Ano Xvii - No. 194 - Fevereiro De 1976

  • Uploaded by: Apostolado Veritatis Splendor
  • 0
  • 0
  • April 2020
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Ano Xvii - No. 194 - Fevereiro De 1976 as PDF for free.

More details

  • Words: 17,406
  • Pages: 50
Projeto PERGUNTE E

RESPONDEREMOS ON-LIN.E

Apostolado Veritatis Spiendor com autorizagáo de Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb (in memoriam)

APRESENTAQÁO

DA EDigÁO ON-LINE Diz Sao Pedro que devemos

estar preparados para dar a razáo da nossa esperanca a todo aquele que no-la

pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos conta da nossa esperanca e da nossa fé hoje é mais premente do que outrora, visto que somos bombardeados por numerosas

correntes

filosóficas

e

religiosas contrarias á fé católica. Somos assim incitados a procurar consolidar nossa

crenca

católica

mediante

aprofundamento do nosso estudo.

um

Eis o que neste site Pergunte e Responderemos propóe aos seus leitores: aborda questóes da atualidade

controvertidas, elucidando-as do ponto de vista cristáo a fim de que as dúvidas se dissipem e a vivencia católica se fortalega no Brasil e no mundo. Queira Deus abencoar este trabalho assim como a equipe de Veritatis Splendor que se encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003. Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual

conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo. A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e

zelo pastoral assim demonstrados.

índice O DIALOGO DO ATEU COM O CRISTAO

49

Cada vez mais comentada:

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA: POLÍTICA E CONSCIÉNCIA

51

AÍNDA A MAQONARtA (nota) Psicología em foco:

QUE É 0 BEHAVIORISMO ?

■■■■

64

...'

65

Fenómeno curioso:

E OS SONHOS PROFÉTICOS?

78

Genialldade da mente e miseria física:

VOCÉ CONHECE BEETHOVEN ?

86

LIVROS EM ESTANTE

•■

92

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

NO

PRÓXIMO

NÚMERO :

Os meios de comunicacáo social e a verdade. — Já ouviu falar de Taizé ? — Quem sao os zumbís ? — Ainda a maconaria.







AMIGO, NAO SE ESQUEJA DE RENOVAR SUA ASSINATURA ! DESEJAMOS CONTINUAR A SERVIR COM O AUXILIO DOS NOSSOS COLABORADORES. X

«PERGUNTE

E

RESPONDEREMOS»

Assinatura anual Número avulso de qualquer mes

Cr$ 60,00 Cr$ 6,00

Volume encadernado de 1975

Cr$ 70,00

EDITORA

REDAQAO DE PR Caixa Postal 2.666 ZC40

20.000 Río de Janeiro (RJ)

LAUDES

S.

A.

ADM1NISTBACAO M

Rúa Sao Rafael, 38, ZCMW 20.000 Río de Janeiro (RJ)

Tels.: 268-9981

e

268-270B

O DIÁLOGO DO ÁTEU COM O CRISTÁO Um famoso dentista francés ateu (será que há realmente

ateus?), Jean Rostand, concebeu o seguínte diálogo: «Dizia um fiel a um incrédulo:

'Como é que vocé conse-

gue viver sem fé?'

Ao que respondeu o ateu:

'E vocé, que tem fé, como é

que vocé nao consegue viver melhor?' » O diálogo é altamente interessante.

1. De um lado, a pergunta feita ao ateu supóe a expe riencia da fé. Perguntar se alguém pode viver sem fé é perguntar-lhe se pode viver sem bússola, sem Norte..., se pode viver sem saber de onde vimos, para onde vamos... A resposta (positiva ou negativa) a tais questóes entra decisiva mente na fundamentacáo de todo programa de vida. Mais: a fé nao está na lógica mesma da nossa linguagem cotidiana? Com efeito; falamos de pessoas e coisas que sao «mais belas» ou «menos belas»...; falamos de procedimentos «mais justos» ou «menos justos»; falamos de «mais bondade» e «menos bondade»; ora será que, ao mencionar o «mais...» e o «menos...», nao estamos implícitamente supondo o Máximo, o Absoluto? Por confronto com qué, dizemos que algo é mais belo ou me nos belo se nao por confronto com a Beleza Máxima ou com a Belezá simplesmente dita? Tudo o que dizemos belo, é belo porque participa limitadamente (até certo ponto) da Beleza! Tudo o que dizemos justo, é justo porque participa limitada mente da Justica! Existe, pois, a Beleza, que é ao mesmo

tempo a Justica, a Bondade, o Amor, a Grande Resposta. É

por isto que o fiel pergunta ao incrédulo como pode este

viver sem fé. Nao leva urna vida desbussolada?... ou urna vida violentada e truncada?

Talvez, porém, diga o ateu: «Nao vejo como chegar á fé! Tenho problemas filosóficos a resolver!» ou «Deus revolucio naria a minha vida, que já está tragada e encaminhada!» A isto poderá o cristáo responder: «Amigo, nao se preocupe. Ore, ore condicionalmente pedindo a fé. Diga: 'Se Deus existe, dé-me a graca da fé!'» Esta prece, condicional como é, nao

compromete o ateu; vem a ser um honesto desafio que o Senhor Deus compreende, pois Ele nos sonda até o nosso mais íntimo. Dizia Frangois Mauriac: «Nao é necessário ter fé para orar. Mas é necessário orar para ter fé». Todos os homens — 49 —

podem orar, até mesmo os ateus (estes condicionalmente), e, orando, iniciam o seu ressurgimento.

2. Doutro lado, o diálogo concebido por Jean Rostand interpela pungentemente os cristáos: «Como pode alguém dizer que tem fé e viver táo mediocremente? Como é possível urna vida táo incolor ou táo incorente?» — Nao há cristáo que nao se sinta vivamente "atingido por estas exclamacóes que

Jean Rostand e outros ateus lhe lancam em rosto.

Se creio

que Deus existe nao como nome apenas, mas como o Primeiro e Supremo Valor, como a Grande Resposta, nao deveria eu colocá-Lo 'á frente de todos os meus atos? De que modo con sigo viver como se nao fosse polarizado pelo Norte? Mais: se creio que Ele existe, nao deveria eu ser inabalavelmente ale

gre e feliz, mesmo em meio as mais vultosas tribulacóes, pois sei qual o sentido do sofrimento, da doenoa, da vida e da morte? Mais ainda: se creio que Ele existe, nao deveria eu

estar disposto a correr os riscos necessários para nao O trair? Dizia S. Agostinho que «ter fé é assinar urna folha em branco e permitir a Deus que ai escreva o que Lihe apraza».

Pois bem. O inicio de novo ano (testemunho da benevo lencia de Deus, que nos chama á oonversáo) incita os cris táos a urna revisáo de vida e a urna programacáo ainda mais amadurecida e consciente. Se sou cristáo, nao vivo apenas a minha vida, de pobre individuo jogado na térra, mas carrego

nao menos do que a causa de Deus (Ele sempre quis confiar-Se aos homens); tudo passa a ser importante em mim, porque tudo está associado á honra e gloria de Deus. Por conseguinte, tudo deve refletir ordem, harmonía, mesmo nos mo mentos mais insípidos ou esmagadores. «O essencial de toda

religiáo consiste em crer que o que sou interessa a Deus. O genuino ateísmo consiste em admitir o contrario ou em resignar-se ao contrario» (Frangois Varillon).

É nestes termos que se desperta a fé do cristáo neste inicio de 1976, quando se ouvem prognósticos de pessimismo e há nuvens sombrías no horizonte. Em meio aos altos e baixos de cada ano que entre e sai, a grande e decisiva tarefa será

sempre a de fazer que Deus deixe de ser mero nome (aquele nome que a crianga, semiconsciente, aprende no catecismo)

para ser cada vez mais um TU, aquele TU que emerge aos

poucos entre os demais em termos definitivos e que dá valor e alegría a todos os outros tu! Na medida em que Ele entrar

realmente na sua vida, vocé poderá construir um mundo novo...

E. B.

— 50 —

«PERGUNTE

E

RESPONDEREMOS»

Ano XVII — N« 194 — Fevereiro de 1976

Cada vez mate comentada:

explosao demográfica: política e consciéncia

Em síntese: O problema do aumento da populacao mundial vem solicitando a atencüo dos governantes e estudiosos. Em Bucarest, agosto de 1974, realizou-se a Conferencia Mundial da Populagáo, na qual se fizeram representar 136 pafses ; estes assumiram entao posicóes diversas frente á questáo, inspirando-se principalmente em interesses políticos. Enquanto as nacdes desenvolvidas ocidentais pleitearam a restriego drástica da natalidade, o bloco socialista, liderado pela U.R.S.S., rejeitou tal pro posta, sugerindo antes medidas de caráter socioeconómico. Quanto aos paí

ses do Terceiro Mundo, em parte concordaran! com o bloco ocidental (assim a India); em parte, porém, reivindicaran! os seus direitos de ter urna populacáo crescente capaz de

povoar os respectivos territorios e explorar-lhes

as riquezas naturais

as nacdes sul-americanas).

(tais

A Santa Sé, presente á Conferencia, salientou os aspectos éticos do problema, pedindo atencSo para os valores típicamente humanos que as solucdes pragmáticas e políticas geralmente esquecem. Após a Conferencia de Bucarest, tém-se feito ouvir vozes que tentam reformular o problema : nao basta acentuar o aumento demográfico em certas partes do globo, pois existe decréscimo de populacao na Europa. As medidas de restrigáo da natalidade podem em alguns países surtir efeitos desastrosos. Em conseqüéncia, os autores cristáos, procurando

levar em conta o problema em toda a sua amplidáo, preconizam a reformulacSo das estruturas económicas internacionais, o auxilio magnánimo

dos povos desenvolvidos aos do Terceiro Mundo a fim de que estes possam ter urna economía próspera e, conseqüentemente, consigam nutrir os seus filhos. Aos governos civls nao compete entrar em questóes de planejamento familiar, pols estas sao de foro Intimo; todavía toca-lhes o dever de instruir as respectivas populacoes sobre o problema; em certos países apregoa-se a elevacáo da idade mínima necessária para o casa mento ; passe de 15/16 anos (como na India) a 19/20 anos.

Comentario: O problema do aumento da populagáo mun dial tem preocupado os Chefes de Governo, economistas e pensadores de todos os países. Quatro bilhóes de habitantes

4

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

povoam a térra e tendem a se multiplicar em proporgóes cres-

centes nos próximos anos. Este fato suscita urgentes problemas no setor da alimentagáo (sempre mais bocas para consumir o pao comum), no plano da educagáo (necessidade de mais esco las), no plano económico e social (procura de empregos con*

dignos...), no setor do. ambiente (poluigáo do ar, das aguas

do mar, dos rios...). Em conseqüéncia, muitas pessoas julgam que a única solugáo plausivel será a coibicáo e diminuicáo da natalidade mundial. É isto que tem levado os estadistas a conceber linhas de política demográfica que levem em conta a

quota de natalidade, a idade das nupcias, o índice da mortáli-

dade, as migracóes internas em determinado país, as migracSes internacionais, a fim de dirigir o aumento numérico dos povos, a sua distribuicáo sobre o territorio da nagáo ou do continente respectivo, a sua repartigáo segundo criterios de idade, sexo... Ora, visto que o problema afeta a consciéncia moral, ñas

páginas seguintes abordaremos algumas de suas facetas e pro

curaremos iluminá-Ias pelos ditames da ética crista.

1. 1.1.

A Conferencia Mundial de Bucarest

Precedentes

O ano de 1974 foi declarado «Ano da Populagáo», espe cialmente dedicado ao estudo da questáo demográfica. O ponto

culminante do programa respectivo foi a Conferencia Mundial da Populagáo em Bucarest, que, de 19 a 30 de agosto de 1974, reuniu 1.100 delegados provenientes de 136 paises, 280 obser vadores de organizagóes nao governamentais, mais de 800 jor-

nalistas, ou seja, um total de aproximadamente 5.000 partici pantes. Foi convidada especialmente uma delegagáo da Santa Sé (Vaticano); esta compunha-se de dez membros: seis dos mesmos eram leigos, entre os quais uma mulher; dois destes provinham de países subdesenvolvidos; o chefe da delegagáo era Mons. Eduardo Gagnon, Presidente da Pontificia Comissáo

para a Familia, que tinha por assessor imediato o Pe. Henri de Riedmatten O. P.

A fim de preparar essa reuniáo, realizaram-se coloquios em que as nagóes trocaram suas experiencias : no Cairo (junho 1973), em Honolulú (agosto 1973), em Estocolmo (setembro 1973), Amsterdá (Janeiro 1974). — 52 —

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

Como base dos debates da Conferencia, foi elaborado por peritos ocidentais um «Projeto de Plano de Agáo Mundial da Populagáo»; defendía a tese de que é necessário deter urgente mente o aumento da populagáo mundial a fim de evitar urna catástrofe eminente. Esse Projeto era acompanhado de vasta bibliografía que alardeava o mundo para os perigos da explosáo populacional e incitava a severas medidas repressivas. Ao lado dessas monografías de tom pessimista, apareceram outras de teor mais reconfortante, que evidenciavam nao haver acordó entre os peritos sobre a solucáo a ser dada ao problema.

Assim, por exemplo, o próprio «Correio da Unesco» (arauto de pessimismo em seu número de julho-agosto 1974) publicou também nesse número (p. 58) trechos de um artigo de Pierre Chaunu, professor da Sorbonne, que chegava a conclusóes diver sas das de outros peritos : "Todas as nossas avalia?5es estao mal focalizadas...

Nos nos deti-

vemos na análise de situacóes que hoje se estao modificando ou mesmo Invertendo... As diminuyes de ritmo de crescimento sao mais surpreere

dentes ainda do que as aceleracóes anteriores. Desde 1955 para a Europa Oriental, desde 1957 para os Estados Unidos, desde 1962 para a Europa Ocidental, urna serie de refreamentos tém-se

produzido!...

Na verdade,

entramos em urna zona de restricóes demográficas C|ue, em última análise, podem custar bastante caro. Espalhou-se urna psicose de medo. Nada há de mais mórbido. É melhor nao frearmos acelerar posteriormente".

ciernáis para

nSo

termos que

Cinco países da Europa (Tchecoslováquia, Franga, Grecia,

Roménia, Hungría) procuram atualmente incentivar o aumento

da respectiva populagáo. Em vista disto, a' Roménia publicou normas que restringem as possíbilidades de aborto legal. Examinemos agora sumariamente 1.2.

