Igreja ao Politburó de Moscou comunista, e fazia um paralelo entre as táticas do marxismo e o procedimento pastoral da Igreja. Tal obra causou mais rebolico ainda. Depois de alguns anos, a situacáo era táo tensa e Frei Leonardo era táo controvertido que foi chamado a Roma para explicar oficialmente seu modo de pensar ou a sua doutrina. Os jomáis noticiaram a ¡da de Leonardo a Roma, acompanhado pelos Cardeais de Sao Paulo e Fortaleza, D. Paulo Evaristo Arns e D. Aloísio Lorscheider respectivamente. Leonardo foi acoIhido com cortesía; nao precisava de advogado, pois nao se tratava de um
processo criminalista, mas, sim, de saber exatamente o que L. Boff pensava; ora nenhum advogado podia responder por Leonardo; era ele pessoalmente que tinha de dizer como entendía as proposicóes lancadas pelos seus livros. Frei Leonardo voltou ao Brasil em paz. Mas, visto que
sustentava evidentes erros teológicos que perturbavam o povo de Deus, foí-lhe imposto um silencio de onze meses (seriam doze meses, mas o S. Padre Joáo Paulo II o dispensou após onze meses). Aos poucos, Leonardo foi percebendo que, se permanecesse na
Ordem Franciscana, estaría sempre sujeito á Regra conventual e as nor mas da Ordem. Dado que L. Boff nao renunciava as suas idéias, mas, ao 395
12
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
contrario, desejava liberdade para as propagar, resolveu desligar-se da Ordem Franciscana e das obrigacoes do seu sacerdocio. Este gesto contribuiu para deixar claro que Leonardo nao quería ser teólogo católico, mas livre pensador, cheio de amargura contra a Igreja.
Refletindo a propósito, diremos: a Igreja é a depositaría do EvangeIho, que Cristo Ihe confiou; compete-lhe zelar pela integridade das verda des da fé. Daí a obrigacáo que toca á Igreja, de admoestar os seus membros que pervertem o patrimonio da fé. Doutro lado, se alguém pertence á Igreja e ensina proposicoes contrarias á mensagem da Igreja, é incoerente; pense como quiser, mas saia da Igreja a fim de nao disseminar ambigüidade e confusáo. Em suma, a Igreja, censurando L. Boff, nao fez senáo cumprir seu dever, dever arduo e ingrato, mas servico prestado ao Evangelho e ao povo de Deus.
2. A Entrevista
É sobre este paño de fundo que há de ser lida a entrevista de L. Boff
a "Caros Amigos"; vem a ser a expressao do azedume do entrevistado, que se volta contra as suas origens franciscanas e católicas. Quem lé o texto, tem motivos para perguntar se Leonardo é objetivo ou se ele real mente diz a verdade. Esta dúvida se impóe especialmente quando ele
fala do modo como foi recebido pela Congregacáo para a Doutrina da Fé, sob a responsabilidade do Cardeal J. Ratzinger e do Arcebispo J. Hamer em Roma. Tem-se a impressáo de que Leonardo caricatura, exagera; quer
parecer pobre vítima inocente; tende a se enaltecer as custas das autori
dades da Igreja. Esta se acha longe de ser o que L. Boff declara; nao é nem cruel nem corrupta nem mentirosa. Ao contrario, a Igreja foi muito paciente com o teólogo franciscano; contemporizou tongamente, protelando por muito tempo urna censura exigida pelo bem comum do povo de Deus. Se L. Boff tivesse desempenhado no Politburó de Moscou o papel que ele desempenhou na Igreja Católica, estaría morto em nossos dias
ou - quem sabe? - estaría exilado na Sibéria. Se ele está vivo e tem
possibílidade de agredir a Igreja, isto se deve á longanimidade e benigní-
dade da Máe Igreja.
Ao dizer isto, nao se quer negar a liberdade de pensamento. Repitamo-lo: se alguém quer ser marxista, que o seja, mas nao o seja com rotulo de teólogo católico. É contraditório querer usar o título de teólogo católico para esvaziar a doutrina católica em favor do marxismo. Nisto se acha o nó da questao. Nao foi, alias, a Igreja quem retirou de L. Boff o
título de teólogo católico, mas foi ele mesmo quem afinal julgou que devia ser coerente. A atitude de L. Boff foi muito dolorosa para quantos o acom-
panharam e estimaram em anos passados, mas foi oportuna, porque cla396
"CAROS AMIGOS" ENTREVISTA LEONARDO BOFF
13
reou os horizontes, dando a ver que o pensamento de Leonardo já nao é o pensamento católico, fiel aos Evangelhos e a Jesús Cristo. Esta última assertiva se baseia especialmente no final da entrevista
de Boff a "Caros Amigos": a nocáo de Deus ai proposta já nao é a concepcáo católica, mas revela um espirito confuso, perturbado, decadente em relacáo ao que foi outrora. Eis o trecho que interessa: «Chico Vasconcellos - A minha última pergunta seria a que
sua mee fez: como é que um padre nao vé Deus? Como é, vocéjá viu Deus, como é que é Deus?
Leonardo Boff - Eu acho que a gente vé com os olhos interiores. Talvez a gente nao veja, mas sinta Deus. Eu acho que toda vez que a pessoa senté entusiasmo, de levantar de manhá e ter de comegar o día,
ter capacidade de estender a máo a outro... Deus nao é um objeto, nao é urna entidade, é urna suprema paixáo, suprema energía, o que os gregos de urna maneira genial disseram, e eu gostaria de dizer porque ela está presente na nossa língua, que é a palavra entusiasmo. Porque em grego
entusiasmo significa ente os mos, ter um Deus dentro. Entáo todo entusi asmo é a esséncia da vida, porque a esséncia da vida nao é a vida, é a vitalidade da vida, é a energía que faz a vida viver. Entáo eu creio que é essa realidade que penetra tudo e nao se deixa captar e sem a qual nos nao entendemos nosso vigor, nossa esperanga, nosso sonho, nosso en tusiasmo, que escapa continuamente e ao mesmo tempo nos desafia pra frente e pra cima. Pensó que isso é Deus. E cultivar esse espago, manter a devogáo, manter o encantamento e deixar que isso se irradie é a obra de alguém que é inteiro. Porque, como disse Santa Teresa, quando se trata de comer galinhas, entáo comer galinhas; quando se trata dejejuar,
entáo jejuar; quando se trata de lutar com os sem-terra, lutar com os semterra; quando se trata de escrever um artigo, ser inteiro na escritura do
artigo. Eu acho que essa capacidade é aquilo que é a ressonáncia, que é o resultado da presenga secreta, sutil, dessa paixáo, desse fogo interior, que nos chamamos Deus».
Estes dizeres, confusos como sao, jogam com a palavra grega enthousiasmós, que significa "estar penetrado por Deus ou pela Divindade"; tal vocábulo tem origem nos meios panteístas do pensamento gre
go. Utilizando-o, Leonardo identifica Deus com um fogo interior, com urna
paixáo, com a vitalidade da vida... Trata-se ai de palavras bonitas, mas de conteúdo obscuro; seriam metáforas? E, se sao tais, que entendem signi
ficar? Em suma, Leonardo mistura Santa Teresa de Ávila, doutora místi
ca, com o pensamento grego, mas parece nao dizer algo de concatenado e lógico ou nao diz "coisa com coisa". Exprime-se assim urna mente con fusa, que - dir-se-ia - perdeu o seu acume juvenil. 397
Sensacionalismo:
'DESCASADOS COM FÉ"
Em síntese: A revista VEJA, edigáo de 11/6/97, publicou urna re-
portagem sobre declaragáo de nulidade de casamentos na Igreja, reportagem que cede ao sensacionalismo e deturpa a realidade, dizendo a
verdade pela metade ou caricaturando-a. A Igreja mantém-se fiel a Jesús Cristo, afirmando a indissolubilidade do casamento validamente contraí do e carnalmente consumado. O Código de Direito Canónico promulgado em 1983 mostrou-se mais atento do que o anteriora um fato mais presen te em nossos dias, a saber: o despreparo psíquico e físico de muitos nubentes, que se revelam, após o casamento, anti-sociais, homossexuais, ninfomaníacos, dispostos a engañar o(a) parceiro(a) para nao deixar de se casar. A freqüéncia de tais casos em nossos tempos fez que o Código de Direito Canónico considere as falhas no consentimento como motivo de declaragáo de nulidade ou declaragáo de que nunca houve casamento. Tal declaragáo, porém, sópode ocorrerapós meticuloso exame de cada caso, desde que esteja claramente comprovada a falha exis tente no ato de contrato matrimonio. Notemos que a infidelidade como tal nao é motivo de declaragáo de nulidade, pois ela ocorre após contraído o matrimonio; só pode vir ao caso, se é a expressáo de urna deficiencia física ou psíquica existente antes do contrato matrimonial. A revista VEJA, ed¡9áo de 11/6/97, traz noticias intituladas "Desca sados com Fé. A Igreja Católica facilita o processo para declarar nulo o
casamento que nao deu ceño". A repórter Lizia Bydlowski apresenta ca sos em que a Igreja tem declarado a nulidade de casamentos famosos
com facilidade surpreendente, cedendo aparentemente á pressáo dos tem pos atuais em favor da solubilidade do matrimonio. O artigo de VEJA surpreendeu muitos leitores. Daí a necessidade de Ihe tecermos comentarios. 1.0 Problema
A problemática é introduzida por VEJA nos seguintes termos:
"Os tempos mudaram, embora poucos católicos saibam disso. A Igreja relaxou seus criterios... e agora é muito mais fácil declarar nulo um
casamento que nao deu certo...".
A repórter fornece a seguinte lista de casos em que o matrimonio católico poderia ser considerado nulo: 1) Nao houve consumacáo; 2) Um 398
"DESCASADOS COM FÉ"
15
dos cónjuges, ou os dois, era ¡maturo; 3) Fatores externos (como gravi dez) forcaram o casamento; 4) Há desrespeito das obrigacoes conjugáis, como fidelidade; 5) um dos cónjuges muda de atitude (violencia, proble mas sexuais) depois do casamento; 6) Falta vocacáo para o matrimonio (o cónjuge nao quer ter filhos). - A linguagem jornalística é imprecisa e tendente ao sensacional. Por isto impressiona os leitores.
Para ilustrar o que diz, Lizia Bydlowski cita varios casos (nao se sabe com que precisáo de linguagem) de declaragáo de nulidade em tempos recentes.
Passemos agora á explanacao do pensamento e das atitudes da Igreja.
2. Doutrina e Praxe da Igreja
A Igreja continua professando a indissolubilidade do casamento como a propóe Cristo no Evangelho; cf. Me 10,2-12; Le 16,18; Mt 5,32; 19,1-9; ver também 1Cor 7,1 Os. Para que o matrimonio seja indissolúvel, requer-se que seja um auténtico matrimonio ou que 1) tenha sido validamente contraído (sem algum dos impedimentos que o Direito Canónico estipula) e 2) haja sido consumado carnalmente.
Examinemos cada qual destas condicóes, a comecar pela segunda. 2.1. Matrimonio consumado
O casamento nao é apenas a convivencia de duas pessoas amigas entre si, mas é a doacáo mais íntima que homem e mulher possam fazer
um ao outro, chegando ao consorcio carnal. É o que decorre da institui-
cáo mesma do matrimonio por parte do Senhor Deus: "Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a térra e submetei-a" (Gn 1,28). Em conseqüéncia, se o casamento, validamente contraído, nao é consumado (porque eventualmente o esposo tem de se ausentar na noite de nupcias e nunca mais voltará), pode ser declarado nulo; tal praxe é secular ou assaz antiga na Igreja.
2.2. Matrimonio inválidamente contraído Sao 25 as causas que podem provocar a nulidade de um casamen to, como se depreende da lista abaixo: 1. Falhas do consentimento
1.1. Falta de capacidade para consentir: 1.1.1. Falta de inteligencia "teórica"
1.1.2. Falta de inteligencia "prática" 1.1.3. Falta de dominio de si no campo matrimonial 399
16
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997 1.2. Ignorancia 1.3. Erro:
1.3.1. Erro sobre as propriedades do matrimonio 1.3.2. Erro sobre a identidade da pessoa com quem alguém se casa 1.3.3. Erro sobre certas qualidades da pessoa com quem alguém se casa
1.3.4. Erro maliciosamente provocado (doloso) 1.4. Simulacáo: 1.4.1. Total 1.4.2. Parcial
1.5. Violencia ou medo
1.6. Condicio náocumprida
2. Impedimentos dirimentes 2.1.ldade
2.2. Impotencia 2.3. Vínculo
2.4. Disparidade de culto
2.5. Ordem sagrada 2.6. Profissáo religiosa perpetua 2.7. Rapto
2.8. Crime
2.9. Consangüinidade 2.10. Afinidade
2.11. Honestidade pública
2.12. Parentesco legal, poradocáo 3. Falta de forma canónica na celebracáo do casamento.
A linguagem respectiva é um pouco técnica; a explicagáo de cada causa de nulidade já foi proposta em PR 303/1987, pp. 338-357. Interes-
sa, no momento, esclarecer as alegacóes da revista VEJA.
