Projeto PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS ON-LIME
Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoríam)
APRESEISTTAQÁO DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanga a todo aquele que no-la pedir (1 Pedro 3,15). Esta
necessidade
de
darmos
conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa crenga católica mediante aprofundamento do nosso estudo.
um
Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propoe aos seus leitores: aborda questdes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega no Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar este trabalho assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site. Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.
Pe. Estevao Bettencourt, OSB
NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Estevao Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual conteúdo da revista teológico filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo. A
d.
Estéváo
Bettencourt
agradecemos
a
confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.
/¿ ANO XI\IN? 121
JANEIRO
1971
ÍNDICE Antes tarde do que minea !
I. 1)
í -
FILOSOFÍA E KELIGIAO
"Existe alguma mudanza na posicáo da Igreja frente a
Magonaria ? O Concilio inovon algo a rexpeito ?"
II.
2)
.'
BIBLIA SAGRADA
"Os episodios da infancia de Jesús narrados em S. Lucas
(capítulos 1 e 2) devem ser tidos como realmente históricos ou serüo 'estórias' e mitos ?"
1G
III.
S)
DOUTRINA
"Fim do Papado ? Divisdo entre os bixpos e o Papa f
Qne há na Igreja ? Que i a calegialidntte ?"
IV.
i)
29
MORAL
"Opiniáo pública na Igreja ? Em que
sentido pode ser
entendida ? Tem direitos ou nao ?"
CORRESPONDENCIA
37
MIÜDA
RESENHA DE LIVROS
COM APROVAQAO ECLESIÁSTICA
>,G
h7
ANTES TARDE
DO QUE NUNCA! Há estórias que, sem deixar de ser estórias ou lendas, sao portadoras de profunda mensagem.
Tal é o caso da narrativa concernente a Santa Córdula. Diz o cronista medieval:
«Quando os hunos viram as virgens (Úrsula e suas companheiras), lancaram-se sobre elas com grande clamor e furia,
como lobos sobre ovelhas, e as mataram todas 1.
Houve entretanto urna virgem de nome Córdula que, ven cida pelo médo, se escondeu durante toda a noite numa nave.
Todavía na manhá seguinte ofereceu-se á morte voluntaria mente e assim recebeu a coroa do martirio.
Já que nao se celebrava a sua festa, pois nao se sabia que tinha derramado o sangue por Cristo, Córdula apareceu muito tempo depois a urna monja reclusa do Mosteiro de Herisa na Saxónia, chamada Helintrudes; contou-lhe que se ocultara, mas por fim se entregara ao martirio; e revelou-lhe o
seu nome».
A estória de Córdula empolgou vivamente os cristáos da
Idade Media. Todavía no sáculo XVI, dado o senso crítico mais apurado dos historiadores, comegou a perder sua voga, sendo hoje do interésse dos poetas e artistas... Como quer que seja, ela ilustra duas grandes verdades que concernem particular mente o cristáo no limiar de novo ano: 1) Vida crista é testemunho (martyrion, em grego) dado a Cristo. É traduzir o Evangelho por palavras e obras até o derramamento do sangue (se necessário); é dar-se a Cristo com todas as riquezas e energías de urna personalidade. Tal
tarefa nao é fácil; ao discípulo de Cristo bem pode acontecer o que se deu com Córdula: recuar diante do chamado do Se-
nhor, intimidar-se e fugir vencido pela pusilanimidade;
há
i O- rei huno Atila, que sitiava a cidade ele Colonha, oferecera o casamento a Úrsula, princesa crista.
— 1 —
ocasióes em que -o Senhor parece exigir muito ou demais dos seus amigos na vida conjugal, na vida profissional, na vida cstudantil, na vida sacerdotal ou religiosa... Passada a hora decisiva, porém, o cristáo reconhece nao raramente o fracasso. 2) Entáo vale a pena acompanhar Córdula em sua decisáo derradeira: após urna noite de fuga, em que a voz de Deus se lhe fez ouvir no íntimo da alma, Córdula foi confessar a fé e aceitou as extremas conseqüéncias de sua profissáo crista. Tornou-se mártir (testemunha) e santa, movida por grande arrependimento e ardente amor. Antes tarde do que nunca! Éste adagio, tantas vézes re petido no dia-a-dia, é portador de profunda sabedoria. Prin cipalmente no que diz respeito as coisas de Deus, a hora tardía ainda é a hora oportuna; é — dir-se-ia — quase a hora nor mal, pois é muitas vézes na hora tardía que os homens sé lembram mais eficazmente do Criador. Nao poucos santos se fizeram santos (ou foram feitos... pela graca de Deus) na hora tardía.
Antes tarde do que nunca! Éste axioma traduz todo o dinamismo da vida crista, todo o inconformismo com a me-
diocridade e a tibieza; o cristáo jamáis se acomoda, julgando ser tarde demais para se converter decididamente ao Senhor Deus. Nao c a quantidade ou o número de nossos días passados na térra que nos interessa decisivamente, mas a qualidade e o conteúdo désses (poucos ou muitos) dias. Mais amor, maior devotamente a Deus e ao próximo dáo valor imenso aos tempos ditos «tardíos».
Vem, pois, a propósito a estória de Córdula quando ini ciamos novo ano de vida: seja um ano de testemunho cristáo
coerente até o extremo, mais coerente ainda do qus foi até
hoje. Quem nao é ou quem nao foi como Córdula, que teve médo do chamado de Deus, e recuou e se escondeu?! Pouco importa; o passado nao decide o futuro. A vocagáo suprema
de toda cristáo — a única a respeito da qual ninguém pode nutrir dúvidas — é a vocaeáo á santidade. O recente Concilio o lembrou enfáticamente; os nossos tempos o pedem com ins tancia incessante. É, pois, com dinamismo e zélo que nos aprestamos a corresponder ao premente convite de Deus e dos homens: convite á plenitude de nossa estatura crista. Antes tarde do que nunca! Podemos dizer que é o próprio
Deus quem no-lo garante!
E.B. — 2 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» Ano XI — N« 121 — Janeiro de 197Ó
I. 1)
FILOSOFÍA
E
RELIGIÁO
«Existe algnma mudanga na posisáo da Igreja frente
a Magonaria?
O Cóndilo inovou algo, a respeito?» Resumo da resposta:
Nos últimos anos tem-se falado com certa
Insistencia de aproximagáo entre a Igreja Católica e a Maconaria, apesar das repetidas condenacoes que desde 1738 os Sumos Pontífices vém proferindo sobre as Lojas Masónicas. Em parte, a mentalidade de dialogo que o Concilio Ecuménico suscitou na Igreja, justifica tais expectativas. — Todavía num julgamento sereno da questáo devese
observar que a Igreja nao pode dialogar com a Maconaria como tal. pois esta se acha cindida em «regular» e «irregular».
A' Magonaria «irregular» tomou seus traeos característicos no século XIX nos paises latinos da Europa (Franca, Italia, Espanha,
Portugal) e da América. £ hostil á Igreja, á qual tem causado gran des males (tenha-se em vista a «questao religiosa» no Brasil do século passádo). Nao é de crer, portante, que se .aproximen* Catolicismo :e Maconaria irregular. '! A Maconaria regular, predominante nos paises anglo-saxónlcos (inclusive nos E. U. A.), tende a ser mais e mais urna sociedade tolerante nos setores filosófico e religioso, dedicándose principal; mente a programas de Índole humanitaria e ética; suas Lojas sao, por vézes, clubes sociais; podém mesmo ter expressOes cristas, caso seus socios sejam, em maioria, cristaos. Frente a tal tipo de Maconari;<. (que vigora na Inglaterra, na Alemanha, nos paises escandinavos e nos E. U. A.), a Igreja Católica poderá assumir atitude aberta e con ciliadora; o diálogo ja se iniciou após o Concilio do Vaticano II medi ante o Secretariado Católico para os NáoCrentes. É de notar, porém, que nao foram revogadas as sentengas condenatorias dos Pontífices
dos sáculos XVIII e XIX, assim como do Código de Direito Canónico.
Resposta: Nos últimos tempos tém-se lido noticias que insinuam a aproximagáo mutua da Igreja Católica e da Maco naria. Sabe-se também que nao poucas pessoas desejam pertencer simultáneamente ao Catolicismo e á «Loja», Em vista déstes fatos, seráo abaixo apresentados alguns dados que per-
mitiráo ao leitor julgar, de certo modo, a questáo. Tal será o
roteiro da exposicáo: 1) Origens e tragos históricos da Maco
naria; 2) Igreja e Ma?onaria antes do no II; 3) ... após o Vaticano II. — ■3 —
Concilio do Vatica
4
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 1
Sobre a Maconaria e as suas relaces com a Igreja já saiu um artigo em «P.R.» 9/1958, pp. 383-390. As páginas que se seguem, completarSo, com dados importantes e recentes, o que ai foi dito.
1.
Traaos históricos da Ma$onario
1. Tém-se atribuido ta Magonaria inicios muito remotos ou secretos, como se proviesse do Egito antigo ou dos construtores do templo de Salomáo (séc. XI a.C.) ou dos misterios religiosos do Oriente ou_ aínda do Rosacnicianismo... Na verdade, a atual Franco-Maconaria se deriva das corporagóes de pedreiros medievais. Estes, dedicando-se principalmente á construgáo de igrejas e catedrais (tenha-se em vista a arte gótica da Idade Media!), eram figuras muito estimadas e, por isto, gozavam de numerosos privilegios e favores tanto da parte dos Fapas como dos principes seculares. Muitos deles se organizavam em Fraternidades que nao estavam ligadas a determinada sede ou regiáo; dai chamarem-se «livres» (em francés, «franc-macons»; em inglés, «free masons»; em portugués, franco-magons). Os pedreiros medievais observavam, sob juramento, certos segre-
dos referentes á sua arte e profissáo — o que nada tinha a ver com ocultismo e esoterismo filosófico ou religioso. Sendo crlstáos, tinham como padroeiro principal Sao Joáo Batista.
No século XVI, o declínio do estilo gótico, o advento da arte renascentista e a Reforma protestante acarretaram o ocaso das corporacóes de pedreiros, que, além do mais, foram
solapadas por discordias internas. Todavía na Inglaterra tais entidades, a fim de assegurar a sua subsistencia, resolveram, a partir de 1641, receber membros honorarios provenientes de outros círculos da sociedade, inclusive da alta nobreza («accepted masons»); os novos socios exerceram influxo deci sivo na evolugáo das corporacóes de pedreiros. Estas tornaram-se centros de aristócratas e intelectuais, cuja fínalidade passou a ser filosófica e humanitaria. Recorrendo ao iluminismo ou racionalismo — filosofía que na época movía a Inglaterra —f os novos «pedreiros» conceberam o ideal de propor ao mundo urna religiáo que satísfizesse a todos os homens e os irmanasse numa familia universal. O vocabulario («arquitetar, construir...») e os instrumentos dos pedreiros (esquadro, compasso, martelo...) assumiram, desde entáo, sentido sim
bólico ñas corporacóes inglesas, designando a construcáo moral da humanidade. Cada corporacáo tomou o nome de «Loja»
IGREJA E MACONARIA
(«lodge», em inglés), inspirado pelo local (muitas vézes, um albergue) em que os socios faziam as suas reunióes. Aos 24 de junho de 1717, festa de Sao Joáo Batista, quatro lojas macdnicas de Londres se coligaram para constituir
a «Grande Loja da Inglaterra». Em 1723 foram promulgados os Estatutos da instituigáo, que o pastor presbiteriano James Anderson elaborara de acordó' com o racionalismo da época. Essa Magna Carta, retocada em 1738, professava «a religiáo na qual todos os homens concordam entre si» («the religión in which all men agree»); admitía, sim, a existencia de Deus tal como a razáo humana a pode conceber, abstraindo de qualquer revelagao sobrenatural (judaica ou crista) *; assim fícariam excluidos das lojas macdnicas apenas os ateus e liberti
nos: «Um macón nunca há de ser um estúpido ateu ou um libertino irreligioso* («a Masón will never be a stupid Atheist
ñor an irreligious libertíne»). A Deus se atribuía o titulo de «Grande Arquiteto do Universo» 2. Na base de tais principios
assegurava-se a cada membro das lojas plena Iiberdade dé
consciénda e de crenga, de modo que a nenhum candidato a Magonaria se deveria perguntar quais as suas crencas religi osas nem se haveria de tocar em religiáo — como também nao em política — ñas reunióes mac&mcas.
E5s na íntegra o trecho da Constituicio magónica de 1737
que interessa á Religiáo:
«Um macón é obrigado, em virtude de seu titulo, a obedecer a lei moral e, se ele entender bem "k arte, jamáis será um ateu estúpido ou um irreligioso libertino. Posto que nos tempos antigos os macons tivessem a obrigacao de seguir a religiáo própria de cada país, qualquer que ela lósse, presentemente julgou-se mais conveniente obriga-los sdmente a praticar aquela religiáo em que todos os homens estáo de acordó, deixando-lhes plena Iiberdade as conviccñes particulares. Esta religiáo consiste em serení bons, sinceros, modestos e honrados,
quaisquer que sejam as denominacCes ou crencas que os distinguen). Donde se concluí que a Magonaria é o centro de uniao e o meio de conciliar verdadeiras amizades entre as pessoas que de outra forma jamáis se teriam tornado familiares» (Const., c. 1* «Sobre Deus e a
Religiüo»).
» Em linguagem filosófica, a ésse tipo de atitude religiosa se dá o nome de «deísmo», ao passo que a aceitagáo da revelacao sobrenatu ral que a Biblia apresenta, se chama «teísmo».
2
Tenha-se em vista a seguinte passagem
Anderson:
da Constituicáo de
«Adam, our first parent, created aíter the image of God, the Great Architect of the Universo (Adao, nosso primeiro pai, criado segunoo a imagem de Deus, o Grande Arquiteto do Universo).
— 5 —
6
-PERGUNTE E RESPONDEREMOS? ,121/1970. qu. 1
A Marañaría propagou-se muito rápidamente, visto que, entre outras coisas, seus membros se prestavam auxilio mutuo no tocante á vida profissional e económica.
2. As lojas anglo-saxónicas conservaram seus principios doutrinários desde a origem até os tempos atuais; por vézes, no decorrer da historia tomaram mesmo posigáo favorável á fé crista. Em 1929, a Grande Loja da Inglaterra, que goza de posicáo primacial na Maconaria, promulgou urna Declaracáo solene em que propunha oito principios fundamentáis a que deve satisfazer urna Grande Loja Magónica: entre estes, estava a fé na «Grande Vontade Revelada». Em 1950, a mesma Grande Loja da Inglaterra afirmou «prestar genuina reverencia ao Deus dos cristáos»; ao que se seguia: «A Franco-magonaria é inspirada pela fé da Idade Media e guarda-lhe fídelidade». No mesmo documento a Gran de Loja da Inglaterra asseverava que «nao reconhecia como Maconaria regular nem a Grande Loja do Uruguai nem alguma outra que rejeitasse suas obrigacóes frente a Deus, Arqitíteto do Universo». Estas proclamacóes (datadas de 1950) diferem (em sentido positivo e valioso) da proñssáo de deísmo e liberalismo contida na Constituicáo Macónica de 1738. Tal evolugáo se explica, em parte, pelo fato de que, na Inglaterra, a Maconaria estéve militas vézes unida á Igreja do Estado (anglicanismo) e ta Casa Real. Os reis Jorge IV* (f 1830), Guilherme IV (t 1837) e Eduardo VII (t 1910) foram magons; o mesmo se deve dizer de grandes estadistas ingleses, entre os quais Winston Churchill.
Na Alemanha e ñas térras escandinavas, a Maconaria tem exaltado a personalidade de Jesús Cristo e as concepcóes cris tas da vida. Na Suécia, as lojas magónicas constituem como
que urna Ordem de Cavaleiros cristáos, com seus patronos (Sao Joáo Batista, S. André, S. Joáo Evangelista...); nos países escandinavos, também se verifica a uniáo da Maconaria com a dinastía real; os reis da Suécia e da Dinamarca tém sido
freqüentemente os Gráo-Mestres da Maconaria em seus paises.
