Ano Xxvii - No. 293 - Outubro De 1986

  • Uploaded by: Apostolado Veritatis Splendor
  • 0
  • 0
  • April 2020
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Ano Xxvii - No. 293 - Outubro De 1986 as PDF for free.

More details

  • Words: 19,949
  • Pages: 54
Projeto PERGUNTE E

RESPONDEREMOS ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de

Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoríam)

APRESENTAQÁO

DA EDIQÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanga a todo aquele que no-la pedir (1 Pedro 3,15). Esta

necessidade

de

darmos

conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por numerosas correntes filosóficas e

religiosas contrarias á fé católica. Somos

assim incitados a procurar consolidar nossa crenca católica mediante um aprofundamento do nosso estudo. Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propóe aos seus leitores: aborda questoes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortaleca no Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar este trabalho assim como a

equipe de Veritatis Splendor encarrega do respectivo site.

que

se

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Estevao Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos

convenio com

d.

Estevao

Bettencourt

e

passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo. A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.

rtstmétwtm SUMARIO

9

Pecado e Santidade na Igreja

j

>

"Senhor e fonte de vida"

'

A única Igreja de Jesús Cristo

j

Urna carta da África do Sul A Igreja Católica Liberal?

:

Cemiterios: jardins de lazer e pesquisas científicas?

j j

i

ANO

XXVII

-

OUTUBRO

-

1986

PERGUNTE E RESPONDEREMOS

OUTUBRO - 1986

Publicado mensal

N9293

•■" ■ ' ■'•> '

Diretor- Responsável:

Autor e

PECADO E SANTIDADE NA IGREJA

433

"SENHOR E FONTE DE VIDA"

434

A Carta Encíclica

Estévao Bettencourt OSB Redator de toda a materia

publicada neste periódico

Diz-se:

Oiretor-Ad ministrador D. Hildebrando P. Martins OSB

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

446

Relativismo na fé? Administracao e distribuicao: Edicdes Lumen Christi

Dom Gerardo, 40 - S? andar, S/501 Tel.r(021) 291-7122

Caixa postal 2666 20001 - Rio de Janeiro - RJ

A ÚNICA IGREJA DE JESÚS CRISTO Um documento pouco conheddo:

UMA CARTA DA ÁFRICA DO SUL

464

Queé

A IGREJA CATÓLICA LIBERAL?

468

Discute-se:

Composicao e Impressao:

CEMITÉRIOS: JARDINS DE LAZER

"Marques Saraiva"

E PESQUISAS CIENTÍFICAS?

Santos Rodrigues. 240 Rio de Janeiro

475J

NOTA: O filme THÉRÉSE de Alain Cavalier

Assinatura de 1986: Número avulso

CzS 100,00 CzS 11,00

Para pagamento da assinatura de 1986, queira depositar a imponen cia no Banco do Brasil para crédito na Conta Corrente n? 0031 304-1 em nome do Mosteiro de Sao Bento do Rio de Janeiro, pagável na Agen cia da Praga Mauá (n? 0435) ou en viar VALE POSTAL pagável na Agencia Central Rio de Janeiro.

458

dos Correios do

479

NO PRÓXIMO NUMERO 294 - Novembro - 1986 A Consciéncia que Jesús tinha de Si e de sua Missáo. - O caso "Charles Curran" "O Demonio anda soltó por ai!" - "Fatos e Mitos sobre a Virgem María".- Mae-Menininha e Catolicismo.

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

RENOVÉ QUANTO ANTES

COMUNIQUE-NOS QUALQUER

A SUA ASSINATURA

MUDANCA OE ENDERECO

Pecado e Santidade na Igreja Encontram-se na Tradicáo eloqüentes testemunhos de amor á Igreja... Fazem eco especialmente aos escritos de SSo Paulo, que tem a Igreja como "Esposa de Cristo, sem mancha nem ruga" (Ef 5,27) e como nossaMSe(GI4,26). Entre outros, destacam-se os dizeres de S. Cipriano (r 258), que escreve:

"A Igreja é urna so Mae ¡mensamente fecunda. Nascemos todos do seu ventre, somos nutridos com seu leite e animados por seu espirito. A esposa de Cristo nao pode ser adulterada, ela é incorrupta e pura, nao

conhece mais que urna só casa, guarda com casto pudor a santidade do único tálamo. Ela nos conserva para Oeus, entrega ao Reino os filhos que gerou. Quem se afasta da Igreja e se junta a urna adúltera, separa-se das promessas da Igreja... NSo pode ter Deus por Pai quem nSo tem a Igreja por Máe" (Sobre a untdade da Igreja, cap. 4).

É digna de nota a referencia á "Igreja incorrupta e pura, que nSo

conhece adulterio". Com efeito; a Igreja é portadora de santidade indefectfvel, que Cristo Cabeca Ihe comunica e que Ela faz transbordar sobre todos os que se Ihe incorporam; Ela é sempre o sacramento universal de salvacSo, instituido por Cristo e confiado a Pedro; Ela suscitou, educou e formou multidao de santos... Todavía os limites da Igreja passam pelo coracáo de cada um dos seus filhos; ora em cada cristáo há urna área de afetos e tendencias aínda nao evangelizada ou ainda paga (somente a Virgem María realizou plenamente a santidade da Igreja). Em conseqüencia, os cristáos pecam h revelia de Cristo e da Santa Igreja; nao obs

tante, a Igreja, qual Máe solicita, carrega os pecados de seus filhos. Isto quer dizer que a Igreja nao existe sem pecadores. Mas Ela mesma, consi derada segundo aquilo que a constitui (a unido com Cristo Cabeca para ser o Corpo de Cristo prolongado), n8o comete pecado. Por conseguinte,

o pecado existe na Igreja; mas nao é da Igreja. Enquanto sao pecadores, os homens nao sao Igreja, mas estáo na Igreja. Poder-se-ia dizer que os pecados sao estranhos á Igreja, embora os pecadores estejam dentro da Igreja. Só nao haverá pecado - esse elemento heterogéneo! - quando a Igreja conhecer a sua Páscoa definitiva, nao mais como peregrina, mas como a Santa Jerusalém ornamentada como a Esposa que entra na ceia da vida eterna (cf. Ap 21,1s).

É precisamente para esta imagem escatológica ou apocalíptica que tendemos. É esta imagem que o cristáo tenta cada vez mais reproduzir em seu intimo e em seu ambiente de vida!

E.B.

433

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS

II "

ANO XXVII - n? 293 - Outubro de 1986

Caita Endctka

"Senhor e Fonte de Vida" Em síntese: A Encfclica "Senhor e Fonte de Vida" datada de 1&05/86 vem atender a um anseio suscitado pelo Concilio Vaticano II, que sublinhou a acáo do Espirito Santo na tgreja e no mundo (ver Constituicáo Lumen Gentium n> 4; Const Gaudium et Spes n- 26). O texto póe em relevo o dom do

Espirito Santo como fruto da Redencéo realizada por Cristo; aponía o Espirito

Santo como Aquele que esclarece as mentes dos fiéis frente ao pecado, cujas expressóes sao particularmente violentas em nossos dias; recorda também os textos de Sao Paulo que propóem o Espirito Santo como Mestre de oracáo ou como Aquele que vem em auxilio da nossa fraqueza, já que nSo sabemos

como orar (Rm 8,26). A oracáo suscitada pelo Espirito Santo 6 ó grande apoto

da Igreja nesta fase problemática de lula entre a luz e as trevas ou entre a vi da e a /norte. A Igreja continua fiel á sua origem no Cenáculo, onde os Apos tólos com María aguardavam o Espirito Santo em oracáo. Ela pede incessantemente as gragas do Redentor para o mundo e clama pela consumacáo da obra da salvag&o: "Vem, Senhor Jesús", exclamam o Espirito e a Esposa, conforme Ap 22,17.

Aos 18/05/86 o Santo Padre JoSo Paulo II assinou a sua quinta Carta Encfclica (circular), versando esta sobre o Espirito Santo (Dominum et VMficantem ou DeV). Completa-se assim a trilogia: ene. Dives in Mi sericordia (1980), sobre o Pai; ene. Redemptor Hominis (1979), sobre o

Filho; ene. Dominum et Vivificantem (1986), sobre o Espirito Santo. É

esta a quinta Encíclica num pontificado de oito anos. O estilo cíclico ou de espiral do texto revela a característica pessoal de JoSo Paulo II. Trata-se

de urna vasta e profunda meditacSo bíblica e teológica sobre o Espirito Santo; das 297 notas de rodapé, 225 se referem á S. Escritura. 0 tom é doutrinário, mas também exortatório e pastoral; nao aborda temas con434

"SENHOR E FONTE DE VIDA" trovertidos como o Filioque, a acáo do Espirito Santo fora da Igreja Cató lica, os carismas e a sua distincáo...

A imprensa nem sempre focalizou a temática central da Encíclica.

Realcando a descricáo dos tragos sombríos de nossa época (que. sem dúvida, faz parte da Encíclica), os meios de comunicacáo quiseram ler nesse

documento "urna visáo trágica ou apocalíptica do mundo" ou também "a mais dura condenacáo do marxismo até hoje proferida pelo S. Padre"; sao perspectivas parciais exageradas. A Encíclica póe, sim, em relevo a luta entre o bem (vida) e o mal (morte) que perpassa a historia; observa, porém, que terminará com a vitória da vida. Há, pois, um fio de esperanca, que anima todo o texto desse documento; tal esperanca, porém, so" atingirá plenamente o seu objeto na consumacáo da historia. O texto compreende tres Partes: 1) o Espirito do Pai e do Filho da do á Igreja; 2) o Espirito que convence o mundo quanto ao pecado; 3) o Espirito que dá a vida. Pode-se dizer que a primeira Parte considera o misterio da SS. Trindade e sua acáo na dispensacáo da graca aos homens, com base especial em Jo 14-16; a segunda Parte se volta para a

atuagáo do Espirito Santo no mundo e na historia; a terceira propfie aplicacdes concretas de ordem antropológica. Vejamos agora de mais perto alguns dos traeos típicos da Encíclica.

1. Introducto (n- 1 e 2) A Introducáo a presenta o propósito do documento: nos últimos cem anos, tres eventos chamaram a atencáo para a apio do Espirito

Santo no mundo e na Igreja: a publicacao da Encíclica Divinum HludMunus (1897) do Papa Leáo XIII, a da Encíclica Mystici Coiporis Christí (1943) de Pió XII e o Concilio do Vaticano II (1962-19651, que foi tido como um novo Pentecostés; este suscitou a necessidade de urna abordagem explícita da acáo do Espirito em nossos días, como notava Paulo VI na audiencia de 16/06/73. Com efeito; a teologia ocidental acentúa muito o binomio Crísto-lgreja (Cristo é a Cabeca do Corpo-Igreja), ao passo que a teologia oriental enfatiza Espirito Santo-lgreja (o Espirito Santo é o principio vivificante da Igreja). Consciente disto, Joáo Paulo II quis preencher a lacuna, tendo em vista especialmente a aproximacüo do ano 2000, que há de ser um kairós, ou um momento oportuno de graca e renovacáo interior sob o impulso do Espirito Santo.

Parte I: O Espirito... dado á Igreja (n? 3-26) Compreende sete subdivisóes, as quais versam todas sobre o mis terio da SS. Trindade, que se deu aos homens na historia da salvacao. 43S

4

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

1.0 ponto de partida das reflexóes é o texto de Jo 16,1 s: "É de vosso interesse que eu me vá, pois, se eu nao me for, o Paráclito nao vira a vos. Mas, se me for, enviá-lo-ei a vos". Estas palavras significam que Je sús devia subtrair-nos a sua presenta visível, embora fosse muito desojada pelos Apostólos (cf. Jo 16,5s); com efeito, se Jesús tivesse permaneci do físicamente presente entre nos, a sua acfio teria sido limitada pela corporeidade (que nao pode ser onipresente). Ao contrario, partindo para a gloria do Pai, Jesús nao nos deixou órfSos, mas enviou-nos o Espirito Santo; este é o dom do Cristo glorificado, o dom do Redentor, que deve continuar a obra da salvacáo através dos séculos; é o outro Paráclito, Ad-

vogado ou Consolador dos fiéis (Jo 14,16). É o Espirito Santo que con

grega os homens de todos os tempos e lugares num so Corpo, chamado "o Corpo de Cristo Místico" ou a Igreja; é pela acáo do Espirito Santo que Cristo volta ou se torna presente de novo modo..., modo que se chama "sacramental". - "Sacramento" é um sinal visível que assinala e comuni ca a graca de Deus; neste sentido, a santlssima humanidade de Cristo, assumida de María Virgem, é o Sacramento Primordial; este se prolonga na Igreja, Corpo de Cristo (cf. Cl 1,24) e termina nos sete ritos-sacramentos (Batismo, Crisma, Eucaristía, Reconciliafáo, Uncjio dos Enfermos, Ordem e Matrimonio). Ora o Espirito Santo é o Autor da ordem sacramental; ám, o Verbo se fez carne por obra do Espirito Santo, a Igreja é vivificada pelo Espirito Santo e os sacramentos sao eficazes pela acáo do Espirito Santo.

0 Espirito Santo foi enviado aos homens em missáo1 visfvel no dia

de Pentecostés (cf. At 2) e é enviado em missáo inyisfvel ao coracáo de cada cristáo que recebe os sacramentos. Isto quer dizer que até hoje o

Senhor Jesús envia o seu Espirito sempre que há um ¿atizado, urna Crisma.

O envió do Espirito Santo por parte do Filho e do Pai e o envió do Filho por parte do Pai (na Encarnagáo) sao o eco, no tempo, das processóes trinitarias: na eternidade o Filho procede do Pai, e o Espirito Santo procede do Pai e do Filho. Assim a historia da salvado, com os misterios da Encarnapáo e de Pentecostés, vem a ser como que o prolongamiento da vida eterna de Deus, que se comunica do Pai ao Filho, e do Pai e do Filho ao Espirito Santo. Eis a linha central da Parte I da Encíclica DeV.

*A palavra "missáo" aquí tem o sentido técnico e etimológico de "envío"

(= minio do latím). A teología distingue a missSo do Filho, enviado pelo Pai na plenitude dos tempos (cf. Gl 4,4) e a missáo do Espirito Santo, en viado pelo Pai e o Filho como dom do Senhor Jesús glorificado (cf. Jo 7,37-39; 16.7).

436

"SENHOR E FONTE DE VIDA" 2. Salientemos agora um trapo particular desta secáo.

Os n-s 19-24 nos dio a ver que Cristo é o Grande Centro da histo ria: a humanidade de Jesús recebeu o Espirito Santo em plenitude; Ele

foi ungido com o Espirito Santo (cf. At 10,38); os Profetas jé haviam pre-

dito o derramamento do Espirito e dos seus dons sobre o Messias (cf. Is 11,2). - Ora Jesús comunicou e comunica o Espirito aos seus discípulos através dos séculos. Já na noite de Páscoa disse aos Apostólos: "Recebei

o Espirito Santo" (Jo 20,22). - É o Espirito Santo que deve continuar a

missáo do Senhor Jesús na térra. E de fato Ele a prossegue agindo na Igreja. A propósito o S. Padre cita o Concilio, do Vaticano II: "Como escreve o Concito, O Espirito Santo habita na Igreja e nos cora-

cóes dos fiéis como num templo (cf. ICor 3,16:6,19): e neles ora e dá testemunho da sua adocáo filial (cf. Gl 4,6: Rm8,1S-16.26). Ele introduz a Igreja no conhecimento de toda a verdade (cf. Jo 16,13), uniSca-a na comunhao e no

ministerio, edifíca-a e dirige-a com os éversos dons hierárquicos e carismátíeos, e enriquece-a com os seus frutos (cf. Ef 4,11-12; ICor 12,4; Gl 5,22). Faz aínda que a Igreja se mantenha sempre jovem: com a tonta do Evangelho,

renova-a continuamente e leva-a á perfeita uniáo com o seu Esposo" (n9 25. Cf. Lumen Genthim/»* 4.J.

