INVESTIGAÇÕES E ATUAÇÃO EM HUMANISMO E EXISTENCIALISMO A Resposta de Rollo May: A coragem de criar
Criar, eis a grande redenção do sofrimento. É o que torna a vida mais leve. Mas para que o criador exista são deveras necessários o sofrimento e muitas transformações. Sim, muitas mortes amargas deverá haver em vossa vida, ó criadores!
Nietzsche
Rollo May (1909-1994) é um psicólogo existencialista norte americano que compreende o processo psicoterapêutico a partir de conceitos filosóficos, sobretudo de Kierkegaard e Nietzsche. Em seus escritos e investigações sobre psicoterapia, também utiliza amplamente recursos advindos do campo da literatura, música, dramaturgia e das artes em geral.
A proposta de Rollo May situa a psicoterapia e a pesquisa no horizonte da criatividade. Para falar da profundidade da experiência humana, recorre a Rembrandt, comparando suas telas desde a juventude, quando eram mais leves e coloridas, até as fases mais maduras, quando vão ganhando profundidade e contrastes mais sombrios. Em Rembrandt, “[...] a transformação de si mesmo e de sua arte andaram de mãos dadas”. Rollo May propõe que o mesmo processo acontece na psicoterapia: a transformação do outro, do cliente, muitas vezes produz a transformação de nós mesmos, psicoterapeutas.
Danaë, 1636
O Retorno do Filho Pródigo, 1669
Para falar da luta pela integridade emocional, a despeito do sofrimento, recorre a Beethoven, afirmando que sua evolução espiritual andava de mãos dadas com seu estilo musical. Na criação artística o que se manifesta é a busca pela ordem.
“A pessoa criadora é aquela que não só tenta estabelecer alguma ordem em sua música ou em sua arte, mas também tenta estabelecer alguma ordem em sua vida”. Para Rollo May, este é o ponto de consonância entre a arte e a psicoterapia: a busca por ordem e sentido.
Rollo May acredita que para empreender essa busca é preciso ter coragem. 1. O que é a coragem? Remontando a Kierkegaard, propõe: “[...] a coragem não é a ausência de desespero, mas a capacidade de seguir em frente, apesar do desespero”. “A principal característica da coragem é originar-se no centro, no interior do nosso eu, pois do contrário, nos sentiremos vazios”.
“A coragem é necessária para que o homem possa ser e vir a ser”.
2. A coragem física
É compreendida por Rollo May como o uso do corpo para o cultivo da sensibilidade, da empatia e da expressão do eu. 3. A coragem moral “Todas as pessoas de grande coragem moral que conheci, ou de quem ouvi falar, detestam a violência”. “É um fato significativo, e quase uma regra, a coragem moral ter origem na identificação da sensibilidade do indivíduo com o sofrimento do próximo”. “A forma mais comum de covardia esconde-se por trás da frase: ‘Não quis me envolver’”.
4. A coragem social
“É a coragem de se relacionar com outros seres humanos, a capacidade de arriscar o próprio eu, na esperança de atingir uma intimidade significativa”. “Por estranhas razões, envergonhamo-nos de compartilhar o que realmente importa”. 5. Um paradoxo da coragem
A dialética entre convicção e dúvida é característica dos mais elevados tipos de coragem. “O relacionamento entre o compromisso e a dúvida não é, de modo algum, antagônico”. Advém da compreensão de que a verdade ultrapassa tudo o que se pode dizer ou fazer.
6. A coragem criativa “[...] é a descoberta de novas formas, novos símbolos, novos padrões segundo os quais uma nova sociedade pode ser construída”. Na psicoterapia, a coragem criativa se revela quando o cliente consegue estabelecer novos padrões de comportamento, comunicação e relacionamento.
Mas o ato criativo, muitas vezes sofre retaliações. Como no mito grego de Prometeu. O que no mito se expressa como “punição dos deuses”, em nossa sociedade “punições” análogas advindas do conformismo, da apatia, da busca pelo conforto, pelo prazer e pelo poder. O cliente de psicoterapia que constrói um repertório criativo pode ser rejeitado e hostilizado por um meio habituado à submissão e ao conformismo.
Referências MAY, R. Minha Busca da Beleza. Petrópolis: Vozes, 1992. (Cap. 8) MAY, R. A Coragem de Criar. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002. (Cap. 1) NIETZSCHE, F. Assim Falou Zaratustra. São Paulo: Rideel, 2005.
Profa. Ma. Débora Inácia Ribeiro – UNITAU