História da Psiquiatria MATERIAL DIDÁTICO – CAPÍTULO 1: HISTÓRIA DA PSIQUIATRIA
LOUZÃ NETO
Os
primeiros registros de patologias
psiquiátricas datam de 2000 anos a.C. As
doenças eram ações de forças externas
ao corpo humano: maus espíritos, bruxos, demônios, deuses... Os
doentes eram atendidos em rituais
tribais ou abandonados.
Era Grega e Romana:
Modelo de doença baseado na ruptura do equilíbrio interno.
Tratamento nos templos gregos: usados como hospitais - ar livre,
água pura e luz solar fundamentais na recuperação.
Roma: relatos de tratamentos com correntes, flagelos, sangrias, purgantes, banhos sulfurosos e inanição (quando comessem teriam a memória recuperada).
Os doentes ricos eram mantidos em suas residências, os pobres
ficavam nas ruas, e subsistiam pela caridade ou realizando trabalhos simples para particulares.
Idade Média: Idade das trevas
Queda das civilizações grega e romana: caem progressos culturais.
Religiosos cuidam dos doentes, crendices supersticiosas crescem: eram flagelados, acorrentados, escorraçados e deixados sem
alimento para que os demônios fossem expulsos / exorcismo. Eram chamados de insanos, “lunáticos” ou “pecadores”.
Doença considerada relação defeituosa entre o homem e a divindade: castigo por faltas morais e pecados, ou invasão por espírito maligno, ou a evasão da alma do corpo da pessoa.
Século O
XVI:
atendimento ao doente mental piora.
Monastérios
substituídos pelas casas de caridade
e asilos. Os
doentes violentos colocados em celas e
masmorras, os não violentos expostos à visitação do público ou forçados a pedir esmolas nas ruas.
Século XVII:
Doença mental: era a luta entre Deus e Satã pela alma humana, ou atribuída às bruxas e aos mágicos: cerca de 20 mil pessoas consideradas bruxas, foram queimadas na Escócia.
As casas de caridade abrigavam tanto doentes como marginais e as masmorras de Paris eram os únicos locais onde os doentes mais graves ficavam escondidos, o tratamento consistia de severas purgações, sangrias, camisas de força e chicote. Mas é também neste século que começam a fundar
locais para tratamento dos doentes mentais.
Século
XVIII:
Philippe
Pinel começa uma reforma de libertação
dos não doentes das internações nos asilos, e tratamento humano para os doentes. O
reconhecimento do doente mental como portador
de patologia natural, orgânica coincide com a Revolução Francesa (igualdade, liberdade e fraternidade), pregada pelo Iluminismo Francês.
Século
XIX:
Construção
de hospitais em lugar das casas de
caridade. Estudos
científicos mais profundos: primeiro manual sobre
transtornos psiquiátricos (1845), e a doença mental passa a ser discutida como as demais doenças. Os
hospitais, devido à superlotação, ficam ineficientes, e
o tratamento consiste em práticas desumanas.
Século XX:
Freud é o principal transformador, com suas teorias sobre comportamento humano. As discussões sobre o atendimento ao doente mental começam a tomar rumo neste século.
Na década de 60, na Itália, Franco Basaglia lidera um movimento que
questiona a psiquiatria. Em 1978 o movimento consegue a aprovação de uma lei proibindo a construção de novos hospitais psiquiátricos, redirecionando os recursos públicos para a criação e manutenção de
serviços alternativos como leitos psiquiátricos em hospitais gerais, lares abrigados, hospital-dia, albergues ou pensões protegidas.
Vídeo 1
HISTÓRIA DA SAÚDE MENTAL NO BRASIL
Brasil-Colônia:
doente mental era livre nas cidades,
aldeias e campos. A assistência médica e hospitalar dependia, sobretudo, das irmandades religiosas. As Santas Casas de Misericórdia funcionavam como albergues
para
os
pobres,
órfãos,
inválidos
e,
obviamente, loucos. No Rio de Janeiro, o Hospital da Santa Casa de Misericórdia foi fundado em 1567.