O Papa acentúa finalmente o valor do Concilio do Vaticano II: os

seus documentos "contém praticaménte tudo o que o Espirito diz ás Igrejas em funcáo da presente fase da historia da salvacao" (n- 25). Há breve insinuacáo dos desvíos ocorridos na aplicacSo das. normas do Con

cilio, mas o S. Padre nao insiste nestes traeos negativos da recente histo ria da Igreja.

Parte II: O Espirito que convence o mundo quanto ao pecado (ns 27-48) Esta Parte do documento considera especialmente a face dramática da historia atual, procurando incutir otimismo e confianga: o pecado é apresentado com sua dramaticidade, mas também é visto como ocasiao de maior efusáo da misericordia divina.

O ponto de partida desta Seccio é o texto de Jo 16,8s: "Quando o Paráclito vier, estabelecerá a culpa do mundo a respeito do pecado, da justiea e do julgamento: do pecado, porque nao créem em mim; da justica, porque vou para o Pai, e nSo me veréis; do julgamento, porque o

Principe deste mundo está julgado" (cf. n? 27-29).

É principalmente sobre o pecado e a denuncia do pecado existente no mundo que o S. Padre insiste. Eis os traeos princip*vs desta Seccfio: 437

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986 II. 1. Pecado original (n« 33-36)

a) O pecado entrou no mundo logo no principio da historia huma

na: é a transgressáo dos primeiros pais. O texto da Encíclica se estende longamente sobre este assunto {n° 33-36) como que para incutir a realidade e a importancia da culpa original num momento em que algumas teorías tendem a esvaziá-la no panorama da teologia. Está claro que a narracao de Gn 2-3 aprésenla ¡magens literarias como a da serpente que

fala, a da átvore da ciencia do bem e do mal, a da árvore da vida... O

texto da Encíclica expóe o sentido da árvore proibida e, conseqüentemente, o da transgressáo do homem. Com efeito, embora criado a imagem e a semelhanca de Deus, o homem é sempre criatura, que deve orientar-se pelo modelo do Criador e que nao é autónoma; ora o preceito do paraíso (simbolizado pela proibicáo de urna fruta) quería lembrar ao homem essa sua condicáo de criatura e provocar a correspondente obe diencia dos primeiros pais; estes, porém, se insubordinaram por orgulho (sem que se possa indicar qual o objeto concreto em torno do qual versou a desobediencia):

"A árvore do conhedmento do bem e do mal devia exprimir e lembrar constantemente ao homem o Smite intransponfvel para um serenado. Éneste sentido que deve ser entendida a proibicáo da parte de Deus: o Criador proibe ao homem e á mulher comerem os frutos da évore do conhedmento do bem e do mal. As palavras da instígacáo, ou se/a, da tentacSo, como formulada no texto sagrado, induzem a transgredir essa proibicáo - feto 6, a superar o imi

te: 'Ouando o comerdes, abrir-se-áo os vossos olhos e tomar-vos-eis como Deus (como deuses) conhecendo o bem e o mar.

A desobediencia significa precisamente passar além daquele Smite que permanece intransponfvet para a vontade e uberdade do homem, como ser criado. O Deus Criador é, de tato, a única e definitiva fonte da ordem moral no mundo por Ele criado. O homem nao pode por si mesmo decidir o que ó bom e

o que é mau - nao pode 'conhecer o bem eomal como Deus'. Sim. no mundo criado Deus permanece a primeira e soberana fonte para decidir sobre o bem eomal"(n«36).

II. 2. Mentira e morte outrora e hoje (n?s 37-38)

0 pecado dos primeiros pais foi provocado pela mentira do tenta

dor, que Ihes propunha serem iguais a Deus mediante a desobediencia: "NSo morrereis; Deus sabe que, no dia em que comerdes, vossos olhos se abrirao e seréis como deuses, arbitrando entre o bem e o mal" (Gn 3,4s). A mentira levou os homens á morte. Jesús notava isto no EvangeIho ao dizer: "O diabo foi homicida desde o principio, e nao permaneceu 438

"SENHOR E FONTE DE VIDA"

na verdade, porque nele nSo há verdade; quando ele mente, fala do que Ihe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira" (Jo 8,44).

Ora o drama do pecado das origens parece reproduzir-se através dos tempos: ainda hoje a verdade 6 vilipendiada, sonegada ou trocada pela mentira, que leva os homens a morte. Ainda hoje a imagem de Oeus é falsificada como se fosse o rival do homem e adversario do crescimento do género humano; o homem suspeita de Deus hoje como outrora, e isto o leva á ruina ou á morte (á morte do homem decorrente da "morte de Deus"):

" 'Deus sabe que, no día em que o comercies, abhr-se-áoos vossos oIhos e vos tomareis como Deus, conhecendo o bem e o mar. Encontrárnosos aqui exatamente no centro do que se poderia chamar o 'antí-Verbo', isto é, a 'antíverdade'. Com efeito, 6 falseada a verdade do homem: de quem é o ho

mem e de quais sao os limites intransponfveis do seu ser e de sua Bberdade.

Esta 'antiverdade' é possfvel porque é, ao mesmo lempo, falseada completa

mente a verdade sobre quem é Deus. Deus Criadorpassa a ser colocado em estado de suspeigSo ou, melhor dito, em estado de acusac&o diretamente, na consdéncia da criatura. Pela primeira vez na historia do homem, aparece o perverso 'genio da suspeigSo'. Ele procura falsear o próprio Bem, o Bem ab soluto" (n* 37).

Sabe-se quanto é poderosa a mentira em nossos dias, e quanto ela

procura afastar de Deus o homem, como se a religiSo fosse um fator

alienante. Assim percebe-se que o tentador se serve hoje das mesmas armadilhas que ele outrora utilizou frente aos primeiros pais. "O homem

é desafiado para se tornar adversario de Deus!" (n° 38).

II. 3. Misterio da iniqüidado e misterio da piedade (nSs 39-42)

O misterio da ¡niqúidade suscita o misterio da piedade: a graca e o

amor salvlfico de Deus respondem ao pecado. Desta maneira o pecado

nao é a última palavra da historia, mas esta, a pos a queda de Adáo, é

como que recomecada pelo Criador, que instituiu um segundo AdSo, ca

paz de restaurar o homem na amizade com Deus.

"O Uvro Sagrado... fate-nos de um Pai que experimenta compaixSo peto homem, como que compaiHlhando a sua dor. Esta imperscnitável e indizfvel dor de Pai, em deñnitívo. gerará sobretudo a admirável economia do amor re

dentor em Jesús Cristo, para que, através do misterio da piedade, o amor possa revelar-se mais forte do que o pecado na historia do homem. Para que prevaleca o Domr (n939).

439

g

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

0 pecado á vencido pelo sacrificio do Cordeiro. Tal enfoque lembra a parábola do filho pródigo (Le 15,11 -32) e a longa explanacáo da mesma encontrada na Encíclica "Rico em Misericordia" do mesmo Joáo Paulo II. II. 4. A Consaenda moral (n^s 43-46) A temática do pecado sugere a da consciéncia, que também é amplamente considerada pelo S. Padre (n? 43-45). Esta é o santuario no qual o homem se encontra a sos com Deus, cuja voz ressoa no seu íntimo (Constituicáo Gaudium et Spes n° 16).

A consciéncia moral do homem nao é autónoma; nao é ela que de fine o que é bem e o que é mal. Por isto deve procurar formar-se segun

do a lei de Deus, de modo a chamar pelo seu nome o bem e o mal. Apontar o mal como mal é ato de coragem, mas, ao mesmo tempo, é servico prestado aos homens. A propósito Joáo Paulo II cita a Constituícao Gaudium et Spes, que soube realizar essa denuncia do mal existente no mundo:

"Tildo aquilo que se opóeá vida, como sejam os homicidios de qualquer

especie, os genocidios, os abortos, a eutanasia e mesmo o suicidio voluntario; tudo aquilo que constituí urna violáceo da integridade da pessoa humana, co mo sejam as rwtilacóes, as torturas moráis ou físicas, as pressOes psicológi cas; tudo aquilo que ofende a dignidade do homem, como sejam as condicóes infra-humanas de vida, as prisóes arbitrarias, as deportacóes, a esclavatura, a prostítuicio, o comercio de mulheres e dejovens, ou aínda as condicóes de trabalho degradantes, que reduzem os operarios a meros instrumentos de lu cro, sem ter em conta a sua personaSdade Svre e responsável... Todas estas coisas e outras sementantes sao, na verdade, urna infamia; ao mesmo tempo que corrompen) a civitizacao humana, desonram mais os que a oías se entre-

gam do que aqueles que sofrem a injuria, e ofendem gravemente a honra dévida ao Criador (rf 16).

II. 5.0 pecado contra o Espirito Santo (n?s 46-48) 0 perdáo de Deus é oferecido a todo e qualquer pecador, exceto aquele que, conforme a linguagem do Evangelho (Mt 12,31 s; Me 3,28s; Le 12,10), peca contra o Espirito Santo. NSo se trata de pecado táo grave que nao possa obter perdáo, mas trata-se da recusa do perdáo, por parte do próprio homem; se este nao aceita a graca de Deus, o Senhor nao o forca a recebe-la: "Se Jesús diz que o pecado contra o Espirito Santo nao pode ser perdoado nem nesta vida nem na futura, é porque esta nao remissáo está ligada, como á sua causa, á nao penitencia, isto é, á recusa radical de converter-se" (n? 46). 440

"SENHOR E FONTE DE VIDA"

Por sua vez, esta obstinado no pecado se prende á perda do senso de Deus; só pode ter exato senso do pecado quem tenha o senso de Oeus. "O pecado do sáculo é a perda do sentido do pecado. E esta perda

vai de par com a perda do sentido de Deus... É a realidade de Deus que desvenda e ilumina o misterio do homem" (n? 47).

é por isto que a Igreja nao cessa de implorar de Deus a gra^a de

que nunca venha a faltar a retidio ñas consciéncias humanas e nio se embote a sensibilidade sadia diante do bem e do mal. Esta retidao e esta

sensibilidade estáo profundamente ligadas a acáo Intima do Espirito de verdade.

Parte III: O Espirito que dá a vida (n^s 49-66) Esta Parte final da Encíclica apresenta aplicacóes concretas dos principios enunciados a vida da humanidade presente e futura. Nela po demos distinguir cinco temas salientes: III. 1.0 Jubileo do ano 2000 (n?s 49-54)

O Jubileu do ano 2000 evocará mais urna vez o nascimentó de

Cristo e o inicio da era crista. É data importante, para a qual a Igreja de-

seja preparar-se sob a acáo do Espirito Santo: assim como por obra do Espirito Santo o Filho de Deus se fez homem, assim por a;3o do Espirito a historia vai ao encontró do seu termo final. O Espirito estende a todos os cristaos a filiacdo divina ou a configuracáo ao Cristo Jesús, o Primo génito dentre muitos irmáos (cf. Rm 8,29): "Recebemos o Espirito pelo qual clamamos: Aba, Pai!" (cf. Rm 8,15-17; Gl 4,6; Rm 5,5; 2Cor 1,22). Mas n3o somente os que professam a fé católica, podem ser beneficiados pelo Espirito; também aqueles que, fora do corpo visfvel da Igreja, ignoram sem culpa o Evangelho, mas seguem de corafáo sincero os difames da sua consciéncia reta, podem chegar á salvacSo eterna: 'Aqueles que ignoram sem culpa o Evangefho de Cristo e a sua Igreja, mas buscam a Deus na sinceridade do coracSo e se esforcam, sob a acáo da gra$a, porcumprir na vida a sua vontade, conhecida atravós dos difames da consciéncia, também esses podem alcancar a salvacSo eterna. Nem a Divina

Providencia nega os meios necessirios para a salvacSo aqueles que, sem culpa, aínda nSo chegaram ao conhetímento explícito de Deus, mas pnxuram com agrace divina viver retamente"'(Const Lumen Gmtlumn* 16).

As afirmacóes do texto ácima nao implicam relativismo doutrinárío, pois supóem que haja ignorancia involuntaria do Evangelho da parte daqueles que sao sinceros para com a sua consciéncia bem formada (a qual é, em última análise, a voz de Deus para eles). 441

10"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

III. 2. O Espirito na conflitualidade da historia (nSs 55-57) A afáo do Espirito Santo encontra resistencia dentro e fora do homem... Dentro do homem..., pois a carne se opóe ao Espirito, tendendo nio raro a um comportamento desregrado. Fora do homem..., pois o materialismo se opóe ao transcendentalismo, as trevas do erro se opóem a luz da vida reta; as lutas de fora do homem tem su a raiz no coráceo do homem. A este propósito o texto tece consideracdes sobre o materialis mo dialético. Este é sempre ateu; tem a religiáo na conta de "ilusáo idea

lista", que deve ser combatida de todos os modos e com os métodos mais apropriados para eliminá-la da sociedade e do próprio coracáo do homem; é o desenvolvimento sistemático e coerente da oposigáo da car ne ao espirito denunciada por Sao Paulo em Gl 5,22-25. - Quáo falsas sejam as concepcóes do materialismo a respeito da religiáo, é evidencia do pela psicología das profundidades, cujos mestres Viktor Frankl, Cari Gustav Jung e outros p6em em relevo o papel da religiáo na estruturagao da personalidade humana. Sao palavras de Jung:

"Dentre todos os pacientes que trVe e queja estavam na segunda me-

tade da vida, isto é, ácima dos 35 anos,- nenhum houve cujo problema, em úl tima instancia, nao losse o de encontrar urna perspectiva religiosa para a vida. Posso dizer com seguranca que todos eles adoeceram porque haviam perdi do aquSo que as religues vivas de todas as épocas deram a seus ñóis e ne nhum deles realmente se curou sem ter restaurado sua perspectiva religiosa". Acrescenta Rollo May: 'Sempre me impressionou o tato de que oráticamente todo ateu vertía-

deiro com quem Bdei, demonstrou nudamente tendencias neuróticas". Eram pessoas que nao tinham estrutura em lungáo da qual pudesse ser feito o ajustamento de suas tendencias; sua vida carecía de objetivo, de diregio ou de reterencial. "Esse estado neurótico pode ser deñnido peto termo religioso de 'inferno'. A desintegracSo gradativa, o colapso da unidade, a lula contra si próprio e ludo o mais é cortamente um inferno" (A Arte do Aconselhamento Psicológico, p. 185).

0 confuto carne e espirito é também o de moite e vida. O materia lismo professa a conceppáo de que a morte é o termo definitivo da exis tencia humana; dal dizer a corrente existencialista que a vida humana é exclusivamente um "exisitr para morrer" - o que nao raro gera o deses

pero e o suicidio. Além disto, a morte tem seus vestigios e sinais em nao poucos as

pectos da historia contemporánea: corrida aos armamentos e perigo de autodestruigáo nuclear, alastramento da miseria e da fome, prática do

"SENHOR E FONTE DE VIDA"

aborto e da eutanasia, terrorismo organizado em escala internacional, guerras que ceifam ou prejudicam notavelmente a vida humana...

Apesar disto, "a Igreja acredita firmemente que, da parte de Deus, haverá sempre um comunicar-se salvffico, urna vinda salvifica... por obra do Espirito" (n? 56). Mais: a própria dor que aflige a humanidade suscita um gemido do coracáo dos homens, que nao pode deixar de ser acolhido pelo Senhor Deus: "gomemos em nos mesmos aguardando... a redencao do nosso corpo" (Rm 8,23); "o proprio Espirito vem.em auxilio da nossa

fraqueza e intercede por nos com gemidos inefáveis, e aquele que perscruta os coracóes sabe qual o desejo do Espirito, pois é segundo Deus que Ele intercede pelos santos" (Rm 8,25).

