Ano Xxvii - No. 290 - Julho De 1986

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Projeto PERGUNTE E

RESPONDEREMOS ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de

Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoriam)

APRESENTAQÁO

DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos estar preparados para dar a razáo da nossa esperanza a todo aquele que no-la

pedir (1 Pedro 3,15). Esta

necessidade

de

darmos

conta da nossa esperanga e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora,

visto

que

numerosas

somos

bombardeados

correntes

por

filosóficas

e

religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa

crenga

católica

mediante

um

aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e

Responderemos propóe aos seus leitores: aborda questóes da atualidade controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortaleca no Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar este trabalho assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e

Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral assim demonstrados.

SUMARIO

<

Teología da Reconciliado O Neocatecumenato

"A Memoria do Povo Cristao" O Fenómeno das Seitas E o Caso do Padre Falcao?

C/J

2 UJ _i

(O

O ce a

ANO

XXVII

JULHO

1986

29O

v

PERGUNTEE RESPONDEREMOS

JULHO - 1986

Publicado mensal

N9 290

Diretor-Retponiável:

SUMARIO

Estévao Bettencourt OSB Autor e Redator de toda a materia publicada neste periódico Diretor-Ad mi niit rador

D. Hildebrando P. Manins OSB Administracao e distribuicao: Edicoes Lumen Christi Dom Gerardo. 10 5? andar, S/501 Tel.?(021) 291-7122 Caixa postal 2666 20001 - Rio de Janeiro - RJ

O FELIZ INCÓMODO DA FÉ

,

Urna mensagem e um Movimento:

TEOLOGÍA DA RECONCILIACÁO

3

Na Igreja Contemporánea:

O NEOCATECUMENATO

12

A Igreja dos tres primeiros sáculos:

"A MEMORIA DO POVO CRISTÁO" por E. Hoornaert

23

Desafio pastoral:

O FENÓMENO DAS SEITAS

35

Noticias de fonte limpa:

Composicáb e Impressáo: "Marques Saraiva" Santos Rodrigues. 240

E O CASO DO PADRE FALCAO?

46

LIVROS EM ESTANTE

47

Rio de Janeiro

Assinatura de 1986: Número avulso Para

Cz$ 100,00 Cz$ 11,00

NO PRÓXIMO NUMERO

pagamento da assinatura de

1986, queira depositar a importan cia no Banco do Brasil para crédito na Conta Correntc n? 0031 304 1 em nome do Mosteiro de Sao Bento do Rio de Janeiro, pagável na Agen

cia da Praca Mauá (n? 0435) ou en viar VALE POSTAL pagável na Agencia Central Rio de Janeiro.

dos Correios do

291 - Agosto - 1986

"Escatologia Crista". — Católico e Mapom? — "La Religio'n en la URSS". - O Direito ao Foro Intimo. — Comentario de Carta Aberta ao Cardeal Ratzinger.

COM APROVAgAO ECLESIÁSTICA

RENOVÉ QUANTO ANTES

COMUNIQUE-NOS QUALQUER

A SUA ASSINATURA

MUDANCA DE ENDERECO

BlbLIOTECA

0 feliz incomodo da fé Em livro de ficcao religiosa, Gustave Thibon imagina um mundo em que a ciencia tenha libertado o homem de todas as causas de angustia — doenpas, velhice e morte — e Ihe proporcio ne todas as comodidades possíveis, como as viagens intersiderais. Todos na térra tém aparéncia jovem, bela, ¡mortal; sao como deuses. . . A ciencia tudo explica; nao fica mais nenhum misterio. A primeira geracao que usufrui deste "paraíso", julga que a crenca em Deus era um tapa-buraco ou um paliativo de que precisavam as geracoes anteriores, sufocadas por muitas miserias. Neste contexto aparecem tres jovens a dialogar: Amanda, seu noivo Helios e urna amiga Estela. Amanda parece estar fora do seu quadro próprio: é saudosista, talvez por erro de programagao genética, e exclama:

"Sim, nada mais a criar! A grande obra está terminada. Tu do foi produzido, tudo perfeito. Mas por que. . . por que estou triste?" Replica Estela: "Triste? Quando todos os cu mes estao aos

nossos pés?"

Amanda: "Gostaría de que houvesse um pico ácima de mi-

nha cabeca... Um pico acessível,... mas que tivéssemos de esca lar".

Estela: "Escalar cofri o auxilio de um Deus, como amiga mente?! Vocé está sonhando, querida..." 0 diálogo prossegue, e finalmente Amanda concluí:

"Renuncio á imortalidade que a ciencia me dá, para ficar com a eternidade que espero. Considerando a vida neste mundo que suporto e recuso, escolho a morte". Este texto, profundo como é, nos faz pensar.

é incómoda a situacao do homem nesta vida, pois ele se vé constantemente obligado a lutar, a procurar conquistar; é situa cao de carencia e sofreguidao. Assim acuada, a criatura tende a sonhar com o dia em que a ciencia emancipará o homem de tudo o que Ihe causa preocupacoes e satisfará a todos os seus anseios ter restres. Entao nao haverá mais nada a procurar e a conquistar. — Ora Amanda representa o protesto espontáneo que tal situacao "gostosa" paradoxalmente sugere: urna vida sem lutas e sem con289

•PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

quistas, urna vida em que tudo esteja pronto e acabado, nao tem graca; é insípida e fastidosa. Pensemos no seguinte: se o Brasil fosse declarado campeao mundial de futebol para sempre, estaría terminada a festa das disputase dos campeonatos; seria preciso in ventar outro tipo de campeonato, pois é só assim que o homem se

descobre, exerce sua criatividade e desdobra suas virtualidades. Isto quer dizer que. o ser humano é essencialmente demanda, anseio, aspiracao... Ele procura algo que nao é ele... As vezes os bens materiais parecem ser a resposta para tal sofreguidao; ele Ihes vai, com grande sede, ao encalco; agarra-os, mas vé que sao como bolhas de sabao, que estouram e nada deixam ñas maos de quem as segura.

Na verdade, o homem foi feito para o Infinito, e só no Infi nito repousa (S. Agostinho). A demanda — e a demanda do Infi

nito — é essencial e congénita no ser humano. Tal situacao pode parecer desagradável, pois é caminhada para "aquilo que o olho nao viu, o ouvido nao ouviu e o coracao do homem jamáis percebeu" (1Cor 2,9). Implica que nos supere mos constantemente, que nao paremos, que nao nos estabilize-

mos na estrada... Mas, pensando bem, verificamos que tal condicao nao é tao incómoda: o Deus da eternidade é o Deus do tempo; Aquele que um dia veremos face-a-face, já o vemos na penum

bra da fé; o Absoluto, portanto, nao nos é estranho. Podemos, sim, té-lo na conta de estranho, se nao convivermos com Ele, por que demasiado voltados para bolhas de sabáo; entao dele fazemos urna simples fórmula ou um nome pouco significativo em nossa realidade concreta. Mas, se nos habituamos a entreter-nos com Ele num coloquio de fé e amor, se fazemos dele o grande Tu ou o Referencial da nossa vida, Ele se torna familiar e íntimo. Assim desaparece a sensacao de incómodo que nossa condicáo de pere

grinos pode suscitar, e se torna compreensfvel a palavra de Santa

Teresa de Avila: "A vida é urna noite mal passada num albergue inóspito, um sonho que, bom ou mau, raramente se prolonga".

Senhor, já é tempo de nos vermos!"

Assim também entenderemos que é ilusoria a imagem de

urna felicidade a ser obtida exclusivamente pelo progresso da

ciencia é pelo atendimento de nossas necessidades materiais. Fo-

mos feitos para muito mais do que isto. Criados para o Absoluto,

aceitemos a grapa ¡mensa, embora paradoxal, de sérmos peregri nos. . . do Absoluto, para os quais a morte nao é ruptura, mas é

Páscoa.ou transicao para a plenitude da verdadeira vida! 290

e D

C.D.

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" ANO XXVII - n? 290 - Julho de 1986

Urna Mensagem e um Movi mentó:

A Teolosia da Reconciliado Em tíntese: Vai tomando vulto na América Latina, a partir do Perú,

urna córtente de pensamento centrada na teología da Reconciliacao. O tema

da Reconciliacao foi enfáticamente apregoado pelo S. Padre Joao Paulo II

quando esteve em Puebla no ano de 1979; desde entao tal conceito vem sen do mais e mais estudado com vistas a situacao agitada que vive o continente latino-americano. O interesse pela temática da ReconciliacSo se prende tam-

bém ao apelo de "Nova Evangelizado" lancado por Joao Paulo II quando abríu em SSo Domingos o novenario de preparacao para a celebracao dos quatrocentos anos de descoberta e evangelizado da América (12/10/1992). A fim de aprofundara Teología da Reconciliacao, fase realizaram dois Congressos Internacionais no Perú, em 1985 e 1986 respectivamente. As pá ginas que se seguem. apresentam breve relatórío dos pronunciamentos ocorridos no segundo céname. (16-19/01/1986}, do qual participaran] tres Cardebáis, diversos Arcebispos e Bíspos e centenas de clérigos. Religiosas e leigos: as conclusdes dos estudos realizados levaram a ver que, de um fadot é ilícito cruzar os bracos diante da situacao social das popufacoes latino-americanas e, de outro lado, a revólucao violenta tende a submeter tais populacBes a to talitarismos, que, em vez de libertar, reduzem a novas formas de escravidSo.

Foi no Perú que Gustavo Gutiérrez, o pa¡ da Teología da Li-

bertacao extremada, deu inicio a esta corrente de pensamento. é também no Perú que vai tomando vulto nos últimos anos a Teo logía da Reconciliacao, concebida como resposta auténticamente evangélica aos problemas do continente latino-americano. A ins-

piracao fundamental desta procede de Puebla, onde o S. Padre lancou a temática em 1979'; o assunto foi retomado por Bispos, teólogos e leigos do continente latino-americano, a tal ponto que

em Janeiro de 1985 se realizou o I Congresso Internacional de 291

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/19K6 Teología da Reconciliacao, reunindo em Ayacucho, sob o patro

cinio de Mons. Fernando Vargas Ruiz de Somancio, Arcebispo de Arequipa (Perú), algumas centenas de participantes de varios paí ses.

O amadurecimento das idéias ocasionou o segundo certame dito "Congresso Internacional sobre Reconciliacao e Nova Evan gelizacao segundo o Pensamento de Joao Paulo M". Ocorreu de 16 a 19 de Janeiro de 1986 em El Callao, perto de Lima (Perú). Reuniu tres Cardeais: Mons. Landázuri Ricketts, de Lima; Mons. Alfonso López Trujillo, de Medellín (Colombia) e Mons. Bernard

F. Law, de Bostón (U.S.A.), diversos Arcebispos e Bispos, entre os quais D. Lucas Moreira Neves, brasileiro. Secretario da Congre-

gacao para os Bispos (Roma) e centenas de congressistas da Amé rica do Sul, do Centro e do Norte.

Na verdade, o Congresso versou sobre dois temas principáis:

Das dimensÓes da Teología da Reconciliacao aplicada ao

nosso continente, muito sacudido por tensoes. Sao palavras de

Joao Paulo II: "A Igreja considera como missao específica sua a reconciliacao de todos os individuos e de todos os povos";

2) a Nova Evangelizacao da América Latina, preconizada por Joao Paulo II, quando em Sao Domingos abriu a novena de preparacao para o quarto centenario da descoberta e da evangeliza-

cao da América (12/10/1992). Esta Nova Evangelizacao deve fa-

zer frente a desafios que os primordios do Evangelho ignoraram na América: o secularismo, as injusticas sociais, o contra-testemunho de cristaos. ..

O Congresso constou de seis densas conferencias e de dezoito Seminarios de fabalho, que versaram sobre temas especiáis, como se depreende da lista abaixo: a) Mons. Darlo Castrillón Hoyos, Secretario Geral do CELAM: "As ce lebrado da Evangelizacao na América Latina".

b) Mons. John Hass, Professor no Seminario Pontificio Josephinum (U.S.A.): "A Evangelizacao na América do Norte"; 292

TEOLOGÍA DA RECONCILIACAO c) Sr. Hervé Marie Catia, do Comité Internacional da Renovacao Ca-

rismática Católica: "Reconciliacao no Espirito";

d) Mons. Osear Alzamora, Bispo de Tacna (Perú): "Perspectivas de

urna Teología da Reconciliacao";

e) Mons. Pe. Teodoro Jiménez Urresti, Professor da Universidade de Salamanca (Espanha): "A Espanha e o 4?Centenario da Evangelizacao";

f) Mons. Gregorio Rosa Chavez, Bispo Auxiliar de San Salvador: "Ur

gencia de urna Reconciliacao na América Central";

g) Mons. Alberto Brazzino, Bispo Auxiliar de Lima (Perú), "O Servico

Ministerial",

h) Sr. Germán Ooig, Instituto "Vida e Espiritualidade" (Perú): "Os

cristaos consagrados: servidores da reconciliacao";

i) Mons. Sean O'Malley, Bispo das linas Virgens (U.S.A.): "Missao da Juventude hoje",

j) Mons. Alfredo Noriega, Bispo .Auxiliar de Lima (Perú): "Missao da

Familia Crista no Mundo Contemporáneo";

k) Pe. Lorenzo Albacete, do Arcebispado de Bostón (U.S.A.): "O

compromisso do teólogo",

I) Sr. Virgilio

Levaggi,

da

(Perú): "Os movimentos eclesiais";

Associacáo Promotora do Apostolado

m) Pe. Cipriano Calderón, responsável pela edicao de L'Osservatore

Romano em espanhol: "Importancia dos Meios de Comunicacao Social";

n) Sta. Lila Blanca Archideo, CIAFIC (Argentina): "Educacáo para a

Reconciliacio e o Progresso",

o) Sr. Federico Müggenburg, do Conselho Coordenador das Empresas

(Me'xico): "Empregados e Empregadores reconciliados na Empresa";

p) Sr. Augusto Blacker, da Revista "Efficacia" (Perú): "Economía, Financas e Solidariedade Internacional";

q) Pe. Claudio Solano, da Escola Social Joao XXIII (Costa Rica): "Evangelizacao e Solidariedade dos Trabajadores"; 293

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986 r) Sr. Pedro Morandé, Professor na Pontificia Universidade Católica do Chile: "Religiosidade popular e Espirito solidario na cultura latino-ame ricana".