Na Alemanha. o Imperador Gullherme I (i- 1888) foi influente membro da Maconaria. Nos Estados Unidos, as lojas magónicas tém desenvolvido intensa atividade. Reconhecem suas «antigás obrigacóes» (de ísmo) ; sao menos interessadas pela filosofía do que por pro blemas sociais, económicos e assistenciais. Desde George Wa
shington até H. Truman, a metade dos presidentes dos E.U.A. aderiu á Maconaria. Grande é o número de lojas magónicas — 6 —
IGREJA E MACONARIA
norte-americanas destinadas aos negros; dois milhoes déstes Ihes estao filiados. 3. Nos países launas da Europa e da América, outras térn sido as atitudes da Maconaria, merecendo assim a designaeáo de «Maconaria irregular». Com éfeito, em 1877 a Loja «Grand Orient de France» rejeitou a profissáo de fé no «Todo-Poderoso Arquiteto do Universo»; aos 15/DÍ/1952 tal posicáo anti-religiosa foi explícitamente renovada pela mesma entidade. Em 1958 o «Grand Orient» expulsou de suas lojas seis memtoros, que no Parlamento francés haviam votado em favor de subvencóes a ser concedidas ao ensino livre, que na Franca é principalmente o das escolas católicas. O «Grand Orient» sempre foi radicalmente infenso á Igreja. Os enciclopedistas do séc. XVm foram todos macons (Voltaire repetía o dístico:
«Écrasez l'infame! — Esmagaí a infame [a Igreja]!»). Em
1789 havia 65 lojas masónicas em Paris tramando contra a monarquía e a Igreja (o trono e o altar), A Maconaria fran cesa cultiva também os ritos de iniciacáo (distingue 33 graus), de progressiva penetracáo na ideología e nos planos masóni cos, seguindo assim o dito «rito escocés». Tais ritos, assim
como a aqáo política e anti-religiosa das lojas de Franca, conferem a estas um caráter secreto muito pronunciado. Na Italia a Maconaria, empenhando-se pela unificacáo da
península no sáculo passado, tinha em vista nao sómenté o
fúh do Estado Pontificio, mas também o da Igreja. Na Espanha os magons apoiaram intensamente a República esquerdista de 1931-1936. Na América Latina, a Maconaria envolveu-se
em tramas contrarias ao Cristianismo, podendo mesmo ser
designada como «Anti-Igreja» por suas atividades passadas. — A Magonaria tradicionalista ou regular desaprovou e conde-
nou sucessivamente tais atividades dos seus irmáos dissidentes ou irregulares. Numa apreciado imparcial, deve-se dizer que certa literatura de lingua francesa exagerou as acusacaes contra a Maconaria. Tenha-se em viste principalmente a obra de Léon Taxil: «Les Fréres Trois-Points» (Os Irmáos Trés-Pontos), Paris 1885. Léon Taxil é o pseudónimo do escritor francés Gabriel Jogand•Pagés. Éste personagem (1854-1907) comecou sua carreira como jornalista e livre pensador.
Aderiu
em
1884 a Maconaria;
tres
meses
depois, porém, foi expulso da Loja. Entáo resolveu aparecer aos olhos
do público como «convertido», pondo-se a oombatar veementemente a
Maconaria; em 1885, publicou «Les Fréres Trois-Points». A partir de 1890, utilizou documentos falsos, atribuindo aos magons o «Paladismo>, ou seja, o culto a Satanás, assim como atividades sacrilegas e obcenas.
— 7 —
8
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. qu. 1
O proceder desonesto de Lean Taxil foi descoberto e denunciado peJo jornal «Kdlnische VoBcszeitung» em 1896-97, sendo um dos protagonis tas da denuncia o padre jesuíta H. J. Gruber.
2.
Igreja e Mojonaría antes do Vaticano II
Em 1738 o Papa Clemente XH condenou a Magonaria, apontando para o seu indiferentismo religioso, sua índole se creta e perigosa á seguranza do bem comum.
Eis parte da Constituicáo «In Eminenti» do citado Pon
tífice:
«Sabemos que se desenvolvem, progredindo cada dia, certas so ciedades, assembléias, reunioes, corrühos ou conventículos, que se chamam vulgarmente franco-macons — ou que tém outra denominacfio segundo a variedade das linguas — assembléias ñas quais se ligam homens de todas as religioes e seitas, sob a aparéncia de nonestidade natural, por um pacto estreito e impenetrável, conforme leis e estatutos por éles criados, obrigando-se debaixo de juramento e sob penas graves a ocultar por um silencio inviolável tudo o que praticam ñas sombras do segredo.
Mas, como é de natureza do exime trair a si mesmo, deixando escapar vozes que descubran» e denuncian, as sociedades ou conven tículos supra citados geraram no espirito dos liéis suspeitas táo serias que quem faz parte délas fica, aos olhos das pessoas de probidade c
de prudencia, marcado com o ferrete da malicia e da perversidade. E estas suspeitas cresceram em tanta maneira que, em váílos Estados, as ditas sociedades foram proscritas e banidas, como elemento perigoso á seguranga dos reinos. Eis por que Nos, ponderando os grandes males que, por via de regra, resultam dessas especies de sociedade ou conventículos, nao sonriente para a tranqüilidade dos Estados temporais, mas ainda para a salvacáo das almas, pois de maneira alguma podem harmonizar-se
com as leis civis e candnicas.... resolvemos e decretamos condenar e
proibir as mencionadas sociedades, assembléias, reuniñes, corrilhos ou conventículos de franco-macons, como de fato os condenamos e proi-
bimos por esta nossa constituicáo, válida para sempre.
Proibúnos, portanto, seriamente e em nome da santa obediencia a todos e a cada um dos fiéis de Cristo, de qualquer estado, poslcao, condicüo, classe, dignidade .e preeminencia que sejam, leigos ou cléri gos, seculares ou regulares, ousar ou presumir entrar por qualquer pretexto, debaixo de qualquer cor, ñas sociedades de franco-macons, propaga-las, sustenta-las, recebe-las em suas casas, ou dar-lhes abrigo e ocultá-las alhures,. ser nelas inscrito ou agregado, asslstir ás suas reunioes ou proporcionar-lhes meios para se reunirem, fornecer-lhes o que quer que seja, dar-lhes conseibo, socorro ou favor ás claras ou em secreto, direta ou indtretatnente, por si ou por intermedio de outrem, de qualquer maneira que a coisa se faca, como também exci tar a outros, provocá-los, animá-los a se instruirem nessas sortes de sociedade, a se fazerem membros seus, a auxiliarem-nas, ou protegerem-nas de qualquer modo. E ordenamos-lhes absolutamente que se
— 8 —
IGREJA E MACONARIA
abstenham por completo dessas sociedades, assembléias, reunides, corrilhos ou conventículos, e isto sob pena de excomunhao, na qual se incorre pelo lato e sem outra dedaragáo, e da qual ninguém pode ser absolvido senao por Nos ou pelo Pontífice Romano reinante, exceto em artigo de morte».
Semelhante reprovagáo foi proferida pelos Papas Bento XIV (Constítuigáo «Provida» de 18/V/1751), Leáo XH (Constituigáo «Quo graviora» de 13/IÜ/1825), Pió IX (em mais de vinte documentos do seu pontificado), Leáo xm (encíclica «Humanum genus» de 20/IV/1884). Codificando a Iegislagáo anterior, o Direito Canónico, pro mulgado em 1717, apresenta os seguintes cánones contrarios
á Maconaria:
Cfinon 2336: «Os que dao seu nome a seita mac&nica e a socieda des semelhantes que conspiram contra a Igreja e as legitimas autori dades clvis. ... incorrem sem mais na excomunhao slmplesmcnte reservada á Santa Sé».
Canon 1240 § 1: «Serao privados de sepultura eclesiástica, se nao derem algum sinal de arrependimento antes de morrer, ... os que tiverem aderido á seita macdnica ou a outras sociedades déste género». Canon 684: «Os fiéis... afastem-se das associasOes secretas, con denadas, suspeitas ou das que procuram subtrair-se a vigilancia legi tima da autoridade eclesiástica».
Sabe-se que numerosos sao os livros e artigos de autores
católicos que explicám os documentos eclesiásticos atrás cita
dos, procurando assim mostrar a distancia e a incompatibilidade
existentes entre a Magonaria e a fé católica.
Deve-se outrossim lembrar que a Magonaria, tanto nos
países latinos da Europa quanto na América Latina, se envolveu em ferrenhas maquinagóes contra os direitos e a sub sistencia da própria Igreja; tais campanhas nao raro lograram
éxito, prejudicando nao pouco os interésses do Catolicismo: Haja vista, por exemplo, a atitude do govérno imperial no
Brasil (muito inspirado pela Maconaria) frente as Ordens Re
ligiosas de nossa patria: mosteiros e conventos foram entravados em seu pro«:esso de recrutamento, de sorte que estavam quase completamente despovoados quando foi proclamada a República no B
vido pelas tramas magónicas.
Verdade é que alguns bispos e sacerdotes aderiram á Maconaria em nossa patria no século passado; assim, o C&nego Januárlo da
— 9 —
10
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. qu. 1^
Cunha Barbosa, Frei Francisco de Santa Teresa Sampaio... — Deve le, porém, dizer que o fizeram na medida em que a Maconaria propugnava a independencia política do Brasil; as lojas de Pernambuco .- tía Bahía, por volta de 1810, e as do Rio por cérea de 1820 eram centros políticos que tramavam a independencia nacional. Em conseqüéncia, a Magonaria recebeu a adesáo de eclesiásticos cujo ideal pa
triótico se identificava com o das Lojas; de certo, naqueJa época a
Maconaria brasileira nao dava provas de anticlericalismo. — Nao há dúvida, as Bulas pontificias proibiam aos fiéis católicos o ingresso na Maconaria; todavía essas Bulas nao haviam sido promulgadas no Bra sil, visto que para tanto se requería o «beneplácito» do Rei ou do Imperador, beneplácito éste que havia sido denegado pelas autoridades civis no Brasil.
Sem dúvida, mestno que o Govérno civil nüo promulgasse as proi-
biedes papáis concernentes á Maconaria, tais proibiedes obrigavam os católicos em consciéncia. Os eclesiásticos brasileiros, que nao lhes prestaram obediencia, tinham a consciéncia obnubilada, visto que as ordena
pontificias nao haviam sido oficialmente publicadas no Brasil.
A situagáo tesa entre a Igreja Católica e a Magcnaria se prolongou até as vésperas do Concilio do Vaticano II.
3.
A partir do Vaticano II
1. Em 1959 o Papa Joáo XXIII anunciou a próxima convocagáo de um Concilio Ecuménico. Tal noticia e os sub-
seqüentes preparativos da grande assembléia suscitaram na
Igreja um novo clima, clima de abertura e diálogo em relacáo a todos os homens, contudo sem concessóes ao relativismo nem detrimento para a verdade. Em 1961 apareceu a obra do estudioso Alee Mellor com o significativo título «Nos Fréres Separes, les Franc-Macons»
(Nossos Irmáos Separados, os Macons). Mellor, como católico praticante, fóra recebido na loja magónica «Esperance» de París, Em seu livro procurava mostrar que os principios da
Magonaria nao eram táo infensos ao Catolicismo como se
pensava; pleiteava assim urna aproximacáo entre católicos e magons. Tal obra certamente impressionou a opiniáo dos cir cuios interessados.
Durante o Concilio do Vaticano n o bispo D. Méndez Arceo, de Cuernavaca (México), famoso por suas posigóes avancadas, pediu, por duas vézes, fósse estudada em assem
bléia conciliar a questáo das relagóes entre a Igreja Católica
e a Magonaria. Nada conseguiu, porém. Houve vozes que se
levantaram, na basílica de Sao Pedro, contra os erros da Ma
gonaria; também escritores e teólogos disseminaram na ocasiáo advertencias contra tal sociedade. — 10 —
IGREJA E MACONARIA
11
Tais fatos, porém, nao impediram que, após o Concilio, as autoridades da Igreja se dispusessem a entrar em diálogo mais assiduo com os adeptos da Magonaria: o Secretariado da Igreja instituido para dialogar com os Náo-Crentes, sob a orientagáo do seu consultor J. B. Toth (húngaro), tem tido con tatos assaz positivos com lojas masónicas, principalmente dos países anglo-saxónicos. 2. Como evoluiráo as coisas em conseqüéncia de tais acontecimentos ? — Para responder, é necessário distinguir entre a «Mago naria regular» (anglo-saxónica) e a «Maconaria irregular» (das nacóes neo-latinas). A Igreja nao pode dialogar com a Maconaria como tal, pois esta nao constituí urna unidade nem possui urna Federacáo Internacional ou Mundial; ao contrario, a Magonaria está cindida, havendo entre os seus adeptos respostas contraditórias a questóes básicas, de interésse capital para a Igreja Católica; assim, por exemplo, frente a Religiáo e ao Cristianismo os magons regulares assumem urna atítude de tolerancia ou mesmo simpatía, que os «irregulares» rejeitam. Feita a distincáo ácima, deve-se dizer: 1) Com a Maconaria irregular, enquanto se mantiver tal, ou seja, hostil á Igreja, a Igreja Católica nao se poderá con ciliar. Permaneceráo de pe as sentengas de desaprovagáo for muladas pelos Sumos Pontífices. A Igreja nao pode permitir que seus membros se filiem a sociedades que professam prin cipios anticristáos e militam contra os interésses do Reino de Cristo na térra. No Brasil predomina
a Magonaria irregular,
o que por
certo dificulta a aproximagáo de magons e católicos. O «Gran de Oriente do Brasil» foi oficialmente «excomungado» pela
Magonaria anglo-saxónica, como se depreende de um Manifestó dirigido pelo «Soberano Supremo Conselho do Grau 33 do Rito Escoces Antigo e Aceito para os Estados Unidos do Brasil» as Potencias Macónicas Regulares: «No mes de julho do corrente ano de 1927, a Maconaria Brasileira soíreu urna seria crise. Os dois corpos magónicos que, confederados, vinham trabalhando desde muitos anos, separaramse. O Supremo Conselho do Rito Escocés viu-se dbrigado a romper todas as relagóes
com o Grande Oriente do Brasil e a Tnclut-lo na categoría das organi
za cóes masónicas irregulares espurias».
— 11 —
12
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 1
Mais adiante ai se le: «A Grande Loja da Inglaterra, táo ciosa das boas c legítimas tradicOes da verdadeira Maconaria, a Grande Loja da Inglaterra, que
rompeu as suas relacSes com o Grande Oriente de Franca, quando ésse carpo masónico aboliu a fórmula de invocacáo ao Grande Arquiteto
do Universo e expeliu a Biblia dos altares; a Grande Loja da Ingla terra, que récentemente o mesmo praticou com o Grande Oriente da Bélgica por idéntico motivo; a Grande Loja da Inglaterra, que consi dera condicSes indispensáveis para a regularidade macdnica a arenca em Deus e em urna vida futura, pode continuar a manter o tratado que íirmou outrora com o Grande Oriente do Brasil e pelo qual entregou á jurisdicáo désse corpo as Lojas que trabalham no Ritual de
Iorque em territorio brasileiro? Acaso o 'Board of General Purpose' da Grande Loja viu um exemplar da Constituicao do Grande Oriente do Brasil e, se o viu, anallsou-lhe os artlgos? Nao o eremos porque, se o houvesse feito, há multo teria deixado de subsistir aquéle tratado. A condenacáo & lrregularldade do Grande Oriente do Brasil por todas as Potencias Macdnicas regulares está na simples leitura da sua Constituicao — da sua lei básica — da sua organlzacao... Rio de Janeiro, 15 de dezembro de 1927 Pelo Soberano Supremo Conselho (a)
Alarlo Behring
Sob.\ Gr.\ Com.*.» (Texto Maconaria déste livro, «Históricos
transcrito da obra de Freí Boaventura Kloppenburg, «A no Brasil», 3' ed., Petrópolls 1957, pp. 24. 29s. O autor por sua vez, transcreveu o documento ácima da brochara Macdnicos», Sao Paulo 1952, pp. 65-71).