Como se percebe, um grande contingente de causas anulantes do
casamento se prende a falhas do consentimento. Estas hoje em dia sao
mais freqüentes do que outrora, visto que ocorre certo despreparo em muitos noivos, que se casam levianamente, "apaixonadamente", julgando que, "se nao der certo, poderáo separar-se e contrair nova uniáo"; o 400
"DESCASADOS COM FÉ"
17
facilitário e o descartável sao fatores assaz característicos da vida moder na. Conscientes disto, muitos canonistas (legistas da Igreja) puseram-se a considerar a problemática daí resultante: nao haveria casamentos aparente mente válidos, todavía nulos, porque contraídos sem que um dos nubentes ou ambos tivessem condicóes de assumir um compromisso exigente e vita licio como é o contrato matrimonial? Eis alguns exemplos significativos: Um individuo é, por sua índole mesma, anti-social; é incapaz de viver pacificamente com outras pessoas. Esse individuo pode conhecer perfeitamente o que significa o matrimonio, e até desejar vivenciá-lo, mas será incapaz de cumprir o que promete no casamento, pois nao é apto a viver numa auténtica comunháo de vida. O mesmo se diga de alguém que tenha tendencias doentias homossexuais, lésbicas, ninfomaníacas, masoquistas, sádicas... Como outrora tais tendencias eram (ou pareciam ser) menos freqüentes, o Direito Canónico nao considerava os impedimentos matrimoniáis daí decorrentes; em nossos dias, porém, sendo numerosos os casos, o Código de Direito Canónico de 1983 os levou em conta, como
se pode depreender da lista atrás proposta. Conseqüentemente, se após o casamento (talvez após anos, durante os quais nasceram filhos ao ca sal) se pode provar (em processo rigoroso e honesto) que o casamento foi contraído com impedimento, a Igreja declara que nunca houve casa mento. Simplesmente verifica o fato. Estas ponderacóes projetam luz sobre as alegacóes da revista VEJA:
1) "Um dos cónjuges, ou os dois, era imaturo". - A palavra "imaturo" pode ser entendida em sentido ampio; toda pessoa passa por maturacáo ora mais rápida, ora mais lenta. Por conseguinte, nao qualquer tipo de imaturidade gera falha de consentimento matrimonial; no processo leva do a efeito pelo Tribunal Eclesiástico ouvem-se testemunhas, colhem-se depoimentos para averiguar se a imaturidade impossibilitava realmente os nubentes (ou um deles) de assumir o compromisso matrimonial com todas as suas implicacóes. 2) "Fatores externos (comogravidez) forgaram o casamento".- Este seria o impedimento decorrente de coacáo ou falta de liberdade e espon-
taneidade dos nubentes ao proferirem o Sim conjugal. Nao é a gravidez
como tal que constituí impedimento. É certo que, quando há gravidez pre
matrimonial, os dois jovens se precipitaram, mas pode ser que, depois, se queíram casar com toda liberdade e verdadeiro amor. Neste caso é válido o matrimonio. Mas pode ser também que os familiares (especialmente os da mofa) pressionem os jovens para que se casem, coagindo-os moralmente; se em tais circunstancias falta aos nubentes espontaneidade e liberdade, o matrimonio é nulo. 3) "Desrespeito as obrigacóes conjugáis". - Está claro que nao se trata de qualquer tipo de desrespeito; nem o adulterio após o casamento 401
18
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
é, como tal, motivo de declarar nula a uniáo conjugal. No caso em foco, a ¡nfidelidade matrimonial só pode ser levada em conta se é síntoma de alguma falha ou defeito grave psíquico ou físico da pessoa infiel, defeito existente antes do casamento: assim a infidelidade por causa de homossexualismo pode ser indicio de que o rapaz nao tem condicóes humanas para contrair matrimonio. Por conseguinte, a infidelidade, como tal, nao tem efeito retroativo; nao pode ser por si só causa de nulidade do contrato; só pode ter incidencia sobre o contrato matrimonial se se pode provar que tal infidelidade revela urna estrutura psíquica ou física inca
paz, desde os tempos anteriores ao casamento, de assumir auténtico
compromisso matrimonial.
4) "Um dos cónjuges muda de atitude (violencia, problemas sexuais) depois do casamento". - Tem-se aquí alusáo ao impedimento de erro... erro quanto ao próprio sentido do matrimonio ou quanto á pessoa do(a)
consorte. É de notar, porém, que nao qualquer erro pode ser causa de nulidade do matrimonio. De modo geral, pode-se dizer que há sempre
certa margem de erro em qualquer contrato; nao é, pois, o erro como erro que vem ao caso, mas é o erro grave, erro sobre algum ponto importante
referente á comunhio de vida que é o matrimonio. É difícil determinar o limite entre o erro acidental e o erro essencial. Após o casamento, na vida
cotidiana, os dois esposos váo conhecendo melhor um ao outro e váo descobrindo qualidades e defeitos que antes nao percebiam; nem por isto se torna impossível o consorcio matrimonial. Pode, porém, alguém descobrir que foi engañado dolosamente ou de má fé por seu ou sua consorte portador(a) de doenca contagiosa; a molestia terá sido guardada em segredo porque a parte enferma nao quería perder a ocasiao de se casar;
está claro que entáo o casamento foi nulo por erro doloso. Paralelamente
a este caso, pode-se citar o ocultamento de crime infiancável ou da exis tencia de filhos nascidos de outras unióes.
5) "Falta vocagáopara o matrimonio (o cónjuge nao quer ter filhos)". - A exclusáo radical e perene da prole torna nulo o casamento, pois este é, por designio do Criador, destinado á mutua complementacao do homem e da mulher e á propagacáo da especie humana. Nao vem ao caso, porém, como impedimento a exclusáo provisoria da prole, exclusáo nos primeiros anos de vida conjugal, enquanto se estabiliza a economía do casal. O planejamento familiar ou a paternidade responsável é altamente desejável para que nao se ponham no mundo críancas que nao tenham a devida educacáo; o que importa, no caso, é seguir os métodos naturais de contencáo da natalidade, sem recurso a anticoncepcionais.
Este percurso da temática lancada por VEJA confirma a ¡mpressáo, já deixada por reportagens anteriores, de que tal periódico nao é informa tivo fidedigno no tocante a assuntos da Igreja Católica. 402
Queé?
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
Em síntese: O pentecostalismo protestante teve orígem nos Esta dos Unidos em principio do secuto XX. É herdeiro do "Protestantismo do Espirito", existente desde o século XVI; caracterizase por valorizar, de modo especial, as efusdes e os dons extraordinarios do Espirito Santo, sem usar o senso crítico necessário quando se trata de manifestagóes religiosas extraordinarias. Dada a grande parcela de subjetivismo ocorrente em tal denominagáo, os pentecostais tendem a se dividir e subdividir em numerosas congregagóes. Entre as principáis distinguimos: a Assembleía de Deus, a Congregagáo Crista do Brasil, a Igreja Universal do Remo de Deus, os Pentecostais independentes. Tal temática será estudada neste e nos seguintes números de PR. *
*
*
Os pentecostais sao, dentro do protestantismo, a corrente que mais cresce; correspondem aproximadamente a 70% dos protestantes do Bra sil. Daí a importancia de um estudo de suas origens e características, estudo que será parcelado neste e nos seguintes números de PR. 1. A origem nos Estados Unidos
1.0 Pentecostalismo clássico é urna forma de reavivamento fundamentalista1 do Protestantismo norte-americano.
Está ligado com um tipo de reavivamento metodista2 chamado Holiness (Santidade), que se originou na segunda metade do século passado Os seus mentores julgavam que os metodistas negligenciavam a doutrina de seu fundador John Wesley (t 1791), concernente á "inteira santificacáo" Segundo esta, o cristáo que já tivesse feito a experiencia da conversáo (necessária para a salvacáo), devia aspirar a urna "segunda béncáo" isto é, a urna nova e mais profunda experiencia religiosa; esta tornaría o cristáo apto á vida de perfeicáo moral, sem sentir perturbado proveniente de algum resquicio do pecado. Tal experiencia nova era tida como "batismo no Espirito Santo" ou também Holiness. Esta segunda ' O adjetivo "fundamentalista" designa urna adesáo incondicional aos artigos funda
mentáis da fé deduzidos da S. Escritura lida estrítamente ao pé da letra. Sobre o fundamentalismo ver PR 421/97, pp. 276-285. 2 O Metodismo é urna denominagáo protestante que, por sua vez, tendía a reavivar o
anglicanismo ou episcopalismo oriundo no séc. XVI na Inglaterra. Julgando que os episcopalianos haviam perdido o seu fervor, John Wesley (t 1791) desejava dar-lhes novo método de vida espiritual; donde o nome "Metodismo". 403
20
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
experiencia teria índole meramente interior e subjetiva, ficando indepen-
dente de qualquer sinal exterior que a denotasse.
Ora aconteceu no ano de 1900 que o pastor metodista Charles R Parham aderia ás concepcoes de Holiness. Tlnha uma escola para estudos bíblicos em Topeka (Kansas, U.S.A.) com trinta alunos, de ambos os sexos. Adotava o método de propor uma pergunta, para a qual os estudantes tinham de procurar os textos bíblicos que pudessem servir de resposta. Certa vez, ¡nterrogou: "Quais sao os sinais que, na Biblia, caracterizam o auténtico batismo no Espirito Santo?" - Na base de At 2, 1-12; 10, 44-48; 19,17,
Parham e seus discípulos concluíram que o único sinal seguro era o dorrí
das línguas (glossolalia). Entáo grande entusiasmo apoderou-se do grupo,
que se pos a rezar ininterruptamente durante varios dias e noites, pedindo a
vinda do Espirito Santo. A1s de Janeiro de 1901, uma das estudantes, Agnes Oznam, pediu a Parham que Ihe impusesse as máos sobre a cabeca enquanto orava; quando isto foi feito, ela experimentou o "batismo no Espirito"
e comecou a falar línguas: "Sentia-me como se rios de agua viva jorrassem
do mais profundo do meu ser, declarou ela mais tarde. Dentro de poucos dias Parham e os outros membros do grupo fizeram a mesma experiencia.
Assim surgiu a primeira congregacáo pentecostal, distinta dos gru pos Holiness pela conviccáo de que o genuino batismo no Espirito há de ser manifestado, como no primeiro Pentecostés, pelo dom das línguas; esse batismo nao visa apenas á santificacáo pessoal dos crentes, mas também os fortalece para que possam dar público testemunho de Cristo* num apostolado eficiente, assinalado por outros dons do Espirito; entre estes, o da cura dos doentes por imposto das maos de um pregador
tem importancia eminente.
O primeiro núcleo pentecostal de Topeka deu origem a outros; espalhou-se pelo Texas e em 1906 estava em Los Angeles, sob a direcáo de um pastor de cor chamado W. J. Seymour, o qual aderira anteriormen
te á espiritualidade de Holiness.
A exaltacao e o entusiasmo demonstrados por esses grupos fizeram
que as comunidades batistas e metodistas tomassem distancia do movi-
mento. Verdade é que Parham, Seymour e os outros iniciadores do Pentecostalismo nao tencionavam fundar nova denominacáo crista, mas apenas suscitar um revlval ou reavivamento no seio das comunidades protestantes.
Quando, porém, se viram rejeitados por estas, passaram a constituir congre-
gacoes próprias, hoje conhecidas pelo termo genérico de "pentecostais",
que nos Estados Unidos contam com um total de dois milhoes de membros!
Nenhuma denominacáo protestante está sujeita a se dividir e subdividir tanto quanto a dos pentecostais. Isto se compreende, dado que as raízes e as forcas impulsoras do movimento sao assaz subjetivas e arbi trarias... Em suma, os pentecostais sao uma das mais recentes expres404
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
sóes do anseio de liberdade que levou muitos protestantes da Inglaterra a emigrar para os Estados Unidos em 1620 (Mayflower); julgavam-se sufo cados pela "Igreja (Anglicana) do Estado". Queriam fundar na térra da Liberdade comunidades menos institucionalizadas, mais corresponden tes a seu modo pessoal de ver. Este anseio inicial até hoje subsiste no Pentecostalismo protestante, de modo que os pastores "inspirados" atribuem a si o direito de fundar a "sua" Igreja. 2. Divisóes e características 1. No Brasil, o pentecostalismo protestante se divide em quatro gran
des grupos, que tém seus subgrupos: 1) a Assembléia de Deus; 2) a Congregagáo Crista do Brasil; 3) os pentecostais independentes; 4) a Igreja Universal do Reino de Deus. Cada qual, desses ramos será considerado de per si ñas páginas de PR.
2. Quanto as características dos pentecostais, pode-se dizer que sao herdadas de denominares anteriores ou do "Protestantismo do Es pirito" existente, de algum modo, desde o século XVI.
Com efeito. O Protestantismo muito voltado para as manifestacóes do Espirito comeca com os Anabatistas. Estes, chefiados por Tomás Münzer (t 1525), ao qual se juntaram Nicolau Storck e os "profetas de Zwickau, afirmavam a superioridade da revelacáo direta do Espirito San to sobre a Revelacáo escrita. Münzer achava absurdo que Deus, após haver falado diretamente aos homens durante séculos, tenha emudecido. Os menonitas, ramo anabatista fundado por Menno Simons em
1536, afirmavam a necessidade de receber o Espirito Santo para iluminar os fiéis na leitura e na compreensao da Biblia. Anabatistas e Menonitas consideravam o batismo como um testemunho de conversáo já efetuada; por isto rejeitavam o batismo de enancas.