Séculos
XVI e XVII – famílias mais abastadas
escondiam seus doentes em casa, em quartos próprios
ou em construções anexas. Século
XVIII – as grandes propriedades rurais
utilizavam apenas mão-de-obra escrava. Este trabalho para o homem livre passou a ser considerado indigno.
Século
XIX - Chegada da Família Real: acaba a
tolerância social ao doente mental. Era necessário “limpar” a loucura das ruas da Cidade. Economia
passa a ser de urbanização/ industrialização:
os “doentes” são amontoados nos porões insalubres das Santas Casas.
Sem
assistência médica, os loucos como os demais
marginais são entregues a guardas e carcereiros, seus delírios e agitações reprimidos por espancamentos ou
contenção. Escravos
e voluntários, sob orientação das Irmãs de
Caridade, cuidavam destas pessoas nas Santas Casas eram os chamados práticos de enfermagem.
A
partir de 1830 começa a haver protestos contra o
encarceramento do louco nas Santas Casas. As
denúncias dos médicos da Academia Nacional de
Medicina sobre as péssimas condições de atendimento que os doentes recebiam fez surgir o discurso da necessidade de profissionais e de um local de tratamento.
1852-
marco
institucional
da
assistência
psiquiátrica:
inaugurado o Hospício D. Pedro II, no Rio de Janeiro.
Outros
hospícios são criados no Brasil (Hospício de Juqueri –
SP- 1858).
As
irmãs de caridade foram substituídas pelas
enfermeiras leigas francesas. O
Governo da República cria, em 27 de setembro de
1890,
a
Escola
Profissional
de
Enfermeiros
e
Enfermeiras, primeira Escola de Enfermagem do país, visando preparar profissionais para atuarem nos hospícios e nos hospitais civis e militares
A
enfermagem psiquiátrica brasileira surgiu no hospício, para vigiar, controlar e reprimir.
Proclamação
da República: estabelecimento da psiquiatria
científica brasileira. A saúde passou a ser atribuição do Estado e a classe médica controla as instituições de saúde. O antigo Hospício D. Pedro II, (agora Hospício Nacional de Alienados), teve seu primeiro diretor médico: TEIXEIRA BRANDÃO.
Início
do século XX, o médico JULIANO RODRIGUES
dirige o Hospício Nacional: quer recuperar os alienados
nos asilos. De
1841 a 1954 proliferam as colônias agrícolas para
tratamento de doentes mentais em diversos estados brasileiros, mas os hospícios-colônias não cumprem um
papel terapêutico (excluíam o doente mental do convívio social).
Praticavam
a laborterapia como técnica terapêutica –
sinônimo da garantia de disciplina e ordem, de forma a docilizar os incuráveis. Utilizavam modernas técnicas da medicina mental do período: a) Hidroterapia - aplicação externa de água – quente ou fria, por meio de longos banhos, de imersão ou duchas;
b) Malarioterapia - inoculação do plasmodium no organismo do doente, para tratar paresia neurosifilítica, e para que a febre e os tremores
“curassem” a doença mental. Jauregg, 1917- Viena; c) Insulinoterapia – aplicação de insulina, em doses crescentes, que
provocava convulsões, coma e um sofrimento físico intenso, para tratar esquizofrenia. Sakel, em 1927 – Berlim.
d) ECT: aplicação de corrente elétrica de alta voltagem sobre a região temporal, para provocar dessincronização traumática da atividade cerebral do paciente com contrações clônicas e perda da consciência.
O
hospício se estrutura a partir do poder disciplinar,
com atendimento voltado para: o isolamento com vigilância constante, a organização do espaço e a distribuição dos doentes no espaço hospitalar. A
função de vigilância era, sobretudo, do enfermeiro
que devia acompanhar os doentes por todos os lugares e em todos os momentos.
