Ano Xxvii - No. 287 - Abril De 1986

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Projeto PERGUNTE E

RESPONDEREMOS ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoriam)

APRESENTAQÁO DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanga a todo aquele que no-la pedir (1 Pedro 3,15). Esta necessidade de darmos conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por numerosas correntes filosóficas e

religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa crenga católica mediante um aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propóe aos seus leitores: aborda questóes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de

W_ vista cristáo a fim de que as dúvidas se

dissipem e a vivencia católica se fortalega no Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar este trabal no assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual conteúdo da revista teológico filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada em nosso trabal no, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.

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Páscoa e o Enigma da Historia

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"Nossos País nos Contaram"

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ANO XXVII





ABRIL



-

1986

287

ABRIL - 1986

PERGUNTE E RESPONDEREMOS Publicacab mensal

No 287

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SUMARIO

DiretorResponsável:

Estévlo Bettencourt OSB Autor e Redator de toda a materia publicada neste periódico Diretor-Adminisirador

D. Hildebrando P. Martins OSB

Urna re-leitura bíblica:

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM" Nicaragua:

"CRISTÁOS SOB FOGO" Administracao e distribuido:

2

13

Que dif erenca há entre

Edicoes Lumen Christi

Dom Gerardo, 40 - 5"? andar, S/501

O HOMEM E OS ANIMÁIS IR RACIONÁIS? 26

Tel.: (021) 291-7122

Caixa postal 2666

A Celeuma de um Filme:

20001 - Rio de Janeiro - RJ

"JE VOUS SALUE, MARIE" Composicáo e Impretsao:

"Marques Saraiva"

Santos Rodrigues. 240 Rio de Janeiro

Um Enigma:

PROLONGAMENTO ARTIFICIAL DA VIDA

E DETERMINAQÁO EXATA DA MORTE . . 45 LIVROS EM ESTANTE

Assinatura de 1986: Cz$ 100,00 Número avulso CzS 11,00 Para pagamento da assinatura de 1986, queira depositar a importan

cia no Banco do Brasil para crédito

na Conta Corrente n? 0031 304-1 em nome do Mosteiro de Sao Bento do Rio de Janeiro, pagável na Agen

cia da Praca Mauá (n° 0435) ou en viar VALE POSTAL pagável na Agencia Central dos Correios do

47

NO PRÓXIMO NÚMERO 288 - Maio - 1986

O Evangelho de Marcos antes de 50? — "Da Teología ao Homem" {P. • E. Charbonneau). - "Contra toda Esperanca" (Armando Valla dares). - A Educapio na Nicaragua. - "Homossexualidade: Ciencia e Consciéncia" (M. Vidal e outros).

COM APROVAQÁO ECLESIÁSTICA

Rio de Janeiro.

RENOVÉ QUANTO ANTES A SUA ASSINATURA

39

COMUNIQUE-NOS QUALQUER

MUDANCADEENDERECO

BIBLIOTECA

Páscoa e o Enigma da Historia O cristao que acaba de festejar a Páscoa, celebrou-a no contexto de días turbulentos. . . A historia é um enigma aos olhos do observador: Porque a desonestidade e a corruppSo parecem merecer o favor de Deus? Nao se diría que Este esquece os seus amigos?

Tais perguntas já atormentavam as mentes dos Profetas bíblicos (cf. Jr

12,1s; Hab 1,1-4; 2,1-4; MI 2,17) e de Jó. Atormentaram também os cristffos do sáculo I como os do sáculo XX. Ora, sob o impacto da ressurreigSo de Cristo, Sao Joao, em 96, escreveu o seu Apocalipse, que é precisamente urna revisao da historia á luz do dom de Páscoa. Neste escrito, o autor sagrado apresenta a corte celeste á semelhanca das cortes orientáis antigás {cf. Ap 4-5): Deus Pai, sobre o seu tro no, entrega ao Cordeiro que foi ¡molado e traz as marcas das suas chagas, mas está em pé como quem triunfou, o Livro da Historia da humanidade; neste livro todo o futuro dos dómense dos povos está registrado pela preci-

éncia de Deus (que nao tira a liberdade dos homens): háb de se desenrolar calamidades, que farao os homens gemer (cf. Ap 6), mas nenhuma dessas desgrapas perturbará a corte celeste, qVie no decorrer de todo o livro canta um Aleluia permanente (cf. Ap 7,10-12; 11,15-18; 15,3s; 16,5-7. . .). Com efeito; os anjos e santos sabem que cada evento da historia está dimensionado pela Providencia Divina e faz parte de um harmonioso plano de santificacSo dos homens; nada acontece fora dos designios da Sabedoria Divina. O Cordeiro chagado, mas vitorioso, é o Senhor da historia; Ele a sustenta em suas maos, de modo que ela na verdade nada tem de absurdo, mas através das linhas tortas, tragadas pelo livre arbitrio dos homens, serve ao plano de salvacao de Deus. Eis a resposta crista para o enigma da historia. Nao pretende (nem po de, como ninguém pode) explicar cada acontecimento, mas afirma, com plena conviccao, que o Senhor Jesús é o Rei dos sáculos, aos quais Ele im

prime o seu caráter de Páscoa; a dor, decorrerite da fragilidade das criaturas, é redimida pelo Amor, que transfigura e diviniza todo sofrimento, fazendoo penhor da Gloria futura.

E tu, cristao, que responderás ao desafio dos teus tempos? — Procura, sem dúvida, trabalhar ardorosamente em prol da Boa Causa; mas lembra-te

de que tens um recurso muito mais teu, menos dependente de meios extrín secos: sim, sé mais santo, mais perfeitamente cristao, pois "urna alma que se eleva, eleva o mundo inteiro". E. B.

145

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" ANO XXVII -n?287 Abril de 1986

Urna re-leitura bíblica:

"Nossos País nos contaram" por Marcelo de Barros Souza

Em sfntese: O livro em pauta é um espécimen da córreme moderna de re-leitura da Biblia em chave socio-política. /Marcelo de Barros Souza narra a historia sagrada como sendo a de um povo oprimido económica e politica mente por outros povos; tende a se libertar, masnemsempre é feliz na reali zado desse projeto; incide, por exemplo, na tentacao de instituir um reí, que o governa e torna a oprimir. Este modo de reler a Biblia vem a ser uni

lateral e esvazia a riqueza da mensagem bíblica; especialmente os capítulos

1-3 do Génesis, que contém verdades fundamentáis para a fé fíustica origi nal, pecado dos prímeiros país, promessa de Messias...), sao desviados em

sentido alegórico, para significar lutas entre povos e classes sociais. Alias, o método exegético que Marcelo de Barros Souza adota, merece serias restricoes. Na segunda parte deste artigo, é apresentada a doutrina do Concilio do Vaticano II referente á interpretado dos livros sagrados (ver

Constituido Dei Verbum nP 12): apregoa primeiramente o estudo da face humana da Biblia lexame dos textos origináis, dos géneros literarios, do con texto histórico e geográfico dos autores sagrados...); a seguir, incute que o texto sagrado seja colocado no quadro gerat da RevelacSo Divina, devendo

ser interpretado em consonancia com esta. A Igreja cabe, em última instan cia, a funcao de transmitir auténticamente a mensagem dos livros sagrados.

Por último, o artigo examina algunos objecSes levantadas pela nova córreme exegética contra a interpretacao científica da Biblia.

A Sagrada Escritura, livro básico para a formacaodos cristaos, tem si do mais e mais difundida no povo de Deus. Existe mesmo uma corrente de estudiosos que procura transmiti-la nao somente em linguagem popular, mas também a partir da ótica do povo e para o povo; chegam a apregoar certa

oposicao entre a concepcao científica (que seria elitista) da leitura bíblica,

muito em voga no século XIX, e a leitura da Palavra viva, feita segundo cri terios sociológicos, económicos e políticos. O enfoque-chave seria o de uma 146

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM"

classe social oprimida que luta por conseguir a sua libertacáo frente á classe opressora. Esta maneira de proceder é justificada pelos seus mentores, se gundo o$ quais a Biblia foi escrita por pobres (os pobres de Israel) e só pode ser lida e entendida adequadamente pelos pobres de hoje: "a Bi'blia vé as

coisas do ponto de vista do pessoal mais humilde, do povinho" (Suplemento Informativo de Biblia-Gente nP 1, p. 1). Conseqüentemente tal modo de ler a Biblia se interessa muito por acao, transformacao, principalmente no cam po social. Espécimen muito significativo dessa nova exegese da Biblia é o livro do Pe. Marcelo de Barros Souza O.S.B., Diretor da Escola de Evangelho da

diocese de Goiás e Assessor de Teologia do Secretariado Nacional da Comissfo Pastoral da Térra, livro intitulado "Nossos Pais nos Contaram. Nova Le i

tura da Historia Sagrada"1. Como diz o subtítulo, tal obra pertence á cate goría das releituras bíblicas, freqüentes em nossos dias.

Abaixo proporemos breves observacoes sobre o livro em pauta e o método que ele adota.

1. O LIVRO: CONTEÜDO E COMENTARIOS 1. O autor tenciona contar "velhas historias" de "maneira nova". Com efeito; considera toda a historia ao Antigo Testamento através do prisma da economia, da política, da sociología e da religiao; apresenta assim "um povo

oprimido (Israel) que lutava para se libertar, quando apareceu urna forca extraordinaria, a presenca de alguém que veio fazer caminho conosco" (cf. p. 13). Esse alguém é o Senhor Deus; a sua atuacao se confunde com a atuacao do próprío povo que luta. "Tudo virou urna coisa só. A acSo de Deus se mostrou clara através do trabalho e luta do povo. Quando a Biblia diz: 'Deus

fez, Deus falou', está dizendo também ao mesmo tempo: 'O povo fez, o po vo falou'"(p. 14). 2. A preocupacSo com os elementos socio-políticos leva o autor a

re-interpretar toda a historia sagrada, especialmente os onze primeiros capí tulos do Génesis, que propoem verdades básicas da fé crista. Estas s3o total mente silenciadas em favor de urna exegese artificial, Ets urna amostragem

deste procedimento:

"Um tempo depois daquela reuniao de Siquém, o povo de Israel foi muito influenciado pela cultura dos vizinhos e cananeus, que adoravam a serpente como sendo deus. E, como os vizinhos, o povo de Israel desejou

também ter um reí. AtéentSo a comunidade das tribos vivía na igualdade. E dizia que o único reí do povo era Deus. Mas comecou a querer ter um reí e isso mudou muito na vida deles. O povo da roca foi quem mais sofreu.

1 Ed. Vozes, Petrópolis. 1984. 137 x 210 mm, 422 pp. I47

"PERGUNTE E RESF ONDEREMOS" 287/1986 A i era normal que, nesta situafáb, eles lembrassem do paraíso, guando Deus criou o homem e tudo era bem melhor. E por que de repente tudo ficou diferente? Para explicar eles contaran) unta historia:

O que estava por tras desta historia

Gn3

"1. A serpente era o mais sabido de

todos os animáis que o Senhoi tinha criado.

2. A serpente disse á mulher: É verdade que voces nao podem co mer das frutas de nenhuma árvore dojardim?

A serpente era adorada pelos cananeus e por isso representava a sode-

dade dos cananeus. De fato.a sodedade dos cananeus era mais sabida que a de Israel e também mais avancada. Foi a sodedade dos cananeus que

influendou a comunidade de Israel adesejar umrei.

3. A mulher respondeu: Podemos comer dos frutos das árvores do jardim, menos do fruto da árvore

Ñas ddades secas da Palestina, só quem tinham jardim era o palacio do reí.

que está no meio do jardim porque

Israel tinha autoridades, mas nao centralizadas (no meio do jardim). Isso Deus tinha pfoibido.

Deus nos disse: se voces comerem dele, morrem.

4. A serpente respondeu: Voces nao

O fruto era o poder de reinar. Ami

morrem de jeito nenhum. Deus sabe que no dia em que voces comerem deste fruto, vao abrir os olhos e váo ser como deuses. Váo conhecer a feüddade e a infelicidade.

gamente os reís eram considerados como deuses.

5. A mulher viu que a árvore devia ser boa para comer e era bonita de se ver. Tomou do seu fruto, comeu e depois deu ao seu marido que a

O poder dos reís dá milita seguranca e prestigio. Dá aparéncia de segu ranca nacional.

acompanhava. Eele comeu também. 148

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM'

5

Quando Israel passou a ter reis comecou a desigualdade entre o prd-

6. Entáo os olhos deles se abriram e notaram que estavam ñus. Cada

um fez tiras de folhas para se cobrir.

prio povo de Deus e as comunida des do campo ficaram mais pobres e sem nada.

7. Ouviram entlo os passos do Senhor na hora do entardecer. O ho-

Cotn a experiencia da realeza houve urna crise religiosa no meio do povo.

mem e a mulher se esconderán! envergonhados.

8.0 senhor chamou o homem e perguntou: Onde está vocé?

9. Ele respondeu: Escutei sua voz no jardim e fiquei com tnedo por que estava nu. Por isso me escondí.

10. Quem revelou a vocé que estava nu? Vocé comeu da árvore que

proibi de comer?

11. A mulher que o Senhor me deu como companheira me deu da fruta e eu comi.

•Nos povos antigos a mulher era li gada á propriedade da térra. É a mulher que dá fruto.

foi que vocé fez? A mulher respon-

11.0 Senhor disse á mulher: O que

Foi naquela época que a socieda-

deu:Aserpente me tludiu e eu comi. Ai Deus amaldicoou a serpente.

de de Israel venceu de urna vez a sodedade dos cananeus que justa mente influendou Israel a ter reis.

13. Já que fízeste isto.sejas maldita entre todos os animáis da térra. Vais andar te arrastando no cháo.e terás de comer poeira da térra a vi

A partir daí os cananeus passaram a ser dominados pelo povo de Is rael. As comunidades do povo de Deus justificavam isto com histo rias como esta (Deus amaldicoou a sodedade dos cananeus, como

da toda.

descendentes da serpente que eles 14. Porei inimizade entre ti e a mu

adoravam).

lher, entre a tua descendencia e a déla. A descendencia déla vai esmagar tua cabeca e tu Ihe pegarás no calca nhar.

149

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986 15. E dbse i mulher: Vou lhe dar muilos sofrimentos na gravidez e vocé vai dar á luz seus fílhos com dores. Vai precisar de homem e ele vai dominar vocé.

Os sofrimentos de Israel em sua historia vio ser como dores de parto.

Os profetas de Deus avisaram ao povo sobre este perigo de dominacáo dos reís ñas comunidades (ISm 8).

16. Finalmente Deus disse ao ho

A regiSo de Judá era de térra muito

mem: Como vocé atendeu á sua mu

ruim para a lavoura.

lher e comeu da fruta que eu proibi de comer, a tena seja maldita por sua culpa.

17. Vocé vai precisar de se cansar para conseguir tirar da térra a sua

comida todos os días. A térra vai

darespinhos.

E a vida dos laviadores, mesmo mais no norte, onde a térra era melhor no tempo dos reís, era muito dura

e de milita opressao.

18. Vocé vai comer o pao com o suor do seu rosto até voltar á térra porque vocé é pó e vai de novo virar pó.

19.0 homem chamou a sua mulher de Vida (Eva),por ela ser a míe de todos os vivos.

A Comunidade de Israel aprende que tem urna missáo. Pouco a pouco vai notar que esta missáo é para

O Senhor fez para o homem e a mulher roupas de pele e os vestiu.

eles a revelacáo do Deus vivo e o mo

Depois disse:

O homem se fez como um de nos. Já que se fez de juiz do que é bom e do que é mau nao vá se apropriar também da árvore da vida, porque

com todos os outros povos = dar a

do dos homens conviverem entre si. Deus impede que o reí de Israel seja

absoluto. O reí nSo pode tomar o lugar de Deus.

ao comer desta árvore vivera para sempre.

Por isso Deus expulsou o homem do jardim do Éden para o homem cultivar a térra da qual foi feito. E colocou anjos com espadas de fogo na entrada do jardim para impedir

o homem de ir até a árvore da vida.