2) Quanto á Maconaria regular, parece que paulatina mente entre ela e a Igreja Católica se vai criando um clima de compreensáo e aproximacáo, ao menos nos paises anglo-
-saxóes ou submetidos á influencia anglo-saxdnica.
Tenha-se em vista, por exemplo, o fato seguinte: Aos 26 de maio de 1962, a Grande Loja Masónica do Haití enviou ao Papa Joáo XXm urna carta em que manifestava discreta simpatía para com a Igreja e formulava votos para que, conseqüentemente,. a Santa Sé retírasse a pena de excomunháo que pesa sobre os membros da Maconaria. O documento comegava exprimindo o regozijo dos magons do Haití pelo interésse que a Igreja vem demonstrando frente aos múltiplos problemas da humanidade contemporánea. Urna tal atitude dava ensejo a inédita solicitagáo da Loja: «Em conseqüéncia, ousamos nos, os macons da obediencia do Haití, apresentar-vos, em vista de urna declsáo justa e prudente, o caso da
Maconaria, ... que íol atingida por pena de excomunháo». Continua — 12 —
IGREJÁ E MACONARIA
13
o texto dlzendo que esta pena é infligida pelo canon 2335 na suposicáo de que a Maconaria seja sociedade que conspira contra o Estado e a Igreja; ora tal suposicSo nao se aplica, de modo nenhum, a Grande Loja do Haití nem a outras multas... Nada se pode denunciar, na Maconaria do Haití, que derrogue aos direitos da Igreja ou as normas da moral natural «O nosso hermetismo (= índole secreta), que injus tamente é tido como suspeito, de forma alguma é cobertura de atividades malignas ou reprováveis; ao contrario, apenas serve para assegurar a integridade e a pureza originarias da Ordem maconica. Professamos a existencia de Deus, que reconhecemos como o Todo-pode roso Arquiteto do universo; e eremos na realidade de outra vida no céu. As dlretlvas da nossa instituicao exlgem que levemos o género humano a mais luz, mais bondade, mais amor; nossa sociedade aprcgoa, como ideal, a irmanaefio de todos os homens sobre a térra. Por isto temos por flnaüdade colaborar na libertacáo do género humano, afirmando os direitos da pessoa humana, de maneira constante e com especiáis esforcos».
Em conclusáo, o documento asseverava que o pedido de suspensáo da pena de excomunhao, em tais circunstancias, so poderla ser tido
como algo de justo e conveniente.
Pode-se crer que entre a Igreja Católica e a Maconaria regular se dé, no futuro, nao sonriente certa aproximagáo, mas quicá, com o decorrer do tempo, urna aceitagáo mutua, porquanto a Maconaria regular vai mais e mais deixando de ser urna sociedade filosófica dotada de principios ideológicos defi nidos, para se tornar urna corporacáo humanitaria; ela vai assumindo as características de urna sociedade tolerante do ponto de vista filosófico-religioso, sociedade que entretem camaradagem ou parceiragem entre seus socios reunidos em
Lojas que as vézes tém a aparéncia de clubes sociais; destarte ela visa levar seus adeptos ao fiel cumplimento de seus deve res para com os demais homens. O deísmo, ou seja, a aceita-
Cao de Deus com exclusáa da revelacao sobrenatural crista, nao é «dogma» da Maconaria; urna loja masónica regular pode chegar a professar o Cristianismo, caso os seus membros
sejam cristáos (é o que se dá, por vézes, nos países anglo-
-saxónicos).
A Maconaria regular, por conseguinte, nao parece ser inimigo perigoso para a Igreja; ela perdeu multo do prestigio de que gozavam as Lojas dos séc. XVTI e XVHL O grande adversario do Cristianismo, hoje em día, é o comunismo (na medida em que éste propSe urna íilosofia materialista e fomenta o ateísmo militante, visando extirpar o sentirnento religioso dos povos subjugados).
Ainda recentemente, no outono de 1968, realizouse em Viena, sob
os auspicios do Cardeal K8nig (que dirige o «Secretariado para os NSo-Crentes»), o encontró de urna comissao de tres macons de lingua alema com tres representantes da Igreja Católica. Os observadores aguardam com curiosidade os resultados que semelhantes coloquios poderSo produzir nos tempos próximos.
— 13 —
1,1
PERGUNTE E RESPONDEREMOS.» 121/1970. qu. 1
A autoridade suprema da Igreja oficialmente ainda nao mudou sua atitude negativa frente á Magonaria; isto se explica em grande parte pela impressáo deixada pelas atividades ne
fastas que a Maconaria irregular desenvolveu até os últimos tempos, tanto na Europa como na América Latina. Acontece, porém, que certos autores católicos (sacerdotes
e leigos) sugerem a revisáo do canon 2335 por ocasiáo da pró xima reforma do Direito Canónico: pleiteiam, nao se imponha a excomunháo a todo e qualquer adepto da Magonaria, mas, sim, apenas aqueles que se filiem a Lojas que de fato militam contra a Igreja. Os principáis autores que advogam tal causa, sao o P. M. Dierickx, jesuíta
holandés, que
escreveu o livro
g
naria, a grande desconhecida», publicado em alemüo pela editora maconica «Bauhütten-Verlag» sob o titulo «Freimaurerei. Die grosse
Unbekannte». Frankfurt 1968,
o escritor francés macón Allec Mellor, em seu artigo «Freimau
rerei», publicado na enciclopedia católica «Sacramentum Mundl», 2* volume 1968 (Herder, Freiburg, colunas 99 a 105). Éste autor, alias, com muita énfase apregoa a reconciliacao do Catolicismo com a Maco naria em outras obras, como «La Franc-Maeonnerie á l'heure du choix». Paris 1963, e «La charte inoonnue de la Franc-Maconnerie chrétienne». Paris 1965.
4.
Urna explicando final
Nos últimos tempos circulou com certa insistencia a no ticia de que a Igreja Católica se havia reconciliado ou estava para se reconciliar com a Magonaria... O rumor se deve ao seguinte episodio: Em outubro de 1966, a Conferencia dos Bispos dos Países Escandinavos resolveu que cada Bispo, na sua diocese, poderia autorizar os macons que se convertam á fé católica, a perma necer membros de sua respectiva Loja macónica. A razáo disto é que, como dissemos, a Maconaria dos reinos escandinavos nao é hostil nem á Igreja nem ao clero, mas defende princi pios cristáos. — De resto, na Islándia os magons que abragassem a fé, já estavam autorizados a se conservar em suas Lojas.
Tal decisáo do episcopado escandinavo só foi divulgada em Janeiro de 1968. Logo a imprensa internacional lhe atribuiu proporcóes exageradas, noticiando que a Santa Sé havia mudado de atitude frente á Magonaria em geral. O jornal «Rome Daily American» de 12/111/68, por exemplo, anunciou o seguinte: «O Papa cancela a condenacao da Maconaria».
— 14 —
IGREJA E MACONARIA
15
O periódico italiano «Panorama» de 2S/IH/68 publicou o texto: «Tarnou-se possível ser católico e macón ao mesmo tempo» (p. 67).
A «United Press Intemationab, aos 1VIII/68, noticiou: «O Vati cano aboliu virtualmente a antiga lei que cxcomungava os católicos
inscritos na Maconaria, disse urna fonte do Vaticano. Agora os cató licos estao livres para tornar-se macons nos E.U.A., na Inglaterra e na maioria dos outros paises do mundo».
Em conseqüéntía, a Radio Vaticano, aos 16/IH/68, fez a seguinte comunicagáo: «Segundo informaedes recém-publicadas na imprensa cotidiana de diversos países, a Santa Sé teria autorizado os macons que se convertem ao catolicismo, a permanecer na organizacJLo maconica, e inten cionaría mudar profundamente a disciplina canónica concernente a
franco-magonaria. Ora o órgao (dicastério) competente da Santa Sé nos autoriza a desmentir tais informacOes como sendo destituidas de fundamento».
Assim a questáo se esclareceu. As medidas tomadas na Escandinávia tém caráter estrítamente local, ficando a crite rio de cada Bispo aplicá-las ou nao na sua diocese. Nao se tratava de permitir que católicos se tornassem magons, mas que magons, convertendo-se ao Catolicismo, se conservassem magons.
Desde que a Santa Sé mude as disposigóes canónicas con cementes á Maconaria em geral, ela o tornará notorio sem ambigüidades. Bibliografía seleta: «Gewandeltes Verháltnis zur Freimaurerei», pondenz» n» 5/23, malo 1969, pp. 216-219.
em
«Herder-Korres-
A. Mellar, «Freimaurerei», em «Sacramentum Mundi», 2* volume. Freiburg i/Br. 1968, col. 99-105. •
G. Caprile, «Chiarimenti a proposito della Massoneria», em «La
aviltá Cattolica», a. 119, 6/IV/68, pp. 74-76.
K. Algermissen, «Freimaurerei», em «Lexikon für Theologie und
Kirche», 4' vóL' Freiburg i/Br. 1960, 343^48. Boaventura 1957.
Kloppenburg,
«A
Maconaria no
Brasil».
Petrópolis
A. Campos Porto, «A Igreja Católica e a Maconaria». Rio de Ja neiro 1957.
J. Bertheloot, «La Franc-Maconnerie et l'Église Catholique». Lau-
sanne 1947.
ídem, «La Franc-Maconnerie». Lausanne 1949.
A. Lantoine, «Histoire de la Franc-Maconnerie francaise». Paris
1935.
— 15 —
16
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 2
II.
BÍBLIA
SAGRADA
2) «Os episodios da infancia de Jesús narrados em S. Lacas (capítoles 1 e 2) devem ser tidos como realmente
históricos ou seráo 'estórias' e mitos?»
Resumo da resposta: A infancia de Jesús em Sao Lucas (capítu los 1 e 2) é narrada de maneira intencionalmente artificiosa.
De um lado, refere fatos reais, pois S. Lucas logo no prólogo de seu Evangelho faz questao de se apresentar como historiador criterioso e fidedigno. Veriíica-se também que o estilo de Le 1-2 difere muito do das lendas de heróis pagaos, assim como do das estórias dos Evangelhos apócrifos; nestes o maravilhoso é desarrazoado ou despro positado, chegando as ralas do ridiculo (Deus, porém, segué um plano sabio, mesmo quando faz milagres). Ao contrario, em Le 1-2 há sobri-
edade e modestia de estilo por parte do Evangelista (tenha-se em vista, por exemplo, o episodio do nascimento de Jesús). De outro lado, observa-se que as narrativas da infancia de Jesús em Le 1-2 íazem eco a numerosas profecías do Antlgo Testamento. Dir-se-ia que o Evangelista intendonou apresentar tais episodios como sendo o cumprimento de vaticinios das Escrituras de Israel: principal mente as profecías de Dan 9 e Mal 3 Inspiram a maneira como S. Lucas dispós e apresentou os episodios da infancia de Jesús.
Para fundamentar estas aílrmacSes, os exegetas apontam grande número de paralelos entre Le 1-2 e profecías do Antigo Testamento. O artigo abalxo apresentará os principáis ddsses paralelos.
Resposta; Os assuntos referentes á infancia de Jesús despertam mais e mais a atengáo dos estudiosos e dos fíete cm geral. Tenha-se em vista quanto foi dito a respeito da
adoracáo dos magos (Mt 2) em «P.R.» 104/1968, pp. 321-332.
Procuraremos, a seguir, averiguar o que Sao Lucas nos transmite a respeito, estudando a estrutura do dito «Evange lho da infancia» em S. Lucas (Le 1-2), o sentido teológico déstes capítulos e o respectivo género literario.
1. 1.
A estrutura de Le 1-2
O Evangelho da infancia de Jesús conforme Sao Lucas
apresenta características muito marcantes: consta de urna serie de cenas narradas em estilo proprio, cujas notas mais freqüentes sao as seguintes:
— 16 —
A INFANCIA DE JESÚS EM. LC 1-2
a)
17
indicasóes de tempos: «nos dias de Herodes...» (1,5) «depois désses dias...» (1,24) «no sexto mes...» (1,26) «naqueles dias.. . rel="nofollow"> (1,39)
.
.
«chegara o tempo de Elisabcte dar á luz.. .> (1,57j «no oitavo dia...» (1,59)
b)
indkncóes de higar: Judéia
■
3
o templo (1,10) «em sua casa» (1,23) em Nazaré (1,26) «para a montanha... em casa de Zacarías»
c)
No centro de cada cena, há um diálogo ou cántico: diálogo de Gabriel com Zacarías (1,13-21) acáo de grecas de Elisabete (1,25) diálogo de María com o anjo (1,29-38) nova acfio de gracas de Elisabete (1,42-54)
cántico de acáo de gracas de Marta, o «Magníficat» (1,46-35) cántico de acfio de gracas de Zacarías, o «Benedlctus> (1,69-79) cántico dos anjos, o «Gloria a Deus...» (2,14) cántico de Simefio, o «Nunc dlmlttis» (2,29-32).
Os diálogos tém caráter lírico, hierático ou mesmo litúr gico; sao, por isto, belos e solenes. 2. Os exegetas enumeram oito grandes cenas em Le 1-2, que se podem assim delinear:
1.
Anuncio do nascimento de Joao Batista: 1,5-25
2.
Anuncio do nascimento de Jesús: 1,26-38
3.
Visitacao de Maria a Elisabete: 1,39-56
4.
Nascimento de Joáo Batista: l,57s
5.
Manifestacáo de Joáo: 1,59-80 ■
6.
Nascimento de Jesús: 2,1-20
7.
Primeara manifestacao de Jesús em Jerusalém:
8.
2,21-40
Segunda manifestagáo de Jesús em Jerusalém:
2,41-52.
Estas oito cenas sao dispostas de modo a formar um para lelo entre Joáo Batista e Jesús. Em outras palavras: o Evan
gelista apresenta dois dípticos ou dois pares de cenas principáis — 17 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 12V1970. qa. 2
18
(o díptico das anunciacóes e o dos nascimentos), dos quais as outras cenas podem ser ditas como que episodios complemen tares.
Eis como se desenvolvem os dípticos:
1.
DÍPTICO DAS ANUNCIARES (1,5-561
1. AnandagSo de Jo&o (1,5-25)
2. Anonciagáo de Jesns (1,26-38)
Apresentacáo dos pais Aparigáo do anjo Perturbacáo de Zacarías «Nao temas...» Anuncio do nascimento Pergunta: «Como o saberei?» Resposta: Repreensao do anjo
Apresentacáo dos pais Entrada do anjo Perturbacáo de María «Nao temas...» Anuncio do nascimento «Como se dará isso?» Revektc&o do anjo Sinal: «Eis que tua
Silencio de Zacarías Partida de Zacarías
Resposta de María Partida do anjo
Sinal: «Eis que fícarás mudó...»
parenta..
3. Episodio) complementar (1,39-56)
Visita de María a Elisabete
II.
DÍPTICO DOS NASCIMENTOS (1.57-2,52)
4. Nascimento de JoSo (l,57s)
6. Nascimento de Jesús (2,1-20)
Nascimento cercado de alegría em estilo lírico
Nascimento cercado de alegría Cánticos dos anjos e dos pastores
— 18 —
A INFANCIA DE JESÚS. EM LC 1-2
19
5. Cirauicisáo e manifestagtío
7. Circuncisáo e primera
(1,59-80)
(2,21-40)
de Joao
Circuncisáo de Joáo
Primeira mánifestacáo do
_ Pfoíeta Canuco de Zacarías Conclusáo: «o menino cresda...» (1,80)
maoifestarán de Jesús • -
Circuncisáo de Jesús Primeira manifestacáo do
Salvador em Jerusalém Cántico de Simeáo Condusáo: «o menino creada...» (2,40)
8. Episodio complementar (2,41-52)
Encontró de Jesús no Temple
(2,41-51) Conclusáo: «Jesús crescia » (2,52)
No quadro ácima a Visitacáo de Mana e o encontró de Jesús no Templo seriam episodios complementares dos respecti vos dípticos das anundacóes e dos nascimentos. 3.