Os debates da Conferencia de Buearesr

Já que se tratava de urna assembléia mais política do que

científica, ninguém se surpreenderá diante das atitudes políti cas e ideológicas tomadas pelos delegados dos países partici pantes.

Entre estes, formaram-se blocos distintos :

1) Os países ocidentais, principalmente os anglo-saxónicos e os escandinavos, constituirán! um grupo decidido a esti mular e fomentar a limitagáo dos nascimentos nos países sub— 53 —

6

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

desenvolvidos. Dentro desta eorrente, salientam-se os Estados Unidos da América; esta nagáo tende a estabilizar a sua populacáo no ano 2000; propugnou que todos os povos cheguem á media de dois filhos por familia, ou seja, o suficiente para com pensar o número de óbitos anuais.

2) Os países socialistas, liderados pela Uniáo Soviética, defenderam outra posigáo: os problemas demográficos se devem

a fatores de ordem sócio-económica; desapareceráo se se adotar

urna economía planejada, que garanta pleno equilibrio entre

populacáo, recursos é ambiente. Tais nacóes, portante, nao pensam em remediar aos males da explosáo demográfica me diante restrigáo da natalidade; as medidas tomadas neste sen

tido pelos Estados ocidentais parecem-lhes nao ser senáo nova forma de imperialismo e colonialismo.

Esta posicáo há de ser encarada á luz de um diálogo ocorrido entre representantes dos Estados Unidos e da Rússia em urna comissáo da Conferencia de Bucarest. Um delegado sovié tico elogiou entáo os resultados da economía planejada e as possibilidades de que a térra nutra até mesmo 35 bílhóes de pessoas. Em réplica, um representante norte-americano salientou que a Rússia e a Europa oriental, que exportavam cereais antes da segunda guerra mundial, passaram últimamente a importar cereais, enquanto os Estados Unidos e o Canadá sao celeiros do mundo; e acrescentava com ironía: «É um pouco irrealista que esse grupo de países, com o seu sistema econó mico pretensamente em perfeito equilibrio, diga que o mundo, táo cheio de imperfeigóes, pode nutrir 35 bithóes de pessoas, enquanto esses mesmos países nao foram capazes de alimentar a si mesmos nos últimos dez anos». 3)

Os países em vía de desenvolvimiento nao tomaram

atitudes unánimes, mas, embora apontassem todos a responsabilidade dos países ricos, manifestavam diferengas profundas em seus sistemas políticos e em suas prospectivas.

A China, por exemplo, sendo o país mais povoado da térra e, ao mesmo tempo, o que conseguiu praticamente controlar a sua explosáo demográfica, atacou duramente as potencias dos Estados Unidos e da Rússia e a corrida destas nagóes aos armamentos. Acentuou a importancia de que as populagóes crescam para poder opor-se ao imperialismo. A China nao excluí,

porém, a regulacáo da natalidade, contanto que respeite a sobe

ranía de cada Estado.

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

Os países da Asia meridional e do Sudeste asiático, tendo a India á frente, dotados de índice demográfico elevado e crescento, mostraram-se favoráyeis á redugáo da fecundidade; disseram mesmo esperar auxilio dos países desenvolvidos para conseguir este objetivo.

É na Asia em geral que o problema demográfico é mais grave. Com 2.204.000.000 de habitantes e urna quota de 3 % para o crescimento da populagáo, a Asia é o continente onde a populaeáo cresce mais rápidamente. A Asia de Leste e Sudeste comporta urna terga parte dos habitantes do globo: urna pessoa dentre tres, na térra, ai vive. — O caso da Tailandia ilustra muito bem o problema: o primeiro recenseamento desse país em 1911 acusava 8.000.000 de habitantes ; em 1943, ou seja, 32 anos mais tarde, a populaeáo havia dobrado; em 1957, ou

seja, 15 anos mais tarde, mais 8.000.000 habitavam a Tailandia;

em 1966, ou seja, 9 anos depois, mais 8.000.000 de habitantes povoavam o país. Isto quer dizer que o aumento demográfico na década de 1960 foi igual ao que teve lugar na primeira metade do sáculo XX na Tailandia. O caso de Singapura, cidade colocada sobre urna ilha, é típico para mostrar a radicalidade das medidas de limitacáo que se tém adotado. Visto que tem a densidade de 3.000 'habi tantes por km2, em 1973 foram ai promulgadas drásticas nor mas : o imposto de renda foi reduzido para quem tenha apenas tres filhos; a licenga remunerada é concedida 'á mulher que deva dar á luz, por ocasiáo dos seus dois primeiros partos ape nas (excluido o terceiro); as despesas do parto váo sendo aumentadas á medida que cresce o número de filhos da mesma familia; o parto, porém, é gratuito se um dos cónjuges aceita a esterili2acáo dentro de um mes após o parto; há prioridade de subvengóes para moradia em favor das familias que tenham dois ou menos filhos. Quanto aos países da América Latina e da África, a maioria dos mesmos, tendo baixa densidade de populagáo, insistiu na soberania de cada nagáo a este propósito; combateram todas as formas, implícitas ou explícitas, de pressáo tendente a limi tar os nascimentos. Muitas dessas nagdes afirmam estar ainda necessitando de maior populagáo para explorar os seus recursos naturais; a solugáo dos males da explosáo demográfica estaría ñas estruturas sócio-económicas internacionais, que precisariam de ser reformadas. O Brasil, a Argentina e a Argelia assumiram

posigóes de destaque dentro desta corrente. O delegado da — 55 —

8

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

Algéria dizia textualmente: «Os países subdesenvolvidos tencionam restaurar a supremacía do desenvolvimento sobre a questáo da natalidades-.

A África e a América Latina tém respectivamente 374 e 308 milhóes de habitantes. Estes números tendem a duplicar-se até o fim do sáculo XX. ' 4) A Santa Sé foi convidada a participar da Conferencia, embora soubessem todos os Chefes de Estado que sua posigáo seria inspirada por principios religiosos e moráis bem precisos.

A atitude do Vaticano foi definida desde o inicio por urna

intervencáo de Mons. Eduardo Gagnon a propósito do «Projeto de Plano» : salientava que esse Projeto parecía considerar a familia como instrumento na execugáo de planos políticos mais do que um valor em si mesma; fora encarada sob aspectos sócio-económicos, sem se levarem em conta suficiente as rea lidades profundas que Ihe dáo origem, que justificam as suas

funcóes e que a levam a querer desenvolver-se: o valor da vida, a felicidade e o amor sao elementos fundamentáis de urna autén tica política estatal. Mons. Gagnon salientou outrossim a necessidade de nova ordem económica internacional e de mais justica para promover os povos mais pobres: «a confusáo que aflige

atualmente o mundo desenvolvido deveria conscientizá-lo de que se encontra numa estrada errada» e de que deve rever a sua corrida ao lucro financeiro assim como o seu estilo de vida. Acrescentou: "Receamos

que,

concentrando-se

exclusivamente

sobre

o

aumento

demográfico, fazendo deste o motivo privilegiado de campanhas para o desenvolvimento, aplicando enormes recursos á solugáo deste único pro blema, o Projeto de Plano provoque um desequilibrio de prospectivas e prepare novas frustracóes para o género humano" (texto completo coletánea de Joseph Moerman citada na bibliografía deste artigo).

na

Terminava Mons. Gagnon dizendo que a auténtica solucáo do problema demográfico está no pleno exercício das respon sabilidades e do autodominio de cada cidadáo — valores estes que amadurecem mediante educagáo e formagáo; estas ultrapassam as prospectivas socio-económicas e a competencia do Estado. 1.3.

O texto final

No decorrer dos debates foram propostas mais de trezentas

emendas ao Projeto. Disto resultou um Plano de Agáo Mundial — 56 —

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

sobre a Populagáo em 108 artigos, muito mais equilibrado do que o Projeto. Sejam realgados aqui os dados quantitativos que o Plano tem em mira atingir no ano de 1985 : 1) o cresdmento da populagáo mundial passará de 2,0 % para 1,7 ao ano ; 2)

a duragáo media da vida humana nos países em via

de desenvolvimento passará de 55 para 62 anos. Em nenhum país a duragáo media da vida será inferior a 50 anos nem a mortalidade infantil ultrapassará os 120 entre 1.000 individuos. O Plano considera estes objetivos como etapa intermediaria

para se conseguir a duragáo de 74 anos como media de vida em todo o mundo no ano 2000; isto significaría, em relagáo aos nossos dias, um aumento de 11 anos para a América La tina, 17 para a Asia e 28 para a África ! 3) A natalidade nos países em via de desenvolvimento passará de 38 sobre 1.000 para 30 sobre 1.000 ao ano.

O Plano reconheee outrossim a necessidade de se garantir a todos os casáis a possibilidade de atingir o número de filhos

e o espagamento entre os mesmos que desejem; para tanto, prevé condigóes sociais e económicas indispensáveis, medidas

educativas, servigos de informagáo e assisténcia médica á fami lia. Propugna outrossim a redugáo da mortalidade infantil, a plena integragáo da mulher no processo de desenvolvimento, maior justiga social, mais ampias possibilidades de educagáo, redugáo do trabalho das criangas, idade mínima para se contrair casamento. Na India, por exemplo, a media de idade para o casamento

das mulheres está entre os 15 e 16 anos. Ora um estudo recente calculou que, se essa media subisse a 19 anos, haveria declínio da cota de natalidade de 30 a 50 % em vinte anos apenas! Mas, como se compreende, para elevar a idade de casamento, nao basta urna lei; é necessário modificar as condigóes sociais e culturáis do povo indiano e enfrentar as dificuldades que isto comporta.

O Plano de Agáo foi aprovado nao por votagáo, mas por consentimento geral dos povos representados, excetuando-se a Santa Sé; outras delegagóes manifestaram certas reservas ao Plano, mas nao o desaprovaram. — 57 —

10

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

No termo da Conferencia, Mons. Gagnon exprimiu a posigáo final da Santa Sé : reconheceu, sim, os melhoramentos introduzidos no Plano, como a tese de que o problema da popu-

lacáo deve ser considerado na perspectiva de um desenvolyimento integral, a tese de que nova ordem económica e maior justica devem ser instauradas entre os povos... Todavía dizia que, apesar disto, a ótica do Plano ainda era muito limitada, insistindo desproporcionalmente sobre a redugáo da natalidade; denunciava ambigüidades e afirmagóes inaceitáveis com relagáo á familia, ao respeito da vida e ao emprego indiscriminado dos meios contraceptivos1. Era última análise, esta posigáo sin gular da Santa Sé foi assim justificada por Mons. Gagnon: "Todos compreenderáo que aquí se trata de principios sobre os quais a natureza mesma da Santa Sé prolba a esta qualquer compromisso. Ela deve ser fiel Aquele de quem se deriva a sua missáo. Deve ser fiel outrosslm a toda a comunidade humana, á qual a Santa Sé propSe os seus ensinamentos em espirito de servlco fraterno. Nestas circunstancias, a nossa delegacSo se vé obrlgada a nfio se assoclar ao consentimento que

sanciona o Plano de Agio Mundial da Conferencia".

Embora nao seja «simpático» discordar..., a posigáo da delegagáo da Santa Sé na Conferencia de Bucarest nao deve ter parecido estrarrha aos membros desse certame. Chamando o

Vaticano ao Simposio, os organizadores deste desejavam a colaboragáo específica (ainda que singular) da Igreja Católica. Esta foi oferecida com firmeza e nitidez, mas sem choque ou polé mica. No decurso dos debates, tornou-se evidente a presenga de uma voz que chamava a atencáo para valores típicamente humanos e muitas vezes esquecidos, enriquecendo assim as discussóes com perspectivas novas. A contribuigáo dos delega dos da S. Sé foi, em parte, aceita e, em parte, recusada. Como quer que seja, o balango dessa participacáo em seu conjunto foi positivo.

A Conferencia de Bucarest como tal teve seus aspectos

válidos: os representantes dos principáis povos da humanidade se reuniram para abordar questóes de interesse comum num diálogo muito desejável. Todavía o que chama a atengáo do

observador cristáo, é que os problemas foram abordados sem referencia alguma a parámetros transcendentais: este fato sugere a imagem de uma humanidade que procura tomar em

máos o seu próprio destino sem levar em conta nem o Criador 1 Como se sabe, a

Igreja Católica, mediante a encíclica

"Humanae

vltae" (1968) definiu-se contraria a qualquer intervencSc artificial no processo generativo.

— 58 —

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

11

nem alguma lei moral que se imponha ao homem por provir de instancia superior. Apenas foram tomados em consideracáo criterios socio-económicos e políticos — o que realmente é insu

ficiente para provocar a colaboracáo fraterna dos povos entre si. Feita esta breve resenha da Conferencia de Bucarest, é necessário levar em conta aínda alguns dados que ajudam a esclarecer a situagáo demográfica da humanidade.

2.

Europa: populajao em declínio

Fala-se muito de explosáo demográfica e dos meios de a deter... É somente nestes termos que, na maioria dos casos, se encara a pectiva nao é no mundo ela está em

questáo da populagáo mundial. Todavía tal pers é suficientemente fiel a realidade; com efeito, nao inteiro que a populagáo vai crescendo; na Europa declínio.

O Prof. Pierre Chaunu, em «Courrier de l'Unesco», julho-

-agosto 1974, p. 58, chamava a atengáo para este fato europeu.

As suas idéias foram reproduzidas pela revista «Missi» de

outubro 1974. Visto que sao de grande importancia para possibilitar um juízo. objetivo sobre a problemática, váo aqui resu midamente propostas: "Nao há dúvida, estamos registrando na Europa a mais espetacular baixa de natalldade, jamáis observada no decorrer da historia, a única,

alias, que possamos observar dia por dia. O público europeu

ignora o

único perigo que o ameaca a meio-prazo: o desabamento de urna sociedade sem lilhos".

E quais seriam os motivos de táo sombrío prognóstico do Prof. Chaunu ? Ei-los :

2.1.

