Projecto Tutorial Licenciatura em Bioquímica
Cecília Carlos Leite Duarte 1º Ano Ano lectivo 2005/2006
Índice Páginas Introdução
1
Bases Moleculares da Hemofilia
2
Hereditariedade da Hemofilia
5
O caso particular da Rainha Vitória
7
Tratamento actual e expectativas futuras
9
Investigação sobre a Hemofilia em Portugal
10
Conclusão
11
Bibliografia
12
Introdução
A Hemofilia é uma doença crónica e uma deficiência congénita no processo de coagulação do sangue. A incidência da Hemofilia parece variar de país para país; isto pode reflectir simplesmente o cuidado com que as formas mais leves desta doença são tratadas ou até detectadas. Por exemplo, no Reino Unido são conhecidos 6.000 casos e nos Estados Unidos da América existem cerca de 20 000. Em Portugal, registadas na Associação Portuguesa dos Hemofílicos, existem actualmente 686 pessoas com hemofilia, devidamente identificadas. No entanto, este número poderá não ser o verdadeiro, dado que não existe nenhum registo oficial da população com hemofilia. Quando um dos vasos sanguíneos sofre uma ruptura, forma-se uma pequena abertura e o sangue começa a fluir. Este derrame sanguíneo pode acontecer fora da pele (hematoma) ou para dentro, onde não pode ser observado (articulações e músculos). Na sequência duma perfuração dos vasos sanguíneos, ou seja, quando a hemorragia começa, factores da coagulação trabalham conjuntamente para produzir um coágulo que cubra essa perfuração. Um coágulo é uma espécie de tampa que cobre o orifício e impede que o sangue se derrame fora do vaso sanguíneo. Para que uma coagulação aconteça normalmente, é necessário que todos os factores, numerados convencionalmente de I a XII, trabalhem na sequência dos seus próprios números. Cada um tem a sua importância e todos eles trabalham em conjunto para que
a
coagulação
possa
ocorrer.
Mas se um dos factores não trabalha como os outros, o resto do complexo não pode fazer o trabalho completo para formar o coágulo e terminar a hemorragia.
Bases Moleculares da Hemofilia De transmissão genética, ligada ao cromossoma X, a Hemofilia aparece quase exclusivamente nos indivíduos do sexo masculino e caracteriza-se pela ausência ou acentuada carência de um dos factores da coagulação. Uma carência do factor VIII provoca a Hemofilia A, enquanto que uma carência do factor IX provoca a Hemofilia B. Tanto a Hemofilia A como a B estão associadas a uma deficiência recessiva ligada ao sexo. Por este motivo, a coagulação (ver figura 3) é lenta ou inexistente, provocando hemorragias frequentes, especialmente a nível articular e muscular. Os alelos que codificam a Hemofilia podem ser originados por mutações genicas, ou seja, por alterações ao nível da sequência do gene. Por muito poucas que sejam
essas alterações, pode surgir um novo alelo. As proteínas formadas podem sofrer alterações e desta forma criar uma situação de Hemofilia. Por exemplo no factor VIII, cujo gene foi localizado (ver figura 1), foi detectada uma mutação por splicing, mutação por delecções e mutação tipo “Missense Mutation”. No caso do factor IX, cujo gene foi localizado (ver figura 2), foram observados transversões que afectavam a proteína traduzida, tornando-a menos eficaz e provocando uma redução nos níveis de antigénios. Foi Também observada uma duplicação de 9 pares de bases que provocava uma instabilidade no cromossoma, podendo vir a potenciar inserções e delecções. Por splicing entende-se uma mutação em que as proteínas de restrição não retiram intrões. No núcleo é realizada a transcrição
do
ADN
para
o
ARN
mensageiro.
Num primeiro momento, o ARN pré-mensageiro apresenta exões e intrões, sendo os segundos
sequências
de
nucleótidos
não
codificantes.
Até chegar ao ARNm funcional há uma etapa chamada “ Processamento de ARN”, em que as proteínas de restrição retiram os intrões da sequência transcrita. Num caso de splicing, essas proteínas não removem os intrões, fazendo com que durante a tradução não se forme a proteína desejada, neste caso o Factor VIII. As delecções são mutações em que não é transcrito material cromossómico. Parte do gene não é transcrito, nem traduzido e a proteína formada não terá a sequência de aminoácidos desejada. Por fim, “Missense Mutation” acontece quando o códão transcrito codifica um aminoácido diferente que torna a proteína traduzida inutilizável.
Figura 1 – Localização do gene factor VIII (Gen FVIII) no cromossoma X
Figura 2 – Localização do gene factor IX (Gen FIX) no cromossoma X
Figura 3 – Coagulação sanguínea
Hereditariedade da Hemofilia A Hemofilia transmite-se de geração em geração, sendo manifestada fenotipicamente pelos atingidos, ou através de mulheres portadoras que carregam o alelo afectado no seu património genético. Tratando-se de uma doença recessiva e ligada ao cromossoma X, a Hemofilia afecta principalmente os homens, pois para que a mulher manifeste a doença, teria de herdar dos progenitores dois alelos que codificassem a doença, pois é uma situação muito difícil de acontecer (ver figura 4). Quando uma mulher apresenta apenas um alelo para a doença, é chamada portadora, pois apesar de não a apresentar fenotipicamente, transmite o alelo de geração em geração. A probabilidade de transmissão da doença por parte de uma mulher portadora
é
pela
lei
da
segregação
independente
dos
alelos,
de
50%,
independentemente do sexo dos filhos. Os homens hemofílicos não transmitem a mutação aos filhos, mas geram filhas portadoras. No caso de ambos os progenitores contenham a mutação o filho ou é normal ou é hemofílico, e a filha ou é portadora ou é hemofílica.