Os Quakers (= os convulsivos) ou a Sociedade dos Amigos ou ainda os Filhos da Luz, fundados pelo anglicano John Fox (1624-1691), apregoavam a inspiracáo direta do Espirito Santo para todos os homens; por isto recusavam qualquertipo de hierarquia social. Opunham-se, conseqüentemente,
á autoridade dos pastores e á organizacáo jurídica das suas comunidades. O nome quakers se deve as convulsoes que nao raro acometiam os crentes em suas reunioes, quando se sentiam iluminados pelo Espirito Santo. Em fins do século XIX surgiu nos Estados Unidos o Latter Rain Movement (= o Movimento da Última Chuva). Baseava-se em Jl 2,28-32 para afirmar que o fenómeno da glossolalia determina nova era do Cristi anismo, pois é o sinal que anuncia a segunda vinda de Cristo. Mediante
esta me'nsagem, tal movimento tomou-se ¡mediato precursor do Pentecos talismo protestante. Pode-se entáo dizer que o Pentecostalismo recebeu
- dos Batistas a prática de só batizar adultos, e sempre por imersáo; 405
22
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
„ ~ dos,Metodístas a concepcáo de que há um segundo Batismo,
dito "no Espirito Santo", mais importante do que o primeiro, pois confere a experiencia de plena salvacáo;
- dos Adventistas do Sétimo Dia, a doutrina segundo a qual está iminente a segunda vinda de Cristo; significará a destruicáo da presente realidade do mundo e a fundacáo do "reino milenar" de Cristo; - do Puritanismo, o Código de Moral. Muitas correntes pentecostais juigam que o mundo está sob a acao de Satanás, provocador de graves males moráis e físicos. Praticam o exorcismo com freqüéncia. Além disto, proibem tudo o que Ihes pareca mundano: fumar, beber, dancar, cantar melodías profanas, assistir á televisáo, especialmente as novelas, usar vestes extravagantes (entre as quais as calcas compridas da mulheres), maquilar-se, divertimentos ou recreacoes que profanem o domingo...
O fato é que o crente pentecostal deve comportar-se segundo um padráo moral tido como exemplar. Ele é "moralmente qualificado" a partir do momento da sua conversáo. Os que nao se ajustam as normas vigen tes na comunidade, sofrem pressóes que váo até a excomunháo. Quem se arrepende de ter violado as regras e quer voltar, só é readmitido após um período de observacáo.
Passemos agora ao estudo dos quatro grandes grupos do Pentecostalismo protestante, comecando pela Assembléia de Deus. 3. Assembléia de Deus: origem e propagarlo
Tendo tido origem em 11900, o movimento pentecostal expandiu-se rápidamente até a Suécia, a india, a América Latina...
Em 1914 organizou-se nos Estados Unidos com o nome de Gene
ral Council (Assembléia Geral).
Naquele ano varios pastores pentecostais reuniram cerca de cem congregares diferentes em Hot Springs, Arkansas (U.S.A.), dando-lhes
o nome único de Assembléia de Oeus.
O Pentecostalismo que originou a Assembléia de Deus no Brasil foi trazido.em 1910 (5 de novembro) por dois missionários suecos - Gunnar Vingren e Daniel Berg. O primeiro nasceu a 08/08/1879, de familia batis ta; em 1903 foi para os Estados Unidos, onde recebeu "O Batismo no Espirito Santo" e comecou a falar em línguas; dizia que, juntamente com outros companheiros, durante a oracáo "sentía a poder de Deus sobre si
como urna pressáo". A decisao de vir para o Brasil foi-lhe inspirada diretamente pelo Espirito Santo, como refere o pastor Lawrence Olson:
"Oremos que o Espirito Santo chama certas pessoas para realizar determinados trabalhos missionários. A chamada divina é essencial para 406
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
23
quem se langa ao trabalho no exterior e mesmo para os trabalhos missionários dentro do país. Como o Espirito Santo chamou Paulo e Barnabé em Antíóquia para saírem ao trabalho missionário, assim hoje também
Deus chama seus servos, embora nem sempre em profecía, como naquele caso. Em 1910 o Espirito Santo chamou doisjovens suecos, por nome
Gunnar Vingren e Daniel Berg, em South Bend, Est. Indiana, E.U.A., por mensagem em línguas estranhas, proferidas por um irmáo Uldin, em cuja
casa estavam hospedados. Sendo repetida tantas vezes a palavra "ParáPará-Pará", entenderam que para algum lugar por esse nome Deus os estava chamando. Verificaram entáo na Biblioteca Municipal que Para era o nome dum Estado no Norte do Brasil. Oraram a Deus. Sentiram que era o
Brasil para onde Deus os chamara. O caminho abriu-se e em Novembro de 1910 chegaram a Belém do Para, onde iniciaram a obra das Assembléias de Deus no Brasil, obra conhecida de todos, de culto nacional, congregando hoje cerca de 1 milháo de membros"(Énfases do Movimento Pentecostal. 0 Espirito Santo e o Movimento Pentecostal, Sao Paulo 1966, p. 28f. Na autobiografía de Daniel Berg, um dos fundadores da Assembléia de Deus no Brasil, narram-se as circunstancias maravilhosas que marcam a sua vida, especialmente a sua vinda para o Brasil: "A melhor forma de saber a vontade de Deus, era orar; foi o que fizemos durante urna semana, dia e noite.
Finalmente, Deus confirmou que deviamos ir para o Para. Se aínda houvesse qualquer dúvida, esta desaparecería dias mais
tarde, quando o irmáo Vingren, durante um de seus longos passeios de meditagáo, ouviu claramente urna voz que Ihe falava ao ouvido dizendo:
"Se vos fordes, nada vos faltará". Vingren voltou-se rápidamente para ver
quem falava táo claramente, porém nao viu ninguém. Era o Senhora con firmar a chamada.
Nao ficamos surpreendidos ao saber que havia dois lugares no na
vio, que nao foram ocupados. O Senhor havia preparado todas as coisas e até aquela hora, de modo que tínhamos a certeza de que Ele cuidaría também dos lugares no navio. Compramos as passagens e embarcamos.
De repente, percebi, ao longe, dois objetos que vinham em diregáo
ao barco, um atrás do outro, em grande velocidade. Quando se aproxima-
1 Neste artigo utilizamos a obra "A Experiencia da Salvacao" de Beatriz Muniz de Souza - Livraria Duas Cidades, S. Paulo (SP) 1969. Os dados históricos fomecidos pela autora sao fidedignos até hoje. Quanto aos costumes e aos depoimentos de pentecostais ai consignados, podem nao ser exatamente os de nossos dias. As correntes mais radicáis tendem a se acomodar e institucionalizar. Como quer que seja, a mentalidade subjacente a tais costumes e depoimentos persiste até nossos dias. Pode-se mesmo dizerque, apesar do passar do tempo, ela se exprime, em muitos casos, ainda do mes mo modo. Eis por que julgamos válida a obra de Beatriz Muniz de Souza. 407
24
■'PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
ram, vi que eram dois peixes. O que vinha na frente era grande, maior que ospeixes comuns, o que vinha a persegui-lo era aínda maior. Estávamos observando como nadavam, rápidos como flexas, quando o peixe perse guido deu um pulo e caiu no meio do barco. Era a resposta á oragáo que fizemos ao Senhor, para que nos desse alimento para ojantar. Agradece mos a Deus, mesmo antes de o preparar para comer
Todos os tripulantes se alegraram e viram, com seuspróprios olhos como Deus prepara alimento para seus filhos. O peixe tinha excelente paladar. O cozinheiro declarou que aquela especie é rara naquela regiáo, o maior exemplar que vira desde muito tempo. Quando o Senhor dá alguma coisa, dá sempre o melhor. As suas béngáos, possibilidades e querer sao maiores do que podemos imaginar. É urna verdade que até mesmo ñas pequeñas coisas, nos acontecimentos diarios e na variada especie
de problemas, sentimos a máo de Jesús dirigindo-nos pelo melhor caminho" (D. Berg, O Enviado por Deus, Casa Publicadora das Assembléias de Deus, Rio de Janeiro, sem data, pp. 30-35. 166s).
Segundo os historiadores do Pentecostalismo protestante, "avisos", "revelares", "sonhos proféticos" sao alguns dos sinais carismáticos que acompanham a expansáo do movimento. Narra, por exemplo, Emilio Con de, encarregado pelos pentecostais de escrever a "Historia das Assem bléias de Deus no Brasil", o seguinte episodio, que é típico do que ainda hoje freqüentemente acontece nos cultos pentecostais: "Para convencer umpovo de coragáo duro, e confirmar urna Obra iniciada em meio táo hostil, o Senhor manifestou o Seu poder ante os olhares atónitos dos descrentes. Certa noite, em um culto realizado na
Vila Coroa (Belém), apareceu um homem endemoninhado que se retorcía
com violencia sem que alguém o pudesse segurar. Os descrentes que assistiam, tentaram imobilizá-lo, porém nao conseguiram. Em dado mo mento a irmá Josina Galváo, comegou a profetizar e, cheia do poder de Deus, dirigiu-se para onde estava o homem endemoninhado. Em nome
de Jesús impós-lhe as máos e ordenou ao demonio que se retirasse Ante a admiragáogeral, o homem ficou imobilizado, de cócoras, dominado pelo poder de Deus; todos viram que algo como um raio saiu pela janela e
desapareceu. Os descrentes que estavam fora de casa, e a tudo assistiam, amedrontados, confessavam que Deus estava no meio daquele novo" (ob. cit., p 33).
lismo.
Analisaremos este fato ao tecermos reflexoes sobre o Pentecosta
A Assembléia de Deus logo se expandiu para outras regióes do Brasil a partir de Belém, onde a primeira congregacao contava dezoito pessoas. Já em 1913 o primeiro mensageiro brasileiro partiu para Portu
gal; em breve outros se Ihe seguiram.
408
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
25
3.1. Causas e Cura das Doencas
Um dos fatores que mais contribuem para a propagagáo das correntes pentecostais, sao as curas de doencas tidas como milagrosas. A propósito convém apresentar a mentalidade segundo a qual os pentecos tais freqüentemente consideram as molestias.
A doenca é, muitas vezes, tida como punicáo... punicáo do pecado. Eis os depoimentos oriundos de labios de crentes pentecostais:1 "A doenga é um castigo de Deus. Embora Ele nao envié a doenga,
permite que o Diabo a envié para o mau crente como castigo, ou, até
mesmo, para aquele crente que Deus quer provar a sua fé. Assim como Deus abengoa até mil geragóes aos que fazem a Sua vontade, Ele também castiga, através do Diabo, até aterceira geragáo. Porisso os filhos
ficam as vezes doentes por causa dos pecados dos pais, ou para a gloriiicagáo de Deus pela fé" (ob. cit, p. 167). "A doenga vai do pecado, até do pecado original. Se urna pessoa
ou seus antepassados conheceram a verdade e depois cometeram mal perante Deus, sao castigados por Ele. Deus só castiga aqueles que creram e pecaram. Nos estamos aqui para orar em vigilia, para nao cair e ficar ahijados, para nao ter um cáncer. Para ir para Cristo, temos de orar todos os días, com muita fé, para que Jesús nos livre dos ataques do Diabo, que traz as doengas" (ob. cit, p. 168). Se tal é a origem das doencas, entende-se que a cura há de ser obtida, antes do mais ou talvez até exclusivamente, através da oracáo. Eis outro testemunho:
'Todas as doengas vém do Diabo, mas podem ser evitadas pelo asseio e pela abstinencia. Na vida eterna, nao existiráo mais doengas e provagoes. O médico, com a permissáo de Deus, pode curar. Quando eu fico doente, oro e pego a Deus para ser curado. Nao sendo curado, procu ro aumentar minha fé; nao conseguindo, apelo para a medicina". Os crentes mais extremados afirmam envergonhar-se de recorrer
ao médico ou tomar remedios, pois "este pode ser um dos meios de que
se vale Satanás para enfraquecer nossa fé na cura de Jesús". Um fiel entrevistado concluiu, de modo convicto: "Quem nao tem fé, pode ser
curado pelo médico. Os crentes novos ás vezes sao fracos, duvidam da cura. Por isto váo ao médico, mas depois se convencem de que só Deus é quem cura". Eis outro depoimento:
"O crente, quando tem muita fé e eré firmemente em Jesús, nao procu
ra médicos. Ele ora para o Senhor, que é o médico dos médicos. Agora, 1 Os testemunhos e as noticias que se seguem relativas ás doengas e curas, sao
colhidos no livro de Beatriz Muniz de Souza: "A Experiencia da Salvacáo", pp. 166171, citado á p. 407 deste fascículo. 409
26
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
quando o crente nao tem fé suficiente, nao é capaz de orar com conviccáo; ele pode procurar a ciencia da térra, pode tomar remedio" (ob. cit, p. 143). As pretensas curas obtidas no espiritismo sao tidas como "curas
engañadores, de que se vale o diabo para conquistar as almas".