III. 3.0 Espirito Santo e o homem interior (nes 58-60) Em meio a todos esses conflitos, o homem interior, ou seja, a nova

criatura existente desde o Batismo é corroborada pelo Espirito Santo, como observa o Apostólo em Ef 3,14-16: "Dobro os joelhos diante do Pai... Ele vos conceda... que sejais poderosamente corroborados pelo seu Espirito na vitalidade do homem interior." 0 dom do Espirito é particu

larmente perceptlvel naqueles que sofrem pressóes para sujeitar-se ao "principe deste mundo"; sao os perseguidos por causa da sua fidelidade a Cristo: "Em situacóes de perseguido... as testemunhas da verdade di vina... tornam-se urna comprovacáo viva da acáo do Espirito da verdade, presente no coracáo e na consciencia dos fiéis e, nSo poucas vezes, se-

lam com o próprio martirio a suprema glorificacáo da dignidade huma

na" (nS 60). A propósito convém lembrar, entre outros, os nomes de Sao Maximiliano Kolbe, Freí Tito Brandsma, Edith Stein... III. 4.0 Espirito nos sacramentos e na oracao da Igreja (n?s61-66) a) Nos sacramentos (n9s 61 -64) Cristo nos subtraiu a sua presenca visfvel, mas enviou-nps outro

Paráclito, o Espirito Santo, que deu origem ¿ realidade sacramental ou á realidade dos sinais senslveis que significam e comunicam a graca divina. A Igreja é o Grande Sacramento, que prolonga, de ceno modo, a huma nidade de Cristo ou o Corpo de Cristo (cf. Cl 1,24). Por sua vez, a acáo da Igreja se realiza principalmente mediante os sete sacramentos, que reco-

brem a vida do homem todo desde o nascer até o passar para a Casa do

Pai e que tém seu centro na Eucaristía. É esta que, por excelencia, con

grega os discípulos de Cristo, corroborando-os na unidade e na caridade. Dado que existem separacdes entre os cristáos, é necessário que todos os discípulos de Cristo se empenhem por reconstituir a unidade dilacerada. 443

]2

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS". 293/1986

"A Igreja é um sacramento de unidade para todo o género humano" (n? 64). 0 Espirito Santo será sempre o Grande Artífice dessa unidade. b) Na oracdotn? 66-66)

A S. Escritura se encerra com a repetícáo de um anseio que brota

do mais profundo do coracáo dos cristSos: "Vem, Senhor Jesús!" (Ap

21,17.20). E com estas palavras também que a Encíclica chega ao seu fim,

explanando, alias, o papel da ora?So na vida da Igreja e dos crístáos.

"O sopro da vida divina, o Espirito Santo, exprime-se e faz-se ou-

vir, da forma mais simples e comum, na oracáo" (n9 65). Em muitos ca

sos a oracáo, sob a acáo do Espirito, sobe do Intimo do homem com mais pureza e profundidade porque o orante se vé despojado de todos os re

cursos (pessoal, aparelhagem, dinheiro...) que Ihe poderiam infundir esperanca ou seguranca humanas; Deus, nao raro, destituí os seus fiéis do

apoio das criaturas para que possam perceber melhor que, em última análise, é Oeus, com a sua graca, quem realiza todo o bem no mundo. Isto é especialmente verídico nos países em que a religiáo é perseguida.

"Sob a ac&o do Espirito, a oragéo sobe do coráceo do homem apesar das ptofoipoBS e das persegwcóes, e mesmo malgrado as prodamaeOes ofi ciáis, afirmando o carátar a-reügtoso ou até ateu da vida pública! A oragéo continua a ser sempre a voz de todos os que aparentemente nao tém voz; e nesta voz ecoa, sem cessar, aqueta torta clamor atribuido a Cristo pela epa tóla aos Hebreus (cf. Hb 5,7)" (ri> 6S).

A consciénda dos males que flagelam os tempos atuais suscita a a.firmacáo de que "a nossa época difícil tem particular necessidade de

oracáo" (n? 65). Esta tem sido praticada ontem e hoje por homens e muIheres que se consagram a Deus, "com grande proveito para a Igreja", na Vida Religiosa; mas últimamente vem sendo redescoberta por movi-

mentos e grupos cada vez mais numerosos, que na oracáo procuram a

renovado da sua vida espiritual. Tal fato é síntoma significativo e con solador: o S. Padre alude aqui implícitamente aos grupos de oracSo no Espirito, aos Focolares, ao Neocatecumenato, ¿s Equipes de Nossa Senhora e a tantas outras formas novas de espiritualidade que vém surgindo na Igreja sob a acáo do Espirito, com grandes frutos para a vida crista. Eis as palavras textuais de S. Santidade:

"A nossa época difícil tem particular necessidade da oragSo. Se no de-

correr da historia, ontem como hoje, homens e mulheres em grande número

deram testermmho da importancia da oracáo - consagrándose ao touvor de

Deus e ávida de oracáo. sobretudo nos mosteiros, com grande proveito para a Igreja - nestes úISmos anos val crescendo também o número das pessoas

"SENHOR E FONTE DE VIDA"

13

que, em movimentos e grupos cada vez mais desenvolvidos, p6em a oracáo em primeiro lugar e neta procurar» a renovacSo da vida espiritual. Tratase de um síntoma significativo e consolador, urna vez que desta experiencia tem de rivado urna contribuicSo real para a retomada da oracáo entre os fiéis, os

quais, desse modo, foram ajudados a meihor considerar o Espirito Santo co mo aqueto que suscita nos comeóos urna profunda aspiracáo a santidade". (n'6S).

Estes dizeres, de certo modo, faíem eco ao Relatório final do Síno do dos Bispos de 1986, que em sua Parte A, n- 4 lembrava a necessidade

urgente dos valores espirituais (oracio, penitencia, conversáo, carídade...) para fazer frente aos desafios que a época presente lanca á Igreja. Ver PR 286/1986, p. 97.

A Igreja permanece fiel ao misterio do seu nascimento. Oriunda do Cenáculo, onde os Apostólos perseveravam na oracio com María, Ela nunca abandonou o Cenáculo. "Espiritualmente o acontecimento de

Pentecostés nao pertence so ao passado: a Igreja está sempre no Cená

culo, que Ela traz no seu coracBo... A Igreja persevera na oracSo com María" (n? 66). Por isto Ela pede ansiosamente a consumacSo da obra do Senhor Jesús: "O Espirito Santo e a Esposa dizem ao Senhor Jesús:

'Vem!'" (Ap 22,17). Esta oracio reveste-se de denso alcance escatológi-

co destinado a dar ptenftude de sentido é celebracio do Grande Jubileu do ano 2000. "A Igreja deseja prepárar-se para esse jubileu no Espirito Santo, assim como o Espirito Santo preparou a Virgem de Nazaré, na qual o Verbo se fez carne" (n? 66). Segue-se a conclusfio da Encíclica, que, após retomar traeos do respectivo conteúdo, propde urna invocacSo ao Espirito: "Otante dele ajoeiho-me, no final destas conskteracóes, implorando que. como Espirito do Pal e do FBho. nos conceda a todos a bóncSoe a grapa, que

desojo transmitir, em nome da Santíssima Trindade, aos fílhos e Shas da Igreja e a toda a familia humana" (n* 67).

A Encíclica DeV é cortamente um monumento de teología, que muito se presta á meditacio e ao estudo dos fiéis cristios. Aborda urna

variedade de temas que compendiam toda a mensagem da fé. Ela p6e o leitor diante do ámago da vida crista e desvenda-lhe o segredo da ple na auto-realizacSo: a dodlidade ao Espirito, que move os homens feitos filhos no FILHO em demanda do PAI (cf. Ef 2,18). Poder-se-ia acrescentar, á guisa de fruto da leitura de tal documento, um texto paulino que a Encíclica nSo cita, mas que ela insinúa de ponta-a-ponta: "NSo entriste céis o Espirito Santo de Deus, pelo qual fostes selados para o dia da RedencSo"(Ef4,30). 445

Diz-se:

"Em Cuba nao há Tortura"

Em símese: Por iniciativa da "internacional da Resistencia" realizou-se em París um Júri presidido pelo escritor cubano Armando Valladares: destinava-se a avallar a situacSo real da ilha de Cuba, na qual se diz nao haver tortu ra nem violencia da parte do Governo contra os cidadSos dissidentes. Foram ouvidas doze testemunhas, que evocaram torturas moráis e físicas impostas a militares de detidos naquele país. Desses doze, tres sao Religiosos violen

tados na condicSo de mensageiros da 1é. É o teor de tais depoimentos que vai, a seguir, apresentado.

Os meios de comunicado social tém procurado apresentar urna ¡magem de Cuba quase idílica, criada pelo governo de Fidel Castro: o comunismo ter-se-ia instaurado na ilha sem violentar a populacáo, obtendo a quase unanimidade do consentimento dos habitantes de Cuba. Ora tal ¡magem nao corresponde á realidade. Isto já foi evidenciado, em parte, pelo depoimento do poeta Armando Valladares, transcrito em PR 288/1986, pp. 201-216. Nos últimos temóos, tém vindo i baila novos de poimentos, dos quais a seguir vSo apresentados tres assaz significativos.

Tais testemunhos foram publicados em francés no boletirn Uaáons Latino-américaines, 28, me Eugéne-Millon, 75015 París, mato 1986, n? 26, pp. 1 -5. A partir dessa fonte foram traduzidos para o portugués.

TRES DEPOIMENTOS Por iniciativa da "Internacional da Resistencia" um Júri reuniu-se em Pa rís sob a presidencia do escritor cubano Armando Valladares. Esse Júri. do qual faziam parte Martín Gray, sqprevivente do ghetto de Varsóvia, Mana Madalena Fourcade, Yves Montand, Jorge Semprun (antígo interno do campo 446

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

15

de concentragSo de Buchenwald). PauHoup Sulitzer, Bemard-Henri Lavy, Jean-Francois ReveL... quis julgar a pertinencia de urna declaragáo de Fidel Castro a respeto dos Direitos Humanos em Cuba: "Nunca, disse ele a Freí Betto, os inbmgos da Revotucéo puderam aduzir a prova de que se tenha tor turado, maltratado ou teito desaparecer um só pristoneiro em Cuba".

Ooze antígos presos poKcos deram seu testemunho, dos quais alguns, como Eduardo Capote, ñcararn deMos durante dezessete anos ou até vinte anos como Abel Neves Morales! Entre eles há tres eclesiásticos: o Pe. Miguel Ángel Loredo, católico, deudo de abril 1966 a (everelro 1976; o pastor adven tista Humberto Noble Alexander, debelo de (evereiro 1962 a junto 1984 (22 anos) e o pastor Sergio Bravo, encarcerado tres vezes e condenado em 1966 a dezoito anos de prisáo (libertado em setembro de 1979). Os seus testemunhos seo eloqüentes. Atestam a imponencia e a es-

tenséo do aparato de repressSo em Cuba (alguns prisioneiros fbram transferi dos mais de dez vezes, o que Ihes permitíu verificara existencia de grande número de prisóes e campos de concentracSo); os testemunhos religiosos evidenciam, de modo especial, a intencSo, do poder comunista, de eliminar to da forma de expressSo da té.

Seguem-se os depoimentos dos tres Religiosos e o comunicado final do Júri. Estes quatro textos oTspensam todo comentario. 1. Sergio Bravo, pregador da Igreja Batista Oádental

Chamo-me Sergio Bravo. Sou de origem camponesa, e, como podéis

ver, de raga negra. Crente, milito atívamente no seio da Igreja Batista Ocidentai, da qual sou pregador leigo. No exerefek) das rrinhas atividades de pregador, transmWndo a mensa-

gem da Salvacáo aos mais carentes e, especialmente, aos nomens do cam po, eu me vi interpelado pelos mistares da Seguranca do Estado; consideravam que as minhas idéias obscurantistas perturbavam as mentes dos camponeses, já que Deus nao existe e é mera invencáo da burguesía.

Apesar das ameacas, eu neo podía nem quería abandonar a minha mfeséo de cristBo e a pregacBo da palavra do Senhor.

Fui encarcerado pela primeira vez em 1960. Fique! preso durante dez meses - de marco de 1960 até o comeco de 1961 - sem que me fomecessem alguma expücacBo nem me entregassem á justica; queriam apenas dar me urna BcSo.

447

16

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293H986

Urna vez libertado, recomecei a pregar aos camponeses e fui de novo aprisionado. Dessa vez, passei por interrogatorios. Puseram-me diante de urna mesa: do outro fado, diante de mim havia um agente da Poítía PoUSca, que comecou por me esboíetear e me insultar em termos que nao seria de cente repetir aquí; enquanto isto acontecía, alguns soldados me seguravam pelos ombros para que eu nSo me mexesse. Durante quatro meses, fuisub-

metido a urna serie de interrogatorios, cuja fínaüdade era levar-me a contessar crimes contra a Revotucáo que eles me imputavam e a denunciar outras possoas tidas como conspiradoras.

Após esses quatro meses, fízeram-me comparecer diante de um tribu nal, sem que eu tívesse o direito de me defender. Condenaram-me a tres anos de cárcere.

Pregador na ilha dos Pintos

Levado para a prisáo da ilha dos Pinhos, conúnuei a pregar, dessa vez aos prisioneros, as escondidas dos militares. Conseguirá iazer penetrar dandestínamene no cárcere urna pequeña Biblia, que eu utilizava ñas pregacOes. Em outubro de 1961, um guarda invaéu repentinamente o barraco n9 3 em que eu me encontrava e, como sempre. choveram bastonadas, bakmetadas e gol pes de cácete. Nessa confusSo de pancadas, os pristoneiros tentaron esqui varse como possfvel e, por isto, procuraram passarpara o andar inferior. Apavorado, eu estava descendo com os outros, quando me lembrei deterdeh xado a Biblia sobre o teito, tora do esconderijo em que eu costumava guar dé-la. Sem mais refíetir, subí de novo para salvar a minna Biblia, que era mais importante para mim do que a própria vida.

Um dos guardas, porém. viu-me entrar na cela. Quando safdesta, ele atírou em mim, e me feriu no pé. Caípor tena, sangrando copiosamente. Revoltados por este abuso, meus companheiros puseram-so a gritar. Boceando urna insurreigéo dos pristoneiros, o guarda se reírou, recusándose a levar me para o hospital. Eu contínuava a sangrar.

Meus companheiros médicos, encarcerados também eles, aproxima-. ram-se de mim; mas, por falta de meios, só puderam examinar a ferida e tentar estancar o sangue.

Por ñm, os guardas vieram procurar-me e me removeram para o hospi tal de Nuevo Girona. Se bem que, de acordó com os módicos, a amputacéo nño fosse necessária, cortaram-me a pema. Para os comunistas, seria perda de tempo passar horas a restaurar veías e ñervos; por isto doctdiram amputar me a pema.

448

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

«7

Na priste ds Pinar del Rio

Alguns meses depois, transportaram-me para a pñsSo de Pinar del Rio, onde cumpri rrinha pena de tres anos, mas nSo fui libertado no fim. Um mes,

dois meses se passaram e eu permanecía no cárcere, sem receber explicagao akjuma. Oito meses depois, quando levavam os pñsioneiros ao reteitóño,

tomei minhas muletas e desci para tentar encontrar o Diretor da Prisáo ou o

chele da Ordem Interna a fim de que me expücassem por que eu neo era devolvido á tiberdade.

Fiz a pergunta ao léñente Remigio Gomales. Á guisa de resposta, ele

chamou uns guardas, disse-lhes algo que nao pude compreender, mas logo

soube de que se tratava. Atiraram-se sobre mim e anancaram brutalmente as minhas muletas; cal; sem cuidado algum para com minhas condigóes de mu tilado, comecaram a me pisotear, maltratando-me com pontapés. A seguir, to-

maram-me pela pema que me restava e me arrastaram peto corredor. Visto que a minha cela ñcava no segundo andar, arrastaram-me também pelas es-

cadas; minha cabeca e minhas costas pulavam contra os degraus. Quando eles me deixaram na cela, eu tinha o nariz e a boca a sangrar, e trazia marcas das pauladas e dos hematomas em todo o meu corpo.

Ao verem-me sangrar, resolverán), algumas horas mais tarde, levar-me para a enfermaría, onde ñquei dois meses.

Um da, fui chamado ao Gabinete do Diretor; o tenente Gonzalos tí estava - aquele mesmo que dera ordem de me espancarem. Anunciaram-me que iam dar-me a tiberdade. Apontaram para o meu dossié colocado sobre a escrevaninha, dizendo-me: "Olha; aqui está o teu dossié. Nem vamos conferi-to. Apenas te avisamos de algo: se tentares recomegar tuas atividades reli giosas entre os camponeses, nao irás para a prisáo, nem serás levado a um tribunal, mas serás fuzilado".