Durajño media da vida na Europa

A duracáo media da vida do homem europeu deixou de se alongar. Ela só continua a se estender nos países em via de desenvolvimento. Na Europa, como no resto do mundo, era costume dizer-se que a duragáo media da vida ia crescendo ; este dado era íntroduzido nos cálculos e prognósticos como algo de evidente. Ora há mais de dez anos que isto já nao corresponde

— 59 —

12

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

á verdade na Europa. Tenha-se em vista, entre outros, o caso da Franca: Imediatamente antes da segunda guerra mundial

(1939-

-1945), a esperanca de vida para os homens era de 56 anos e, para as mulheres, de 61 anos. Após 1946, passou a ser de 62 e 68 anos respectivamente; após 1950, era de 65 e 71 anos; depois de 1960, veio a ser de 67,5 e 74,5 ; em 1964 atingía os números-récordes de 68 e 75 anos. Desde entáo registra-se um declínio numérico da longevidade na Franca. 2.2.

Declínio da nalalidade

A quota da natalidade, em vez de subir, tem decrescido. Segundo o «Book of the Year» da Enciclopedia Británica, «há mais de um decenio que a natalidade nos Estados Unidos, no Canadá e na maioria dos países europeus tende a diminuir.

Depois de ter subido um pouco (em seguida a um declínio), entre 1968 e 1970, ela recomegou a cair em 1971...»

Nos Estados Unidos, a fertilidade se sitúa abaixo da quota necessária para manter o equilibrio populacional (nascimentos compensando óbitos). O Departamento do Censo teve que reformular as suas previsóes; julgara que no ano 2000 a populacáo estaría entre os 322 e 270 milhóes; foi-lhe, porém, necessário fixar as previsóes entre os 300 e 250 milhóes (o que equivale a reduzir de 20 milhóes as estimativas).

Na Europa ocidental, o declínio aínda é mais notável. Desde 1970, os Países-Baixos véem a sua quota diminuir um ponto por ano. Na Inglaterra, a queda é de 16,3 para 14,7 sobre

1000 em um ano. Na Alemanha Oriental, após a promulgacáo

da lei que permite o aborto, a quota da natalidade, que era

de 13,8, caiu para 8,7 em outubro 1972, para subir a 11 apro ximadamente no comeco de 1973.

Eis anida, segundo a revista «Missi», um quadro compa rativo das taxas de natalidade em 1963 e 1973 em alguns países da Europa : Natalidade por

Alemanha Oriental Alemanha Ocidental

1.000 habitantes

1963 17,6

18,5 — 60 —

1973 10,6 10,2

Diferenga

— 7,0 — 8,3

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

Espanha Finlandia Franca Italia Países-Baixos

Inglaterra

Suécia U. R. S. S.

21,5 22,0 18,2 19,0 21,7 18,4

19,2

14,8 21,2

13,5 17,6

12,2

16,4 16,0 14,5 14,0

13

— 2,3 — 9,8 — 1,8

— 3,0 — 7,2 — 4,4

— 1,3 — 3,6

Em alguns países, como a Austria, a Bélgica, a Finlandia, as duas Alemanhas, a Hungría, a Suécia e a Grá-Bretanha, a quota de natalidade é inferior á quota de mortalidade. Há ape nas duas excegóes marcantes no ritmo geral dos povos euro-

peus : a Albania maoísta, que em 1963 tinha a quota 39 e conseguiu deter-se em 35 até os últimos tempos, constituindo o

índice de natalidade mais elevado da Europa; a outra excecáo é a da Irlanda católica, que passou de 22,3 em 1963 a 22,5 em 1973. Quanto 'á Roménia, adotou urna legislagáo fortemente natalista, que provocou a ascensáo da quota de 15,7 em 1983 para 18,1 em 1973. O Japáo também está em ascensáo depois de ter conhecido um declínio. Diante de tais dados, o Prof. Chaunu concluí: "Os organismos das NacSes Unidas, surpresos pela alta imprevista que se reglstrou em 1955-1960, tendem a subestimar os sinais de dtmínuigao, que nao cessam de se avolumar. A baixa de fecundidade será muito mais rápida que as previsdes indlcam".

2.3.

Envelhecimento

da

populacáo

Nos países ocidentais verifica-se o envelhecimento global da populacáo. Em outros termos: o número de anciáos aumenta mais rápidamente do que o dos jovens. Cada ano, a proporgáo dos jovens é inferior á do ano precedente.

Na Franca, por exemplo, no inicio do século XX havia

34 jovens de menos de 20 anos para 8 adultos de mais de 65 anos. Atualmente a proporcáo é de 31 para 16. 2.4.

Aumento

da

esterilidade

preeoce

Aínda um grave fator a ser ponderado é o da esterilidade biológica. Mesmo involuntario, este mal tem-se feito mais e mais sentir em conseqüéncia do envelhecimento global da popu— 61 —

14

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

lagáo. Na Franga, por exemplo, 4 % dos casáis sao esteréis apesar de nao o quererem. A quota de esterilidade passa a 10 após os 25 anos e a 33 antes dos 35 anos.

A esterilidade pode resultar de causas bem determinadas. Em primeiro lugar, é urna conseqüéncia dos abortamentos; nos Estados Unidos, apesar das precaugoes tomadas, 10 % das mulheres que praticaranr o aborto, tornam-se esteréis. A seguir, sao recenseadas como causas de esterilidade prematura os abusos da sexualidade, o uso de certos remedios, o declínio geral da saúde...

Na Franga, essas diversas causas explicam que quase a metade das mulheres casadas nao tenham filhos. Estes fatos mostram que, quando urna sociedade se en trega á licenciosidade dos costumes, a sua própría subsistencia corre perigo, pois entra pela via do declínio da populagáo. Geralmente essa licenciosidade decorre da perda da consciéncia dos valores sobrenaturais e religiosos. Ao contrario, a fé, embora tenda a um fim transcendental e aponte para a vida eterna, incita o ser humano a viver corajosamente na térra, respeitando o seu corpo e as leis da vida; a fé apregoa a paternidade responsável dentro da observancia do ritmo da natureza (cf. encí clica «Humanae Vitae»).

3.

Países de forte natal idade

Ao lado do quadro europeu e norte-americano assim esbo

gado, existe, sem dúvida, o conjunto das nagóes de forte natalidade. Situam-se na África, na Asia e na América Latina, cujas populagóes váo aumentando sem proporgáo com a quota de

seus recursos naturais ou ao menos de sua renda «per capita». A fim de mitigar os males da fome, das doengas e das perturbagóes sociais, os Governos respectivos julgam-se obrigados a aplicar medidas drásticas que detenham a crescente taxa de

natalidade : distribuem, por vezes macigamente, anticoncepcionais como a pilula e outros; favorecem a esterilizagáo da mulher ou do homem (como acontece na India, por exemplo); desenvolvem intensa propaganda antinatalista; concedem isengdes e favores as familias pouco numerosas e oneram pesadamente as que tenham muitos filhos.

Esses meios significam, até certo ponto, interferencia do poder público em assunto que é estritamente do foro intimo — 62 —

EXPLOSAO DEMOGRÁFICA

15

ou da consciéncia do casal1; o Estado nao tem o direito de pressionar os casáis no que concerne ao planejamento da fami lia, mas deve respeitar os direitos e a liberdade dos esposos neste particular. O que o Estado pode — e deve — fazer, é chamar a atencáo dos seus súditos para a situacáo populacional e económica do país, expondo-lhes dados concretos a fim de que os casáis se possam nortear com sabedoria e realismo. Além disto, ao Estado é licito adiar, por lei, a idade mínima do casamento, de modo a diminuir a faixa de anos em que possa haver paternidade e maternidade legáis. Na India, por exemplo, a media de idade para o casamento das mulheres está entre os 15 e 16 anos. Algo de semelhante se dá na Indonesia, onde a populacáo duplicou em quarenta anos. Na China comu nista, o Estado elevou as medias de idade para o casamento mediante medidas legislativas e económicas e através de disci plina sexual coletiva.

Sem dúvida, a postergacáo do casamento só pode ser aceita por um povo devidamente preparado para compreender o al cance de tal medida; esta, como tal, pode provocar relutáncia por parte da populacáo interessada.

4.

Cortctusáo

O cristáo nao ignora o problema do aumento demográfico. Sente-se mesmo chamado a colaborar para o resolver na me dida do possivel. A contribuicáo especifica do discípulo de Cristo neste par ticular consiste em lembrar que o problema nao pode ser solu cionado segundo criterios estraníhos á dignidade do ser humano; 1 Alguém objetará: se o Estado nao tem o direito de intervlr em que6tóes de foro Intimo ou de conscléncla dos casáis, a Igreja o tem ? Em resposta, dir-se-á: a Igreja nio é senSo a porta-voz da mensagem de Cristo para todos os homens. Por tsto Ela tem o direito — e até o dever — de propor aos homens a palavra de Cristo ou a Leí de Deus

no tocante ao matrimonio e ao uso do sexo. É precisamente as consclén-

clas que o Senhor Deus e, conseqüentemente, a Igreja se dirige. Note-se, alias, que, ao rejeitar os métodos artificiáis de limitagSo da prole, a Igreja nSo faz senSo expllcitar a lei natural ou a leí gravada pelo Criador no Intimo de todo homem, lei que por isto mesmo ó acesslvel á

razSo de qualquér ser humano.

Os casáis tém a obrlgacfio, em consciéncia, de seguir a Leí do Criador. Por Isto ao Estado que quelra legislar sobre o assunto, compete respeitar a mesma leí; o direito civil e as lels positivas de um país devem

fazer eco á leí e á ética naturals.

_ 63 —

16


este é o primeiro valor a ser considerado e fomentado, qualquer que séja a vía de solugio proposta. Quem aceita este enfoque da problemática, ha de se dispor conseqüentemente a procurar resolver o desafio por vías diversas das que mais comumente sao sugeridas: revisáo do modo como os povos se relacionam entre si, principalmente os povos mais aquinhoados frente aos mais necessitados; melhor distribuigáo das riquezas, servigo de técnicos e cientístas a países pobres, extensáo dos sistemas escolares e educacionais em todos os povos subdesenvolvidos...

contribuiráo valiosamente para que se respeite a dignidade humana, sem os perigos de calamidade que certos prognósticos apontam unilateralmente. A propósito "Le probléme de la population. Une interpellation aux hommes de nolre temps. Dossier presenté par Joseph Moerman". Paris 1975. F. Lombardl, "Bucarest 74: il Plano d'Azlone Mondiale delta popolazione", em "La Clvillta Cattollca", n? 2984, 19/X/74, pp. 181-202.

R. Allix,

"La croissance

de

la

population

mondiale vue

perspective évangéllque", em "Le Christ au monde" pp. 373-381.

AÍNDA

A

dans

une

n? 5, vol. XX, 1975,

MAQONARIA

Urna noticia da imprensa de 27/XII/75 oferece i Redacüo de PR a oportunldade de declarar que esta revista nao assumlu posi?3o própila nem propds tese particular no tocante ás relac8e3 da Ig-eja com a Maconarla. Os artigos mais recentes de PR sobre o assunto acham-se em 179/1974, pp. 415-426 e 168/1975, pp. 372-375 ; nSo fazem senSo expor com fldelldade o teor de dote documentos emanados da Santa Sé aos 19/VII/1974 e 12/111/1975 respectivamente. Estes documentos e artigos

sersavam sobre Loja maconlca. veniencia de se Lo]a macdnica;

a possibilidade de algum fiel católico ser membro de — De quanto fol exposto, nada se seguía sobre a con celebrar a S. Mlssa por ocaslao do aniversario de alguma este aspecto da questüo é independente de quanto foi

abordado em PR.

No próximo número voltaremos ao assunto. A Redacáo de PR

— 64 —

Psicología em foco:

que é o behaviorismo ?

Em síntese: O behaviorismo (cu comportamentismo) é a escola de psicología que se limita ao estudo do comportamento humano provocado por estímulos e sltuacóes; exprime-se em números e valores quantitativos. Em outros termos-: é o estudo meramente objetivo do pslqulsmo humano, rejeitando a introspeccáo ou a pesquisa de fatores ocultos, Íntimos, imprevisíveis, que possam estar na raíz da conduta humana. Esta escota tem seus precedentes na psicofisiologia, na reflexologia e em outras correntes materialistas de psicología, asslm como na filosofía positivista de Augusto Comte.

Na verdade, o behaviorismo nao atinge o Intimo do psiqulsmo humano. Este, além de ser influenciado por estímulos extrínsecos, ó movido por iiberdade e criatividade, que nSo se enquadram dentro de fórmulas quantitativas. Observe-se que diversos individuos colocados diante de um mesmo obstáculo podem reaglr a este de diversas mane iras: ou tentam remové-lo, ou... contorná-lo ou recuam ou se apavoram e arremessam contra ele... Existe no homem um principio de vida e acSo que é transcendental em relacSo á materia e á mecánica e que se chama "alma espiritual". Em últlmq análise, o behaviorismo destrói o específicamente humano, ao passo que a psicología crista procura, antes do mais, definir o homem, reconhecendo nele a imagem e semelhanca do Criador, sempre nova e criativa em sua;> atltudes.

Comentarios: A psicología hoje em dia atrai cada vez mais as pessoas que refletem. Trata-se de urna ciencia que é, ao mesmo tempo, empírica (experimental) e filosófica (espe

culativa) ; se a filosofía se associa sempre ao cultivo da ciencia, ela está especialmente presente em se tratando das ciencias humanas e da psicología. Entre as diversas escolas de psicolo gía, há urna que se acha muito difundida como tal ou sob alguma de suas variantes: é o behaviorismo ou comportamen tismo (doutrina do «behavior» ou comportamento), cuja filo sofía merece atencáo.