Tendo procurado terreiros de Umbanda e sessóes espiritas antes de conhecer o Pentecostalismo, um dos informantes, adepto da seita,
declara:
"A cura do Espiritismo é a cura do corpo, mas a alma se perde. Satanás também tem o dom de fazer milagres, mas faz para o mal. O demonio é urna criatura desesperada. Faz curas, mas a diferenga está em
que a pessoa que é curada pelo Espiritismo nao eré em nada, a pessoa nao muda porque nao eré, continua urna pessoa do mundo. Eu mesmo fui curado pelo Espiritismo, antes de me converter. Fui ao centro espirita, tomei o remedio que mandaram e sarei. O mal, porém, continuou dentro
de mim, pois nao acreditaba em nada. Agora sou diferente porque estou
salvo por Jesús" (ob. cit, pp. 169s). 3.2. A Terapia Aplicada
Se "só Jesús cura", existem técnicas terapéuticas aplicadas em nome
de Jesús por pessoas que tém o dom da cura:
a) Imposicáo das máos, acompanhada de oracao por cada um dos enfermos "em nome de Jesús". Varios textos bíblicos sao entáo cita dos: At 16,18; Mt 8,16;12,45; Le 9,1; Me 5,8-10. Quem pratica tal gesto julga, muitas vezes, possuir autoridade divina para "ordenar aos demoni os que abandonem o corpo do enfermo".
b) Unció com óleo, acompanhada de oracáo, conforme Tg 5,14. Tanto homens como mulheres estáo habilitados a praticar este rito. c) Acordó entre duas pessoas, das quais urna goze do dom da cura. Faz-se assim "urna corrente de oracáo e fé", baseada em Mt 18,19: "Em verdade vos digo: se dois de vos estiverem de acordó na térra sobre qualquer coisa que queiram pedir, isso Ihes será concedido por meu Pai, que está nos céus".
d) Béncio de pecas de roupa ou de outros objetos, de acordó com At 19,11s: "Pelas máos de Paulo, Deus operava milagres nao comuns. Bastava, por exemplo, que sobre os enfermos se aplicassem len cos ou aventáis que houvessem tocado seu corpo; afastavam-se deles as doencas, e os espirites maus saiam". É usual levarem-se aos crentes carismáticos lencos brancos ou fotografías pertencentes a pessoas que nao possam comparecer pessoalmente ao culto. Esses objetos sao de
volvidos após terem sido "abencoados" pela imposicáo das máos dos que possuem o dom da cura.
410
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
27
Os testemunhos de cura divina, muito freqüentes, despertam a emocáo da assembléia, que os acompanha com exclamares vibrantes ("Gloria, Aleluia, Amém Jesús..."), enquanto a pessoa que narra cai em prantos. Eis o testemunho proveniente de urna senhora de meia-idade da Congregacáo Crista do Brasil, testemunho proferido com voz emociona da, entrecortada por palavras de louvor:
"Queridos irmáos, bendito seja o nome do Senhor! Fui visitar urna amiga e, quando lá cheguei, ela estava chorando, porque sua filha, que
sofría do coragáo, estava passando mal. Orei com fervor e sentí que Je sús estava comigo. A moga doente dormiu e, quando acordou, disse que viu Jesús e mais tres homens aparecer para ela e mostraran) o coragáo déla preto de um lado. Jesús tinha tirado o seu coragáo; operou e depois a moga viu quando Ele chegou peño e colocou o coragáo no peito déla. Jesús operou o coragáo da moga e hoje ela está boa. E o nome do Senhor seja eternamente louvado!"
As curas "operadas em nome de Jesús" referem-se a todos os tipos de molestias, desde as mais simples, como resfriados, dor de garganta,
"mal-estar", até as mais graves, após terem sido os pacientes desenga ñados pelos médicos: cáncer, AIDS, molestias do coracáo... As doencas do sistema nervoso sao freqüentemente tratadas como possessáo diabólica. Há "revelacóes" referentes aos doentes que o Espirito Santo quer curar ñas assembléias de culto. Diz um pastor: "Quando Deus me revela o doente, há urna grande luz iluminando a cabera da pessoa". Inspirado pela "revelacáo", o pastor descreve o tipo de enfermidade e indica o local da igreja em que se encontra o paciente. Por vezes ocorre certa confusao, pois varias pessoas se levantam ao mesmo tempo, desejando ser a escolhida para a cura divina. Todavía o dirigente indica aos diáconos ou aos obreiros apenas urna délas, "a que foi revelada por Deus". Esta é entáo levada á frente, enquanto a assisténcia prorrompe em exclamacóes de júbilo e louvor.
Sucedem-se os chamados, compreendendo ampio leque de mo lestias:
"Chamo um irmáo com doenga no estómago; é o último desta ala. É o Senhor que está revelando".
"Outra pessoa, na fila da frente, é revelada. A sua enfermidade está na espinha. A Sra. eré que Jesús pode curar?... Entáo levante-se". "Agora urna irmá. Nao tem doenga física, mas é perturbada. Bate nos filhos e no próprio marido; por isso Deus vai libertá-la esta manhá. Aproxímese aqueta que está na ponta esquerda do penúltimo banco". "Deus me revela um homem que sofre dos intestinos. O seu intestí411
28
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
no está furado; tudo o que come, faz mal. É um tumor maligno. Chegue-se
para peño".
"Agora urna moga que o diabo está fazendo coisa horrível com ela; é tentada pelo diabo. Ouga, moga: vocé chegou a jogar a Biblia por térra e disse urna palavra que nao quero repetir; só vocé ouviu. E viu como eu sei o que vocé disse? Deus querperdoar-lhe. Vocé quer serperdoada por Deus? Fique de pé e venha ser curada".
Após estas "revelacóes", o pregador ora, com imposicáo das máos, por todos os enfermos levados á frente por diáconos, obreiros, parentes ou amigos: "Senhor, Senhor, aleluia! Doenca maldita, sai! Cessa, demo
nio!". Dirige-se aos "revelados" e diz: "Olhem para mim. Hoje voces foram escolhidos por Deus. Isto nao quer dizer que sao melhores que os outros; sao piores talvez. O privilegio é de Deus e nao de voces. Deus ama a todos. A igreja diga: Aleluia!". Cf. ob. cit., pp.111s. Levantando os bracos para o alto ou para a frente, todos os presen
tes unem suas vozes na oracáo final.
A crenca cega ñas intervencóes do demonio se estende a outros setores da vida dos crentes, como atesta a noticia seguinte, extraída do JORNAL DO BRASIL de 2/12/94, p. 12: «CRENTE QUEIMA UMA FORTUNA
Pastor mandou destruir o bilhete que valia 50 mil
Fortaleza -A conselho do pastor Wagner, da Igreja Assembléia de Deus na Rúa Guadalajara, a empregada doméstica María Benoiza Nasci-
mento, 39 anos, que mora com sete filhos no bairro Boa Vista, periferia de
Fortaleza, queimou o bilhete premiado da Tele-sena no valor de R$ 50 mil. Desempregada, assim como o marido, ela contou que, durante o cul to, o pastor disse que, se fosse receber o premio anunciado no dia 15 no Programa Silvio Santos, do SBT, o aviáo cairia e ela "ia afundarno peca
do dentro do inferno".
María Benoiza disse que as irmás gritavam em coro "queima, quei-
ma, queima", depois da pregagáo do pastor, que recomendou a ela, como crente da Assembléia de Deus, "destruir o bilhete - coisa do diabo -para se salvar do fogo do inferno". Segundo ela, o episodio a deixou com a
"cabega atribulada e confusa". Ao chegarem casa, queimou o bilhete jun to com o registro de nascimento dos filhos e sua carteira de identidade.
O marido de María Benoiza, Raimundo Nonato, também está desempregado. Ao saber do que aconteceu através dos vizinhos, deu urna surra na mulher, arrumou a mala para ir embora de casa e mandou que ela desse um jeito de "recuperar o prejuizo". Aflita, ela disse que a sua última esperanga agora é que a diregáo da TeleSena-SBTpossa validar o 412
O PENTECOSTALISMO PROTESTANTE
29
premio com base no impresso com nome e enderego do apostador envia do a empresa pelo Correio.
Segundo María Benoíza, tres dos seus filhos estáo com pneumonía e a familia só nao tem ficado sem comer alguns dias porque os vizinhos ajudam com alimentos».
3.4. Os demais dons espirituais
Além do dom da cura, os pentecostais muito estimam outros dons do Espirito, que muitas vezes tém caráter extraordinario, de modo que as
suas assembléias de culto sao muito vibrantes, emocionáis e até dramá
ticas. Enfatizam a necessidade de que os pecadores se arrependam e se convertam "aceitando Jesús como único e suficiente Salvador". Prepa ra m assim o
3.5. Batismo no Espirito Santo
O Batismo no Espirito Santo é urna especial efusáo do Espirito Santo,
comparável á que os apostólos receberam no dia de Pentecostés. É urna
experiencia que reveste o crente com o poder do Alto, habilitando-o a viver mais intensamente a sua vida crista e a usar de autoridade e ousadia para proclamar as verdades do Evangelho. A maioria dos mestres julga que a essa experiencia está associado o dom das línguas (glossolalia): este faz que o fiel fale um linguajar ininteligível - trinados, cánticos sem palavras, repeti^áo de sons -; é a "língua dos anjos", conforme al
guns depoimentos. Ás vezes, a pessoa mesma que fala línguas, interpre
ta-as para a edificacáo da assembléia; nao raro, porém, o linguajar estranho fica sem explica$áo.
Eis o depoimento significativo de alguém que recebeu o Batismo do Espirito Santo:
"Nao demorou muito para eu receber o batismo do Espirito Santo. Logo depois do batismo das aguas minha fé aumentou muito. O batismo do Espirito Santo se refere que a pessoa está andando ceño. O batismo quer dizer o sepultamento de nosso pecados. Um dia, entrei na Igreja e todos já estavam orando. Fechei os olhos e fiquei em qragáo. O pastor chegou perto de mim e disse: Pega. Eu pedia e nao sabia o qué. O pastor chegou, pos a máo na minha cabega e disse: Nao pega mais, que vocé alcangou o que pediu. De repente, comecei a pularalto e falar, falar línguas. Continuaram a
orar e pregar e eu nao conseguía parar. O pastor dizia: Deixa o irmáo Anto nio, que ele está contente. As enancas me rodearam e comegaram a cantar hinos em volta de mim. Demorei quase duas horas assim; só parei quando o pastor encerrou a reuniáo. Todos me cumprímentaram porque disseram que eu falei tantas línguas -japonés, alemáo, e outras - mas ninguém compreendeu o que eu falei. Ai comecei a ser convidado a pregar em outras igrejas. Comecei a levar, a dirigirá mocidade, um grupo de mogas e mogos, por urna 413
30
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
porgáo de lugares, visitas, pregagáo na rúa, fomos até ao interior. Eu nao tenho instrugáo, só tenho o 4B ano, mas posso pregar urna mensagem. O Espirito Santo enche a boca da gente. Urna vez eu pregueipelo radio, quando o pastor viajou. Eu tremía, nao sabia como fazer, mas a pregagáo foi maravilhosa" (ob. cit, pp. 137s).
Além do dom das línguas, os pentecostais reconhecem 3.6. Os dons de revelagáo
Trata-se de gracas concedidas ao homem para que entenda as verdades e os misterios da fé contidos ñas Escrituras. Quem possui tal tipo de dom, pode resolver problemas cotidianos e orientar o próximo no encaminhamento de sua vida.
Merece referencia também o discernimento dos espíritos malignos que estáo dentro das pessoas oprimidas; na base deste reconhecimento,
é praticado o exorcismo. O mesmo dom permite transmitir "avisos" da parte do Senhor; o crente antevé o que acontecerá aos irmáos e os "avi sa" de antemáo. Diz um depoimento: "Certa vez, avisei a tres pastores que eles iam perder seus cargos, pois eu podía saber, inspirada pelo discernimento, o que ia acontecer na vida deles. Nao me deram crédito e, mais tarde, eu soube que perderam mesmo os cargos". Eis ainda um depoimento impressionante:
"Os dons nascem com a pessoa; a pessoa é o aparelho. Desde crianga tenho revelagdes. Tenho os dons de cura, revelagáo, evangelizagao e línguas. Urna vez vi um irmáo em um caixáo e 3 dias depois ele morreu. Tenho ganho muitas almas - é o dom de evangelizar, dom da palavra. Prego na feira. Urna vez, pregueipara umpreto mendigo e disse para ele orar, que Deus indicaría a maneira dele deixar de pedir e daría iniciativa para ele arranjar trabalho e que ele seria curado. Urnas semanas depois, o preto estava curado e com urna banca de Bombril na feira. O dom de
cura é maravilhoso porque, com o poder de Jesús Cristo, sabemos que vai curar. Orel por um surdo e ele está curado. Orei por urna fazendeira com cáncer, curou e toda a familia está na igreja. Oreiporuma muiherque estava grávida e a crianga morreu no ventre; ela precisava operar para tirar a criancinha morta, mas nao tinha dinheiro. Orei e depois a crianga comegou a se mexerno ventre déla e um mes depois a crianga nasceu viva.
O dom de revelagáo pode ser dormindo ou acordado; por ele se vé um perí-
go que vaipassar. Odom de evidencia (videncia, provaveimente confundido com discemimento de espíritos) vé urna pessoa com espirito do demonio, comdoenga. Nao existe um dom mais importante que outro" (ob. cit, p. 144). Sao estas as principáis características da Assembléia de Deus e das correntes congéneres. No fascículo seguinte de PR consideraremos as idéias-mestras da Igreja Universal do Reino de Deus. 414
Quem foi?