Mais tarde os imperios opressores (persas, assírios, babilónicos), que acreditavam nestes anjos com espa das de fogo, é que impedirán) os reís de Israel de serem donos de tudo".

150

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM"

Este texto, bem típico da exegese da escola cm foco, sugere algumas observacoes:

a) há alegorizacao arbitraria ou realizada sem provas: o texto bíblico, que conta a historia do pecado original, seria apenas uma versSo figurada

de acontecimentos políticos ocorridos em Israel após o regime de Josué (1220-1200 a.C).

As auténticas versoes de tais acontecimentos ou da instituicao da mo narquía se encontram de maneira clara, sem alegorías, em ISm 8, 1-22; 9, 1-10, 16; 10, 17-24; 11, 1-15. Se, portanto, queremos conhecer o modo como Israel considerava o surto da realeza, devemos recorrer a ISm e nao a

Gn 3; este texto é violentado arbitrariamente quando submetido á interpretacao proposta; seria preciso que o exegeta comprovasse a sua nova versao

mediante paralelos literarios, apresentacao de simbologia semelhante e de expressionismo orientáis correspondentes. Muitas vezes as novas escolas de exegese falham por afirmar sem provar, ou por formular hipóteses mais ou menos gratuitas, que pouco adiante, no decorrer da exposicSo, reaparecem como sentencas certas, as quais dio margem á formulacSo de novas

hipóteses, que por sua vez mais adiante sSo tidas como definitivas...

b) O texto de Gn 3, 1-24 contém, segundo toda a TradicSo crista (firmada pelo magisterio da Igreja), profundas verdades atinentes á origem do género humano: este, no inicio da sua historia, foi elevado a filiapao divina, gozando de dons gratuitos; sub'metido a uma prova, o homem disse Nao ao convite de Deus e perdeu o estado de santidade original em que se achava; em conseqüéncia, todos os homens nascem carecendo de tais dons — carencia esta que se chama "o pecado original originado"; cf. PR 285/ 1986, pp. 84s. c) Significativo é o fato deque para Gn 3,15 (3,14 no texto transcrito atrás) o autor n3o tem interpretado alguma. Na verdade, tal versículo é o proto-evangelho ou o primeiro anuncio da Boa-Nova: a muiher entraría em inimizade com a serpente tentadora e a descendencia da muiher esmagana a

cabeca da serpente. Entendido em sua plenitude, este texto se refere a

María SS. e a Jesús Cristo. — Ora nada disto se encontra no livro em foco; á muiher, para o autor da obra, significa a própria comunidade de Isreel (cf. p. 26)! 3. A historia de Caím e Abel (Gn 4, 1-16) é entendida também de mo do alegorizante, fora da linha de pensamento do autor sagrado. Eiscomo a explica Marcelo de Barros Souza:

"As comunidades antigás tinham uma continuacao para esta historia do homem expulso do jardim de Deus. é difícil saber quando foi que surgiu esta historia de Caím e Abel. Mas provavelmente comenta o relacionamentó entre comunidades conhecidas uma da outra (Caím e Abel} e o de151

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986 sentendimento entre o povo da ropa (Israel) e o povo da cidade (cananeus)' fpp. 26s).

A exegese científica teria sido muito útil no caso, pois estuda as carac terísticas literarias, arqueológicas, geográficas... do texto de Gn 4, 1-16 e

tira desta análise conclusoes objetivas e ¡ndependentes de premissas precon cebidas. Em vez de falar de desentendimento entre povo da roca e povo da cidade, a exegese científica leva a ver em Cafm um famoso fratricida, que é apresentado pelo autor sagrado logo após o pecado dos primeiros pais para

lembrar ao leitor que, quando o homem diz Nao a Deus, inevitavelmente se dispSe a dizer Nao (ou a matar) a seu irmSo.

4. Em conseqüéncia das suas preocupacoes socio-políticas, Marcelo Souza n3o focaliza devidamente a arteria central do Antigo Testamento, a saber: há urna Alianca do Senhor Deus com o género humano travada no paraíso, violada pelo pecado e objeto de promessas subseqüentes, que culminam na restauracao dessa Alianca em Jesús Cristo. A historia bíblica gira em torno destes dois eixos ou dois homens compendiosos: o primeiro Adao e o segundo Ad3o (Jesús Cristo). Entre um e outro situam-se aliancas parciais e provisorias, que sao etapas no caminho da restauracao: as aliancas com AbraSo, com Moisés e o povo de Israel, com Davi e sua casa... O Antigo Testamento, á luz do Cristianismo, toma o seu pleno sentido se considerado

como a historia de urna lenta pedagogía de Oeus, que prepara o homem pe cador a receber a mensagem do Messias; Este traz ao homem muito mais

riquezas espirituais do que as que foram perdidas pelo pecado de Adá*o. A grande graca do Messias é a vocacSo do homem a ver Deus face-a-face e

participar do consorcio da vida trinitaria (cf. Gl 4,6; Rm 8,15).

Está claro que o homem assim amado por Deus no Antigo e no Novo Testamento deve esforcar-se por realizar em torno de si um mundo justo e fraterno, que espelhe a Leí do Senhor e seja urna sementé do Reino de

Deus. Todavía essa tarefa socio-política nao é meta primeira da Revelacao bíblica; vem a ser a decorréncia da mensagem teológica e dos dons estritamente sobrenaturais que o Senhor Deus quis conceder aos homens através dos tempos.

5. é necessário reconhecer que o livro de Marcelo de Barros Souza é

escrito de maneira agradável e fácil, preenchendo a sua finalidade de atingir

o povo simples. Faz muito bem ao justapor textos do Antigo e do Novo Testamento, mostrando como certos personagens ou episodios foram apro-

fundados pelos autores do Novo Testamento; é pena, porém, que este procedimentó nlo tenha tido mais ampia repercussSo na obra do autor; com efei-

to, o Antigo Testamento, em última análise, se torna patente no Novo, enquanto o Novo Testamento está latente no Antigo. 152

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM" Passemos agora a considerares sobre o próprio método de interpretar a Biblia.

2. COMO INTERPRETAR A BIBLIA O Concilio do Vaticano II, fazendo eco á Tradic3o exegética católi ca, formulou em poucas sentencas o método a ser adotado para interpretar auténticamente a S. Escritura. Ver Constituicao Dei Verbum n? 12, cu jo teor vai aquí reproduzido. A S. Escritura é livro divino e humano. Divino. . . porque o próprio Oeus fala através do texto sagrado; a Biblia nao apenas contém, mas é a Pa-

lavra de Deus.' Humano—, porque o Senhor Deus quis servir-se de homens,

que contribuiram com sua linguagem e sua cultura para a redacao do texto sagrado.

Em conseqüéncia, a interpretado da Biblia se desenvolve em duas eta pas: 1} análise da face humana do texto sagrado; 2) percepc3o da mensagem divina transmitida por essa face humana.

2.1. Análise da face humana Já que Deus falou mediante homens, o intérprete deve, antes do mais, procurar entender o que os autores sagrados (hagiógrafos) queriam dizer em

seu linguajar próprio. Para tanto, deve recorrer aos idiomas origináis do tex

to biblico (o hebraico, o aramaico, o grego) e ao contexto histórico, geográ fico, social... do autor bCblico a fim de entender o texto como o hagiógrafo o entendía. Com outras palavras: o intérprete deve transpor-se para o mundo dos judeus e nao judeus anteriores a Cristo ou do século I após Cristo, mun do esse que tinha seus problemas próprios e seu modo peculiar de os colo car. De modo especial, merecem atencáo os chamados "géneros literarios" ou as normas de vocabulario e estilo vigentes entre os antigos para redigir historia, profecías, poesia, leis. . .; com efeito, nao se pode interpretar urna

poesia como se interpreta urna lei (a poesia é essencialmente figurada, reti cente, ao passo que a lei deve ser sempre precisa e breve). "A verdade é apresentada e expressa de maneiras diferentes nos tex tos. . . históricos, profétícos ou poéticos ou nos demais géneros de expréssao. Ora é preciso que o intérprete pesquise o sentido que, em determinadas circunstancias, o hagiógrafo, conforme a situacaó do seu tempo e de sua cul tura, quis exprimir e exprimiu por meio dos géneros literarios entSo em uso "

CDei Verbum n? 12).

1 Esta é a verdade primeira e fundamental da fé católica: Deus se revélou aos homens por via oral primeramente, e depois também por via escrita. 153

10

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986 Isto nlo quer dizer que todo leitor da Biblia deva conhecer I taguas e

cultura orientáis, mas implica apenas que procure certa iniciagao antes de

abordar determinado livro; para tanto, podem servir-lhe as páginas de introducüo que as boas edicoes da Biblia costumam apresentar. O leitor estará

consciente de que nao deve ler a Biblia como leña urna página de jornal ou um escrito moderno, redigido segundo as categorias de pensamento e linguagem do próprio leitor.

2.2. Percepcao da mensagem .divina Embora seja indispensável, nao basta ao intérprete conhecer exatamente o sentido humano de determinada página bíblica; isto redundaría em mu-

til agio da mensagem respectiva. Em conseqüéncia, deverá colocar o texto sa grado dentro do contexto da Revelaca"o Divina; cada página bíblica é ilumi nada pelas demais e deve ser entendida em harmonia com estas ou segundo a analogía (= consonancia) da fé. Afirma o Concilio: "Visto que a S. Escritura deve ser ¡ida e interpretada naque/e mesmo Espirito em que foi escrita, para apreender com exatidao o sentido dos tex tos sagrados, deve-se atender com nao menor diligencia ao conteúdo e á uní-

dade de toda a Escritura, levadas em coma a Tradicao viva da Igreja toda e a analogía da fé... Todas essas coisas que concernem á maneira de interpretar a Escritura, estao sujeitas, em última instancia, ao ¡uizo da Igreja, que exerce o divino

mandato e ministerio de guardar e interpretar a Palavra de Deus" rOei Ver-

brnnn? 12). Vé-se que, em última análise, a interpretacao da Biblia está sujeita aos criterios da fé: eremos que Deus falou aos homens e quis confiar á sua S. Igreja o ministerio da Palavra, assegurando-lhe para isto a assisténcia do Es

pirito Santo (cf. Mt 16, 16-19; Le 22. 31s; Jo 14, 16s; 16, 13-15). Estas normas sao válidas para todos os homens e todos os tempos.

Urna vez depreendida a mensagem teológica do texto sagrado, compreendese que seja preciso procurar as implicagoes concretas da mesma na conduta dos leitores. A Palavra de Deus é viva e eficaz; quer ser transformada em ges

tos significativos; por conseguinte, ela inspira urna auténtica Ética crista", que atenderá aos anseios de justica e fraternidade dos homens.

Resumindo, podemos propor o seguinte roteiro de interpretacao da Biblia:

1) penetracao científica 2) percepcao da mensagem teológica 3) aplicacao á vida ética dos leitores

Examinemos agora algumas objecóes que se fazem a tal método. I54

"NOSSOS PAÍS NOS CONTARAM"

11

2.3. Objetes 1) "A exegese científica é ideológica, porque realizada por sabios, que sao naturalmente levados a trabalhar em favor da classe dominante contra a classe dominada ". Em resposta, devemos distinguir a erudicá*o ou o saber, que ¡negavel-

mente tem enorme valor, e a atitude ética com que alguém cultiva o saber. Como tal, a erudicao é moralmente neutra; pode ser aplicada tanto para o bem como para o mal. Por conseguinte, nüo se diga que toda erudicao é

ideológica e opressora. Ao contrario, o estudioso movido por auténtico espi rito cristao poderá tanto melhor servir aos seus irmaos quanto mais capacita do estiver no plano da ciencia. 2) "A exegese científica é abstraía; perde-se em teorías, que ficam bem longe da realidade do povo simples".

Respondemos: o saber é sempre precioso; é a penetracSo dentro da verdade, para a qual a inteligencia humana fo¡ feita. Em todo homem há urna sede espontánea de verdade. Nao se deve, pois, desprezar o estudo especulativo; ao contrario, é preciso que ele se torne o bem oferecido a to dos os homens — ricos e pobres. Doutro lado, a filosofía ensina que a ver dade é ¡nseparável do bem; por conseguinte, ela deve ter repercussoes na

vida prática. Isto é particularmente válido para as verdades da fé ou para a mensagem escriturística; toda a erudicao bíblica so tem sentido pleno se

leva o cristífo a melhor conhecer e amar o Senhor Jesús num genui'no servíco aos irmaos.

Ponderemos ainda o seguinte: por nao levarem em conta a face huma na da Biblia, muitos leitores se dao a interpretacoes fantasiosas, seguindo cri

terios meramente subjetivos, decorrentes de um fervor mal iluminado. E o que acontece, por exemplo, com os cristaos que julgam poder depreender da Biblia a data do fim do mundo, as catástrofes que o precederao, a existencia de discos voadores, de habitantes em outros planetas e outras noticias "proféticas"... O cristao que é materialmente pobre, mas carece de orientacáo para

ler a Biblia, poderá deduzir desta as nocoes mais estranhas, que ele atribuirá

ao Espirito Santo. Verdade é que Oeus fala muitas vezes aos pequeninos ou

aos que, além da pobreza material, cultivam a pobreza espiritual; mas o Se nhor Deus nao está obrigado a fazer milagres para revelar ao homem oque este pode adquirir pelo estudo.

3) "Nao se deve refletir sobre a Biblia em favor do pobre ou para o

pobre listo redunda em assistencialismo e paternalismo),' mas sim com o

"Assistencialismo " e "paternalismo "sao palavras geralmente enten didas em sentido pejorativo; significam a atitude de quem da' esmota, preenchendo necessidades momentáneas e criando dependencia para o pobre, em vez de resolver de maneira cabal o problema dos pequeninos. 155

12

"PERCUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

pobre (este deve ser o autor da sua historia, sem ter que depender dos pode

rosos). Respondemos: o estudioso auténticamente cristao é um pobre que, com os seus irmaos pobres, tem o zeto pela implantadlo do Reino de Deus. Com efeito; pobres nao sa"o apenas aqueles que carecem de bens materiaís,

mas sSo também os que tém o espirito de pobre, isto é, o desapego e a liberdade interior que um cristao deve ter dentro de si. Um tal cristao aplicará sua erudica"o em favor dos semelhantes. — De resto, em vez de jogarmos os

homens uns contra os outros, procuremos fazer que se sintam solidarios entre si, unidos na familia dos filhos de Deus. Isto será possi'vel se todos se empenharem pela conversJo do coracao, da qual resultará certamen te um mundo melhor.

4) "Os pobres sao o autor humano da Biblia e sao e/es, em última ins tancia, que tém a chave da sua interpretado ". Respondendo, devemos observar que, entre os autores dos livros sagra dos, houve homens das mais diversas classes sociais: Isaías, por exemplo, era

um freqüentador da corte do rei Acaz (736-716); Ezequiel e sua escola eram de estirpe sacerdotal; os autores de livros históricos do Antigo Testamento eram provavelmente oficiáis da corte dos reís; Amos era pequeño pastor...

No Novo Testamento, Sao Mateus era cobrador de impostos; SSo Lucas, mé

dico. . . Verdade é que todos tiveram o espirito de pobre. Em conseqüéncia, nao se pode dizer que somente os pobres no plano material tém a chave da interpretacao bíblica; a pobreza material nao recomenda ninguém a Deus a

nao ser que acompanhada de espirito de pobreza; este é o valor decisivo (que se traduz certamente em sobriedade e simplicidade no plano material). — Poderfamos, alias, reformular a objecSo proposta nos seguintes termos: O Espirito Santo é o autor principal dos livros sagrados; por conseguinte,

aqueles que tém o Espirito Santo, possuem a chave dé interpretado dos mesmos, independentemente de categoría social.SSo estas algumas ponderacoes que no momento parecem importan

tes para esclarecer o uso da S. Escritura ñas comunidades do povo de Deus. Como se vé, a Igreja, como Mae e Mestra, tem algo a dizer sobre tSo momentoso assunto, a fim de que nSo se desvirtué a riqueza da Palavra de Deus.