Essa escola se concentra no estudo do comportamento

humano concebido como resposta mais ou menos mecánica ou definida a urna situagáo-estímulo; recusam os behavioristas penetrar dentro do fator subjetivo da consciéncia psicológica; rejeitam explicar a partir do «misterio» da pessoa humana os — 65 —

18

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 194/1976

comportamentos da mesma. Tal tese psicológica parece encon trar ilustracáo e comprovagáo em dois dados da historia con temporánea :

— a cibernética fabrica «cerebros» eletrónicos, pernas me cánicas, corasóes artificiáis..., que realizam, a partir de pecas de engrenagem devidamente arquitetadas, certas fungóes do organismo humano ;

— além disto, sabe-se que se fizeram (e estáo fazendo) tentativas de produzca vida em laboratorio. Pela primeira vez, em 1828, o estudioso alemáo Wohler realizou a síntese arti ficial da uréia ; isto parecía demonstrar que a producáo de compostos orgánicos poderia ser obtida sem a colaboracáo de um corpo vivo; por conseguinte, a vida e as reacóes vitáis dependeriam únicamente de reagóes físico-químicas e a psico logía nao teria por objeto senáo investigar a freqüéncia, a rapidez e as leis estatísticas dessas reagdes. Ora a tal teoría dedicaremos as páginas que se seguem, expondo os precedentes do behaviorismo, a posigáo de J. Watson (1878-1958) e estudiosos exponenciais do behaviorismo e, por fim, algumas reflexóes sobre o assunto.

1.

Precedentes

1. Um dos precursores do moderno mecanicismo psicoló gico (o qual estava longe de imaginar as conseqüéncias de suas idéias) foi Rene Descartes (1596-1650). Este filósofo e mate mático julgava que o corpo humano é urna máquina, como qualquer corpo físico; nele vive a alma humana, substancia nao extensa, que faz que o corpo humano se distinga do dos ani

máis e nao seja mero autómato.

2. Nos séc. XVHI e XIX a psicología tomou cunho fortemente materialista. Os arautos do materialismo científico

asseguravam que os fenómenos mentáis e o comportamento do homem podem, em última instancia, ser descritos mediante conceitos das ciencias físicas e matemáticas; as explicares dadas pela psicologia deveriam evitar fatores ou forgas nao observáveis, nao materiais e nao matemáticas. Dentro dessa

corrente distinguiram-se Étienne de Condillac e Pierre Cabanis, na Franga; F. Glisson e Robert Whytt, na Inglaterra; Dubois-Reymond, Ernst Brücke, Hermann von Helmholtz e Karl Ludwig, na Alemanha. — 66 —

BEHAVIORISMO

19

3. A fisiología, desenvolvendo-se no séc. XVHI, levou os estudiosos a distinguir entre ñervos sensoriais e motores, a reconhecer a natureza elétrica do impulso nervoso, a tentar localizar as fungóes do organismo no cerebro, assim como a

outras conclusóes que pareciam confirmar a tese de que o corpo humano é urna grande máquina, cujas atividades sao mensuráveis. Em conseqüéncia, passou-se a cultivar a psico-

metria, ou seja, a técnica de enquadrar os fenómenos psicoló gicos dentro das categorías dos números e da quantidade. 4. Muito significativo foi também nos últimos cem anos o estudo do comportamento dos animáis. De modo especial, destaca-se Ivan P. Pavlov (1849-1936), que obteve o premio Nobel por seu estudo sobre secrecóes digestivas : mostrou que um estímulo originariamente neutro, como urna campainha (que nao é destinada a produzir salivagáo), pode passar a produzir salivagáo na boca de um animal se durante algumas ex

periencias o toque da campainha é associado a apresentacáo de comida; depois de urnas tantas realizacoes, por reflexo inconsciente o animal passa a secretar saliva todas as vezes que ouve o mesmo toque de campainha, aínda que nao lhe seja oferecido alimento algum.- A tais respostas inconscientes dá-se o nome de reflexos condicionados.

Os russos Vladimir Bechterev (1857-1927) e S. M. Sechenov (1829-1905) distinguiram-se também notavelmente como reflexologistas.

As conclusóes desses estudiosos insinuaran! a muitos filó, sofos e psicólogos a tese de que, como o comportamento dos animáis é motivado por reflexos condicionados, também o do homem seria mecanicista; nada haveria de original neste, nem

se deveria admitir a consciéncia, em que o homem, usando de sua liberdade, prepara imprevistas respostas aos seus estí mulos.

5.

Entre as correntes que influiram no surto do behavio-

rismo, está ainda o funcionalismo, cujos principáis mentores

foram -John Dewey (1859-1952) e James Powland Angelí (1869-1949). Esta escola procura saber como as atividades psí quicas sao adaptadas aos estímulos e como se ajustam ao res pectivo ambiente social. Acentúa a base biológica dos atos humanos, valendo-se dos conceitos de evolucáo e adaptacáo postos em voga por Ch. Darwin. O funcionalismo se interessa — 67 —

20

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 194/1976

mais pelos processos mentáis ou pela maneira como a mente se comporta, do que pelos conteúdos da consciéncia e os estados mentáis. Assim o aspecto mecánico ou mecanicista ou materia lista da conduta humana era realoado preponderantemente; encontrou grande aplicacáo ñas áreas da educagáo.

. Um dos funcionalistas da Universidade de Colúmbia, Edward L. ThorndQte (1874-1949), escreveu sua tese de doutoramento a respeito da «inteligencia» animal; para tanto,

empreendeu pesquisas sobre a maneira como caes, gatos e galinhas aprendem a sair de uma caixa quebra-cabega. Em sua tese, publicada em 1898, o autor relatava ter descoberto.um progresso lento e continuo na eficacia da conduta dos animáis postos diante de um problema; afirmava que a aprendizagem ocorre mecánicamente, com a eliminagáo gradual das respostas erradas. Em síntese, asseverava que, em uma situagáo proble mática, o comportamento é inicialmente casual; através deste e de suas conseqüéncias, o animal vai associando mecánica mente estímulos e respostas; a aprendizagem se faz mediante ensaios cegos e erros (trial and error learning, como dizia Lloyd Morgan). Dai a «lei do efeito», formulada por Thorndike: em dada situagáo que estimule o animal, todo ato deste bem sucedido fica gravado na memoria, ao passo que todo ato mal sucedido é eliminado da recordacáo; com outras palavras: a recompensa grava-se ñas faculdades do sujeito, enquanto o castigo nao se grava.

Em 1932, porém, Thomdike reformulou esta lei, «trun cando-a» : a experiencia posterior lhe ensinou que a fungáo do castigo nao é táo eficaz quanto pensara; o castigo nao enfraquece tanto os instintos quanto a recompensa os fortalece; em conseqüéncia, Thorndike propós a eliminagáo da segunda metade da sua lei (relativa ao castigo).

6. Nao se poderia deixar de mencionar neste contexto a psicología associacionista. Esta escola parte da tese de que nao existe propriamente um sujeito ou egó responsável por suas acóes e reacóes espontáneas ou improvisadas, mas o ego é uma colegáo de átomos, ou seja, de sensacóes, idéias e vibragóes, que explicam o comportamento do sujeito. David Hartley (1705-1757) desenvolveu a tese, apresentando urna primeira

psicología fisiológica: cada idéia provocaría um efeito fisioló

gico no cerebro; esses efeitos fisiológicos se associariam para explicar o comportamento humano. Os estímulos extrínsecos produzem, segundo Hartley, vibragóes nos ñervos; estas tém — 68 —

BEHAVIORISMO

21

por resultado as sensagóes. Todavía as vibragóes nao cessam abruptamente, mas continuam depois que o estímulo cessa, em termos mais brandos. Esses residuos de vibragóes tém o nome de «vibratiunculas»; sao responsáveis pelas pós-imagens e pela memoria, e podem estar associadas por contigüidade. As idéias simples constituem grupos ou idéias complexas, de tal modo que a idéia de maga, por exemplo, é um composío complexo de muitos elementos associados. John Stuart Mili (1806-1873) falava de «química mental» para designar a composigáo de idéias; afirmava que a composigáo de diversos elementos pode produzir algo inteiramente novo com propriedades diversas das

de suas partes componentes, como, por exemplo, a unidáde da

agua nao se pode deduzir dos elementos que a compóem; assim as idéias misturam-se e fundem-se urnas com as outras, for

mando novos todos. O associacionismo de Hartley prolonga-se em sua escola; esta tenía explicar os condicionamentos, a aprendizagem de palavras e linguas e certos tipos de comportamento em que a fisiología parece marcante.

Passemos agora ao estudo do pensamento dos principáis

expoentes do behaviorismo.

2.

A escola b&haviorista

1. O estudioso considerado como fundador do behavio rismo é John Broad Watson (1878-1958), pensador norte-ame

ricano. Lecionou na Universidade de John Hopkins de 1908 a 1920. Envolvido em escándalo pela esposa, que pediu divorcio, acusando-o de adulterio, teve de abandonar o magisterio. For jado a dpdicar-se a neeócios particulares, iraressou no setor

da publicidade, onde obteve éxito notável. Quando Hie morreu a secunda esposa (1935), já se havia retirado de t.o'ia participacáo ativa no campo da psicología. Todavía em 1957 a Ame ran Psvcholocical Association, de que fora presidente em

1915. homenacreou-o como «iniciador de urna revolucáo no w>nsamento psicológico». O seu livro mais orieínal é intitulado

«Psychology from the standpoint of a behaviorist»

(1919).

Watson foi até o fim da vida partidario das idéias evolu cionistas de Lamarck, defendendo a hereditariedade (discuti da) de caracteres adquiridos.

Iniciou seus estudos observando o comportamento de ani

máis («animal education»); fez entáo experiencias com ratos, — 69 —

22

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS? 194/1976

macacos resos e pássaros... Numa segunda fase, passou a aplicar muitas de suas idéias e observagóes ao estudo do comportamento das criancas, especialmente dos seus próprios filhos.

Tendo chegado á conclusáo de que, no comportamento dos ani

máis irracionais, tudo se reduz á interagáo de estímulos e respostas, Watson afirmava que o mesmo se dá no ser humano

adulto. Segundo ele, a psicologia deve ser abordada como qual-

quer das ciencias naturais, isto é, com objetividade, recusan-

do-se o elemento subjetivo e imprevisivel chamado a consciéntía humana. Por esta tese, Watson se filiava ia environmentalist school (escola do meio^ambiente), que se opunha as escolas de psicologia introspectiva (psicanálise), ñas quais se admite o elemento pessoal singular e misterioso donde procede em última análise o variegado comportamento humano; os condicionamentos produzidos pelo meio ambiente seriam a chave para a compreensáo da conduta humana.

O potencial de reagáo do ser humano é enorme, segundo Watson, que chegou a escrever: «Déem-me urna dúzia de criangas sadias e bem formadas e o mundo por mim especificado dentro do qual hei de criá-las. E garanto que tomarei urna délas ao acaso e a treinarei para que se torne um especialista de qualquer tipo ou escola — médico, advogado, artista, comer ciante, bem como mendigo ou ladráo — quaisquer que sejam seus talentos, tendencias, capacidades, vocagáo ou a raga de seus ancestrais».

Por conseguinte, a tarefa da psicologia, segundo Watson,

é a de estabelecer as leis que regem as relacóes entre os estí

mulos do ambiente e as respostas dos organismos aos mesmos; em outros termos:... é a de observar o comportamento relacionado com o ambiente; essas relagóes podem ser expressas em termos de quantidade e números.

Watson levou seus

principios até as últimas conseqüéncias: dizia, por exemplo, que o pensamento é urna «fala subvocal», constando de movimentos diminutos das cordas vocais e da língua. Os processos

internos mais sutis do psiquismo humano (também ditos «há bitos ocultos ou implícitos») poderiam ser medidos por meio

de eletrodos colocados na laringe, por exemplo, a fim de se dimensionar o pensamento ou a fala subvocal; em última aná lise, segundo Watson, todas as respostas do ser humano podem ser classificadas como glandulares ou musculares e tudo quanto fazemos é secretar (glándulas) e contrair (músculos); as emogóes estáo associadas aos músculos lisos, ao passo que os instintos aos estriados. — 70 —

BEHAVIORISMO

23

O pensamento de Watson foi assuniido por outros estu diosos, que o desenvolverán! em diregóes diversas. 2. Merece atengáo especial, por exemplo, Edward C. Tolman (1886-1959), que pos em evidencia a índole de totafidade

do comportamento cáo de estímulos e padrees em que o posigáo de Watson

humano. Este nao se deve tanto á interaorganismos, mas obedece também a certos organismo se comporta como um todo. A observaría os fenómenos moleculares, isto

é, pequeños, «microscópicos», ao passo que a posigáo de Tol-

man seria molar, isto é, voltada para a moles, a massa, o

todo. Tolman era levado á sua tese por influencia da Gestaltpsychologie ou da psicología da forma, do conjunto; assim inspirado, este autor nao se preocupava muito com leis fisio lógicas e biológicas (estímulos e arcos nervosos), mas, sim, com aspectos gerais, observáveis no ambiente em que vive o individuo, aspectos aptos a suscitar e explicar as respostas de cada pessoa como sendo um todo.

3. Para nao mencionar outros muitos autores, seja aquí citado ainda apenas o nome de Z. Y. Kuo, psicólogo chinés domiciliado nos EE. UU. da América, que se tornou um dos expoentes mais significativos e origináis do behaviorismo. Muito jovem, manifestou-se antünstmtivista, ou seja, contrario a explicar os comportamentos animáis por meio dos instintos; tentou demonstrar experimentalmente que algumas das atividades animáis geralmente consideradas como instintivas eram simples produto de condicionamento e aprendizado. Nao recusava admitir comportamentos inatos, mas, com Watson,

limitava o número destes e frisava que desde cedo se integravam nos múltiplos processos de condicionamento do animal. Em ampia pesquisa, que foi muito divulgada e comentada, Kuo procurou demonstrar que o gato poderia ser condicio nado a comer o rato

ou apenas matar o rato

ou cagar o rato e brincar com ele sem o ferir ou apreciar a presenga e o convivio do rato. O gato seria dotado táo somente de tendencia inata a rea-

gir a criaturas pequeñas e fugidias; essa reagáo se traduziria em exploragáo e dominio das mesmas. Todavía Kuo nao levou suficientemente em conta que o gato é carnívoro e dispóe de garras e dentes relativamente — 71 —

24

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

possantes; é o que leva a admitir nesse animal urna tendencia natural e espontanea a agredir, matar e devorar as suas presas.

Está claro que as observacóes de Kuo sobre a psicología

dos animáis irrácionais sugeriam semelhantes teorías no to cante ao comportamento humano; este seria o mero reflexo de condicionamentos e estímulos extrínsecos.