Como se compreende, a distribuicáo das cenas assfcn
proposta nada tem de dogmático. Como quer que seja, parece
inegável que o Evangelista quis dispor os acontecimentos do Evangelho da infancia de modo a estabelecer um paralelismo e um confronto assaz minucioso entre JoSo Batista e Jesús Tal confronto redunda em nítida exaltagáo do Senhor Jesús: os tragos sombríos que caracterizam a historia de Joao Batis
ta se transformam em'vivas luzes nos episodios referentes a Jesús; há mesmo um certb contraste entre os genitores de Joáo e a mié de Jesús, assim como entre Joto e Jesús. 15 o que se depreenderá das seguintes consideracóes: a)
Os genitores do Precursor e a Máe do Messias
Segundo o uso normal, Zacarías é nomeado antes da sua esposa Elisabete (cf. 1,5). Ao contrario, María é nomeada antes de José — o que torna complicada a redagáo dé Le
l,26s. Ñas narrativas seguintes, María guarda sempre o primeiro plano, fícando José em posicáo um tanto apagada (á diferenca do que ocorre em Mt 1-2). O elogio dos personagens que abre cada um dos dípticos, deixa entrever a dignidade única de María. Com efeito, Zaca— 19 —
20
PERPUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 2
rías e Elisabete sao «justos diante de Deus» e irrepreensiveis frente á Lei do Senhor; María, porém, é cheia de graca, cheia de um favor (cháris, grapa em grego) que lhe vem diretamente
de Deus (cf. 1,30).
A esterilidade de Elisabete é, para esta santa mulher, um
opróbrio (cf. 1,25). Para a Virgem, é a conseqüénda. de «nao conhecer varao» (cf. 1,34), o que, segundo a opiniáo clássica, supóe em María o propósito de conservar a virgindade.
Joáo Batista foi concebido de maneira natural e terrestre (cf. l,23s).. Jesús, ao contrario, de maneira sobrenatural e celeste (cf. 1,35). Conseqüentemente, a alegría ocasionada pelo nascimento
de Joáo é alegría humana e terrestre (cf. 1,58), ao passo que,
quando Jesús nasce, a alegría vem do céu e é proclamada aos homens pelos anjos (cf. 2,9s).
Ao passo que Zacarías foi repreendido por sua falta de
fé, María foi louvada por sua fé: 1,20
1,45
«FIcarAs mudo...
«Bcmaventurada
porque nao creste
aqueta que creu,
em minhas palavras, que se cumprirfio».
pois as palavras do Senhor terSo seu cumplimento».
Por fim, o díptico das anunciacoes se encerra com certa
ironía: Zacarías, afetado pela mudez, nao pode responder ao anjo nem aos fiéis que o esperam (cf. 1,22); ao invés, María afirma sua plena adesáo á palavra de Deus: «Eis a serva do Senhor...» b)
(1,38).
Joño
(o Precursor)
e Jesús (a Metsias)
Entre os dois meninos, o contraste aínda é mais forte. Tenha-se em vista a etimología dos respectivos nomes, a qual sugere urna progressáo:
JoSa (Johanan) significa «Javé teve picdade»; Jesús (Jeshu'a) significa «Javé é Salvador», ou seja, efetua realmente a salvacáo. A dignidade dos dois meninos é afirmada respectivamente nestes termos:
Joao (1,15a) «será grande diante de Deas.. .> (1,15a); Jesús «será grande.. .»
(1,32a).
— 20 —
A INFANCIA DE JESÚS EMLC12
21
O mesmo adjetivo (grande, megas) ocorre de um lado e de outro, mas com matizes significativos. Jesús será grande sem mais... Ora o qualificativo «grande» como predicado («ser grande»), sem cláusula restritiva, é reservado a Deus só, na linguagem bíblica; cf. Tob 13,1; SI 47,2; 75,2; 85,10;
95,4; 135,5; 145,3; 147,5; Jer 10,6; Dan 14,40. Com relacáo aos homens, a S. Escritura utiliza ésse epíteto como simples qualificativo («um grande homem»; cf. Lev 19,15) ou com alguma cláusula que indique grandeza relativa: «homem gran de diante de Deus ou dos homens» (cf. Eclo 48,22; Gen 10,9; Est 10,3). A grandeza dos dois meninos é, a seguir, explicada; de um lado, vé-se um varáo justo e piedoso; do outro lado, alguém que possui a Filiacáo Divina:
•¿Ble converterá muitos dos íilhos de Israel ao Senhor seu Deus. Caminhará diante do Senhor com o espirito e o poder de Elias para converter aos filhos os caracúes
dos pais... a fim de preparar para o Senhor um povo bem disposto.
«O Senhor Deus Ihe dará o trono de Davi seu pai.
Reinará eternamente sobre a casa
de
Jaco, e
seu
reino
Ji&o terá
íim».
De um lado, tem-se urna missáo provisoria e preparatoria,
ao passo que, do outro lado, a missáo é eterna («seu reino nao terá fim»). De um lado, tem-se um profeta, herdeiro das qüalidade de Elias; do outro lado, o Reí messiánico («Filho de Davi»).
Eis, rápidamente delineados, a estrutura de Le 1-2 e o sentido teológico déstes dois capítulos: estabelecendo um con
fronto entre Joáo Batista e Jesús, o Evangelista intenciona por em realce a dignidade incomparável do Messias-
Todavia a intencáo do autor sagrado, ao redigir o «Evari-
gelho da infancia», parece ter visado ainda outra tese. É o que se concluirá de ulterior exame de Le 1-2. 2.
Na plenitude dos tempos o Senhor se apresento no Templo
O dinamismo que caracteriza Le 1-2 e que tende a realcar a figura de Jesús, pode ser um pouco mais claramente defi nido se se ponderam algumas outras características literarias dos dois capítulos. — 21 —
22
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 2
A secgáo Le 1-2 está toda perpassada de alusóes a textos do Antigo Testamento, dos quais os principáis sao Daniel
9,21-26 (a profecía das 70 semanas) e Malaquias 3 (a vinda do Senhor ao Templo). Vejamo-lo: 1)
Daniel 9,21-26
Eis o texto de que se trata: «Nao tinha eu terminado a oracáo, guando se aproximou de mim em vóo rápido — era a hora da oblacáo da tarde — Gabriel, o ser que tinha contemplado anteriormente em visao. Deu-me, para me informar, as explicacoes seguintes: 'Daniel, vim neste momento aqui para te esclarecer. Logo que havias comecado a tua oracáo, urna palavra foi pronunciada e eu vim dar-te a conhecer, porque és um horoem de predilecto. Presta, pois, atencáo a éste oráculo e compreende bem a revelacao: Setenta semanas foram lixadas ao teu povo e a tua Cidade Santa para conclusao da lnlidelldade, para cancelar os pecados e expiar a iniqüidade, para instaurar urna justica eterna, para encerrar a visao
e a profecía e para ungir o Santo dos santos. Pois sabe e compreende isto: Após a declarac&o do decreto sdbre a restauracao de Jerusalém até a uncao de um Chefe, haverá sete semanas; depois, durante sessenta e duas semanas, reaparecerá, será reedificada com pracas e fosso (de muralhas). No desenrolar dos tempos, após estas sessenta e duas
semanas, um Ungido será exterminado e ninguém por ele. A cidade e o santuario serao destruidos pelo povo de um chefe invasor. A ci dade acabará submergida e até o íim haverá guerra e a devastacao decretada'».
O texto ácima tem seus traeos obscuros. Apresenta, porém, o anjo Gabriel como portador de urna mensagem que se cum plirá dentro de 70 semanas, ou seja, após 490 anos... Ora note-se que no Antigo Testamento só há mengáo do
arcanjo Gabriel em Dan 9,21 e 8,16; o mesmo arcanjo reapa rece em Le 1,19, justamente no momento da oblagáo do sacri ficio (cf. Le l,9s), como em Dan 9,21.
Observe-se outrossim que a secgáo Le 1,5-2,22 oferece urna cronología assaz precisa dos acontecimentos narrados, fato éste qué chama a atengáó e que parece nao obedecer apenas a cuidados historiográficos do Evangelista, Também em Jo 1,29.35.43; 2.1 encontra-se urna cronología exata, segundo a qual o milagre das bodas de Cana se deu no sétimo día da vida pública de Cristo. O Evangelista Sao Joño frisa éste dado
cronológico, porque provávelmente quer assim significar que o Senhor comecou a creerla» o mundo no dia (sétimo) em que, conforme Gen 2, havia terminado a primelra criacao.
Tenham-se em vista os seguintes dados de Le 1-2: 22
A INFANCIA DE JESÚS EM LC 1-2
23
180 dias (on seis meses) decorrem entre o anuncio do anjo a Zacarías e o anuncio a María (cf. Le 1,26 e 36); 270 dias (ou nove meses), desde o anuncio a Maria até o
nasdmento de Jesús (cf. Le 2,1-7);
40 dias desde o nasdmento de Jesús até a apresentagáo do Senhor no Templo (cf. Le 2,22 e Lev 12,3). Em suma, 180 + 270 -f 40 dias perfazem 490 dias, ou seja, 70 semanas!
Trata-se de simples coincidencia? — Nao se pode provar
que naja mais do que coincidencia. Todavía existem indicios de que o Evangelista quis realmente dizer algo mais do que cronología ao apresentar as datas ácima: quis, sim, apresen-
tar os episodios da infancia de Jesús como urna resposta ao texto de Dan 9. Com efeito, registram-se certas passagens dos
anuncios do anjo a Zacarias e a Maria que parecem aludir a trechos de Dan 9-10 (a fim de nao alongar demasiadamente éste artigo, nao se podem enumerar aquí todas essas afinida des literarias). Observando tais traeos paralelos, julgam bons exegetas que Sao Lucas quis realmente apoiar em Dan 9 a cronología do Evangelho da infancia. Em outros termos: quis
realcar que entre a manifestacáo inicial do anjo no Templo e a manifestacáo de Jesús nesse mesmo Templo decorreu o número cronológico sagrado ou místico que Daniel consagrou na sua profecía das 70 semanas.
Está claro que o oráculo de Daniel nao se reíeria precisamente
á apresentacao de Jesús no Templo, mas se referia ao Templo de Jerusalém e tinha sentido messiánico (cf. «P.R.> 58/1962, pp. 421-28). Isto tora sido suficiente para que Sao Lucas aplicasse ésse oráculo á apresentacao inicial de Jesús, o Messias, no Templo.
Passemos agora á consideraejáo de 2)
Malaqim» 3
1. Os estudiosos reconhecem que as primeiras palavras do anjo a Zacarias evocam Mal 3 ou mais precisamente Mal 2,6; 3,L23s. Estes quatro versículos desenvolvem um só pensamento: em Mal 2,6 Levi é apresentado como o prototipo
do «mensageiro» cuja missáo será «converter» por sua palavra. Em 3,1 o Mensageiro aparece como aquéle que preparará
o camiñho do Senhor que há de vir ao seu Templo; em 3,23s
sao descritos o espirito e o modo de agir do mensageiro. Tal mensageiro, o Evangelho da infancia o identifica com Joáo Ba tista (cf. também Le 7,27).
— 23 —
24
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 12V1970, qu. 2
Eis o confronto dos paralelos entre Le e Mal (note-se bem
que Joáo Batista pertencia a urna familia sacerdotal ou levitica e que Mal 2,6 alude a Levi). Mal
2,6 3,1
Le
«Ele (Levi) converteu a mu ¡tos. Caminhou comigo. Preparará o caminho diante
de Mim. 3.23 Eis que vos enviarei... Elias
1,16 «Converterá (Joao) a muitos dos fillios de Israel. 1,17 E caminhará diantc déle no
3.24 file converterá
espirito
e
no
a íim de converter
os coragóes dos pais para os filh
poder de Elias,
os coracóes dos pais para os filnos».
A mesma profecía de Mal inspira a segunda parte do cán tico de Zacarías («Benedictus»), onde se diz que Joáo Batista preparará o caminho do Senhor: Mal
Le
3,23 «Eis que vos envió o profeta Elias.
1,76 «E tu, menino, serás chamado profeta do Altíssimo,
2,6
Ele caminhou
pais caminharás
3,1
diante de Mim
diante do Senhor
para preparar o caminho».
para preparar suas vias>.
2.
Pergtmta-se: que há de preparar Joáo Batista segun
do a profecía de Malaquias?
A resposta se encontra em Mal 3,1: «Eis que enviarei meu mensageiro para que abra um caminho diante de mim. E repentinamente entrará em sen Templo o Senhor que vos procuráis».
A liturgia realca a afinidade que há entre a entrada do Senhor Javé no seu Templo segundo Malaquias e a apresentacio do Senhor Jesús no Templo descrito em Le 2,22-40. Em Mal 3 e Le 2,22-40, a idéia dominante é a da inauguracáo dos tempos escatológicos ou messiánicos. Com efeito, em Mal 3,1 o Senhor Se manifesta aqueles que O procuram, e introduz «o día do Senhor»
(cf. Mal 3,2.17.19.21) — expressáo
esta que designa o aparecimento do Messias. Em Le 2,25-30.38, Jesús sé manifesta a Simeáo e Ana, piedosos representantes de Israel que, ao ver
— 24 —
A INFANCIA DE JESÚS EM LC 1-2
Essa inauguragáo dos tempos messiánicos ou escatológicos
acarreta um julgamento sobre os homens; cf., entre outros
textos, os dizeres de Mal 3,5. — Em Le 2, Simeáo prediz que a presenga do Senhor entre os homens «manifestará os segredos dos coracóes» (cf. v. 35) e que as situacóes dos homens seráo abaladas, pois Jesús «veto para a queda e o reerguimento de grande número déles» (cf. v. 34J. Mais aínda: Mal 3 alude a urna oblacáo sacrifica! que os levitas apreséntaráo «da maneira devida» (cf. v. 3) e que «será agradável aos olhos do Senhor como nos dias antigos»
(cf. v. 4). — A estes dados corresponden! a oblacáo de duas pombas por parte dos genitores de Jesús em Le 2,24 e prin cipalmente a oblacáo de Jesús apresentado ao Senhor em Le
2,22.
Poder-se-iam apontar numerosos
outros
paralelos entre
Mal 3 e Le 2,22-40; sao aqui omitidos por motivos de brevidade. 3.
As consideracóes exegéticas até aqui proposta ? suge-
rem a seguinte conclusa©;
Sao Lucas quis dar por trama ou estmtura de base ao
seu «Evangelho da infancia», dois textos do Antigo Testamento
■— Dan 9 e Mal 3 —, a fim de insinuar aos leitores que no Senhor Jesús se cumpriram as duas citadas profecías (e, cotn
elas, como se eompreende, os demais vaticinios do Antigo Testamento). Evidentemente o Evangelista nao quis fazer a exegese rigorosa de Dan 9 e Mal 3, mas apenas teve em mira mostrar que estes dois textos proféticos se referiam ao Senhor
Jesús e foram devidamente preenchidos quando veio o Filho de Mana á térra.
Mais precisamente: Dan 9 e Mal 3 falam da inauguracáo. dos tempos escatológicos ou messiánicos
..-
acompanhada de um juízo de Deus sobre os homens nnm ambiente de Templo e culto sagrados.
Ora Lucas rio seu Evangelho da infancia parece ter reto
mado ésses tres elementos e construido sobre éles as narracóes de Le 1,5-2,40. Todo o Evangelho da infancia está, desde os
seus inicios, orientado para a manifestacáo de Jesús no Tem plo; é esta tendencia dinámica que concatena as sucessivas
cenas de Le: colocando a infancia de Jesús sob a luz de tais vaticinios, o Evangelista quis mostrar que Cristo foi realmente o Messias prometido pelo Senhor Deus mediante os Profetas do Antigo Testamento. — 25 —
26
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 121/1970, qu. 2
O episodio da perda e do encontró de Jesús no Templo ooorrido quando o Senhor tinha doze anos (cf. Le 2, 41-52) ja nao pertence propriamente a infancia de Jesús; por isto nao é considerado neste
ensalo.
É preciso reconhecer que Sao Lucas fez ressoar em seu
«Evangelho da infancia» numerosos outros textos do Antígo
Testamento; Le 1-2 está todo impregnado da mentalidade e dos dizeres da Biblia; todavía tais outros trechos bíblicos nao tiveram, na redacáo de Le 1-2, a projegáo e a importancia que Lucas quis atribuir a Dan 9 e Mal 3. Pode-se agora passar á última questáo:
3.