156

Nicaragua:

"(listaos sob Foso" por Humberto Belli

Em sintese: Humberto Bel/i foi, por dez anos, sandinista militante, doutrinado peto marxismo-leninismo, que ele adotava com entusiasmo. To davía converteu-se ao Cristianismo por observar as incoeréncias do comunis mo. Jornalista como era, quando viu que o Governo sandinista em 1982 o submetia a severa censura, foi para os Estados Unidos, onde continua sua carreira de escritor. O livro apresentado neste artigo é o depoimento de H. Belli, que diz o que viu e experimentou do comunismo nicaragüense. Poe

freqüentemente em relevo o principio leninista: "É preciso dar dois passos á

frente e um para tras", a fím de promover o avanco comunista sem encon trar grande resistencia da parte dos adversarios e do público perplexos. Espe cialmente na América Latina os comunistas sabem que precisan) da colabo rado dos cristaos para fazer a RevolucSo; daias ambigüedades e camuflagens que eles costumam aplicare de fatb tém aplicado na Nicaragua. 0 Gover

no sandinista se apresentou como diferente dos regimes marxistas ateus, contando até sacerdotes em seus altos escaldes; isto vem ludíbriando a opiniSo pública dos próprios cristaos, que.muítas vezes tém prestado solidar/edade aos torturadores dos cristaos e nao aos cristSos perseguidos na Nica ragua.

0 autor ilustra seu depoimento apresentando numerosos fatos acompanhados de documentos em fac-simile, fotografías, citacdes ou transencoes. . . - o que torna o livro altamente interessante; tratase de informa-

poes pouco conhecidas provenientes da parte de quem tem autoridade para falar.

Humberto Belli é nascido na Nicaragua em 1946. Ucenciou-se em Dire i to pela Universidade de Madrid e realizou seu Mestrado em Sociología na Universidade da Pensilvánia (U.S.A.).

Marxista durante mais de dez anos, colaborou com o Movimento San

dinista contra a ditadura de Somoza.1 Converteu-se ao Cristianismo em 1 Sis o testemunho verbal de Humberto Belli: "Eu estive pessoalmente envolvido com os sandinistas, primeiro em 1966, logo de 1973 a 1975, como membro de urna célula clandestina diri gida por quem ho/e é comandante da regiao do Atlántico, William Ramírez. Enquanto estive na FSLN tive reunioes com Tomás Borge e outros líderes, 157

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

1977, tornando-se expressivo porta-voz do Evangelho no seu país. Após a vitória da revolucao sandinista em 1979, Bel I i assumiu a di reglo da página

editorial do diario La Prensa, único jornal independente da Nicaragua. Mas a imposicao de censura total em marco de 1982 levouo a deixar a patria para continuar sua tarefa de escritor no estrangeiro. Em Janeiro de 1982 foi nomeado pela Santa Sé Consultor do Secretariado para os Nao Crentes. Re side atualmente nos Estados Unidos, onde formou um Centro chamado Pue

bla Inititute, para promover a resposta cristS á problemática da América Latina (P. O. Box 520, Carden City, Michigan 48135, U.S.A.) H. Belli publicou em portugués o livro "Nicaragua: CristSos sob Fogo", edicao do Instituto atrás indicado, onde relata, com o apoio de documentos

em fac-simile, fotografías e depoimentos, o que tem ocorrido na Nicaragua,

a fim de que a opiniSo pública se possa orientar; os meios de comunicacSo tém exibido entrevistas com líderes da América Central propicias a entusiasmar os cristaos. Humberto Belli, tendo vivido intensamente as experiencias somozista e sandinista, dá seu testemunho para mostrar qual a situaca*o da populacáb, especialmente dos crístSos, da Nicaragua sob o regí me sandinista.

Realcaremos, a seguir, alguns tópicos importantes do livro.

1. QUEM SAO OS SANDINISTAS? A identidade dos sandinistas é discutida: seriam auténticos marxistas?

Ou cristSos que conseguiram urna mésela rara de valores marxistas e cris taos?

Para responder, H. Belli lembra que, quando Fidel Castro marchou triunfante pelas rúas de Havana em 1959, trazia um rosario pendente ao pescoco; procurava assim dissimular suas verdadeiras intencóes. Todavia alguns anos mais tarde suas posicoes anti-religiosas eram evidentes. Algo de seme-

Ihante ocorre na Nicaragua: os líderes revolucionarios, vitoriosos em 19 de julho de 1979, dizem-se "sandinistas" porque inspirados por Sandino; proclamaran!, no inicio da sua gestao, respeito pela religiSo, mas na verdade

procedem como condiscípulos de Fidel Castro na escola de Marx e Lenin;

e em determinado momento este encarregou-me da tarefa de ensinar marxis mo a meus companheiros. Como membro da FSLN, nSo tfnhamos dúvida sobre a natureza marxista-leninista de nossa organizado. Usávamos como

cartilha o livro 'Marxismo-leninismo para Principiantes' de George Pulitzer, por sua clareza e simplicidade. Castro era nosso herói e Cuba nosso modelo. Ele parecía simbolizar o valente Davi diante do Golias imperialista, enquanto Cuba era o exemplo de sociedade onde o povo tínha resolvido libertarse da opressio mediante um elogiável esforco coletivo que nao dava tugara in decisos. O totalitarismo implícito nesta concepcao nio nos preocupaba"

(ob. cit. p. 11). 158

"CR1STÁ0S SOB FOCO"

15

tal escola ensina que é preciso avancar dando dois pasaos para a frente e um para tras, a fim de que a opiniao pública se deixe confundir pelos passos observados.

Eis alguns episodios que traduzem claramente a identidade do sandi-

nismo:

Por ocasiáo do primeiro Natal ocorrido sob o regime sandinista, o Governo publicou o chamado "Memorando de Natal", que procurava politizar o conteúdo da fé e, ao mesmo tempo, ocultava as ¡ntencóes anti-religiosas do sandinismo, como se depreende dos dizeres seguintes extraídos do Me morando:

"Agora, depois do triunfo da Revolucio Popular Sandinista, estamos dirigindo a celebracao do Natal, específicamente para as enancas, e com um conteúdo diferente, fundamentalmente político. Enfrentar no presente momento de maneira direta, a quase cinco me

ses do triunfo, urna tradicio de mais de 1979 anos nos levaría a conflitos po

líticos e perderíamos influencia entre o nosso povo.

Além disto, a 62 anos da revolucio na URSS esta tradicio religiosa aínda nao pode erradicarse como um todo. Da/ constituirse urna manifes tado de revolucionarísmo pequeño burgués pretender tolher o nosso povo em tao pouco tempo de revolucio ".

Tal documento é interessante porque mostra que os sandi nistas estao conscientes de que nao é prudente agredir de uma vez e frontal mente a religiao; julgam melhor proceder indiretamente e aos poucos para nao cho car o povo.

No sistema educativo da Nicaragua foram introduzidas mudancas no

sentido de implantar na escola o materialismo marxista. Isto seconcretizou, entre outras coisas, num livreto publicado em 1981 pelo Ministerio da Educacao com o título "Dialética: categorías e leis fundamentáis". Este manual foi imposto a todos os professores e alunos de qualquer escola da Nicaragua; á p. 4 o texto analisa a diferenca entre "idealismo subjetivo" e "materialis mo dialético". O primeiro, segundo a cartilha, afirma que "Deus criou o mundo e a humanidade com um propósito determinado", ao passo que o materialismo dialético ensina que "o mundo n3o teve principio e que a natureza sempre existiu. . . 0 desenvolvimento das ciencias confirma que o materialismo é a verdadeira filosofía científica e a única corrente filosófica

que proporciona respostas claras conforme a realidade objetiva. No dia 1/5/81, por ocas ¡a o do Oía Internacional do Trabalho, um cartaz gigantesco foi colocado pelos sandinistas na fachada da catedral arruina da de Managua. Nele se lia: "Marx, Engels,.Lenin: Gigantes do Pensamento Proletario". Com imagens de Lenin, Fidel Castro e Marx, "ornamentaram" os edificios públicos.

O totalitarismo de esquerda do Sandinismo manifestase ainda: - na sufocacao gradual do pluralismo político. Os Partidos nao san159

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

dinistas tiveram suas sedes invadidas; a maioria dos seus dirigentes, todos opositores do regime de Somoza, foram para o exilio: assim Wilfredo Mon-

talván, do Partido Social Demócrata; Alfonso Róbelo, do Mov¡mentó De mocrático Nicaragüense; José Davial M., do Partido Social Cristao; Edgard Macías, do Partido Popular Social Cristao; e Adolfo Calero, do Partido Con servador Nicaragüense; — na supressao de Organizares Trabalhistas independentes. Urna vez no poder, os sandinistas criaram seus Sindicatos próprios: a Central Sandinista dos Trabalhadores (CST) e a AssociacSo dos Trabalhadores do Campo (ATC). Em 1981, a CST filiou-se á Federacao Mundial dos Sindicatos con trolada pela URSS e comecou a ser imposta aos operarios como "a única

Central verdadeiramente representativa da classe operaría". Os trabalhadores que se unissem a outras organizacoes, eram despedidos — o que violava o direitp as associacfies livres reconhecido pela DeclarapéEo Universal dos Direitos

do Homem, que a Nicaragua assinou em 1948; — na criacüo de grupos de choque destinados a intimidar os oposito res. Essas tropas armadas e motorizadas agrediram disidentes políticos, jornalistas independentes e pastores da Igreja, entre eles tres bispos católicos, além de numerosos fiéis. Daniel Ortega, o chefe do Governo sandinista, cha ma-as "tropas divinas";

— na confusSo entre Estado e Partido. Os sandinistas seguem o padrfo marxista segundo o qual Estado e Partido se identificam. O exército nicara güense é o "Exército Popular Sandinista"; seus soldados sSo credenciados

como membros da Frente Sandinista de Libertadlo Nacional (FSLN). Cri ticar o marxismo na Nicaragua significa ser inimigo da nacao; todos os an ticomunistas sao "assassinos"! Varias outras manifestares públicas da vida nicaragüense evidenciam

que o sandinismo é urna forma de marxismo camuflado pela ambigüidade para nao assustar a populacao crista do país. O próprio Fidel Castro, em dis curso proferido aos 26/7/79 (ou seja, pouco após a vitória do sandinismo),

recomendou ao Governo da Nicaragua procedesse mais devagar em suas re formas do que Fidel procederá; e isto, porque a Nicaragua nSo é urna ilha: além do qué, tem urna populacao camponesa independen te e aguerrida, muito dedicada a Igreja e aos valqres da fé.

2. SANDINISTAS E CRISTÁOS 1. Os comunistas estSo convencidos de que, para tomar o poder nos

países da América Latina, precisam da colaborarlo dos cristaos. É, entre outros, o cristao chileno que se fez marxista, Pablo Richard, quem o diz:

'"Fidel nos convidou a ir a Cuba. Ficamos tros semanas conhecendo o processo cubano, e por fim passamos quase dez horas discutindo com o comandante Fidel os temas da alianca entre marxistas e cristaos. Também 160

"CRISTAOS SOB FOGO"

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nos ajudaram muito as famosas palavras de Che Guevara: 'Quando os cris tSos revolucionarios se atreverem a dar testemunho integral, nesse día a revolucao latino-americana será irreversfvel'. Fidel estava profundamente con vencido de que nao haveria RevolucSo na América Latina sem os cristSos"

(Pablo Richard, La experiencia de los Cristianos en Chile durante la Unidad Popular, em Cristianos Revolucionarios // n? 4, Managua 1980, p. 31). Esta conviccao levou e leva os sandinistas a dissimular o seu espirito anticristSo. A principio, alegavam a presenca de varios cristSos revolucio narios, inclusive sacerdotes, nos altos escaldes do Governo. Os cristaos revolucionarios sio os chamados "Cristaos para o So

cialismo", que assumem o marxismo como a única via de libertacao social. 0 Governo sandinísta aproveita-se da colaboracSo destes para difundir mensagens como a seguinte, proclamada no com eco de 1981: "Os verdadeiros cristSos, os cristSos sinceros, abracam a cpcao da revolugSo sandinista, que

é hoje, na Nicaragua, o caminho em direcSo á opcSo pelos pobres" (Jornal Barricada, de 02/2/81).

A conseqüéncia deste principio é que os cristSos nao sandinistas nao sSo cristSos verdadeiros ou sinceros. Portanto, o criterio para distinguir dos falsos cristaos os auténticos discípulos de Cristo é político ou é o compro-

misso com a FSLN. Quem nao se compromete com esta, é infiel nao so ao povo (que a FSLN supSe representar), mas também a Cristo. O compromis-

so com a FSLN há de ser incondicional ou absoluto. É o que diz o jesu íta Pe.

Juan Hernández Pico, do Instituto Histórico Centroamericano de Managua: "Para um cristao nao existe outra maneira de mostrar sua fé no Reino de Deus a nao ser que se comprometa absolutamente com um projeto rela tivo".

Pablo Richard vai mais adían te: "Nao se trata de procurar no Evangelho urna justificativa para o nosso

compromisso, mas dá-se totalmente o contrario: a partir de um compromisso que é assumido por si e por sua própria racionalidade, nos queremos re pensar toda a nossa fé" (Volver a repensar nuestra lé.na obra citada atrás).

Como se vé, nessa perspectiva o valor tido como inquestionável e dog

mático é a RevolucSo sandinista; a própria fé há de ser adaptada aos ditames desta, e nao vice-versa. Por conseguinte, o pecado se identifica com o capita

lismo; a salvacSo se consegue lutando contra este por meio da revolucSo ar mada; o Messias é o Partido Revolucionario, que leva o povo ao verdadeiro Reino de Deus ou ao Socialismo; assim como Deus se encarnou num homem, assim os cristSos devem encarnar-se num projeto político, que é a re-

volucao marxista. Jesús foi o primeiro revolucionario dedicado á libertadlo política de Israel. Em conseqüéncia, dizem os cristSos revolucionarios com Juan Hernández Pico S. J.: "No nos bastó Jesucristo" (em Cristianos Revo lucionarios II); com efeito, para eles, o Cristianismo necessita da "mediacao de urna teoría histórica e de urna praxis revolucionaria invariavelmente mar

xista, a fim deque as promessas comidas no Evangelho se tornem reaüdade". 161

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986 O Pe. Ernesto Cardenal, hoje Ministro da Cultura do Governo ¡andi

nista, chegou a declarar á imprensa:

"Cheguei á revoluto por meio do Evangelho. Nao fot pela leitura de Marx, mas pela de Cristo. Pódese dizer que o Evangelho me fez marxista. O marxismo é a única solufSo para omur.do ". "O verdadeiro cristSo nao somente pode, mas deve ser marxista... 0 comunismo vem a ser um elemento essencial do Cristianismo, como provam alguns textos de SSo Paulo, em que este emprega o termo grego koirtcnfa (comunhao) para exprimirá partilha comunitaria dos bens materiais". As palavras de Ernesto Cardenal só se podem entender se se abstrai daquilo que o Cristianismo tem de específico, ¡sto é, o seu relacionamento com Deus e os valores transcendental. Somente o Cristianismo esvaziado de sua própria identidade pode levar ao marxismo ateu ou assimilar o comunis mo ateu.

2. Os cristaos revolucionarios nao pregam aos marxistas no intuito de

atrai-los a Jesús. É o contrario que se dá: pregam aos cristSos para atrai-los a Marx; converter os cristSos ao marxismo é, na verdade, o mais forte empenho dos revolucionarios. O Instituto Histórico Centroamericano de Mana gua, dirigido pelo Pe. Alvaro Arguello, imprimiu numerosos folhetos acenseIhando os cristlos a nlo ter medo do marxismo e apresentando Fidel Castro

como amigó do Cristianismo. O ateísmo de Marx nao perturba os cristaos revolucionarios. Para es tes, crer ou nSo crer em Deus nao tem importancia fundamental. O Pe. Mi

guel D'Escoto, Ministro das Relacoes Exteriores do regime sandinista, declarou em 1980 ao jornal La Prensa: "Há pessoas que se dizem ou se confessam atetas, e nos temos de respeitar que as pessoas se digam atéias. Na verdade, do ponto de vista cristSo, isto nao tem maior importancia. O que tem importancia, é o comportamento das pessoas, a prática, nao a teoría".