Nao respondí ás ameacas. Voltei é minha aldeia. A seguir, fui para Havana, onde continuei a pregar a Palavra de Deus porque isto eraeéa minha mssSo. Fui de novo encarcerado. Dessa vez os interrogatorios foram muito mais brutais. Eles me espancaram desde o primeiro dia. Tiraram-me as mule tas e minha pema artificial para me obrigar a caminhar dando putos e piruetas. Colocavam-me em celas totalmente escuras, em que se perdía a nogSo do tempo e do espago. Os maus tratos sofridos petos ReBgiosos sao talvez os mais crueis de todos.

Vive direito a um novo processo e af aconteceu algo sem precedente. Haviam preparado urna corto dejulgamento em que todos, absolutamente to

dos, eram negros. Ató o advogado de servigo, um rrúStar designado por eles, era negro; esse advogado, que supostamente seria meu defensor, disse que 449

18

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

eu era um elemento provocador de tumultos e que a Revotucáo devia ser ca

riciosa. Para nSo alongar demais o meu depoimento, eu vos direi apenas que nao havia nenhuma prova, nenhuma acusacSo contra mim. A corte me acu són de ser um "traidor da raga negra" e me condenou como tala dezoilo anos deprisio.

Nosso objetivo, ao comparecer diante de vos, é dar a conhecer, antes do mais, a prática sistemática da tortura em Cuba e desmentir categórica

mente a afírmacáo de Fidel Castro segundo a qual "¡amáis poóeremos provar que a tortura existe em Cuba".

2. Humberto Noble Alexandor. adventista Chamo-me Humberto Noble Alexander. Nastí aos 12/02/1934 em Sant

Germán, pequeña aldeia da provincia de Oriente (Cuba). A medida que eu me

adlantava nos estudos, gaigava os escalóos da Nerarquia adventista: primaramente fui diácono, depois professor na Escola deFóe pastor assistente.

No día 20/03/1962, após um sermSo sobre a origem do pecado, vottava para casa, quando cafnuma armadilha: tiraram-me brutalmente do meu carro e levaram para a Secretaria de Seguranca do Estado. Segundo diziam meus detentares, seria coisa de cinco minutos; estes cinco minutos vieram a ser vinte e dois anos, cinco meses e orne días de cárcere.

Padecí torturas físicas e psíquicas; mandaram que me despisse numa sala fría; a seguir, quando me vi diante de quem me interrogaría, diñgiram urna lámpada de quinhentos watts contra o meu rosto. No decorrer das 72 primetras horas, nao tive tempo nem para comer nem para dormir. Os interrogatorios eram permanentes. Levavam-me de volta para a cela, apresentavam-me algo

para comer, mas, no momento em que jutgavam que eu ia comecar a comer,

etes me levavam de novo para um interrogatorio. Certa vez, quando o inquisi dor eslava sentado á sua mesa, havia atrás de mim um oficial, cuja presenca eu ignorava; ele me espancava, enquanto o outro me interrogava. Depois o in quisidor dsse: "Dá-lhe um toque de telefone", teto consistía em darpancadas violentas sobre as orelhas. Tais coisas aconteceram há 23 anos, mas até hoje trago as conseqüéncias dos toques de telefone. No dia seguinte o oficial me

disse que recebera ordem de me matar. Atirou-se entáo sobre mim, e apoiou um revólver sobre a minha témpora. Eu esperava que disparasse o tiro a

qualquer momento.

A seguir, fui mergulhado num lago de agua multo fria, com as máos ata das, e amarrado por urna corda na cintura para que me fízessem mover-me dentro da agua.

A partir de 1982, fíquei preso noG2 (Seguranca do Estado). LA perma necí até mato completamente ¡solado, sem acusacSo definida contra mim. De450

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

'9

pois fui transferido para a prisáo de Alia Seguranga de La Cabana, onde um piocesso de torga teve lugar, no decorrer do qual me deram finalmente a palavra para me defender; quando acabei de falar, o Presidente me humilhou, dingindo-se a mim oestes termos: "Cala-te, negro!"

Vinte anos de prisáo

Fui condenado a vinte anos de prisáo, "por conspiragáo contra o Esta do".

No cárcere de La Cabana, comecei a celebrar clandestinamente oficios religiosos. Em conseqüéncia, sofri humilhagdes sem número. Destruiam oslivros religiosos que eu conseguía obter. Varias vezes queimaram a minha Bi blia. Noutra ocasiáo, um carcereiro, surpreendendo-me a pregar, mirou-me com a sua pistola. Atirou e feríu-me na máo esquerda. Recusaram propiciar

me cuidados médicos, caso nao aceitasse urna condigáo humilhante que me

propunham.

No comego de mato de 1963, fui posto em prisáo secreta e mandado para urna cela subterránea; aos 6/04/1973, fui transferido para a prisáo-mo-

délo da Una dos Pinhos. Lá forgaram-me a trabalhar das quatro da manhá até

as seis da tarde. E nao raro até nove horas da noite. Exigiam resultados sem-

pre melhores no trabalho e, em vista disto, as "autoridades" aplicavam o gume

do facáo, a ponta das baionetas e recorriam até ás armas de fogo. Sou um

adventista do sétimo día. As autoridades nao o ignoravam, e, como eu recu-

sasse trabalhar no sábado, fui espancado com cabos eiétricos até desmaiar.

Em 1970 fui transferido para o cárcere de Alta Seguranga de Boniato, na

regiáo de Oriente, urna das mais duras de Cuba. Lá fuisubmetido a experien cias biológicas durante dois anos, sem assisténcia médica.

Urna vez terminada a primeira etapa das experiencias biológicas, levaram-me de novo para a prisáo de La Cabana. Fui encarcerado em diversos

cubículos e, finalmente, transferido para a prisáo de Alta Seguranga de Com

binado del Este - até a minha libertagao em 1984 -, onde de novo sofri tortu ras.

Passei os últimos dez anos sem contato algum com o exterior. Durante

esses anos, participei de varias greves de tome para protestar contra as con-

digfes desumanas do encarceramento. Algumas greves duraram até tnnta e sete días.

No lempo todo de meu encarceramento, conseguí continuar minhas atividades religiosas, mesmo clandestinamente. 451

?2

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986 Nao tenho vergonha do Evangelho, poiséo poder de Deus, no qual se

encontra a salvacáo para todos aqueles que creém. Posso dizer hoje que toi

grabas a esta té que pude sobreviver a essa provacáo.

3. Miguel Ángel Loredo, sacerdote católico

Chamo-me Miguel Ángel Loredo. sou sacerdote e pertenco á Ordem

dos Franciscanos. Sou cubano, fílho de cubanos, e, com excecáo de um pe ríodo em que fe meus esludos no eslrangeiro, sempre viví em Cuba. Atualmente, após ter sido obrigado a deixar meu país, resido em Roma

onde taco urna especializacáo em Teología, antes de me mergulhar de novó ñas tarefas próprias do meu ministerio em quatquer parte do mundo iá que

nao me permitem voltar a rrinha patria.

Sou grato por ter sido convidado a vir a este tribunal. Sou grato por es-

cutarem este testemunho pessoal em nivel táo qualificado. Nao é sempre

possfvel encontrar alguém que escute.

Creio que todo cubano é um testemunho vivo que pode ser apresentado

diante de um tribunal dos Direitos Humanos. Um testemunho que é urna acusacáo. Chamaram a mim, creio, por causa da minha experiencia carcerária de dez anos. Concretamente, em vista dos maus tratos físicos e das torturas de toda especie que sofri. Eu quisera. porém, esclarecer o segvinte: nao sou urna excecáo ás regras do respeUo devido á pessoa humana. Sou, antes um re

presentante banal - e nao predsamente o mais interessante - desses anos de violencia e de torturas que, convém notar, aínda nao terminaran) em Cuba.

Meu depoimento refere primevamente o que sofri pessoalmente. Por

certo, nao excluo o que ouvi, vi e toquei com as minhas máos, o que sofreram

meus companheiros. Isso também. eu o sofri. e posso festemunhá-to na ori-

meira pessoa.

Nem odio, nem revanche

Quero que minhas palavras sejam ouvidas sem a carga emotiva de urna revanche, de odio e de urna agressSo sofrida. Quero apenas contribuir para esclarecer a situacáo de Cuba, por vezes apresentada como algo de aceitavel. Sinto o dever de protestar, com energía, contra os logros da propaganda Desejo principalmente colocar-me ao lado dos oprimidos no meu país para

que possam exprimirse por sua própria voz.

Urna última observacáo: presto este depoimento em comunhéo com a Igreja e a Ordem ás quais pertenco e que respeitaram e aprovaram o meu de452

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

21

ver de (estemunhar. Mais: eslou contente por oferecer este depoiménto talan do urna linguagem que a Igreja em Cuba jutga imposslvel neste momento por causa das condicfes dittceis em que ela vive e que ela neo superou. Em comunháo também com todos os meus timaos, com os quais eu me encontró diante de vos. Resumirei agora a realidade do que viví, isto é, meu Iracasso e minha condenacáo, os anos decorridos no cárcere, os acontedmentos que se deram por ocasiáo da minha salda de Cuba. No tocante ao meu processo, meu encarceramento toi acompanhado por grande propaganda: fui acusado de ter abrigado no meu convento -ede ter feito sairdo país - um piloto de aviagáo, Ángel Mana Betancourt, que tenta ra apoderarse de um aviáo para deixar Cuba com a sua familia e as dos seus cómplices; tena matado, nessa tentativa de fuga, o piloto e guarda do aparelho visado. Processo falsificado

Estas acusacóes, altamente falsas, levantadas contra mim, loram arquitetadas para tentar envotver-me no caso, com o auxilio de um agente da Seguranca do Estado, que dizia ser um dos meus discípulos espirituais e meu penitente. Fui posto em prisSo secreta durante mais de dois meses, sofrendo interrogatorios entre quinze e vinte veíes por dia: guardavam-me na escuridáo, modificando o ritmo das minhas magras refeicóes que eu recebia, a fírrt de me fazer perder toda nocáo de lempo, numa cela fría e muito estreita. Só

pude talar durante cinco minutos com um advogado antes dojulgamento. E foi

somonte depois que me deram a palavra para me defender, que me acusaram de implicagóes políticas, acusacóes das quais eu nao tinha conhedmento. Fui

condenado a quinze anos de prisáo por agir em clandestinidade e cumpScktade. Na verdade, esse processo tinha por fínalidade provocar a hostilidade da populacáo para com a Igreja Oda como contra-revolucionaria e inimiga da na-

cáo. Procuravam, alias, um pretexto para ¡ustiñcar diante da opiniáo pública a política de repressSo e de perseguicao movida pelo Govemo. No momento estavam também reduzindo á inercia um sacerdote especialmente comprome tido no trabalho ¡unto aos jovens. Na prisáo, fui primeiramente enviado aos trabalhos toreados ñas pedreiras da ilha dos Pinhos (bloco 20, brigada 80). Trabalhando sob o sol cubano durante doze horas por dia, desmaiei quatro vezes por causa do esgolamento e da tome. Obrigavam-me a trabalhar nu sem calcados, e até, urna vez, quan-

do eu sofría de flebite, com 40° de febre. Fui espancado multas vezes por dois

soldados... de punhos cerrados com baionetas e com facóes. enquanto a tro pa nos cercava com armas pesadas. Emagreci tanto naquela época que eu podía envolver meu braco entre meu polegar e meu dedo maksr. 453

22

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

Submetido a humilhagóes verbais repetidas vezes, vi também como outros eram espancados, feridos e mortos. Ouando alguém moma, voltávamos para o recinto de prisáo em silencio completo, sinal de lulo. Durante muilo tempo, clandestina e muito esporádicamente celebrei a Missa servindo-me, á guisa de cálice, de um prato de metal manchado pelo sangue de um dos meus companheiros: Julio. Ele tinha trazido esse prato pendente da sua cintura até o dia em que foi assassinado por ter recusado comer capim como um animal. Vinte transferencias em dez anos

Inquéntos humilhantes acompanhados de pancadas - colativas e indivi duáis -, o isolamento, as violacóes de toda especie da dignidade humana completam esse esboco de quadro.

Durante os dez anos de prisáo, fui transferido mais de vinte vezes, seja no interior de um mesmo cárcere, seja para outros estabelecimentos peniten ciarios; altemavam-se as fases em que era agrupado com outros prisioneiros e aquetas em que eu era ¡solado e posto em incomunicabilidade. Estávamos por vezes táo amontoados que, para melhor respirar, tfnhamos que nos es tender por térra - o que neo podíamos fazer por falta de espago; só tfnhamos

direito a um copo de agua por dia e a uma refeigáo que podía caber ñas pal mas das máos.

Na prisáo de La Cabana, tínhamos que suportar convocacóes e cha madas que se faziam a qualquer hora da noite, acompanhadas de chuva de

golpes distribuidos com barras de ferro para nos obligar a sair. Misturado com prisioneiros de direito comum - que eram, antes, casos patológicos, pessoas acusadas de crimes maiores -, vi-me obrigado a participar de quatro greves de tome. A administragáo tentou acabar com a segunda - uma greve de tome

e de sede que faztamos na prisáo de Guanajay - fazendo-nos tragar fortes doses de fumo. As duas últimas das quais participei, haviam sido motivadas por uma escalada da violencia, que ameagava a nossa integridade física; uma dessas greves durou 35 dias, durante os quais nao engotimos alimento nenhum, nem mesmo uma pitada de agúcar. Durante mais de um ano, fui obriga

do a permanecer nu, na incomunicabilidade, dormindo no chao, porque eu recusava vestir o traje que simbolizava nossa renuncia aos nossos direitos mais elementares. Em certas momentos desse tipo de encarceramento, puseram-me, por torga, o uniforme dos prisioneiros de direito comum; guardavamme amarrado, privavam-me de alimentos durante varios dias e encerravamme nos cubículos de Castillo del Principe.

Ouanto aos cuidados médicos, foram-me recusados diversas vezes, principalmente quando eu sofría de uma inlecgáo que me obrigou a fazer-me operar por um dos meus companheiros, que, para trabalhar na cirurgia, só tinha uma navalha e pequeños tubos de anestésico dentario. Foi só após isto 454

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

23

que me prestaram cuidados médicos num hospital - ñas vésperas de minha salda do cárcere; aproveitaram a ocasiáo para me fazer retomar meu peso e me restaurar físicamente.

Violencias inumeráveis No tocante ao ¡solamente só a Ululo de exempto, quero dizer que nSo

me comunicaram a morte de meu pai, que deíxava minha mSe oráticamente só nessa cidade de Havana, na qual eu me enconlrava encarcerado.

A serie de violencias que eu poderla descreverna base de experiencias na própria carne, está tonge de se limitar ao que acabo de referir. Muito mais importante ainda é o tato de que posso dar testemunho de torturas, mutilagóes e maus tratos sofrióos por meus companheiros. Podemos estar certos de que neste momento em que vos falo, em que me ouvis, com seis horas de dilerenca horaria, homens e mulheres estáo sendo vfíimas de violencias, de urna maneira ou de outra, em varios lugares de Cuba. Prisioneiros anónimos e ignorados hoje. Como nos mesmos temos anónimos e ignorados ontem. Mas eu me deterei aquí no que diz respeito a mim, para concluir relatando suma

riamente as circunstancias de minha salda de Cuba. Fui libertado, gracas a conversacóes - que eu nunca solicitei - realizadas pela Santa Sé. Fiquei em prisáo dez anos. Sempre afírmei o meu desejo de permanecer no meu país, desejo que as autoridades cubanas respeitaram durante um ano após a minha libertacáo. Depois, talvez por causa do meu trabalho de prolessorno Seminario de San Carlos de la Havana e das múltiplas atividades pastorais que eu exercia junto aosjovens, os governantes comeca-

ram a pedir á Nunciatura Apostólica, e depois a Conferencia dos Bispos de Cuba, o meu afastamento do país. Chegaram a propor a vinda de dais padres

para Cuba em troca da minha partida. Declararan} que nao podiám garantir a minha vida em caso de confuto entre eles e mm. Montaram um conjunto de acusacóes, chegando a me incriminar de modo francamente absurdo, pela posse de explosivos e por organizar grupos contra-revolucionarios clandesti nos. Também sofri pressóes diretas; convocavam-me para Interrogatorios; prendiam os jovens da minha comunidade e antigos colegas de prisáo que me

visitassem. Por vezes, usavam de discriminagáo: os jovens que vinham á Igreja, perdiam o seu ernprego. Também fizeram pressáo sobre as familias

desses jovens.