FREI DAMIÁO DE BOZZANO
Em síntese: Frei Damiao de Bozzano foi um missionárío capuchinho benemérito por seu abnegado trabalho pastoral nos Estados do Nordeste durante mais de setenta anos. Contra a sua tática pastoral levantase a objegáo de que era antiquado, pois muito falava do pecado e do demonio. Na verdade, a pregagao da Igreja hoje em dia, sem negar o pecado e a
existencia do demonio, muito enfatiza o amor e a misericordia de Deus. É de notar, porém, que Frei Damiáo conseguiu afervorar o povo que o ou-
via, levando numerosos fiéis e infléis a urna vida de piedade e fidelidade a Cristo; este éxito era devido nao somente a palavra do missionárío, mas também ao fato importante de que Frei Damiáo pregava por seu teor de vida simples e pobre, mais voltada para o próximo do que para si. Nao se pode deixar de reconhecer o heroísmo desse abnegado arauto do Evangelho. *
Aos 31/05/97 faleceu em Damiáo de Bozzano. Era muito teou muito sentidamente a sua trovertida nao do ponto de vista
*
*
Recife o conhecido frade capuchinho Frei estimado no Nordeste, onde o povo pranmorte. Todavía a sua figura tem sido con moral, mas no tocante as táticas pastorais
e á pregacáo que o caracterizavam. Eis por que se faz oportuno tecer comentarios a respeito.
OBJECÓES E PONDERACÓES 1. Os jomáis fizeram eco á concepcáo popular que tornou Frei Damiáo quase um mito, comparando-o ao Padre Cicero Romáo Batista (t 1934) de Juazeiro do Norte (CE) e a Antonio conselheiro. Esta aproximacáo é inadequada; deturpa a imagem de Frei Damiáo. Este foi sempre um missionário fiel á Igreja, despretensioso e abnegado de si. Ele mesmo dizia que nao quería ser comparado ao Pe. Cicero, porque este sacerdote teve problemas com a autoridade da Igreja, ao passo que Frei Damíáo sempre manteve absoluta fidelidade á Igreja, como
auténtico capuchinho ou auténtico filho espiritual de Sao Francisco. O grande sucesso de Frei Damiáo se deve paradoxalmente á sua simplicidade, á sua pobreza, ao seu desapego... Em última análise, os
valores do ser falam muito ao grande público. A palavra de Frei Damiáo poderia ser cha e rude, mas era inflamada de fé e zelo apostólico ou de interesse pela salvacáo das almas. Era precisamente isto que a tornava 415
32
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
persuasiva e penetrante. Já os grandes oradores latinos da antigüidade diziam que a eloqüéncia convincente nao está na verbosidade, mas no calor com que alguém fala1. Tal era, por certo, o caso de Frei Damiao.
Nao há dúvida, o povo tende por vezes a exagerar as suas impressóes. Daí a necessidade de se fazer o descontó de tais exageras, sem se perder a consciéncia dos valores representados por Frei Damiao. 2. A imprensa chamou a atencáo também para o pretenso poder taumatúrgico de Frei Damiao. Terá feito milagres em vida, como refere o JORNAL DO BRASIL em 1B/6/97, p. 7:
«Para o povo nordestino, a santidade de Frei Damiao era provada por seus milagres, nunca reconhecidos pela Igreja. Em 1991, o Instituto
de Teología do Recite catalogou 80 relatos de milagres que Ihe foram atribuidos. Há quem diga que elejá fez chover sobre térras estorricadas e com um simples toque de mao curou enfermos. Diz a literatura de cordel aínda que quem duvidasse das palavras do padre capuchinho seria castiga do. Foi o caso de um homem de Católe do Rocha, na Paraíba, que decidiu zombar do Freiencolhendo a boca em um gesto de desdém. Resultado: sua boca ficou torta para sempre, mesmo reconhecendo o erro aos pés do Frei». Quem lé tais noticias, nao tem obrigagáo de Ihes dar crédito, pois a imaginacio popular é fecunda. Nem é necessário que alguém faca mila gres para ser tido como Santo; os milagres sao algo de acidental na cami-
nhada para Deus. Muito mais importante é o fato de que Frei Damiao dedicou 76 anos de sua vida as missoes do Nordeste, percorrendo regióes flageladas pela seca e pregando o Evangelho. Diz ainda a imprensa ao falar de Frei Damiao no fim de sua vida:
«Entre urna recaída e outra, no entanto, Frei Damiao surpreendia os médicos com sua vltalidade para se recuperar. Días depois das visitas
hospitalares, o frade retomava sua rotina normalmente: acordava ás2h30 e rezava até 5h, quando celebrava a primeira missa. Das 8h30 ao meio-
dia e das 14h as 18h, ouvia confissdes. Ás 19h, pregava sermóes que só terminavam depois das 21h. Nao sei o que este homem tem. Ele é um milagre permanente, resumiu Frei Femando, certa vez» (ibd). 3.0 missionário pregava certezas, como se tem dito: Deus é Deus, 0 valor primeiro, o Ser Supremo, que nos criou para gozarmos da sua bem-
aventuranca; o pecado é coisa feia, é o pior mal que alguém possa cometer, pois afasta de Deus o pecador. Afinal, o que todos os ouvintes de um prega-
dor querem ouvir, sao certezas a respeito de pontos fundamentáis, e nao teorías ou hipóteses complexas que nada deixam de claro e construtivo.
1 Sao palavras de Quintiliano (f 95), o famoso mestre romano de eloqüéncia: "Pectus est quod disertos facit, et vis mentís. - O coragáo e a sólida convhgao é que tornam os
homens eloqüentes"(Inst. ora. 10,7,15).
416
FREÍ DAMIÁO DE BOZZANO
33
4. Verdade é que Frei Damiáo falava muito do demonio e do inferno. Hoje a tendencia dos pregadores é um tanto diversa; preferem talar sobre o amor e a misericordia de Deus. Todavía o modo de falar do velho missionário corresponde as verdades do Credo; o Evangelho ensina que existem o demonio e o inferno. O estilo da pregacáo moderna é muito válido, contanto que nao silencie verdades essenciais do Credo. E certo, porém, que, assim como Frei Damiáo podia exagerar em seu tom auste
ro o pregador contemporáneo também pode exagerar, dando a crer que
Deus é um Pai bonacháo, capaz de pactuar com o pecado e os desvíos moráis, o que é falso. Como quer que seja, é muito acertado propor um
Cristianismo como convite de Deus á vida e á felicidade, sem omitir o
tema "pecado", mas também sem comecar pelo medo e o apavoramento. É de notar ainda algo de muito importante: no século passado e em épo cas anteriores, a linguagem usada por Frei Damiao contribuiu para formar muitos Santos, para estruturar as familias e a sociedade; donde se deduz que nao se devem julgar os homens e as mulheres de outrora com os criterios dos tempos atuais, como se partissem das mesmas premissas que hoje estáo em uso.
5. Fala-se muito da canonizacáo de Frei Damiáo; dizem os fiéis que era um Santo e que tem de ser proclamado tal mediante a canonizacáo. A propósito convém observar, antes do mais, que canonizar é colo
car um nome no canon ou no catálogo dos Santos da Igreja. Este proce-
dimento nao faz o Santo em sua realidade íntima, mas supoe a santidade.
- Ora nao se pode duvidar das virtudes do missionário capuchinho; mas
nao basta o vozerio popular para se proclamar oficialmente que alguém é santo. Para chegar a tal resultado, a Igreja realiza investigacóes precisas
e prolongadas, isto é, examina os escritos da pessoa tida como santa, ouve testemunhas que tenham convivido com ela e, principalmente, aguar da um sinal de Deus, ou seja, um milagre devidamente examinado e reconhecido por peritos. Caso tal portento ocorra mediante a intercessáo postuma da pessoa em foco, a Igreja julga ter base para crer que foi Deus quem o fez, a fim de testemunhar a santidade do(a) servo(a) de Deus. A primeira etapa de tal processo é a chamada "Beatificacáo", que ocorre
após o primeiro milagre auténticamente comprovado; a segunda etapa é
a "Canonizacáo", que tem lugar após um segundo milagre. O processo de Beatificacáo nao comeca logo após a morte da pessoa; aguardam-se cin co anos depois de falecida para abrir tal processo, que investiga os docu mentos da apregoada santidade.
Em suma, o povo de Deus pode dar gracas ao Senhor por ter Ele suscitado a figura apostólica de Frei Damiáo, rico de fé e de zelo missio nário em nossos dias. Possa o testemunho do abnegado capuchinho frutificar amplamente ñas térras do Brasil! 417
Clamor significativo:
DE "REÍ DO ABORTO" A DEFENSOR DA VIDA Em síntese: O Dr. Bernard Nathanson chegou a ser considerado "o Rei do Aborto". Praticou cinco mil abortamentos numa clínica que realizava cento e trinta operagóes desse tipo por dia. Aos poucos foi conceben-
do o horror de suas práticas. Dejudeu ateu que era, tornou-se católico, havendo sido batizado pelo Cardeal O'Connor, arcebispo de Nova lorque, aos 9/12/96. A trajetória do Dr. Nathanson é brevemente relatada ñas
páginas subseqüentes.
♦
*
*
O Dr. Bernard Nathanson tornou-se famoso pela prática do aborto. Eis, porém, que, após um total de cinco mil abortamentos aproximada
mente, tomou consciéncia do valor da vida humana e resolveu abandonar
sua prática abortista. Judeu e ateu, foi-se aproximando do Catolicismo ate receber o Batismo aos 9/12/96. A seguir, váo relatados alguns traeos
de sua carreira de médico e religioso.
1. AConversáo
O Dr. Bernard Nathanson, médico judeu norte-americano, foi cha mado "o Rei do Aborto". Ele mesmo escreveu: "Ninguém tem mais expe riencia de abortamentos do que eu". Fundou em 1969 a Liga Nacional do Direito ao Aborto (NADAL), para fazer propaganda em favor da legalizacáo oficial da interrupeáo da gravidez. Por meio da propaganda nos meios de comunicacáo social procurava influenciar a opiniáo pública. "A partir de 1871 - escreve ele - dirigí a maior Clínica abortista do mundo. Tmha dez salas de operagáo e trinta e cinco médicos as minhas ordens. Realizávamos cento e trinta abortos por dia, mesmo aos domin gos. Só nao trabalhávamos no dia de Natal. Tenho de confessar que foram praticados, as minhas ordens, sessenta mil abortos. Eu, pessoalmente, fiz uns cinco mil".
Aos poucos, porém, o Rei do Aborto foi-se compenetrando da gravidade do que cometía; estava matando enancas inocentes. E foi-se eno
jando do seu trabalho.
Ao perceber a hediondez do aborto, Nathanson comecou a questi-
onar a sua própria vida. Pensou em suicidar-se nao só por causa dos múltiplos enmes que cometerá, mas também por causa de sua vida pregressa: fizera tres casamentos fracassados; nao fora bom pai com seu filho José, que estava com trinta e um anos; havia feito o aborto até 418
DE "REÍ DO ABORTO" A DEFENSOR DA VIDA
35
de um filho seu. Declarou ele: "Eu sentía como a carga do pecado se tornava mais pesada e angustiante".
Até 1980 foi um judeu ateu. Em 1980 comecou a voltar para Deus. Escreve Nathanson:
"Persistentemente, amorosamente, desinteressadamente rezavam
por mim, e nao tenho a menor dúvida de que tais oracóes foram atendi das. Pensando ñas pessoas que o fizeram, muitas délas desconhecidas para mim, meus olhos enchem-se de lágrimas".
Comecou entao Nathanson a ler os testemunhos de pessoas con
vertidas á fé católica. Leu e releu a biografía de Malcom Muggeridge, Walter Percy, Graham Greene, Simone Weil, Richard Gilman, Pascal e Cardeal John Henry Newman.
Durante um ano assistiu aos Cursos de Ética no Instituto Kennedy, da Universidade de Georgetown, e comecou a conversar com freqüéncia com o sacerdote John Me Closkey do Opus Dei. Diz Nathanson:
"Ele soube que eu estava-me aproximando do Catolicismo. Procurou-me e pusemo-nos a conversar semanalmente. Veio á minha casa e
trouxe-me material para ler. Guiou-me pelo caminho que me conduziu aonde estou agora. Devo a ele mais do que a qualquer pessoa". Finalmente aos 9/12/96 recebeu o Batismo das máos do Sr. Arcebispo de Nova lorque, Cardeal O'Connor, na catedral de Sao Patricio. Pouco depois, num día de manhá, em Missa simples, da qual participaram cerca de vinte e cinco pessoas, o próprio Cardeal ministrou-lhe a Crisma e deu-lhe a Primeira Comunháo. Eis o depoimento do convertido: "Quando aceitas Cristo, nada perdes. Eu continuo a serjudeu étnica e culturalmente. Orientando a minha vida para Cristo, nao sinto sujeigáo a coisa alguma, nem a quero sentir. Havia convertido a minha vida num caos; ninguém podía ter procedido pior. Agora estou ñas máos de Deus". Com setenta e um anos de idade, Nathanson quer resgatar o tem-
po e compensar o mal que cometeu. Exerce suas funcoes de ginecologista em zonas pobres, dentro e fora dos Estados Unidos; percorre varios países como a Espanha e Portugal ensinando a respeitar a vida humana. Editou um vídeo em que mostra o feto a estremecer no seio materno por causa das dores que senté quando Ihe aplicam o fórceps para o extrair. Escreveu também alguns livros, entre os quais urna autobiografia intitulada "A Máo de Deus". Nesse livro declara:
"Fracassei em tres casamentes e tenho um filho que é ressentido e desconfiado, aínda que brilhante na ciencia dos computadores. Tenho urna bagagem moral táo pesada que, se a levasse para o outro mundo, eu me condenaría por toda a eternidade, talvez de maneira mais aterradora do que aqueta que o poeta Dante descreve na sua Divina Comedia". 419
36
TERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
■
Termina seu livro autobiográfico sem jamáis ter justificado o seu
comportamento anterior e exprimindo confianca na misericordia divina,
no perdáo de Deus e na salvacáo que vem de Jesús Cristo por intermedió
da Igreja Católica:
"Alguém morreu pormeus pecados e minha maldade há dois milanos.