Referindo-se a Alejandro Bermúdez, conhecido comunista nicaragüen se que faleceu em 1979, o Pe. D'Escoto continuou: "Ele era, apesar de que teóricamente se tenha dito ateu,

urna das

pessoas mais crentes."

Se perguntássemos a D'Escoto por que assim julga, respondería que Bermúdez lutava pela revolucao e nela acreditava. Tal concepcao bem revela um conceito de fé secularizado ou despojado de seu conteúdo religioso.

Alias, o Credo sandinista, como foi publicado em El Nuevo Diario de

07/1/84, professa urna mensagem laica ou arreligiosa:

162

"CR1STÁ0S SOB FOGO"

19

CREDO SANDINISTA por Dionisio Herrera y Canales "Creio em Sandino, Pa¡ de Nossa Revoluto Popular Anti-Imperialista, que nasceu de mae camponesa proletaria, descendente da casta de Diriangén, Estrada. Castro e Zeledón.

Foi proletario com consciéncia de classe, autodidata, patriota e guerrílheiro nacionalista, e, como o David bíblico, derrotou o Golias.

Creio em Sandino organizador do EDSN, formado por operarios e camponeses, que lutou em montanhas, vales e povoados, e cidades contra

traidores, entreguistas e aínda contra as legioes do imperio tanque, defendendo nosso solo patrio, nossa soberanía e dignidade nacional. Foi traído e assassinado por um Judas, "fifho" do Tio Sam, que em pagamento recebeu anos de ditadura militar e muitos dólares. Os assassinos e profanadores de seu cadáver foram anistiados por urna cómplice comissib livre-conservadora. Creio em Carlos Fonseca, seu dileto filho, que herdou seus ideáis e

tíficas de luta guerrilheira, que foi fundador da FSLN, nossa vanguarda po lítico-militar, e que no altar da patria está ao lado de seu pai revolucionario, cuja doutrina enriqueceu com novos pensamentos filosóficos e revoluciona

rios de conteúdo proletario e que transmitiu a seus irmios de luta mais chegados.

Creio na Revoluto Popular Sandinista e na sabia conducSo políticomilitar de nossa Direcao Nacional da FSLN que traba/ha para e pelo bem-es-

tar das massas populares nicaragüenses antes exploradas e margina/izadas, e luta pela paz na América Central.

Creio ñas doutrinas e lutas de Marx, Engels, Lenin e Che, grandes

mestres e guias da classe trabalhadora, que é forca produtiva e verdadeiro motor da luta de classes, que enterraré para sempre a classe exploradora, anti-cristae desumanizada.

Creio na construcao da sociedade socialista marxista-leninista. Creio na imortalidade e respeito por nossos heróis e mártires. Creio no poder po pular em maos dos operarios e camponeses, e em sua existencia até a consumacao dos séculos. Amém".

3. Uma das táticas utilizadas pelos revolucionarios é a de dividir a Igreja, jogando os fiéis contra os bispos, especialmente contra Mons. Miguel

163

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"PERGUNTEE RESPONDEREMOS" 287/1986

Obando y Bravo, arcebispo de Managua.1 Com outros termos: propunham a promocao da Igreja Popular ou dos pobres (ou dos cristaos sandínistas) con tra a Igreja institucional dos ricos, que é a Igreja oficial; esta seria "arrogan te, autoritaria, contra-revolucionaria, inimiga do povo".

Em julho de 1981, por exemplo, os sandinistas suspenderam a transmissáo da Missa dominical celebrada pelo arcebispo já havia mu i tos anos. Logo se impuseram fortes restricoes a emissora de Radio católica, a única do país, que, alias, hoje está supressa. Os jomáis também passaram a ser seve

ramente censurados para que nao apoiassem a Igreja oficial na sua luta con

tra o sandinismo. O Ministerio do Interior chegou a determinar que as ho milías e os sermSes de maior alcance deveriam ser previamente censurados pelo Governo.

'Alguns sacerdotes passaram a ser perseguidos em sua honra e dignidade; com efeito, foram armadas citadas, especialmente contra o Pe. Bismarck Carbatlo, porta-voz do arcebispado, que foi fotografado em lugar compro metedor sem que tivesse a mínima culpa. Alguns sacerdotes foram expulsos do país a título de "reacionários" e por falsas acusacóes, que suscitaram pro testos da Radio Vaticana, dos bispos da Venezuela, de Costa Rica e dos Es tados Unidos. 4. Em conseqüéncia da perseguidlo á Igreja hierárquica, registrou-se um fato paradoxal: a "Igreja dos pobres" tornou-se rica e a "Igreja dos ri

cos" ficou sendo pobre. Com efeito; os cristaos revolucionarios receberam vultosa ajuda económica internacional por parte de protestantes e nao cató licos: assim, por exemplo, em 1983, o Conselho Mundial das Igrejas doou 176.000 dólares ao Centro Valdivieso (Sandinistas cristaos); o Conselho Na cional das Igrejas dos Estados Unidos deu ao mesmo a importancia de 365:329 dotares; o Comité Metodista Unido para a Ajuda Ihe deu 100.000 dólares; o Programa Presbiteriano Unido para Combater a Fome doou 10.000 dólares. A Junta Global dos Ministerios da Igreja Metodista Unida entregou 25.000 dólares. En tremen tes o Governo, por decreto de agosto de 1982, proibiu que a Igreja Católica e as instituicoes particulares recebes-

sem doacoes do estrangeiro. Assim os católicos fiéis á Igreja oficial carecem de centros de comunicacio e mal podem fazer chegar ao estrangeiro as no ticias concernentes á sua dolorosa condicao de perseguidos.

1 Mons. Miguel Obando y Bravo, arcebispo de Managua desde 1970, opunha-se ao Governo de Somoza para defender a causa dos camponeses; as denuncias que fazia, de sucessivas violacoes dos direitos humanos, valeram-lhe ameacas e um atentado contra a sua vida, além de campanhas de

difamafSo, que Ihe atribuiam o titulo de "comunista". Mons. Miguel Oban do y Bravo apoiou o Governo sandinista até se patentear a índole anticris ta do mesmo; desde entao é arauto da verdadeira democracia na Nicaragua. 164

"CRISTÁOSSOBFOGO"

21

Notemos aínda que a "Igreja dos pobres", rica como é, veio a ser en cabezada por urna élite de ¡ntelectuais, em maioria estrangeiros, ao passo que a Igreja institucional é pobre e constituida principalmente por indígenas

(os indios Meskito, entre outros) e goza de respaldo esmagador entre os po

bres da Nicaragua; em 1981 urna pesquisa realizada em 900 lares demonstrou que Morts. Obando, arcebispo de Managua, era a figura mais popular do país {a partir desta pesquisa, alias, o Governo promulgou urna lei que proibia a realizacao de pesquisas sem autorizacao do Estado).

3. A VISITA DO PAPA EM 1983 Preparando sua visita á Nicaragua, o S. Padre JoSo Paulo II enviou aos bispos do país urna carta datada de 29 de ¡unho de 1982, em que expressava sua solidariedade com a Igreja naquele país e se opunha á fundacao da Igreja

Progressísta que o Governo sandinista planejava. Ora o Ministerio do Interior

proibiu a publicacio de tal carta na Nicaragua.

Eis os fatos que acompanharam a visita do Papa, em marco de 1983, á

Nicaragua:

1) Os sandinistas dificultaram ou detiveram o tráfego na maior parte do país para nSo permitir o encontró dos fiéis com o Sumo Pontífice. JoSo Paulo II, consciente do que ocorria, saudou "os milhares de nicaragüenses aos quais nao pdde dirigir-se como desejara".

2) O Governo impediu que as pessoas se reunissem com antecedencia nos lugares onde o Papa devia aparecer. Em Managua a polícia disparou ar

mas automáticas sobre os fiéis que procuravam conseguir acomodacoes ñas primeiras horas do dia.

3) JoSo Paulo II foi interrompido por gritos e alaridos durante o seu sermao e na parte restante da Missa em Managua. Durante a Comunh3o, por

exemplo, um agitador sandinista gritou através de potente megafone: "San to Padre, se realmente o senhor é o representante de Cristo na térra, exigi mos que seja solidario conosco". A própria policía dirigía as intervencoes estranhas.

4) Técnicos do Governo distribuiram microfones entre os grupos progovernamentais e os ligaram ao sistema principal de alto-falantes, amplifi cando os gritos de "Poder Popular!", que ¡nterrompiam continuamente as

palavra do Papa. Em repetidas ocasioes o S. Padre pediu silencio. 5) Durante a celebracSo da Missa, os nove membros do Diretório Na cional da FSLN - incluindo o Presidente Daniel Ortega - fizeram causa comum com os agitadores, movendo o braco esquerdo com a mSo cerrada em punho e gritando: "Poder Popular! Poder Popular!"

6) A Igreja e o Governo haviam decidido que a visita papal seria apolítica ou exclusivamente religiosa; por isto o clero pediu aos fiéis que se abstivessem de demonstracoes políticas. Nao obstante, os sandinistas leva165

22

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

ram piquetes e cartazes políticos, gritando seu slogans atravésde megafones

e concluiram a Missa papal cantando o hiño do Partido.

É de notar que tais manifestacóes nao foram atitudes espontáneas do povo, mas, sim, acoes premeditadas que partidarios da FSLN devidamente tre ¡nados levaram a cabo.

4. OS JOVENS E O SERVIDO MILITAR Aos 29/8/1983 a Conferencia dos Bispos da Nicaragua publicou uma Carta Pastoral que questionava a legitimidade da lei do servico militar obrigatório para todos os jovens. A argumentado dos Bispos — compartilhada por numerosos jovens e seus pais — procedía do fato de que o exército sandi-

nista é uma organizacao do Partido e nSo da patria; forcar todos os cidadSos

a servir a essa instituidlo seria uma violacao das consciéncias. O diario Barri cada publicou tal documento dos Bispos, insinuando que era uma prova de "traicao" do episcopado nicaragüense. Um mes mais tarde, aos 30 de outubro de 1983, produziu-se uma onda de ataques coordenados contra vinte e duas igrejas aproximadamente situadas em diversos pontos do país: as tropas de choque, armadas de paus e armas de fogo, agrediram durante a celebragao da S. Missa: destrocaran! portas e janelas e espancaram brutalmente os. fiéis, inclusive o Bispo Auxiliar de Managua e outros sacerdotes. Uma procissao em honra da Virgem Maria também foi alvo, nesse dia, de tratamento similar. Ao anoitecer, novos grupos atacaram outros Templos. O jornal "L'Osservatore Romano" do Vaticano comentcu os fatos co

mo sendo provocacao e expressio de intolerancia religiosa (2/11/1983). O Governo sandinista convidou entao a Igreja ao diálogo: oferecia-lhe a suspensSo dos ataques f i'sicos em troca de uma declaragao eclesiástica que condenasse a agio dos contra-revolucionarios e as ameacas de invasKo estran-

geira. A proposta era comprometedora. Se a Igreja condenasse a contra-revolucao, os sandinistas explorariam o fato em seu favor; se na*o o fizesse, podería ser acusada de traidora da Patria. Os Bispos nicaragüenses, representados

por Mons. Pablo Vega, Presidente da Conferencia Episcopal, responderam:

"É muito difícil dizer qual invasSo seria a mais grave: a invasao militar de

fora ou a invasao ideológica de dentro que está ameacando todas as aspiracoes e necessidades fundamentáis do homem". Nao houve reacao ¡mediata dos governantes sandinistas. NIo obstante, muitos jovens cristSos nicaragüenses passaram a sofrer

serios vexames: a juventude sandinista, protegida pela Policía, resolveu dar buscas em casas particulares, ónibus, restaurantes, salces de cinema, igrejas, pedindo aos jovens em idade militar que mostrassem suas carteiras de mem-

bros do Exército; quem nio tivesse a sua, era violentamente agredido e sujeito a represalias académicas ou outros castigos.

166

"CRISTÁOS SOB FOGO"

23

5. HUMANISMO REVOLUCIONARIO? 1. Corre por vezes o rumor de que os sandinistas sao revolucionarios muito humanos; n3o se terao vingado dos seus opositores nem terao realiza do execucSes sumarias.

Ora tres Comissoes de magistrados ¡nvestigaram as ocorréncias na Ni caragua e puderam atestar o uso da violencia brutal e milhares de assassina-

tos. Tais foram a ComissSo Permanente de Oireitos Humanos Nicaragüense, a Comissao de Juristas Nicaragüenses e a Comissao Internacional de Juris tas das Nap6es Unidas. - Humberto Belli em seu livro exibe depoimentos, documentos e fotografías que comprovam a brutalidade desumana aplicada pelos revolucionarios a quem nao se quisesse submeter á ideología implanta da. Entre outros, merece ser citado o caso dos indios Miskito, populapáo

de aproximadamente 80.000 pessoas, que viviam na regiá"o quase desolada da costa atlántica, alimentando-se de caca e pesca: como tivessem suas carac terísticas culturáis e religiosas próprias, que o sandinismo nao tolerava, so-

freram, em parte, remocao para acampamentos sob resguardo militar (cam pos de concentrado); em parte, fugiram para Honduras, onde subsistem co

mo refugiados em condicoes muito precarias; em parte, permanecen) no li

toral atlántico, sujeitos á lei marcial e á contfnua provocapib policial. Co menta H. Belli:

"Caso queirantos identificar a causa decisiva da tríbulacSo dos Miski to, diremos que é a determinacao dos sandinistas de tornar comunista a sociedade nicaragüense — pretensao que viola as tradicoes e aspiracdes mais profundas do povo Miskito, simples, religioso e outrora pacífico. A remocSo massiva de populacoes inteiras. .. tem sido constante na prática marxista, ao redor do mundo. Stalin 're-assentou' os Kulaks (camponeses russos) ñas décadas de vinte e trinta; os cambo/anos vermelhos 're-assentaram' sua po-

'pulacao urbana na década de setenta. O comunismo encama um dos maiores

esforcos que se podem encontrar na historia para impor, sem consideracao

de custo humano, urna sociedade uniformizada sob um Estado absoluto. As diferencas individuáis, os direitos da pessoa ou das minorías culturáis ou étnicas nSo contam. Do ponto de vista marxista, a destruicáb daqueles que se negam a integrarse á grande utopia é algo completamente justificado. A tragedia dos Miskito é só o capítulo mais recente de um longo histórico comunista de supressao das minorías étnicas" (pp. 85s). 2. Os avancos sociais alcanzados pelo Governo sandinista sao muitas vezes apresentados como contra-peso do que se atribuí de negativo ao mesmo regime. Humberto Belli observa o seguinte:

Esses progressos sociais nao estao dev idamente documentados; seria preciso demonstrar melhor a sua realidade histórica. Além do qué, tém aspectos que costumam passar despercebidos aos observadores estrangeiros. 167

24

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

"A campanha de alfabetizado, por exemplo... Um exame mais minu cioso da realidade revela que a campanha de alfabetizado fot possivel pela participado e o apoio logfstíco e financeiro de toda urna gama de agrupamentos alheios ao Governo. Na campanha participaran) todas as escolas ca tólicas; as associacóes de país de familias cristas deram vasto apoio logfstico aos analfabetos; as igrejas católicas e evangélicas exortaram todos os seus membros a participar; o entao Presidente da Conferencia Episcopal, Mons. Otando, viajou aos Estados Unidos para coletar fundos para a Campanha; muitos empresarios também deram o seu apoio a esta tarefa. Por outra par te, a campanha foi principalmente financiada com fundos provenientes dos países ocidentais, especialmente dos Estados Unidos e da Alemanha Fede ral, e 70% do custo total foi coberto por fontes norte-americanas tanto pú blicas como privadas. Em constraste, a URSS fomeceu aproximadamente J % do total" (p. 87).

"No referente a me/horas ñas áreas de saúde pública, habitacao e re forma agraria, também resulta difícil discernir entre propaganda e política. A falta de dísponibilidade de dados esta tísticos confiáveis, assim como o controle aplicado a todos os aspectos da administracao pública nicaragüen se impossibilitam a avaliacao objetiva destes fatos" (p. 88).