Por fim, sofri um acídente, em conseqüéncia do qual tive que ficar com a

perna estendida; o motorista nSo foijulgado. Muitas pessoas, tanto dentre os clérigos como dentre os leigos, (disseram-me) ¡ulgavam que se tratava de um acídente provocado. Por efeito deste, tive que me submetera urna cirurgia e fícar em tonga convalescéncia numa cadeira de rodas, com muletas etc. 455

24

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

Devo dizer que os Bispos de Cuba sempre recusaram negociar minha salda. Em nenhum momento me pediram abertamente que partisse. A Nun ciatura Apostólica exprimiu-me varias vezes a sua satislacáo peto trabalho

que eu realizava. Todavía alguns Bispos disseram repetidamente a mim e a

Visitadores de Provincias da minha Ordem Religiosa que eu encontraría difi-

cutdades e que a Igreja em geral so/reria problemas se eu fícasse e perseverasse ñas rrénhas atividades em Cuba.

Em junho de 1984, após urna conversa com meu Superior franciscano, tomei finalmente a dotorosa decisao de sair de Cuba, consciente de que estava aliviando tensóes e me abría a novas posibilidades pastorais para o meu

ministerio de padre.

4. A Resoluto do Júri

O Júri verifícou a concordancia de todos os depoimentos relativos as condigóes de encarceramentos arbitrarios: á condenacáo por tribunais milita res sem processos públicos e sem advogados de defesa: a interrogatorios de varios días, acompanhados de pancadas, ferimentos e torturas; ás condigóes de detengáo em campos de trabamos toreados, sem ahmentagáo suficiente, sem vestes, sem cuidados médicos e, muitas vezes, em promiscuklade com

os prisioneiros de direito comum. Mais grave aínda era o encarceramento de criangas a partir de nove anos de idade, de adolescentes expostos ás piores torturas na promiscuidade dos campos.

Além disto, como certos depoimentos mostraram, as condigóes de ex-

torsSo de confissóes lembram de maneira impressionante os métodos aplica

dos por Hitler nos campos de concentragáo da Alemanha: imersáo, estrangulamento, muWagóes, sem contaras ¡áticas de terrorismo intelectual que tendiam a obrigar os condenados a abjurar. Outros falos particularmente graves foram relatados, especialmente a prática de experimentagáo médica em pri sioneiros sob o controle de médicos soviéticos.

Resulta do conjunto dos depoimentos que os prisioneiros políticos nao gozam do beneficio das leis intemacionais, particularmente daquelas procla madas pela Declaragáo dos Direitos Humanos da ONU, na qualo Estado cu bano está representado.

De outro lado, o Júri, diante dessas violagóes deliberadas dos direitos do homem, estranha o silencio dos meios de comunicagáo ocidentais, que so-

negam á opiniáo pública falos táo graves, fatos que, na Europa Ocidental, lembram trágicos acontedmentos récenles.

Além disto, nao é lícito que nos contentemos com esta denuncia sem déla tirar conseqüéndas. A primeira destas é que Fidel Castro mentiu a opini456

"EM CUBA NAO HÁ TORTURA"

25

¿o publica internacional e que a sua afírmagéo de que nenhum prisioneiro loi torturado ou maltratado em Cuba é falsa. A segunda conseqüéncia é que se

faz mister ajudar, por todos os meios, os prisioneiros políticos aínda encarce-

rados ñas condicóes denunciadas ñas sessóes deste tribunal; dever-se-á exigir principalmente o respeito ao direito de defesa própria.

O Júri estima, por fon, que é imperioso constituir no plano internacional, á semelhanca do que se fez na Europa, urna Corte Internacional dos Direitos

do Homem, pois, no momento atual, os regimes de ataduras militares comu nistas violam sistemáticamente os direitos do homem, fortalecidos peto apoto

da URSS e pela cumplicidade ou pela covardia dos Estados democráticos.

Em conclusáo, prestando homenagem ao martirio dessas testemunhas

corajosas, que enfrentaram todos os riscos para dizer a verdade, toca agora aos povos, pela sua vigilancia e pela sua acáo, apagar no mundo a tragedia do comunismo totalitario. Nao se pode mais repetir o crime cometido antes da

segunda Guerra Mundial, quando os Govemos nao quiseram admitir a rea/ídade dos campos de concentragáo e dos horrores nazistas. Omitirse assim é tornarse cómplice de tais crimes.

Os dizeres destas páginas sao eloqüentes por si mesmos, de modo

a dispensar qualquer comentario.

i NOVAS CORRENTES RELIGIOSAS

A FIM DE ESCLARECER O PÚBLICO A RESPEITO DAS CORRENTES RELIGIOSAS E FILOSÓFICAS QUE SE TÉM PROPAGADO NO BRASIL, A ED. SANTUÁRO PUBLICOU: 15QUESTÓES DEFÉ

A SERIE DE FOLHETOS "NOS E NOS". AUTORÍA DE ESTÉVÁO BETTENCOURT O.S.B.

PEDIDOS Á EDITORA SANTUARIO, RÚA PE. CLARO MON-

TEIRO, 342, CAIXA POSTAL 04 - 12570 APARECIDA (SP)

457

Relativismo na fé?

A Única Igreja de Jesús Cristo Este artigo se deve a D. Boavenlura Kloppenburg O.F.M., Bispo Auxiliar de Novo Hamburgo (RS), que, com grande acume teológico, estuda certo re lativismo eclesiológico que vai sendo ditundido em nossos dias. Com efeito, segundo alguns, as diversas denominacóes cristas seríam equivalentes entre

si, de modo que ser catóSco, ser batista, ser presbiteriano, ser pentecostal...

nao laña diferenca diante de Deus. Segundo outros, nenhuma denominacéo crista preenche todas as exigencias da tgreja que Cristo quis fundar, de modo que esta só se realizará no fím dos lempos. Como fundamento destas proposigóes erróneas, muitos invocavam dizeres do Concilio do Vaticano II: "A

Igreja de Jesús Cristo subsiste na Igreja Católica, Apostólica confiada a Pe

dro". Ora Frei Boaventura, como teólogo perito fexpert; do Concilio do Vati cano II, explica o auténtico sentido de talpassagem do Concilio: este quis afirmar que. a Igreja Universal, confiada a Pedro, preenche todos os requisitos da Igreja fundada por Cristo, ao passo que as outras denominacóes cristas só satisfazem a alguns (ora mais, ora menos numerosos) desses requisitos. Agradecemos a D. Boaventura a valiosa colaboracao.

1. O problema

"Até agora estávamos acostumados a nos considerar como a Igre ja, única e verdadeira heranca do legado apostólico da fé crista", acusa o

Pe. Paulo Hornero Gozzi, S.S.S., na revista Vida Pastoral, de julho-agosto

de 1986, página 2. Tal modo de ver, porém, garante, já nao seria a doutrina oficial da Igreja Católica desde o Concilio Vaticano II. Cita entáo o texto de um ante-projeto de documento sobre a Igreja apresentado ao

Concilio em 1962, no qual se ensinava que somente a Igreja Católica é a única verdadeira Igreja de Jesús Cristo. Mas este texto, informa, "foi totalmente rejeitado pelos Bispos", e "o que náó se conseguiu mudar em quinhentos anos, alterou-se completamente em apenas dois anos de de bates". A doutrina certa do Vaticano II agora seria esta: "A Igreja de

Cristo nao é mais a Igreja Romana, nem se identifica mais com ela pura e 458

A ÚNICA IGREJA DE JESÚS CRISTO

27

simplesmente, mas subsiste nela". Depois explica: "0 Concilio reconhece e admite que pertencem á única, verdadeira e indivisivei Igreja de Cristo todos os balizados que professam a verdade do Deus Trino e confessam

a Jesús Cristo como Senhor e Salvador, nao so individualmente, mas

também reunidos em assembléias (Decreto sobre o Ecumenismo, UR 1). Isto porque nasceu também urna nova consciéncia da fundacáo da Igreja

e da entrega de seu governo, nao mais sobre Pedro e seus sucessores,

como aparecía no primeiro ante-projeto rejeitado, mas sobre os Apostó los e seus sucessores. O papel de Pedro é coordenar o grupo de seus ¡rmáos Apostólos para manté-lo unido (cf. Constituicáo sobre a Igreja, Lumen Gentium, III, n. 18)".

Assim manipula-se o Concilio. O que Ihe é atribuido no número 1 do Decreto sobre o Ecumenismo, lá nao está. Se estivesse, seria real mente doutrina inaudita. 0 documento, na alinea 2 do citado número 1, fala nao da Igreja, mas do movimento ecuménico, afirmando entáo que deste movimento participam "os que invocam o Deus Trino e confessam a Jesús como Senhor e Salvador, nao só individualmente, mas também reunidos em assembléias". O articulista simplesmente trunca o texto do Vaticano II. E o que afirma com base no número 18 da Lumen Gen tium (LG), também se distancia da doutrina do Concilio. No citado nú mero 18, alinea segunda, o Vaticano II simplesmente reafirma a doutrina do Vaticano I sobre a instituigáo, pecpetuidade, poder e natureza do sacro Primado do Romano Pontífice, propondo-a "novamente para ser criada firmemente por todos os fiéis". Deste contexto concluí o autor que o go verno da Igreja nao mais repousa sobre Pedro e seus sucessores, mas

sobre os Apostólos e seus sucessores! O papel de Pedro seria apenas o

de "coordenar o grupo de seus irmáos Apostólos para manté-lo unido". Na realidade, a doutrina sobre o Primado de jurisdifáo, explícitamente reafirmada pelo Vaticano II, vai muito além da mera funcjio de coordenacáo. Definiu o Vaticano I que ao Sucessor de Pedro nao cabe apenas a tarefa de inspecjio ou diregáo, e sim "o pleno poder de jurisd¡?áo sobre toda a Igreja, nao só ñas coisas referentes á fé e aos costumes, mas tam bém ñas que se referem á disciplina e ao governo da Igreja universal" (Dz 1831). Sem limite de tempo, pessoa, lugar e coisas, seu poder se estende individualmente ou coletivamente sobre todos os fiéis, todos os pastores, todos os ritos, em questóes de doutrina da fé, de moral, de governo, de liturgia, de costumes (Dz 1827). E o Vaticano II, na Lumen Gentium, n. 22b insiste neste ensinamento: "O Colegio ou o Corpo episcopal nao tem autoridade se nele nao se considerar incluido, como cabega, o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, e permanecer intacto o poder primacial do

Papa sobre todos, quer Pastores quer fiéis. Poís o Romano Pontífice, em virtude de seu múnus de Vigário de Cristo e Pastor de toda a Igreja, possui na Igreja poder pleno, supremo e universal. E ele pode sempre livremente exercer este seu poder".

459

28

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

Nem é verdade que aquele texto provisorio apresentado em 1962

ao Concilio "foi totalmente rejeitado pelos Bispos", pelo simples fato de jamáis ter sido objeto de votacáo.

Mais desconcertante, todavía, é a conclusáo que o articulista da Vi da Pastoral tira da substituido do verbo "est" (é) pelo verbo "subsistít in" no atual número 8, segunda alinea, da Lumen Gentium: "A Igreja de Cristo nao 6 mais a Igreja Romana, nem se identifica mais com ela pura e simplesmente, mas subsiste nela". Também o Sr. Luiz Carlos Araújo, Profecía e Poder na Igreja (Paulinas 1986) argumenta com o "subsistit in", para inferir que "todas as Igrejas cristas estáo sendo, em graus dife rentes, a Igreja de Cristo" (p. 21). Já antes, em Igreja: Carisma e Poder (Petrópolis 1982), Frei Leonardo Boff, O.F.M., se baseara no mesmo

"subsistit in" para deduzir que a Igreja de Cristo "pode subsistir também

"em outras Igrejas cristas" (p. 125). Nega-se assim a doutrina de fé sobre a unicidade da Igreja de Cristo.

2. Que ocorreu de fato no Concilio? Na Comissáo de Doutrina, na qual eu estava presente na qualidade de "peritus", encarregada da redacáo do texto sobre a Igreja, discutia-se a segunda alinea do número 8. Nela se ensinava que a única Igreja de Je

sús Cristo, que no Símbolo confessamos una, santa, católica e apostólica e que nosso Salvador, depois de sua gloriosa ressurreicáo, entregou a

Pedro para a apascentar e confiou a ele e aos demais Apostólos para a propagar e reger, constituida e organizada neste mundo como urna so-

ciedade, "é a Igreja Católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunháo com ele, embora fora de sua visfvel estrutura se encontrem varios elementos de santificacáo e verdade". Após demorado debate, do qual participei pessoalmente, o "este" foi substituido por "subsistit in". Todo o resto do texto ficou exatamente como estava e aín da hoje está. Por que se fez a mudanca? Na relacáo oficial, a Comisséo explica que com este verbo o texto se adaptou melhor á afirmacáo acerca dos "elementos eclesiais de santificacáo e verdade" presentes também em outras denominacóes cristas, algumas das quais, como as orientáis,

sempre foram consideradas até mesmo como "Igrejas" (a locucáo "Igre jas Orientáis" nao foi inventada pelo Vaticano II): "ut expressio melius

concordet cum affirmatione de elementis ecclesíasticis quae alibi adsunt". (este grifo está no original).

Era, pois, intencáo do Concilio Vaticano II ensinar que a una e única Igreja, como Jesús Cristo a quis e fundou, existe históricamente e como

tal é hoje cognoscivel; e que sua forma existencial concreta é a Igreja que ' está sendo dirigida pelo Sucessor de Pedro. Ao mesmo tempo, porém, 460

A ÚNICA IGREJA DE JESÚS CRISTO

29

reconhecia que varios elementos ("plura elementa") eclesiais queridos por Cristo estáo presentes ("adsunt") em Igrejas e Comunidades separa

das de Roma. Isto é: a "eclesialidade" nao se identifica sem mais ("est") com a Igreja Católica, mas incompletamente ou imperfetamente (segun

do o maior ou menor número de elementos eclesiais presentes); ela, a eclesialidade, se encontra outrossim ñas Igrejas ou Comunidades separa das. Num voto modificativo (o "placet iuxta modum") 19 votantes sugeriram entáo que se dissesse "subsistit integro modo in", ¡sto é, a Igreja de

Jesús Cristo se realiza de modo completo, perfeito ou pleno na Igreja Católica, insinuando que ela se realiza ñas outras denominacóes de modo nao perfeito ou pleno. A Comissáo respondeu que tal doutrina se encon tra mais adiante, no número 14. Veja-se sobre isso meu estudo A Edesiologia do Vaticano II, pp. 59-64, livro que a Editora Vozes retirou do comercio.

Esta, pois, é a doutrina clara e firme do Concilio Vaticano II: "Úni camente por meio da Igreja Católica, que é o auxilio geral da salvacáo, se

pode conseguir a total plenitude dos meios de salvacáo. Cremos que o Senhor confiou todos os bens da Nova Alianca a um único Colegio apostólico, a cuja testa está Pedro, a fim de constituir na térra um só Corpo de Cristo, ao qual é necessário que se incorporem plenamente todos

os que de algum modo pertencem ao Povo de Deus" (UR 3e.).

3. Documentos complementares Quando Leonardo Boff, no citado livro, concluiu do "subsistit in" que a Igreja de Cristo "pode subsistir também em outras Igrejas cristas",

um documento especial de Santa Sé sobre aquele livro (Notificacáo da Congregagáo para a Doutrina da Fé. de 11-03-1985) rejeitou semelhante exegese conciliar como "exatamente contraria á significacáo auténtica do

texto conciliar". E a Notificacáo sobre o livro de Leonardo Boff explica: "O

Concilio tinha escolhido a palavra subsistit exatamente para esclarecer que há urna única subsistencia da verdadeira Igreja, enquanto fora de sua

estrutura vislvel existem somente elementa Ecctesiae, que - por serem elementos da mesma Igreja - tendem e conduzem em direcáo á Igreja Católica". E manda ver a Declaracáo Mysterium Ecclesiae. de 24-06-1973, na qual se reafírmava:

"Os católicos tém o dever de professar que, por misericordioso dom di vino, pertencem á Igreja que Cristo funüou e que é dirigida pelos sucessores de Pedro e dos demais Apostólos, nos quais persiste íntegra e viva a primige nia instítuicáo e a doutrina da comunidade apostólica e o patrimonio perene da verdade e a santidade da mesma tgreja. Por isso nao 6 lícito aos fiéis imaginar que a Igreja de Cristo seja simptesmente um conjunto - sem dúvida dividido. ■461

30

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

apesar de conservar aínda alguma unidade - de ¡grojas e comunidades ecle

siais; e de nenhuma maneira sSo livres para opinar que a Igreja de Cristo nSo exista mais hoje em lugar nenhum, de forma que se deva considerá-la como urna meta a ser procurada por todas as Igrejas e comunidades".

