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VIEIRA, Alberto (1999), Revoltas e Motins Populares
COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto (1999), Revoltas e Motins Populares, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/revoltas.pdf, data da visita: / /
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REVOLTAS E MOTINS POPULARES A História da ilha regista inúmeros motins populares o que lhes valeu por vezes das autoridades do continente o epíteto de desordeiros. Na memória de muitos estão presentes as revoltas que ocorreram no século XX e destas quase sempre refere-se apenas a da Farinha(1931) e do Leite(1936), ignorando-se todas as outras convulsões, como a do imposto ad valorem(1924) e as inúmeras de carácter político que aconteceram durante o momento conturbado no século XIX. Mas, a História regista outros motins, pautados por reivindicações de ordem económica, por inimizade e afrontamento da arrogância das autoridades, em pleno fulgor das campanhas eleitorais, por questões sociais e políticas. Até ao século dezanove foi evidente o braço implacável dos corregedores enviados em alçada à ilha, enquanto no século XIX a Revolução liberal trouxe-nos a novidade da presença repressiva de forças militares enviadas de propósito da metrópole, mas que por vezes acabam por estar na origem de novas revoltas, como sucedeu com a revolta da Madeira de 1931. A História da Madeira assinala diversos motins nos primeiros séculos motivados fundamentalmente por questões económicas. As dificuldades de abastecimento de cereais a partir da década de setenta do século XV conduziu a inúmeras convulsões sociais no meio urbano. A situação agravou-se em princípios do século XVII com a presença de uma força espanhola, conhecida como do presídio. O não pagamento do soldo a estes soldados levou a diversos motins de que ficou memória o de 1626 contra o provedor da fazenda. A política especulativa dos mercadores ingleses na distribuição das farinhas e cerais conduziu a outra convulsão social em 1694 sendo o principal alvo o mercador inglês William Bolton. Todavia a primeiro motim é de carácter político e tem por palco a ilha do Porto Santo. Em 1553 Fernão Bravo e Filipa anunciam-se os habitantes do Porto Santo como profetas, arrastando consigo a maioria da população. As convulsões com carácter político são inauguradas em 1641 com a restauração da monarquia portuguesa. Os populares adeptos do novo rei manifestaram-se publicamente e de forma violenta contra os vereadores e funcionários das instituições régias no activo que eram fervorosos adeptos da causa castelhana. A 18 de Setembro de 1668 surgiu outro motim de carácter político tendo com alvo o governador, D. Francisco de Mascarenhas, preso quando se dirigia para quinta dos jesuítas em Água de Mel e depois expulso da ilha, colocando em seu lugar o fidalgo Aires de Ornelas e Vasconcelos. Da sindicância resultou a prisão e degredo de algumas personalidades madeirenses. Mas as convulsões de carácter político terá o seu lugar predilecto a partir de 1821 com a Revolução liberal.. Os distúrbios civis ou com a intervenção dos militares são uma constante até finais do século, surgindo como repercussão das que acontecem no reino. Em 1829 revoltaram-se os militares e em 1834, 1847, 1868 as revoltas do reino atingiram também a ilha. Os actos eleitorais eram momentos de verdadeiro combate político, ocorrendo em muitos destes motins provocados pelos adeptos ou chefes dos vários partidos ao nível regional. A estes sucederam-se as revoltas em pleno acto eleitoral. A de 1868 ficou conhecida como a revolta da pedrada e foi resultado dos conflitos entre os partidos Popular e fusionista. A mesma agitação popular provocou em 1887-88 a criação das Juntas de
Paróquia. Ficou conhecida como a Parreca e agitou as populações em toda a ilha, obrigando ao envio de batalhões militares dos Açores e Lisboa. Em São Vicente estão referenciados tumultos da população, tendo dois como origem o sistema de cobrança de impostos. O mais relevante ocorreu em 12 de Abril de 1868 e levou à destruição total doa arquivo camarário. Os tumultos confundem-se com a convulsão política que ocorreu a 8 de Março de 1868, ficando conhecida como a revolta de pedrada. As eleições acirraram os ânimos entre os defensores dos partidos Popular e Fusionista e foi esta conjuntura de afrontamento que fez despoletar a revolta popular tendo como objectivo a aplicação do decreto sobre o sistema métrico decimal e a abolição do imposto indirecto sobre a eira e o lagar que foi substituído pela contribuição predial. O