Escola Secundária Artística António Arroio Português Professora: Elisabete Miguel
Bartolominha e o pelicano de Mia Couto
Tiago Miguel Ferreira nº 25 - 10º F
O conto é a forma narrativa, em prosa, mais pequena. Tem como objectivo a precisão, a simplicidade e detalhe em poucos aspectos e tenta passar uma pequena moral, normalmente no fim. Tem poucas personagens e, maioritariamente, tem mais acção do que momentos descritivos, de pausa. Este tipo de histórias vem já desde 4000 a.C. no Egipto, de livros religiosos, até textos da autoria de Eça de Queirós em 1902.
Depois da leitura de alguns dos muitos contos de Mia Couto, cativou-me a atenção “Bartolominha e o pelicano”, do livro Na Berma de Nenhuma Estrada, e é nesse conto que eu baseio o meu trabalho.
Bartolominha e o pelicano Síntese da acção
Um neto que explica que a sua avó, Bartolominha, mora numa ilha, num sítio isolado, e o seu avô, Bastante António, faroleiro, lá vive com ela. Ora, um dia, subindo as escadas do farol, o avô morreu e só anos depois é que a família recebeu a triste notícia. Bartolominha tinha a mente decidida, e ficaria na ilha em que seu marido morreu. De seguida perguntaram-lhe como arranjaria sustento e aí ela mostrou um pelicano que lhe trazia comida.
O neto voltou à ilha e lá ficou uns dias. Numa noite, enquanto Bartolominha dormia com o pelicano, o neto levantou-se e, guiado por um estranho impulso, investigou a campa do avô e reparou que, em vez dos restos deste estavam os restos de um pássaro. Subiu até ao cimo do farol e pensou ter visto sua avó desaparecer a voar. A partir daí, ele ocupa o lugar de faroleiro.
Personagens Neste conto, o narrador não descreve fisicamente qualquer uma das personagens (apenas uma vez para descrever o que Bartolominha trazia vestido). A história desenvolve-se simplesmente à volta de Bartolominha, Bastante António, e o seu neto e só os podemos retratar com a relação entre os quatro e as atitudes que tomaram no decorrer do conto.
Bartolominha é a personagem principal e é modelada, porque, ao longo da história, o leitor vai reparando nas diferentes acções e atitudes tomadas pela avó. Bartolominha é teimosa, dedicada e fiel pois cumpre o desejo de seu marido de guardar o farol e não deixar que nada lhe aconteça. Também tem uma atitude parental para com o pelicano que criou desde pequeno e se afeiçoou a ela. Era sonhadora, pensava que, ficando com o pássaro, aprenderia a arte de voar.
Bastante António é personagem secundária, plano. É uma pessoa persistente, responsável e fiel pois sempre respeitou o seu trabalho e manteve-se trabalhando no farol para bem dos barcos que por lá passavam. Mesmo as pessoas que controlam os salários e os serviços à sociedade (pessoas do governo) lá se esqueceram dele. Mas Bastante não ligou importância, não se queixou, e manteve o seu posto.
O neto é um personagem secundária e modelada. É uma pessoa preocupada, pois quando recebe notícia da morte do seu avô e da avó se encontrar sozinha parte com a família para a tentar salvar dali. Depois disto passa noites sem descanso a pensar na solidão de Bartolominha e decide revisitar a ilha durante uns dias para a persuadir a sair daquele sítio. Sendo atencioso, diz que lhe daria aconchego e abrigo ou levá-la a viajar. Também é curioso, pois antes da avó desaparecer do farol já ele investigava o lugar. Chegando ao fim, percebemos o porquê de ele ser uma personagem modelada. O neto do avô Bastante torna-se o faroleiro daquela ilha, de onde ele tanto queria tirar a avó, mostrando uma completa mudança de atitudes.
Há outras personagens, secundárias como o pelicano. Também figurantes, os membros da família de Bartolominha mas que muito pouca importância têm para a história e não desempenham papel no decorrer das acções.
Algumas frases "plasticamente" interessantes
"Esqueceram-se dele ali, os dos serviços centrais, lá onde o dinheiro brilha e a gente apodrece." - esta frase refere-se ao facto de Bastante António trabalhar no farol voluntariamente, sem se preocupar se recebe salário ou não. Aqui, o narrador descreve os políticos como pessoas corruptas ("a gente apodrece") cujo objectivo é somente ter dinheiro ("onde o dinheiro brilha") e poder.
"Num segundo, essa intermitente luz de dentro deixou de lhe iluminar o peito." - esta frase relata a morte de Bastante António. Actua quase como uma comparação entre o farol e o avô pois, tal como o farol tem uma luz no seu interior, também o avô a possuí. Quando Bastante morre essa luz desaparece de ambos.
"A velha senhora tinha raízes fundas." - esta frase descreve a experiência de vida que a avó tinha. É uma metáfora que explica que já viveu muito e a sua sabedoria e o seu pensamento já chegaram a lugares muito distantes e fundos na sua mente.
"Deitei-me olhando as estrelas como buracos no fundo preto de um tecto. Me deixei adormecer mas logo fui despertado por um estranho pesadelo. Na realidade, eu não sonhava com nada. Nem mesmo entendia o porquê desse meu impulso ao erguer-me da esteira. Era como se eu fosse guiado por vozes, escuro adentro. Me dirigi à campa e raspei as areias com os pés. Descobri então que o buraco era raso: a sepultura não tinha fundura nenhuma. Quando me debrucei sobre os restos vi os ossos que se esfarelavam. Eram ossos de pássaro. E um muito volumoso bico."