A seguir, proporemos o conteúdo de algumas das principáis

conferencias do notável Congresso.

1. Em continuidade com o passado, o futuro...

Mons. Ricardo Durand Flores O Arcebispo-bispo de Callao, Mons. Ricardo Durand Flores, foi o primeiro conferencista do certame. Iniciou sua exposicao com urna referencia á dignidade humana, que só encontra seu verdadeiro sentido em Cristo e na obra de reconciliacao realizada por Ele. Para se alcancar esta reconciliacao, tanto a nivel indivi dual como a nfvel social, no ambiente civil e dentro da Igreja, requer-se urna atitude de humildade, que leva á conversao do cora-

cao. Esta implica renovacao; todavia a renovacao jamáis poderá significar urna mudanca do depósito da fé ou da Revelacao. A Teología da Reconciliacao nao tenciona construir "nova Igreja" nem modificar a missao confiada por Jesús Cristo aos Apostólos e á Igreja Universal.

Em Puebla, sob o impulso de Joao Paulo Mea despeito de pressoes exercidas em contrario, a Igreja tomou distancia em re lacao as ideologías tanto de inspiracao marxista quanto de "Segu-

ranca Nacional". As primeiras (tenha-se em vista a Nicaragua) sufocam a liberdade do homem; as outras (veja-se o regime chileno) ofendem sua dignidade, impondo-lhe um sistema que os cidadaos rejeitam.

A confusao provém do fato de que cada urna dessas ideolo gías pretende encarnar de maneiras diversas a "civilizacao crista". Todavia quem pode sustentar que o Evangelho leve a algum siste ma político determinado? Ao contrario, toda auténtica reconciliacao deve apoiar-se sobre humildade, profundo respeito pela S. Escritura, grande sinceridade e ardente amor á verdade. A genuína Nova Evangelizacao preconizada por Joao Paulo II deve pro mover essa reconciliapao. Em Sao Domingos, o S. Padre exprimiu votos de que haja "novo esforco criador", urna "evangelizacao re294

teología da reconciliado

novada", mais dentro dos parámetros da fidelidade á Igreja e aos textos do Magisterio.

A Nova Evangelizado deve ocorrer sem perder de vista a

opcao (ou o amor) preferencial pelos pobres, que nao é nem ex

clusiva nem excludente. Segundo a doutrina da igreja, nao é lícito

identificar o mundo dos pobres e urna classe social em luta. O

combate pela justica em favor dos pobres há de ser travado sem que os pobres corram o risco de tornar-se escravos de um sistema que os prive da sua liberdade e que os submeta ao ateísmo siste mático; também se deve evitar que tal combate leve a um mate rialismo prático, apto a despojar os pobres da sua riqueza interior e do seu ■ senso de transcendencia.

A primeira libertacao que devemos propiciar a todo homem, é a do pecado, a do mal moral, que está em seu coracao e que dá

origem ao "pecado social" e ás estruturás opressoras. Assim entendida, a libertacao social faz parte integrante da libertacao simplesmente dita. Todavía nenhum partido político, nem sistema político-económico algum pode pretender apropriar a si o dinamismo do Evangelho e, menos aínda, a Palavra de Deus tal como a Biblia no-la entregou. Será gracas a urna tal libertacao que a reconciliacao poderá ocorrer e levar á paz.

2. Urna Evangelizado Reconciliadora Pe. Julio Terán Dutari S.J.

O Reitor da Pontificia Universidade Católica do Equador, o Pe. Julio Terán Dutari S.J., dissertou sobre "As Dimensoes de urna Evangelizacao Reconciliadora: Salvacao, Libertacao e Promocao Humana". Estes tres aspectos estío, de resto, intimamente ligados entre si. O Pe. Terán mostrou que, se a missao de Cristo nao era nem económica nem política nem social, nao obstante o Evangelho comporta em si urna forca capaz de transformar a comunidade dos homens.

Foi isto que a Conferencia do CELAM em Medellín (1968) quis exprimir. Mas a recusa de cumplicidade com situacoes de in295

8

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

justica nao significa, como abusivamente foi dito, que a Igreja identifique libertacao e revolucao.

A libertacao crista apoia-se sobre os valores bíblicos. Abre perspectivas que englobam o homem todo e todo homem. A Igre

ja liga, mas nao confunde, associa, mas nao identifica a salvacao do homem e a promocao humana. O que Joao Paulo 11 denunciou em Puebla, foi a reducao da salvacao evangélica á promocao humana. A mudanca de estruturas é apenas um dos elementos da transformapáo total que o Evangelho preconiza.

Medellín e Puebla vém a ser "aberturas" aos problemas sociais, mas Puebla insistiu principalmente na necessidade da conversao dos coracoes.

A auténtica libertacao deve integrar também a "encarnacao da misericordia". Isto significa que ela nao pode pactuar nem

com o materialismo de um "capitalismo selvagem" nem com a luta de classes. Da mesma forma, o amor da Igreja pelos pobres nao

se pode reduzir aos aspectos políticos e sociais, mas deve tender ¡mpreterivelmente a levar-lhes os bens definitivos e transcenden-

tais.

3. Os Bispos e a Reconciliacao D. Lucas Moreira Neves

0 Secretario da S. Congregacao para os Bispos abordou o

papel dos Bispos na Nova Evangelizapao. Em primeiro lugar, enfa-

tizou que falar de "Nova Evangelizacao" significa que se admite

urna evangelizapao anterior, evangelizapao que deve ser aceita e

assumida sem ser julgada a partir de criterios de nossos dias. Trata-se nao propriamente de por em relevo as inevitáveis limitacoes do passado, mas de construir projetos novos de evangelizacao a partir das exigencias do presente.

Evangelizar hoje nao significa contentarmo-nos com passar

verniz sobre estruturas antigás, mas trabalharmos na transformacao do homem de hoje, suscitando aspiracoes, correntes de pensamento e mentalidade novas. Implica agir sobre as culturas comu

nicando-Inés um sopro vital. Significa ainda entrar em diálogo 296

teología da reconciliado com a cultura moderna, valorizar seus melhores aspectos, corrigir o que é mediocre, recusar o que é inaceitável.

Outro aspecto enfatizado por D. Lucas Neves: a evangelizacao na América Latina nao pode ser urna copia do que ocorre (ou

ocorreu) na Europa de maneira mais ou menos bem sucedida. É preciso inventar urna dinámica evangelizadora para a América La tina.

Todavía o que importa ácima de tudo, é a fé. O Bispo nao é somente homem de fé. Deve ser também um defensor da fé, que saiba nao apenas transmiti-la, mas também como a fazercrescer; seja um confessor da fé, que, por certo, há de respeitar o mundo tal como é, mas nao se sentirá intimidado ou complexado diante deste.

Nao sem certo humor, D. Lucas evocou a questao do plura

lismo, táo apregoado por aqueles que procuram um pretexto para se calar quando deve Mam falar: "A Igreja, disse, nao quer impor-

se a ninguém, mas, em nome do pluralismo, Ela reivindica o direito de proclamar a Palavra de Deus, da qual Ela é depositaría". Ela eré que essa Palavra é profética e é capaz de iluminar o momento presente. Trata-se menos de denunciar do que de anunciar.

4. A irrupcao de ideologias Card. Alfonso López Trujillo

O Cardeal Trujillo teve por tema "A Beconciliacao na Verdade e no Amor: do confuto á paz". Apornfundou o sentido dos dois termos: Verdade e Amor. A opcao pela Verdade excluí todos os relativismos; trata-se da

Verdade de Cristo ou de Cristo-Verdade. A exigencia de fidelidade á Revelacao, manifestada na Escritura e na Tradicao, e ao seu intérprete legítimo, o Magisterio da Igreja, é de especial necessidade nestes tempos de confusao e conflitos. A fidelidade á Verda de leva-nos a acautelar-nos contra duas armadilhas: 1) a irrupcao, dentro da Igreja, de ideologias que trazem consigo a divisao, como o vento traz a tempestade; essas ideologias sSo portadoras 297

]Q

•'PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

de conflitos internos e externos. Por conseguinte, um certo realis mo exige que se restabeleca primeramente a paz entre os cristaos, reunindo todos em torno daqueles que tém o encargo da unidade: o Papa e os Bispos. 2) A segunda armadilha é a da con-

fusao das línguas: marxistase nao marxistas pronunciám freqüentemente as mesmas palavras (paz, libertacao, Igreja dos pobres...}, mas esses vocábulos nao recobrem sempre as mesmas realidades.

Para uns, a paz é a "tranqüilidade da ordem" (S. Agostinho, S.

Tomás); para outros, é "a lei do mais forte", ou seja, daquele que tiver conseguido impor suas idéias, mesmo pela forca, sem levar em conta a vontade do povo (vejase o caso de El Salvador).

Quanto ao amor, o cristao deve participar do amor de Deus para com os homens, manifestado em Cristo Jesús. A opcao pelo

amor implica a recusa de todos os sistemas que se apresentam em

termos conflitivos. Aludindo as palavras de Hobbes "o homem é

lobo para o homem" e as de Sartre "o inferno sao os outros", o Cardeal Trujillo observou como o marxismo é urna ideología de confuto, que propoe a violencia e o odio como meios de salvacao. Ora os sistemas assinalados pelo espirito de confuto estao em ra dical oposicao á Revelacao crista; por isto nao é lícito interpretar a mensagem do Evangelho em chave de confuto.

O caminho da Reconciliacao nasce precisamente da Revelagao do misterio do amor de Deus em Cristo. Trata-se de urna afir mativa que, rejeitando a opcao pelo confuto "sacralizado" ou

"santificado", leva á paz mediante o amor. Isto nao significa que

fuja da realidade, mas implica realismo oriundo de um reconheci-

mento da verdade sobre o homem, sobre Jesús Cristo e sobre a Igreja.

O conferencista encerrou sua exposicao detendo-se sobre o sentido da paz crista: esta é centrada na verdade e no amor e distingue-se claramente do irenismo (ou da paz irreal, amorfa, que

pactua com qualquer proposta),. . . irenismo que carece da soli dez da paz verdadeira, pois nao se norteia por def inicoes. 5. Fecho do Congresso

Cardeal Landázuri-Ricketts

O Cardeal-arcebispo de Lima, Mons. Landázuri-Ricketts, to-

mou a palavra no encerramento do Congresso. Após enfatizar o 298

teología da reconciliado

valor das teses apresentadas, observou: "Este Congresso de Callao, estou certo, contribuirá poderosamente para que as duas pilastras

básicas da Igreja - Reconciliacao e Evangelizapao - se reavivem

nao só no Perú, mas também em outros países. Urna Reconciliacao baseada na justica, no respeito á pessoa humana e ao direito dos demais homens. Reconciliacao com Deus e com os irmaos a

fim de sustentar urna Nova Evangelizapao. Se a conseguirmos,

creremos, com a graca do Senhor, ter cumprido a nossa missao".

Comenta o Pe. Jaime Baertl Gómez, Secretario Geral do Congresso, ao terminar breve relatório do mesmo:

"Após teranalisado a situacao da nossa América Latina e a si

tuacao do mundo em que vivemos, um mundo e urna sociedade sulcados pela ruptura, a desuniao social, a violencia, a in/'ustica, a desconfianza de uns em re/acao aos outros, mundo que gera ho

mens e mufheres fechados em seu próprio egoísmo por falta de

Amor, nao nos é lícito assumir a atitude da indiferenca ou de quem nao quer ver, de quem nao quer exercer seu papel na histo

ria e na Igreja, de quem nao deseja ser guardiao do seu irmao,

porque isto incomoda. Também nao é lícito aceitar a atitude daqueles que julgam ser a violencia a única via fácil e eficaz para urna transformado importante.

A reta posicao, a atitude certa há de ser a de María, Mae da Fé, Pedagoga do Evangelho, que, acolhendo o Plano de Deus,

acreditou no poder de conversao da Boa-Nova e permitiu que o

Senhor nela fizesse maravilhas. Devemos ter fé, crer na forca do Cristo, que pode converter e transformar" fVida y; Espirituali dad, n?3. Enero-abril 1986, p. 119).

Outros Encontros do tipo do que foi apresentado, estío sen do preparados, a fim de se dar vulto e eficacia á Nova Evangeliza-

cao reconciliadora tao apregoada pelo Santo Padre Joao Paulo II.

299

Na Igreja Contemporánea:

0 Neocatecumenato Em síntese: O Neocatecumenato é urna instituido que proporciona aos fiéis católicos ¡á batizados a ocasiao de se aprofundarem na fé, percor-

rendo sucessivas etapas de reflexao e de prúticas cristas. O nome tembra o catecumenato que a Igreja antiga aplicava aos pagaos desejosos de receber os sacramentos da iniríacao crista"; a caminhada tinfia em vista tornar cons

cientes e coerentes os futuros cristSos. O Neocatecumenato propoe dez anos de percurso em seis etapas, que visam a ministrar sólida formacao espiritual aos seus seguidores; nao termina com o Batismo, pois este jé foi ministrado

(na infancia?) aos neocatecúmenos, mas encerrase com a solerte renovacao das promessas do Batismo. 0 tripe de tal formacSo consta da Palavra de Deus, da Liturgia (especialmente da Eucaristía) e da Comunidade-comunhao (Igreja), a Cruz de Cristo gloriosa também é muito estimada pelos ca tecúmenos. Tal instituicao nada tem que ver com as comunidades edesiais de base; deve caracterizarse por plena fidelidade ao magisterio da Igreja e ás instituicoes da hierarquia local (Bispo, Pároco). Os Papas Paulo VI e Joio

Paulo II tém dado sua aprovacao a tal Caminho. que comecounos arredores de Madrid em 1964 por obra do jovem Kiko Arguello, convertido do ateís mo á fé crista; Kiko sentía a necessidade real de oferecer ao mundo descris tianizado e aos fiéis católicos afastados a ocasiao de urna tomada de consciencia mais profunda do que seja a vocacio crista.

Varias iniciativas tém surgido na Igreja contemporánea a f im de promover a conversao dos pecadores e afervorar a vida crista.

Entre outras, está o chamado "Neocatecumenato" ou o "Cami nho Neocatecumenal", existente no Brasil a ponto de suscitar o interesse do público cristao. Em vista disto, passamos a expor o que seja tal forma de vida crista.

