O Sonho Da Harmonia

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Duas coisas ameaçam o mundo: A ordem e a desordem Paul Valéry

O Sonho da Harmonia - a nova cavalaria espiritual Partindo do pressuposto de que a Maçonaria é um novo ideal de construção do Cosmos e da própria Humanidade, cabe neste trabalho reflectir e analisar caminhos para a construção de uma sociedade em que nos interligamos por um espírito de fraternidade, tolerância e obediência cavalheiresca aos nossos ideais, um ideal de cavalaria espiritual em que todos nós caminhamos para a Luz e para a perfeição de um maior conhecimento. De nada servirá a Luz se não a soubermos colocar ao serviço de todos os que dela necessitam. De nada servirá a luz se não soubermos transformar a pedra bruta e corrigir as imperfeições. Na era moderna assistimos à abertura das fronteiras entre o bem e o mal, a ordem e a desordem. A crise que se instalou é mais profunda que uma simples crise de valores pois assistimos permanentemente às metamorfoses das simbologias, do sagrado e do profano. Diremos então que o homem parece estar perdido pois vive numa sociedade aparentemente organizada sem que saiba exactamente o papel que desempenha. As mudanças sociais e culturais são demasiado rápidas e profundas e adquirem uma dimensão mundial. Estamos numa fase de mudança cultural e de constante mutação do próprio mundo e do quotidiano em que vivemos que aparentemente cria uma desordem. O ser humano vive com a necessidade da transcendência e é justamente essa

necessidade

que

gera

novas

configurações

provenientes

das

mudanças de culturas emergentes, de novas formas de presença das religiões. Por outro lado renega permanentemente o sagrado embora crie religiões moldadas e paralelas às novas culturas e saberes que vai adquirindo.

A crise religiosa nos países ocidentais de tradição cristã, é uma situação unanimemente reconhecida. A esta situação objectiva corresponde uma situação de evidente mal-estar para todos os que teimam em manter as regras e a simbologia da religião em que cresceram, apesar das diferenças socio-culturais que o tempo trouxe. A crise religiosa é o reflexo de uma crise prolongada e mais profunda da actual sociedade. As igrejas fazem agora parte de uma sociedade em transformação. As metamorfoses que vivemos a nível do sagrado baseiam-se sobretudo na difusão de práticas alternativas à religião tradicional, práticas essas muitas vezes retiradas de outras tradições espirituais e de uma espécie de proliferação de novos movimentos religiosos. O homem na sua essência absorve novos pensamentos filosóficos e novas reflexões éticas a uma velocidade estonteante e sem a devida assimilação de conteúdos. Parecemos ter regressado a uma era anterior em que o mundo se conquistava por ideias religiosos, em que os homens morriam e se imolavam para defender a sua crença. Períodos de intolerância que fizeram a história da humanidade mais sangrenta, mais obscura e menos perfeita. Mas a metamorfose que vivemos implica necessariamente mudança. Muitas vezes é uma mudança em sentido oposto, mas será sempre uma transformação. O sistema tradicional é agora contestado nas suas crenças, as suas práticas e rituais, os seus símbolos, comportamentos éticos, sentimentos e obviamente nas instituições. A simbologia religiosa passou à categoria de objecto de adorno, sendo por vezes transportado como objecto esotérico apesar de ser apenas portador de uma filosofia exotérica pela banalidade que transporta. As novas sociedades estão submetidas a um processo demasiado rápido de transformações.

A

globalização

veio

trazer

uma

aglomeração

de

conhecimentos e por vezes um excesso de informação que nos torna descrentes pela exagerada tentativa de explicar por vezes o inexplicável. Mas, excesso de informação não é, como bem sabemos, sinal de conhecimento.

O sagrado constitui uma categoria fundamental para a interpretação de todos os fenómenos mesmo aqueles que a história apresenta como fenómenos religiosos e dado que todas as religiões se inscrevem no mundo do sagrado, a história das religiões pode ser compreendida como a evolução das formas históricas de que se reveste o sagrado para o homem. A evolução do homem estará necessariamente ligada à transformação religiosa que o rodeia. A crise religiosa provoca implicitamente a perda da tradição e a perda da memória cristã. Dois grupos se formam: aqueles que conseguem viver a religião de uma forma mais ou menos renovada e os que se assumem cada vez mais como não crentes. Tudo isto são formas de luta contra a essência humana. Assumir-se como não crente é assumir que se perdeu o arquétipo original, a capacidade de viver o sagrado, de sentir o sagrado sem o interrogar, a capacidade de fazer parte de um grupo para o qual foi eleito. Como dizia Paracelso “triste época a nossa em que tudo é feito de qualquer maneira, na mais total desordem” Mas o ser humano precisa do sagrado e dos rituais. Precisa de evoluir no binário Bem versus mal. Não basta ensinar ao homem uma especialidade, porque se tornará uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. É necessário que adquira um sentimento, um sentido prático do que é belo, do que moralmente é correcto, do sentido da construção. Se não for assim o homem assemelhar-se-á mais a um cão ensinado, um animal amestrado, e não uma criatura harmoniosamente desenvolvida embora repleto de conhecimentos profissionais. Segundo Albert Einstein, o homem “deve aprender e compreender as motivações dos homens, as suas quimeras, as suas angústias, para poder determinar com exactidão o seu lugar na relação com o próximo e sobretudo com a comunidade”.