O Deus do Novo Testamento surgiu diante de mim como urna figura amável, magnánima, incomparavelmente tema, em quem eu podía procurare encon trar o perdáo que tinha buscado táo desesperadamente durante tanto tempo". Antes de seu Batismo, dizia: "Ficarei livre do pecado. Pela primeira
vez na vida, sentirei o refugio e o calor da fé".
O depoimento do Dr. Bemard Nathanson sugere algumas ponderacoes. 2. Refletindo...
Os dizeres e a vida de Nathanson podem inspirar seis tópicos de
reflexáo.
1) A ciencia em nossos dias sabe com certeza que o feto é um ser humano; é sujeito de direitos, entre os quais o direito á vida. Nao se pode dizer, como outrora, que a animacáo ou a hominizacáo se dá quarenta ou oitenta dias após a conceicáo.
2) A ciencia sabe também que o aborto é um homicidio, e um homi cidio bárbaro, cometido contra um inocente. A este sao aplicados méto
dos mortíferos que nem aos prisioneiros dos campos de concentracáo nazistas eram aplicados.
3) A graca pode atuar em qualquer pecador, levando-o ao arrependimento e á conversáo. Diz Sao Joáo: "Tranquilizaremos o nosso cora cáo, se o nosso coracáo nos acusa, porque Deus é maior do que o nosso
coracáo" (1 Jo 3,19s). Deus é o Pai que recebe de bracos abertos o filho
sinceramente arrependido e o coloca em seu lugar de filho da casa ou de cidadáo do Reino dos céus (cf. Le 15,20-24).
4) O judeu que se faz cristáo, nao deixa de ser judeu, pois Jesús Cristo e o Messias prometido a Abraáo e á sua descendencia É lógico que um judeu se torne cristáo, visto que o judaismo é essencialmente a
expectativa do Messias. Jesús provou que era e é o Salvador aguardado pelos Profetas e pelo povo de Israel.
_ 5) É de grande valor para todo ser humano (especialmente para o
cnstao) ler o itinerario religioso dos antepassados convertidos, como fez Nathanson. Sao manifestacóes da multiforme graca de Deus e desse singu lar amor de Deus as suas criaturas, por mais frágeis e pecadoras que sejam.
6) Á semelhanca de Nathanson, o cristáo se empenha pelo repudio
ao aborto que ameaca o povo brasileiro, consciente de que a nacáo que mata seus filhos se condena a sofrer as conseqüéncias da criminalidade 420
Debate candente:
O ENSINO RELIGIOSO E A
CONSTITUIQÁO DO BRASIL por D. Lourenco de Almeida Prado O.S.B.
Em síntese: D. Lourenco de Almeida Prado, Reitor do Colegio Sao Bento, defende o ensino religioso ñas escolas públicas como sendo um direito dos cidadáos, que o Estado democrático deve respeitar. Negar o ensin'o religioso equivale a violar o direito, das familias brasileiras, de escolher o tipo de educagáo que desejam para seus filhos, sendo aínda de notar que a escola pública é financiada pelo dinheiro da populagáo que paga seus impostes. *
*
*
Reproduzimos, a seguir, o artigo "Ensino Religioso e a Constituicáo" da autoría de D. Lourenco de Almeida Prado, Reitor do Colegio Sao Bento, do Rio de Janeiro, publicado no jornal O GLOBO aos 2/6/1997. A
razáo dessa reproducáo é a grande repercussáo que o artigo teve na opiniáo pública, merecendo o apoio de autoridades diversas.
ENSINO RELIGIOSO E A CONSTITUICÁO «Os psicólogos que expliquem, eu apenas constato. Nao há ninguém que reclame mais pelos direitos humanos que o bandido assassino encarcerado. Reclama da comida; reclama da superlotacáo, como se ele mesmo nao fosse um contribuinte para ela. Dizia Saldanha que o penetra
era sempre o que, na frente, o primeiro, protestava contra o excesso ines perado de gente na festa. Nao há também ninguém mais veemente no zelo pela liberdade pessoal e pela neutralidade estatal que o esquerdista totalitario. Sobretudo em relacáo ao ensino religioso ñas escolas públicas. O problema do ensino religioso tem sido objeto de viva controver sia, em que opinioes, as mais variadas, discordantes e, nao raro, vee-
mentes e apaixonadas, tém sido apresentadas, tanto em relagáo á sua natureza e ao seu conteúdo educacionais, como em relacao á sua posicao jurídica diante da Constituicáo é da lei. Isto prova, ao menos, que a
materia nao é lateral. Apaixona, porque mexe com o cerne da vida huma na. Aristóteles diz que o homem é um ser social e político. Podemos dizer
também que o homem é um animal religioso.
O questionamento religioso é a própria indagacáo fundamental desse ser curioso e inquiridor que nao só é movido, por admiracáo ou espanto, a 421
38
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
querer conhecer o mundo exterior, que o rodeia e no qual vive como que
¡merso, mas é movido também, e com mais vital empenho, a desvendar o segredo de si mesmo, de sua vida. Quem ou o que sou eu? Para que vivo? Qual o sentido da minha vida? Essa busca profunda e envolvente é a própria vida religiosa. Religioso é quem reconhece Deus, mas é tam bém quem o nega. Berdiaef já, há mais de 50 anos, chamava nossa atencáo para o fato de que o marxismo materialista, pela feicao totalitaria da concepcáo de vida, constituí urna tomada de posicáo religiosa. Religiáo nao apenas sem Deus, mas contra Deus.
Voltemos, porém, ao nosso problema brasileiro, embora nao deixe-
mos de atentar que, por ser brasileiros, nao deixamos de ser, antes de
tudo, pessoas humanas. Como nascido nesta térra, desta gente (pode mos dizé-lo com o romano), sou brasileiro; como natureza humana, sou cidadáo do mundo. Ou cidadáo do céu, como diz Sao Paulo.
A confusa e confutante Lei de Diretrizes e Bases da Educacáo retira do poder público o direito de cumprir seu dever de manter, isto é, custear o ensino religioso ñas escolas públicas. Para justificá-la, o parecer n9 5/ 97, do Conselho Nacional de Educacáo, invoca o artigo 19 da Constituicáo, que veda á Uniáo, aos Estados e aos municipios estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los...
No mundo pluralista em que vivemos, a posicáo nao só é a melhor, mas é a mais capaz de salvar o principio que manda dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus (Mt 22,21). Nao é preciso ser muito
arguto para perceber que nao é de construir igrejas e sustentar cultos que se trata. Trata-se do dever, do Estado, de proporcionar aos cidadáos, como
gerente do dinheiro que vem do povo e é do povo, o servíco da educacáo de acordó com seus desejos e aspiracoes. E a tarefa do Estado na edu cacáo (como no servico de saúde) nao é determinar e impor esta ou aquela educacáo, mas proporcionar recursos para que a familia escolha a edu
cacáo que deseja.
Isto, evidentemente, nao pretende significar que a familia saiba sem-
pre optar pela melhor educacáo, mas, a um tempo, reconhece a sua primazia, por razáo biológica, e suscita a diversificacáo libertadora, evitando o monopolio estatal, que sempre gera tiranía. A nossa LDB, marcada pelo
estatismo esquerdizante, nao reconhece ¡sso. Apesar da lei tendenciosa, a liberdade escolar é um dos direítos inalíenáveis do ser humano, consa grado pela Declaracáo Universal dos Direítos do Homem e acolhida por nossas leis anteriores e, para quem souber ler, até pela nossa Constituicáo. O artigo da Constituicáo que cabe ser invocado a respeito, nao é o de n° 19, mas o que trata da educacáo, seja o ítem II, do artigo 206 (alias repetido pela LDB, no artigo 39), que coloca como um de seus principios "a liberdade de aprender".
422
O ENSINO RELIGIOSO E A CONSTITUIgÁO DO BRASIL
39
Construir templos é vedado ao Estado, proporcionar recursos para
que haja igualdade de condigóes (outro principio do artigo 206), e cada um tenha a liberdade de escolher a educacáo que prefere, é outra coisa. Costuma-se justificar a posicáo contraria alegando a neutralidade do Es tado laico. Que neutralidade é essa que nega? Que neutralidade é essa que se coloca no extremo do contra? Que neutralidade é essa que priva da liberdade e do direito de aprender? A materia é seria, mas permitimonos urna comparacáo, que parecerá jocosa para quem nao tem ouvido sutil para entender analogías. Ela nos ajudará, com o jogo da semelhan9a, de um modo mais palpável, a por a descoberto o equívoco dessa neutralidade. Imaginemos que, na oscilacáo hodierna entre Mercosul e
Alca, surgisse um ressentimento internacional. Nessa situacáo, se o Bra sil determinasse a obrigatoriedade do inglés, desagradaría aos sul-americanos; se o fizesse em relacáo ao espanhol, os ressentidos seriam os americanos. Para sair dessa, sem melindrar urna das partes, duas solu-
cóes seriam aventadas; numa, o Estado, sem impedir as escolas de ensinar urna língua, negaría recursos para isso; noutra, o Estado nao tomaría partido, mas nao fugiría ao encargo de custear a que fosse escolhída pelos educandos. Perguntamos: onde, nessas duas hipóteses, está a plena neutralídade? Certamente, na segunda hípótese, na qual nao tomaría partido por esta ou aquela, mas habilitaría cada um a ter a liberdade de escolher. Na primeíra hípótese, assumíria a posicáo contra, poís fechava ambos os lados da alternativa. É esta a posicáo da LDB, em relacáo ao ensino religioso. Nao é neutra; é contra. E o contra, no caso.náo é sim ples omissáo; é tomar a posicáo religiosa antiteísta. E esta estranha neutralidade, que fecha alternativas, se torna mais chocante e injusta quando os seus propugnadores, nao raro professores
universitarios, nao aplicam a mesma medida em relacáo ao materialismo marxista ou á religiáo antiteísta. Nega-se ao aluno o aprendizado da sua religiáo, da religiáo a quem já é adepto; e nao se senté o menor constrangimento de impingir aos alunos, sem advertencia previa e com desleal intencáo
catequista e proselitista, o materialismo contra Deus. Aqueles é negada a
liberdade de pedir, a este é permitido inocultar ou conscientizar o que o "mestre" (ou o partido) pensa. Useí a palavra desleal. Ela se ajusta bem ao caso.
Os antigos romanos - Cicero ou Juvenal - conheciam as virtudes que aprimoram a justica ñas relacóes humanas entre desiguais, como é o caso da relacáo professor e aluno. "Á enanca se deve reverencia", dizia Juvenal. Outros falam do respeito. Na nossa linguagem moderna, temos urna palavra mais viva: ao educando se deve lealdade. Impor ao aluno, á sua revelia, urna concepeáo de vida, conscientizá-lo, é urna deslealdade, um crime con
tra a justica. Reconhecer-lhe a liberdade e o direito de aprender a sua reli giáo (digo, a sua religiáo, nao urna religiáo qualquer) é ser justo com ele". Ver a propósito PR 419/1997, pp. 161-166. 423
Emergem do silencio:
DOIS DEPOIMENTOS DE UM CONFESSOR DA FÉ
A colonia rumena nos Estados Unidos publica um boletim paroquial (Buletinu Parohiei) em Alexandria, VA 22302, que traz noticias da vida dos cristáos rumenos. Sao ortodoxos em maioria, separados da Sé de Roma, mas ardorosos em seu testemunho de fé. O n9 5 do volume VIII (maio de 1997) desse Boletim oferece ao leitor o depoimento de um sa cerdote rumeno anónimo que passou pelas prisoes do comunismo em sua patria. Atualmente vem á tona o heroísmo desses arautos silenciosos do Evangelho, que falaram e falam por sua conduta corajosa e fiel ao extremo mais do que por suas palavras. Será de interesse dos amigos de PR conhecer as experiencias desse sacerdote por ele mesmo relatadas.
A VIDA NO CÁRCERE 1. "Cristo Ressuscitou!"
«A seguirte experiencia teve lugar em domingo de Páscoa.
Ás sete da manha, os guardas da prisáo mudavam de turno. Eu
estava ¡solado dos outros prisioneiros, numa cela sem janelas, sem cama
(além de urna tábua que, de dia, era levantada e apoiada na parede), submetido a urna exterminacáo lenta. No momento quando a porta da cela se abria, os prisioneiros eram obrigados a se levantar, virar a cara para a parede, e ficar assim até escutarem a porta da cela se fechar. Naquele dia de Gloria a Jesús, nao virei a cara para a parede, mas olhei o guarda fixamente nos olhos - era um dos mais cruéis, o terror da secao de isolamento - e disse-lhe: 'Cristo Ressuscitou!'.
As minhas palavras o golpearam como um chicote. Olhou-me por
um momento com espanto, virou para o corredor onde estavam os outros
guardas do turno, virou-se para mim novamente e respondeu-me: 'É verdade que ressuscitou!'
Por minha vez, eu também fiquei golpeado pela sua resposta, mas de outra maneira: sabia, sentía que nao ele me respondeu, mas um anjo de Deus. Era o anjo que falou ás mulheres: 'Vos nao temáis, porque sei
que procuráis a Jesús que foi crucificado; ele já nao está aquí, por que ressuscitou como tinha dito; vinde e vede o lugar, onde o Senhor estava posto' (Mt 28,5-6)».