6. CONCLUSÁO .

O relatório de H. Belli termina com algumas reflexñes a guisa de

conclusao, que podem ser assim compendiadas:

A populacho nicaragüense está sob um regime que, apesarde todas as promessas de respeito á religiao e aosdireitos humanos, é urna ditadura marxista-leninista.

A participapao dos crinaos na vitaría do sandinismo foi de grande con veniencia para este. Sim;deu foros de credibilidade a pretensSo sandinista de ser um regime novo, no qual Cristianismo e revolucSb (marxista) poderiam

caminhar juntos. Os cristaos sandinistas convidam seus irmaos na fé a se aproximar de Marx, mas nSo convidam os marxistas a se aproximar de Cris to; a mao é única rumo ao comunismo ateu. A teología pro-marxismo apresentada por tais cristaos nSo é produto da reflexáó do povo nicaragüense; mas é concebida em salas de aula e biblio tecas confonáveis dos Estados Unidose da Europa;é levada para a Nicaragua por estrangeiros, que também f inanciam a sua propagacSo. A grande maioria

dos cristá'os nicaragüenses, principalmente os mais pobres, nao tém dado grande importancia a esse Evangelho penetrado de marxismo. Bem observava JoSo Paulo II em Puebla: "Como por instinto evangélico, os fiéis humil des e simples captam espontáneamente quando se serve a Igreja e ao Evan

gelho, e quando se procura esvaziar seus conteúdos ou asfixiá-los em proveito de outros interesses" (III, 6). 168

"CRISTAOS SOB FOGO"

25

Por último, Humberto Belli nota, com certa dor, que os crinaos do mundo inteiro pouco apoio tém dado aos seus irmaos na fé nicaragüenses

que sofrem perseguicao. Muitos assim procedem por ignorarem a situacao real da Igreja naquele país; outros talvez, porque se deixam fácilmente empolgar por messianismos políticos de ocasiio, esquecendo-se da originalidade e da riqueza insondável da mensagem de salvaclo crista. Eis a propósito um dos depoimentos mais significativos:

Armando Valladares, poeta cubano cristao, passou vinte e dois anos na prisao em Cuba até 1982. Conta que a experiencia mais dolorosa dos cris taos cubanos era o apoio que os cristaos no estrangeiro davam ao Governo marxista em vez de o dar aos cristaos perseguidos Dor este Governo: "Durante todos estes anos, com o objetivo de forjar-nos a abandonar nossas crencas religiosas e para desmoralizar-nos, os doutrinadores comu nistas usavam constantemente declarares de apoio á revolucio cubana pu

blicadas por alguns representantes das igrejas cristas americanas. Cada vez

que se publicava um folheto nos Estados Unidos, cada vez que um sacerdote escrevia algum artigo, apoiando a ditadura de Fidel Castro, mostravam-nos

urna tradufSo e isso para nos, prisioneiros políticos cristaos, era pior do que os golpes que recebfamos ou a fome á qual nos submetiam. Enquanto espe-

rávamos com ansiedade o abracó de solidariedade da parte de nossos irmaos em Cristo, de maneira incompreensfvel para nos os que recebiam este abraco eram os nossos torturadores" (p. 8). Precisamente o objetivo do livro de H. Belli é informar documenta damente os leitores de Ifngua portuguesa acerca do que padecem os cristSos da Nicaragua ou a quase totalidade da populacSo nacional, cerceada

em seus direitos humanos pelo marxismo, é importante que o público leia o depoimento de quem conhece o comunismo por experiencia direta. A

palavra de H. Belli é particularmente ponderável porque parte de quem fo¡ adepto militante do marxismo e se decepcionou com o que viu ñas fileiras comunistas. Mais de urna vez o autor p5e em relevo no seu relato a tática

marxista de "dar dois passos á frente e um passo para tras", a fim de confun dir a opiniáo pública e assim avancar sem suscitar a resistencia que encontra ría urna campanha nlo camuflada; cf. pp. 29. 57. 60. O Cristianismo possui em sua mensagem diretrizes lúcidas que podem contribuir poderosamente para a solucSo dos problemas sociais da América

Latina sem o recurso á violencia. Já disse mais de urna vez Joao Paulo II que a doutrina crista nSb precisa de complementacSo heterogénea para res ponder aos anseios dos homens.

O livro de H. Belli pode ser solicitado gratuitamente ao endereco indi cado á p. 158 deste fascículo.

169

Que diferen?a há entre

O Homem e os Animáis Irracionais? Em sfntese: É freqüente perguntar se no homem existe alma espiritual ou algo que transcenda a materia. Há quem responda negativamente, afir mando que corpo e alma nao sao senáo duas facetas da mesma realidade. A questao se resolve mediante o exame dasatívidades do ser humano; se estas sao imateríais ou uitrapassam as possibiiidades da materia (como de

fato uitrapassam), supoem um principio vital ¡material ou espiritual; sendo espiritual, este nao tem origem a partir da materia nem perece com a mate

ria, mas é dotado de imortalidade. — As atividades que permitem chegar a tal conclusao sSo: a formulario de nocoes abstraías ou universais, a linguagem simbólica, o exercfcio da liberdade de arbitrio, a consciéncia que o homem tem de si mesmo, a cultura e o pmgresso, o cultivo de valores moráis e religiosos.

Muitas teorías sao hoje oferecidas ao estudioso para ilustrar a identi-

dade da criatura humana; seria um macaco aperfeicoado? E, caso se diga que tem alma espiritual, será que esta se distingue do corpo? Pode-se admi

tir a dualidade (nSo o dualismo) de corpo e alma?1

Em nossa resposta, exporemos, antes do mais, algumas nocoes básicas, a respeito das quais se exige clareza para poder raciocinar. A seguir, exami naremos dados de experiencia, que nos sugerirSo algumas reflexSes. O as-

sunto já foi abordado em PR 226/1978, pp. 423-434; volta agora um tanto enriquecido.

1. NOQOES BÁSICAS Faz-se mister ter conceitos claros de corpo (materia) e alma (espirito). A materia é urna realidade extensa, dotada de figura, cor, peso. . . 0

corpo humano é materia viva ou materia (calcio, ferro, hidrogénio, oxigé-

1 Dualismo é a distincao que implica oposicao, como existe entre luz e trevas, bem e mal... Dualidade é a distincao real que nao implica oposi cao, como existe entre homem e mulher, corpo e alma. 170

O HOMEM E OS ANIMÁIS IRRACIONA1S

27

nio...) penetrada por um principio vital, que a faz funcionar como um toHo orgánico ou um organismo. Dizemos que esse principio vital do homem (ou a alma humane) é espiritual. - Que é espirito? Espirito é um ser real, que nSo tem tamanho nem cor, nem sabor, nem peso..., mas é dotado de inteligencia e vontade; é pelas manifesta

res intelectivas, que nada tém a ver com vozes, toques, imagens..., que reconhecemos a existencia do espirito. Distinguimos tres modalidades de espirito:

[nao criado: Deus

Espirito^

I para v¡ver sem corpo: anjo

[criado < I para se unir a um corpo: alma humana A alma humana, como principio vital, é responsável por todas as fun coes vitáis do corpo a que está unida: funcoes vegetativas (alimentar-se, crescer, reproduzir-se...), funcoes sensitivas (conhecer objetos concretos, mate-

riaisl, funcoes intelectivas (conhecer nocoes abstratas, universais, def inicdes,

proporcoes entre meios e fim...).

Os estudiosos tém examinado atentamente o comportamento do homem e dos animáis irracionais. Em conseqüéncia deste estudo, pode-se instituir o seguinte raciocinio:

1) O homem se distingue dos animáis irracionais em seis, ao menos, das suas expressoes ou atividades características: formulacao de conceitos abstratos e definicSes, linguagem simbólica, exercicio da liberdade de arbi trio, consciéncia de si mesmo, cultura e progresso, cultivo de valores moráis e religiosos;

2) ora essas atividades sao imateriais: o seu objeto nao apresenta ta manho, extensao, peso, cor...;

3) por conseguinte, existe dentro do homem um principio de ativi dades que deve ser ele mesmo ¡material ou isento de tamanho, extensao, peso, cor..., pois ninguém produz o que nSo tem; tal principio é chamado "a alma humana espiritual", a qual conseqüentemente se distingue da mate ria ou do corpo do homem. Iniciemos agora o nosso exame de fatos acompanhado de ref lexoes.

2. AS ATIVIDADES TILICAS DO SER HUMANO Seis sSo essas atividades, a comecar pelo pensamiento abstrativo. 171

28

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

2.1. Formulacao de conceitos universais Distinguimos conceitos concretos e conceitos universais.

Conceitos concretos sao aqueles que nos apresentam um objeto preci so e singular: esta rosa, este menino, este beija-flor..., com seu tamanho, sua cor, seus traeos individuáis. Na mente temos a imagem exata de tal obje to bem determinado. Conceitos universais ou abstratos sao aqueles que nos apresentam os

elementos essenciais de tal ou tal objeto concreto: por exemplo, nesta rosa que vejo agora, há tragos que só ela tem (tal cor, tal tamanho...) e há traeos que todas as rosas e todas as flores tém (esta rosa é flor, como o cravo é flor,

como a violeta é flor...}; o conceito abstrato ou universal de flor é, pois, aquele que prescinde dos trapos próprios desta rosa e me apresenta aquilo que a flor como flor (¡ndependentemente de ser rosa, cravo ou violeta...) deve ter; é universal porque tal conceito convém a toda e qualquer flor.

Pois bem. 0 hotnem é capaz de formular conceitos universais, ao passo

que os irracionais nSo sao tais.

2.1.1. Observando o ser humano O homem, e só o homem, é capaz de conceber nopSes abstraías ou

universais: posta diante de diversos individuos humanos, por exemplo, um preto, outro branco, um gordo, outro magro, um velho, outro jovem..., a mente concluí que nSo é o tamanho nem a cor, nem o sexo, que faz a pessoa ser gente, mas é o fato de ser v ¡vente racional... Pois bem; o conceito de vivente racional, como o de flor, o de pássa-

ro. . . é um conceito ¡material, ao qual nSo é inórente extensSo, tamanho, peso... Quando digo "vivente racional", na"o devo imaginar um homem concreto, porque a mulher também é vivente racional; nao devo imaginar

um adulto concreto, porque a enanca também é vivente racional; em suma, nada posso imaginar de particular e concreto, porque precisamente tenho um conceito que está para além de todos os pormenores contingentes e abrange apenas o essencial de cada ser. Muitos outros exemplos podem ser aduzidos para provar que o homem é capaz de conceber nocoes universais; assim virtude (n§o esta ou aquela virtude), justiga (nao este ou aquele ato de justiga)... s3o nocoes ñas quais nao posso apontar lado direito e lado esquerdo, parte de cima e parte de baixo... como os aponto numa imagem; nSo posso afirmar que sao de hoje ou de amanha, porque sSo de todos os tempos. Quem pode dizer qual seja a auténtica imagem da justipa? - Urna mulher com os olhos vendados, trazendo uma balanga na mSo? Mas o ope

rario que trabalha conscienciosamente nSo está também praticando a jus tica? O patrao que paga o digno salario ao pedreiro, nao é também imagem

da justica? - Verdade é que cada uma destas imagens encerra o conceito de justiga, mas nenhuma esgota tal conceito, porque este transcende cada um 172

O HOMEM E OS ANIMÁIS IRRACIONAIS

29

destes atos particulares e estende-se a numerosos outros, com os seus varia dos aspectos. Diremos, pois, que a justica, a flor, a enanca, o pássaro... existem fora da nossa mente com seus traeos concretos, como que "encar nados" na materia; em nossa mente passam a existir de outro modo, ou seja, de modo ¡material. Mais um passo no raciocinio: se os conceitos produzidos pela mente humana sao imateriais (pois abstraem da materia), a própria mente deve ser

¡material ou espiritual; ela é urna faculdade da alma humana, que por isto também há de ser tida como ¡material.

Estas ponderacoes seráo confirmadas no parágrafo seguinte.

2.1.2. Observando os ¡rracionais... Os animáis ¡nfra-humanos tém seu psiquismo, dotado de memoria, afetos,

instintos, reflexos condicionados..., mas na"o tém manifestacoes intelectual (raciocinio, formulacSo de conceitos abstratos, jufzos...). Com efeito...

Pode-se realizar a seguinte experiencia:1

Disponha-se urna serie de vasilhas fechadas, na primeira das quais se coloca o alimento de um macaco. O animal, posto diante de tal serie, ná"o

sabe onde encontrar a sua racáo; o operador entao abre a primeira vasilha e Ihe mostra o seu alimento. Ftepita-se a experiencia, encerrando na segunda vasilha o alimento, e nao na primeira. O animal, recolocado diante da serie, é guiado pela memo

ria sensitiva e, recordando-se do ocorrido no dia anterior, vai á primeira vasi lha. O operador entao o coloca diante do segundo recipiente, do qual o ani mal se serve. Num terceiro ensaio, coloque-se o alimento fechado no terceiro rec¡: píente: guiado pelas impressoes sensíveis do ensaio anterior, o macaco se dirige para o segundo vaso... Caso se multipliquen! as experiencias, verifi ca-se que o animal procura de cada vez o recipiente em que no ensaio an terior encontrou o que Ihe interessava. Nunca chega a abstrair dessas diver sas experiencias a lei da progressao que as rege. Nunca se desvencilha das no

tas concretas da vasilha em que por último encontrou a sua racao, deduzindo que nSo é o fato de ser a segunda, a terceira ou a quarta vasilha que interessa, mas é o fato de ser a vasilha n + 1 (fórmula em que n designa o nú mero da experiencia anterior). Ora urna enanca sujeita a tal teste, depois de tres ou cinco experiencias, consegue abstrair a lei n + 1 do fenómeno. Oestes ensaios se concluí que o animal, por mais semelhante que seja ao homem, jamáis se desembarazada percepcao do concreto, material; ele per-

1 Feita pela primeira vez por G. fíevesz, Reconnaissance d'un princi pe, em Archives Neerlandaises de Physiologie 8 (1923), pp. íss. 173

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

cebe o primeiro, o segundo, o terceiro objetos... postos á sua frente, mas é incapaz de perceber a proporcao que há entre esses objetos: 1 =n + 1 2 = n + 1 3 = n + 1 4 = n + 1 5=n + 1

Na coluna da esquerda temos ácima a lista dos termos concretos, par ticulares, ao passo que na coluna da direita temos a fórmula universal e a indicacáb de proporcSes. Ora passar da coluna da esquerda para a da direita

percebendo a constante n + 1 por debaixo das variacoes 2, 3, 4, 5... é al go que só a inteligencia faz, porque só esta abstrai do concreto. O animal irracional ná*o se eleva ao abstrato, universal. Por conseguinte, o irracional

ná*o tem principio de conhecimento ou principio vital ¡material ou espiri tual; a alma do macaco ou do animal irracional é material. Ao contrario, o

homem, que é capaz de abstrair do concreto singular, possui um principio

vital ou urna alma ¡material ou espiritual.

J. V. Hamilton realizou outra experiencia,1 com dez pessoas e 27 animáis. Cada um desses individuos foi introduzido varias vezes num recinto fechado com quatro portas; tres destas só se podiam abrir do lado de fora, mas urna podía ser aberta por um empurrao de dentro do recinto. A porta que se podía abrir, variava vez por vez segundo um principio ou urna lei

geral, que era preciso descobrir por deducSo. - Ora tal descoberta só foi efetuada pelos seres humanos, ao passo que os animáis nSo conseguirán) fazé-la.

Isto confirma que os irracionais sá*o incapazes de formular principios abstra-

tos ou nio tém inteligencia.