resultado disto foi a queima de toda a documentação do Arquivo Municipal, perdendo-se irremediavelmente tudo o que estava aí depositado e não concretização do acto eleitoral para as juntas de paróquia em Ponta Delgada e Boaventura. O sentimento de revolta popular contra os impostos persistiu em 1880, 1897 e 1899. A centúria oitocentista termina sob o espectro da morte face ao avanço da cóleramorbus. Assim em 1894 a fúria popular aconteceu à entrada da cidade face à chegada dos passageiros do vapor Funchal, vindo de Lisboa onde se dizia já grassava a doença. Mesmo assim a doença alastrou a partir de Novembro de 1905 obrigando as autoridades a isolar os doentes no Lazareto, considerado as masmorras da morte. Correram nas cidades vários boatos sobre este isolamento que acenderam a revolta dos populares. Assaltaram o isolamento, libertando os presos, e perseguiram o seu principal responsável, o Dr. Balbino Rego. Episódio semelhante só em 1846 com o Dr. Robert Reid Kaley, perseguido pela populaça por propagandear o calvinismo. Os primeiros trinta anos do século podem ser considerados o momento de redobrada agitação social. Primeiro foi a agitação resultante da ordem governamental que determinou em Abril de 1911 que determinou o encerramento das fábricas de aguardente. Em S. Vicente a câmara a 20 de Março apelou às autoridades para a necessidade de o revogar face aos receios da ira popular mas a resposta do governo foi o envio em segredo de uma força militar que não impediu que a revolta acontecesse. Em 1924 as câmaras decidiram lançar o imposto "ad-valorem" com o intuito de custear as suas despesas e garantir o necessário equilíbrio orçamental. Note-se que esta faculdade fora concedida pela lei nº.999 de 15 de Julho de 1920, regulamentada pelo decreto nº.1956 de 31 de Dezembro de 1921. O imposto de 3% incidia sobre todos os produtos exportados do concelho: vimes, cana, carne, coiros, peles, cereais, vinho aguardente, aves, batata, lenha, madeira, nata e manteiga, bordados. De novo fez-se notar a ira popular em S. Vicente, Câmara de Lobos e Ribeira Brava, obrigando as vereações a acabarem com este imposto, enquanto o governador civil em circular explicava que havia decidido aplicar o mesmo que se fazia nos Açores, isto é, a cobrança na alfândega. As convulsões terminam na década de trinta com as mais celebrizadas revoltas madeirenses que marcaram a época contemporânea. Os problemas económicos decorrentes das dificuldades de abastecimento cerealífero estão na origem da convulsão. Em 1921 foi o aumento do preço da farinha e já em 1931 foi o decreto que estabelecia o monopólio da moagem que despoletou a revolta popular em Fevereiro e provocou a dos militares a 4 de Abril. De novo em 1936 um decreto regulador dos lacticínios viria a lançar o alvoroço em muitas das freguesias rurais, encerrando esta página tormentosa
das revoltas e motins. As peias do Estado Novo fizeram esmorecer o espírito reivindicativo do madeirense.
BIBLIOGRAFIA: Henrique F.F. Valle, A Revolta da Madeira e a Comissão de Inquérito. Breves Considerações e Apontamentos, Funchal, 1888. Fernando Augusto da Silva, Elucidário Madeirense, III volumes, Funchal, 1965(entradas: motins populares, peste bubónica, domínio castelhano, Rego, Dr. António de Balbino, Profetas). Pedro M. Ferreira, Tumultos Populares na Madeira: A Parreca (1886-1887), Islenha, 4, 1989, 6470. IDEM, As eleições de 1887. Um Teste aos Republicanos da Madeira, Atlântico, 12, 1987,,295-302. João Adriano Ribeiro, Os Tumultos no Concelho de S. Vicente da Madeira em 1868, Islenha, 17, 1995, 113-122. Alberto Vieira. S. Vicente Um século de Vida Municipal, Funchal, 1997. António Pedro Gomes, A Peste bubonica na Madeira e as suas consequencias, apontamentos, Lisboa, 1906, Dr. Antonio Balbino do Rego, Um Ano Depois, Porto, 1907, IDEM, na Ilha da Madeira, Porto, 1907. João José Abreu de sousa, a Patuleia na Madeira 847, Islenha, 14, 1994, 5-21. Folhetos de poesia popular sobre o Dr. Rego: Farça do Lazareto, 13 pp., Sonho dum Machiqueiro, 9 pp., Auto da Peste, 16 pp., O dr. Rego no Inferno, 8 pp., O Dedo da Providencia, 8 pp., A Peste no Funchal (versos do Feiticeiro), 7 pp., A Peste Balbinica, A Peste no Funchal, A Panelinha da Peste e um medroso, Os Primos do dr. Rego, O dr. Rego enforcado, Confissões do dr. Rego, Os Pestilenciais no Funchal, A Despedida, Canção da Peste, Má Peste dê nos Pestes, Farças e Farçantes, 1.ª 2.ª 3.ª e 4.ª partes, O Bicho desapareceu, Viva o dia 7 de Janeiro de 1906, O Ultimo Suspiro, Assalto ao Lazareto, A Peste no Funchal no dia 7 de Janeiro de 1906, Partida.