424
DQIS DEPOIMENTOS DE UM CONFESSOR DA FÉ
41
2. Os Trabalhos Focados
"A última experiencia aconteceu quase um ano e meio depois, tam-
bém na prisáo de Aiud. A administracáo da prisáo quería obrigar-me a
trabalhar na cela. Recusei, porque negava ao regime comunista extermi-
nador de um povo inteiro o direito de me encarcerar e de me torturar. Responderam-me que eles tinham meios de me forcar a trabalhar. Cum-
priram a promessa deles. Um certo dia, trouxeram á minha cela dois detentes de direito comum, criminosos sádicos; um deles tinha matado a própria máe. Devíamos trabalhar em equipe e cumprir a norma. Se a nor
ma nao fosse cumprida, a equipe inteira seria punida. Aqueles dois devia-
se-lhes cortar os pacotes da familia, reduzir a porcáo de comida, etc. As
punicóes nao me estavam atingindo, porque eu de nenhuma dessas van-
tagens me beneficiava, trabalhando ou nao. A situacáo foi bem pensada pela administracáo da prisáo. Os dois detentes pediram-me que traba-
Ihasse e cumprisse a norma: se nao, iria apanhar e mesmo ser morto, porque a administracáo da prisáo Ihes dera essa ordem. Expliquei-lhes a minha posicáo, a minha recusa e os motivos da recusa. Nao compreenderam. Quando veio o guarda, pedi-lhe nao condicionar a situacáo dos meus colegas de cela á minha recusa de trabalhar, porque nunca trabaIharia para um regime que serve a Satanás e nao a Deus. O guarda me assegurou que iria mudar de atitude muito em breve. Os dias se passaram no terror; aqueles dois criminosos estavam-
me ameacando, me insultando, algumas vezes me brutalizando (nao demais), tentando-me fazer desistir da minha decisáo. Recusei. Entáo me ¡solaram, interditando-me talar, comer ou ir á privada; fazia-o somente quando eles me permitiam. Nao tinha o direito de orar de modo visível para eles. De vez em quando, eram chamados á Direcáo da prisáo e voltavam á cela profundamente perturbados e mais furiosos. Estou certo de que se Ihes imputava a vacilacáo de me matar, mas eles continuavam a hesitar.
Alguns meses depois, os dois me avisaram que tinham decidido nao mais me terrorizar ou matar e que, daí em diante, poderia fazer o que quisesse na cela, com respeito a minha vida de presbítero. A minha surpresa foi enorme e a alegría ¡ndescritível: em vez de morte, tinha o direito de celebrar a Santa Missa. No Domingo seguinte, fiz todos os preparati vos para celebrar a Missa. Os dois colegas estavam-me olhando com curiosidade. Eles conheciam poucas coisas sobre a fé e tanto menos so
bre a Missa. No inicio, tive a impressao de que me consideravam urna
especie de mago e que o que eu estava fazendo era parte de um ritual mágico, porque um fiel nao sabe o que está fazendo o presbítero no Altar (atrás da Iconostase). Aos poucos o ambiente de oracáo se instalou, o 425
42
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
meu ardor religioso os envolveu de todas as partes. Tlnha aprendido a Missa de cor, sabendo que ia ser preso. Nao tinha vinho, mas tinha pao e
agua e considerava que, durante o servico, Jesús transformaría a agua em vinho. Depois do momento da eplclese e das respectivas oracoes, quando me voltei para eles para dlzer-lhes: "Pace vouá" (Pax vobiscum)!
os vi ajoelhados, cheios de luz e entáo me dei conta de que a cela inteira estava inundada da luz pascal que tinha visto quando o guarda me res-
pondeu: É verdade que ressuscitou!
Talvez a luz nao criada enchesse a nossa cela desde o inicio da Missa, ou talvez, exatamente no Instante da transubstanciacáo, a luz de Jesús tenha jorrado das Santas Especies e nos ¡lumlnou. O restante do día, passei-o em silencio, em oracáo e mesmo em
amor crístico.
No dia seguinte, os dois colegas foram retirados da cela e nunca
mais os encontrei".
Quero dizer a Deus que..., pelo Pe. Orlando Gambi. - Ed. Santuario
Aparecida (SP) 1997, 105 x 175mm, 172 pp.
O autor é um missionário redentorista, já famoso por obras anterio
res, que em estilo simples dizem verdades profundas. Desta vez oferece
ao público urna coletánea de oragoes que ajudam a rezar numa linguagem muito viva e concreta. Eis alguns de seus títulos mais significativos"Quem és Tu e quem sou eu", "Podes o que nao posso", "Rezo por quem nao reza", "Tudo está em Tuas máos", "Dá-me paciencia"... O autor confessa o propósito do seu livro á p. 5:
"Prepare! este livro pensando no que vocé gostaria de dizer a Deus
em certos dias. Procurei imaginar suas alegrías e tristezas. Nao todas
Algumas. Procurei imaginar seu coragáo, as vezes cantando e confiando
as vezes pedmdo e agradecendo. Creía que Deus nunca falha e nao sé deixa vencer em generosidade.
Na verdade, com Deus todo o bem é possível. Sem Deus nenhum bem permanece! Aprenda a rezar com fé e humildade para que Deus o entenda e atenda!".
O livro poderá fazer grande bem a todos os cristáos, visto que orar
nem sempre e fácil á natureza humana, muito atraída pelos bens visíveis. E. B.
426
Vem do Japáo:
QUE É A MORALOGIA?
Em síntese: A Moralogia, fundada pelo mestre japonés Chiruko
Hiroike, propóe urna Ética sadia e válida. Todavía as mesmas propostas e aínda mais grandiosas perspectivas de crescimento espiritual se encon-
tram na Moral católica. Esta é baseada no amor de Deus, que primeiro nos amou (cf. Uo 4,19) e que pede resposta condigna, ao passo que a
Moralogia é assaz imprecisa no tocante ao conceito de Deus e ao valor da religiáo. O mestre japonés coloca no mesmo plano Jesús Cristo, Sócrates,
Buda, Confúcio e Amaterasu Omikami; ora o paralelismo entre Jesús e outros sabios é inaceitável a um cristáo, que vé em Jesús "o Verbo eterno
feito carne" (Jo 1,14); ademáis Jesús pregou o monoteísmo (há um só Deus Criador do mundo e do homem), ao passo que Buda pregou o
panteísmo (Deus, o mundo e o homem se identificariam entre si). *
*
*
A Moralogia, oriunda do Japáo, tem-se expandido por varios paí ses, inclusive o Brasil, onde tem sede nacional em Sao Paulo. Apregoa urna Ética coerente com os bons principios da lei natural, mas deixa dúvidas quanto as suas crencas religiosas. Daí a conveniencia de examinarmos atentamente os documentos da Moralogia, entre os quais se destaca a "Introducáo á Moralogia", publicada pelo Instituto de Moralogia. Além de tal obra, nos nos serviremos, ñas páginas seguintes, do fascículo "Nova Moral" editado pelo mesmo Instituto. 1. Origem da Moralogia
O fascículo "Nova Moral" em sua 39 capa relata:
«A Moralogia nasceu através das amargas experiencias de grave doenca do Prof. Hiroike, por volta de 1912, logo após a outorga do título de Doutor em Direito pela Universidade Imperial de Tokyo, com a tese intitulada Estudo das leis parentescas da antiga China. Apesar desse título honorífero, ele estava entre a vida e a morte como conseqüéncia de
diversos anos de arduos estudos, e conscientizou-se da diferenca entre o
sucesso na vida e a felicidade na vida. A partir desse momento, ele decidiu abandonar tudo que possuia, e oferecer-se em prol da felicidade de toda a humanidade. Assim, mesmo em estado doentio, dedicou-se a pro
fundos estudos sobre as ciencias moráis, humanas e sociais. Ele chegou
á conclusáo entáo de que a crescente desvalorizado da moral perante a 427
44
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
sociedade, era devida, principalmente, ao tato de nunca terem sido de monstrados os efeitos da prática da moral. O Prof. Hiroike sentiu entao que era necessário um estudo racional e científico sobre a moral, e entregou-se inteiramente ás pesquisas nesse campo, formulando as bases de urna nova ciencia, que veio a se chamar moralogia.
Essa nova forma de Educacáo Social lancada pelo Prof. Hiroike é baseada no amor supremo dos Mestres da Humanidade, e visa orientar
corretamente a atitude mental e a conduta de cada um, em nossa vida dia ria, para a realizacáo da paz, felicidade e desenvolvimento da humanidade».
O fundador da Moralogia, o Dr. Chiruko Hiroike, nasceu aos 29/3/ 1866 em Higashi Nagasoi (Japáo). Em 1885, com dezenove anos, conquistou o certificado de professor primario. Em 1902 era Professor Uni versitario de Gramática Clássica Chinesa. Em 1912 doutorou-se em Direito. Tendo adoecido gravemente, jurou dedicar-se de corpo e alma á salvacáo da mente humana. Em 1915 publicou a obra 'Templo de Ise e o Caráter Nacional", na qual esclarece o significado e a importancia de "Bene volencia, Tolerancia e Auto-Reflexáo", que passaram a ser o ámago da Mo ralogia. Em 1926 concluiu o texto da obra Tratado de Ciencia Moral", ficando esse ano estabelecido como data da fundacáo do Instituto de Moralogia. Pós-se a viajar pelo Japáo, proferindo conferencias sobre a sua filosofía de vida. Foi respeitado pelas autoridades govemamentais do Japao, ás quais explanou os principios da Moralogia. Finalmente, com 72 anos de idade faleceu em 1938 numa estancia de aguas termais próxima de Tanigawa.
Como se vé, as preocupacoes do fundador se voltaram muito mais
para a Etica do que para a Religiáo propriamente dita. Vejamos-agora quais sao 2. Os Principios da Moralogia
Lé-se no mesmo fascículo "Nova Moral", 3a capa, o seguinte:
«A Moralogia é o estudo da moral, que tem por finalidade incentivar a prática da suprema moral, e demonstrar, através de análise racional e científica, os efeitos da sua aplicacáo na vida humana. A Moralogia é a
palavra criada pela primeira vez pelo Prof. Chikuro Hiroike (1866-1938)
formada de Mos-Moris (costume, moral), do latim, e Logos-Logia (ciencia
estudo), do grego.
A suprema moral é o conjunto dos ensinamentos comuns encontra dos nos principios moráis e filosóficos legados ao mundo, através de cin
co grandes Mestres da humanidade:
Jesús Cristo, de Israel.
Amor
Sócrates, da Grecia
Justiga 428
QUE É A MORALOGIA?
45
Confúcio, da China
Clemencia
Buda, da india
Benevolencia
Amaterasu Omikami, doJapáo
Pureza»
1. Explicitando o ácima dito, podemos afirmar que a Moralogia dis tingue dois tipos de Moral: a M. Comum e a M. Suprema.
A Moral Comum prega bons costumes, etiquetas sociais, compaixáo gentileza, justica, paciencia, autocontrole, assiduidade... E indispensável á manutencáo e ao desenvolvimento de urna sociedade sadia. Todavia apresenta imperfeicóes, tais como a de cair em meras formalida des Assim, por exemplo, quem visita um doente, pode estar agindo por compaixáo e gentileza, mas também pode estar procedendo segundo mera formalidade, preocupado apenas com manter urna boa imagem perante
os outros. O egocentrismo pode estar prevalecendo, pondo em pengo os
interesses da própria pessoa e dos demais cidadáos.
A Moral Suprema respeita a Moral Comum, mas exige benevolen cia ainda que esta custe prejuízos a quem a pratica. Tal é a Moral dos cinco Sabios citados: Sócrates, Jesús Cristo, Buda, Confúcio, Amaterasu Omika
mi. A Moral Suprema acarreta beneficios para o individuo e para a socieda de, obtendo-lhes felicidade, alegría e harmonía na convivencia social
Os grandes temas da Moralogia vém a ser: Renuncia ao Egoísmo, Benevolencia, Cumprimento do Dever, Respeito aos Direitos Alheios, Gratidáo e Retribuicáo, Desenvolvimento e Salvacáo da Mente Humana. A Moralogia insiste muíto no Ortolinon1 ou serie de benfeitores antepassados que contribuiram para o desenvolvimento, a paz, a seguranca
e a felicidade do género humano, Há tres tipos de Ortolinon:
- o Ortolinon Familiar, que é a sucessáo dos ancestrais de alguém;
- o Ortolinon Nacional, que é a serie de benfeitores de urna na-
cáo. Em todo país, há urna figura que exerce a funcáo principal de unificar a nacáo e a quem se devem amor e respeito;
- o Ortolinon Espiritual, que é a serie de benfeitores da vida espi
ritual, como os Sabios que se dedicaram de corpo e alma á salvacao e ao desenvolvimento da mente humana; sao eles que ensinam a Moral Su prema.
Existe também o Co-Ortolinon, que sao pessoas vivas na Térra, a quem devemos favores: padrinhos, professores, fornecedores, clientes, educadores, economistas...
' Ortolinon é explicado como palavra composta do grego órthos, reto, correto, e linón, linha, fio. 429
I6.
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 424/1997
A Familia Imperial Japonesa goza de especial veneracao, pois se diz que, durante dois mil anos aproximadamente, cultivou Benevolencia
Tolerancia e Auto-Reflexao.
Os frutos da Moral Suprema sao a paz e a felicidade para todos os
que a praticam; isto favorece a saúde física e a longevidade dos seres
humanos; alias, o mestre Hiroike se interessou vivamente pela saúde
corporal dos seus seguidores a partir de 1936. É de notar que os moralogistas nao se referem á vida postuma; seus principios visam apenas á realizacáo do homem no mundo presente.