Pois, como ensina o Concilio, a Igreja, de fato, se encontra plena mente lá onde os sucessores de Pedro e dos outros Apostólos realizam visivelmente a continuidade com as origens (LG 8b); e a unidade, que é um dom de Deus, de fato foi dada a esta Igreja "e nos eremos que ela subsiste inamissfvel na Igreja Católica"(UR 4c), dotada "de toda a verdade revelada por Deus e de todos os meios da grapa" (ib. 4f). E o Concilio Vaticano II é categórico quando assevera: "Por isso nao podem salvar-se aqueles que, sabendo que a Igreja Católica foi fundada por Deus me diante Jesús Cristo como instituicáo necessária, apesar disso nao quiserem nela entrar ou nela perseverar" (LG 14a). Mais severo aínda, adverte: "Nao se salva contudo, embora incorporado á Igreja, aquele que, nao perseverando na caridade, permanece no seio da Igreja 'com o corpo; mas nao com o coracio'. Lembrem-se todos os filhos da Igreja de que a

condicio eximia em que estao se deve nao a seus próprios méritos, mas a urna peculiar graca de Cristo. Se a ela nao corresponderem por pensamentos, palavras e obras, longe de se salva rem, seráo julgados com maior severidade" (LG 14b). Em documento de outra natureza, a Declaracáo Digrótatis humanae, sobre a Liberdade Religiosa, o Concilio nao é menos claro, porém mais positivo: "Professa em primeiro lugar o Sacro Sínodo que o próprio Deus manifestou ao género humano o caminho pelo qual os homens, sen/indo a Ele, pudessem salvar-se e tornar-se felizes em Cristo. Cremos

que esta única verdadeira Religiáo se encontra (subsistere) na Igreja Ca tólica e Apostólica" (n. Ib).

A Pontificia Comissáo Teológica Internacional publicou no ano pas-

sado Temas Seietos de Edestologia (veja-se o texto completo portugués em SEDOC de abril de 1986, 921-966), dedicando o décimo capitulo ao tema da unicidade da Igreja. Sua conclusáo é esta: "De nossa análise consta que a auténtica Igreja nao pode ser entendida como urna utopia que visaría a atingir todas as comunidades cristas hoje divididas e sepa radas. A verdadeira Igreja, bem como sua unidade, nao sao exclusiva mente urna realidade futura. Elas já se encontram na Igreja Católica, na qual está realmente presente a Igreja de Cristo". 4. Conclusáo A doutrina oficial da Igreja, por conseguinte, é sem dúvida esta: a única Igreja de Jesús Cristo de fato subsiste de modo pleno somente na 462

A ÚNICA IGREJA DE JESÚS CRISTO Igreja Católica; ñas outras Igrejas ou Comunidades separadas da Sé Apostólica de Pedro, ela subsiste apenas parcialmente, em diferentes graus de perfeicáo, segundo o maior ou menor número de elementos eclesiais substanciáis nelas presentes.

E porque a Igreja de Jesús Cristo é urna só, a que foi edificada so

bre Pedro e que o próprio Salvador denomina "minha Igreja" (Mt 16,18), e únicamente nela se encontra a plenitude dos meios de salva?§o e santificacáo, exorta o Documento de Puebla no n. 225: "Temos o dever de proclamar a excelencia de nossa vocacáo á Igreja Católica", já que, como ensina belamente no n. 227, ela "é o lugar onde se concentra ao máximo

a acSo do Pai, que, na forca do Espirito de amor, busca solícito os homens para partilhar com eles - em gestos de indizivel ternura - sua própria vida trinitaria".

Nossa abertura ao diálogo ecuménico nSo deve ser motivo para atenuar a clareza e a firmeza de nossa fé católica. Ainda neste ponto o

Concilio Vaticano II é firme quando nos dá a seguinte regra: "É absolu

tamente necessário que a doutrina inteira seja lucidamente exposta. Nada é táo alheio ao ecumenismo quanto aquele falso irenismo, pelo qual a

pureza da doutrina católica sofre detrimento e seu sentido genuino e certo é obscurecido" (UR 111. *

*

*

(continuacáo da p. 467)

Tornou-se um chavao alegar o conluio do Cristianismo com as torcas domi nantes; quem o faz, nao se dá ao cuidado de examinar a historia com objetividade e em toda a sua amplidao. Precisamente para dissipar preconceitos e equívocos a respeito, a historiadora medieval Regirte Pernoud tero escrito algumas obras, entre as quais "0 Mito da Idade Media", analisada em PR 289/1986, pp. 262-273. O Cristianismo é essencialmente um movimento religioso, de origem e fina-

lidade transcendental e, por isto, n3o equiparável ao Marxismo, que é visceralmente materialista e ateu. Sonriente quem desfigura ou esvazia o Cristianismo, o pode conciliar com o comunismo. A preocupacáo com o irmao e a justica social

no Cristianismo tém fundamento no amor a Deus (fundamento muito mais sólido e válido do que o odio que inspira a luta de classes); o Marxismo nSo conhece o amor ao próximo, mas, ao contrario, sacrifica o homem {também o proletario) ao Estado e á sociedade coletivista. - De resto, a historia atesta que até hoje o Maxismo, ao tomar o poder em qualquer continente, se voltou sempre contra a Religiao (crista ou nao crista); esta tática é inerente ao comunismo, que nao pode conviver com o transcendental e os ditames de humanismo que o senso religioso sempre ins pira.

É lamentável a posicáo pre-conceítuosa, artificial e tSo pouco científica do

autor do livrinho.

Esteváo Bettencourt O.S.B. 463

Um documento pouco conheddo:

Urna Carta da África do Sul Em síntese: Vai abaixo publicada urna carta proveniente da África do

Sul, que chama a atencáo pata o envoMmento de elementos espurios ou segregacionislas, também eles. na lula contra o apartheid ou a segregacáo

racial existente naquele país.. O comunismo está interessado nessa luta, e

disposto a tomar o poder com o apoto de eclesiásticos iludidos. - Na verdade, qualquer tipo de apartheid racial ou social ou político, é anticristáo.

Foi distribuida entre os Carmelos (Conventos de Carmelitas, casas de oracáo) de llngua portuguesa a carta abaixo, proveniente de urna exCarmelita que se sentiu chamada por Deus para atuar em favor da popu

lado negra da África do Sul. Este documento é significativo, porque póe

em relevo um aspecto da situacáo daquele pais que geralmente passa sob silencio: vé-se que a opressáo exercida sobre os negros nao se deve apenas ao Governo local, mas também á ingerencia de agentes soviéti cos, que tencionam aproveitar-se das circunstancias para implantar o

comunismo na África do Sul, como fizeram em outras ex-colónias áfricañas. Verifica-se que os povos oprimidos passam, nao raro, de um tipo de opressáo ou de colonialismo para outro, julgando conseguir assim a sua libertacao; as condicoes de vida de muitos povos africanos ainda sao as de colonias ... nao do mundo ocidental, mas dos regí mes soviéticos do Leste Europeu e da América Central.

Eis o texto da carta em pauta: 50 Berg Street - fíosenttenvilte Johannesburg 2197

África do Sul

31 de Afeó de 1986 Visitacáo de María SSma.

S.O.S. - AJUDAI-NOS COM VOSSAS VALIOSAS ORACÓES a Nossa Senhora, a Sao José, e a nossa Santa Mee Santa Teresa, para que 464

UMA CARTA OA ÁFRICA DO SUL

33

se/a evitado que nosso país seja vltima de uma revolucáo comunista, talvez aínda este mes. especialmente a 16 de junho! Nos nao temos outra esperanca que o milagre!

Minhas queridas Madres e Irmas.

Esta carta é um pedido urgente de oracóes pelo povo da África do Sul, e

especialmente petos pobres negros, que estáo sofrendo uma honivel e brutal mtimdacáo das máos dos que apregoam serem seus "libertadores': o movi-

menta terrorista CNA, promovido pelos soviéticos, que se aprésenla como o

dos auténticos líderes da populacáo negra da África do Sul. Estes assim cha

mados "líderes" gozam de tito pouco apoto entre a populacáo negra que se

véem toreados a apelar para os mais horrfveis métodos, para torear todo o mundo a aderir a seus sinistros empreendimentos, como apedrejar e queimar vivas as pessoas, lazé-las em pedacos, esquartejar enancas, e a terrivel "morte do colar", na qual um pneu com gasolina é posto ao pescoco da vñima e incendiado, ás vezes depois de os bracos da vltima terem sido cortados, pa ra evitar resistencia. Os comunistas se infíltram por toda parte, com suas

mentiras e desinfomacóes espantando um quadro totalmente falso de nosso país no Exterior, com cenas de TV para consubstanciar suas mentiras. Com ista, muita gente engañada passa a ter simpatía petos 'libertadores" do CNA; a política suhaíricana é apresentada sempre sob uma péssima luz, enquanto as terríveis atrocidades cometidas pelo CNA sao ignoradas, ou tácitamente aprovadas. O CNA está planejando uma diabólica exibicáo de maUade e car nificina a 16 de junho, e nossa populacáo negra está terriñeada para além do imaginivel. A situagáo é táo seria que apenas oracóes nos podem ajudar, es pecialmente oracóes a Mana SSma., e mais particularmente sob o Ututo de Senhora do Rosario de Fátima. Eu sei que posso contar com minhas irmás Carmelitas do mundo todo, que nos ajudem a atrair o milagre que po de salvar nosso povo dos horrores de uma ocupacáo comunista, e da conseqüente revolugSo violenta, com destruicSo de vidas e de valores da nossa civiBzacáo crista, a nossa santa fé mais especialmente. Eu tenho trabajado

entre os pretos desde 1968, tendo sido euprópria antes uma Carmelita, e tendo sido chamada por Deus, como parece claro a mim, a deixar o Convento e engajar-me no trabalho pelos pretos, especialmente como professora. Até recernemente eu trabalhava no SOWETO, a maior área residencial de pretos na

África do Sul, indo e vindo cada día durante todos os meses das óesordens,

até que, infelizmente, a revolucáo tomou conta de nossa escola, e nño pude mais continuar ensinando lá. O que eu vi e experimente) era demoniaco e mau a um grau terrível. Changas que eu conheci lindas, felizes e queridas, foram deformadas em irreconhecfveis monstros de odio selvagem. E foram defor madas assim por aqueles que decidiram que as enancas negras devem ser a

Snha de frente da revolucáo: uns se tomaram os "Cantaradas" - como sao conhecidos, e estes sao uma pequeña minoría, - outros, pobres inocentes vi-

465

34

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

Urnas forjadas sob ameaca de morie a engrossar a violencia de rúa. Poucos pensam no daño espiritual dessas pessoas. mas esta nao é a preocupagío desses cujo único objetivo 6 derrubar o govemo e estabelecer sua brutal tira nía comunista. Eles tém pervertido nossas enancas negras, ensinando-lhes

odio a Deus ao ponto de sacrilegios serem cometidos com arrogancia. É hor-

rivelmente triste ver estas coisas acontecendo com criangas que nos ama mos tanto e cujo progresso tanto desojamos. Agora, urna geracSo inteira pa rece perdida, se nao duas ou mais, com negros "radicáis" manifestando urna setvageria que era totalmente desconhecida em sua cultura tribal. Ao mesmo tempo, a grossa maioria dos pretos e trancos continua fíela sua crenca crista de que só Deus nos pode ajudar, e portanto, em número cada vez maior, es tamos nos voltando para a oragéo. Nossa populacáo negra necessita espe cialmente de urna tremenda coragempara vencer o estrangúlamelo do pavor que Ihe foi imposto. Nos todos necessitamos de coragem, e eu própria corro perigo de vida porque estou me opondo ao Comunismo. Infelizmente, alguns altos prelados aquí lavorecem a vinda do Comunismo e fazem tudo a seu al cance para mobilizar gente para apoiá-lo em nome do Evangelho, aplicando os principios da Teología da Ubertacáo condenados pela Igreja. E os Bispos mo derados parecem ter medo de (alar contra o Comunismo! PEDIMOVOS ENCARECIDAMENTE: rogai a Nossa Senhora que nos livre deste perigo!

Em Jesús e María unida a vos, e certa da torga de vossas oracóes, despeco-me,

(a) Joana Píenaar

As observares fináis da carta sao importantes, pois mostram a perplexidade que afeta mesmo as pessoas mais bem intencionadas; o Comunismo quer escalar o poder com o apoio da Igreja, mas depois* se volta tiránicamente contra Ela.

Completando os dizeres da carta da Sra. Joana Pienaar, transcrevemos noticias tiradas do jornal francés L'Homme Nouveau, edicáo de

¡ulho-agosto 1986, n° 905-906, p. 13: "Na África do Sul, sem comunismo

já se teña encontrado urna solucáo" (Houphouét-Boigny). Observa entao Roben Lacontre, colaborador de Fígaro Magazine: "Sejamos claros

1. O apartheid é infame, inlquo. Foi criado pela historia, como muitas outras coisas Mames e infquas. Deve desaparecer. 466

UMA CARTA DA ÁFRICA DO SUL

35

2. O apartheid existe em outros países. Voces acreditam que os sovié ticos suprimiram os salvo-condutos? Que os oiienta milhOes de mugutmanos da URSS e as outras minorías nao russas podem habitar tranquilamente no país de Moscou?...

4. ... Os objetivos soviéticos sao muito claros: utilizar todos os movimentos agitadores para disseminar o tumulto, tazer explodir o regime existente e levar ao poder os agentes de Moscou". Sem dúvida, o apartheid ou a discriminado racial deve ser comba

tido e eliminado. É preciso, porém, que os cristáos estejam conscientes

da ambigüidade da situacáo da África do Sul e se empenhem pela autén

tica libertagáo da populacáo negra, que muitos querem explorar sob nova forma de opressáo.

A propósito lembramos quanto foi dito a respeito da discriminadlo ou segregacáo existente nos países soviéticos em PR 291/1386, pp. 378s.

Cristianismo e Marxismo, por Freí Betto. - Ed. Vozes, Petrópolis 1986,130 x 180 mm, 47 pp.

O autor quer provar a "conciliabilidade" de Cristianismo e Marxismo. Para tanto, interpreta o Cristianismo nascente como urna forma de movimento social ou socialismo, que tinha "notáveis pontos de semelhanca com o movimento mo

derno da classe operaría, pregando a iminente salvacüo da escravidSo e da miseria" (cf. p. 17). Posteriormente o Cristianismo se teña tornado um sistema de apoio aos maiorais contra os pequeninos (cf. p. 19). Mas o Cristianismo hoje volta a ser

um movimento popular de íibertacáo, como acontece na Nicaragua e na América Latina em geral (cf. pp. 37-39). Do seu lado, o Marxismo, diz Freí Betto, nao é necesariamente anticristáo, mas é "a-religioso" (sem religiao), podendo conviver com um Cristianismo popular

ou social (cf. pp. 25-31). - Daí a conclusao:sao compatíveisentre si Cristianismo e Marxismo (cf. pp. 42s).

Este livrinho de 47 páginas aborda assunto delicado e complexo de maneira superficial, sem aduzir a documentacao adequada, mas contentando-se, por vezes,

com afirmacSes gratuitas. A sua concepcao de Cristianismo nascente baseia-se ñas interpretac&es de Engels e Marx (pp. 17-19), sem recurso a algum historiador ou especialista na materia. Desta maneira preconceituosa (nSo científica) o autor pre

para a conclusáo a que deseja chegar.