Em síntese, o principio fundamental de todo behaviorismo é o que os seus fautores chamam «a estrita objetividade»: deve-se levar em conta o comportamento manifestó dos homens e deixar de lado a consciéncia e a introspeccáo. Mais: a descricáo dos dados psicológicos, nesse contexto, há de ser

feita em centímetros, gramas e segundos (cgs); somente assim a psicología será verdadeira ciencia, dizem os behavioristas. Ora este procedimento assimila a psicología as ciencias físi cas. Tal posigáo se deve, em grande parte, á influencia da filosofía positivista, para a qual só é objeto de ciencia o que é empírico ou experimentável, ficando excluida a metafísica. O behaviorismo difundiu-se amplamente em meados do século XX entre os psicólogos norte-americanos, e vai esten-

dendo as suas influencias de maneira mais ou menos generali

zada a todos os países, inclusive o Brasil.

Importa agora tentar avaliar as teses behavioristas e a filosofía que as inspira.

3.

Reflexao final

O behaviorismo sugere algumas ponderacóes em virtude das quais tal sistema se mostra inepto para abranger a plena realidade do ser humano. 3.1.

Imprevisibilidade criativa

O behaviorismo parte da premissa de que o comporta mento humano é comparável ao de urna máquina, que diante de cada estímulo reage com urna resposta preponderantemente (ou totalmente) instintiva e meoanicista. No homem, nada haveria de transcendental ou de imaterial; nao haveria um

principio de vida capaz de superar as leis da «mecánica hu mana» e de criar respostas novas e imprevisíveis. — 72 —

BEHAVIORISMO

25

Ora a experiencia e a historia desmentem este pressuposto. Embora o homem tenha seus comportamentos mais ou

menos mecánicos e cegos, devidos aos hábitos adquiridos, aos instintos inatos e aos fatores subconscientes, no homem existe

um principio capaz de criatividade e originalidade; é este prin cipio que explica as reagóes múltiplas e, freqüentemente, incontroláveis dos seres humanos colocados ñas mesmas situacóes e diante dos mesmos estímulos. Com efeito, os psicólogos italianos Ponzo e Gemelli realizaram varias experiencias a respeito da capacidade com que diversos individuos se adaptam a mesma situacáo. Assim, por exemplo, imagine-se alguém que viaja de carro á noite através de urna planicie; de repente, vé urna áravore caída sobre o leito da estrada. A experiencia repetida muitas vezes ensina que quem se depara em tal situa cáo, pode tomar diversas atitudes: ou para e tenta remover a árvore, para continuar a viagem; ou, se julga muito difícil esta operacáo, tenta contornar passando sobre o campo con tiguo 'á estrada; ou recua e vai procurar outro roteiro; ou

espera o carro seguinte para pedir auxilio e limpar definitiva mente a estrada, a fim de evitar que motoristas posteriores sofram algum acídente; ou se apavora, perde o equilibrio psí quico e se arremessa contra a árvore ou outro obstáculo..., ou, ainda, nao tem tempo para frear, por incorrer em excesso

de velocidade, de modo que se choca contra a árvore caída... Essas diversas respostas dependem de urna serie de fato res que se combinam de maneira nova e original (pessoal) em cada individuo:

— os fatores emotivos: há personalidades mais calmas e outras mais sensíveis e vibráteis; —'há pessoas mais inteligentes, que, conseqüentemente, discernem mais fácilmente o essencial do problema, libertando-se de notas acidentais, que menos atengáo meregam; nem todos tém o mesmo grau de inteligencia e, por isto, nao rea-

gem todos do mesmo modo, e com a mesma rapidez, aos estímulos;

— há pessoas que tém hábitos numerosos e profunda mente arraigados, os quais impelem a determinado tipo de comportamento, ao qual nao estáo igualmente inclinadas outras pessoas;

— 73 —'

26

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

— mesmo entre aqueles que tém semelhantes hábitos, há os que mais dominio conseguem exercer sobre os mesmos, e há os que mais fácilmente se deixam dominar. Nao há dúvida, é possível agrupar os individuos segundo diversos tipos de adaptagáo: há a categoría dos que superam certeiramente os obstáculos e continuam a executar o plano trabado; há os que se perturbam profundamente e se veem decisivamente prejudicados pelos obstáculos encontrados; há os que tentam recuperar-se, mas nao o conseguem de maneira total e duradoura. Além do mais, dentro de cada grupo podem-se distinguir matizes diversos e pessoais, de modo a ressalvar sempre a singularidade e unicidade de cada pessoa humana.

3.2.

Quetn é o homcm ?

Muitos psicólogos objetam, hoje em dia, ao behaviorismo o fato de que se descuida do mais importante, ou seja, de analisar e definir o que é o homem, o que constituí o homem

como homem ou o que mais caracteriza a natureza deste. O estudo da psicología é pelo behaviorismo extremamente sim plificado, pois, para muitos autores desta escola, se reduz ao binomio estímulo-reaeáo.

A quem queira insistir em que a psicología deve estudar o comportamento ou «behavior», deve-se lembrar a tese, muito válida, de P. Janet: por «conduta» nao se háo de entender apenas as acóes do homem; o conceito de «conduta» é global, envolvendo as arengas, as reflexóes, as opinióes e os julgamentos do sujeito. A conduta extrínseca de alguém depende da sua vida interior ou da sua consciéncia íntima; é nesta que se prepara e elabora o tipo de comportamento do sujeito, mesmo quando esse comportamento é subconsciente. Fazendo eco a esta idéia, deve-se mencionar a «Gestalt-

psychologie» (ou psicología da forma), que, ao contrario das correntes que pulverizam o psiquismo humano, afirma que

cada agáo e reagáo da pessoa é inspirada por um conjunto

unitario resultante das múltiplas fungóes do psiquismo hu

mano: o conjunto (psíquico do homem) é mais do que a soma de suas partes (funcóes), é mesmo de outra índole que essa

soma. Mais: a natureza das partes é determinada pelo todo e — 74 —

BEHAVIORISMO

27

nao vice-versa; nao se deve comecar o estudo do psiquismo humano pela análise de seus elementos, mas, sim, estudar o todo (o conjunto de suas expressóes) para ver quais as suas partes naturáis.

3.3.

Hemnje e liberdade

É certo que todo ser humano tem suas aptidóes e ten dencias inatas, devidas a fatores biológicos, que marcam pro fundamente a sua personalidade desde que cometa a existir. Todavía, além desta heranga congénita, deve-se reconhecer den

tro de todo homem a liberdade de afirmar (confirmar) ou negar (réjeitar), totalmente ou em parte, o seu lastro inato

de inclinacóes próprias e características. Principalmente os sistemas pedagógicos de nossos tempos visam a educar para a liberdade; procuram, sim, fazer que o educando se emancipe de influencias instintivas e cegas congénitas, assim como de sugestionamentos e pressóes, a fim de que a pessoa seja «ela mesma», aceitando e desenvolvendo ou recusando e modifi cando parcialmente a sua heranca biológica. Dir-se-ia, pois, que as modernas técnicas de educagáo se encaminham em sen tido contrario ao behaviorismo.

3.4.

ObjeKvidode e ¡r£rospec$5o

Em conseqüéncia, vé-se que a psicología deve aplicar tanto o método objetivo da análise do comportamento do sujeito como o método subjetivo da introspecgáo; um e outro se complementaria mutuamente e sao inseparáveis entre si. Quem estuda a conduta humana, deve procurar examinar como foi ela preparada e antecipada no intimo da pessoa ou dentro desse. pequeño mundo misterioso e sagrado que se . chama «consciéncia». A raiz da consciéncia psicológica é um principio nao ma

terial, nao mecánico, que todo homem traz em si e que se chama «a alma humana». Essa alma, pelo fato mesmo de transcender as leis rígidas e cegas da materia e ter suas reagóes inéditas, inteligentes e variegadas diante dos mesmos estímulos, é espiritual; sendo espiritual, nao é composta, mas

é simples — o que aínda quer dizer: é imortal (nao se decompóe).

— 75 —

28

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

3.5.

O irracional, a crianza e o adulto

Quanto aos animáis irracionais, infra-humanos, verifica-se,

sim, que seu comportamento é instintivo e estritamente guiado

por reflexos, sem que haja emersáo do sujeito ácima de si mesmo, a fim de rever, corrigir ou melhorar o seu comporta mento. Com outras palavras: os animáis procedem com inte ligencia ao confeccionar os seus ninhos, as suas teias, as suas galerías, as suas tocas...; todavía essa inteligencia tem sede fora deles (no Criador) e nao neles mesmos, pois tais animáis sao incapazes de rever os seus métodos e procedimentos, a fim de aperfeigoá-los e progredir na sua «técnica»; as habitagóes maravilhosamente confeccionadas pelos animáis sao hoje em dia as mesmas que nos tempos anteriores a Cristo. Ao contrario, a mansáo do homem evoluiu e tende a evoluir sempre mais desde os tempos das cavernas pré-históricas e dos

abrigos lacustres até os arranha-céus e «bungalows» contem

poráneos. Por isto se diz que os animáis irracionais tém prin cipio vital ou alma material; a eles se podem aplicar, sem dúvida, as teses e conclusóes materialistas do behaviorismo.

No que diz respeito as criancas, observe-se que, enquanto ainda estáo em fase de consolidacáo e desenvolvimento do cerebro e dos seus sentidos, podem assemelhar-se aos animáis

irracionais em suas reacóes a estímulos.

A alma espiritual,

que a crianca tem desde a conceicáo no seio materno, nao se

pode manifestar com toda a sua inteligencia e criatividade, se nao dispóe dos seus órgáos corpóreos (cerebro, sistema ner voso, sentidos externos e internos) em condigóes de pleno desenvolvimento. É por isto que muitos psicólogos aproximam a psicología da crianca da do animal irracional; esta afinidade pode existir até certo ponto no que diz respeito ao comporta

mento extrínseco; todavía nao deveria ser tomada com base para se dizer que no adolescente e no adulto só existem, como no animal (ou só parecem existir como na crianza) instintos e reagóes reflexas ou mecánicas. A crianga, tornando-se ado lescente, já apresenta criatividade e previsibilidade, que a distanciam sempre mais do animal irracional (se ela é devidamente educada).

A título de ilustrado, merecem ser citadas as observagóes de Gemelli e Zunini em sua obra «Introdugáo á Psicología» (Rio de Janeiro 1962), p. 84: — 76 —

BEHAVIORISMO

29

"Sem sombra de dúvlda, é aspiracSo de todo homem de ciencia o alcancar o máximo de objetivldade: chegar a expressar em números ou quantidades os dados que recolhe. Mas é possfvel que o psicólogo faga isto ? Há fatos que, indubltavelmente, podem ser expressos em medidas e que sSo govemados por leis rigorosas. Isto pode demonstrar-se para a psicofisiologia, para a pslcometria, ou seja, para alguns capítulos da psi cología, a que os cultores de psicología experimental, ate há vinte anos, consideravam que devia llmitar-se a psicología. Porém, se se pretendesse fazer isto com toda a psicología, chegar-se-ia, como já vimos, a desumanizá-la: desse modo a psicología nSo estudarla o homem. O psicólogo, que deve enslnar-nos a conhecer o que é característico do homem (Isto é,

de sua vida psíquica), terla em máo ou fatos físicos ou fatos biológicos ou, no máximo, estudaria as leis de qualquer prucesso psfqulco elementar, mas nao poderia afirmar ter o homem como objeto do seu estudo. NSo se trata de pura hipótese; fol o que sucedeu: basta conhecer a historia

da psicología. Felizmente, como já salientamos, expulso pela porta de

alguns laboratorios de psicología, voltou o homem a entrar pela janela. Afinal pOs-se o psicólogo a estudar o homem; e do estudo do homem fez a psicología o objeto de sua próprla InvestigacSo" (p. 84).

«O homem eliminado pelo homem»..., tal e o problema que o behaviorismo suscita e que o bom senso repudia para reformular a problemática: em que consiste o misterio ou a

singularidade do homem? — A esta pergunta responde a clássica psicología: consiste em que no homem há mais do que materia; há urna alma espiritual, que torna o ser humano

imagem e semelhanca de Deus, criatura imprevisível.

A guisa de bibliografía: Gemelli-Zunlnl, "Introdujo á psicología". Rio de Janeiro 1S62. Burns

Frederlc

A. Tilquin,

"Le

Skinner,

"Ciencia e

behaviorisme".

escolas behaviorIsticas).

Paris

comportamento

1942

humano".

(exposfcáo

das

1967.

diversas

Albert Blandura, "Principies of behavior modiflcation". New-York 1969. Kenneth Haven 1956. Robert

J. S.

W.

R.

Spence,

Sears,

"Behavior

"Ideniificatlon

Solomon, "A synthesis of

theory

and

child

human

Dumas, "Traite de psychologle".

77 —

and

condlllonlng".

rearlng".

behavior".

London

New

1966.

New York 1954.

Fenómeno curioso:

e os sonhos proféticos?

Em sintese: Há sonhos que parecem conter mensagens do além, referindo acontecimentos futuros ou comunicando ordens á pessoa que sonha. : Nao é imposslvel que o Senhor Deus se sirva dos sonhos para se manifestar aos homens; a Biblia o atesta. Todavia julga-se que os sonhos extraordinarios hoje em dia ocorrentes sSo, geralmente, expressoes do psiquismo do próprio sujeito. A psicanálise e a parapsicología estilo em condlcoes de explicar muitos dos sonhos premonitorios e proféticos que impressionam o público. Tenham-se em vista os sonhos de Gloria Lasso, cantora francesa, e de Otto von Bismarck, Primelro-Ministro da Prússla, referidos no corpo deste artigo. A ciencia reconhece os fenómenos de telepatía e percepcSo extra-sensorial; afirma tambóm a capacidade, exis tente em todo ser humano, de conjeturar o futuro com estima e carinho ou com horror. Estas funcdes podem elucidar grande número de previsdes e de percepcdes á distancia que certas pessoas experimentan! em sonho.

Comentario: Nao é raro ouvir-se dizer que determinada pessoa teve um sonho impressionante... As vezes é sonho em que um ser falecido «aparece» ao amigo e lhe pede um favor (mande celebrar Missas, pague dividas deixadas pelo defunto...); ou a pessoa que sonha, tem a intuigáo de que

algo de muito grave (morte, desastre...) está acontecendo —

o que, logo depois que acorda, se confirma para ela. Esses sonhos sao ditos «premonitorios» ou «proféticos» (em sentido ampio).