1. Neocatecumenato: origem A rigor, a palavra "Catecumenato" indica o período de pre parado dos adultos para o Batismo, período que na Igreja dos 300

NEOCATECUMENATO

13

primeiros séculos era observado rigorosamente com instrucao (catequese), jejum, exame das intencoes do candidato (scrutinium)... Os antigos procuravam assim fazer que o Batismo fosse recebido conscientemente e dispusesse o neófito a serio e coerente teste-

munho de vida crista. O catecumenato prolongado e solene caiu em desuso quando comecou a preponderar o número de batiza-

dos de enancas na Igreja. Últimamente, porém, o Concilio do Va ticano II (1962-1965) apregoou a restauracao do catecumenato na sua Constituido sobre a S. Liturgia:

"Restaure-se o catecumenato dos adultos dividido em diversas etapasde acordó com o parecer do Ordinario do lugar. Desta maneira o tempo do catecumenato, estabelecido para a conveniente instrucao, poderá ser santifi cado com os sagrados ritos a serem celebrados em terrinos sucessivos" (n? 64).

Independentemente de tal instituicao, já em vigor para pre-

parar-se o Batismo de adultos, nasceu em 1964 um Movimento

destinado a pessoas já batizadas que procuram aprofundar a sua fé e a sua vida crista, e que tomou o nome de Neocatecumenato. A origem deste ocorreu entre os favelados de Palomeras Al

tas nos arredores de Madrid (Espanha) em 1964 por obra de um joyem espanhol chamado Kiko Arguello e de seus companheiros leigos.

Kiko era ele mesmo um convertido do ateísmo, que descobrira o Senhor Jesús, como ele dizia: "Taívez tivésseis outra imagem a respeito de Kiko... Eis, porém, que encontrastes um pobre homem — o que possivelmente vos causou profunda

decepgao. Desculpai-me. Nao soueu que vos convoque!, mas foi a Palavra de

Deus, foi aquilo que Deus realizou na vossa comunidade. Quem sou eu? Sou alguém que se sentiu chamado por Cristo, embora desgranado e infeliz. Os outros me amavam, na medida em que eu tinha valores ou caso eu estudasse,

fosse útil, caso desse e devolvesse... Ao contrarío, senti-me amado por Cris to gratuitamente, embora pecador e infiel..." (palavras proferidas por Kiko no Encontró Neocatecumenal de 10 a 13/01/1977 em Roma}.

0 testemunho de vida de Kiko e de seus companheiros lei gos entre os pobres da periferia de Madrid tornou-se fermento na massa; levou aquela gente simples a pedir ao grupo que cermparti-

Ihava a sua indigencia, urna catequese baseada na leitura da Bi blia. Kiko aceitou a missao; a principio encontrou dificuldades 301

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

para se adaptar ao ni'vel de pouca cultura de seus ouvintes, mas a perseveranca permitiu que aos poucos fosse elaborando urna síntese catequética lúcida e convincente, que deu origem a urna au

téntica comunidade de fiéis. Assim teve surto o que se chamaría

depois "o Caminho Neocatecumenal". Associou-se a Kiko, entre outras pessoas, urna jovem, Carmen Hernández, diplomada em

Física e em Teología. Esta, depois de ter trabalhado durante al-

gum tempo em Nazaré, procurava comprometer-se com o Evange-

Iho; encontrou o que procurava, agregando-se a Kiko e seus companheiros; a palavra inflamada desses arautos parecía reproduzir

as maravílhas de Pentecostés em Palomeras Altas. Diría Kiko:

"Com grande surpresa, fomos testemunhas de urna Palavra, que, fa-

zendo-se carne em gente tao pobre, mas tao acolhedora, dava origem a urna

comunidade de oracao, a urna Liturgia surpreendente tal como era a respos-

ta de tantos irmaos, que, cheios de pecados, bendiziam ao Senhor. que se recordara deles. Assim num período de tres anos vimos aparecer aos nossos olhos um caminho degestacao da fé, urna especie de catecumenato, que rea-

lizava aos poucos a Igreja, criava urna comunhao fraterna, dava lugar ao

amor numa dimensio que maravilhava todos, porque era a da morte em fa

vor do inimigo ou era a dimensSo da Cruz" (Le comunitá neocatecumenali em Rivista di Spiritualitá 2 1975p. 193). '

A vida da pequeña comunidade oriunda no meio daquela gente pobre, em clima de simplicidade e sincero amor fraterno, tornou-se em breve um sinal que chamou á fé muitas pessoas in crédulas ou, se batizadas, pessoas afastadas da vida sacramental.

Em conseqüéncia, alguns vigários, como o de S. Frontis em Za

mora e o de Cristo Reí em Madrid, impressíonados pela experien cia realizada em Palomeras Altas, pediram a Kiko e seus compa-

nheiros que a fossem repetir na sua paróquia. Após atender a tais

convites, observava o jovem líder: "Ficamos surpresos por ver

como naquelas paróquias cujo ambiente sociológico era diferente

do da favela, tiveram origem, apesar de tudo, comunidades em via de conversao suscitada por urna catequese de dois meses" (ibid). Diante dos resultados obtidos, o próprio arcebispo de Madrid,

Mons. Casimiro Morcillo, encorajou o movimento e apresentou-ó

a outros vigários; recomendava sempre que qualquer nova comu

nidade catecumenal a ser fundada guardasse a comunhao com o respectivo pastor, a f¡m de nao formar um quisto dentro da paró

quia.

302

NEOCATECUMENATO

15

O progresso de tal iniciativa foi taman no que em breve passou da arquidiocese de Madrid para a de Barcelona e para outras partes da Espanha, vencendo os inevitáveis obstáculos que a novidade despertou num ou noutro lugar.

Quatro anos mais tarde, ou seja, em 1968, o Catecumenato de Kiko e seus companheiros chegou a Roma, acompanhado de recomendacao de Mons. Morcillo ao Cardeal Vigário de Roma: os corajosos apostólos Kiko, Carmen e Pe. Francesco Cuppini es-

tabeleceram-se no Borghetto Latino, o reduto de pior fama da Cidade Eterna. Bem acolhidos ai, espalharam a sua mensagem e o seu ideal nao só em Roma, más em toda a Italia. Assim tomou vulto ainda mais definido o carisma daqueles catequistas itineran

tes (sacerdotes e leigos). A partir de 1972, a difusao se fez em outros países da Europa e mesmo da América Latina em atendimen-

to a pedidos de Bispos e sacerdotes. Hoje em dia pode-se dizer que o Neocatecumenato está presente e atuante em todos os con tinentes. Até mesmo em núcleos da Comunhao Anglicana, os ca

tequistas itinerantes instituí ram o Catecumenato após o devido acordó entre Bispos anglicanos e Bispos católicos. Pergunta-se agora:

2. Que é propriamente o Neocatecumenato?

O Neocatecumenato é urna instituicao que tem por objetivo levar os cristaos adultos, especialmente os mais afastados, a urna.

converslo mais profunda; para tanto propoe-lhes um caminho de

diversas etapas, semelhantes áquelas que a I groja antiga propunha aos adultos que se preparavam para passar do paganismo á vida

crista; essas etapas vao familiarizando o "catecúmeno" com a Pa-

lavra de Deus, com as fórmulas da fé e da oracao e com os ritos sacramentáis a f im de que possa abracar esses dons de Deus com

mais conviccao e eficacia. Ó catecumenato na Igreja antiga termi-

nava com a recepcao do sacramento do Batismo (ao qual, nao ra ro, se acrescentavam os da Crisma e da Eucaristía); hoje em dia o Neocatecumenato já supoe "catecúmenos" batizados, apenas visa

a transmitir-Inés mais profunda consciéncia do valor e das respon sabilidades da vida crista; termina com a renovacao das promessas do Batismo. Tal é o depoimento de alguém que fez a experiencia neocatecumenal: 303

16

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

"Embora tivéssemos recebido o Batismo, para muitos de nos ele era

inoperante na vida concreta; nos o tinhamos esquecido ou nao sabíamos o

que era a vocacao crista. Éramos millonarios que viviam na miseria" (K. Ar

guello, II Neocatecumenato.l.

Desta forma o Neocatecumenato tenciona "reconstruir a Igreja no sáculo presente, na historia que estamos vivendo" (Pau lo VI),... a Igreja que, sem destruir o seu passado, volta as fontes

auténticas da sua vitalidade e se renova no intuito de mostrar ao mundo o Cristo presente em meio aos homens de hoje. A face da

Igreja renovada há de se caracterizar pela vivencia do amor e da

unidade.

Assim entendido, o Neocatecumenato nao deve ser confun dido com as comunidades eclesiais de base, que tém origem e fi nalidades diferentes.

3. As etapas do Neocatecumenato

O itinerario do Neocatecumenato pode durar dez anos. Seis

sao as suas principáis etapas: 1) o anuncio da Boa Nova; 2) o precatecumenato; 3) a passagem ao catecumenato; 4) o catecumena-

to 5) a escolha (electio ou eleicao); 6) a renovacao das promessas do Batismo. Percorramos essas sucessivas fases. 1)0 anuncio (kerygma) da Boa Nova. Com a aquiescencia do Vigário, o Neocatecumenato é apresentado aos diversos setores de urna paróquia. Os fiéis que o queiram aceitar, passam a reunir-se doravante duas vezes por semana durante dois meses, a fim de ouvir o anuncio da Boa-Nova. Este proclama a salvacao

éfetuada pela Páscoa: Cristo, morrendo e ressuscitando, obtevenos a graca de morrermos com Ele para o pecado e de ressuscitarmos para urna vida nova, que implica comunhao com Deus e com

os irmaos. Este breve período termina com a formacao de urna comúnidade, para a qual sao eleitos um coordenador e seus cola boradores; o pároco acompanhará o grupo com o seu carisma de pastor. Os catequistas que deram o impulso inicial á comunidade,

se retiram para as suas sedes de origem, mantendo de longe o con tato com a comunidade fundada.

2) Precatecumenato. A segunda etapa dura aproximadamen te dois anos. Os irmaos se encontram duas vezes por semana pa304

NEOCATECUMENATO

17

ra a reflexao sobre a Palavra de Deus e para preparar a Eucaristía dominical. As reunioes sao planejadas por equipes de cinco ou seis pessoas, que, juntas, léem os textos bfblicos, os estudam e interpretam a fim de oferecer á comunidade a respectiva mensa-

gem. Unía vez por mes, toda a comunidade participa de um día de convivencia, quando os irmaos compartilham suas experien

cias pessoais á luz da Palavra de Deus; cada qual examina e expoe qual tenha sido o seu comportamento na familia, na profissao, na sociedade, confrontando-o com o modelo tragado pelo EvangeIho. Trata-se de um exercício de humildade, em que todos sao convidados a tirar as máscaras a fim de ser plenamente ilumina dos pela Palavra de Deus.

Transcorridos os dois anos respectivos, esta etapa se encerra com um primeiro escrutinio de transicao para o catecumenato.

Num retiro de tres dias, os candidatos refletem sobre as exigen cias evangélicas de "carregar a cruz", "entrar pela porta estreita", "tudo deixar em prol do Reino". . .; é-lhes incutido o valor da

graca de Deus, que nos vem pelo Batismo e que nos faz membros

da Igreja. Tendo meditado sobre estas verdades, o candidato, que as aceita concretamente, exprime diante do Bispo o seu propó

sito de responder ao apelo e de entrar no Catecumenato.

3) Transicao para o Catecumenato. Este período dura tembém dois anos e desenvolve-se sobre o tripe "Palavra de Deus — Liturgia — Comunidade". Cada mes é proposto aos candidatos

um momento da historia da salvacio: Abraao e os Patriarcas, Moi sés e o éxodo, a Térra Prometida, o Exilio... Também é apresentado aos catecúmenos o perigo dos ídolos que escravizam o ho mem: o dinheiro, os afetos desregrados, o trabalho apaixonado; diante das seducoes destes valores o homem é muitas vezes inca paz de se desviar; por isto o Senhor Jesús Ihe oferece a sua graca, que converte os coracoes.

Esta etapa termina com um segundo escrutinio de entrada

definitiva no catecumenato. Durante um retiro e na presenca do Bispo, o neocatecúmeno renuncia publicamente aos ídolos deste mundo para fazer de Deus o centro da sua vida, consciente de que "todo aquele que nao renunciar a todos os seus bens, nao po de ser meu discípulo" (Le 14,33). 305

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

4) O Catecumenato. Esta fase dura tres anos. O primeiro ano é dedicado á leitura e ao aprofundamento dos Salmos em pers pectiva crista; encerra-se com a entrega do Salterio como livro de oracáo. O segundo ano é caracterizado pela reflexao sobre o Cre do Apostólico: os catecúmenos procuram vivé-lo e transmiti-lo as familias da paróquia; a cerimónia de entrega do Símbolo de Fé se realiza no domingo de Ramos, quando cada catecúmeno recebe das maos do Bispo urna palma benta como sinal do testemunho do Cristo que chega até o heroísmo do martirio. O terceiro ano

consta de nova iniciacao á oracao mediante a entrega do "Pai

Nosso", coracao do Evangelho. Estes tres anos levam em conta

especialmente a familia e a vida crista a ser vivida no lar; as criancas é dado participar da aprendizagem e da prática de oracao dos mais velhos, consoante o preceito que o Deuteronómio formula

para as familias israelitas: 'Tu os repetirás (os mandamentos) aos teusfilhos"(Dt6,7).

5) A escolha (eleicao). Esta penúltima etapa é das mais exi gentes, seja porque comporta catequese sempre mais aprofundada, seja porque requer vida moral ainda mais pura da parte dos catecúmenos. Tais exigencias nao sobrevém como algo de artifi cial ou forcado; ao contrario, decorrem da preparacao de varios anos que as antecederam. Aqueles a quem Deus dá a graca de corresponder devidamente a tais apelos, sao candidatos a escolha (a palavra "escolha" — electio em latim — no caso lembra a vocapao gratuita que Deus dirige aos homens; nao é a criatura que se

impoe a Deus, mas é Este que tem a iniciativa de chamar a cria tura). A cerimónia de escolha comporta a inscricao do nome do catecúmeno no livro da vida (ver Le 10,20); mediante esta ¡nscri-

cao, o cristao testemunha a plena aceitacao das exigencias da vida crista, formuladas ñas palavras do Senhor Jesús: "Sede perfeitos como vosso Pai que está nos céus" (Mt 5,48). A missao alta e nobre que incumbe a quem tem o nome no livro da vida, é a de ser cristao.