Quol o género literario de Le 1-2 ?
O fato de que Sao Lucas utiliza táo freqüentemente as
Escrituras do Antígo Testamento, sugere a dúvida: terá o hagiógrafo em Le 1-2 descrito fatos reais ou forjado narra tivas imaginarias, adaptadas a textos do Antigo Testamento?
— Em resposta, dir-se-á: Le 1-2 refere acontecimentos históricos vistos á luz de textos do Antigo Testamenta Desen volvamos esta afirmacáo: 1)
Le 1-2 refere ocontedmontos histórico*
Em outros termos: Le 1-2 n&o apresenta pegas lendárias, livremente concebidas para ilustrar idéias religiosas, mas, sim, o relato substancialmente fiel, embora estilizado, de fatos reais. É o que se depreende das seguintes consideragóes: a)
no prólogo
(Le 1,1-4), o Evangelista professa sua
intencáoi de ser estritamente fiel h historia:
«Muitos empreenderam por em ordem a narragáa das coisas que entre nos se realizaram, de acordó com o que nos íoi transmitido por aqueles que as presenclaram desde o inicio, e que délas se íizeram os arautos.
Também a mlm, ó nobilissimo Teófilo, pareceu-rae bom, depois de me ter informado cuidadosamente de tudo desde o principio, escrever-te urna exposlcao ordenada dos fatos, para que conhecas plena mente a verdade dos ensinamentos em que leste instruido>.
Como notam os comentadores, seria, estranho que um escritor iniciasse a sua obra com a evocacáo da autoridade de suas fontes e se professasse um fiel servidor da palavra
— 26 —
A INFANCIA DE? JESÚS EM LC 1-2
27
e, logo depois, comegasse a escrever dois capítulos de pura ficcáo. Hár porém, quem julgue que Lucas tenha redtgido o seu prólogo exclusivamente em vista dos capítulos 3-24 do seu Evangelho; a seccáo 1,5-2,52 terla sido inserida posteriormente & redacao do prólogo. — A hipótese parece gratuita. Como quer que seja, é de crer que Lucas
nao terla introducido o «Evangelho da infancia» no seu livro se nao visse néle um relato de íatos reais.
b) no «Evangelho da iwfftn<»fcn>, Sao Lucas se refere a testemunhas oculares:
María, cujas reminiscencias ele duas vézes evoca: «Ma
na conservava cuidadosamente todas essas recordacóes em seu
coracáo» (Le 2,19.51); os vizinhos e parentes de Elisabete e Joáo Batista; cf. Le 1,58,66.
c)
o érame literario, do «Evangelho da infancia» de Le
leva as seguintes oonsideragóes:
«Aínda que aprésente traeos origináis, nao habituáis numa obra estritamente histórica, o Evangelho da infancia (Le 1-2) nao tem as características de urna composlcSo lendária. Sem dúvida, quem nfio aceita o sobrenatural, considera o conjunto das narrativas de Le 1-2 como míticas. Todavía tal prevenc&o preconcebida nao pode ser levada em seria consideracao. Por Isto a hlstorlcidade substancial de Le 1-2 nao pode ser seriamente posta em düvida... Do ponto de vista puramente literario, as narracCes nao tem o
colorido e as características de urna obra de íiecáo. Os protagonistas reaparecem em outros escritos de historieldade nao dúbia (os Evangelhos) e se movem em urna moldura topográfica suficientemente garantida. S. Muñoz Iglesias* demonstrou quanto as presumidas relacOes entre os Evangelhos da infancia e as descrieñes do nasclmento dos heróis pagaos (Sargon, Faraó, Buda, etc.) s&o Uteráriamente gratuitas.
Para convencermo-nos da objetlvldade das narracOes de Le 1-2, basta confrontar estes capítulos com os Evangelhos apócrifos: o Evan gelho de Tomé, por exemplo, o Evangeljio árabe da infancia ou o do Pseudo-Mateus. O que impressiona em tais narrativas, nao é o sobre
natural, mas a irracionalidade com que se manifesta o sobrenatural:
suas leís e sua finalidade. Nos apócrifos, a natureza se abala quando o Menino Jesús e sua mae viajam para o Egito; as árvores se indinam; as feras se amansam...
DescrlcOes désse género nao ocorrem
de modo algum no Evangelho da infancia de Lucas. Nenhum prodigio acompanha o nascimento do Messias, ocoxrido em um pobre tugurio; nao há extraordinaria intervencáo do céu para salvaguardar a sua
Ver bibliografía á pág. 29 déste fascículo.
— 27 —
28
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. qu. 2
vida, para tranquilizar os genitores angustiados quando o perderam ou para reconduzir o menino incólume á companhia dos país. Em Le 1-2, a narraeáo se desenvolve dentro de unía moldura modesta, sobria, destituida de pormenores inverossímeis ou absurdos. Embora a nar-
racio seja... prenhe de sobrenatural, ela é suficientemente concreta
para íazer compreender em que época, lugar e circunstancias os acontecimentos se deram.
Com isto, nao se quer dizer que se trate de urna crónica objetiva, de urna narracáo... desnudada de artiíiciosidade, ... embelezamentos; oontudo tais aspectos, examinados de per si e considerados ño con junto da obra, n&o comprometen* o caráter histórico de Le 1-2»
2)
... ci luz de textos do Antigo Testamento
Em Le 1-2 nao há crónica no sentido moderno, mas urna selecáo de relatos esporádicos. Estes relatos foram escolhidos em fungáo de urna intengáo teológica, a saber: mostrar como a infancia de Jesús faz eco a profecías e vaticinios do Antigo Testamento, de sorte que Jesús deva ser dito realmente o Messias prometido pelo Senhor Deus a Israel e a todos os povos.
Os israelitas fervorosos, desde remotos tempos antes de Cristo, costumavam servir-se da Biblia para fazer suas meditagóes; confrontavam ora textos sagrados com textos sagra dos, ora textos sagrados com acontecimentos históricos. Sao
Lucas refere em 2,19 e 51 que María costumava fazer o mésmo (alias, o canto do «Magníficat» é um tecido de citacóes bíblicas). —■ Ora o próprio Sao Lucas, em seu «Evangelho da infancia», observou também ésse tipo de meditacáo: estava convicto de que a vida de Cristo foi preparada por Deus (cf. 2,31); ela constituiu o cumplimento da palavra dirigida por Javé a Abraio, aos Patriarcas e aos Profetas (cf. 1, 55. 70. 73). Por isto o Evangelista apresentou aos seus leitores em Le 1-2 um confronto dos acontecimentos da infancia de Jesús com textos do Antigo Testamento. Tal género literario é o que os judeus chamavam «midrash» ou, mais precisamente, midrash do tipo haggadah: reflexáo, á luz de textos bíblicos, sobre o significado teológico de episodios históricos (no nosso caso, ... significado teológico da infancia de Jesús).
Faz-se mister, de resto, notar aquí o que já foi dito em «P.R.» 104/1968, pp. 321-332; o midrash nao é fábula, mas,
sim, apresentacáo de fatos reais, estilísticamente realcados a fim de comunicar um ensinamento teológico. — 28 —
PRIMADO DO PAPA E COLEGIALIDADE
29
Bibliografía:
J. Daniélou, «Os Evangelhos da infancia». Petrópolis 1969. Ortensio da Spinetoli, «Introduzione- ai Vangeli deU'Infanzia>. Bres-
da 1967.
R. Laurentin, «Structure et Théologie de Luc MI». Paris 1957. J. Galot, «Marte dans rfivangile». Paris 1958.
M. Zerwick, «Historia InfanÜae. Lucas I-n». Romae 1959. S. Muñoz Iglesias, «El Evangelio de la Infancia en San Lucas y las infancias de los héroes bíblicos», em «Estudios Bíblicos» 16(1957). pp. 329382.
III. 3)
DOUTRINA
«Fim do Papado? Divisáo entre os bispos e o Papa?
Que há na Igreja? Que é a cotegialidade?» Besumo da respoata: O Sinodo dos Bispos reunido em Roma, no mes de outubno de 1969, estudou a colegialidade do govémo da Igreja.
Cristo constituiu Pedro chefe visivel do grupo dos Apostólos e dá
Igreja inteira; cf. Mt 16,18s («Tudo que desligares sobre a térra, será desligado no céu...»); Le 22, 32; Jo 21,1517.
Todavía Cristo conoedeu tamben* a Pedro e aos onze apostólos conjuntamente os poderes de ligar e desligar (= governar a Igreja); cf. Mt 18,18.
Dónde se segué que a autoridade na Igreja pode ser exercida de
duas maneiras ou por dois sujeitos inadequadamente distintos um do
outro: Pedro, a sos; e Pedro com os onze Apostólos. Em ambos os casos, porém, requer-se a presenga e a agáo de Pedro, sem a qual nao ha autoridade na Igreja.
•
Ora o Concilio do Vaticano II reafirmou solenemente estes prin cipios do Evangelho, declarando o segulnte: as funedes do Apostólo
Pedro se prolongam ñas do Papa, sucessor de Pedro, e as do colegio (ou corpo) dos Apostólos se continuam ñas dos Bispos. Por conséguinte, a Igreja pode ser governada ou pelo Papa só ou pelo Papa e
os Bispos reunidos colegialmente. Compete, porém, ao Sumo Pontífice
convocar os Bispos para o exerelelo da colegialidade, como também
lhe compete aprovar ou recusar as decisñes do episcopado reunido; os Bispos nada podem determinar sem o Papa. .
Sendo assim, os Bispos reunidos no Sinodo em 1969 pediram ao Santo Padre Paulo VI mais assiduo exercicio da colegialidade. O pe dido era inspirado, entre outras coisas,, pelo caráter complexo .dos problemas de nossos tempos. Note-se também que o exercicio da cole gialidade é assaz facilitado pela rapidez dos meios de comunicacáo
— 29 —
30
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 12V1970, qu. 3
contemporáneos. Tal atitude dos Bispos nada tinha de contrario á
doutrlna e á disciplina da Igreja. Compete á prudencia do Santo Padre dar-lhe a resposta oportuna.
Bespossta: Em outubro pp. realizou-se ém Roma o II Sínodo Mundial dos Bispos, que muito chámou a atencáo do
público internacional Essa assembléia, composta de 143 Bis pos e tres Superiores Religiosos, provenientes do mundo inteiro, foi convocada para estudar as relacóes e a colaboracao entre o Santo Padre o Papa (que trabalha com a assessoria imediata da Curia Romana) e os Bispos do mundo inteiro. Estes tém-se reunido em Conferencias Nadonais, que dáo orientagáo a Igreja no respectivo país; ora é necessário haja consonancia entre os pronunciamentos pontificios e as declaracóes dos Bispos em seus territorios; a encíclica «Humanae Vitae», concernents la limitacáo da natalidade, deu ocasiáo a que éste ponto se tornasse bem evidente. Sabe-se que, por ocasiáo do Sínodo em outubro de 1969, o assunto foi vivamente debatido. Reafirmou-se entáo a cole gialidade do govérno da Igreja. Já que o assunto se prestou
a numerosos mal-entendidos, como se se tratasse de suprimir a autoridade papal, ñas páginas que se seguem seráo expostos
a nocáo de colegialidade e os termos exatos do problema deba tido no Sínodo.
1.
Advertencia preliminar
É preciso, antes do mais, observar que as questóes de govérno e hierarquia na Igreja nao sao as mais importantes,
embora sejam essenciais para a Igreja enquanto esta é pere
grina na térra. Com efeito, neste mundo a Igreja necessita de organizacáo e distribuicáo de fungóes; essa orgamzagáo,
porém (que tem seu aspecto jurídico), está a servico da san-
tificagáo das almas; ela deve fomentar a caridade. Esta é o
valor máximo da Igreja, o dom supremo que nao passará, enquanto outros valores desapareceráa
Todo Bíspo, todo pastor de almas, na Igreja há de pro curar suscitar e corroborar a caridade, consoante a palavra do Senhor: «Vim trazer fogo a térra» (Le 12,49) e a do Após^ tolo: «O amor de Cristo nos compele» (2 Cor 5, 14). Contudo é preciso notar que essa tarefa seria frustrada se nao fósse baseada na ordem e na harmonia que as leis estipulam e procuram assegurar.
— 30 —
PRIMADO DO PAPA E COLEGIALIDADE
2.
31
A ígreja na época dos Apostólos
Sempre se considerou, na teología, a época dos Apostólos como fase singular da historia da Igreja. Foi o período em que se colocaram as bases de um edificio que deveria subsistir pelos sáculos. Os Apostólos mesmos sao figuras cujo papel nao se repete na historia do Cristianismo. Com razáo o Apocalipse descreve a Jerusalém celeste colocada sobre doze fundamentos, cada nm dos qnals traz o nome de um Apostólo (cf. Apc 21,14). Sao Paulo, por sua vez, fala da posicjLo fundamental dos Apostólos: «Sois conddadáos dos santos e membros da fa milia de Deüs, edificados sobré o alicerce dos Apostólos e dos Profetas, com Cristo por pedra angular» (Ef 2,20). Em conseqUéncia, distinguem-se nos Apostólos duas espe
cies de. facuidades:
a) facilidades extraordinarias: cada Apostólo era apto a governar qualquer comunidade crista; Sao Paulo era o bispo de £feso, de Corinto, de Tessalonica... Sao Paulo era Bispo de Roma, das comunidades da Siria e da Asia menor.. .Cada Apostólo podía escrever cartas que, em última análise, se dirigiam á Igreja inteira. Em outros termos: cada Apostólo era Bispo de toda a Igreja e nao de urna porcáo apenas da niesma. Tais poderes eram exclusivos dos Apostólos; nao se transmitiram aos seus sucessores;
b)
.
facilidades ordinarias: eram as facilidades que de-
viam permanecer para sempre, transmitidas pelos Apostólos
aos seus sucessores. Essas facilidades ordinarias, os Apostólos
nao as possuiam todos do mesmo modo. Com efeito, Cristo
quis estabelecer Pedro a frente de seus irmáos, conferindo-lhe um primado, que seria sinal e garantía da unidade do. grupo
dos Apostólos e da Igreja. Na verdade, em tres passagens do Evangelho Jesús outorga a Pedro facuidades que sao próprias e exclusivas déste Apóstelo: Le 22,31s: «Simáo, Simáo, tís que Satanás vos redamou com insistencia para vos penetrar como trigo, mas en rognei por ti, pan que toa fé nSo desfalega. E tu, urna vez convertido, confirma teas irjnSos».
Mt 16,18s:
«Tu es Pedro e sobre esta pedra ediíicarei a minha
Igreja e as portas do inferno nao prevalecerfio contra ela. E eu te
darei as chaves do reino do céu. Todo o que ligares sobre » térra bco&
ligado no céu, e todo o que desligares sobre a tarro será desligado
no céu».
Jo 21,15-17: «Disse Jesús á Sim&o Pedro: 'Simáo, filho de JoSo, tu
me amas mais do que estes?'
— 31 —
32
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 12V1OT0, qu. 3 £Ie respondeu: 'Sim, Senhor, tu sabes que eu te amo*.
Disse-lhe Jesús: 'Aplacenta meas cordehros?. Perguntou-lhe novamente: 'Simfio, íilho de Joto, tu me amas?' — 'Sim, Senhar, tu sabes que eu te amo'. — 'Apascenta mlnhas oveDtas', repete Jesús. E pela terceira vez
lhe diz: 'Sünáo, filho de Joáo, tu me amas?*
Pedro entristeceu-se porque pela terceira vez Jesús lhe perguntou:
Tu me amas?', e respondeu-lhe: 'Senhor, tu sabes tudo; sabes que eu te amo'. — 'Apascenta mlnhas tnrelhas% disse-lhe Jesús».
Assim se vé que Pedro foi constituido pastor do rebanho inteiro de Cristo, desfrutando primazia até sobre os demais Apostólos, pois estes deveriam ser confirmados por Pedro na fé. Pedro foi estabelecido como rocha, ou seja, como última base visível sobre a qual a Igreja toda deveria pousar.