Dir-se-ia que tém sua causa no além, pois parecem

ser o produto de mensagens provenientes do «outro mundo». É em vista desse aspecto portentoso dos sonhos que abaixo estudaremos o assunto. Trata-se de tema complexo, que os analistas vém considerando com atencáo sem conseguir una-

nimidade em suas teses e interpretagóes. Como que quer seja, com o auxilio da filosofía, da psicologia e da parapsicologia, podem-se hoje em dia fornecer indicagóes valiosas para a interpretagáo de sorvhos ditos «premonitorios».

Comegaremos típico.

por

apresentar

— 78 —

um

sonho

premonitorio

E OS SONHOS PROFÉTICOS?

1.

31

Típico sorteo premonitorio

O jornal «France-Dimanche», aos 19/XÜ/1957, publicou a historia de um sonho apto a despertar sensacáo no público. Gloria Lasso, cantora que nao conseguía sucesso em sua carreira, teve na.noite de Natal de 1954 um sonho maravilhoso, em que urna voz clara e enérgica lhe dizia:, «Vai a

Vendóme, atravessa a passarela e toma o caminho á direita! Verás duas árvores, que assinalam a entrada do cemitério».

A voz acrescentou: «Entra ai. Contarás quatro quaüras; na

quinta quadra, perto de veiha árvore, descobrirás urna sepul tura pequeña abandonada. Kncarregar-te-ás de cuidar deia».

Gloria Lasso tín'ha um amigo, a quem contou esse sonho,

muito perturbada. Ele quería dissuadi-ia de atender ao pedido; mas ñas noites seguintes a mesma voz muito insistentemente se fazia ouvir e mandava Gloria ao cemitério. Entao o jovem amigo resolveu levá-la a Vendóme. Encontraran! as localida

des indicadas e chegaram realmente ao cemitério, onde viram a sepultura abandonada que em sonho fora apontada a Gloria. Ora verifioaram que esse túmulo era o de urna menina cha mada Catarina Labbé, filha dos dois amantes Jacques Algaron e Louise Labbé; havia sido vítima dos amantes e morrera

assassinada; depois fora deixada no esquecimento em seu tú mulo. Os jornais haviam feito grande alarde desse caso, difundindo o noticiario respectivo nos anos de 1953-55. Temió visto

a sepultura,

Gloria Lasso,

profundamente

impressionada, entregou ao guarda do cemitério a sua última nota de dez mil francos para que cuidasse desse túmulo.

No dia seguinte, a cantora assinou o seu primeiro con trato de trabalho artístico. Pouco depois, a mesma voz se fez ouvir de novo em sonho, aprovando o gesto de Gloria e pedindo-lhe que mais ainda se interessasse pela defunta. Entáo Gloria mandou colocar os restos moríais de Catarina Labbé em novo jazigo. Em seguida, na sua profissáo comegou a bater todos os récordes de sucesso. Eis o que comumente se chama «aonho premonitorio». Pergunta-se: corresponde realmente a urna intervengáo de espirito do Além? A defunta Catarina Labbé ter-se-á assim manifestado a Gloria Lasso? E ter-lhe-á obtido de Deus, em troca do seu solícito atendimento, a possibilidade de fazer sucesso em sua carreira ? É o vamos ponderar sob o título seguinte. — 79 —

32

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS!. 194/1976

2.

Á luz «ta psioologta

1. Nao é impossivel que, em certos casos, Deus permita que os vivos, na térra, recebam mensagens através de sonhos. O Senhor Deus parece mesmo ter provocado tais intervencóes junto a certos personagens bíblicos: Abraáo (Gn 15, 12-21); Abimelec (Gn 20, 3-6), Jaco (Gn 28,11-22), José (Gn 37, 5-11), Gedeáo (Jz 6,25s)... Todavía é de notar que a Biblia nao

refere sonhos durante os sáculos que váo do rei Salomáo a Zacarías profeta (6éc. X-V a. C), ou seja, durante toda a a época dos Profetas; isto significa que nesse tempo os sonhos eram considerados urna forma secundaria de revelacáo; a palavra profética, ao contrario, oorrespondia, por excelencia, maneira como Deus se dirigia ao seu povo.

á

2) Em nossos días, os sonhos premonitorios tém sido estudados pelos psicólogos e analistas, que tentam explicá-los como expressóes da realidade íntima do paciente. As explicagóes assim dadas tém, em muitos casos, sua grande verosse-

melhanca. Vejamos, por exemplo, como se elucidaría nessa perspectiva o sonho de Gloria Lasso atrás referido.

1) Antes do mais, seria necessário verificar se o caso da cantora está bem contado ou se o noticiario a respeito do sonho que teve, das medidas que tomou no cemitério e do éxito que teve em sua carreira profissional, corresponde á rea lidade dos fatos... Na verdade, acontece nao raro que os casos «maravilhosos» sao criados, total ou parcialmente, pela fantasía popular... Em conseqüéncia, quem os ouve pode dar importancia a um falso prodigio ou a algo que nao aconteceu ou nada teve de portentoso. 2) Averiguada a veracidade das noticias todas, seria preciso levar em conta o seguinte: os jomáis publicaram mi nuciosamente as ocurrencias do caso de Jacques Algaron e

Louise Labbé; devem ter realizado reportagens também sobre o cemitério e o túmulo abandonado de Catarina Labbé. — Ora é muito possivel que Gloria Lasso tenha lido essas noticias da imprensa, talvez sem lhes dar, no momento, grande importan cia. Guardou-as, porém, na sua memoria inconsciente. É isto que se chama criptotmnésia (Jcrypton = oculto, latente, em grego; mnésia = memoria). É certo que muitas vezes regis tramos em nosso inconsciente urna paisagem, urna cena, um rosto, urna informagáo..., mas nao fazemos uso dessa impres-

— 80 —

E OS SONHOS PROFÉTICOS?

33

Sao; nao a levamos até a nossa memoria consciente, mas a conservamos em nossa memoria (faculdade de registrar) inconsciente.

Alias, os fenómenos de criptomnésia sao freqüentes; tornaram-se objeto de assíduos estudos, como os de Flournoy. Mtütas vezes as impressóes colhidas em passado remoto vém

a baila do sujeito, quando este menos espera. Em conseqüéncia, exclama: «Já vi essa paisagem, esse rosto, essa casa...» E, já nao sabendo onde viu tal imagem, a pessoa é propensa a dizer que só a pode ter visto em outra encamagáo ou na vida pregressa (o que é gratuito, como se depreende fácil mente) .

Por conseguinte, no caso de Gloria Lasso pode-se perguntar se a aparicáo de Catarina Labbé em sonho nao se deve á

récordacáo das noticias que Gloria colhera através da imprensa e que guardara em seu inconsciente (num fenómeno de crip tomnésia) .

3) . Admitida esta hipótese, *pergunta-se: qual terá sido o motivo pelo qual Gloria Lasso se lembrou do caso de Catarina e viveu as cenas do seu sonho? — A explicacáo poderia ser a seguinte: Gloria estava passando por urna fase difícil no seu relacionamento com o mencionado amigo; julgava-se culpada e receava que essa situarlo negativa pudesse prejudicar a sua

carreira de cantora ou o seu futuro. Havia, pois, um drama afetivo no íntimo de Gloria. Ora a moga terá estabelecido, em seu subconsciente, um paralelo entre o caso de Jacques Algaron, Louise Labbé e Catarina, de um lado, e o caso déla mesma com o seu amigo de outro lado. Vivendo o seu drama, Gloria terá tido a reminiscencia do drama de Catarina, que lhe estava

na memoria inconsciente.

4)

Se assim foi, pergunta-se ainda: — com que finalidade

Gloria teve o seu sonho? Qual a intengáo do subconsciente ao fazer Gloria viver tal sonho? — Em resposta, pode-se dizer: esse sonho devia servir — e serviu — para libertar Gloria da penosa situacáo em que se achava. Foi, sim, o que se deu: Gloria, que tinha sentimentos de culpa, lavou-os e eliminou-os, entregando-se á caridade, ou seja, cuidando do túmulo aban donado de Catarina. Liberta do seu sentimento de culpa, ela se dedicou sem restrigóes á carreira artística, conseguindo o pleno sucesso que ela antes nao conseguía. Deixou o relacio-

— 81 —

34

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

namento com o amigo, que a afligía; doravante esse amigo é que foi sendo atormentado por pesadelos, como referiu o jornal «France-Dimanche».

É esta a explicagáo que, á luz da psicología, se pode dar para o sonho premonitorio de Gloria Lasso. É possível que outros sonhos premonitorios e proféticos sejam suscetíveis de análogas explicagoes; em tal caso, perderiam ó suposto caráter de «mensagens do Além».

Nao há dúvida, éstas ponderagóes nao esgotam todas as interrogagóes que os sonhos «misteriosos» suscitam. Faz-se, pois, mister aínda levar em conta o binomio: 3.

Telepatía e sonhos

Pode acontecer que em sonho alguém veja um acontecimento estranho; depois de acordar, tal pessoa é informada de que realmente se deu. Doencas e falecimentos sao assim percebidos em sonho. Tais fenómenos nao significam que o espi rito da pessoa doente ou moribunda saia do seu corpo para

ir comunicar-se com quem está sonhando. Na verdade, o que se dá é um fenómeno de telepatía ou de percepcáo extra-sen

sorial M em tal caso, a pessoa que sonha, percebe á distancia, extra-sensorialmente,

o

acontecimento

que

ocorre,

como se

estivesse presente a este. Percebendo-o, ela o projeta em sua fantasía durante o sonho.

Ainda outras explicacóes se podem propor para sonhos «misteriosos».

4.

1.

Conjetura e desejo

Aínda no tocante aos sonhos previsivos ou proféticos,

é oportuno observar quanto segué:

O ser humano é sempre sequioso de informagóes, prin cipalmente a respeito do futuro. A incerteza no tocante ao futuro pode desgastar a pessoa mais do que urna má noücia i Sabemos que a percepcfio extra-sensorial 6 aquela que se faz Independentemente dos cinco ou seis sentidos externos, por vía que certamente existe, mas cujo funclonamento ainda nao pode ser plenamente definido.

— 82 —

E OS SONHOS PROFÉTICOS?

35

concernente ao porvir. Pesquisas realizadas nos cárceres evidenciaram o seguinte: um prisioneiro que saiba estar con

denado para o resto da vida, pode conseguir tranqüilizar-se e adaptar-se á sua nova situacáo mais fácilmente do que os colegas que ainda nao sabem o que será feito deles. Urna má noticia as vezes é-preferível á ausencia de noticias, pois quem

está informado tenta recuperar a seguranga e reconstruir sua vida a partir da situacáo ingrata de que ele está consciente. Ou ainda: quem está informado, pode (conforme o caso) preparar suas defesas e resistencia para enfrentar os males que Ihe foram anunciados. — Se assim é, pode-se dizer, a quanto parece, que o ser humano em seu subconsciente tem especial capacidade de prever ou conjeturar o futuro e — o que nao é menos importante — de assumir certos comportamentos em fungáo das previsSes feitas.

Na base destes dados, voltemos a examinar os sonhos prospectivos. Poderiam ser elucidados também do seguinte

modo: muitas vezes o ser humano conjetura algum aconteci-

mento futuro; as vezes também deseja-o ou horroriza-o. Ora estas funcóes inconscientes sao suficientes para provocar o sonho respectivo : a pessoa vé em sonho os acontecimentos que ela conjetura e deseja ou abomina. Ora, se tal conjetura está bem arquitetada, ela corresponde á realidade futura; em

tal caso, o sonho que ela provocou, pode ser dito «um sonho profético». Tal profecía, porém, nada tem de sobrenatural, pois se explica pela acáo de faculdades naturais do ser humano. A propósito, cita-se o famoso caso do estadista alemáo Otto von Bismarck, Primeiro-Ministro da Prússia na segunda metade do séc. XIX: sonhou que seria vitorioso em ardua campanha militar contra a Austria, e de fato conseguiu triun

far. — Tal sorrho se explica tranquilamente pelo ardente de-

sejo que o marechal prussiano nutria de superar a Austria : o sonho exprimiu tal desejo; ora, o desejo tendo sido bem sucedido em sonho, Bismarck decidiu empenhar-se com todo o afinco para que se tornasse realidade... Em casos como este, o sonho nao mostra propriamente o que está para acontecer, mas, sim, aquilo que a pessoa quer fazer ou deve fazer; e muitas vezes é isso mesmo que realmente está para acontecer. De modo geral, deve-se dizer que a preciénda absoluta nao existe por vía natural. Pode haver, sim, a profecia como dom de Deus,... dom sobrenatural que ultrapassa as facul dades naturais do ser humano. Se alguém fosse capaz de

— 83 —

36

tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

prever o futuro com exatidáo, poderia encaminhar os acontecimentos vindouros em seu proveito, e em pouco tempo se

tornaría senhor da sua cidade ou quicá senhor do mundo (popularmente se diz: acertaría sempre na lotería esportiva).

O Dr. Lyall Watson, biólogo sul-africano citado na bibliografia deste artigo, que tem feito pesquisas em diversas partes do mundo, estudou cuidadosamente o curso de vida de algumas das pessoas mais ricas e poderosas da historia contemporánea: nao encontrou nesses personagens o mínimo indicio de faculdades estranhas ou prodigiosas; tais pessoas obtiveram sucesso gracas ao seu esforco ou também gragas a fatores de boa fortuna, que as favoreceram; todas, porém, cometerán) seus erros, as vezes elementares ; e nenhuma dispensou as

Kcóes da experiencia do próprio sujeito ou dos antepassados.

Outro tipo de fenómeno merece aínda ser levado em conta, quando se trata de explicar sonhos, a saber:

5.