6) Renovacao das promessas do Batismo. Os catecúmenos,

no caso, já foram batizados em tempos remotos. Por conseguinte, o que Ihes toca no final do seu itinerario, é renovar as promessas

do Batismo, que incluem a renuncia a Satanás, ás suas pompas e obras, e a procura de vida inteiramente fiel ao Evangelho. Os que 306

NEOCATECUMENATO

19

chegam a este termo, sao cristaos que proelamam Cristo Ressus-

citado como único Senhor de suas vidas e sabem que os frutos do Batismo sao dons gratuitos de Deus, apregoados pela Igreja em todos os tempos e hoje tornados mais presentes á mente dos fiéis

através da praxe catecumenal. A propósito observa Kiko Arguello: "Nao é possfvel contar todos os mi¡agres de que somos testemunhas; as pessoas que abandonaram a sua vida mundana de pecado, de adulterio,

de furtos, de violencia, ateísmo, profundo egoísmo; os 'casáis separados ou

as familias divididas que Cristo recompós; osjovens transviados que reencon

traran) o sentido da vida; a comunhSo criada entre pessoas de todas as ida-

des e de condiedes sodais e culturáis muito diferentes. É verídica a Palavra: "Hi aínda outras coisas realizadas por Jesús que, se fossem narradas urna por urna, creio que o mundo inteiro nSo bastaría para conteros livros que se deveriam escrever' (Jo 21,25)" (K. Arguello, II Neocatecumenato, 101).

Examinemos agora

4. Os fundamentos teológicos do Neocatecumenato 0 Neocatecumenato se ergue sobre a base de tres grandes va

lores do Cristianismo:

1) A Palavra de Oeus. A esta é atribuido o papel desencadea-

dor e sempre estimulador da caminhada. É um sacramental que

vai sendo gradualmente aprofundado pelos catecúmenos; estes a penetram nao em atitude intelectualista e fria, mas em perspecti

va sapiencial e orante. A Palavra de Deus é urna sementé (Mt '

13,19), que contém a vida (Dt 32,47) e germina na historia pessoal e comunitaria, consolidando a Igreja e produzindo a grande árvore do Reino de Deus
2) Eucaristía. No centro da vida comunitaria dos neocateeumenos está a Eucaristía. A redescoberta da Eucaristía como fonte indispensável de vida crista foi muito incentivada pelo mo307

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

vimento litúrgico que o Concilio do Vaticano 11 conf¡rmou em tudo o que ele tinha de sadio. Assim as duas mesas sao assiduamente freqüentadas pelo IMeocatecumenato: a da Palavra e a do Corpo do Senhor (cf. Constituicao Dei Verbum n° 21). É da Eu

caristía que os catecúmenos recebem o incentivo para a sua missao e é para a Eucaristía que tendem a levar todos aqueles que escu tam a Palavra de Deus.

3) A Cruz gloriosa. O IMeocatecumenato nutre a forte conyiccao de que a Cruz está plantada no coracao do Evangelho; a

ignominia do patíbulo é iluminada pela gloria do Cristo Ressús-

citado. Já que toda a vida de Jesús tendía para a Cruz (cf. Me

10,32-34, Le 12,50; Mt 16,23), também o discípulo deve seguir Jesús carregando a sua cruz (cf. Mt 16,24s). Para o catecúmeno, anunciar a salvacao é proclamar a cruz gloriosa de Cristo; esta im plica renuncia ao egoísmo e ao pecado para abrír-se á graca e á vida que vém da parte do Ressuscitado. A imagem do Servidor de Javé que sofre para expiar os pecados do mundo e obter a salva-

cao para todos os homens, paira ante os olhos do neocatecúme-

no (cf. Is 42,1-7; 49,1-6; 50,4-9; 52,13-53.12).

Baseado, pois, nos valores da Palavra, da Eucaristía e da Cruz, o cristao se dispoe a "testemunhar o nascimento de um no vo humanismo, no qual o homem se define, em primeiro lugar, por sua responsabilídade perante os ¡rmaos e a historia" (Consti

tuicao Gaudium et Spes n?55).

A espirítualidade do catecumenato assim alimentada é a de

conversao continua ou é a de vivencia, tao coerente quanto possí-

vel, da graca do Batismo (que é inseparável do dom da Eucaris tía). María é considerada como o modelo desta atitude, pois ela

se colocou^ ao inteiro díspor do Senhor Deus mediante o seu Fiat; em decorréncia desta entrega, o Espirito Santo a recobriu com a sua sombra e ela trouxe em seu seio o Fílho de Deus para dá-lo ao mundo inteiro (cf. Le 1,28-38). O Neocumenato é tido como um

período em que o Espirito Santo fomenta a formacao do Cristo em cada cristao; com efeito, o Batismo deposita no neófito urna sementé de vida nova, principio de "nova criatura", que há

de ser desenvolvida pela acao do Espirito Santo (cf. Rm 8 14-162Cor 5,17; Gl 4,6; 6,8; Cl 3,10; Tt 3,5); quem é dócil a essa acao 308

NEOCATECUMENATO

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e se entrega cada vez mais á vocacao crista, se torna mais e mais portador do Cristo em beneficio seu e de toda a S. Igreja. 5. Conclusao

A inspiracao básica do Neocatecumenato é sadia e tem me

recido a aprovacao dos Sumos Pontífices Paulo VI e Joao Paulo

II. Assim, por exemplo, se exprimia o atual Papa em visita ás co munidades neocatecumenais da paróquia de S. Joao Evangelista em Spinaceto (Roma): "É belo também o nome: comunidades neocatecumenais. Pois este nome nos leva a pensar nos catecúmenos que outrora se preparavam para o Batísmo durante multo tempo ou durante meses e anos, especialmente na Quaresma. A seguir, assim preparados, recebiam o Batísmo com grande fervor, com profunda alegría" (L'Ouervatore Romano, 19/20 novembro de 1979p. 5).

Pode-se dizer que o Neocatecumenato nao tenciona senao

tornar viva de modo concreto e sistemático a exortacao de Paulo VI formulada aos 5/11/1979: "A RenovacSo da Igreja segundo o espléndido programa proposto pe

lo Concillo do Vaticano II nao pode ser, em sua fundamental ossatura (e também ñas suas concretas manifestares), outra coisa senSo urna auténtica conversao a Deus dentro das exigencias do nosso tempo. O apelo á conversao fmetanoeitej, isto é, á penitencia, é nSo somente a primeira Palavra do

Evangelho, mas também a constante e insubstítufvel palavra deste. É dessa

palavra que provém toda a vitalidade da Igreja. A Igreja se encontra tanto mais plenamente ¡n statu mitsionis - isto é, tanto mais plenamente realiza a

sua missao — quanto mais se converte a Deus. É só mediante esta autocon-

versao que Ela se torna mais eficaz como centro de conversao dos homens e do mundo ao Criador e Redentor".

Como em todo movimento da Igreja contemporánea, sao apontados exageros ou abusos no modo de falar ou agir de neocatecúmenos. Tais fainas se explicam pela fragilidade humana, mas nao decorrem da mensagem do neocatecumenato. Este tenciona

ser fiel ao magisterio da Igreja. £ contraria ao seu programa qual-

quer atitude de insubordinacao ao Bispo diocesano ou ao Pároco, como também qualquer enquistamento dentro da paróquia. 0 neocatecúmeno é incitado a alimentar em si o "sentir com a 309

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

Igreja", de modo a servir a Esta, fomentando a sua unidade e comunhao, jamáis trabalhando em direcao contraria. Urna vez ter minado o longo itinerario, o fiel católico deve sentir-se compro metido com as tarefas pastarais da sua paróquia e da sua diocese; há de ser um membro vivo e atuante da comunidade paroquial é diocesana, de acordó com as palavras de Paulo VI: "Construir a Igreja é o grande dever de todos nos, fiéis do nosso tem-

po. . . Construir a Igreja em dois sentidos, a saber: primeiro, reconstruir aqueta Igreja da qual recebemos urna heranca riquíssima, mas tio necessita-

da de purificacao segundo o espirito do Evangelho e de restauracao princi

palmente no plano dos valores religiosos, dos quais o mundo de hoje vai per-

dendo a estima, embora tanto precise deles. Em segundo lugar, num sentido

que se volta para o futuro, mais do que para o passado: aponta-nos o dever

de continuar, até de renovar com fídelidade tradicional, a antiga construcao, e de Ihe dar formas novas concordes com as exigencias históricas e constitudonáis" (L'Osservatore. Romano, 22/07/1976).

Eis por que os fiéis católicos podem reconhecer no Neocate-

cumenato um dos frutos da acao do Espirito Santo em nossos

días, e pedem ao Senhor preserve tao generosa e benéfica iniciati

va dos desvíos que a debilidade humana Ihe pode inflingir. A propósito citamos:

ZEVINI, GIORGIO, Informales sobre Experiencia de Iniciapao Cris

ta de Adultos ñas Comunidades Neocatecumenais, em: Concilium n9 142 1972/2. pp. 72(2081-81 (217).

ÍDEM, Neocatecumenato, em: Nuovo Dizionario di Spiritualitá Ro

ma, Ed. Paulinas 1979, pp. 1056-1073.

ÍDEM, ti Cammino Neocatecumenale. Itinerario di maturazione nella fede, em: Movi mentí Ecclesiali Contemporanei. Librería Ateneo Satesiano Roma 1982, pp. 231-267.

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A Igreja dos tres primeiros sécuios:

"A Memoria do Povo Cristáo" por Eduardo Hoornaert

Em jfntese: Eduardo Hoornaert tenciona escrever a historia da Igreja dos tris primeiros sáculos a partir dos pobres, de acordó com as premissas

da colecao 'Teología e Libertado", na qualse insere. Esta ótica predefinida leva o autor a cultivar antfteses: pobres e ricos, carisma e instituido, judais mo e helenismo.. . O esquema da luta de classes está subjacente a todo o ti-

vro, o que nao pode deixar de deturpar os quadros aposentados. Testemu-

nhos e fatos que nio condigam com as premissas do autor ousSo omitidos ousSo interpretados tendenciosamente; até mesmo o Apostólo Sao Paulo é

sujeito a críticas da parte de Hoornaert por ter pretensamente cedido a

idéias enemistas (corrente herética que repudiava o convivio conjugal}. A índole tendenciosa tira ao livro o seu valor científico, embora nele se encontrem betas páginas sobre o teor de wdj heroico dos primeiros cristaos, testemunhado por escritores antigos. cujos textos Hoornaert transcreve. *

*

*

A coledlo "Teología e Libertacao" apresentou sua terceira obra, intitulada "A Memoria do Povo Cristao"1, da autoría de Eduardo Hoornaert; tenciona ser urna historia da Igreja dos tres « primeiros séculos, escrita a partir do povo, de acordó com as dire-

trízes que ¡nspiram a referida colecao. - Vamos, a seguir, assina-

lar alguns dos traeos marcantes do livro, ao que serao acrescenta-

dos breves comentarios.

1. Linhas-mestras do livro

1. A historia da Igreja dos tres primeíros séculos é escrita a partir de premissas predefinidas, das quais a principal é a da luta Eduardo Hoornaert, A Memoria do Povo Cristao. Colecao "Teología e Li bertado". Serie I. Experiencia de Deus e Justipa. Ed. Vozes, Petrópolis 1986. 140x210 mm, 263 pp. - Por determinacao da Santa Sé, a equipe responsévelpela colecSo suspendeu seus trabalhos para poder ser reformulada. 311

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

de classes; Jesús terá sido um marginalizado contestatario (cf. p. 44), que deu inicio a um movimento de marginalizados adversa rios da sociedade em que viviam: ". . .0$ que o Direito Romano chama de humildes fhumiliores,/ em oposicao aos honestos /honestioresA' os escravos, libertos, infames como gladiadores, bestiarios no circo, dancarinos. cantores, prostitutas, mulheres

e criancas. Entre estes é que devemos procurar os cristaos" (p. 50).

Em vez de alimentar complexo de inferioridade, os cristaos descobriram na marginalizacao social "um plano de Deus de im portancia soberana e passaram a elaborar urna teología da ele ¡cao e predilecao divinas pelos marginalizados, a grande teología dos primeiros tempos cristaos" (p. 50). Eram as seguintes as línhas dessa teología: a predilecao pela mulher num mundo machista, a predilecto pela enanca num mundo de adultos, a predilecao pelos operarios num mundo de patroes, a predilecao pelos doentes num mundo de sadios, a predilecao pelo negro num mundo de brancos, a predilecao pelos indios num mundo invadido pelos brancos, a predilecao pela periferia do sistema no plano da política inter

nacional (cf. p. 53). O intuito dos discípulos de Jesús - os materialmente pobres — era transformar o Imperio Romano, onde havia autoridade constituida e determinado tipo de vida social. Por conseguinte, o Cristianismo antigo era fortemente politizado: "Diante da religiosidade típica reinante no Imperio Romano, baseada fundamentalmente numa apolitizacao e espiritualizacao, mas também numa

teorizacao da vida religiosa, o Cristianismo causou impacto pelo seu caráter prático, realista, sobrio, voltado para a transformacao da sociedade, embora'

em nfveis sociais muito distantes das esferas do poder político" (p. 240).

A familia "nao era considerada célula da sociedade (um te ma clássico das religioes de Estado), mas como fermento de urna nova sociedade" (p. 166). Os cristaos terao levado vida de comunidades de base, em que a responsabilidade era de todos; um Mame genérico, inspirado pelo amor e pelos carismas, fazia a uniao dessas comunidades en tre si: 3L2

"A MEMORIA DO POVO CRISTÁO"

25

"As atuais comunidades de base encontram ñas primeiras comunida

des cristas dos tres primeiros séculos paralelismos surpreendentes. Pelo me nos é o que se pode perceber nos entusiasmos dos cristaos atuais que partici pam de unta comum'dade de base e comparam a sua vivencia com a dos pri meiros cristaos" (p. 137). "Existia entre as comunidades de base dos primeiros tempos urna cor respondencia marcada por duas características: a freqüéncia e o trato de igual para igual. Nos anos 160-170, por exemplo, o bispo de Corinto, Dio nisio, envíou urna serie de cartas ás mais diversas Igrejas, em Lacedembnia,

Atenas, Nicomédia, Creta, Asia Menor, Roma, sem nenhum trago de autori

tarismo, simplesmente para animar os irmaos e as Irmas a perseverarem na fé, combater as heresias. procurar a comunhao com Cristo e entre sie final

mente reativar a memoria crista (Eusébio, Historia Eclesiástica 4.23.1-11)" (p. 151).