2. A respeíto de Deus a Moralogia apresenta um conceito confuso
que se exprime do seguinte modo:
«O universo em que vivemos está sempre em movimento ordena do, e essa realidade é a demonstragáo da existencia de uma lei. O globo
terrestre, que faz parte deste universo, bem como todos os seres que nele habitam, sao regidos inteiramente por esta lei. Nos, seres humanos nao podemos viver ignorando-a. A Moralogia denomina essa lei de "Lei da Natureza", eelaéa própria obra da natureza, que cría e desenvolve tudo e todos. A esséncia dessa obra é reconhecida como sendo Deus.
Em seguida, como podemos ver ñas historias e mitologías de diver
sos povos, o homem, desde a antigüidade, temía e venerava a obra da natureza, e rendía homenagens a Deus, expressando a gratidáo pela far
ta dádiva recebida. Esses fatos nos demonstram que reconhecer Deus é um requisito fundamental para o ser humano» (Introdugáo p.23). Pergunta-se: que significa "Deus é a esséncia da obra da nature za"? Seria uma afirmacáo panteísta, que identificaria Deus com a própria natureza que nos cerca? Pode-se crer que o autor do texto nao é panteísta pois pouco adiante no mesmo capítulo parece corrigir-se, caindo em cer
ta contradicáo:
"Na Moralogia, Deus representa o 'Deus Absoluto', que atua no universo, com significado mais ampio que os deuses venerados em parti cular por alguns povos ou religióes. Esse Deus, que cria e desenvolve todas as coisas, é de natureza universal" (Introdugáo, p. 24).
Neste texto, o autor fala de Deus Criador, o que corresponde ao
conceito monoteísta de Deus.
Á p. 27 da mesma "Introducáo", lé-se: "Na Moralogia Deus é considerado um Serpersonificado e a Lei da Natureza, a manifestagáo da Vontade Divina. Podemos dizer, portante
que Deus e um Ser superior aos Sabios, pois os próprios Sabios qué tanto veneramos, O reconheceram como um Serpersonificado. Assi'm ao personificarmos Deus, podemos perceber a sua esséncia, que é a de'cri430
QUE É A MORALOGIA?
47
ar e amar todas as coisas, e levamos urna vida virtuosa com muita convicgáo".
"Para a Moralogia, reconhecer e acreditar em Deus significa a rea-
lizagáo de benevolencia, com a mentalidade diariamente renovada e com sentimento de gratidáo e veneragáo a Deus". A Moralogia venera também os Sabios colocando Jesús Cristo no plano de Sócrates, Buda, Confúcio, Amaterasu Omikami. Esta relativizacáo nao corresponde ao conceito que os cristáos tém de Jesús Cristo; é inaceitável, visto que, para a fé crista, Jesús é Deus feito homem ou o Verbo feito carne (cf. Jo 1,14). Segundo a Moralogia, os Sabios admitiram a existencia de Deus; sao venerados por muitos como pessoas divinas (Intr.oducáo, p. 23).
Vé-se, pois, que o conceito de Deus nao é claramente formulado na Moralogia, o que alias corresponde á índole dessa Escola, que mais se importa com a Ética do que com a Teología propriamente dita. 3. Conclusáo
A Moralogia propóe urna Ética sadia e válida. Todavía as mesmas propostas e ainda mais grandiosas perspectivas de crescimento espiritu al se encontram na Moral católica. Esta é baseada no amor de Deus, que primeiro nos amou (Uo 4,19) e que pede resposta condigna. Para morigerar a si mesmo e construir urna sociedade harmoniosa, o cristáo nao precisa de abandonar a sua cosmovisao crista e filiar-se á escola de Chiruko Hiroike. Jesús Cristo ensinou um ideal de vida muito mais subli me do que o do mestre japonés.
De resto, o paralelo entre Jesús e Buda é inconcebível, já que Je sús pregou o monoteísmo (Deus é um só, Criador do mundo e do ho mem), ao passo que Buda professou o panteísmo (Deus, o mundo e o homem se identificam entre si). Sem dúvida, todo Credo religioso prega as mesmas normas básicas da lei natural; coloca-as, porém, em urna cosmovisao que pode variar de mestre para mestre. Estéváo Bettencourt O.S.B. *
*
*
Lectio Divina, pela Renovagao Carismática Católica. Colegáo Paulo Apostólo 7.-Ed. Santuario, Aparecida (SP), 1997, 140x210mm, 38 pp.
Eis mais um valioso manual que introduz o leitor na oragáo pessoal silenciosa, apresentando um método de leitura bíblica ou leitura espiritual comprovado por sáculos de experiencia nos mosteiros e atualmente di fundido com grandes vantagens no povo de Deus. O método compreende quatro etapas: leitura, meditagáo, oragáo, contemplagáo; quando obser vados os requisitos previos, produz copiosos frutos de uniáo com Deus. 431
A MULHER E O HOMEM Apreciados por Víctor Hugo
m* h 2 íTlS QOS IQ63IS.
é a maiS el6vada das criaturas. A mulher o mais subli-
- Deus fez para o homem um trono, para a mulher um altar - O homem é o cerebro, a mulher o coracáo. O cerebro produz a
luz, o coracao produz o amor. A luz fecunda, o amor ressuscita
ve., o '^SSS¿T 9énÍ°' 3 mU'her Um anj°- ° 9énÍ° incomensurá"
*a virtí ,HoAaawPÍra5§°AdCí -h?mem é a suPrema 9'ória; a aspiracáo da mulher virtude extrema. A gloria promove a grandeza, a vlrtude a divindade
- O homem tem a supremacía, a mulher a preferencia. A suprema cía significa forca, a preferencia o direito. M - O homem é forte pela razáo, a mulher invencível pelas láqrimas A razao convence, as lágrimas comovem. '«grimas. - O homem é capaz de todos os heroísmos, a mulher de todos os
martirios. O heroísmo nobilita, o martirio purifica.
- O homem é o código, a mulher o Evangelho. O código corriae o
Evangelho aperfeicoa.
'
- O homem é o templo, a mulher o sacrário. Ante o templo nos
descubrimos, ante o sacrário nos ajoelhamos.
- O homem pensa, a mulher sonha. Pensar é ter urna larva no cere
bro, sonhar e ter na fronte urna auréola.
- O homem é o océano, a mulher é o lago. O océano tem a pérola
que adorna, o lago a poesía que deslumhra.
- O homem é a águia que voa, a mulher o rouxinol que canta Voar
e dominar o espaco, cantar é conquistar a alma.
- O homem tem um fanal: a consciéncia. A mulher urna estrela- a
esperanca. O fanal guia, a esperanca salva.
- Enfim, o homem está colocado onde termina a Térra, a mulher
onde comeca o Céu.
NEM TUDO O DINHEIRO CONSEGUE (autor desconhecido)
O dinheiro resolve muitas situacóes, mas nem sempre compra aquilo
que corresponde a profundo desejo.
O dinheiro pode comprar, por exemplo:
M
- A cama, mas nao o sonó; o livro, mas nao a inteligencia ou o saber - O alimento, mas nao o apetite; o luxo, mas nao a beleza.
- Urna casa, mas nao um lar; o remedio, mas nao a saúde. - A convivencia, mas nao o amor; a diversáo, mas nao a felicidade
- O Crucifixo, mas nao a fé; urna granja, mas nao os lucros - Um lugar no cemitério, mas nao no céu. 432
Visite o MOSTEIRO DE SAO BENTO e
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" na
Internet: http://www.osb.org.br.
ALGUNS LIVROS DAS PUBLICARES DE DOM ESTÉVÁO, DISPONÍVEIS EM NOSSA LIVRARIA:
- CHENCAS, RELIGIÓES & SEITAS: QUEM SAO? Um livro indispensável para a familia católica. (Coletánea de artigos publicados na revista "O Mensageiro de Santo
Antonio") 2a edicáo. 165 págs. 1997
R$ 7,00.
- CATÓLICOS PERGUNTAM. Coletánea de artigos publicados na secáo de cartas
da revista "O Mensageiro de Santo Antonio". 1997.165 págs
R$ 6,00.
- PARA ENTENDER O ANTIGO TESTAMENTÓLO livro apresenta subsidios muito importantes para todas as pessoas interessadas em entender o AT e aprofundar seus conhecimentos sobre questoes muitas vezes controvertidas que ali se encon-
tram. Traz também um guia prático para a leitura da Biblia). 43 edicáo, revista e
atualizada. 286 págs. 1994
R$ 12>00-
- PÁGINAS DIFÍCEIS DO EVANGELHO. (O livro oferece-nos um subsidio seguro para esclarecer as dúvidas mais freqüentes que se levantam ao leitor de boa vontade, trazendo-nos criterios claros e levando-nos a compreender que todas as pa-
lavra's de Cristo sao de aplicacáo perene e universal), 2a edicáo. 1993,
47 págs
R$4>50-
- COLETÁNEA - Tomo I - Obra organizada por Dom Emanuel de Almeida, OSB e Dom Matías de Medeiros, OSB. Publicacáo da Escola Teológica da Congregacáo Beneditina no Brasil. Esta obra foi feita em homenagem a Dom Estéváo. Além do esboco bio-bibliográfico de Dom Estéváo, encontram-se artigos de amigos e admirado res de Dom Estéváo. Sao professores da Escola Teológica, do Pontificio Ateneu de Santo Anselmo em Roma, que ministraran varios cursos nesta e outros que o estimam. Sumario: Histórica, Bíblica, Histórico-Dogmática, Dogmática, Canónica, Litúrgica, Pedagógica, Literaria e Noticias Biográficas. 1990. 315 págs R$ 13,20. - DIÁLOGO ECUMÉNICO, TEMAS CONTROVERTIDOS. Seu autor, D. Estéváo Bettencourt, considera os principáis pontos da clássica controversia, entre católi cos e protestantes, procurando mostrar que a discussáo no plano teológico perdeu muito de sua razáo de ser, pois, nao raro, versa mais sobre palavras do que sobre conceitos ou proposites. 3a edicáo. 1989. 380 págs R$ 16,80. Pedidos pelo Reembolso Postal ou pagamento conforme 2a capa. RENOVÉ QUANTO ANTES SUA ASSINATURA DE PR.
RENOVAQÁO OU NOVA ASSINATURA 1997: NÚMERO AVULSO PR DE 1996:
Encademado em percalina, 590 págs. com índice. (Número limitado de exemplares) R$ 45,00.
R$25, g$ 25.00
"*
'
50.
MOVIDADE! OS CISTEfíCIENSES Documentos Primitivos
Texto latino e traducáo brasilelra
Os monges cistercienses - ramo da familia beneditina que em 1998 estará celebrando seu IX centenario de fundacáo - tem uma historia muito interessante e uma rica espiritualidade, que penetrou profundamente na Igreja. Importante fenó meno religioso, social e cultural, vem sendo muito valorizado e estudado, inclusive nos meios uni versitarios. Sao Bernardo encheu todo o seu tempo. Nos nossos dias um autor como Thomas Merton tem uma merecida fama. Ano passado o martirio de um grupo de trapistas franceses na
Argelia, comoveu o mundo.
O presente volume contém uma colecáo de do cumentos, todos eles remontando ao século XII
que sao os primeiros testemunhos da historia, da vida e da espiritualidade cistercienses Em edicao bilingüe (latim-portugués), coloca á dísposícáo do leitor brasileiro, textos de ongens e finalidades diversas, que convergem todavía em um ponto essencial: constítuem uma fonte auténtica para o conhecimento dos valores fundamentáis desta importan
te Ordem religiosa.
Este nosso final de século tem sido marcado por uma sede de misticismo e espiritualidade, muitas vezes desorientada e até desesperada, que é, sem dúvida uma
reacao ao pragmatismo e á violencia da nossa cultura de massa, que mais e'mais despersonalizam e embrutecem o ser humano. Os primeiros monges cístercienses expenmentaram esta mesma sede e souberam encontrar uma resposta para ela bebendo
de uma fonte que conserva, aínda hoje, todo o seu vigor: a espíritualidade monástica beneditina. Por isso mesmo, os textos apresentados neste volume, enquanto nos infor-
mam sobre sua ardente busca espiritual e os meios que escolheram para vivé-la guardam toda sua atualídade e podem certamente iluminar os que, também em nossó tempo, sentem-se movidos por igual procura.
OS CISTERCIENSES - Documentos Primitivos, foi publicado originalmente na Fran ca (Citeaux Commentarii Cistercienses), tendo uma introducáo e bibliografía do Irmáo Francois de Place, da Abadía de Notre Dame de Sept-Fons. Sua edicáo no Brasil foi urna iniciativa do Mosteiro Trapista de Nossa Senhora da Assuncáo de Hardenhausen-
Itatmga, em Sao Paulo, tendo o apoio dos beneditinos do Río de Janeiro. A tráducáo é do jornalista Irineu Guimaráes, pormuitos anos correspondente no Brasil do jornal francés "Le Monde". Padre Luis Alberto Rúas Santos, O. Císt., foi o responsável pela revisao da obra.
O livro sai pela Musa Editora, de Sao Paulo, em coedicáo com a "Lumen Christi" do
Rio de Janeiro (254 páginas)
Para pedidos: EDICÓES "LUMEN CHRISTI".
Atendemos pelo Reembolso Postal ou pagamento conforme 29 capa.
R$ 25'00