Em síntese: os Apóstelos receberam todos do mesmo modo os seus poderes extraordinarios e intransmissíveis. Re ceberam, porém, de modo diverso, os poderes ordinarios e transmissíveis, cabendo a Pedro a primazia dentro da Igreja.
Agora outra serie de textos evangélicos ünpde-se á nossa consideracáo.
3.
O colegiado
1. Jesús disse a Pedro: «Tudo o que tn ligares sobre a térra, será ligado no céu...» (Mt 16,19).
Disse, porém, a todos os Apóstelos, isto é, a Pedro e aos onze: «Tudo o que ligardes sobre a térra, será ligado no céu, e tudo
Déstes dizeres se segué que o mesmo poder de ligar e des ligar foi concedido, por inteiro, a Pedro só, que é a rocha, a Pedro juntamente com os onze outros Apóstelos. Isto quer dizer que a mesma faculdade de governar a Igreja (tal é o sentido das metáforas «ligar» e «desligar») pode ser exercida de duas maneiras: ou por Pedro só
ou por Pedro com os onze (nunca, porém, pelos onze sem Pedro).
— 32 —
PRIMADO DO PAPA E COLEGIALIDADE
33
Ha, pois, dois sujeitos do govérno da Igreja, mas dois su jeitos inadecuadamente distintos um do outro, pois em ambos os casos se requer a presenca e a participagáo de Pedro... Pedro pode governar a sos, como também pode governar em colegiado, ou seja, deliberando e decidindo juntamente com seus irmaos Apostólos.
É nestes textos do Evangelho que se baseia a doutrina muito atual do govérao colegiado da Igreja. O Concilio do Vaticano II explicitou-a, ensinando que, assim como Pedro esta para os demais Apostólos, assim está o Papa para os demais Bispos: «Assim como, por disposlcao do Senhor, SSo Pedro e os outros Apostólos constituem um colegio apostólico, paralelamente o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, e os Bispos, sucessores dos Apostólos, est&o unidos entre si» (Constltuic&o «Lumen Gentiun» n* 22).
Em outros termos, isto significa que, assim como o Papa pode governar a Igreja a sos (como Pedro), ele a pode gover nar .também com o colegio dos Bispos, ou seja, colegialmente (como Pedro com os onze Apostólos) '. Esquemáticamente, tem-se a seguinte figura:
Pedro
Papa
Onze Apostólos
Bispos
Éste esquema, entre outras coisas, dá a ver o seguinte: tudo o que Pedro possuia, ele o transmitiu ao Papa; tudo o que os Apostólos possuiam, éles o transmiüram aos Bispos, mas aos Bispos como colegiado, em seu conjunto,
nao a cada Bispo em particular; o colegio (conjunto) dos Bis pos é herdeiro do colegio dos Apostólos. Donde se segué que d colegio dos Bispos unido ao Papa pode governar a Igreja, como o colegio dos Apostólos unido a Pedro o podia. Nunca, porém, o colegio pode ou poderá agir sem Pedro ou sem t> Papa, que é a sua cabeca legitima instituida por Cristo. 1 A expressao «colegio (= grupo, conjunto) dos Bispos» causou hesitacGes entre os conciliares do Vaticano II. Na verdade, «colegas» no antigo Direito Romano sao os membros de urna socledade' que gozam todos igualmente dos mesmos dimitos e delegam a autoridade
a um colega para que éste a exerca em nome dos demais. Ora tal express&o podia dar a entender que o Papa nao goza senáo da autori
dade que os demais Bispos lhe delegam — o que seria falso. A ex pressao «colegio», por consegulnte, tem sentido próprio na linguagem
do Vaticano H, sentido diverso do do antigo Direito Romano.
— 33 —
34
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. gu. 3
2. Devem-se notar ainda dois pontos importantes relati vos ao govérno colegiado da Igreja: 1) O colegio dos Bispos unidos ao seu chefe visivel nao goza de autoridade maior do que o chefe visivel sóou o Sumo Pontífice. A autoridade do sucessor de Pedro é táo válida quanto a do conjunto dos Bispos associados ao Papa. Apenas se deve dizer que, quando se exerce o colegiado, há mais par ticipantes da autoridade suprema da Igreja; pode haver também mais ricas oontribtücóes humanas para o feliz éxito do govérno da Igreja. 2) Quando se exerce o colegiado, nao se estabelece na Igreja o regime parlamentar ou republicano. Na verdade, o Papa conserva sempre o seu lugar de Vigário de Cristo e Pri maz do colegio dos Bispos. Ao Papa tocam sempre direitos próprios e exclusivos; assim — o direito de confirmar ou tarnbém de rejeitar o que o conjunto
dos Bispos decida. É de crer que difícilmente ocorrerá um dissidlo entre o Papa e a maioria do episcopado; até hoje as decisSes colegia-
das na Igreja tém sido tomadas por quase-unanlmldade; tenha-se em vista a promulgacSo dos diversos documentos do Concilio do Vati
cano II;
— o direito de convocar o colegio dos Bispos e de dirigir a pauta dos trahalhos a ser apresentados á assembléia. O Papa pode reservar a si exclusivamente ou a urna comissüo de peritos por ele designados o nxamc da cortas qucstOes.
Eis o que diz o Concilio do Vaticano II: «Já que o Sumo Pontífice é a cabeca do colegio (dos Bispos), só
ele pode exercer determinados atos, que nao sao de modo al guiri da competencia dos Bispos: por exemplo, convocar e dirigir o colegio, aprovar normas para a sua atividade... Ao juizo do Sumo Pontífice, a quem fo! entregue o cuidado de toda a grei de Cristo, compete determinar, de harmonía com as necessidades da Igreja. que variatn com os tempos, como convém que essa missfio se exerca: de maneira pessoal ou de maneira colegial. O Romano Pontífice, quando se trata de ordenar, promover e aprovar o exercicio da colegialidade, em vista do bem da Igreja, procede segundo a sua própria dlscricao» (Const.
«Lumen Gentium» nota explicativa 3).
3. Ao Concilio do Vaticano II coube realcar a doutrina do colegiado a fim de completar as declaracóes do Vaticano I (1870). Éste só pdde definir o primado e a infalibilidade do Pontífice Romano; interrompido bruscamente pela guerra franco-alema, nao pdde acabar os estudos programados a respeito de outros aspectos da Igreja. Quem só levasse em conta os dizeres do Vaticano I, poderia conceber urna imagem me34
PRIMADO DO PAPA E COLEGIALJDADE
35
nos adequada da Igreja e de seu govérno; principalmente os irmáos separados (ortodoxos orientáis e cismáticos) sentiriam a falta de realce devido as funcóes dos Bispos no pastoreio do rebanho de Cristo. 4. Caso se perguntasse por que o Senhor Jesús quis que naja na sua Igreja duplo sujeito ou duplo exercício da um único poder supremo, poder-se-ia responder que ésse duplo su jeito corresponde a duas notas características da Igreja: esta é lina e é católica, universal. O exercicio do govérno por parte do Papa ou de maneira psssoal c direta corresponde á nota de unidade da Igreja; fa vorece-a e preserva-a. Por sua vez, o exercício da colegialidade preserva ou fomenta a catoliddade ou imiversalidade da Igre ja; possibilita melhor insercáo da Igreja ñas diversas regióes
e populaQóes do globo. Assim c que o Catolicismo pode tentar chegar mais e mais ao ideal de um pluralismo sadio dentro da unidade.
4.
O Sínodo de 1969
A luz de quanto foi até aqui explanado, pode-se compreender o tema debatido no Sínodo dos Bispos reunidos em Roma em outubro de 1969: varios dos Sinodais, entre os quais
os Cardeais Suenens (Malines-Bruxelas), Doepfner (Munique), Alfrink (Utrecht, Holanda), pediram exercício mais freqüente
da colegialidade no govérno da Igreja. Tal pedido nao consti
tuía algo de desarrazoado nem de rebelde nem de contrario á sá doutrina da Igreja. Tinha seus fundamentos na Escritura Sagrada e na Constituicáo «Lumen Gentium» do Vaticano II, como vimos atrás. Além do que, parecía sugerido pela situacáo histórica que atravessamos: os problemas com que a Igreja se defronta, se tornam por vézes muito complexos, pois assumem facetas variegadas de acordó com as diversas partes do
globo em que éles sao vividos; daí a vantagem de se ouvirem muitas autoridades sobre o mesmo assunto. No século passado
ou mesmo na primeira metade do século XX, talvez nao se pudesse pensar seriamente no exercicio assíduo da colegiali dade, pois os meios de comunicagáo nacional e internacional ainda eram relativamente insuficientes: o Papa nao poderia entreter-se com os Bispos de distantes regióes dentro do curto
prazo que as vézes a solucáo de um problema exige. Atualmente, porém, a civilizacáo evoluiu: nestes últimos anos já se pode usar o telefone ou o aviáo ao jato para obter contatos rápidos com o estrangeiro. É por isto que, dentro das circuns— 35 —
36
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. qu. 3
tandas recentes em que a Igreja se vé, muitos prelados manifestaram o desejo de que a colegialidade seja exercida mais freqüentemente do que nos tempos passados (alias, a colegia
lidade nunca deixou de ser praticada na historia da Igreja; tenham-se em vista os vinte eum concilios ecuménicos até hoje realizados). É o bem mesmo da Igreja que motiva nos Bispos o desejo de mais assídua colegialidade.
Ao Papa compete julgar tal pedido e dar-lhe a resposta
adequada. Paulo VI, no encerramento do Sínodo de outubro pp., prometeu atender aos votos de seus irmáos no episcopado; todavía nao se pode impor ao Sumo Pontífice um programa obligatorio. A Sua Santidade cabe ponderar as vantagens que possam advir do uso da colegialidade caso por caso. £ de frisar, portante, que no Sínodo de Roma em 1969 nao houve rebeliáo dos Bispos; nao se pensou em extinguir ou diminuir o poder papal; houve apenas legitima apresentacáo de motivos em favor de urna tese contida na S. Escritura e explicitada ao máximo pelo Concilio do Vaticano n. A re beldía tena consistido em se dizer, por exemplo: assim como
o conjunto dos Bispos nada pode resolver sem o seu chefe visivel, assim também o chefe visivel da Igreja, o Papa, nada pode decidir sem o colegio episcopal; o Papa entáo estaña
ligado ao corpo episcopal de modo a nao ter autoridade quando falasse a sos.
Ao invés, o anti-sinodo reunido simultáneamente com o
Sínodo em Roma é que deve ser tido como manifestacáo de
indisciplina. ¿órnente Deus julga as intencóes désses «sinodais»;
todavía as suas acusagóes dirigidas á Igreja e as suas reivin-
dicacóes fizeram por vézes eco á linguagem dos adversarios
da Igreja. É de lamentar a ocorréncia désse infeliz conciliábulo. Nao é, porém, a primeira chaga que se inflige á face humana
da Igreja; como as anteriores, é de crer que será saneada pela invencível vitalidade da Igreja que Cristo sustenta. A respeito, podem-se consultar:
Ch. Journet, «De la collégiallté», em «La Documentaron Calholi-
que» n« 1546, 7/DC/69. pp. 785-787.
ídem.
pp. 120-131.
«De la collégiallté»,
em
«Nova
et Vetera»
XL
(1965),
Diversos, «A Igreja do Vaticano II», sob a direcao de Frei Gui-
Iherme Baráúna, Petrópolis 1965.
Diversos, «La Teología dopo U Vaticano II», a cura di John Miller.
Brescia 1967.
— 36 —
OPINIAO PÚBLICA NA IGREJA
IV.
37
MORAL
4) «Opiniao pública na Igreja! Em que sentido pode ser entendida?
Tem díreltos on nao?» Resumo da. reposte: Por «opiniáo pública» entende-se nao somente o modo de pensar de urna coletlvidade, mas também a liberdade
de opinar em público e asslm, de certo modo, Influir no pensamento da ooletividade.
A opiniáo pública tem lugar justificado em toda sociedade bem constituida. Como o afirmou Pió XU, ela é cabível tambera dentro da S. Igreja, em relacáo aos assuntos que a fé ou a «analogía da íé» nao dirime. Verifica-se, hoje em dia mais do que nunca, o extraordinario al
cance que tfim os pronunciamentos públicos, principalmente em virtude dos meios modernos de comunicac&o social (imprensa escrita e telada). Sendo assim, é para desejar que quem íala publicamente na Igreja, leve sempre em considerac&o as exigencias da íé, da Justica, da caridade e da prudencia.
A fé pede que nao se proceda na Igreja como em urna sociedade
meramente humana, mas, considerando-se a índole dlvlno-humana da Esposa de- Cristo, se respeitem valores ai instituidos pelo próprio Deus.
A prudencia sugere que quem íala na Igreja, pondere bem os
posslvels efeitos de sua paíavra: proposlgoes aceltaveii podem ser mal
entendidas ou nocivas em auditorios nao preparados. Ha questOes que nao convém debate? em circuios de pessoas a quem tais proble mas nSo dizem respeito prdpriamente. Quem usa de radio e televlsáo,
as vézes arrisca-se a nao poder abordar certos assuntos com a profundidade e a riqueza de perspectivas que éles comportam; dai desejar-se
particular ponderacáo por parte de quem recorre a imprensa talada
ou televistonada.
Em última análise, o que o cristáo deseja quando move a opiniao pública, é que as verdades da fé sejam mais reconhecidas e vividas em sua pureza e integridade.
Besposta; A expressáo «opiniáo pública» tem sua origem no setor político-social. Pode significar 1) ou a libordade de falar em público numa determinada sociedade. Tal liberdade recorre a processos variados aptos
para suscitar determinado modo de pensar e querer dentro de
urna coletívidade. Entre ésses processos enumeram-se os «meios de comunicagáo de massa» (radio, televisáo, imprensa escrita, cinema...), cuja eficacia é cada vez mais senslvel;
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS* 121/1970, qu. 4
2) ou os resultados obtídos por tais processos, a saber: o próprio modo de pensar e querer da coletividade. Cada coletividade costuma ter sua opiniáo pública, ou seja, sua maneira característica de reagir ou de se comportar diante de certos fatos ou noticias. Os regimes totalitarios tendem a uniformizar a opiniáo pública, exercendo pressáo ou constrangimento sobre os súditos. O grau de democratizagáo de urna sociedade pode-se aferir pela liberdade de expressáo e de formagáo de opiniáo dessa sociedade. Ora a Igreja é urna sociedade. Por isto póe-se dentro da
Igreja a questáo: admite-se ai opiniáo pública? Que sentido pode ter ela?
Trataremos do tema considerando a legitimidade e os pre dicados de urna opiniáo pública dentro da Igreja; ao que se seguiráo alguns documentos ilustrativos.
1.
Opiniáo pública na Igreja : sim !
Nao há dúvida, na Igreja pode e deve ser deixada apre-
ciável margem á liberdade de opiniáo, tanto entre os clérigos
como entre os leigos. Em verdade, quando se torna membro da Igreja, o cidadáo nao perde os seus inalienáveis direitos humanos; entre estes, figura certamente o de opinar com liber dade, desde que a sá razáo ou a Palavra de Deus nao exijam o silencio ou determinada atitude.
A constituigáo da Igreja, fundada por Cristo, nao excluí
liberdade de opiniáo. Sem dúvida, á hierarquia competem as
funcóes do magisterio e do pastorado a servico de todo o povo
de Deus. Os fiéis leigos, porém, sao chamados a colaborar com a hierarquia, a fim de que toda a grei sagrada cresga na compreensáo da verdade e na vivencia da caridade. Aos
Bispos Cristo concede de modo especial o «carisma seguro da verdade» *; todavía a conservagáo e o crescimento da Igreja inteira na verdade nao estáo confiados apenas ao episcopado, mas ao povo de Deus no seu conjunto; os leigos sao chamados a refletir sobre as maneiras oportunas de se aplicar o Evangelho as situagóes concretas em que a Igreja se acha. Ora
i O Concilio do Vaticano II, na sua ConstituicSo «Dei Verbum» n' 8, fala da «pregacáo daqueles que, com a sucessSo do episcopado, receberam o carisma seguro da verdade».