Os anseios dessas células do Cristianismo antigo eram de ordem prática ou vivencial mais do que de ordem doutrinária: "Os documentos que o Cristianismo primitivo nos legou nSo deixam urna sombra de dúvida: ser cristao naqueles tempos nao significava antes de tudo aderir a urna nova doutrina. mas viver urna nova vida" (p. 164)..

Mais: "O Cristianismo nao pode conceber-se como urna doutrina conservada intacta através dos séculos, mas sim como fonte geradora de realizacoes sempre repetidas a partir da fidelidade ao evento fundador que é Jesús e a sua prática.. . A verdade nao pertence, pois. a ninguém, mas é dita por muítos v pela veracidade da vida e pelos vestigios do evento Jesús que nela se encon

tram" (p. 191).

Segundo Hoornaert, os antigos cristaos viviam em comu

nhao de bens materiais: "comunhao de bens entre todos os cris taos indiscriminadamente" (pp. 221-223). "A fraternidade ñas comunidades cristas teria que ter dimensoes financeiras. As co munidades só conseguiriam ser o inicio de urna nova sociedade

se nelas se praticasse a nova lei de que todos participam dos bens materiais e nao apenas das palavras" (p. 212). 2. Todavia essa realidade carismática e fraternal da Igreja dos dois primeiros séculos terá comecado a desmoronar, segundo 313

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

Hoornaert, por efeito de tres fatores principáis, que terao deterio rado a face e o íntimo do Cristianismo:

1) a influencia do helenismo ou da cultura e da filosofía he lenista, cultivadas especialmente por Clemente
sús, dos profetas, dos apostólos do Reino.

2) O monaquisino, que tem seu pioneiro em S. Antao (251356), também modificou profundamente a realidade da Igreja an-

tiga; com efeito, pregava a retirada para o deserto ou a vida despolitizadá como também o celibato: "A imagem eclesial original mudou consideravelmente com a propagacao do modelo monacal e a conseqüente acentuacao da prática celibatária no modo de se viver Igreja e Cristianismo" (p. 236). - Hoornaert critica Sao Paulo por apregoar a vida celibatária em 1Cor 7,25-31; insinúa que tal posicao se identifica com a dos hereges encratistas, para os quais a materia era má e, por conseguinte, o casamento condenável (pp. 167s).

3) A hierarquia da Igreja foi-se estruturando de modo que a espontaneidade dos carismas terá desaparecido na Igreja. Tal estruturacao haverá sido influenciada por correntes filosóficas gre co-romanas: "Acreditamos que tanto o fascfnio exercido pelo sis tema organizatório romano como a influencia das idéias platóni cas e estoicas tiveram um papel relevante na reviravolta do século II" (p. 193). Os mestres carismáticos passaram a ser sujeitos á hie rarquia clerical (cf. p. 192).

Exposto o conteúdo do livro em termos sintéticos, propore

mos algumas consideracoes a respeito.

2. Refletindo...

O livro de Hoornaert tem suas páginas interessantes, espe

cialmente quando transcreve textos de escritores dos primeiros 314

"A MEMORIA DO POVO CRISTAO"

27

séculos do Cristianismo (S. Justino, S. Ireneu, Aristides, Atenágoras, Clemente, Orígenes. . .}, pouco conhecidos ao leitor brasileiro. Todavía quem o lé, verifica que se baseia em permanente antítese ou dualismo entre pobres e ricos, carisma e instituicao, ju daismo e helenismo.. . Para firmar esse dualismo, o autor omite a consideracao de textos nao condizentes com o seu propósito ou interpreta-os tendenciosamente. Para evidenciar isto com a máxi ma clareza, seria necessário escrever outro livro. Eis, porém, algumas observacoes a propósito da temática: 2.1. Carisma e Instituicao

Nao se deveria crer que os antigos cristaos vivessem de inspi-

racoes carismáticas alheias a urna instituicao ou a um regime jurí

dico. Sejam recordados, entre outros, os seguintes pontos:

Em 1Cor 5,3-5 e 2Cor 2,5-11, temos as mais antigás noti cias de excomunhao da Igreja: a primeira aplicada a um cristao in cestuoso de Corinto; a segunda, a um fiel que havia injuriado o Apostólo.

Em 1Cor 14,1-40 Sao Paulo tem em vista os fiéis dotados de

carismas na comunidade de Corinto; preferiam o dom das línguas, que era, á primeira vista, o mais impressionante. Ora o Apostólo censura a estima indisciplinada dos carismas e baixa normas para o bom uso dos mesmos: "Se alguém julga ser profeta ou inspirado pelo Espirito, reconheca, ñas coisas que vos escre- -

vo, um preceito do Senhor. Todavía, se alguém nao o reconhecer,

é que também Deus nao é reconhecido" (1Cor 14,37s).

A estrutura jurídica da Igreja foi-se desenvolvendo com o

passar dos decenios. As epístolas pastorais, que sao da segunda metade do século I, já revelam a hierarquia com diversos minis

terios e os prenuncios do episcopado monárquico (um só bispo á

frente de presbíteros e diáconos); o episcopado monárquico está

plenamente instituido na época de S. Inácio de Antioquia (1110

aproximadamente), cujas cartas nos foram transmitidas.

S. Clemente de Roma (t cerca de 102) escreve aos Corintios:

"Os Apostólos foram mandados a evangelizar pelo Senhor Jesús 315

28

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

Cristo . Jesús Cristo foi enviado por Deus. Assim Cristo vem de

Deus e os Apostólos de Cristo. .. lam pregando por campos e cidades. . . e estabelecendo os que eram as primicias dentre eles co mo bispos e diáconos dos futuros fiéis, depois de prová-lps no Es pirito Santo" (n?42).

No século II o Papa S. Vítor (189-198) excomungou os fiéis

da Asia Menor que queriam seguir seu calendario próprio para a celebracao da Páscoa.

Nao nos é possível alongar a lista de testemunhos que provam que, desde as suas origens, a Igreja foi regida institucionalmente. Está claro que a organizacao jurídica só aos poucos foi-se desdobrando; a principio as dificuldades de viagem e comunicacao criavam obstáculos ao exercício de um governo central. De resto, a característica "instituicao" na Igreja tem seu fundamento no próprio Evangelho, onde Jesús entrega a Pedro as faculdades necessárias para ligar e desligar (cf. Mt 16,16-19), para confirmar

seus irmaos na fé (Le 22,31s), para apascentar seu rebanho (cf. Jo 21,15-17). O colegio dos Apostólos, por sua vez, recebeu a fa-

culdade de "ligar e desligar" (cf. Mt 18,18). A autoridade na Igreja nao se opoe aos carismas; ao contrario, ela é exercida em funcao do misterio ou do sacramento do Corpo de Cristo prolon gado, que o Espirito Santo vivifica. Há, de resto, verdadeiros e

falsos (ilusorios) carismas; entre uns e outros é a autoridade da Igreja que deve julgar, -a fim de que a doutrina e a obra de Cristo nao sofram deturpacoes; ver Constituicao Lumen Gentium n?12.

Mais: o exercício da autoridade dentro e fora da Igreja nao

era visto pelas prime ¡ras geracoes como algo intrínsecamente mau ou alheio á caridade e aos carismas cristaos. Muito ao contrario,

Sao Paulo se refere á autoridade civil e ao seu poder coercitivo em termos muito enfáticos, procurando valorizar o uso justo e honesto das faculdades de governar: "Todo homem se submeta as autoridades constituidas, pois nao há autoridade que nao venha de Deus, e as que existem foram estabelecidas por Deus. De modo que aqueie que se revoita contra a autoridade, opoe-se á ordem estabelecida por Deus. £ os que se opoem atrairao sobre si a condena-

caá Os que governam incutem medo quando se pratica o mal, nao quando 316

"A MEMORIA DO POVO CR1STÁO"

29

se faz o bem. Queres entao nSo ter tnedo da autoridade? Pratica o bem e dela receberás elogios, pois ela é instrumento de Deus para te conduzir ao bem. Se, porém, praticares o mal, teme, porque nSo ó atoa que ela traz a espada; ela é instrumento de Deus para fazer Justina e punir quem comete o mal" (fím 13,1-4).

Algo de semelhante se lé em 1Pd 2,13s. 2.2. O monaquisino

O monaquisino, com seu programa de fuga do mundo (alheamento á política partidaria) e celibato, é auténtico fruto da pregacao evangélica. Conforme 1Cor 7, 25-35, a consciéncia de

que chegou o Reino de Deus com os valores definitivos leva os

cristaos a procurar envolver-se o menos possível ñas coisas deste

mundo: "os que usam deste mundo, sejam como se nao usassem

plenamente" {ICor 7,31). Daf a vida una e indivisa desde os primeiros decenios e a retirada para o deserto no sáculo III. Tais ati-

tudes sao muito lógicas e coerentes com a pregacao de Jesús. Hoornaert critica Sao Paulo neste ponto. . .; critica, porém, em virtude de preconceitos ou porque o Apostólo (que certamente tem respeitável autoridade) nao "se enquadra no esquema que o

historiógrafo quer impor á Igreja antiga.

Os primeiros cristaos eram estranhos á vida pública e á sociedade civil do Imperio nao exclusivamente por motivos ciassistas ou sócio-económicos, mas principalmente porque estas possuiam sempre características religiosas; cada familia tinha seus dii manes

ou penates ou seus deuses domésticos, de modo que até as festas de familia eram celebracoes religiosas pagas; isto dificultava a participacao dos cristaos tanto nos certames públicos como na con vivencia doméstica. 2.3. Pobreza e comunhSo de bens A comunhao de bens na Igreja era praticada espontáneamen

te e nao de maneira sistemática e cumpulsória. Tenha-se em vista o caso de Ananias e Safira: venderam urna propriedade, mas nao

entregaram aos Apostólos toda a quantia correspondente; foram entao punidos porque "mentiram ao Espirito Santo" querendo .engañar os Apostólos; Sao Pedro disse expressamente a Ananias 317

30

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

que ele podia ter conservado os seus haveres e, se os vendesse, po día ter guardado a quantia respectiva; cf. At 5,1-4. Barnabé vendeu seu campo e levou o respectivo preco aos Apostólos; este ca so deve ter sido excepcional para merecer especial mencao (cf. At

4,36s). É certo, porém, que cada cristao na comunidade de Jeru-

salém punha seus bens á disposicao de todos; cf. At 2,42-47; 4, 32-35; 5,12-16. Sem chegar a praticar a comunhao de bens obrigatória, os cristaos posteriores se ajudavam mutuamente; Tertu liano (t após 220) refere que em Cartago criaram urna caixa comum, formada pelas contribuicoes mensais que cada um dava es pontáneamente para atender aos mais necessitados {cf. Apologé tico 39.5-11).

As prime i ras comunidades cristas parecem ter sido recrutadas majoritariamente entre os pobres; nao, porém, de modo ex clusivo. Com efeito; o Apostólo Sao Paulo se dirigiu aos sen ñores de escravos para pedir-lhes benevolencia em favor destes: "Todo aquele que fízero bem, receberá o bem do Senhor, se/a ele ser vo, seja lívre. E vés, senhores, fazei o mesmo para com eles (servos), sem amea&s, sabendo que o Senhor deles e vosso está nos céus e que Ele nao faz acepcao de pessoas" (Ef 6,8s).

A carta a Filemon recomenda o escravo cristao Onésimo a seu patrao cristao, a fim de que o trate como irmao; cf. Fm 16.

Em 1Cor 7,17-24 Sao Paulo aconselha cada cristao a perma necer na condicao social em que se achava quando foi chamado á fé: "Eras escravo quando foste chamado? Nao te preocupes com isto. Ao contrario, aínda que pudesses tornar-te livre, procura an tes tirar proveito da tua condiclo de escravo. Pois aquele que era

escravo quando chamado no Senhor, é um liberto do Senhor" (1Cor7,21s). Os cristaos, durante mu i tos séculos, nao puderam pensar em abolir a escravatura; isto nao Ihes passava pela mente, pois equivalena ao colapso da vida pública. Embora a escravatura seja ¡niqua, ela nao Ihes parecía tal, como se depreende das próprias car tas do Novo Testamento; cf. 1Pd 2,18; Ef 6,5-8; Cl 3,22-25; Fm.

O que os Apostólos pediam, era compreensao e benignidade para com os escravos.

318

"A MEMORIA DO POVO CRISTÁO"

31

Os ricos nao sao condenados pelo Apostólo Sao Paulo, mas

exortados "a que facam o bem, se enriquecam com boas obras, sejam pródigos, capazes de partilhar. Estarao assim acumulando para si mesmos um belo tesouro para o futuro, a fim de obterem a verdadeira vida" (ITm 6,17-19).

A conversáo, ao Cristianismo, de pessoas de classe social mais conspicua é atestada já no primeiro século. Tal foi o caso do

cónsul Flávio Clemente e de sua esposa Domitila, que, conforme

Dio Cassio (67,14-2), foram martirizados por causa da fé sob Domiciano "com muitos outros inclinados aos costumes judeus". Quando Sao Paulo esteve detido em Roma de 61 a 63, deve ter suscitado a conversáo de pessoas chegadas ao Imperador, que o Apostólo menciona em Fl 4,22; muitos cidadaos desejosos de urna filosofía de vida mais satisfatória foram entao procurar Paulo e

abracaram a fé crista, tais como Émbulo, Pudente e Lino, que pa-

recem ter pertencido á aristocracia romana (Lino seria posterior mente Papa e mártir, o primeiro sucessor de Sao Pedro). O escri tor romano Tácito fala de urna mulher da aristocracia, Pompónia Grecina, que em 57, por causa da sua vida austera e de outros in dicios, foi acusada de "supersticüo estrangeira"; terá sido urna crista? 2.4. Helenizacao e desvio de rota

Nao se deve associar o Cristianismo ao patrimonio cultural judaico a ponto de opor ao Evangelho a cultura helenista, como se fosse anticrista ou provocadora de desvio do Cristianismo.

Na própria S. Escritura encontramos ecos da cultura helenis ta; tenha-se em vista o livro da Sabedoria, escrito em Alexandria, nos séculos 11/I a.C: recorre a conceitos e vocábulos da filosofía grega para exprimir a genufna Revelacao de Oeus. Mais: os escri tos do Novo Testamento supoem, por vezes, categorías gregas de

pensamento, como atestam especialmente as epístolas de Sao Paulo, o prólogo do quarto Evangelho, a epístola de S. Tiago...