Extenuando e sonhos

Tém-se feito experiencias para verificar o que acontece quando alguém se priva de sonó por longo período de tempo. Ora pode-se dizer o seguinte: tais pessoas ainda conseguem resolver problemas de aritmética — o que mostra que conservam as atividades conscientes do cerebro. Podem reagir

¡mediatamente a forte jato de luz, apertando urna campamha para ver-se livres do incómodo — o que evidencia que sua capacidade de reagáo nao é alterada. Mas os individuos muito

carentes de sonó já nao conseguem concentrar-se por espago

de tempo prolongado; cometem erros numerosos, quando querem raciocinar, e precisam de refazer sempre os seus racioci

nios a fim de se corrigir. Caso sejam submetidas a mais duradouras provas de insónia, tais pessoas perdem, por vezes mo mentáneamente, consciéncia da realidade que as cerca; e

comegam a ver coisas que nao existem, isto é, p5em-se a sonhar com os olhos abertos. Ninguém diria que estáo sonhando, mas na verdade estáo desligadas do meio ambiente e projetando em sua mente imagens e impressóes guardadas em seu subconsciente. Este fato ocorre especialmente em pessoas impressionáveis, ricas em sensibilidade e imaginagáo; a fan

tasía entáo deixa de ser controlada pelo sujeito esgotado e

póe-se a funcionar livremente como em sonrho, ainda que a pessoa conserve as pálpebras descerradas. — 84 —

E OS SONHOS PROFSnCOS?

37

Este fenómeno langa luz sobre certas visóes e «aparicóes» que algumas pessoas experimentam imprevistamente e que, na falta de auténtica explicacáo, atribuem a seres do Além ou espíritos desencamados redivivos sobre a térra.

Eis algumas pistas científicas e objetivas que contribuem valiosamente para desvendar o «misterio» dos sonhos proféticos. Antes de se procurar explicagáo dos mesmos por recurso direto a Deus e aos santos ou falecidos, é preciso tentar aplicar-lhes as respectivas nocóes de psicología e parapsicologia, que geralmente dissipam as falsas suspeitas de intervencáo do Além. A guisa de bibliografía: Lyall

Watson,

Raymond París 1958. Siegmund

"L'histoire naturelle du

de

Becker,

Freud,

C. Q. Jung,

"Les

songes".

"La sclence des

"L'homme á

surnaturel".

Coll.

"Bilan

revés". París

Jean Lhermitte, "Les

réves".

Robert Amadou,

parapsychologie".

Ania

Teilhard,

"Le

du

symbolisme

du

Paris

réve".

mystére"

6.

1950.

la découverte de son ame".

ídem, "Die Wurzeín des Bewustseins. Zürlch

"La

Paiis 1974.

París

1943.

1950.

1954.

Paris

1948.

Georges Devereux, "Psychoanalysis and the Occult". New York 1951.

X

CARO AMIGO,

SE

VOCÉ

AÍNDA

NAO

RENOVOU

SUA

ASSINATURA,

FACA-0 QUANTO ANTES. CONTAMOS COM SUA COLABO-

RACAO TAMBÉM NA DIFUSÁO DE PR. — 85 —

Genialldade da mente e miseria física:

vocé conhece beethoven ?

Em síntese: Ludwig van Beethoven (1770-1827) é um de que alguém pode ser grande no plano da personalidade tralfSes e ciladas da saúde:e da natureza. Surdo desde os de Idade, Beethoven produziu as suas maíores obras muslcals

testemunho apesar das trinta anos durante os

vinte e cinco e mals'anos de surdez. Atinglu o auge de sua carreira em 1814. Morreu como auténtico cristao, reconfortado conscientemente pelos

sacramentos da Igreja, após ter levado urna vida de luta contra a molestia, a pobreza material e a agresslvidade do seu próprio temperamento.

Ñas páginas que se seguem, além de breve esboco biográfico de Beethoven, sao apresentados alguns textos do compositor que demonstram algo da grandeza de sua alma.

Comentarios: A nossa revista PR tem abordado temas de psicología e, de modo especial, a conciliacáo de neurose e

santidade; cf. PR 188/1975, pp. 344-355. Considerou também a grafologia; esta evidencia que os santos também foram «de argila» ; sujeitos a más inclinas.oes e paixóes, que o amor de Deus neles conseguiu sublimar e superar; cf. PR 188/1975, pp. 356-371.

Propomos agora a figura de Ludwig van Beethoven, um dos maiores genios da música, que se tornou grande apesar do terrível mal de surdez que paradoxalmente o acometeu. Alias, nao só a surdez atormentou Beethoven ; a falta de recursos materiais o ameacou freqüentemente. Todavía esse gigante da arte soube superar o desánimo que nao raro o tentou e, com forte espirito cristáo, desenvolveu o seu talento musical. A IX Sinfonía e a «Missa solemnis» de Beethoven dáo testemunho dessa Vitoria do espirito do compositor sobre as intemperies da materia. Abaixo apresentaremos dados biográficos de Ludwig van Beethoven, seguidos de alguns textos mais característicos desse mestre.

VOCÉ CONHECE BEETHOVEN?

1.

39

Esbogo biográfico

Ludwig van Beethoven nasceu aos 16 de dezembro de 1770

em Bonn (Alemanha) num miserável sótáo de casa pobre. Era de origem flamenga. O pai exercia a profissáo de tenor, mas sofría do vicio da embriaguez. A máe era filha de cozi-

nheiro; casara-se em primeiras nupcias com um camareiro, de quem enviuvara.

Assim Ludwig teve infancia muito severa. O pai quis fazer dele um astro da música, de modo que, aos quatro anos, obrigava o filho a duros e prolongados exercicios de piano e violino, constrangendo-o com tapas e bofetees. Ludwig, assim educado, quase rejeitou para sempre a arte que tinha de aprender.

Em novembro de 1792, foi Beethoven para Viena, a metrópole musical da Austria, onde estudou com grandes mes-

tres

(Mozart,

Haydn

e

Albrechtsberger).

Obtevo

notáveis

sucessos musicais naquela cidade, atraindo para si a admiragao de amigos aristócratas; estes resolveram oferecer-lhe valiosa ajuda de custo, que permitiu ao artista permanecer na Austria e dedicar-se inteiramente á música.

Beethoven cedo foi desiludido do amor, de modo que nao chegou a constituir o lar que ele tanto desejava. Por conseguinte, viveu a sos a vida inteira — o que deve ter concorrido para torná-lo melancólico e fazé-lo sentir especialmente as inclemencias da vida:

Entre 1796 e 1800 comecou a ensurdecer; zoavam-lhe os ouvidos dia e noite. A audigáo enfraquecia-se progressivamente. Por muitos anos a ninguém o disse, nem mesmo aos amigos mais caros. Fugia do mundo para que nao fosse no tada a sua enfermidade. Mas em 1801 já nao a podia esconder. Desesperado, Beethoven chegou a redigir o seu testa mento; estava disposto a suicidar-se. Tal foi a primeira reacjio

á molestia que se avultava. Todavía conseguiu superar a crise, pois tinha formagáo católica. Em conseqüéncia, prosseguiu a

sua carreira, que chegou ao auge em 1814. Depois disto, a

surdez foi piorando, de modo que ficou quase totalmente ¿so lado do mundo. — 87 —

40

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

Beethoven soube fazer da surdez a porta para a interiorizagáo; assim é que conseguiu produzir até o fim da vida obras grandiosas.

Nos últimos meses, ou seja, a partir de Janeiro de 1827, tinha á sua mesa de cabeceira a «Imitagáo de Cristo». Sofría

duramente em seu leito de enfermo; mas, apesar disto, poucos

dias antes de morrer ainda pensava na X Sinfonía, que ele desejava compor. Aos 18/111/1827, vendo-o ainda muito espe-

rancoso a ocupar-se com ..suas obras musicais (na medida do possível), o Dr. Wawruch escreveu-lhe um bilhete em que lhe anunciava a proximidade da morte. Os efeitos dessas linhas sao assim descritos pelo médico: "Beethoven leu-as com singular dominio de si, com lentidáo e reflexáo; seu semblante transfigurou-se. Ofereceu-me a mSo com cordialidade e seriedade, pedindo-me: 'Mande chamar o sacerdote'. A seguir, calou-se e, pensativo, acenou-me com a cabera e disse: 'Eu o reverel em breve'... Recaiu entfio no silencio e na meditacfio".

O sacerdote administrou ao enfermo os últimos sacra mentos, que ele recebeu com fervor; terminado o rito, exclamou: «Obrigado, padre; o Sr. me trouxe a consolagáo... A agonía foi angustiada e dolorosa, terminando entre cinco e seis horas da tarde de 26 de margo de 1827, quando urna tempestade de nevé se abatía sobre a cidade de Viena. Enorme afluencia da populagáo assistiu aos funerais.

Romain Roiland saudou Beethoven como «a mais resplandescente vitória jamáis obtida pelo espirito: um desgrasado,

um pobre solitario enfermo, dor feita homem, a quem o mundo recusou a alegría, criou ele próprio a alegría para dá-la ao mundo. Ele a forjou com a sua miseria, como disse numa

frase orgulhosa em que resumiu a sua vida, frase que é a divisa de toda alma heroica: 'Durch Leiden Freude' (Pelo Sofrimento á alegría)».

Ludwig van Beethoven é digno de atengáo nao somente pela genial obra musical que deixou, mas também pelo tipo de sua personalidade: privado de afeto e carinho na infancia,

teve sempre um temperamento forte e agressivo; este era agugado pelas inclemencias ocorrentes em sua carreira, como a surdez e a penuria de recursos. Nao obstante, foi um homem

de fé, que deixou testemunhos de sua grandeza de alma e de sua tenacidade na luta em prol do ideal que ele acalentava. — 88 —

vocé cónheCe beetiíoveñ?



Vamos, pois, abaixo reproduzir algumas passagens seletas

dos escritos de Ludwig van Beethoven, aptas a mostrar a

fortaleza de espirito desse grande vulto da humanidade. .2.

Antología

Diz-se que Beethoven tinha duas paixóes : a arte e a virtude (=honestidade).

Eis o retrato do artista, que ele deixou em carta a urna pianista: "O verdadeiro artista nio tem orgulho. Ele sabe, Infelizmente, que a arte nio conhece limites; senté obscuramente quanto está afastado da meta e, enquanto outros talvez o admlrem, ele deplora nio ter aínda chegado aonde um genio melhor brilr.e como um sol longlnquo" (texto trans crito de "La vie de Seethoven" de Edouard Herriot, p. 262).

2.

Apesar da sua tempera violenta, Beethoven soube ser

solícito para com os outros.

Em carta a Franz Gerhard Wegeler datada de 29 de junho de 1901, escrevia: "Se o conforto nao aumentou um pouco em minha patria, deve minha

arte consagrar-se a melhorar a sorte dos pobres...

Minhas composicóes se vendem bastante; digo até que, de tio nume

rosas, nem posso satlsfazer ás encomendas recebtdas. Para cada obra, tenho seis, seté editores e mais ainda, se me quero dar trabalho. Nao se discute comigo: fixo o prego e pagam-me. Vé como é encantador I Por exemplo, encontró um amigo em necessidade, e minha bolsa nao me permite auxiliá-lo. Nada mals tenho que fazer senao sentar-me á minha mesa de trabalho para em pouco tempo livrá-lo do apuro" (transcrito do livro "Beethoven" de Romain Rolland, trad. brasileira de José Lannes, p. 126).

Exercia certa tutela sobre seu sobrinho Carlos, cuja máe indigna nao lhe merecia confianca. Por isto escreveu : "Meu Deus,. meu amparo, minha defesa, meu único refugio I Tu les ñas profundidades da minha alma e conheces as dores que experimento quando é preciso que eu faca sofrer os que me querem disputar meu Carlos, meu tesouro. Ouve-me, Ser que . n§o sei como nomear! Atende á súplica da mais, infeliz das tuas criaturas. Socorre-me, ó Deus I Tu me vés abandonado pela humanidade inteira por nao querer pactuar com a injustica. Atende á súplica que te faco, ao menos para o futuro, de viver com o meu Carlos! Sorte cruel, implacável destino! Nao, nao, minha desgrasa jamáis íindará" (transcrito de "Beethoven" de Romain Rolland, p. 67s).

3. Na doenga, Beethoven expandiu o seu íntimo diante de Wegeler aos 29/VI/1801: — 89 —

42

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976 ——

»

"Meu caro e bom Wegeler, quSo grato te sou pela tua lembranca I Bem pouco a mereco e bem pouco faco por merecé-la...

Desgracadamente, um demonio ciumento, minha má saúde, veto-se Interpor Inopinadamente. Há já tres anos que meu ouvldo se torna dia por dia mals fraco. A causa disso deve ter sido urna afeccfio do ventre,

de que eu jé sofría outrora, conforme sabes, mas que piorou multo nestes

últimos tempos: sou continuamente afligido pela dlarréia, á qual se segué extraordinaria fraqueza. Frank quls fortlficar-me com reconstltulntes e tra tadme o ouvido com óleo de améndoas. Mas proslt 1 Nao adiantou nada:

o ouvldo está sempre pior e o ventre continua no mesmo estado. Isso vem durando desde,'o último óutono, e muitas vezes senti-me á beira do

desespero. Um asno de um médico aconselhou-me banhos frios; outro, mais avisado,

banhos

tépidos

do Danubio:

este

tratamento

operou

ma-

ravllhas; o ventre melhorou, mas meu ouvido ficou na mesma ou talvez tenha plorado ainda mais. Neste invernó, meu estado era deplorável: sofría

cólicas medonhas e tive urna recaída completa. Assim andel até o mes passado, quando ful ver Verlng, pois pensava que o meu, mal reclamava sobretudo um cirurgiSo e, de resto, sempre tlve confianza nele. Ele con-

segulu'cortar quase completamente a diarréia violenta; prescreveu-me ba nhos tépidos do Danubio, nos quais me fazia derramar um frasqulnho de licores tonificantes; nao me deu remedio atgum, salvo, há cerca de quatro dias, urnas pflulas para o estómago e urna especie de cha para as orelhas. Acho-me melhor e mais forte conquanto tenha nos ouvidos, noite e dia, urna ronqueira incessante. Posso dlzer que a vida que levo, é urna vida miserável. Já faz dois anos que evito toda sociedade, pois nao posso dizer as pessoas: 'Sou surdo'. Se tivesse qualquer outro oficio, isso seria ainda posslvel, mas, no meu oficio, é urna situacSo terrivel. Que dirlam disso os meus inimigos, cujo número nSo é pequeño ? I Para te dar urna Idéia dessa estranha surdez, digo-te que, no teatro, tenho de sentar-me bem perto da orquestra para compreender os atores. Nao ouco os sons agudos dos instrumentos e das vozes, se me coloco,

um pouco que seja, longe deles. É surpreendente que haja pessoas que nao o tenham percebido ainda na conversacfio. Como sou multo distraído, atribuem tudo á minha distracfio. Quando falam baixinho, mal consigo ouvlr. Sim, ouco bem os sons, mas nfio as palavras; por outro lado, quando gritam, é-me intolerável. O que irá acontecer, só o Céu o sabe. Vering disse que Isso memorará com certeza, se nao sarar de vez. — Mui

tas vezes eu maldisse minha existencia e o Criador. Plutarco me conduziu á reslgnacáo. Quero, se isto todavia é possfvel, arrestar o meu destino, mas há momentos na vida em que sou a mais miserável das criaturas de

Deus. — Suplico-te que nada digas do meu estado a ninguém, nem mesmo a Lorchen; é confidencialmente que te contó tudo isto. Gostaria de que escrevesses a tal propósito a Verlng. Se meu estado nao se alterar, vire!, na próxima primavera, para Junto de ti; alugar-me-ás, nalguma bela re-

giSo, urna casa de campo: quero tornar-me campónio durante seis meses. Taivez isso me faca bem. Resignacáo I Que triste refugio 1 E, no entanto, é o único que me resta 1 — Perdoa-me por trazer mals esta preocupado de amigo para os teus já muitos aborrecimentos".