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OPINIAO PÚBLICA NA IGREJA
39
tal tarefa supóe liberdade de expressáo e de diálogo dentro da Igreja. • A própria historia da Igreja dá a ver que o magisterio da Igreja sempre auscultou o modo de pensar e viver dos fiéis leigos; as definigóes e os pronunciamentos dos magisterio muitas vézes nao foram senáo a confirmacáo daquilo que todos os cristáos professavam e viviam desde muito.
Compreende-se, pois, que aínda recentemente o S. Padre Pió XII tenha proclamado a necessidade da opiniáo pública dentro da Igreja, como em toda sociedade sadia: «A opiniáo pública é o apanágio de toda sociedade normal com posta de homens que, conscientes do seu comportamento pessoal e social, estáo Intimamente ligados com a comunidade da qual sao menv
oros...; a opiniáo pública é o eco natural e a ressonáncia comum,
mais ou menos espontánea, dos acontecimentos e da situacao do mo mento na mente e no juizo dos cidadSos. Onde nao aparecesse qualquer maniíestacáo de opiniao pública, sobretudo onde fdsse notada sua real inexistencia, dever-se-la nisso constatar um vicio, urna eníermidade, urna irregularidade da vida social... Desejamos acrescentar urna palavra acerca da oplniao pública no seio mesmo da Igreja (obviamente: no tocante as materias delxadas á livre discussao). Tal palavra surpreenderla apenas aqueles que nao conhecem a Igreja ou a conhecem mal. Em verdade, a Igreja é um organismo vivo e lhe faltarla algo de sua vida se lhe faltasse a opi niáo; essa falta seria devida á culpa dos pastores e dos fiéis» («Discorsi e radiomessaggi», 19 fev. 1950, vol. XI, pp. 365 e 371).
Urna vez reconhecida a
legitimidade da opiniáo pública
fora e dentro da Igreja, convém considerar os predicados que devem caracterizar urna sadia liberdade de expressáo.
2.
E como. . . ?
O Concilio do Vaticano II abordou o tema «opiniáo pú blica» no seu decreto «ínter mirifica» relativo aos meios de comunicagáo social (imprensa escrita e falada), propondo as seguintes consideracóes: «Visto que hoje as opinioes públicas exercem grande autoridade
e coacáo sdhre a vida,
particular e pública,
de todas as classes de
cidadáos, é mister que todos os membros da sociedade cumpram também neste setor as suas obrigacSes de justica e caridade. Por isto, também com o recurso désses meios (imprensa escrita e falada), poríiem na formac&o e divulgacáo de retas opinioes públicas» (n' 8).
Como se vé, o Concilio lembra o extraordinario poder
de que gozam os meios de comunicagáo social para mover o — 39 —
40
«PERPUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970, qu. 4
comportamento dos homens. A palavra é realmente um instru mento de enorme alcance tanto para o bem como para o mal; o seu poder parece hoje em dia multiplicado pelos esmerados recursos áudio-visuais e pela fdrca do sugestionamento ampiamente empregados pela televisáo (que o radio e as revistas procuram acompanhar de perto). Daí a grande responsabilidade que toca aos que dispóem de tais recursos: empenhem-se por suscitar retas opinióes públicas. Éste imperativo, concernente la vida civil em geral, é par ticularmente exigente dentro da Igreja ou quando se trata de assuntos atinentes á fé, á moral e á disciplina cristas. Tais assuntos dizem respeito, direta ou indiretamente, a um patri monio sagrado, cujo valor é vital e capital. Quem, por sua imprudencia, concorre para que os homens percam a estima da fé e o zélo pela genuína causa de Cristo, torna-se especial mente responsável diante de Deus e de seus semelhantes: a justiga e a caridade devem nortear profundamente os clérigos e os leigos que susdtem ou orientem a opiniáo pública na Igre ja, a fim de que essa opiniáo seja reta. De modo particular, importa salientar duas características
que háo de nortear os responsáveis pela opiniáo pública na Igreja: 1)
Fé
A Igreja nao é sodedade meramente humana. Embora tenha sua face humana bem sensível, nela vive o Cristo, o qual Lhe prometeu sua assisténda até o fim dos sáculos (cf. Mt 28,20). Na Igreja, portante, há elementos humanos, reformáveis, e elementos divinos, irreformaveis; a autoridade na Igre ja, por exemplo, embora traga a marca dos homens, nao é exercida simplesmente em nome dos homens; ela vem a ser contmuagáo da missáo que o Pal confiou ao Filho; dizia Jesús,
referindo-se aos Apóstelos:
«Assim como Tu, Pai, me enviaste ao mundo, também Eu os envío ao mundo» (Jo 17,18). Compreende-se entáo que um fiel católico olhe sempre para a Igreja numa atitude de fé. Isto nao quer dizer que feche os olhos as deñciéndas que possam ocorrer na face hu mana da Igreja; ao contrario, reconhecer tais falhas e pro curar contribuir para corrigi-las é dever imperioso de todos os cristáos (o cristáo nao deve ser simplório ou infantil). A fé,
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OPINIAO PÚBLICA NA IGREJA
41
porém, ensina ao católico que todo debate na Igreja deve levar em considerac&o o chamado «depósito da fé»J no fundo de cada tema teológico ou disciplinar que se debata, há certos dados intocáveis, dados (proposicóes) que vém da parte de Deus; ésses dados, através das discussóes, nao podem sofreí' detrimento, mas, ao contrario, seria para désejar que fóssem realcados e abrilhantados, porque sao essenciais á vida crista:
Que pode almejar um católico com mais ardor do que a estima
é a difusáo das verdades da fé?
Em outros termos: quem ama o Cristo, nao pode deixar de desejar ardentemente que a Palavra de Cristo seja, sini)
depurada de toda crendice, supersticáo e religiosidade infantil;
seja desvinculada de todo costume arcaico ou tradicáo obso leta. Mas quem ama o Cristo, deseja que a Palavra do Senhor guarde o seu conteúdo auténtico transmitido pela voz oficial da Igreja, que o Senhor mesmo instituiu. Em sua alocucSo de 23/6/69, o S. Padre Paulo VI apontava entre
«os graves pericos que ameacam a Igreja de Deus» «... um diminuido senso da ortodoxia doutrinal frente ao delicado depósito da íé (cf. 1 Tim 6,20), que a Igreja herdou da pregacfio apostólica originaria, expressa na Sagrada Escritura e na autentica Tradicao, depósito que Ela meditou e atestou em seu enslnamento responsável, eob a guia do Espirito Santo que Cristo Lhe prometeu> («La Documentation Catholique» LXVI, 6/7/69, n' 1543, p. 607). 2)
Prudencia
Quem fala ou escreve sobre assuntos de fé, moral e até de disciplina da Igreja, há de levar em conta o auditorio a que se dirige ou os ambientes em que sua palavra vai ecoar.
Há opinióes teológicas que, proferidas entre teólogos, podem ser estimuladoras de novas pesquisas e benéficas, mas, levadas
a circuios de pessoas católicas simples ou menos preparadas, causam perplexidade. Em tais casos, é necessário que quem
fala saiba graduar as suas opiniñes de modo a edificar, vivifi
cando a fé em vez de a solapar: «para a vossa edificacáo, e nao para a vossa ruina...», diz o Apostólo (2 Cor 10,8).
A prudencia sugere também a seguinte pergunta: emborá
seja oportuna a livre troca de opinióes entre os homens, convém ao bem comum (dos católicos e dos nao católicos) que todos os problemas da vida católica sejam debatidos em foro público? Existem, sim, questóes delicadas e extremamente
complexas, que só podem ser avalladas e discutidas com efica cia por pessoas competentes; aqueles que nao tenham o conhecimento exato de tais assuntos, podem equivocar-se sobre o — 41 —
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«tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970. qu. 4
teor dos debates e até julgar-se obrigados a. interferir cota propostas pouco adequadas.
Especial ponderacáo requer-se da parte daqueles que usam
os meios de comunicacáo social (imprensa, cinema, radio, televisáo) para abordar problemas da Igreja (celibato do clero, encíclica sobre o controle da natalidade, indissolubilidade do vinculo matrimonial...). Tais meios atingem pessoas de todos os niveis de cultura (profana e religiosa) e de variados credos (católicos fervorosos, católicos em dúvida, protestantes, espi ritas, agnósticos, ateus...). Quem recorre a tais meios, é obrigado, nao raro, a simplificar os problemas, sem poder levar em conta todas as suas facetas. É também muitas vézes impelido a usar os recursos de encenacáo, emocionamento, impresionismo próprios da televisáo, do radio, das revistas, recursos estes que podem redundar em detrimento do rigor
lógico, dos matizes e dos valores de fundo dos temas aborda dos. Em tais condicóes — pergunta-se — que probabilidades
restam de se formarem e incrementarem «opinióes retas», expressóes do «senso da fé» do.povo de Deus? Nao é mais provável que assim se disseminem modos de ver um tanto deteriorados e equívocos? E a disseminacáo de tais modos de
ver nao constituirá posslvelmente um entrave a um posterior estudo sereno c rsepnosável dos problemas? ... nao consti tuirá urna forma de pressáo sobre o magisterio da Igreja, forma de pressáo exercida talvez de boa fé, sem previsáo de todo o seu alcance?
Por isto em junho de 1969 dizia o Santo Padre Paulo VI a um grupo de Religiosos que se dedicavam ao apostolado dos meios de comunicagáo social: rDeveis ponderar nao sómente o interésse que unía noticia possa suscitar, mas haveis de considerar também os efeitos bons ou nocivos que a divulgado da mesma possa produzir, tendo em vista de modo
especial a vida católica a cujo incremento vos vos dedicastes. A adesáo as diretivas da autoridade eclesiástica responsável conferirá nao sómente maior crédito ao vosso trabalho, mas também maior mérito. Jamáis prevalecam sobre a.retidao do vosso servico apostólico nem
opinloes particulares,
destoantes da lealdade profissional e eclesial,
nem lnterésses estranhos á causa do apostolado, nem motivos de pres tigio oh outros que sejam!» («L'Osservatore Romano», 29/VI/69).
Ainda a propósito ocorre mencionar a constituigáo «Lumen Gentium» do Concilio do Vaticano II: ao tratar dos leigos na Igreja, lembra-lhes que «tém o direito e, por vézes, até o dever de exprimir suas opinióes sobre as coisas que se relacionam com o bem da Igreja:*. Pede-lhes, porém, que o fagam, «se — 42 —
OPINIAO PÚBLICA NA IGREJA
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fér o caso, através dos órgáos para tal estabeleddos na Igreja e sempre com... prudencia... e caridade para com aqueles que, em razáo de sua fun£áo sagrada, representam a pessoa de Cristo» (m 37).
Destarte o Concilio teve em mira evitar que problemas de índole estritamente eclesiástica ou religiosa se tornem objeto do comentario de pessoas as quais tais questóes nao dizem respeito própriamente. Os valores da Religiáo e da própria fé poderiam assim padecer menosprézo e descrédito. O bem comum, portante, pede que todos aqueles que falam na
Igreja procurem medir devidamente o alcance e a oportunidade de suas palavras. Fonderem a quem se dirigem e falem de maneira correspondente á compreensáo de seus ouvintes, tando scmpre em vista os interésses genuinos de Cristo e da Igreja. Quem aponta problemas, deve também ponderar que nem
sempre é fácil ás autoridades encontrar de imediato a solucáo respectiva; nao raro tal solucáo tem de ser adotada gradatívamente, em atencáo aos diversos tipos de pessoas e forma-
cdes dos membros do povo de Deus. A demora entáo pode suscitar impaciencia, com se compreende; todavía, por amor ao bem comum ou a fím de evitar divisSes daninhas, o homem de Deus tempera seus pronundamentos. Procura assim nao dar lugar ao que o S. Padre Paulo VI descreve na sua entídica «Ecdesiam suam»:
«O espirito de independencia, de critica, de rebeliáo mal se concilia com a caridade que anima a solidariedade, a concordia, a paz na Igreja; ele transforma fácilmente o diálogo em discussSo, em dissídio. Tal fenómeno é profundamente doloroso, embora infelizmente possa sempre ocorrer com facilidade; contra ele exorta-nos de antemáo a voz do Apostólo: "Nao naja divisSes entre vos' (1 Cor 1,10) > ín* 119).
Espirito de fé e espirito de prudencia. .. Eis, pois, duas notas que, juntamente com a caridade e a justíca, devem nor tear quem levante a voz na Igreja para criticar algo de sua face humana, movendo assim a opiniáo pública. A propósito, podem-se recomendar os seguintes escritos: -214.
«La Chiesa contestata», em «La Civiltá Cattolicas. l/n/69, pp. 209«Opinión! ed 'opinione' neDa Chiesa», ib. 19/VII/69, pp. 105110. «Sacerdozio in crisi», ib. 5/VII/69, pp. 3-8.
Jorge Mejia, «El principio de autoridad en la Iglesias, em «Crite rio* 24/VII/69, n' 1576, pp. 494-498.
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 12171970, qu. 4
APÉNDICE Em apéndice, seguem-se dois documentos que se referem a um dos mais importantes pronunciamientos efetuados nos últimos tempos dentro da S. Igreja: o do Cardeal Léon-Joseph Suenens, de Malines-Bruxelas, que, em entrevista publicáaa em «Informations Catholiques Internatíonales» n» 336,15/V/69, pp. II-XVI, propos observagóes acerca do exercício da autoridade no povo de Deus. Nessa entrevista, S. Eminencia declarou «estar fazendo o
processo do juridismo, nao do direito; do autoritarismo, nao
da autoridade; do legalismo, nao da lei; da esclerose, nao da ordem; da uniformidade, nao da unidade» (ib. p. XV).
Sem proferir juízo algum sobre os dizeres do Cardeal Suenens, publicamos aqui o texto de comentarios feitos a tais dizeres. As palovras de Paulo VI
O primeiro comentario (embora carega de alusáo explícita ao Cardeal Suenens) foi proferido pelo S. Padre Paulo VI aos
23/VI/69, numa alocugáo ao Colegio Cardinalido. Chamam a atengáo na passagem abaixo o tom equilibrado e a humildade do Pontífice, que, de um lado, verifica certo exagero ñas contestagóes, mas, de outro lado, promete levar em conta quanto lhe é apresentado: «Nao podemos ficar insensíveis as criticas — nao sao todas exa
tas nem justas, nem sao sempre respeitosas e oportunas — que de
diversos lados se dirigem a esta Sé Apostólica, designada oela expres-
sao mais fácilmente vulnerável de 'Curia Romana'. Seria fácil, e talvez
necessário, retilicar certas aíirmacoes que se encontram nessas objec6es severas e veementes. Mas julgamos que o povo de Deus, infor mado pela verdade das coisas e esclarecido pela esperanca que nasce da caridade, poderá fácilmente realizar essa tarefa.
Diremos apenas que meditamos com serenidade as observagoes dirigidas a esta Sé Apostólica. Fazemo-lo com dois sentimentos. Em primeiro lugar, um sentimento de humilde e sincera objetividade, pronta a tomar em consideracao as razóes plausiveis dessas atitudés divergentes, disposta a modificar as posicoes puramente jurídicas que
existem, desde que
seja razoável
faze-lo.
Com eíelto, desejariamos
renovar de manelra 'continua e interior o espirito da legislacSo canó nica, para melhor servir á Igreja e a fim de que a missáo desta no mundo de hoje se desenvolva de maneira benéfica e eficaz. Estamos
também dispostos a compreender e acolher as- boas inspiracSes' parti culares de um legitimo pluralismo na unidade.
Poder-se-ia ver urna prova de Nossos sentimentos, e mcsmo de nossas resolucoes a tal respeito... na convocacáo do Sínodo extra44
OPINIAO PÚBLICA NA IGREJA
45
ordinario, no grande trabalho, atualmente em curso, da revisáo do Direito Canónico, com recurso a ampias e múltiplas consultas...» ULa Documentation Catholique» LXVI, 6/VÜ/69, n' 1543, pp. 607s).