A filosofía grega haveria de ser, para os antigos cristlos, o instrumental oportuno que os ajudaria a ilustrar as verdades da Jé (a da SS. Trindade, a da Encarnacao do Verbo, a da Materni319

32

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

dade Divina...). Sem dúvida, ela podia ser utilizada — e, de fato,

foi por vezes — para favorecer heresias, para promover o-intelectualismo, que encontrou no Gnosticismo dos séculos ll/lll urna

de suas expressoes mais daninhas. Contudo é inegável que o Cris tianismo professa o primado do logos (do pensamento) sobre a praxis (apio); a doutrina da fé é que deve iluminar o comportamentó concreto do cristao, e nao vice-versa; basta lembrar a énfase que Sao Paulo dá ás expressoes "palavras da salvacao" (At 13,26), "palavra da fé" (Rm 10,8), "palavra sadia" (Tt 2,8), "pa-

lávra da verdade" (2Tm 2,15), "palavra de Deus" (Ef 6,17; 1Ts 2,13; 2Tm 2,9; Tt 2,5), "palavra da reconciliacao" (2Cor 5,19), "palavra da Cruz" (1Cor 1,18). . . Os Apostólos empenhavam-se

ao máximo pela preservacao da mensagem anunciada, de modo que seria anatema até mesmo o anjo que anunciasse algo de

contrario (cf. Gl 1,8s). Ao logos da verdade os Apostólos opoem os mythoi (mitos), que eles profligam enérgicamente e que tendiam a se infiltrar ñas antigás comunidades (cf. ITm 1,4; 4,7; 2Tm 4,4; Tt 1,14; 2Pd 1,16); Sao Paulo sacrificou-se durante to

da a vida para manter puro o Evangelho ameacado pelas teorías

dos judaizantes. Por conseguinte nao é lícito relativizar o valor da doutrina da fé em favor da vivencia honesta e exemplar dos pr¡meiros cristaos. Esta era, de fato, impressionante, mas como funcao da Palavra previamente apregoada e assimilada. Vale a pena referir aquí o caso de Sao Justino ocorrido em pleno século II, antes de Clemente e Orígenes de Alexandria. Nascido de familia paga em Naplusa (Palestina), sempre procurou a verdade; por isto freqüentou mestres estoicos, aristotélicos, pi tagóricos e platónicos, sem, pprém, encontrar a plena resposta.

Certa vez um anciao em Éfeso Ihe despertou o interesse pelo No

vo Testamento e a mensagem crista. Nesta Justino reconhéceu ter achado "a única filosofía proveitosa"; fez-se entao cristao pelo Batismo e pelo porte de vida, mas nunca deixou a vocacao de fi lósofo e professor, chegando a fundar urna escola em Roma. Eis alguns trechos do diálogo com o judeu Trifao, em que Justino narra seu itinerario intelectual e sua conversao:

"Justino: A filosofía é deveras um grande bem, muito precioso aos olhos de Deus, a quem ela nos conduz e apresenta. Verdadeiramente sSo san tos os que aplicam sua inteligencia a filosofía. Todavia a maior parte ignora 320

"A MEMORIA DO POVO CRISTÁO"

33

o que sejá filosofía, e a razio por que foi dada aos homens...

Trifao: Mas que é filosofía? E qual a feliddade que pode proporcionar? Se nada te proibe dizé-lo, d¡ze-o\

Justino: Filosofía é ciencia do ser e conhecimento da verdade. E isso mesmo constituí a felicidade, o premio da sabedoría. Trifao: E que é que chamas Deus?

Justino: Aquele que sempre 6 o mesmo e se comporta da mesma maneira, eéa causa da existencia dos outrosseres;a este chamo Deus".

Após narrar a seqüéncia do diálogo, concluí Justino: "Refletindo comigo mesmo sobre aspalavras doanciSo, acabeiachando que eram a única filosofía segura e conveniente. Assimposso dizer que por cau sa desta filosofía (a mensagem crista) também eusou filosofo. Quisera que to dos os homens, tomados do mesmo entusiasmo que eu, nio se apartassem dos ensinamentos do Salvador. Suas palavras sao fortes e temíveis, capazes de persuadir os que andam desviados do caminho reto; e contudo um suave descanso para os que as meditam".

Assim como Justino guardou por toda a sua vida o manto

do filósofo, também Tertuliano, advogado famoso que em 195 se converteu ao Cristianismo, conservou sempre a toga do jurista.

Podemos, pois, dizer que Clemente e Orígenes de Alexandria nao deturparam a mensagem crista, mas a aprofundaram e

ilustraram mediante estudo mais sistemático da mesma. A mensa gem evangélica nada tem a recear da parte do estudo; ao contra rio, só pode ser, por este, mais e mais penetrada para ser mais amada.

Nao há dúvida, muitas outras observacoes deveriam sertecidas a propósito do livro de Hoornaert; neste artigo apenas é possível tentar por em relevo o caráter preconceituoso dessa obra, que por certo atesta a erudicao do autor.

Em símese: o livro de Hoornaert se ressente de um enfoque fundamental deficiente, que impede a auténtica reconstituipao 321

34

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

da historia do Cristianismo dos tres primeiros séculos. Infelizmen te a historia é um dos terrenos mais palmilhados pelas ideologías,

que tencionam encontrar nela o respaldo para as su as teses. — Um panorama mais nítido e objetivo da mesma temática nosé oferecido por famosos historiadores como JEDIN, HUBERT, Manual de Historia de la Iglesia, vol. I. Ed. Herder.

Barcelona 1980.

MINERATH. /?., Les chrétiens et le Monde Ed. J. Gabalda París 1973.

DANIEL-ROPS. A Igreja dos Apostólos e dos Mártires. - Uvraria Ta-

vares Martins, Porto 1956.

BIHLMEYER-TUECHLE. Historia da Igreja, vol. I. - Ed Paulinas

Sao Paulo 1964.

ATENCAO! A Editora Santuario de Aparecida (SP) está publicando unía serie de mais de vinte folhetos de quatro páginas. Cada qual versa sobre urna das denominacoes protestantes ou sobre as «sitas japonesas, coreanas, indianas ou ainda sobre as Igrejas Brasileiras, a Maconaria, a Rosa-Cruz. .. Visam assim a fornecer ao Srs. Párocos e á populacao em geral um instrumental que esclareca sobre a origem e a doutrina de cada qual dessas correntes religiosas ou filosóficas. - Pedidos á Editora Santuario, Rúa Pe. Claro Monteira 342, Caixa Postal 4,12570 Aparecida (SP). Remessa mínima de dez exemplares.

322

Desafio pastoral:

0 Fenómeno das Seitas Em tíntete: A Santa Sé, através de quatro dos seus Secretariados, publicou em maio p.p. urna exposicao referente ao fenómeno das seitas con

temporáneas. É documento ampio e fudkioso, pois resulta de colheita de

dados feita no mundo inteiro mediante um inquérito. Em suma, o texto nos

diz que o fenómeno das seitas corresponde a situacao de desatino e perplexidade em que se encontra o homem de nossos días; frustrado, margina/izado, traído, busca urna resposta para as suas ihdagacoes fundamentáis; em tais circunstándas, a solucao mais simples parece ser a melhor e a definitiva; os

sentimentos e emocoes superam assim a lógica da razio, é o que explica a

docilidade com que os homens de hoje se deixam aiidare 'comandarpelos

seus líderes "carismáticos". aos quais prestam crédito incondicional. - Tais atitudes constituem grave ameaca para os próprios individuos e para as fa

milias. Mas é, antes de tudo, para os católicos um desafio: os anseios de resposta que os homens de hoje manífestam, só podem encontrar auténtica so lucao no Evangelho, que Cristo entregou á sua S. Igreja. Esta, portanto, é chamada a desenvolver um trabalho de evangelizacao mais ampio e caloroso, acompanhado pelo testemunho de vida dos 'fiéis católicos? O documento, anafisado no artigo que se segué, descreve o fenómeno das seitas e aponía diversas pistas pastarais a ser trilhada pelos clérigos e leigos da Igreja Católica.

Muito se tem comentado a surpreendente difusao de seitas, que se faz sentir nao sd no Brasil, mas em diversas partes do mundo. A Santa Sé vem-se preocupando com o fato, pois tem conseqüéncias varias sobre a vida dos

fiéis católicos. Conscientes disto, o Secretariado para a Unidade dos Cristaos, o Secretariado para os Nao-CristSos, o Secretariado para os NSo-Cren-

tes e o Conselho Pontificio para a Cultura promoveram, em fevereiro de 1984, um inquérito junto as Conferencias Episcopais e aos organismos simi lares, para colher ¡nformacoes sobre as seitas e os novos movimientos religio sos de nossa época; na base destes dados poderiam tracar-se linhas de acao pastoral mais eficazes.

323

36

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

Aos 30/10/1985 haviam chegado á Santa Sé 75 respostas, algumas assaz minuciosas e acompanhadas de farta documentacao. Tais elementos possibilitaram a elaboracao de um relatório, que considera o problema, suas

causas e suas pistas de solucáo; foi publicado, em nome dos referidos Secre tariados, no periódico "L'Osservatore Romano", edicáo francesa de 13/05/86, pp. 5-8. Abaixo vai proposta urna slntese desse importante do cumento.

1. As seitas: traeos característicos Nao é fácil definir o que seja urna seita hoje, mormente se se leva em

conta o variegado panorama das que ¡nterpelam o povo católico. Embora sejam geralmente proselitistas, intolerantes e agressivas, estas notas nao bastam para caracteriza-las, pois sao encontradas também em grupos de fiéis pertencentes ás grandes comunidades eclesiais. Por isto o documento propoe a seguinte descricáo: seita é todo grupo religioso que professa a sua visao do mundo própria, derivada dos ensinamentos de urna das principáis religioes do mundo; tais grupos tém seu comportamento distintivo: sim, em geral sao autoritarios, praticam severo controle mental sobre os seus membros, chegando á lavagem cerebral; inspiram sentimentos de culpa e de medo, que caracterizam o ambiente de muitos desses cultos.

Ulteriormente é preciso distinguir entre seitas de origem crista e seitas derivadas de outras religioes ou de um certo humanismo. As seitas oriundas do Cristianismo distinguem-se da Igreja ou das classicas comunidades eclesi ais (luteranismo, calvinismo, anglicanismo...) pelo fato de nao raro admitírem, além da Biblia, outros livros "revelados" ou "proféticos", como o li-

vro de Mórmon, os escritos de Ellen Gould White (adventismo),a obra "Os Principios Divinos", de Sun Myung Moon...; tais "revelacóes" alteram, por vezes de maneira notável, o conteúdo da Biblia.

2. Expansao 2.1. Ambientes adequados

O fenómeno das seitas tem-se desenvolvido com rapidez, sendo que entre os jovens encontra terreno muito receptivo. Estes nao raro sofrem es pecialmente dos males da sociedade contemporánea: pertenca a familias ins-

táveis, desmembradas, desemprego ou ociosidade (ás vezes

involuntaria),

filiacao a minorías étnicas. . .; tomam-se entao vulneráveis ao proselitismo

dos novos grupos. Mas também os adultos sao atingidos, ás vezes, como obje

tivo preferencia!' de certas seitas; há mesmo aquelas que mais se alastram em

ambientes de alto nivel económico e cultural, inclusive ñas Universidades, que Ihes servem de campo fecundo de recrutamento. Da parte dos católicos, 324

FENÓMENO DAS SEITAS

37

a adesao ás seitas é facilitada quando já se acham parcialmente desligados da

Igreja, em virtude de situacóes matrimoniáis irregulares ou por causa de difí cil relacionamento com o clero.

2.2. Motivos de expansao

As pessoas que aderem ás seitas, nlo costumam ter intencóes desones-

tas, mas geralmente procuram satisfazer a urna aspiracáb natural dentre as que, a seguir, serao enumeradas. As seitas, porém, ás vezes abusam das boas

intencóes e dos anseios das pessoas insatisfeitas, prometendo-lhes o que nao podem cumprir.

As razSes pelas quais as seitas se expandem, sao variegadas. Além de algumas de caráter heterogéneo, como sao interesses económicos, pressóes políticas, simples curiosidade. . ., há necessidades e desejos congénitos em todo homem, a que algumas pessoas julgam nao poder satisfazer na Igreja; podem ser reunidos sob nove títulos principáis:

2.2.1. Procura de pertenca (ou senso de comunidade)

Na vida moderna muitas pessoas sentem-se desarraigadas e sos, ou por

que o seu lar foi destruido ou porque estao deslocadas em relacao aos seus costumes tradicionais. Daí experimentarem especial necessidade de calor hu mano, comunidade, fraternidade, solidariédade, protecao, abrigo...

Ora as seitas parecem oferecer atencao, apoio, seguranca, partilha, orientacao (o grupo pensa em lugar do individuo). 2.2.2. Procura de resposta

As situacoes complexas e confusas de nossos dias suscitam IfortemerH

te o desojo de solucoes sobre o sentido da vida, do trabalho, do sofri mentó, do amor. . . - Diante disto, as seitas parecem oferecer respostas simples e pron

tas para conjunturas complicadas, urna "nova verdade" para pessoas que mal conhecem a "velha verdade", diretrizes bem tracadas, urna teología sincretista e pragmática, provas "sobrenaturais" como profecías, glossolalia, mediunidade...

2.2.3. Procura de ¡ntegralidade

Cuitas pessoas parecem sofrer a desintegracao de si mesmsas e das suas

relacóes com os outros, com a sua cultura e o seu meio ambiente... Sao pes

soas feridas por seus pais, seus mestres ou pela sociedade... Desejam ávida mente a restauracáo, a reconciliacao, a participacao, a cura psíquica ou físi ca.

325

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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

Ora as seitas parecem oferecer a salvacao, a conversao interior, a cura fí sica ou espiritual (especialmente aos que sao vftimas do álcool e das drogas) em celebrapoes litúrgicas que dao lugar á participadlo, a espontaneidade e á

criatividade.

2.2.4. Procura de identidade cultural

Este aspecto se liga estreitamente ao anterior. Em países do Terceiro Mundo muita gente se senté alienada porque a cultura européia Ihe foi "im posta" em detrimento da cultura tradicional do seu país. — Ora as seitas nao raro restauran) o patrimonio religioso-cultural tradicional de um povo; em

suas oracóes e prédicas usam linguagem e estilo condizentes com esses valo res típicamente regionais.