Como
consequência, toda violência e agressividade presentes
no hospício eram decorrentes do desempenho violento e
agressivo do “enfermeiro”, a quem cabia por herança secular o serviço sujo das pequenas e cotidianas atrocidades do
espaço asilar: amarrar, conter, gritar, ofender, impor-se pela robustez física, proibir, aplicar as medidas terapêuticas psiquiátricas prescritas, tudo em nome da pseudo ordem do hospital.
O
profissional da enfermagem não era formado para
atender melhor ao doente mental, mas para viabilizar as possibilidades do discurso psiquiátrico brasileiro tornar-se científico. A enfermagem psiquiátrica foi criada especificamente para vigiar e disciplinar o louco, e não para cuidar dele.
Em
1950, a OMS recomendava que os governos
invistam em ações de saúde mental. Alguns Institutos de Aposentadorias e Pensões no Brasil incorporam
parcialmente a assistência psiquiátrica entre seus benefícios. Em
1955, a introdução das drogas antipsicóticas abriu
novas
perspectivas
mentais.
no
tratamento
dos
doentes
Final
da década de 50 - saúde mental caótica: só no Juqueri havia
mais de 15 mil pessoas internadas. A assistência psiquiátrica
brasileira não acompanhava as atualizações terapêuticas que ocorriam no exterior. Década
de 60: criado o INPS. O doente mental é o objeto de
lucro. Proliferam entidades privadas de assistência psiquiátrica. As internações triplicaram e, pacientes sem necessidade clínica eram internados.
A
rede ambulatorial pública era subdimensionada
Início
da década de 70 - o período de “milagre
econômico”: as jornadas de trabalho mais extensas aumentam o índice de acidentes de trabalho, a massa trabalhadora tem diminuição de seu poder de compra, com
reflexos
em
suas
condições
principalmente nas grandes cidades.
de
saúde,
A
assistência em saúde mental é negligenciada pelo
Estado. Fim
da década de 70
- surgem os primeiros
movimentos da Reforma Psiquiátrica, com o Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental (MTSM) – debate e encaminhamento de propostas de transformação da assistência psiquiátrica.
Fim
com
da década de 80 - o movimento atinge seu ápice, contribuições
das
experiências
italianas,
começam as propostas de uma psiquiatria menos repressora,
seja
através
de
processo
de
desospitalização, ou de um trabalho mais voltado para os interesses e necessidades da comunidade.
A
década de 90 tem como marco principal a Lei de
deputado Paulo Delgado. REFORMA PSIQUIÁTRICA ou Política de Desinstitucionalização, que prescreve a extinção dos hospitais psiquiátricos, e sua substituição por outras modalidades e práticas assistenciais.
A
Conferência Regional para a Atenção Psiquiátrica,
organizada pela Organização Pan-Americana de Saúde
em Caracas em 1990 e a II Conferência Nacional de Saúde Mental realizada em Brasília em 1992 são os
marcos da década de 90 ressaltando sempre os direitos humanos e civis dos pacientes psiquiátricos.
Processo de Reforma Psiquiátrica: reestruturação da assistência, superando o modelo asilar e construindo novas possibilidades de assistência substitutivas.
Reforma Psiquiátrica ou Política de Desinstitucionalização: extinção dos hospitais psiquiátricos, e criação de outras modalidades e práticas assistenciais. Não só um processo de desospitalização, mas invenção de
práticas assistenciais territoriais; processo de desconstrução dos conceitos e das práticas psiquiátricas”. (AMARANTE, 1994, p. 81).
Trata-se,
na verdade, de dar ao doente o direito a um
cuidado real, concreto, “não de ser excluído, mas de receber ajuda no seu sofrimento, na sua positividade e
na sua possibilidade de ser sujeito (...) de não ser despossuído de seus direitos não apenas sociais, civis e políticos, mas de ser uma pessoa, de ter seus desejos e projetos” (AMARANTE, 1996). Vídeo
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