(Continua na pág. 463) 467

Queé

A Igreja Católica Liberal?

Em tíntete: A Igreja Católica Liberal (ICLI é urna córtente derivada do ramo jansenista - "Velho-católico", Que é cismático e tem suas origens nos sécalos XVIII-XIX. Foi na Inglaterra, por obra do bispo anglicano Char les Gore, que a ICL se constituía em 1916. A sua mensagem conserva ele mentos típicos do Catolicismo (pretensamente o episcopado, a Eucaristía, o ministerio sacerdotal...), juntamente com traeos do hindúismo (reencarnacao, salvacSo universal...) e principios do liberalismo racionalista e relati vista dos tempos atuais; ora estas tres modalidades de pensamento se anulam entre si, de modo que é impossivel definir o que a ICL tem de especifi co e novo a dizer ao mundo de hoje.

Tem-se espalhado no Brasil urna denominacao religiosa dita "Igreja Ca

tólica Liberal" (ICL); celebra seu culto e realiza sua catequese, deixando muitas pessoas perplexas a respeito da ¡dentidade desse movimento religioso. Em vista disto, apresentaremos a origem e a doutrina dessa denominado, valendo-nos de impressos distribuidos por membros da mesma*.

1. Origem da ICL Eis como os próprios escritos da ICL apresentam a origem dessa faccao:

/

Esses impressos tém os seguintes títulos: "Igreja Católica Liberal — Diocese do Brasil — Informapáo Ceral 1985" (citado como INF¿ "Igreja Católica Liberal - Fórmula Abreviada da Eucaristía" (citado co mo FAEA

"Igreja Católica Liberal - Breve Explicacao" (citado como BEA 468

IGREJA CATÓLICA LIBERAL

37

"A Igreja Católica Liberal possue Sucessffo Apostólica valida a reco-

nhecida, derivada da Igreja Católica Apostólica Romana, através da Igreja

Velha-Católica da Holanda (Sé arquiepiscopal da Utrecht), queseseparou de Roma há mais de dois sáculos.

Estabelecida na Gra-Bretanha e Irlanda no inicio do sáculo XX, ñor-

ganizou-se em 1916, atualizando-se e adotando o nomede IGREJA CATÓ LICA LIBERAL.

A Igreja Católica Liberal é urna comunidade crista... completamente independerse e autónoma" flNF, fascículo nSo paginado). Explicitemos estes dizeres:

A Igreja Católica' foi sacudida pelo Jansenismo nos séculosXVIl-XVIH. Esta correóte de pensamento devia-se a Cornélio Jansénio (1585-1638), que escreveu o livro Auguitinus, publicado postumamente (1640). Esta obra professava idéias heréticas a respeito da natureza humana (totalmente deterio rada pelo pecado), a propósito da graca (¡rresistfvel) e da predestinacSo (restrita a poucos homens). O Jansenismo foi condenado por Inocencio XI em 1653. Os jesuítas, como baluartes do pensamento da Igreja, se Ihe opuseram com grande zelo. Aos poucos os jansenistas foram-se envolvendo noutra con

troversia - a do Galicanismo (criacao de urna Igreja nacional na Franca) - o que tornou muito sutil e prolongada a controversia. Esta ardeu tanto na

Franca como na Holanda: em Utrecht (Pafses-Baixos), havia urna sede epis copal cujo titular — Pedro Codde — suspeito de Jansenismo foi destituido pe

la Santa Sé; a sede estando vaga, o Conselho da diocese, sem consultar Ro ma, houve por.bem eleger em 1703 para o cargo de arcebispo o Vigário Geral Cornélio Steenhoven; este recebeu a ordem episcopal de um bispo fran cés suspenso (Dom¡ñique Marie Marlet). A Santa Sé, porém, náb reconheceu

o novo titular. Contudo este persistiu na sua funcao; donde se originou o cis ma jansenista, que até hoje perdura e conta cerca de 12.000 fiéis. Ora em 1870 reuniu-se o Concilio do Vaticano I, que profnulgou o primado de jurisdicao do Romano Pontífice e a sua infalibilidade quando fala ex cathedra sobre assuntos de fé e Moral. Urna faccSo de sacerdotes e

Católica, geralmente chamada Romana, porque pastoreada pelo

Bispo de Roma, sucessor de SSo Pedro, a quem Jesús confiou as chaves do Reino doscéus (Mt 16,1&19;cf. Le 22,31s; Jo 21,15-17). O adjetivo Roma na nao restringe a catolicídade ou universalidade da única Igreja fundada por Cristo.

469

38

"PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

leigos católicos nao aceitou tal definicáo, abrindo assim o cisma dos chama

dos "Velhos-Católicos", que tinha á frente o sacerdote I nací o Dollinger. Es

tes se aproximaram dos jansenistas holandeses; elegeram para si um bispo,

José Hubert Reinkens, que foi receber a ordem episcopal na Holanda em

1873. Em 1889, os Velhos-Católicos e os jansenistas assinaram urna Decíaracao de Principios comum, segundo

a qual só reconhecem os Concilios

Ecuménicos celebrados antes de 1054 (ano em que os bizantinos se separaram de Roma). Os Velhos-Católicos se estenderam para a Inglaterra, onde fundaram urna missao chefiada pelo bispo Arnold Harris Mathew, que recebeu sua or

denadlo episcopal em Utrecht aos 28/04/1908 por parte de um bispo janse nista. Foi neste contexto velho-católico-jansenista que em 1916 se originou a "Igreja Católica Liberal", ramo independente de qualquer outro dentro do Cristianismo. O seu grande doutrinador foi o bispo anglicano Charles Gore, que editou o livro LUX MUNDI (LUZ DO MUNDO), de varios autores; foi

Gore quem deu o título de Liberal á forma de Cristianismo por ele patroci nada numa tentativa de conciliar o pensamento cristao com a filosofia libe

ral modernista, condenada por Pió X em 1907'.

A Igreja Católica Liberal diz contar com quarenta e um bispos, espaIhados por quarenta e um países. No Brasil tem um Bispo diocesano com seu

Vigário Geral e igrejas ou cápelas em Brasilia, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Sao Paulo, Sergipe. Afirma estar na linha da sucessao apostólica, pois seus bispos foram ordenados por bispos validamente ordena dos e sucessores dos Apostólos. Examinemos agora

2. A Doutrina da ICL Os jansenistas e os velhos-católicos deixaram-se influenciar forte mente

pelo protestantismo. O mesmo. porém, nao aconteceu com a ICL, que diluiu

extremamente a mensagem crista e assumiu o panteísmo e o reencarnado-

nismo das crencas indianas. É significativo o Rito abreviado da Liturgia Eu-

carística da ICL: conserva oracóes á SS. Trindade, a fórmula de consagracáo do pao e do vinho, a Comunháo..., mas professa um Credo despojado de

O modernismo era urna córreme de pensadores que guardava os nomes tradicionais da mensagem crista (fé, pecado, redencao, grapa.. .), mas os esvaziava de seu conteúdo teológico, para dar-lhes um sentido racionalista ou meramente filosófico. 470

IGREJA CATÓLICA LIBERAL

39

qualquer referencia a SS. Trindade e ao sacrificio expiatorio de Cristo1. Eis o respectivo texto:

"Oremos que Deus é Amor, Poder, Verdade e Luz. Que urna justica peiietta regula o mundo. Que os seus filhos um día chegarao aos seus pés, por muito que se tenham transviado. Sustentamos a paternidade de Deus e a fratemidade humana. Sabemos que tanto melhor serviremos a Deus quanto melhor servirmos ao homem nosso irmao. Por isso, a sua béncao repousa so

bre nos, ( i) bem como a sua paz para sempre. Amém".

Embora o boletim INF afirme a prática dos sacramentos, dá-nos a sa

ber que na ICL "se reconhece o direito de seus membros a urna completa liberdade na interpretacao dos Credos, Escrituras e TradicSes bem como de sua Liturgia e do Sumario de Ooutrina. Nao pede a seus membros a aceitacao de urna crenca comum, senaó a boa vontade para orar juntos por meio de um ritual comum. Acolhe em seus altares a todos os que sincera e reveren temente deles se aproximan) para participarem dos sacramentos, quer perten-

cam a algum Credo religioso ou a nenhum, desde que se sintam chamados ao servico de Deus".

Apesar de todo esse liberalismo, a ICL propoe fórmulas que denunciam o patrimonio cristáo de suas origens, mescladas com afirmacSes pantei'stas, que absolutamente nao sao conciliáveis com a mensagem crista. É o

que torna inconsistente ao extremo a doutrina da ICL. O panteísmo aparece nos seguintes dizeres:

"Qualquer pessoa se pode filiar como MBMBRO da Igreja, pois as religioes sao energías cósmicas, ¡á comidas na SEMENTÉ UNÍ VERSAL, quando se manifesta um Universo. Assim sendo, as ReligíBes foram criadas para o HOMEM para acelerar o desenvolvimiento do ser humano em geral e nSo a urna determinada élite" (INF).

"Todos os Grandes Rituais estao baseados num Ritual Primordial e encontram-se de tal modo ligados com este Divino Ritual da Criacao que cada ato, palavra ou gesto que se executa com o Ritual de aquí embaíxo se corres

ponde com urna realidade muitíssimo Maior de Aquele Ritual Eterno lá de cima.

1 Sabemos que os principáis misterios da fé crista sao: 1) Unidadee Trinda

de de Deus; 2) Encarnafio, Paixáo e Morte de Nosso Senhor Jesús Cristo. 471

40

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

Assim, desta maneira, deste nosso Ritual humano flui urna continua corrente até Ácima, que se une com Aquele Grandioso e Poderosissimo Fogo Criador, que é a manifestacao de Deus em Seu Universo. Por outro lado, como o Ritual executado aquí na térra está harmoni zado com o Grande Ritual de Cima, é capaz de transmitir algo das Divinas Forcas Criativas ao Mundo circundante, tendo como centro o lugar onde é realizado, ao mesmo tempo que beneficia todos aqueles que receberam a Honra e Privilegio de participar de tSo Magna e Maravilhosa Obra" (\Uf).

"A religiSó tem sido buscada como um meio de salvacáo, o que é um conceito demasiadamente restritivo, visto que todos temos nossa origem em

Deus e a Ele voltaremos quando perfeitos. Os servicos religiosos tém como objetivo, alcancar esta perfeicao visada pela Leí da EvolucSo. Na Igreja Cató

lica Liberal o conceito essencial éode cooperario com Deus na obra evolu tiva, portanto é um conceito de servico e nSo de salvacáo própria" (BE). 0 texto cita pensadores antigos, abonando a filosofía dos mesmos:

"Orígenes foi também um Universalista, quer dizer, acreditaba que todos os homens serao SA L VOS, porque sao divinos em esséncia ".

"Giordano Bruno (1548-1600) foi um defensor do sistema de Copérnica, porém também ensinou que a natureza vive e é divina. Deus é a onipenetrante alma de todas as coisas, o pequeño e o grande e. porsua vez, imá nente e transcendente" (\W).

O panteísmo inspira-se em fontei hinduístas, que s3o citadas explícita mente no Informativo: "Achamos oportuno as palavras do AVATAR CHRISNA, fundador do

Induismo, religiSó miienarda india, há mais de 20.000 anos, sendo portanto a mais antiga religiao do planeta ainda em atividade. palavras essas que repre sentan) urna auténtica joia da literatura védica cuja mensagem chegou até

nos: 'Pouco importa o caminho pelo qual os homens me procuram, pois sempre é meu qualquer caminho que eles sigam' ".

Com o panteísmo, é professada pela ICL a reencarnado e, finalmente, a salvacSo de todas as criaturas:

"Orígenes (185-257) foi considerado o primeiro grande teólogo da Igreja. Ensinou doutrinas bem familiares para os católicos liberáis. Orígenes

foi mais conhecido por seus ensinamentos sobre a oré-exsisténcia. Pensava-se 472

IGREJA CATÓLICA LIBERAL geralmente que nao ensinava a reencarnado como se entende agora. Porém, as seguintes citacdes de seu DE PRINCIPIIS parecem implicar que a en sinava, pelo menos em parte: 'A alma nao tem principio nem fim... Toda a alma entra neste mundo fortalecida pelas Vitorias ou debilitada pelas derro

tas da vida anterior.. . seu trabalho neste mundo determina seu comportamentó no mundo que se hé de seguirá este... Todos, em sua devida hora e por sua própria vontade, regressario a Deus, incluindo o diabo e os Anjos Caídos; regressarSo finalmente salvos e entSo Deus estará todo em Todos'"

É de notar que Orígenes propds tais idéias (preexistencia e reencarnagao das almas, salvacao universal) como hipóteses. Foram seus discípulos • os chamados "origenistas" (nao raro, mongesque ná*o freqüentavam escolas teológicas) — que fizeram de tais teorías proposicoes sólidamente afirmadas. O Concilio de Constantinopla II (553) condenou formalmente o origenismo, ou seja, as teses atrás enunciadas.

Vé-se, pois, que a doutrina da ICL é estranhamente eclética, ou mesmo contraditória: de um lado, afirma nao ter nenhum dogma e atender a to do homem que simplesmente "considere a religiao como urna atitude que deve ser vivida mais do que urna crenca a ser professada" (INF). Doutro la do, propoe seus dogmas ou artigos que a razSb nSb alcanca, mas so a fé pode

professar, tais como a reencarnacao, a'satvacfo universal, o valor da Liturgia e dos sacramentos como ocasüfo de nos por em contato com "um Ritual Eterno lá de cima" (INF). .. Assim elementos clássicos do Catolicismo se mesclam com elementos religiosos heterogéneos (hinduístas, principalmen te) e com principios da filosofía racionalista (que por si bastariam para anu

lar os anteriores), é difícil entender como numa só mente se possam combi

nar tantas assercóes contraditórias entre si. Verifica-se, alias, que, quanto mais recentes sao os ramos que infelizmente se separam do tronco cristío iniciado por Jesús Cristo e confiado a Pedro Apostólo, tanto mais diluidos e

pobres sao em seu conteúdo; cada vez menos se encontram neles os elemen tos típicos e essenciais do Evangelho.

3. A sucessSo apostólica

A ICL reivindica para si a sucessá~o apostólica e, por isto, validade do seu sacerdocio ministerial e validade dos sacramentos por ela administrados. A propósito observamos:

A sucessSo apostólica nffo é o simples fato de que as ordenacoes episcopáis sempre foram ministradas validamente de geraclo em geracSo e assim 473

42

"PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

chegaram até nos a partir de Pedro, Tiago, Joao...; com efeito, a sucessío apostólica nao é um fluido que passa de um Bispo para outro pela imposicáo

das míos. Além da validade das ordenacóes através dos séculos, a sucessao apostólica requer comunhao de fé e de tarefas com os demais Bispos ou com toda a Igreja; principalmente se exige comunhSo com o centro de referencias de toda a Igreja, que é Pedro e seus sucessores.

As comunidades separadas (cismáticas ou heréticas) sempre procuraram ter a aparéncia de sucessao apostólica, a fim de justificar e valorizar o seu culto sagrado e o seu ministerio pastoral. Tal é o caso, ainda hoje, das Igrejas Católicas Apostólicas Brasileiras, que dizem derivarse de O. Carlos Duarte, ex-Bispo de Maura, mas que nao guardam a comunhao com a Igreja Universal; nao possuem a sucessao apostólica propiamente dita. Tal é o caso também dos Bispos "patriotas" instituidos por governos comunistas e sagra dos por um Bispo "colaboracionista". - Entre os elementos constitutivos da sucessao apostólica, seja realcada a comunhao de fé; é necessário que o Bis po conserve intata a doutrina transmitida desde os tempos dos Apostólos.

Essa comunhao é expressa pelo fato de que toda ordenacio de Bispo supóe a presenca de tres Bispos concelebrantes.

Eis o qué podemos dizer sobre a Igreja Católica Liberal. Seria desejável

que nao utilizasse o apelativo "Igreja Católica..." para se autodesignar, vis

to que esta expressáo já é consagrada pelo uso de vinte séculos para designar a única Igreja de Cristo fundada sobre a Rocha, que é Pedro. A existencia dessa nova corrente religiosa entre nos evidencia, mais urna vez, a enorme necessidade de que os discípulos de Cristo se aprofundem na mensagem do Evangelho e possam "dar razao da sua esperanca a todos aqueles que a pe-

dem"(1Pd3,15).