Este parágrafo foi o que mais me emocionou simplesmente pelo suspense. A acção pareceu-me ser a mais rápida em todo o conto. Li este excerto com ansiedade pois começa logo a dizer que o neto se levanta do seu sono e, sem razão aparente, dirige-se à campa do avô. Logo aí, as palavras quase que dão uma sensação macabra enquanto se lê. Depois ele descobre que, em vez dos ossos do avô, estão os ossos de um pássaro, neste caso de pelicano. É este aspecto quase surreal no fim que me despertou mais a atenção na história. O narrador levanta esta questão dos restos mortais do animal duma maneira simbólica, melhor interpretada com a leitura do resto do conto.
O título
Bartolominha e o pelicano é um título simples que enuncia duas personagens da história. Com este título, o autor pretende destacar a relação importante entre a avó e o pássaro sendo crucial no decorrer do conto, principalmente no final.
O final
Gostei do final pois é sobrenatural. Podem ser retiradas variadas interpretações da história e o narrador permite muita subjectividade com este final . Acaba simbolicamente. Pelo ponto de vista do narrador, o neto pensa que viu Bartolominha desaparecer, a voar para longe do farol. Provavelmente aprendeu mesmo a arte de voar com o pelicano. Na minha opinião, o narrador, através destes acontecimentos sobrenaturais, conta que Bartolominha partiu. Aprendeu com o pelicano e saiu dali para fora. Ao mesmo tempo o pelicano pode simbolizar o seu falecido marido, pois tomou conta dela e o neto encontra os seus restos na campa do avô, o que denuncia esse papel protector que o pelicano teve. Depois disto, o neto torna-se faroleiro. Foi uma atitude que teve por fidelidade para com os seus parentes. E ainda há um outro aspecto. A última frase desta história diz-nos que quando as grandes aves passam pelo farol, o neto lhes acena. É provavelmente um acto de agradecimento por, pássaros como aqueles, terem ajudado a sua avó.
Na minha opinião esta imagem ilustra muito bem a história que tenho vindo a descrever. Mostra uma ilha, ou parte dela, com um farol e uma casa. O mar está agitado e a luz do farol, forte e bem visível (sendo o elemento que mais se destaca), aponta para longe mostrando o aspecto trabalhador de Bastante António, mesmo em noites agitadas não desiste do seu dever. Também dá uma sensação de esperança, sendo a luz o ponto mais claro na imagem que se estende para fora desta. As nuvens por detrás, a agitação do mar e o uso contínuo do preto em variados locais na imagem intensificam o aspecto isolado daquela ilha e atribuem também uma sensação de perigo, mostrando que a persistência do velho casal naquele sítio deve ser reconhecida. É também importante reparar no facto de ser de noite na imagem. Simboliza a noite em que o neto de Bastante passou a tomar conta daquele edifício tal como todas as noites de trabalho do seu avô.
O tema
Depois de interpretado, posso dizer que o conto tem como tema a dedicação, manter o farol como a parte mais importante da ilha. O que considero principal na história foi a persistência de Bartolominha, Bastante e de seu neto. Bastante morreu trabalhando no farol. Depois deste incidente, até Bartolominha dedicou o resto da sua vida na ilha a tomar conta daquele edifício. E por fim, o neto toma o lugar do avô e a ilha torna a ter faroleiro até ao fim dos seus dias. Estes aspectos foram os que mais se destacaram na minha leitura do conto.
Apreciação
Gostei de ler a história. Sendo um conto, o autor mistura bem os bocados de acção com os momentos de pausa (descrições). Estes dois aspectos estão bem balançados e, também, não criou muitas personagens nem as descreveu muito, pois não era necessário para o desenrolar da história. Assim podemos acompanhar o conto mais facilmente. Um aspecto interessante foi o facto de nem sequer o sexo, idade ou nome do neto ser revelado. É apenas um detalhe em como ele era simplesmente o narrador participante e uma personagem secundária, apesar de ter papéis importantes. Logo no início, aprecio a maneira como o narrador explica o local isolado onde Bartolominha vive "exposto ao longe e ao esquecer". A utilização do verbo "esquecer" entrega mesmo a sensação de um lugar desabitado que é uma noção importante da ilha para o resto do conto. Gostei da aparição do pelicano como
personagem relevante. Este surge como
substituto ao avô Bastante, ajuda Bartolominha dando-lhe comida e até a ajuda a sonhar quando dorme aconchegado a ela, e esta pensa que aprenderá a arte de voar. A acção até um pouco antes do fim é calma e simples mas os dois últimos parágrafos são o que muda tudo. Desde que o neto acorda "guiado por vozes" até se tornar faroleiro há um grande momento de suspense. Acabou duma maneira que eu não esperava e fiquei surpreso pelo aspecto simbólico do decorrer das acç ões finais. Foi a parte do conto que mais me emocionou. No geral, gostei muito do conto pois despertou-me muito a atenção para Bartolominha
que desaparece misteriosamente. É dessa maneira que eu acho que o narrador criou um texto com um final bastante subjectivo e sujeito a diversas interpretações.
Apresentação Oral:
1. Ler síntese do conto. 2. Descrever personagens: Bartolominha, Bastante António e o seu neto. 3. Ler e explicar alguns excertos interessantes. 4. Fazer apreciação.