A entrevista do Cardeal Léger
O Cardeal Léger deixou em 1968 a sua arquidiocese de Montréal (Canadá) para ir trabalhar entre os pobres e enfer mos do Camerum (África). Aos 22/VI/69, o jornal «Corriere della Sera» publicou urna entrevista de S. Eminencia assim concebida: «Será que no Camerum... chegam a V. Eminencia os ecos da tensao que existe no seio da Igreja atual? Que pensa V. Eminencia a xespeito de certos discursos sobre o fim do Papado e de certas entre vistas de Cardeais? — A Igreja hoje se encentra por certo em urna situacáo de grave mal-estar. Ela assim esta, porque, entre outras causas, se íala demáis, se escreve demais e nao se tem o tempo de reíletlr, de meditar, de orar (e mesmo de estudar)...
La onde estou, na Áírica, nao se íala da morte de Deus, porque Deus é a presenca mais averiguada por todos: animistas, muculmanos, e crlstáos recentes.
Lá nao se fala da morte do Papado porque o Papado na África
nao é distinto da Igreja e a Igreja só agora comeca a ser descoberta pelas grandes massas africanas.
Sei o que signiílcam tais expressOes. Mas nao compartilho a malaria das preocupacoes que as Inspiram. O Cristianismo é a verdade animada pelo amor. Onde está, o amor, hoje em dia, em tantas pessoas que se proclamam portadoras de 'verdade'? Ora o mundo precisa, antes do mais, de ser amado. Pois urna verdade sem amor já nao é urna verdade; é urna geometría abstrata, um sofisma, urna arquitetura de palavras.
Sim; falemos de reformas de estruturas dentro da Igreja. Mas nao esquejamos que urna Igreja altamente institucionalizada, como a de Pío XII, iluminou o mundo ñas trevas da guerra e que, com urna Igreja igualmente Institucional, Joao XXEII suscitou a alegría e criou a esperanza no mundo. Nao seráo as instituicCes mais ou menos trans formadas que salvaráo a Igreja, mas o espirito que anima as novas estruturas.
Nao me parece justo que um Cardeal, como o arcebispo Suenens, de Malines-Bruxelas, espalhe profusamente em j ornáis e conferencias públicas suas oplniSes sobre o govérno da Igreja, sobre o melhor modo de esoolher o Papa, sobre a legitimidade da funcáo dos Nuncios. Adia rla mais respeitoso que isso tudo fósse discutido primeiramente com outros bispos e Cardeais, para ser depois apresentado conjuntamente ao Sumo Pontífice. De resto, há pontos sobre os quais o Cristianismo precisa nao de oplniSes, mas de certezas e exemplos, como a fidelidade ao Vigário de Cristo, a uniáo dos bispos e Cardeais em torno da Cátedra de Pedro. O Papa pode ser exortado, mesmo admoestado, como o fazia Santa
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 121/1970, qu. 4
Catarina de Sena com os Papas de Avinháo, contanto que o considerem, segundo a definigSo daquela grande italiana, como 'ó doce Cristo sobre a térra*.
Hoje em dia a opiniáo pública é muito desabusada; admite perfeitamente que se queira reduzir o Papa a um presidente de clube e a Igreja a um imenso Rotary — salvo todo o respeito devido a essa benemérita institulcáo — em que as pessoas se encontram periódica mente para expor suas próprias oplni&es em t6mo de urna mesa e
'praticar um pouco de bem*. Parece-me insensato que tenham deixado falar de 'cassacáo de santos', apresentando o problema de maneira infeliz e quase provocante. Todo o conteúdo da íé parece-me assim estar em causa.
A primeira heresia do Cristianismo íoi a gnose, isto é, a tentativa de racionalizar por completo a fé. É precisamente o que hoje tentam imprudentemente íazer, como se íósse obra meritoria cancelar a nota de misterio, de profundidade mistica... que se encontra em toda verdade da revelacao crista.
Proponho um silencio temporario na Igreja para dar lugar a muita reflexáo e oracáo. A mim, no Terceiro Mundo (que me aceitou preci samente porque fui para lá a fim de lá ficar), por certo nao faltará
tempo para meditar.
E na solidáo a voz de Deus, que estimula a ter esperanca em favor da Igreja e do mundo, íaz-se ouvir distintamente como urna cancáo de primavera» («La Documentation Catholique» LXVI, 20/VII/69, n' 1544, p. 681).
Estéváo Bettcncburt O.S.B.
CORRESPONDENCIA MIÜDA Marisa (Florianópolls): «Jesús falava em parábolas para obcecar
os seus ouvintes e assim impedMos de chegar á salvacáo? Ele nao veio salvar todos os homens?»
— Os textos de Me 4,lls e Le 8,9s sugersm que Jesús falava em parábolas para que os ouvintes nao compreendessem. Todavía o texto de Mt 13,13 diz-nos que Jesús assim falava porque o povo estava mal disposto e nutria preconceitos que o impediriam de compreender outro tipo de catequese. — Ora os textos de Me e Le devem ser entendidos
á luz do de Mt. Eis, pois, como se nao de compreender as passagens
ácima:
Jesús veio procurar e salvar o.que perecerá (cf. Le 19,10). Por isto falava em parábolas — método simples e vivaz, que devia des pertar o interésse dos ouvintes. Os judeus nao teriam entendido o
plano de Deus se lhes tivesse revelado ¡mediatamente ésse plano gran dioso e misterioso, do qual íazia parte o paradoxo da Cruz. As pará bolas, portante, sao urna expressáo da benigna pedagogía de Deus, que quería atrair os homens.
Ouvindo as parábolas, os discípulos deveriam interrogar o Senhm
Jesús a seu respeito. Foi o que fizeram os Apostólos, que estavam
abertos para o ensinamento do Mestre (cí. Mt 13,36; 15,15; Me 4,10); o Senhor entSo lhes explicava o seu pensamento; assim as parábolas eram salutares para ouvintes bem dlspostos. •
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RESENHA DE LJVROS
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Todavía boa parte do povo de Israel, imbuida de falsas expectati
vas, ílcava indiferente aos ensinameritos de Jesús; ouvia, mas nao interrogava o Mostré. Em conseqüéncla, para os coragoes mal di» pastos, as parábolas permaneciam esteréis, e o enslnamento concebido como meio de salvacSo se fazia ocasiáo de ruina. É á luz desta explicacao que se deve entender também o texto de Is 6,9s, citado em Mt 13,13-15. — NSo ha, pois, motivo de perplexidade ñas passagens apresentadas. Cf. «P.R.» 3/1957, pp. 23-25.
E.B-
RESENHA DE LTVROS Rezar os salmos hoje; traducáo do original .hebraico por Carlos Mesters e Francisco Teixeira. — Livraria Duas Cidades, Sao Paulo
1969, 120 x 1280 mm, 150 pp.
Livro que apresenta o texto de 70 salmos, traduzido para um por tugués vivo e atual. Os tradutores (dois carmelitas de Belo Horizonte) evitaram os semitismos e arcaísmos de linguagem. Cada salmo é pre cedido de um titulo sugestivo e de textos do Novo Testamento, que ajudam o leitor a perceber o conrteúdo cristao do salterio. Em apéndice, os autores
da
obra propSem urna
dlstribuicño de
salmos para a oracao da manhá, da tarde e da nolte de cada día da
semana. Também sugerem situagSes da vida cotidiana que Inspiram
o uso de cada um dos 70 salmos apresentados: «Estou na íossa! Nao tem mais solucáo! Nao sei mais o que fazer!» (SI 13 e 43). «Os passa-
rlnnos fugindo c esvoacando, assustados pelo tiro do cacador» (SI 11). «A chuva e o orvalho que caem e irrigam a térra, ajudando-a a pro-
duzir os seus frutos» (SI 71 e 84)...
Sabemos que os salmos íoram redigidos muito antes de Cristo, em circunstancias de vida bem diferentes das modernas; conseqüente-
mente, á primeira vista pouco signlílcam para muttos crist&os de nossos tempos. Conscientes disto, os dols tradutores carmelitas nos
mostram que os salmos exprimem o que vai na alma de todo homem
peregrino na térra; feita a auténtica traducao do expressionismo ori
ental antigo, o salterio se torna rico alimento para .a vida de oracao do cristao contemporáneo.
O trabalho dos dois tradutores foi ousado; já tem sido controver
tido, pois a traducao por éles apresentada perdeu
muito do sabor
semita e oriental que caracteriza os textos bíblicos. Todavía nao se
pode dizer que a obra tenha caido no banal; ao contrario, é perpassada de dignidade. Trata-se de urna tentativa de assoctar erudicáo e pas
toral numa só obra — o que é plenamente válido. A execucao — já em si íeliz — poderá sofrer retoques e melhoramentos. Desde já,
porém, recomenda-se calorosamente a obra dos dols tradutores car-
melitas.
Gofo da Assembléla Crista — I (do 1' domingo do Advento até o 1» domine» da Epifanía) por Thierrry Maertens e Jean Frisque; tra ducao de Maria Cecilia Duprat. — Editora Vozes, Petrópolis 1969, 160 x 230 mm, 334 pp.
O antigo «Guia da Assembléla Crista» da Abadia de S. André (Bélgica) acaba de ser inteiramente refeito, visto que as leíturas da Mlssa foram selecionadas recentemente segundo novos criterios.
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«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 121/1970
A obra refundida estender-se-á por nove volumes; está saindo era .oito linguas diferentes. Apresenta os comentarlos dos textos bíblicos da Liturgia para cada día do ano (e nao sámente para os domingos, pois cada dia tem leituras próprias na Liturgia renovada). Aos do mingos os comentarios sSo maís ampios, abrahgendo também temas de doutrina teológica (conversao, liberdade, vigilancia, sentido cristao dotempo...). As passagens bíblicas sao colocadas no respectivo con
texto literario e histórico, de modo a se compreender precisamente o seu sentido literal; a seguir, a sua mensagem é explanada de modo a alimentar a ptedade do cristáo. A doutrina é sólida; nao se perde, porém, na erudtcao, mas apresenta perspectivas muito belas, que estiraulam realmente o leitor a urna vivencia crista inspirada pela Biblia e a Eucaristía.
O qne é ser cristao, por Joseph Ratzinger; traducáo de Geraldo Honorato Michel. Colecáo «Idéias e Vida» 9. — Edlgoes Paulinas, Ca> xias do Sul 1969, 110x175 mm, 123 pp. O volume reúne diversos trabalhos do autor, que é um dos prin cipáis discípulos do grande teólogo Karl Rahner: tres sermoes profe ridos na catedral de Münster no advento de 1965; um artigo sobre «a estrutura sacramental da existencia crista»; meditacSes para sexta-feira e sábado santos transmitidas pela Radio Baviera em 1967. Ratzinger focaliza na vida crista a fé, a esperanca e a caridade; realca-a como servioo, que se opoe ao individualismo e ao egoísmo; exalta o sentido da historia, cenarlo no qual o reino de Deus se vai realizando de maneira misteriosa. ~ Muito fecundas sao as conslderacoes do autor sobre o significado das realidades materiais: estáo prenhes de valores transcendentais: «quase poderíamos definir o homem como urna esséncia capaz do Divino... A vocac&o para a éternidade o constituí um homem> (p. 84). O íato de que os bens espirituais e eternos estao associados a realidades concretas e por estas se comunicam, constituí o fundamento sacramental da existencia crista. Profundamente teológicas sao as meditacoes fináis do Iivro. Em geral, éste se destina a quem tenha certo preparo religioso e esteja afeito as obras dos teólogos alemáes, cujo estilo literario muito difere do latino.
O cristao na hora jtedstva, Córdufe», por Hans Urs von Balthazar; traducáo de C. Ferrário. Colecao «Idéias e Vida» 10. — Edicdes Pau linas, Caxias do Sul 1969, 110x175 mm, 143 pp. Foi finalmente traduzido para o portugués o Iivro ácima, que
muito chamou a atencao no seu original alem&o e em traducdes
européias.
O autor é um dos grandes teólogos de nossos dias, que, com linguagem forte, examina a atual crise de fé. Verifica que sob o vemlz
da erudicáo muitos cristSos solapam a fé e tentam «suavizar» a vida crista, de modo a guardar palavras sem alma ou sem conteúdo: <Só lhes fica urna fé análoga em urna Palavra (de Deus) análogamente entendida, pelas quals (íé e palavra) só valerla a pena moirer análoga mente, como só análogamente vale a pena viver o seu cristianismo.
Vé se entre tantos 'professdres* encontras pelo menos alguns confessores» (pp. 7s). Em vista da crise, o autor mostea que o martirio ou o testemunho dado até o derramamento do sangue está no amago
da mensagem do Evangelho; Jesús exige coeréncia da parte de seus
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discípulos, coeréncia que implica disciplina e sacrificio para que o Evangelho seja transmitido na sua integridade e pureza. A Igreja precisa de santos, «precisa de figuras que nos guiem como íarois...
Nao é exato que nada possamos fazer para obter santos ou para ser
santos... Antes tarde do que nunca» (cf. p. 143).
Em seu estilo veemente, o autor toca as raias do sarcasmo; provocou polémica, principalmente por fazer alusóes desfavoráveis a cer tas posic5es de abalizado teólogo Karl Rahner. Todavía a voz de Urs
von Balthazar tem seu lugar oportuno no concertó das vozes católicas de nossos tempos. O livro impressiona pelo ardor de espirito e o tom profético que o inspiram.
Teología da Pobreza, por Karl Rahner; traducüo de E. Royer. Colecao «Pontos controversos» 3. — Edic5es Paulinas, Caxias do Sul 1969, 120 x 175 mm, 101 pp.
Nos últimos tempos as comunidades religiosas vém experimentando a necessidade de rever a pirática da pobreza religiosa. Com efeito, a necessidade de exercer apostolado e missáo no mundo de hoje impóe
aos Religiosos o recurso a aparato vultoso (cursos, instrumentos caros, bibliotecas especializadas, viagens...), que supóem financiamento e instalacSes de monta.
O jesufta Karl Rahner, com seu fino espirito teológico, aborda o problema, sem pretender esgotá-lo. Entre outras linhas de solucáo,
preconiza a «ascese do consumo»: tendo que usar dos recursos déste
mundo, saibam os Religiosos utilizá-los com sobriedade, renunciando a tudo que seja mera procura de gozo, de compensacáo pessoal ou re
quinte no consumo. Facam a «.higiene das necessidades», demonstrando assim que vivem de outros atrativos que nao os da materia. Numa palavra: distingam-se os Religiosos «pelo seu náo-conformismo con as formas típicas do consumo hodierno, que provoca necessidades artificiáis e exerce a tiranía do consumo» ip. 92). — Inútil será sublinhar quanto sao importantes tais consideracóes, emanadas da abalizada pena de K. Rahner.
Psicología Pedagógica, voL I: As transformacoes da Infancia, por Georges Cruchon; traducáo de Paulo Sergio Lima Silva.— Editdra Agir, Rio de Janeiro 1969, 140 x 215 mm, 303 pp.
O autor propóe a evolucáo por que passa a crianca desde o útero materno até os seus 12 anos de idade: descreve a primeira, a segunda e a terceira infancias com seu desenvolvimento físico, afetivo, lingüístico, moral e também religioso. As orientacóes pedagógicas que formula, sao sempre baseadas em fatos devidamente averiguados; os exemplos sao freqüentes e significativos. Chama a atencáo a importancia que Cruchon atribuí aos aspectos moráis e religiosos da formacáo da en anca e do adolescente; sao aspectos de alcance decisivo, infelizmente, porém, negligenciados em muitos manuais dessa materia. O livro, no seu capitulo I, sintetiza a historia da Psicología Peda gógica a partir do século XVI. No flm apresenta ampia bibliografía,
bem classiíicada, abrangendo livros de diversos idiomas. Está em preparacáo o tomo II: «As maturacSes da adolescencia». Obra que será muito útil a país e educadores, obrigados a conhecer com certa profundidade a psicología da crianca e sua evolucáo.
E.B.
NO
PRÓXIMO
NÚMERO :
O «Teorema» de Pier Paolo Pasolini Isolado o gene ; homem sob receita ! Torturas em
nossos dias
Ainda o celibato do clero
Vaticano I : centenario
«PERGUNTE
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R E S P CN D EKSM O S »
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Assinatura anual
1970
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Número avulso de qualquer mes e "ano
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índice de qualquer ano
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