2.2.5. Necessidade de ser reconhecido e valorizado

Todo ser humano é propenso a sair do anonimato e afirmar a sua iden tidade; quer sentir-se apreciado, e nao apenas um número ou urna peca anó nima dentro da massa Na Igreja Católica e ñas clássicas denominacoes do Protestantismo, as paróquias ou congregacóes, grandes como sao, dificultam a aproximagao de cada pessoa, na sua situacao individual, por parte dos clé rigos.

Eis, porém, que as seitas, formando pequeños grupos, oferecem a ca da um de seus membros um tratamiento pessoal, a oportunidade de desenvol ver seu potencial próprio, de pertencer a um grupo de élite

2.2.6. Procura de transcendencia

Muitos homens experimentam vivamente a necessidade de ultrapassar o ¡mediato, o material, o controlável; procuran» elucidar o sentido supremo

da vida mediante o recurso ao além. Em outras palavras: tem o sentido do misterio e do misterioso e a preocupacao com o futuro invisível. Embora se-

jam cristáos, ignoram o que a Igreja tem a dizer a respeito, porque só aprenderam preceitos e proibipóes do Catecismo ou só conhecem os aspectos ins-

titucionais da Igreja.

Ora as seitas recorrem copiosamente á Biblia ou a livros "revelados"; o seu discurso é fortemente voltado para os valores transcendentais, enriqueci dos por "dons do Espirito Santo". Geralmente nao mostram preocupacao com problemas sócio-políticos, mas vio de cheio ao encontró da sede de Deus e dos bens definitivos. 2.2.7. A necessidade de direcao espiritual

Muí tos individuos sentem-se desorientados e nao encontram quem os 326

FENÓMENO DAS SEITAS

39

ouca pacientemente; as familias, os educadores, os clérigos nao tém tempo para atender-lhes.

As seitas sao "generosas" neste ponto: apresentam seus gurús e seus mentores carismáticos, que desempenham papel importante, a ponto de polarizar a afetividade dos discípulos; estes nao só se tomam dóceis em relapso aos guias, mas és vezes concebem devocáo histérica para com os seus chefes, como se fossem profetas ou Messias. 2.2.8. Necessidade de visa*o

O homem de hoje, vivendo sob ameaca de violencia e conflitos, senta

se inquieto em relacao ao futuro, que Ihe parece muito incerto. Muitos, cedendo ao desatino, procuram sinais de esperanca e revelacoes que os livrem da perplexidade.

Ora as seitas parecem oferecer nova visto do homem, da historia e do mundo. Prometem a irrupcao de nova era e de nova humanidad» 2.29. Necessidade de participacáo e comprornisso Este aspecto se prende a varios dos anteriores. As pessoas que querem

prever o futuro, querem também sentir-se responsáveis pelas decisoese tarefas concernentes a esse futuro.

Ora as seitas setisfazem a este anseio, oferecendo missoes concretas a

desenvolver em favor da humanidade "que está para naufragar", exigindo total doacáo do individuo á causa proposta ou h construcao de um mundo melhor.

Em síntese: pode-se dizer que as seitas se implantam cada vez mais por causa da forte conviccao e do calor com que anunciam urna mensagem de "salvacáo" transcendental; vao ao encontró das pessoas mais carentes, onde estas se acham, e Ihes falam de maneira muito pessoal em residencias, rúas, pracas públicas, templos. . . Acompanham intensamente os seus adeptos, orientando-os e tirando-os do anonimata Embora procedarn de maneira nao

raro fantasiosa e nem sempre honesta, encontram acolhida de muitos e mui tos que a vida e a sotiedade deixaram de lado. Para explicar o sucesso das seitas, devenios ainda levar em conta as

suas técnicas de recrutamento e doutrinacáo. Donde o novo titulo:

3. Recrutamento e doutrinacSo Os processos de recrutamento e doutrinacao ñas seitas recorrem fre327

fO

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986

qüentemente á arte da encenacao ou da teatralidade, que se exercem sobre pessoas inconscientes dos objetivos dessas técnicas; isto equivale a certa ma-

nipulacáo dos individuos inspirada por proselitismo ferrenlio. A tática come-

ca tranquila, mas tende progressivamente a exercer controle sobre as pessoas mediante urna lavagem de cranio, ora mais, ora menos acentuada. Os jovens

e as pessoas idosas vem a ser a presa mais fácil de ser captada por esses recur

sos. Tais procedimientos diferem radicalmente dos que a Igreja aplica na pregacao do Evangelho, pois esta nao suprime, mas antes precisa de consenti miento idóneo e responsável da parte dos ouvintes.

Sao estas as principáis táticas utilizadas pelas seitas: - o candidato vai sendo aliciado sutilmente para participar do grupo; a principio nao sabe precisamente quem sao os seus interlocutores; - técnicas de dominio: refe ¡cao gratuita num centro de convencoes

solenes, namoro (flirting-fishing) "bombardeio de amor" (love-bombing); - gestos de ami'zade que constrangem ou tolhem a liberdade do can

didato;

- bajulacao;

- distribuicao de remedios, roupas, dinheiro, em troca de adesao aos

atos de culto da seita;

- ¡solamente: o candidato é privado de toda informacao ou de toda influencia de fora (familiares, amigos, jomáis, revistas, televisao, radio. . .),

que poderia prejudicar a assimilacao dos fascinantes modelos dé comportamentó que Ihe sao incutidos;

- lembranca de possível comportamento desregradodo individuo em

tempos passados (abuso de sexo, drogas...), para que o candidato quebré os liames com a sua vida pregressa e proponha iniciar vida nova;

- bombardeio intelectual, aprésentacao de clichés ou de frases curtas e eloquentes, cerceamento da capacidade de raciocinio e de crítica do indi viduo - o que provoca mudanca de consciéncia ou de personalidade;

- os recrutas sao ocupados permanentemente em tarefas e jamáis dei-

xados a s6s; sao exortados a atingir certa exaltacáo espiritual, que os toma empolgados e dispostos a submeter-se automáticamente ás ordens recebidas; - enfatizacao da pessoa do chefe. Em seitas cristas, a figura de Cristo' pode ser empalidecida em favor da do fundador. A este é preciso tributar in

condicional confianca.

4. Desafio e abordagem pastoral 4.1. Desafio

Pode-se dizer que o fenómeno das seitas é urna das expressoes do esta

do desumano em que se acha a sociedade contemporánea. 328

FKNÓMKNO DAS SEITAS As bruscas mudancas - acarretadas pela industrializacáo, a urbaniza-

pao, as migracóes, o rápido desenvolví mentó dos meios de comunicacáo, a pujanca da tecnocracia — deixam muí tos individuos desorientados, desarrai gados, inseguros e, por conseguirle, vulneráveis. Muitos sofrem a crise da própria identidade (quem é o homem neste mundo?) e as incertezas do futu

ro (desemprego, ameacas de guerra nuclear, perigos ecológicos...). Muitos se interrogam a respeito da verdade e da maneira de descobri-la,. .. a respeito do sentido da vida, ... a propósito das dominacdes ideológicas e políti cas. . . Em suma, um grande vazio se fez no interior de muitos homens e até de grupos ¡nteiros.

A frustracao, o desespero, a falta de motivacao, de protecao, a traicao,

a decepcáo, a marginalizacáo, a solidáo... suscitam espontáneamente a pro cura de luz ou de resposta; em tais circunstancias, o raciocinio é um tanto obnubilado pelos sentimentos e afetos, de modo que a solucáo mais simples

(ou simplona) tende a parecer a melhor e a impor-se como sendo a única e definitiva solucáo. Muitas das pessoas que aceitam tal resposta, aprenderam outrora a agir conscientemente e nao como joguetes ou oportunistas emoti vos, mas a dureza das circunstancias em que se acham, deixa-os perplexos e quase incapacitados de raciocinar com a devida coeréncia.

Tal angustia do homem contemporáneo, se de um lado revela a morbi dez da sociedade de hoje, de outro lado é síntoma de inconformismo do ser humano com o enxovalhamento dos verdadeiros valores; o homem de nossos días é doente porque, apesar dos reveses sofridos, anseia por urna resposipara suas indagacoes transcendental ou místicas. Infelizmente, porém, c movido mais por sentimentos um tanto irracionais do que pela lógica do seu raciocinio (alias, o antiintelectualismo disseminado por correntes existencialistas modernas tem contribuido para o descrédito da filosofia e da razao

e o predominio, claro ou velado, das emocoes e dos afetos). É esse antiinte

lectualismo filosófico que favorece a aceitacao das solucoes prontas e fan tasiosas das seitas.

A Igreja, como portadora da mensagem do Evangelho, sente-se profun damente interpelada pelo desafio das seitas. Ela sabe que entre os fiéis cató

licos houve e há deficiencias, em parte responsáveis pelo mal-estar do mundo

contemporáneo. Mas Ela eré que no tesouro do Evangelho se acham valores novos e velhos (cf. Mt 13,52) a apresentar como auténticas respostas ao ho mem sequioso em nossos días.

Vejamos, pois, quais seriam as linhas pastarais que o fenómeno sugere á Igreja. 329

42

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 290/1986 4.2. Linhas pastorais 4.2.1. O senso de comunidade

Quase todas as respostas ao inquérito lancado pela Santa Sé pedem urna revisao do sistema de comunidade paroquial tradicional; aspiram á for madlo de comunidades mais fraternas, mais adaptadas á vida de seus me ru

bros,. . . comunidades animadas por fé viva, amor fraterno, compreensáo mutua, capazes de ajudar aqueles que trazem problemas particulares de casa mento, de desemprego, de margina lizapao,... comunidades que oram e celebram com um so coracáo e urna só alma. Seriam as comunidades eclesiais de base conservadas na sua autenticidade originaria. 4.2.2. Formacao básica e formacao permanente

As respostas enfatizam também fortemente a necessidade de evangelizacao e catequese para quem nao conhece suficientemente o Credo, e de for macao permanente ou atualizada para' quem já o conhece e para quem o

transmite em aulas, conferencias, pregacoes, etc. O próprio clero, portante, deve passar por essa formacao permanente. Em tal processo a S. Escritura há de ocupar lugar central, sem que se negligenciem a teología sistemática, as diretrizes do ecumenismo, a espiritualidade, a formacao ascético-mística, as teses da Moral... 4.2.3. Abordagem pessoal e abordagem integral

É preciso ajudar cada individuo a tomar consciéncia de que é amado por um Deus pessoal dentro de urna historia que Ele acompanha com sua

Providencia A "velha verdade" deve tornar-se, para cada um, a "nova verdade" pelo fato de ser apregoada com vigor juvenil dentro do contexto de nossos días. Especial atencao há de ser dada á dimensao de experiencia, ¡stoé, á descoberta pessoal de Cristo pela orapao e por urna vida comprometida (tenha-se em vista o que acontece nos gruposcarismáticosecongéneres, quando bem orientados). O zelo pastoral nao deve levar em conta apenas os as pectos espirituais, mas também as dimensóes físicas, psicológicas, sociais, culturáis, económicas e políticas do ser humano. 4.2.4. Identidade cultural

O problema da inculturacao é fundamental. Trata-se do enquadramen-

to do Evangelho dentro dos moldes das diversas culturas do globo e nao ape

nas dentro das do Ocidente. Principalmente as respostas provenientes da

África ¡nsistiram nesta exigencia, assim formulada: "Os africanos querem ser cristaos. Nos Ihes demos a possibilidade de o ser, mas nao Ihes demos

330

FENÓMENO DAS SE1TAS

43

casa própria. . . Querem um Cristianismo mais simples, integrado nos diver sos ángulos da vida cotidiana, nos sofrimentos, ñas alegrias, nos trabalhos, ñas aspiracoes, nos temores e ñas necessidades dos africanos... Os jovens reconhecem ñas 'Igrejas independentes' um auténtico filio da tradigao religio sa africana". 4.2.5. Oracao e culto Algumas respostas sugerem a revisao das formas da liturgia dominical, que é nao raro distante da vida cotidiana dos fiéis. A Palavra de Deus há de ser redescoberta como elemento importante para a construyo da comunidade. A pregacáo, portanto, deve ter um cunho fortemente bíblico; seja devidamente preparada nao somente pela reflexao, mas também pelo testemu-

nho de vida do pregador; urna equipe de clérigos e leigos encarregue-se do

digno desenrolar da Liturgia. A pregacáo, o culto e a oracáo da comunidade nao deveriam ficar necessariamente restritos aos lugares de culto tradicionais. 4.2.6. Participacfo e coordenado

Em vista da insuficiencia numérica dos ministros ordenados é dos Reli giosos, requer-se a formacáo de leigos para que possam assumir as funcoes que o Direito Ihes reconhece. Os leigos-bem formados, e em comunhao com seus pastores, podem exercer papel muito proficuo na abordagem das seitas. Os presbíteros nao sejam considerados como funcionarios da Igreja, mas co mo irmáos, guias, consoladores e homens de oracao. Os Bispos permanegam em contato pastoral com os fiéis e os presbíteros, pois o ministerio dos Bis pos e dos presbíteros é ministerio de unidade e de comunhao, que se deve tornar visfvel aos olhos de todos os fiéis.

5. Conclusao

"Afinal qual deve ser nossa atitude diante das seitas?", pergunta o do cumenta

Para tal indagacáo apresenta urna resposta sabia, que vai, a seguir, reproduzida literalmente: "Entende-se que nio podemos ser simpfesmente irónicos diante do fe nómeno das seitas. Analisamos suficientemente a atuacao das seitas de modo

a ver que as atitudes e os métodos de algumas délas podem destruir a personalidade, desorganizar as familias e a sodedade; as suas doutrínas estao mui to distantes do ensínamento de Cristo e da sua Igreja. Em certos países po demos suspeitar — ou mesmo sabemos — que, através das seitas, estío em 331

44

"PERGUNTE B RESPONDEREMOS" 290/1986

acao farpas ideológicas e interesses económico-políticos totalmente estranhos ao verdadeiro bem da humanidade; utilizam o 'humano' em vista de designios desuníanos.