2.2. A linguagem simbólica Observemos separadamente o homem e o macaco.

2.2.1. A linguagem humana Em que consiste propriamente o falar? — A linguagem é a capacidade que temos de formular conceitos uníversáis e exprimí-los mediante sons concretos, que variam de idioma para idioma. Assim os conceitos de pai e mae, por exemplo, sao conceitos un ¡versais, que todo ser humano concebe espontáneamente, mas que cada povo ou cada grupo lingüístico exprime de modo diferente. O homem é capaz de

1 J. V. Hamilton, A study of trial and error reactions ¡n mammals, em: Journal of Animal Behaviour 1,1911. 174

O HOMEM E OS ANIMÁIS 1RRACIONAIS

31

emancipar-se de determinado som associado a determinado conceito univer sal para propor exatamente o mesmo conceito mediante outra expressao

fonética; é o que se dá com os tradutores, que procuram guardar exatamen te as mesmas mensagens intelectuais através de diversas sonorizacoes.

Quem olha para a cavidade bucal de um homem e a de um macaco, é propenso a dizer: se o homem fala, o macaco também fala, pois orgánica mente este dispSe de tudo o que o homem possui para falar. Nao obstante,

o macaco nao fala. Isto só se pode explicar pelo fato de que no homem há algo mais do que no macaco; esse algo mais é a espiritualidade do seu prin cipio vital. Com efeito; o homem só pode falar porque é capaz de perceber que diversos sons nao significan! sempre diversos conceitos ou porque é ca paz de distinguir entre o som concreto e o conceito universal, ¡material. Isto denota no homem a presenca de urna alma ¡material ou espiritual.

Observe-se também: nao há transicáo entre o material e o ¡material (ou espiritual). O espirito nao é a materia rarefeita ou gasosa energética, pois mesmo a materia rarefeita e a energía elétrica slo dimensionáveis mediante números ou estao suje ¡tas á quantidade, ao passo que o espirito nSo é quan-

titativo nem comensurável.

2.2.2. A comunicacáo dos irracionais Na década de 70, varios psicólogos norte-americanos tentaram ensinar

a linguagem humana a chimpanzés; visto que estes sao incapazes de proferir

palavras, foi-lhes transmitida a sinalizacSo utilizada pelos surdo-mudos. Os pioneiros foram o casal de psicólogos Alien e Beatric Gardner, que se dedicaram á chimpanzé fémea Washoe, ensinando-lhe a linguagem de ges

tos e imagens dita Ameslan (American Sign Language): o animal aprendeu certo número de sinais associando-os entre si, de modo a se comunicar com os homense com outros animáis que aprenderam depois dele. Dann M. Rumbaugh treinou a fémea de chimpanzé Lana para que per-

cu tisse as teclas de um computador; sobre estas estavam gravados sinais que eram associados a acoes e objetos diversos. Lana chegou a completar frases;

por exemplo, o operador escrevia na linguagem convencional: "Please ma chine give..."; o macaco entao apertava a tecla que significa apple. Donde: "Por favor, dé a máquina... ao macaco".

Mais: Francise Patterson treinou urna féma de gorila chamada Koko, de modo que esta nao somente respondia, mas também proferia insultos e dizia mentiras! O casal Gardner conseguiu que outros chimpanzés fizessem desenhos. Um deles, chamado Moja, após haver tracado rabiscos muito confusos du rante meses, comecou a fazer algo de melhor. Interrogado sobre o significa do de um desses desenhos, o animal fez o gesto "Pássaro!" Será que ¡sto significa que entre o homem e os animáis inferiores há 175

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

apenas diferencas quantitativas, nao, porém, essenciais?

Respondemos: a linguagem propriamente dita implica que alguém utilize determinado som ou geno como símbolo de um conceito mental; esse símbolo pode variar nos diversos idiomas; o conceito, porém, nSo muda, porque a pessoa que fala conhece o sentido meramente funcional e ins trumental do seu símbolo. Ora entre os animáis nio existe tal flexibilidade; as comunicacoes se devem táo somente ao uso da memoria, ao instinto imi tativo e a certas intuicoes práticas adestradas por um hábil e paciente treinamento. Este provoca associacoes de sinais e gestos ou reflexos condiciona dos; sim, o treinador induz o animal a fazer tal gesto ou bater tal tecla, associando isto a determinado objeto ou atividade;o animal é premiado quando corresponde á expectativa do operador; se nao, é punido. O treino é repeti do tantas vezes quantas sao necessárias para obter a associagao de gesto e efeito.

Observemos que Washoe levou sete meses para associar o gesto de vir com a acao de vir; após 22 meses de treino, aprenderá 34 gestos. Sarán, outro macaco, aprendeu em sete anos de treino 130 sinais, que o animal usa com 75 ou 80% de acertó. - Pergunta-se: por que tanta lentidao na aprendízagem e tao ampia (20 a 25%) margem de erras? A resposta está precisamen te no fato de que se trata de exercício de memoria associativa, sem compreensao dos porqués.

Quanto aos desenhosde Moja, foram examinados pelo Prof. Fernando Olivier, da Universidade de Montpellier. Este os equiparou ás primeiras garatujas das enancas, que sao muito confusas e nada representam; interrogadas pelos adultos, as enancas dSo um nome qualquer (pássaro, flor, casa...) a esses rabiscos.

Pódese, pois, concluir que nem os macacos mais aperfeicoados possuem linguagem simbólica ou linguagem propriamente dita. O que eles praticam é mímica, associacao de idéias e reflexos condicionados. Ademáis rtote-se que tais animáis nao sabem o que é a morte: foi, sim, observado o comportamento de chimpanzés diante de um acídente mortal ocorridocom um

semelhante; a indiferenca dos mesmos revelou que nao compreendiam o sig nificado do ocorrido, nem quando se tratava de mae posta diante do filhote morto.

A respeito de linguagem dos ¡rracionais ver ulteriores consideracoes

em PR 232/1979, pp. 135-150.

2.3.3. Aprofundando... A diferenca entre o homem e os i rracionais no tocante á común ¡cacao pode ser ¡lustrada ainda pelas observacoes seguintes:

Os animáis, dotados de todos os sentidos externos e internos e de urna configuracSo bucal apta para falar, nao conseguem produzir linguagem, mas apenas associam sinais e objetos entre si, criando reflexos condicionados, á 176

__

O HOMEM E OS ANIMÁIS IRRACIONAIS

33

custa de longo treinamento. Ao contrario, o ser humano, mesmo privado de

visao, audigao e linguagem oral, consegue comunicar-se com urna linguagem auténtica e assaz evoluída. Tal foi o caso de pessoas que se tornaram famo sas por sua forca de vontade e nobreza de caráter.

a) Marie Heurtin nasceu em 1885, surda, muda e cega. Em desespero de causa, seu pai entregou-a com dez anos de idade (1/111/1895) á escola de

Larnay, dirigida por Irmffs educadoras. A mesma menina, á primeira vista,

parecía fadada a levar vida mais infeliz do que a dos animáis irracionais, pois, "para penetrar pelas ¡numeras portas do mundo fechado que a cercava, só tinha o molhe de chaves formado pelos seus dez dedos" (Lucien Descaves).

Urna das Religiosas — a Irma* Margarida — encarregoti-sedeempreender

a educacüo da jovem.

A principio teve que lutar contra os f requemes acessos de cólera de Marie. Um belo dia, tendo observado que a menina se deleitava em brincar com um cañivete, retirou-lhe da mSo este objeto; Marie se enfureceu. En-

tao a Religiosa Iho devolveu por um momento; a seguir, colocou-lhe urna das maos sobre a outra em sentido perpendicular como se a fosse cortar (tal é o sinal para designar a faca entre os surdo-mudos). A menina de novo mostrou-se irritada; mas tembrou-se de fazer por si mesma o sinal convencional que acabava de aprender; á vista disso, a Irma Ihe restituiu definitivamente o cañivete.

Marie mostrou assim que compreendia haver urna relacao misteriosa entre o cañivete e o sinal de mSos. Tendo concebido a idéia de relacao, Marie pode aos poucos aprender outros sinais convencionais para designar outros objetos. A Irma" Ihe ensinou o alfabeto dactilógico (as letras expressas pelos dedos); a Religiosa Ihe fazia sentir na ponta dos dedos a equivalencia exis tente entre sinais novos e decompostos e o sinal sumario e simples que a jo vem já aprenderá. Posteriormente Marie aprendeu a equivalencia de todos esses sinais dos dedos e de conjuntos de furos feitos sobre papel segundo o método de Braille. Depois que Marie aprendeu a "ler" e "falar" dentro do ámbito das coisas sensíveis, a Irma Margarida tentou e conseguiu enriquecer sua mente com nocóes abstratas e imateriais: fé-la apalpar duas companheiras, urna grande e outra pequeña; a seguir, fé-la tocar atentamente um menino carregador, maltrapilho, inclinado sob o peso de um saco, e urna pessoa bem ves

tida, ornada de jóias e portadora de moedas em sua bolsa; fez também que passasse as mSos sobre o semblante liso, fresco e juvenil de urna ¡rma e, a se

guir, por contraste tocasse a cabeca trémula, a pele rugosa e o dorso encur-

vado de urna pessoa octagenária. Por esses meios rudimentares, Marie penetrou no mundo dos conceitos

abstratos, como sSo miseria e riqueza, juventude e velhiee, grandeza e pequenez; isolou

os predicados

grande e pequeño)

das

percebidos (velho, jovem, rico, pobre,

condicdes concretas de espaco

177

e de

tempo em

34

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

que os havia conhecido, e concebeu as nocoes perenes de juventude e velhice, pobreza e riqueza, pequenez e grandeza. — Percebeu a pobreza e a velhice como realidades que ameacam todos os homens em todos os tempos e que a ela mesma ameacavam, a tal ponto que Marie se mostrou instintiva mente revoltada contra tais realidades durante horas.

Marie Heurtin pode assim granjear cultura e tornar-se útil para a sociedade. Faleceuem 1921.

Vé-se que a idéia de relacSo ou proporcSo foi, para Marie Heurtin, a chave da aprendizagem. Tendo essa idéia, a jovem conseguiu associar sinais sensíveis e conceitos abstratos, universais: tal ou tal conftguracao dos dedos, das míos ou dos furos de papel com as nocSes gerais de instrumento cor tante, velhice, juventude, riqueza, pobreza, pai, mae, irmáo— Ora a idéia de relacao ou proporcSo nao pode ser o produto de órgaos sensfveis materiáis, pois estes só apreendem as coisas concretas. A idéia de relacao e a capacidade de refletir e generalizar escapam ¿s possibilidades do conhecimento sensível. Donde se conclui que havia em Marie Heurtin, como há de resto em todos os demais seres humanos, urna faculdade de agir imaterial ou espiritual.

b) Antes do caso Marie Heurtin, já se registrara, o de Marta Obrecht,

também surda, muda e cega. Confiada á mesma Escola de Larnay, foi edu

cada pela Irm3 Branca, que Ihe aplicou processos semelhantes aos do caso Heurtin. De modo especial fez que Marta voltasse sua atencao para o conceito de mié: a menina aprendeu a discernir o que é essencial na figura da genitora; concebeu assim a nocao gerat ou universal de mae, distinguindo-a de notas contingentes que se podem encontrar nesta ou naquela mSe. No fim do aprendizado, Marta, percebendo o papel materno de sua preceptora, escrevia: "A IrmS Branca é mSe para Marta". A Irma Branca procurou também sugerir a Marta a idéia de futuro:

em dado momento, a menina se levantou bruscamente, e, estendendo os bracos para a frente, pós-se a caminhar rápidamente diante da Irma; acabara de conceber a clássica comparacao da vida com urna estrada. A educadora conseguiu outrossim despertar na jovem a nocao de seres imateriais, como alma e Dous; Marta assimilou também proposjcóes de fé e moral. Em 1910, entregava-se aos afazeres de dona de casa, á datilografia, á costura (á máquina) e a outros misteres técnicos. c) Ana María Poyet tornou-se cega e surda com a idade de tris

meses. Nao obstante, seu pai foi-lhe educando o tato, de modo que pode

conhecer e exprimir muitas nocSes. Um sopro sobre a mSo significava pai, dois sopros mae, tres so pros avó. Aos sábados, quando o pai, simples traba-

Ihador, voltava a casa, trazendo o salario da semana, a menina apalpava as moedas respectivas e, reconhecendo-lhes o valor, manifestava a sua alegria.

d) A senhorita americana Mellen Kelleré outroexemploda mesma realidade. Cega, surda e muda, pode aprender, mediante a linguagem simbólica 178

O HOMEM E OS ANIMÁIS IRRACIONAIS

35

do tato, que urna mestra pacientemente Ihe énsinou, as verdades mais d¡ficéis e abstraías; chegou a tornar-se autora de escritos que ¡mpressionam peta profundidade de seus sentimentos e o alto ni'vel de seu raciocinio. Uma reflexáo sobre as quatro jovens que acabam de ser mencionadas,

permite concluir que, no ser humano, mesmo destituido dos melhores de seus sentidos externos, existe um principio de atividade capaz de distinguir ñas criaturas o que há de concreto, material e contingente, e o que há de perene, ¡material e universal; esse principio de atividade, que transcende o concreto e percebe relacoes ou proporcoes, há de ser ¡material, pois a toda

atividade corresponde um principio adequado; tal principio é o que se cha ma "a alma humana" espiritual e, por conseguinte, ¡mortal.

2.3. A liberdade de arbitrio Observamos que os animáis infra-humanos sao levados a comportar-se de acordó com os seus instintos..., instintos de conservacSo do individuo e da especie; sao estes que os impelem a certos bens e os retraem decenos males...

Também o ser humano pode ser movido por instintos, instintos espon táneos, cegos, anteriores á deliberacao, em virtude dos quais o individuo

prové á sua conservacao ou á conservacSo da especie bu ainda a seu prazer... Todavia o homem é capaz de disciplinar e controlar os seus instintos e agir em conseqüéncia de deliberacoes ou decisoes tomadas após conhecer intelectualmente a situacSo em que se ache, e escalonar os valores que ela propoe.

Esta atitude própria do homem se explica do seguinte modo: Todo ser humano, além de conhecer instintivamente o que favorece e o que prejudica a sua subsistencia física, momentánea, é apto a conceber também a nocao de Bem, sem restricto; em conseqüéncia, é capaz de que rer, por sua vontade, o bemsem limites ou Bem Infinito; todo ser hjjmano, ao querer algo, só o quer porque tal objeto Ihe aparece comoum bem (real ou,

ao menos, aparente); em última análise, a vontade humana quer o bem sem restricao ou sem mésela de ¡mperfeicüo. Acontece, porém, que todo bem que a inteligencia aprésente á vonta de humana, é sempre um bem finito; mesmo o próprio Deus (que é o Bem Infinito, único capaz de saciar as aspiracoes do ser humano) é reconhecido na térra á semelhartca dos bens finitos, ou seja, de maneira análoga. Com ou-

tras palavras: todo bem que se aprésente á vontade humana, pode aparecer como insuficiente ( o próprio Deus pode aparecer nao só como Pai atraente, mas também como Legislador coibitivo de certos prazeres). Por isto a von tade humana goza de liberdade de arbitrio na vida presente, em relacSo a qualquer bem criado e em relacao ao próprio Criador. Na medida em que a inteligencia apresenta á vontade os aspectos de um objeto conveniente ás disposicóes momentáneas do sujeito, a vontade se inclina para esse objeto; 179

36

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

dado, porém, que o individuo se ponha a considerar os aspectos do mesmo

objeto que contrariem ás paixoes do sujeito, a vontade já tem fundamento

para o rejeitar. — é este o argumento filosófico que comprova a existencia do livre arbitrio do homem; ele se baseia, em última instancia, sobre a capacidade que a alma possui de conhecer o universal, o essencial ou o Ser como

tal e o Bem como tal, e nao somente o bem particular, concreto, singular. Ora tal capacidade supóe, como dito, a ¡materialidade ou a espiritualidade da alma humana.