Figura 4 – modo de transmissão da Hemofilia
Á esquerda, o modo mostra como se determina o sexo, numa família. A do meio mostra quando a mulher é portadora (com coloração a vermelho na figura) e o pai não tem Hemofilia, existe uma probabilidade de 50% para que a sua filha seja portadora e de
50%
que
o
seu
filho
tenha
Hemofilia.
Á direita mostra quando o pai tem Hemofilia (com coloração a vermelho) e a mãe não
é portadora, cada filha herdará o cromossoma X defeituoso do pai e será uma portadora obrigatória. Todos os filhos varões deste casal não terão Hemofilia, já que herdaram o cromossoma Y do pai. Eles não irão transmitir a Hemofilia às suas crianças.
O Caso particular da Rainha Vitoria
Quando se fala da Hemofilia em determinadas famílias, provavelmente a mais notável e famosa é a Rainha Vitória de Inglaterra (ver figura 5). Em 1853 deu à luz o seu oitavo filho Leopoldo que tinha hemofilia, o qual veio a falecer aos 31 anos, de uma queda de cavalo, após ter casado e deixado uma filha Alice, portadora de hemofilia, que viria a ter, mais tarde, um filho supostamente com hemofilia (Rupert). Através destas árvores genealógicas podemos constatar que a Hemofilia esteve presente em quase todas as casas reais da Europa (Inglaterra, Rússia, Espanha), através dos 9 filhos e filhas da Rainha Vitória. Talvez por essa razão se chame à Hemofilia uma doença de sangue azul.
Tratamento actual e expectativas futuras Actualmente o tratamento a ser usado é injecção do factor em carência para cada tipo de hemofilia. Existem alguns tratamentos que podem aliviar os sintomas dos hemofílicos. Por exemplo a pratica de natação, que quando desenvolvida de forma regular e orientada, trás benefícios para as pessoas com hemofilia, pois é uma forma saudável para o desenvolvimento e fortalecimento do sistema músculo-esquelético, tornando as crises hemorrágicas menos frequentes. A terapia génica consiste na através da transferência dos genes responsáveis pela produção duma proteína para as células, induzindo estas a produzir a referida proteína em falta. A Hemofilia é uma doença que se adequa à Terapia Genica pois atrai uma enorme quantidade de pesquisas sobre a terapia génica, uma vez que se sabe muito sobre a transmissão da doença, a localização e estrutura do gene e a estrutura e função do factor produzido pelo gene. É de salientar que a concentração sanguínea de Factor VIII ou IX conseguida, não é crítica, uma vez que fica acima de um limiar de cerca de 5% - o valor base de FVIII ou FIX é inferior a 1% na hemofilia grave e cerca de 2-5% na hemofilia moderada. Se os investigadores conseguirem aumentar a produção de Factor para manter a concentração à volta de 5% e fixá-la nesse valor, então terão convertido a hemofilia grave ou moderada numa forma ligeira. Os doentes com hemofilia ligeira geralmente não sofrem de hemorragias espontâneas. Aumentar a concentração de Factor VIII ou IX até 25%-50%, significaria que os doentes com hemofilia teriam uma tendência para hemorragias, semelhante à da população em geral. São necessários três elementos essenciais para esta transferência de gene: o veículo ou vector de transporte do gene, o gene a transferir e a célula alvo específica. A maior parte dos investigadores utiliza vírus como vectores ou transportadores do gene de interesse. Os vírus que têm sido utilizados incluem retrovírus, adenovírus e vírus adeno-associados. Os investigadores provocam alterações nos vírus, para evitar a sua reprodução dentro das células. Devido às reacções adversas de alguns vectores virais, os investigadores estão também a tentar utilizar vectores não virais para a terapia génica.
Investigação sobre a Hemofilia em Portugal
A investigação realizada em Portugal sobre a hemofilia enquanto doença genética e hereditária tem sido desenvolvida por alguns institutos nacionais de saúde, como é exemplo
o
Instituto
Dr.
Ricardo
Jorge,
em
Lisboa.
Um dos investigadores deste instituto, o professor Dezso David, e a sua equipa estudam as diferentes causas genéticas que levam um certo indivíduo a ser portador da doença. Estas causas estão relacionadas, a maior parte das vezes, com alterações do material genético (mutações). As investigações realizam-se em membros de famílias com casos de hemofilia e em pacientes com diferentes estados da doença. O sangue é obtido dos pacientes com o seu devido consentimento. Também são estudadas árvores genealógicas que poderão ajudar
os
cientistas
nos
trabalhos
de
investigação.
As investigações reportam-se a diferentes genes ou factores relacionados com a doença, cuja localização já é conhecida pelos especialistas.
Conclusão
A hemofilia é uma doença crónica, de transmissão genética que se deve á não coagulação do sangue, provocada pela carência de factores, existindo dois tipos de Hemofilia, A e B. O tratamento actual é a injecção do factor em carência, mas deposita-se esperança na investigação, que envolve a terapia génica com objectivo de resolver a deficiência de factores.
Bibliografia
→ TORTORA J. Gerard, GRABOWSKI Sandra, Princípios de Anatomia e Fisiologia 9º edição, Guanabara Koogan, 2002, Brasil → SEELEY R. Rod, STEPHENS D. Trent, TATE Philip, Anatomia e Fisiologia 3º edição, Lusodidacta, 1997, Portugal → www.cienciaviva.pt → www.zlbbehring.com.br → www.ncbi.nih.gov/books/bookres.fcgi/gnd/pda.html → www.uc.pt/rnam/index.htm → www.hemobase.com/molecular_hemofilia/index.htm → www.sciencecases.org/hemo/hemo.asp