É necessário informar e acautelar os fiéis, especialmente os jovens; é

preciso até pedir a a/uda de profissionais para que cofaborem coni alvitres e protecao legal. . . As vezes parece-nos que seria válida e merecedora de es tímulo a intervencao radical do Estado dentro da esfera de suas atribuicoes. Sabemos também, por experiencia, que geralmente há pouca ou nenhuma possibilidade de diálogo com as seitas, e que nao somente elas sao fechadas ao diálogo, mas podem, além do mais, tornarse serio obstáculo á educacao ecuménica nos lugares em que atuam. Apesar de ludo, se queremos ser fiéis á nossa fé e aos nossos princi pios — respeito da pessoa humana, respeito da liberdade religiosa, fé na acao do Espirito, que age segundo principios insondáveis para que se cumpra o desi gnio de amor de Deus sobre toda a humanidade, sobre cada individuo, homem, mulher ou crianca - nao nos podemos dar por satisfeitos simplesmente por condenar e combater as seitas, por vé-las postas fora da legalidade ou enxotadas e por saber que os seus membros sao 'desprogramados' a revetia

sua. O desafío das seitas ou dosnovos movimentos religiosos deve estimular nossa renovacao pessoal em prol de mais eficaz acao pastoral.

Este desafio deve também desenvolver em nos e em nossas comunida des o espirito de Cristo frente as seitas; esforcar-nos-emos por compreender o ponto em que se acham e, sempre que possivel, ir-lhes ao encontró no

amor de Cristo.

Havemos de alimentar estes objetivos, confiando na verdade ensinada por Cristo, com amor a todos os homens e a todas as mulheres. Nao pode mos deixar que as preocupacoes suscitadas pelas seitas diminuam nosso zelo pelo verdadeiro ecumenismo entre os cristaos".

Após esta conclusao, o documento apresenta, á guia de Apéndice, a mensagem do último Sínodo dos Bispos atinente ao assunto.

6. Convite do Sínodo dos Bispos de 1985 O Relatório final do Sínodo registrou o reavivamento do sentido do sagrado, a ponto que multas pessoas procuram ñas seitas respostas para o

mesmo (II A. 1). A Igreja é muitas vezes vista simplesmente como instituicáo

jurídica.

331

FENÓMENO DAS SE1TAS

45

Para ir ao encontró de tais anseios. o Sínodo quis lembrar que a Igreja é um misterio (II A; cf. 3.1.6) e comunhao (II B; cf. 4.1, 4.6). Todos os cristSos sao chamados á santidade, ¡sto é, a conversao do coracao e á participa-

pao na vida trinitaria de Deus (II A,4; cf. 3.1.1, 3.1.5). A Igreja, sendo co munhao, deve tornar perceptlvel a participacáb e a corresponsabilidade dos seus fiéis (II C 6; cf. 4.4, 3.1.9). Quanto á inculturacáb, "a Igreja Católica nada recusa do que é verdadeiro e santo ñas religioes nao cristas... Os cató licos devem reconhecer, preservar e fazer progredir os valores espirituais, moráis e sócio-culturais que nelas se encontram" (II D,5). Sobre a justica no mundo, lé-se: "A Igreja deve denunciar de modo profético toda forma de

pobreza e opressáb, defender e promover em toda parte os direitos funda mentáis e inalienáveis da pessoa humana" (II D, 6; cf. 3.2).

O Sínodo quis outrossim recomendar a formacao espiritual dos fiéis (II A, 5; cf. 3.1.7, 4.2), a evangelizacáb e a catequese sistemáticas, acompa-

nhadas do testemunho da vida (II Ba, 2; cf. 3.1.8, 3.1.3), a participacáo na Liturgia (II B.6; 3.1.9, 4.5), o diálogo entre os cristaos (lie, 7), as diversas formas de espiritualidade vigentes na Igreja de hoje (II A,4; cf. 3.1.7) e, de modo especial, o recurso á Palavra de Deus, norma de vida dos fiéis (II Ba 1 e2>.

O documento da Santa Sé até aqui apresentado faz eco a quanto pas

tores e fiéis leigos católicos disseram recentemente sobre a invasao das seitas. Este fenómeno tem seus aspectos preocupantes, sem dúvida; mas há de ser considerado, antes do mais, como urna interpelacao que o homem de hoje, maltratado pela historia contemporánea, dirige a Deus; inconformado com o materialismo e a desagregado dos valores tradicional, ele procura recupe

ra-los; procura, porém, de maneira mais emotiva do que propiamente racio

nal. Em conseqüincia, compete aos fiéis católicos aprasentar mais nítida e

brilhante ao mundo a mensagem do Evangelho entregue por Cristo á Igreja, para que o homem desatinado de nossos dias possa encontrar ai a Resposta que, sem saber definir, ele está procurando. Com efeito, as aspirapoes mais genuínas do ser humano só podem ser plenamente saciadas pela conversao a

Cristo,... conversao que nao deve ter em seu favor nenhum artificio teatral,

mas únicamente o próprio fulgor da verdade. Foi a verdade como tal que,

perseguida pelo Imperio Romano até 313, conseguiu atrair o mundo pagao

a Crista Será ela que, devidamente ilustrada pela palavra e pela vida dos fiéis, consolará e reerguerá o homem contemporáneo abatido e inquieto.

333

Noticias de fonte limpa:

E o caso do padre Falcáo? Em abril pp., fo¡ ordenado sacerdote o Pe. José Cabra I Falcao homem casado que outrora deixou a familia O caso, difundido pelos meios de comunicacao social, suscitou interrogares no grande público. Escrevemos portanto, ao Sr. Bispo de Nazaré da Mata, que ordenou o Pe. FalcSo, a fim

de pedir-lhe informacoes sobre o ocorrido. Muito gentilmente o Sr. Bispo respondeu-nos nos termos seguintes:

Nazaré da Mata, 20 de maio de 1986 Caríssimo Dom Estevao Bettencourt:

Pax\

Recebi sua distinta carta, a que logo respondo, inicia/mente, o processo de Ordenacao do Pe. José Cabra/ Falcao concretizou-se através de um lon

go caminho entre a conversio e a Ordenacao. Convertido, ele entrou numa

fase de seria e generosa penitencia af, no Rio de Janeiro, sendo acompanhado espiritualmente por Dom Joao d'Ávila Moreira Lima, com assisténda da Assodacao BenefÍcente Comunidade Safo Joio Crísóstomo. Em seguida, fez os estudos de Sagrada Teología no Mosteíro de Sao Bento, Olinda, PE. Du-

jante esse tempo de estudos. realizou em paróqulas da Diocesé de Nazaré,

nos fináis de semana, um eficiente trabalho pastoral a base da Oracao e Adoracao ao Santfssimo Sacramento (manifestándose ao mesmo tempo grande devoto da Santissima Virgem), o que permitíu aos Padres em cujas paróquias ele exerceu os ministerios, até o Diaconato, dessem total apoio á sua Ordenació.

Um ano antes da conclusao do curso teológico, encaminheiá Santa Sé o pedido de dispensa do impedimento Hgaminis, conforme reza o Canon 1042. A Santa Sé instou no sentido de que fosse clara, livre e definitiva a disposicao do candidato de assumir o celibato, bem como a renuncia livre e espontánea da esposa ao direito do débito conjugal. Também os fílhos, que

jé estao educados e independentes económicamente, concordaran! com a decisao do Falcao e até rezamporsua fidelidade. Com o encaminhamento dos documentos exigidos pela Santa Sé e anexado o parecer de alguns Padres e 334

O CASO DO PADRE FALCÁO

47

Bispos que o conheciam de perto, bem assim o veredicto do Conselho de Professores da Escola Teológica, todos reconhecendo, no caso, convenio, isto é: urna repetido da historia de Saulo e Agostinho, o SANTO PADRE acolheu benignamente minha solicitacao, permitindo que José Cabral Falcao pudesse ser ordenado Diácono e Padre.

Observa^áfo: — o casamento do FalcSo nSo foi nulo, mas, dispensado o impedimento "ligaminis", teve condicao de ser admitido ao Sacerdocio. £ preciso frisar o compromisso dele e da esposa de assumiram o estado celiba-

tário. FalcSo foi o primeiro homem casado no Brasil a ser ordenado sacerdo te, mas nSo o primeiro na historia da Igreja. É o segundo na América Latina,

porquanto o primeiro ordenado Sacerdote foi Fausto Barriga Ortiz, de 62 anos, e pai de seis filhos. Sua Ordenacio Sacerdotal realizou-se no dia 25 de novembro de 1984. na Catedral da cidade de Los Teques, na Venezuela. A

esposa de Ortiz, dona Leonora Chacón, e seus seis filhos estiveram presentes.

A esposa de FalcSo se externou, considerando que "aconteceuum verdadeiro milagre "e que -"Cabral encontrou o melhor caminho quepoderia ter o pai de meus filhos". Acrescentou ela: - "agora ele é para mim mais um

filho e eu sou para ele sua mae". Consta até que ela declara estar disposta a, logo que se casar o filho que aínda mora com ela, endausurar-se na vida con templativa.

Dom Manuel Lisboa de Oliveira Bispo Diocesano de Nazaré.

Agradecemos cordialmente aoSr. Bispo os valiosos csclarecimentos. *

*

*

Estéváo Bettencourt O.S.a

Livros em Estante A Caminho do Reino, por Marguerite Ph. Hoppenot. Traducao de Nadyr de Salles Penteado. - Ed. Loyola, Sao Paulo 137x206 mm, 164 pp. Este livro apresenta a mensagem e a doutrina espiritual da Sra. Mar guerite Ph. Hoppenot, belga, que fundou no ano de 1940 o Movimento

Séve (Seiva) em París. Tratase de um movimento de leigos, cuja divisa é

"Ser, Amar, Servir e Unir"; destinase a avivar a consciSnda do que é ser Igreja no mundo de hofe, em que muitos católicos se sentem confusos ou ti bios por causa de falta de formacSo e preconceitos. A mensagem da funda dora é haurída da mais pura fonte da espiritualidade da Igreja e exprímese característicamente ñas seguintes palavras da Sra. Hoppenot:

"O Movimento Seiva nSo se desinteressa nem da justica no mundo, nem dos problemas dos países em desenvolvimento, nem da reforma de es335

48

"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 390/1986

truturas, nem do mal-estar atual da Igre/'a. Pelo contraria, é oíante da univer-

salidade e da dimensao desses problemas que Seiva adquiriu a conviccio de que a sua causa inicial é o homem, a qualidade do homem, este homem cuja evolucio espiritual, isto é, plenamente humana, nao seguiu a evolucio do progresso técnico e científico e, por esta razio, nao é mais capaz de dominar

o mundo, nem de orientá-lo para a sua verdadeira finalidade. É por isto que Seiva nao é um movímentó de idéias, mas de acao. Ele gera a acio interro gando primeiramente o instrumento da acao. o homem ou o coracao do ho

mem, chamado a mudar o mundo" (pp. 18s). O Movimentó ¡á foi implantado no Brasil. Ulteriores ¡nformacoes po-

derao ser solicitadas a Sra. Sylvia Borba Leite de Moraes, Rúa Rita Joana de

Souza n? 126, 04601 Sao Paulo (SP); fone: 240-3670. Os fiéis católicos sentem hoje, mais do que nunca, a necessidade de se agrupar e irmanar, a fim de estudarem juntos a sua fé e as exigencias da mesma no mundo atual. Amar e Ser Amado. Comunicapao no Amor, por Pierre Weil. — Ed.

Vozes, Petrópolis, 13a. edicao 1984, 135 x 210 mm, Í65pp. O autor estuda as diversas formas de comunicacao amorosa:a genital, a sensual, a transferencia!, a motivacional, a procriadora, a costumeira, a possessiva. . . Descreve a vida psíquica e o comportamento sexual do homem e da mulher com certo embasamento científico, mas sem filosofía ou sem es

cala de valores. No tocante á doutrina católica, é faino quando diz que "o ato sexual é considerado pela religiao crista como pecado sempre que disso-

ciado da intencao de ter filhos. Isto explica que a Igreja proiba todos os meíos antíconcepcionais mecánicos ou químicos" (p. 74). Na verdade, sabe mos que a Moral Católica admite relacoes sexuais durante o período estéril da mulher por parte de casáis que nao queiram ter filhos; tais relacoes nao

ferem ou nao contrariam a natureza, pois esta mesma se faz estéril no perío do assinalado.

O livro tem o estilo de divulgafio, redigido em incisos curtos e de fácil leí tura, ilustrado por desenhos. Infelizmente, porém, nao preenche a tarefa de colaborar na educacao sexual dos teitores; com efeito, instruoao sexual

sem apresentacao de escala de valores é incompleta; nao atinge o que há de mais típico na pessoa humana, a saber: a aspiracao a ter um ideal de vida só lidamente estruturado. Esse ideal exigirá sempre esforco, autodominio, re nuncia da parte do ser humano, pois "amar nao é querer o outro construido, mas é querer construir o outro"; ora nao há referencia a tal aspecto da temética no livro em foco; dir-se-ia que o criterio da vida sexual é o prazer,... até o prazer de "voltarmos á vida intra-uterina e á vida marinha, nos, mamí feros, que antigamente éramos peix.es e vivíamos em meio marítimo", se gundo a teoría de Ferenczi, que P. Weil cita com certa simpatía as pp. 26-28.

Ás pessoas interessadas em obra mais ampia e profunda, pode-se reco

mendar o livro de Joio Mohana: "A Vida Sexual dos Solteiros e Casados", Ed. Globo, Rúa Sargento Silvio Ht

Til?, fía

de Janeiro (RJ).

- f f.S

336

Para Cursos de Teologia:

1

RIQUEZAS DA MENSAGEM CRISTA (2a. ed.l. por Dom Cirilo Foleh Gomes O.S.B. (falecido a 2/12/83). Teólogo conceituado, autor de um tratado completo de Teología Dogmática, comentando o Credo do Povo de Oeus, promulgado pelo Papa Paulo VI. Um alentado volume de 700 p., best-seller de

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2

O MISTERIO DO OEUS VIVO, P. Patfoort O.P.O autor foi examinador de D.Ci rilo para a conquista da láurea de Doutor em Teologia no Instituto Pontificio Santo Tomás de Aquino em Roma. Para Professores e Alunos de Teologia, é um Tratado de "Deui Uno e Trino", de orientacao tomista e de índole didática, 230 p. Cz$ 37,00.

3

ENCONTRÓ COM A BIBLIA. Pe. Louis Monloubou e Ir. Oominique Bouyssou. 1980. Pontos de referencia para uma primeira leitura da Biblia.

1 Pvolume, Amigo Testamento, 130págs 29volume, Novo Testamento, 104 págs

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5

DIÁLOGO ECUMÉNICO - Temas controvertidos, por Dom Estéváo Bettencourt.

Por Dom Esteva o Bettencourt. OSB

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6

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