474

D¡scute-se:

(emitérios: Jardins de Lazer e

Pesquisas Científicas Em tíntese: O projeto do Deputado Freitas Nobre, que tem em vista transformar os cemitérios em áreas de lazer e pesquisas científicas, fere nao somonte a consciéncia crista, mas também valores fundamentáis do ser hu mano como tal. Em última instancia, equivale a reduzir o cadáver á condicSo de adubo para árvores frutíferas e decorativas; além disto, descaracteriza os cemitérios, que nio sao necessariamente lugares de tristeza, mas sim lugares de recolhimento, meditacao, salutar e oracio. A reflexio sobre a morte, Ionge de corresponder a masoquismo ou pessimismo, é extremamente útil a to

do homem, pois se diz com razio que a morte é a única certeza que o ho mem tem desde que nasce. Tal reflexio deve ser instituida por quem tem saúde e lucidez de mente, e nao hi de comecar quando a doenca grave difi culta o pleno funcionamento do ratíotlnio e dos afetos.

0 Deputado Freitas Nobre elaborou um projeto de leí segundo o qual os cemitérios seráo transformados em parques de lazer e de pesquisas cien

tíficas. Com efeito; os defuntos háb de ser enterrados em posicifo vertical; em

cima dos cadáveres colocar-se-ao estrume e adubantes, de modo a tornar o solo fértil; e neste se plantario árvores e vegetáis de diversos tipos destinados a proporcionar bem-estar a quem deseje passear, e materia de pesquisas bioló gicas, botánicas e zoológicas a quem estude flora e fauna. Quem o quiser, poderá comer as frutas (mangas, laranjas, abacates. . .) produzidas nocemitério.

0 projeto vem sendo discutido calorosamente, pois é algo de original no Brasil, embora nao seja novidade (como dizem) em outros países. Conseqüentemente surge a pergunta:

Que dizer?

1. Antes domáis, podemos reconhecer.no Deputado Freitas Nobre, a interrcáo de tirar dos cemitérios a sua índole tristonha e acabrunhadora; esta 475

44

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

seria trocada pela de um lugar de utilidade pública, aproveitado para fins sociáis e científicos; a tétrica imagem da morte assim se dissiparia, um pouco

ou muito, na mente do público.

2. Todavía nao seria lícito esquecer graves inconvenientes que tal projeto acarretaria para a sociedade:

a) Respeito ao corpo humano

Em perspectiva crista (que é também a de um auténtico humanismo),

o corpo humano merece respeito nao somente em vida, mas também depois

da morte. Nele e por ele alguém "se realizou"; a alma humana desenvolve suas virtualidades e procura atingir a sua plena identidade mediante o corpo; o misterio profundo ou o sacrário da personalidade humana é inseparável da

realidade corpórea da mesma.1 Por isto o corpo humano, após a morte (ou

depois que a alma ¡mortal o deixa para comparecer diante de Oeus), nfo po de ser tratado como lixo, muito menos. . . como estéreo ou adubo. Mas há de ser considerado com respeito e dignidade.

Durante muito tempo, até 1964, a Igreja se opós á cremaclo dos cadá veres porque esta era propugnada por pensadores nao cristSos com a intencao de menosprezar o corpo humano; os materialistasqueriam, mediante esse

processo, dizer que o homem é mera materia, de modo que, quando deixa

de viver e ser útil, merece ser queimado, como um detrito imprestável; cf. PR 215/1977, pp. 468-478. Em 1964 foi suspensa a proibicao de incinerar os cadáveres no Direito da Igreja, porque em nossos dias se vé que tal procedimento nao está necessariamente ligado a urna filosofía anticrista; pode ser sugerido por razoes de higiene, de urbanismo, de economía. .. compatíveis com a mensagem do Evangelho.

A ressurreícao dos monos ou da carne, que a fé crista professa, nao é prejudicada pela cremacao dos cadáveres; mesmo sem cremacSo, estes se dissolvem na térra. . . A teología ensina que Oeus reconstituirá o corpo huma-

Sabemos que o ser humano é um composto de corpo e alma; agüele é material, esta é espiritual. Bnquanto o corpo tem condicoes de saóde ou de bom funcionamento, a alma permanece nele e desenvolve nele as suas virtua lidades. Quando, porém, o corpo está irremediavelmente desgastado (o coracao pira, por exemplo), a alma (que nSo morre) separase do corpo e conti nua a viver no além, colhendo o que semeou na vida presente. 0 corpo se decompoe, reduzindo-se aos seus elementos (calcio, ferro, hidrogénio, oxi-

genio, carbono...).

476

CEMITÉR1OS: JARDINS DE LAZER

45

no a partir do que a Filosofía chama "a materia prima". . ., pura potencia, que, unida á alma humana (forma substancial), se torna o corpo individual e

próprio dessa alma1. Portanto, qualquer que seja o destino dado ao cadáver,

Oeus restaura o ser humano na sua identidade psicossomática (ou espiritual e material) no dia da ressurreigao final. Em conseqüéncia, vé-se que ná*o é a expectativa da ressurreica*o que se opSe a esta ou aquela maneira de tratar os

cadáveres; mas é, sim, o respeito devido ao corpo humano, templo do Espiri to Santo, "utilizado por Este para toda obra boa" (como diz S. Agostinho),

que exclui a equiparacáo do cadáver a lixo ¡ndesejável.5 b) Cemitério: lugar de tristeza?

A palavra "cemitério" vem do grego koimetérion = dormitorio. Ela traduz a consciéncia que os cristaos tém, de que a morte nao é urna ruptura ou a extincao da vida, mas é um "sonó" que terminará com a ressurreigao no dia da parusia (segunda vinda de Cristo) e do juízo final. A alma humana,

separada do corpo após a morte, continuará a viver consciente e lúcida no estado de bem-aventuranca ou de desgraca que ela tiver preparado para si mesma (ela nao cai no sonó ou no torpor); mas o corpo humano é que pare ce cair num sonó, do qual despertará quando Cristo o chamar para a ressurreicao (cf. Jo 5,25-28). O cemitério, portanto, deve ser na"o um lugar de tris teza (pois a vida nao nos será tirada, mas trocada), mas, sim, um lugar de recolhimento e oracSo; trata-se de algo.que lembra aos homens o sentido da vida presente, ajudando-os a construir a reta escala dos valores sem ilusao

a respeito da transitoriedade das criaturas. Tal meditacao é salutar; deveria mesmo ser incentivada, pois, como se diz, "a morte é a única certeza que temos desde que nascemos"; fugir da ref lexao sobre a morte é enganar-se a si mesmo numa atitude imatura; é preciso que o homem maduro saiba conviver com a idéia da morte, que o espreita e o pode arrebatar a qualquer mo

mento. Quem pensa na morte que o espera, dispoe a sua vida de maneira harmoniosa ou de tal sorte que a morte nao seja urna ruptura ou um hiato assustador, mas, ao contrario, um ponto de chegada, de consumacao, de pienitude. Por isto um projeto de urbanismo que descaracterize os cemitérios identificando-os com parques de lazer e de pesquisa científica, é nocivo ao próprio homem, porque Ihe subtrai urna ocasiao de perceber o sentido da

vida e da morte — percepcao esta que é de importancia capital. É precisa

mente quando tem saúde e boas condicoes de reflexio que o homem deve

1 Ver Curso de Iniciacao Teológica por Correspondencia, módulo 34 (C.p. 1362, 20001 Rio}.

2Em linguagem crista, diz-se com Sao Paulo que o corpo é o templo do Es pirito Santo (cf. ICor 6,19). 477

46

"PERPUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

pensar na realidade inevitável da morte; se comeca a fazé-lo quando esta se

aproxima mediante doenca grave, talvez nao tenha as condicoes físicas ou psíquicas necessárias para este exercício.

c) Respaito as familias e aos morto» O projeto do Deputado Freitas Nobre tende a fazer esquecer nao somente a morte, mas também os monos; a mansao dos monos perdería a sua

identidade. Ora isto vem a ser desrespeito aos falecidos como também ás res pectivas familias. Estas tém o direito de visitar o túmulo dos seus monos, de rezar por eles e de se concentrar sobre a sua memoria num clima de paz e

de reverencia. Tal direito é ¡nalienável; seria conculcado se os cemitérios se

tornassem parques de lazer e récriacao. é preciso que as autoridades públicas nao imponham aos cidadüos medidas que ofendam as conciencias e os prin cipios básicos do humanismo (para ná*o dizer:... do Cristianismol.

Quanto ao sepu11amento em posicáo horizontal ou vertical, é algo de totalmente secundario, contanto que se respeite o cadáver ( o respeito exige que este seja enterrado com roupa ou vestido). Também é indiferente a fé crista o uso de caixao ou de lencol para envolver o corpo morto; a rigor, poder-se-ia dispensar até mesmo o lencol (mortalha) para o cadáver a ser enter rado, contanto que isto nao significasse que os restos mortais sao estéreo.

Sao estas algumas ponderales que o projeto Freitas Nobre sugere; embora inspirado por be las intencoes, afeta valores nao só do cristao, mas do ser humano como tal.

478

NOTA

" Thérése ": um Filme de Álain Cavalier O Festival cinematográfico de Carines (maio 1986) teve como ponto alto - coisa estranha! - um filme sobre Santa Teresa do Menino Jesús de Usieux, ou Santa Teresinha.

É o que refere Mons. Vilnet, arcebispo de Lille, e Presidente da Confe

rencia dos Bispos da Franca no Boletim Diocesano de Lille n? 11 (13/06/86); deixamos que o relator nos fale em seu estilo próprio e muito significativo:

"Coisa surpreendentei. . . Os críticos cinematográficos nSo se cansar» de elogiar um filme francés que acaba de ser apresen tado ao festival de Cari nes. O seu título? Tao breve quanto possível: Teresa. Seu cenarlo? Nenhum

a nao ser a biografía de urna jovem do fim do sáculo pastado, que se enclau-

surou no exiguo espaco de um Carmelo, onde e/a morreu de tuberculosa, na flor de seus anos.

No día da morte de Teresa de Usieux (pois é déla que se trata), urna das Religiosas perguntava o que a Priora poderia escrever no noticiario ne crológico que deveria ser enviado a todas as comunidades carmelitas...' Um ceno Alain Cavalier valeu-se dessa existencia de Teresinha. Ao seu

filme, vista a opiniao dos críticos, desejamos ampia rsceptividade...

Qual é a chave desse filme sedutor que corría o risco de ser insípido?

Alain Cavalier mesmo responde: As Carmelitas dedicam seu amor a um homem que nao deixou de repetir como em refrió: 'Eu sou a Vida. Eu sou a

Vida. Eu sou a Vida'.' Tal homem as encanta e, por vetes, as abandona. Cabem-lhejunto a elas todos os papéis: o de esposo, o de pai, o de filho...

1 Tao modesta e apagadamente tinha vivido Teresa de Listeux! (Nota do

tradutor).

479

48

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 293/1986

O cenarista atribuí a urna co-lrma de Teresa esta verif¡cacao, cujo carater humorístico nada tem de sacrilegio: 'Dígase que todas estao empolgadas por alguém que morreu hi dois mil anos e de quem nSo se sabe nem mesmo se existíu\'

'Quem dizem os hornens que eu sou?' perguntava o Cristo aos seus dis

cípulos. Hoje aínda nos, que fazemos profissSo de fé no Cristo, somos assim interpelados.

E o próprio Cristo nos interroga: 'Quem dizeis que eu sou?Teresa res-

pondeu: "Tudo V"

Os comentaristas cinematográficos observam aínda o seguinte: a artista Catherirte Mouchet, que representa S. Teresinha, traz em sua vida pessoal o mesmo cunho de simplicidade e profundidade que ela assume no papel de Teresinha; é por causa disto que ela representou tSo bem a Santa. A verificacao de tais fatos dá-nos a ver que parece que o mundo de hoje, por mais ma terializado que esteja, é, nao obstante, sensível aos auténticos sinais de trans cendencia: o misterio de Deus, bem apresentado, fala-lhe profundamente. Oir-se-ia que se comprova assim mais urna vez a observacáo de S. Agostinho:

"Senhor, Tu nos fizeste para Ti, e inquieto é o nosso coracáo enquanto nao repousa em Ti" (ConfissSes I 1).

■ Ni

.

j>

141

U"



tiliJc

d

Estéváo Bettencourt O.S.B.

F.S

6 • V ■ -¡

'ÍV

480

O MOSTEIRO DE SAO BÉNTO Grande Álbum, em estojo: formato 36,5 x 28'Obra de arte, com

texto em portugués e inglés por Oom Marcos Barbosa. O.S.8.

Dezoito fotografias artísticas (preto-branco) por Hugo Leal, o mesmo que fotografou Ouro Preto e Salvador- Bahía.

Como nem todos podem vir ao Rio de Janeiro ou penetrar na clausura, poderáo contudo admirar a beleza arquitetónica desse monumento colonial do inicio do século XVII. Edicáo "Lumen Christi - CzS 400,00

EDIQÓES

"LUMEN

MOSTEIRO DE

SAO

CHRISTI" BENTO

Rúa Dom Gerardo 40, — 5? andar — Sala 501 Caixa Postal 2666 — Tel.: (021) 291-7122

20001 — Rio de Janeiro — RJ

PRÓXIMO LANCAMENTO DAS EDICÓES "LUMEN CHRISTI":

D. PEDRO MARÍA DE LACERDA ÚLTIMO BISPO DO RIO DE JANEIRO NO IMPERIO (1869- 1890)

Para elaborar o presente livro, o autor, D. Jerónimo de Lemos O.S.B., além de consultar ampia bibliografía, viu também o arquivo de D. Lacerda, lendo sua correspondencia, escritos, e preciosa documentacáo até hoje inédita, bem como jomáis daquele tempo, gracas ao que pode contribuir para urna perspectiva inteiramente nova sobre a pessoa e acontecimentos da época em que viveu esse bispo, que, durante mais de vintén nos dirigiu espiritualmente os destinos da extensa diocese de Sao Sebastiáo do Rio de Janeiro, a qual, naquela época, nao se restringía ao assim chamado Municipio Neutro, mas abrangia todo o Estado do Rio e Espirito Santo, e territorios das provincias de Santa Catarina e Minas Gerais.

Nascido na cidade do Rio de Janeiro, em 1830, nela faleceu a 12 de novembro de 1890, quando ocorrerá o 19 Centenario de sua morte, tres

dias antes de se completar um ano da Proelamacáo da República. Foi ele o último Bispo do Imperio, Conde de Santa Fé, a reger a diocese em questáo, e o último capeláo-mor.

O leitor poderá avaliar o interesse que tal obra desperta, através

dos capítulos que a constituem, cujo índice aqui transcrevemos:

I. O Lar dos Lacerdas. II. Nascimento e Estudos. III. Doutor em

Teologia. IV. O Episcopado. V. Monsenhor Félix. VI. Sagracao e Posse.

Vil. Pastoral de Saudacáo. VIII. Ainda a voz do Pastor. IX. Algumas pro videncias. X. No Concilio Vaticano I. XI. Padre Almeida Martins. XII. Explicacóes do Prelado. XIII. Zelo do Pastor. XVI. A volta do Filho Pródigo. XV. A Questáo Religiosa. XVI. Retrocedendo. XVII. D. Freí Vital. XVIII.

Supremo holocausto. XIX. Figuras que passam. XX. O Internuncio Sanguigni. XXI. Visitas Pastorais. XXII. Continuacáo do mesmo assunto. XXIII. O adeus a D. Vicoso. XXIV. D. Lacerda e os Religiosos. XXV. A Ro sa de Ouro. XXVI. O Internuncio Spolverini. XXVII. Arcebispado e Cardinalato. XXVIII. O. Joáo Esberard. XXIX. O sucessor de D. Lacerda. XXX.

Consumpcáo e Morte. APÉNDICE: Relacáo das Paróquias da Diocese de S3o Sebastiáo do Rio de Janeiro no tempo de D. Lacerda NOTAS FON-

TES.

Related Documents


More Documents from "Apostolado Veritatis Splendor"