Beethoven soube reagir ao desánimo, manifestando pro digiosa energía (passou mais de vinte e cinco anos na surzez!). Eis o que mais tarde escrevia ainda a Wegeler: — 90 —

VOGÉ CONHECE BEETHOVEN?

"Mais do que nunca, minha torga física aumenta com minha torga intelectual. Minha mocldade como que principia. Cada dia me aproxima do alvo que antevejo, sem o poder definir. Oh 1 Se me llvrasse desse mal, eu abracarla o mundo. Nenhum repouso I NSo conheco outro senio o sonó. E sou bastante Infeliz por Ihe dispensar mais tempo do que dantes. Flcasse eu livre únicamente da melada do meu mal, e entáo... Nao; eu nao o suportare!. Quero agarrar o destino pelas güelas. Ele nSo conseguirá dobrar-me inteiramente. Oh 1 £ tio belo vivar mil vezes a vida 1" (trans crito de "Beethoven" de R. Rolland p. 38).

Estes dizeres dáo testemunho de magnanimidade rara. Beethoven se impós á posteridade nao somente por seu talento musical, mas também pelo seu perfil de homem interior, capaz de lutar denodadamente em prol de um ideal. Se a Providencia nao o quis isentar de conhecer a fraqueza humana, ele soube vencer as miserias do corpo e da alma com o auxilio da grasa de Deus. A leitura das palavras de Beethoven sugere algumas verdades básicas para a formagáo de toda personalidade, prin cipalmente de um cristáo:

1)

os grandes homens nao foram privilegiados por na-

tureza. Ao contrario, fizeram-se com a graca de Deus, apesar das traigóes e armadilhas que a sua natureza mesma Ihes preparou;

2) os males físicos nao impedem a grandeza de alma de quem os suporta. Ao contrario, sao muitas vezes a ocasiáo para que essa pessoa cresga mais rápidamente em sua estatura interior e definitiva.

Que o exemplo de Ludwig van Beethoven a muitos aproveite! A guisa de bibliografía:

Romain Rolland, "Vida de Beethoven". SSo Paulo.

A. de Rezende Martins, "As nove sinfonías de Beethoven". Sio Paulo. Rodolpho Josetti,

"Beethoven e suas

nove slnfonias".

Rio de Ja

neiro 1945.

Roberto Menna Barreto, "Beethoven e sua sexta Sinfonía". Río de Janeiro 1954.

Edouard Herriot, "La vie de Beethoven". París 1928.

Vincent d'lndy, "Beethoven". Paris 1911. Richard Specht, "Ritratto di Beethoven". Milanos

1947.

Fritz Zobeley, "Ludwig van Beethoven". Reinbek bel Hamburg 1965. Afred lín 1962.

Amenda,

"Appasslonata.

Ein

Lebensroman

— 91 —

Beethovens".

Ber

44

«PERQjJNTE E RESPONDEREMOS» 194/1976

IIvros

em

estante

- Revista da coimmidade Jovem, n? 1, 2, 3 e 4 pelo Pe. Zezinho; n? 5, pelo' Ir. Neryi n? 6, por'N: Maccarl. — Ed. Paulinas, Sao Paulo 1975, fascículos de 200 x 260 mm, entre 31 e 56 páginas. • Temos em mSos os seis prlmelros números dessa nova revista, lanzada pelo Centro de Catequese das Edigdes Paulinas. O primeiro número n3o tem prefacio que aprésente a serie nem indica a periodicidade da revista; percebe-se, porém, que se trata de fascículos destinados á juventude com fins catequétlcos em estilo de linguagem jovem.

Os quatro

prlmeiros fascículos versam

sobre

os sacramentos,

é

oportuna a idéia de apresentar os sacramentos de maneira ilustrada, em estilo que faz eco aos debates travados entre o autor e os jovens. Todavia julgamos necessárlo propor algumas observacdes devem ten escapado á consideragáo do autor.

sobre

expressdes

que

Assim no fase. 1, p. 8 lé-se: "Os sacramentos das Igrejas cristas e sobretudo da Igreja Católica..." Ora há urna diferenga essenclal entre

os sacramentos no protestantismo e no catolicismo: este admite que o sacramento é rito eficaz, que transmite a graca (dom ontológico) simboli zada pelo rito mesmo. O protestantismo, ao contrario, na grande maioria das suas denominacóes, considera o sacramento (Batismo e Ceia, geralmente) como mero símbolo, que fala á fé, á Inteligencia e aos sentidos do crente.

' '

A p. 10 do mesmo fascículo, diz o texto que o pecado é perdoado

desde que o penitente reconhece a sua falta diante de Deus; o sacramento apenas darla a dimens9o comunitaria a esse arrependlmento (algo de semeIhante se encontra no fase. 4, p. 24, coluna 1). Ora a teologia católica enslna que a absolvicüo sacramental nao é mera declaracáo de que o pecado já foi perdoado diretamente por Deus, nem tem apenas fungió comunitaria, mas é o próprlo veículo do perdáo. — Mais: a expressao "Religiáo crista nao católica" é inadequada; melhor seria falar de "denominacSo crista nao católica". Sao estas algumas impropriedades de enfoque teológico que o autor nao terá observado, mas que nao deveriam ser conservadas em futura reedigio dos fascículos.

O fascículo 5 (sobre a Igreja) e o 6? (sobre Jesús Cristo) sio multo

oportunos e beneflclaráo grandemente os leitores.

Felicitamos as EdigSes Paulinas e seus colaboradores pela Iniciativa da nova revista. Apenas enfatuarnos a necessidade de que as formulagóes teológicas sejam sempre precisas, embora recorram ao vocabulario e ao expressionismo dos jovens. Cura do pslquismo, pelo Pe. Edvino A. Frlderichs S. J. — Ed. Loyola, Sao

Paulo, 975, 138x210mm, 102 pp.

O Pe. Edvino é conhecido como psicólogo e parapslcólogo. Desta vez apresenta-nos um compendio de higiene física e mental, desenvolvendo

cinco importantes sugestoes para a saúde de todo ser humano: 1) bem

orientada;

2)

resplracao

profunda;

4) cultivo de pensamientos positivos; consciéncia.

O

autor formula

3)

glnástica

dieta

perseverante;

5) paz com Deus e com a própria

principios

essencials

popular, intercalando casos concretos que ilustram — 92 —

em

estilo

simples,

o seu pensamento.

Certas passagens do livro entram também em questfies de espirltualidade religiosa, na medida em que esta integra uma personalidade bem formada. O livro assim alende a leltores preocupados com problemas psicológicos e médicos de nivel básico; lembra, em certos pontos, at obras de Norman V. Peale, das quais a mais conhecida é "O poder do pensamento posi tivo" ; o Pe. Friderichs toma, com vantagem, o lugar de Norman Peale. Ao falar de ioga, o autor observa sabiamente: "Advertimos os leltores cristaos a nao fazerem confusáo entre a ciencia ioga, que é neutra, uni versal, patrimonio da humanidade, e a religiáo e filosofía hindus, do Oriente, de mentalldade paga. É obvio o fato de muitos conceitos explanados em livros iogues virem mesclados com conceitos metaffsicos hindus, essencialmente pantelstas e nirvánlcos". (p. 21). — Em suma, a obra é destinada a prestar servigo a quem se quelra iniciar em questfies de saúde física e psíquica numa perspectiva genuinamente católica. A mulher na Igreja, presenca e acao hoje, por lrm§ Jeanne Marie Tierny, Leonardo Boff, Pe. Alberto Antoniazzi, Irma Marta Maria Braccini. Colecáo "Vida Religiosa: temas atuais" n? 2. — Coedlgao Vozes/CRB. Petrópolis 1975, 130x180mm, 98 pp. Ainda no Ano Internacional da Mulher apareceu este livro, fazendo eco aos numerosos estudos que nos últimos tempos tém sido realizados sobre a mulher e seu papel na construcüo da sociedade. Trata-se de uma coletánea de artigos resultantes de pesquisas criteriosas. Multo Interessantes sao os dados que a Ir. Jeanne Marie apresenta a respeito das funcóes atualmente exercidas pela mulher na Igreja do Brasil; por exemplo, dentre 135 dioceses aue responderam a um inquérito, 33 fizeram contrato com 114 comunidades de Religiosas para assumlrem paróqulas ; 54 dioceses tSm 293 comunidades de Religiosas desempenhando trabalhos pastorais de maneira permanente; um total de 500 comunidades de Religiosas trabalha de maneira habitual, sem contrato, na pastoral das 135 mencionadas dioceses. O número de mulheres leigas engajadas na pastoral também é crescente. Os resultados desse trabalho feminino sao tidos como muito

alvissareiros, conforme os depoimentos catalogados pela Ir. Jeanne. — No artigo seguinte, Frei Leonardo Boff tece consideracdes sobre "masculino" e "feminino", mostrando que estes dois termos, antes de significar diversldade, acusam "Identldade que se dá numa diferenca"; o "ser homem"

tem duas faces (varao e mulher) ontologicamente feitas para se integrarem mutuamente em todas as suas expressoes. O artigo é profundo e feliz; descobre realmente novas perspectivas da temática. — Também é digno de nota o artigo do Pe. Antoniazzi sobre participagáo e responsabilldade da mulher na Igreja. — A Ir. Marta María encerra o conjunto com os resul

tados de estudos feitos em Porto Alegre sobre a promopüo da mulher. — O livro merece ser estudado com ateng&o. Rumos da Filosofía Atual no Brasil em auto-retratos, vol. 1?. Cole?So dirigida pelo Prof. Dr. P. Stanislavs LadusSns S. J. — EdigSes Loyola, SSo Paulo 1976, 140 x 210 m, 533 pp.

Eis um volume original, pois apresenta a autobiografía de 27 pensa dores que representam a filosofía no Brasil de hoje. Juntamente com o retrato biográfico, o leltor encontra úma resenha da síntese filosófica de cada qual dos autores apresentados, de modo que muitas correntes filosó ficas desfilam perante a mente do estudioso, desde o mais puro tomismo até a "filosofía univérsica" de Huberto Rhoden. É instrutiva e enriquecedora a leitura de tal obra; requer, porém, leitores de pensamento amadurecldo e sólido, que saibam avaliar deyidamente a contribuicSo de cada um dos autobiografados. Aguardamos com interesse e curiosidade o segundo vo lume, que continuará a revelar o grau de cultura filosófica da nossa patria. A obra nao tem precedentes no Brasil; pelo que é especialmente benemérita.

Os deuses dancantqs. Um estado dos Cursllhos de Ctlstandade, por Otto Daña, Prefacio de Rubem A. Alves. PublicacSes CID: Pastoral/4. — Ed. Vozes, Petrópolls 1975, 135x210mm, 171

pp.

O livro foi escrito por alguóm que fez o Cursllho, mas o considera quase exclusivamente do ponto de vista psicológico e sociológico. Descobre entao deficiencias no Movlmento de Cursilhos. — Na verdade, o Cursllho tem seus aspectos meramente humanos, passlvos de cor estudados por especialistas das ciencias humanas. Mas, antes de tudo, os Cursilhos sSo urna expressao da acfio do Espirito Santo na Igreja de hoje. Com efeito; a pregacfio da Palavra de Deus e a adesBo á mesma, motivando conversSo ou mudanca de vida, sio fenómenos que nao podem ser enquadrados ex clusivamente dentro de categorías psicológicas e sociológicas; quem se limita a isto, ou desfigura ou nao percebe o essencial. Eis por que Julgamos o livro de Otto Daña insuficiente em seu conjunto, embora aponte aspectos parciais que realmente merecem atencao. Na verdade, os Cur silhos tém sido um dos rrials eficazes instrumentos de auténticas "ressurreicSés" espirituais, psicológicas e sociológicas. Se alguém verifica neles algo'a methórar, proponha-o em critica construtiva, de modo a. promover

os Cursilhos; mas nunca os destruir. Quem quiser ter urna ímpressáo objetiva e fiel do que sejam os Cursilhos, n9o deixe de ler (também) Teslemunho do 4? dia, por Angelo Palomero. ColecSo "Rota Cristo" 6 — Ed. Paulinas, Sao Paulo 1976, 120x180mm, 108 pp.

r

-v-

O

para

ECO

(nova traducáo)

:i- "P'ela floresta a vagar solitario, Eu perscrutava meu triste fadário,

., ;.

-■■>•'•■

É a voz se arranca de dentro de mim :

"Meu Deus! Nao posso mais viver assim !" De íonge um eco repercute: "Ah, sim I" Ao eco retruquei: "Tudo me espanta...

-'•- ;•

O mundo é mau, e a mim me desencanta...!" E meigo o eco a responder-me : "Canta !" Como cantar, ó eco ? Estou spfrendo

Sem espéranca, de tudo descrendo..."

Monte e floresta replicam : "...crendo!" Surda revolta em mim sinto roncar. Que farei ? Rir ou raneor derramar ?

E logo o eco me arremeda: "Amar!"

Fui obediente ao eco da floresta, E minha vida transformou-se em festa. Pois meus lamentos cederam lugar Ao canto alegre, e creio e sei amar. Amigo

anónimo

Related Documents


More Documents from "Apostolado Veritatis Splendor"