O desconhecimento

destes princípios levará a novas trevas. Só alguns saberão construir e trabalhar a boa pedra, esculpir nela a nova luz, conhecimento conferido a todo o cavaleiro que cumpre o seu ritual. O verdadeiro cavaleiro é aquele que aceita sujeitar-se a todas as provas destinadas a conferir-lhe o domínio de si mesmo, guiando-se pela lealdade e

cumprindo um pacto com toda a irmandade a que pertence. Compreenderá as motivações dos homens e aceitá-las-á porque é tolerante. Ouvirá as suas angústias porque sabe o que é a alteridade. O caminho a percorrer é uma nova demanda em busca de um novo Graal, a busca do novo lugar para o homem descrente que vive à velocidade da sociedade de informação mas não se questiona, não tem regras nem rituais sagrados, vive intensamente o peso e a sobreposição do profano. No novo contexto social são inúmeras as ameaças e daí surgem oportunidades renovadas no tipo e nas estratégias de intervenção. Prisioneiros de uma sociedade de consumo em que o ter desvaloriza e anula o ser , a sedução da imagem faz esquecer o conteúdo, a rapidez convida ao atropelo da vida, os homens tornam-se passivos consumidores de um qualquer “fast”. As disparidades económicas e sociais, a pobreza extrema, a intolerância,a guerra e outros flagelos revelam uma parte da humanidade incapaz de perceber a relatividade da vida. A sociedade proporciona meios e tecnologias capazes de proporcionar maior bem-estar, melhor saúde, maior qualidade de vida. A ciência fala-se em linguagem quase comum. Somos cidadãos do mundo. Mas de que serve tudo isto se não houver um sentimento de Fraternidade, compreensão e ajuda? Contrariamente à aprendizagem de conhecimentos, a transmissão de valores tem responsabilidades partilhadas. Descobrir o sentido e fazer a aprendizagem de valores é uma tomada de consciência, mas os valores aprendem-se tanto mais quanto mais se praticam. A solidariedade e a fraternidade exigem compromisso. È preciso transformar as necessidades sociais em oportunidades de acção para todos os que querem cumprir um dever social e participar activamente na sociedade em que estão inseridos. O primeiro passo é agir. Agir e construir algo. Participar activamente na construção do mundo. Criar oportunidades de acção. O caminho faz-se passo a passo e cada passo tem a medida de quem o dá e dos obstáculos que encontra pelo caminho.

Uma das armas fundamentais é, na realidade, a Tolerância. John Locke fundamenta a tolerância no pressuposto de que todo o ser humano possui um conjunto de direitos fundamentais imutáveis. Nesse sentido tolerar será ajudar a superar o erro e não, esmagar uma pessoa. O diálogo e a tolerância supõem o reconhecimento da dignidade do outro, a alteridade e só assim a tolerãncia poderá ser o habitat de uma sociedade plural. Mais do que em qualquer outro momento da história, só a fraternidade e a tolerância nos levarão à luz, e este caminho só se percorre com a consciência do verdadeiro saber. Trabalhemos a aparente desordem do mundo seguindo as regras a que nos submetemos como novos cavaleiros. Trabalhemos

o

mosaico

da

nossa

existência

com

o

esquadro

por

instrumento, ao som de uma qualquer flauta mágica. Mozart deu ao mundo tudo o que o mundo precisava de ouvir. Assim façamos nós. Não seremos mais “brilho sem luz e sem ardor/ como o que o fogo fátuo encerra” (F. Pessoa) porque temos um caminho por onde somos guiados pelos nossos irmãos. Uma nova ordem universal, uma cavalaria espiritual : “In the third heaven the stones of the waste glimmered like summer stars and opened the rite” (Charles Williams)

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