Em íntima ligacáo com tal argumento, acha-se o seguinte:

2.4. A consciéncia de si mesmo Verifica-se que os animáis tém conhecimento de objetos que os cercam, ameacando-os ou favorecendo-os. O ser humano, além deste tipo de co nhecimento, possui o conhecimento de si mesmo ou a autoconsciéncia; o homem nao somente senté dor, mas sabe que senté dor ou que está lesado fí sicamente; este fator aumenta enormemente a sua dor, pois o sujeito huma no percebe que a sua molestia o impede de trabalhar devidamente, o que

pode prejudicar a sua familia, a sua carreira, o seu ideal... Possuindo o co nhecimento dos objetos e de si mesmo, o homem concebe o plano de orde nar o mundo e a si mesmo, dominando fatores estranhos ao seu ideal, supe rando paixoes desregradas, cultivando boas tendencias, etc. Isto tudo esca pa ás possibilidades de um animal irracional, pois este conhece o seu objeto concreto, singular, e é incapaz de se emancipar das notas concretas deste e de se voltar para si mesmo de maneira sistemática a fim de se conhecer. O ser

humano, ao contrario, realiza esta introspecc3o, porque o seu principio de conhecimento (intelecto) é capaz de ultrapassar o seu objeto concreto, ma terial para atingir o próprio sujeito...

2.5. A cultura e o progresso Verifica-se que o homem ¡ntervém no ambiente natural que o cerca, modificando-o de acordó com as suas intencBes e os seus planos; cria assim a cultura, que se sobrepoe á natureza, adaptando-a ao homem; assim é que surgem casas, estradas, cidades, fábricas, artefatos. . . Essa atividade cientí fica e técnica, social e ética, artística e religiosa, nao é o produto de processos fisiológicos e psicológicos apenas ou de fatores materiais e económicos

t3o-somente, mas se deve á ac3o intelectiva e planejadora da inteligencia e á liberdade de arbitrio do ser humano. Com efeito, ao conhecer a natureza que o cerca, o homem apreende as relacóes entre meios e fins ou as proporcoes entre diversos termos e concebe projetos para melhorar o seu ambiente (o seu habitat natural, a sua alimentacSo, o seu vestuario, as expressoes de sua arte, de seus sentimentos religiosos. . .); vai assim construindo civilizacoes sucessivas.. . Ora o animal é incapaz de progredir em suas expressSes,

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O HOMEM E OS ANIMÁIS IRRAC1ONAIS

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porque é guiado por instintos; assim o animal, embora certeiro e apurado em seus movimentos instintivos, é incapaz de dar contas a si mesmo do que faz e dos porqués da sua atividade; é, por isto, incapaz de se corrigir ou de se ultrapassar. Em última análise, a raíz da diferenca entre o comportamento

do homem e o do animal reside no fato de que o homem tem um principio vital ou um principio de atividades ¡material ou espiritual, ao passo que o

animal tem uma alma material ou confinada pelas potencialidades da mate ria.

2.6. Valores moráis e religiosos Verifica-se outrossim que os animáis nao tém consciincia moral. Esta supóe um principio interior que clama: "Pratica o bem, evita o mal"; este

principio nao é forjado pelos homens, mas é congénito; vem a ser a voz de Deus, que chama a criatura ao seu Fim Supremo. Em conseqüéncia, tudo o que é condizente com a voz da consciincia bem formada é moralmente bom; e tudó o que é destoante, é moralmente mau.

Á ordem moral se prende a Religiao. Esta afirma a existencia de um

Ser Superior invisível, que a inteligencia humana reconhece e que o homem

adora e cultua. Uma das mais antigás manifestares do senso religioso é o

sepultamento dos mortos (supoe a vida postuma outorgada pela Oivindade): desde a pré-história um dos mais típicos sinais de existencia de verdadeiros homens em algum lugar é a presenca de sepulturas; estao muitas vezes

voltadas para o Sol nascente, que seria o Olho da Divindade a acolher o defumo. Ora os animáis ¡nfra-humanos n3o manifestam senso religioso e, por conseguinte, nao sepultam os mortos; estas atitudes implicam a percepcao de valores transcendentais e imateriais; ora tal percepgao só pode ocorrer se

existe no sujeito uma faculdade ¡material ou espiritual de percepcao; o ani mal irracional nao a tem, mas o homem a possui; este é vivificado por uma alma espiritual, que nSo é materia fluida, nem energía etétrica, mas um ser dotado de inteligencia e vontade.

3. Conclusao Vé-se, pois, que, embora o ser humano seja essencialmente dsícossomático, isto é, uma composicao orgánica e harmoniosa de corpo e alma1, es tes dois elementos nSo se identif icam entre si, mas sao realmente distintos, como a materia e o espirito se diferenciam um do outro. — Esta afirmacSo nao depende de premissas culturáis de uma determinada época, mas resul-

1 Nada do que o homem faz. é meramente corporal; nada é mera mente espiritual.

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

ta da aplicacao da razüo humana, que tem seu acume e sua eficiencia pe renes.

Quem admite a distincao real de corpo e alma, nao cai no dualismo; este significaría antagonismo entre corpo e alma (o que nao é cristao). En tre dualismo e monismo, existe a dualidade, que é real distincÜo sem oposicao, como a que existe entre homem e mulher.

De resto, a Santa Sé, tendo em vista a recente tendencia a identificar corpo e alma entre si, publicou urna InstrucSo, que reafirma a devida distin

cao, Instrucao já comentada em PR 275/1984, pp. 266-273. Esta palavrado magisterio da Igreja nSo faz senSo reafirmar a constante doutrina da Tradicao crista. Merece acato da parte dos fiéis, pois o assunto nao é meramente filosófico, mas toca o próprio patrimonio da fé. Por último, notemos que, se a alma humana é espiritual, ela nao se ori gina da materia por evolucSo, mas é criada diretamente por Deus para cada novo ser humano concebido no seio materno. Além disto, é ¡mortal, ou seja, nao perece com a materia, já que o espirito nao se decompfle (na"o tem par tes componentes); a alma humana sobrevive sem corpo, desde que este, des gastado, nao possa ser mais sede da vida humana. A propósito citamos

MARCOZZI. VITTORIÓ, Le origini dell'uomo: Milano, 8?ed. 1983; PR 226/1978. pp. 423-434 (espiritualidade da alma); PR 227/1978, pp. 475-481 (imortalidade da alma); PR 95/1967, pp. 453-461 (imortalidade da alma).

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A celeuma de um filme:

"Je Vous Salue, Marte" de JeanLuc Godard

Em síntese: O filme "Je vous salue, Marie" é evidentemente atentato rio a fé crista, apesar da interpretado benigna de aiguns críticos, segundo os

quaisJ.L. Godard nao teria intencionado referirse aos personagens bíblicos María e José; as próprías declaracoes de Godard á imprensa atestam que o cineasta tinha em mira parafrasear o Evangelho. Sendo ofensiva aos valores religiosos, tal película nao deve ser exibida ao público, como nao o deve ser qualquer película ofensiva é patria ou a bandeira nacional; como nao se deve desrespeitar a mae do próximo, os fiéis católicos tém o direito de exigir que se respeite a Virgen» María, Mae de Deuse Mae dos homens (cf. Jo 19,25-27);

é de bom alvitre lembrar que os direitos de uns cessam guando comecam os legítimos direitos de outros. — Ademáis, se há público interessado em pelí culas de libertinagem sexual e pornografía, nao Ihe falta o que ver nos cine mas do mundo inteiro; nao existe necessidade de misturar religiao e porno

grafía; a religiao é algo de sagrado e inwcável para quem a professa. Daí a sabedoria da resolucao do Presidente da República do Brasil, assim como de diversas declaracoes transcritas na terceira parte deste artigo.

Aos 23/01/85 foi lampado na Franga o filme "Je vous salue, Marie"

(Eu vos saúdo. Maña ou Ave Maria) do cineasta f ranco-sufgo Jean-Luc Go dard, de origem protestante. Desde entao vem provocando celeuma nos

países da Europa e da América, pois toca profundamente em tema religioso, muito caro aos fiéis católicos. No Brasil a opiniao pública acompanhou com

vivo interesse as etapas do processo de censura ao filme, que finalmente foi

interditado pelo Presidente da República aos 04/02/86. - Procuremos co mentar as peripecias do debate e propor um juízo sereno sobre o assunto.

1. O FILME COMO TAL Eis como o Office Catholique du Cinema da Franca apresenta o filme em sua ficha técnica: "Maria, filha de um proprietárío de posto de gasolina, gosta de bas-

quetebol. José, chofer de taxi, ama Maria. Eles sao noivos e vio-se casar lo go. Um dia chega deaviSo o tío Gabriel, em companhia de urna menina. Eles se aproximan) de María, e Gabriel Ihe anuncia que ela tere urna crianca. María se espanta. Mais tarde um médico confirma que Maria está grávida. 183

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986 José, com ciúmes e persuadido de que María havia dormido com algum outro, está profundamente magoado. Aínda mais que María se recusa a en

tregarse a ele. 0 que nao é tao simples para ela, assaltada és vezes por um dese/o brutal. Como Eva, por exemplo, uma Jovem que, na vila Paraíso, se

entrega a um tcheco, que Ihe dá um curso sobre o universo e a criacao. José acaba aceitando a situacao; María dé a luz um menino (Jesús). Alguns anos depois o menino abandona José e María. O tío Gabriel também se vai, e Ma ría se prepara para levar uma vida de mulher".

Esta ficha, sobria como é, precisa de ser completada por outros dados significativos.

A personagem central Maria (Myriem Roussel) do filme se apresenta desnuda em diversas cenas e deixa a camera percorrer lentamente o seu cor-

po em close-up (fotografía tirada de perto). O noivo José (Thierry Rodé) aproxima a sua mao do ventre grávido de Maria e aos poucos a vai afastando. María incita seu filho a observar o corpo nu de Maria, o que escandali za o próprio José e o leva a intervir. A linguagem utilizada pelos personagens do filme é vulgar; por motivos bañáis juram, trocam insultos e se referem, nos termos mais crus, aos órgáos e atos sexuais.

Em longo monólogo, que parece ser uma parodia do Magníficat (Le 1, 46-55), Maria declara seu "desprezo por tudo", seu "odio a tudo"; revolta-se contra Deus em acusacoes veementes, tratando o Senhor Deus de "vampiro" e coisas ainda mais baixas.

Paralelamente ao caso de Maria, Godard apresenta o de um professor tcheco que discute com estudantes a ongem da vida; é entao que uma jovem aluna o alicia para um relacionamento sexual, vencida pela paixao, ao con trario de Maria, que resistiu aos Impetos de José; tal estudante se chama pre

cisamente "Eva", da Vila Paraíso! Estranhamente o professor explica a seus al unos que "a vida veio de longe, do espapo; todos somos extra-terrestres". Que pode significar isto na mente de Godard? Alias, o cineasta parece supor que o pecado dos primeiros pais tenha sido pecado sexual — o que é absolu

tamente falso.

O final do filme apresenta cenas da vida da nova familia: o menino dá aos seus amiguinhos os nomes de Pedro e Tiago. Os genitores o chamam para entrar no carro da familia; ele, porém, se recusa, alegando que deve ocupar se com as coisas de seu pai (cf. Le 2, 41-50). Na rúa Gabriel saúda a mae-

virgem com as palavras: "Ave Maria (Je vous salue, Marie) " Maria diz: "Nao fui eu que quis esse filho".

O filme assim concebido encontrou defensores e apologistas como também sofreu críticas severas. Exporemos algumas das tentativas de o interpretar, sem pretender esgotar o assunto.

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"JE VOUS SALUE, MARIE"

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2. IIMTERPRETAQOES FAVORÁVEIS Podemos distinguir dois tipos de atitude simpática ao filme: 1. "Je vous salue, Marie", dizem alguns, nada tem que ver com o Evangelho; refere-se ao misterio da origem da vida, que suscita a admiracao e o encanto dos homens. Os personagens María, José, Gabriel, no filme, nao devem ser identificados com os da Biblia. Segundo tal hipótese, o filme n5o constituiría afronta aos valores religiosos. Ver Herder-Korrespondenz, 6/1985, pp. 257s.

Oeve-se dizer, porém, que tal ¡nterpretacao é artificial e nao corres ponde ás intencoes de Godard. Este mesmo terá declarado, conforme a ¡m-

prensa: "é normal que o Papa nSo deseje ver a Virgem María correndo pela

casa, da forma que a retratamos. . . Eu nSo inventei nada. Está tudo na Bi blia. Quando pensei no assunto, me ocorreu que o mundo moderno é brutal e nao vejo por que nSo mostrar María em nossos días sendo tratada brutal

mente" (extraído da Folha de Sao Paulo, 13/11/85, p. 43).

Sería necessária grande dose de boa vontade para admitir que é "por acaso" que no filme todos os nomes sSo bíblicos e lembram a Sagrada Fam(lía e os Apostólos de Jesús,... que é "por acaso" que varias vezes no filme aparecem as palavras "Naquele tempo. . .", características do anuncio do

Evangelho e se fazem alusSes diretas óu indiretas aos episodios da infancia

de Jesús.

2. "Je vous salue, Marie" seria realmente um filme religioso. . . O Pe. Paul-Eugéne Charbonneau, por exemplo, que é um dos mais convictos da ■

causa, afirma que "a película é urna Grapa (com G maiúsculo), urna Graca que vem de Deus e que Godard, incumbido por Ele, nos oferece envolta em

tanta beleza" (extraído da Folha de Sao Paulo, 26/01/86, p. 94). Todavía o autor nSo explica nem justifica seu ponto de vista; trata-se de posicao emocional mais do que racional e argumentada. Alias, de modo geral, os crí

ticos que se pronunciaran! em favor da película, pouco entraram no ámago da questio mediante um raciocinio claro edidático. Oisseram seu sím ás ve zes com muitos adjetivos e pouca substancia. Sabemos que, em nossos dias, a emotividade tende a dominar o raciocinio em muitas pessoas de certa pro-

jecao, poís na*o é "simpático" dizer Nao a um filme libertino; torna-se muito mais cómodo dizer Sim, pois isto pode granjear o aplauso da grande platéia. Daí a facilidade com que algumas pessoas tomam em público a posicio mais simpática ou, ao menos, urna posicáo ambigua, que possa satisfazer a gregos e troianos.

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42

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

3. UM JUI'ZO SERENO Observaremos o seguí nte: 1. Sem querer entrar ñas intenses pessoais de Jean-Luc Godard, devese notar que a apresen tapio-de personagens bíblicos em estilo de nudez, lin-

guagem de baixo cálao, imprecacoes. . . é de todo inconveniente ou, mais propriamente, blasfema. Se Godard,emsuaconsciéncia, nSo viu nisso mal al-

gum, é indubitável que o público religioso, tomando as imagens como elas

sao (sem fazer malabarismos mentáis muito subjetivos), vé em tais figuras urna ofensa á mensagem da fé e aos seus sentimentos religiosos. So median te "restricoes mentáis" e urna acrobacia de pensamento muito dif icéis é que se pode fugir á obvia evidencia das cenas do filme. Alias, todos os cultores de arte, desde o inicio do Cristianismo até nossos días, sempre apresentaram María SS. com o máximo respeito; basta contemplar as telas e escultu

ras que a historia da arte nos legou; é a primeira vez em quase vi nte sáculos que uro produtor de arte ousa representar a SS. Virgem como faz o filme. — Admitimos que um intelectual queira transpor para o contexto histórico e geográfico do nosso Ocidente as cenas do Evangelho; mas o que nao se po de admitir é que o faca de maneira a deturpar seu conteúdo ou a insinuar o contrario do que aquelas cenas querem dizer.

2. Para o público afeicoado a filmes libertinos e pornográficos, a cine matografía tem um

mostruário muito variado.

NSo há

necessidade de

associar pornografía e religiao, pois isto implica em desrespeito a cidadüos que tém o direito de nao ver seus mais caros valores conculcados. Assim co mo ná"o se deve conspurcar a bandeira de um país estrangeiro, porque isto fere os filhos de tal nacao, assim também nao se deve ofender a religiao alheia nem a mae do próximo (María SS. é a Mae de Deus e á MSe de todos os fiéis, conforme Jo 19,25-27). Os direitos de um cídadao cessam onde comecam os direitos legítimos de outro cidadao.

Por isto eremos que muito sabiamente, cumprindo um dever nao só de fé, mas também de civismo, o Presidente da República houve por bem ve

tar a exibicá*o de "Je vous salue, Marie". Como base jurídica de sua atitude, S. Excia. valeu-se do artigo 153, § 8 da Constituicao Nacional, que reza: "NSo serlo toleradas a propaganda de guerra, de subversfo da ordem ou de

preconceitos de relígiao, de raga ou classe". Ademáis o decreto 20.493, art. 41, de 1946 "nega autorízacao para representacao, exibicao ou transmissSo radiotelefónica a obras consideradas ofensivas ás coletividades ou religióes"; ainda a Lei 5536/68 impede censura classificatória para obras consideradas ofensivas pelos mesmos motivos.

Seguem-se pronunciamentos ponderáveis de personalidades eclesiásti cas, cujos argumentos retomam e completam quanto foi dito até aqui. 186

"JE VOUS SALUE, MARIE"

43

4. DEPOIMENTOS 1.0 S. Padre Joao Paulo II pronunc¡ou-se a respeito através da palavra do seu Secretarlo de Estado, o Cardeal Agostino Casaroli, que assim se dirigiu ao Cardeal Ugo Poletti, Vigáriode S. Santidade para a diocese de Roma:

"O Sumo Pontífice se une á unánime deploracao dos fiéis da Diocese de Roma pela programacao de urna obra cinematográfica que. afrontando te mas fundamentáis da fé crista, deturpa e vilipendia seu significado espiritual e seu valor histórico e fere profundamente o sentimento religioso dos erentes e o respeito peto sagrado e pela figura da Virgem María, venerada com tanto amor filial pelos católicos e tao cara aoscristaos. Espiritualmente pre

sente ao encontró de reflexao e oracio que tem lugar na Basílica de Sao Joao de LatrSo como gesto de desagravo comunitario a Nossa Senhora. o Santo Padre invoca sua materna misericordia pela Igreja e pelo mundo e envía aos participantes da celebracao a sua propiciatoria béncao apostólica." 2. A Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil, aos 3/02/86, redigiu a seguinte Nota oficial assinada por D. Ivo Lorscheiter, bispo presidente, D.

Benedito Ulhoa Vieira, vice-presidente, e D. Luciano Mendes de Almeida, Secretario Geral: "1. Desde que surgiu o problema do filme, a CNBB em nenhum mo mento tentou qualquer negociacáb em troca da censura ao filme. Esta inju riosa vertió é absolutamente gratuita e fantasiosa.

2. A respeito da legitimidade ou nao de "censura", nota recente do presidente da CNBB já esclareceu a diferenca entre "censura política e ideo lógica", que nao se pode aceitar e que tanto mal causou no período do go-

verno militar, e "censura de ordem moral" que pode ser, quando criteriosa-

mente feita, necessária defesa do bem comum. é exatamente o caso deste filme. No clima emocional, que se estabeleceu nesse momento, já se nao es tá raciona/mente distinguindo os dois aspectos.

3. Sob o aspecto doutrinal, nao se pode honestamente aceitar que urna obra, por ser ou pretender ser artística, destrua a verdade histórica de Maria Santfssima e seja infiel a esta verdade. Afém disto, o sentimento de veneracao a Mae de Cristo, que é patrimonio do povo crlstao, merece ser respeitado pelos intelectuais. pelos críticos, pelos artistas. Nem pode a Igreja ca larse, quando sabe, pelos próprios críticos europeus que analisaram a obra de Godard, que o filme esvazia o misterio cristio. 4. Por fim, lembra esta presidencia aos católicos a palavra do Papa

Joao Pauto II, deplorando que a citada obra cinematográfica "deturpa e vi lipendia o seu significado espiritual e seu valor histórico e fere profunda

mente o sentimento religioso dos crentes e o respeito pelo sagrado e pela fi-

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

gura da Virgem María, Venerada com tanto amor filial pelos católicos e tao cara aos crístaos". Nem vale, diante da autorizada palavra do Santo Padre, com quem se sentem em comunhao todos os católicos, qualquer outra opiniao déla discordante.

É o que, por dever de consciéncia, a presidencia da CNBBjulga opor tuno dizer neste momento". 4. 0 Cardeal Francois Marty, arcebispo emérito de París, emitiu a seguinte declarafio:

"Por que aviltar as coisas da religiao em um filme barulhento e escan daloso, que explora o nudismo e a sexualidade? Tudo o que é sagrado me

rece respeito. Por que querer chocar assim a consciéncia dos fiéis?" (O Ca

tolicismo, n? 413, maio de 1985, p. 5). Possam estas ponderacoes iluminar as mentes dos leitores desejosos de

refletir sobre tío candente e serio assunto!

continuacao da pág. 48

Qual é mu Problema? por Edvino Augusto Fridertchs S.J. ColecSode Parapsicología XV. - Ed. Loyola, Sao Paulo 1985, 205 x 140mm. 162 pp.

0 Pe. Edvino é parapsicológo, que se tem dedicado a cursos, palestras,

programas radiofónicos e á redacao de obras de sua especialidade. No pre sente volume apresenta casos de psicología, psiquiatría, parapsicología e religi3o. .., casos colhidos em cartas de seus ouvintes ou leitores e, a seguir, Ihes propoe a resposta ou a explicagao devida: aparecem assim temas como a "brincadeíra do copo", batidas e socos na parede, pintura mediúnica, feitico no colchSo, cartomancia, macumba, ¡déla fíxa. . . Em poucos parágrafos, o

autor elucida com firmeza os fenómenos mais perturbadores, pelos quais se interessam muitas e muitas pessoas. O livro pode ser de grande valia para o nosso público. Apenas há urna resfríelo a fazer á obra: a p. 76 o autor pare ce negar a possessSo diabólica — o que vem a ser urna posipSo gratuita e pou-

co condizente com a mensagem dos Evangelhos: nestes Jesús aparece a ex pulsar demonios de possessos (cf. Me 2,23-27.32-34; 5,1-20...). Ora, se n5o havía possessos, Jesús fez urna pantomina, que confirmou seus contemporá neos e pósteros num erro grave - o que é aberragao, já que o Senhor veio para dar testemunho da verdade {cf. Jo 18,37). Nos demais pontos referen tes á fé, o autor se mostra fiel arauto do pensamento da S. Igreja. E. B.

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Um enigma:

Prolonsamento Artificial da Vida e Determinado Exata da Morte Esteve reunido, em Roma, nos dias 10, 19 e 21 de outubro, a convite da Pontificia Academia de Ciencias, um Grupo deTrabalho composto de cientistas do mundo inteiro, para estudar "o prolongamento artificial da vida e a determinacao exata da mor te". No último dia, os participantes foram recebidos em audien cia especial pelo Papa Joao Paulo II, que proferiu um discurso saudando os cientistas, dizendo da importancia de suas investigacoes, "dado que a vida é inegavelmente um tesouro", e lembrando que nao se pode cooperar nem consentir com a eutanasia, mas também nao se pode "impor a ninguém a obrigacao de recorrer a urna técnica que, embora já em uso, aínda nao está isenta de perigos ou é demasiado onerosa". Ao final dos estudos e debates, os cientistas emitiram urna Declaracao, nestes termos:

"Depois de ter constatado os recentes progressos das técni cas de reanimacao e dos efeitos ¡mediatos e a longo prazo dos da nos cerebrais, o Grupo de traba/ño debateu os criterios objetivos da morte e das regras de conduta diante de um estado persisten te de morte aparente. De um fado, as experiencias efetuadas revélam que a resistencia do cerebro é ausencia de circulacSo cerebral pode permitir recuperacoes consideradas ¡mpossfveis.

Doutro lado, veríficou-se que, quando a totalidade do cere bro sofreu um daño irreversivel (morte cerebral), toda a possibilidade de vida sensitiva e cognitiva é definitivamente anulada, enquanto urna breve sobrevivencia vegetativa pode ser mantida pelo prolongamento artificial da respiracao e da circulacSo. 1. Definipao de morte

Urna pessoa está mona quando sofreu a perda irreversível de toda a capacidade de integrar e de coordenar as funcoes fí sicas e mentáis do corpo. 189

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

A morte ocorre quando: a) As funcdes espontáneas cardíacas e respiratorias cessam definitivamente ou

b) Se verificou cessacao irreversivel de toda funcao cerebral. Do debate emergiu que a morte cerebral é o verdadeiro cri terio da morte, dado que a parada definitiva das funcdes cardiorespiratórías conduz rápidamente a morte cerebral. O Grupo analisou em seguida os diversos métodos clínicos e instrumentáis que permitem averiguar esta parada irreversivel das funcdes cerebrais. Para estar certo — mediante eletroencefalograma — de que o cerebro se tornou liso, isto é, nao apresenta mais atividade elétrica, é necessário que o exame seja efetuado ao me nos duas vezes no espaco de seis horas. 2. Regras de comportamento médico Por tratamento o Grupo entende todas aquetas intervencoes médicas disponiveis e apropriadas ao caso específico, qualquer que se/a a complexidade das técnicas. Se o paciente está em coma permanente, irreversivel, nao se exige tratamento, mas devem ser-lhe ministrados os cuidados, in cluíndo-se a alimentacao.

Se clínicamente ficou estabelecido que existe urna possibilidade de recuperacao, requer-se o tratamento.

Se o tratamento nao pode trazer beneficio algum ao pacien te, ele pode ser interrompido, continuando os cuidados. Por cuidados, o Grupo entende a ajuda ordinaria devida aos pacientes enfermos, bem como a compaixao e o apoio afetivo e espiritual devidos a todo o ser humano em perígo. 3. Prolongamento artificial das funcdes vegetativas

Em caso de morte cerebral, a respiracao artificial pode pro longar a funcao cardíaca por um tempo limitado. Esta sobrevi vencia induzida dos órgaos é indicada quando se prevé um pro longamento em vista de um transplante. Esta eventualidade é possível só em caso de lesao cerebral total e irreversivel ocorrida numa pessoa jovem, essecialmente depois de um trauma brutal. Tomando em consideracao os importantes progressos das técnicas cirúrgicas e dos meios para aumentar a tolerancia aos en.

190

PROLONGAMENTO DA VIDA E DETERMINADO DA MORTE 47 xertos, o Grupo considera que os transplantes de órgaos merecem o apoto da profissao médica, das legislacoes e da populacao em geral. A doacao de órgaos deve, em todas as circunstancias, respeitar as últimas vontades do doador, ou o consenso da familia, on

de querque e/a se encontré". Esta declaradlo faz eco fiel a um texto oficial da S. Congregacao para a Doutrina da Fé datada de 01/05/80, e comentado em PR 252/1980, pp. 516-525. Em símese, quer dizer que n3o há obrigacao deentreter ávida de um paciente por meios artificiáis grandemente aparatosos, quando as proba bilidades de melhora sao nulas ou quase nulas ou sao desproporcionáis em relacáb ao aparato aplicado. Estévao Bettencourt O.S.B.

livros

em estante

Epístola aos Filipenses. Comentario bíblico do Novo Testamento, por José Comblin. — Ed. Vozes, em co-edicao com Imprensa Metodista e Edito

ra Sinodal, Petrópolis 1985,65 pp. Eis um dos primeiros fascículos de um novo comentario da Biblia 70 volumes a ser redigido na ótica da Teología da Libertacáo. O mesmo Comblin expós os principios norteadores desse comentario num caderno teriormente publicado pelas mesmas Editoras: o pobre (materialmente

em

Pe. an en

tendido) seria o intérprete, por excelencia, da Biblia Sagrada, visto que esta foi redigida por pobres; em conseqüéncia, os comentadores procuram reler a B íblia a partir da praxis social do pobre e em vista de incitamento a esta mesma

praxis. Tais principios já foram comentados as pp. 153-156 deste fascículo de PR: é de notar que a Biblia tem como autor principal o Espirito Santo, de modo que só a léem adequadamente aqueles que se deixam mover peto

Espirito Santo; estes nao se podem identificar com alguma categoría social. Em particular, o comentario da epístola aos Filipenses que ora temos

em vista, é objetivo e procura expor o sentido do texto paulino segundo cri

terios aceitáveis. Transparece a mentalidade própria do Pe. Comblin quando á p. 17 identifica os judeus e os judeus-cristaos com os ricos "porque nao querem renunciar a certos bens espirituais (a Lei, as obras, os ritos como a circuncisao e os sacrificios), que Ihes dao a ¡mpressao de forca e poder, seguranca e afirmacao de si próprios". Tal posicSo é artificial; era, antes, o zelo

religioso e a fidelidade cega as tradicSes mosaicas que levava os judaizantes a impugnar a obra missionária de Sao Paulo; cf. At 21, 17-25. 191

48

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 287/1986

J. Comblin propSe a sentenca segundo a qual Fl consta de tres cartas do Apostólo aglutinadas entre si: Carta A (a mais antiga): 4,10-20; carta B

(posterior): Fl 1,1-3,1a. e4,2-7.21-23;carta C {a última): Fl 3,1b-4,1e 4,8-9.

Tal hipótese nao deixa de ter seu fundamento no texto, mas fica sendo con

jetura.

Biblia. Palavra de Deus. Curso de Introdupáo á Sagrada Escritura, por Valerio Mannucci. Tradupao de Jo3o Luiz Gaio. ApresentacSo de Luis Alon so Schokel S.J. ColepSo "Bibliotecade Estudos Bíblicos" n?15. - Ed. Pauli nas, Sao Paulo 1986, 145 x 210 mm, 421 pp.

Obra de erudito professor de S. Escritura no Seminario Maiorde Fiorenpa, tal livro apresenta os quatro tratados clássicos que constituem a Introdupao Geral á S. Escritura: InspiracSo, Canon, Historia do Texto e Herme néutica. Todavía insere estes estudos no contexto ampio da Revelacao Divi na e da sua Transmissao, seguindo assim a orientacSo deixada pela Constitui-

cao Dei Verbum do Concilio do Vaticano II. Trata-se de obra rica em informacoes e consideracoes de ordem filosófica (veja-se quanto é dito sobre a

Palavra como tal as pp. 15-23), teológica e histórica. Expoe claramente o

que a fé católica ensina a propósito de cada tema, mas nao deixa de apontar para questdes laterais abertas ou discutidas; faz também freqüentes referen cias ás posicSes protestantes - o que habilita o estudioso ao diálogo ecumé nico. Especialmente importantes sao os capítulos 17 e 18 do livro, que tratam da Hermenéutica ou da arte de interpretar a S. Escritura; este setor tem

sido muito disputado nos últimos decenios; os estudiosos tém recorrido largamente á filosofía da linguagem e ao exístencialismo, especialmente en tre os protestantes (Bultmann, Fuchs, Ebeling, Pannenberg, Moltmann...),

cujas posicoes Mannucci expoe com fidelidade; presta assim grande servico ao estudioso brasileiro, resumindo o conteúdo de obras densas edifi'ceisde

autores alemáes, que mu¡ta influencia tém exercido até sobre teólogos lati no-americanos; por último, Mannucci apresenta com muita clareza as nor mas hermenéuticas católicas formuladas na Constituicao Dei Verbum n? 12. A obra assim redigida atende simultáneamente á erudicSó e á piedade, como é de se desejar quando se estuda a S. Escritura. Recomendase viva mente esse valioso instrumento de trabalho, que os Seminarios e as Escolas de Fé poderao utilizar com grande proveito. continua na pág. 44

192

EDIQOES "LUMEN CHRISTI"

Rúa Dom Gerardo. 40 — 5? andar — Sala 501 Caixa Postal 2666 — Tel.: (021) 291-7122 20001 - Rio de Janeiro - RJ LIVROS DIVERSOS:

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Código de Derecho Canónico, a cargo de Pedro Lombardia y Juan Igna

cio Arrieta, Universidad de Navarra y Salamanca. Ed. bilingüe anotada, com índice analítico - 1230 págs, encadernado " CzS 505,00.

2.

Nuevo Derecho Canónico (Manual universitario), por Catedráticos de Direito Canónico da Univ. de Salamanca - 626 págs., ene. CzS 420,00

3.

A Fé em crise? (Relatório sobre a Fé), Cardeal Ratzinger, Prefeito da Sa grada Congregarlo para a Doutrina da Fé. Sua famosa e longa entrevis ta ao escritor e Jornalista Vittorio Messori - 154 págs., CzS 53,00

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San Pablo, heraldo de Cristo, Josef Holzner, índice analítico com mapa

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