TV DESTINO Central Destino de Produção
Cap. 27
14/04/2008
FOGO SOBRE TERRA Novela de
Walter de Azevedo Inspirada no original de
Janete Clair Colaboração de Eduardo Secco Direção Claudio Boeckel e Marco Rodrigo Direção Geral Luiz Fernando Carvalho Núcleo
Luiz Fernando Carvalho Personagens deste capítulo HEITOR CELESTE BRUNO LEILA DIOGO BÁRBARA EDUARDA ANDRÉ ARTHUR ISABEL RITA SANDOVAL
FRIDA BRISA CHICA HILDA MINERVINA CORINA MUNDICA ZORAIDE TIANA BALBINA ZULMIRA BICHO-BRABO
NILO HEITOR CELESTE LEILA BRUNO LEONOR VINÍCIUS ZÉ MARTINS TONHO PEDRO
Atenção “ Este texto é de propriedade intelectual exclusiva da TV DESTINO LTDA e por conter informações confidenciais, não poderá ser copiado, cedido, vendido ou divulgado de qualquer forma e por qualquer meio, sem o prévio e expresso consentimento da mesma.No caso de violação do sigilo, a parte infratora estará sujeita às penalidades previstas em lei e/ou contrato.”
FOGO SOBRE TERRA
Capítulo 27
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CENA 01. APARTAMENTO DE HEITOR. SALA. INTERIOR. NOITE CONTINUAÇÃO DA CENA FINAL DO CAPÍTULO ANTERIOR, COM UM INTERVALO DE TEMPO DE ALGUNS MINUTOS. HEITOR, CELESTE, BRUNO E LEILA ESTÃO SENTADOS TOMANDO CHAMPAGNE. HEITOR
— Eu sabia que ia conseguir! Não ia morrer e nadar na praia. Todo o meu esforço tinha de ser recompensado. Meu não. Nosso, não é Bruno?
BRUNO
— O mérito é seu. Foi quem correu atrás e batalhou pra conseguir isso.
LEILA
— Uma hidrelétrica. Eu não entendo muito dessas coisas, mas deve ser um contrato ótimo. Ainda mais contrato com o governo.
HEITOR
— Mais do que ótimo, Leila. É uma oportunidade única. E não é só isso. Nós podemos ganhar muito mais.
CELESTE
— Heitor está falando de desapropriação.
HEITOR
— Exatamente. Eu tenho muitas terras naquela região, bem aonde vai se formar o lago da hidrelétrica. Um lugar muito valorizado.
LEILA
— Entendi tudo. Você não dá mesmo ponto sem nó, não é Heitor.
HEITOR
— Como você acha que eu cheguei até aqui, Leila? O grande segredo pra se tornar um homem de negócios bem sucedido e saber perceber a hora e o tipo certo de negócio a se fazer. Isso, aliado a um pouco de sorte...
BRUNO
— Que aliás, nunca lhe faltou.
HEITOR
— Graças a Deus. (p) Bruno, vamos até o escritório? Eu quero lhe explicar alguns detalhes.
BRUNO
— Claro.
HEITOR
— Senhoras, com licença.
LEILA
— Me senti uma velha, agora.
TODOS RIEM. BRUNO E HEITOR LEVANTAM E VÃO PARA O ESCRITÓTIO. LEILA
— Seu marido vai ganhar ainda mais dinheiro do que já tem.
CELESTE
— Eu sei.
LEILA PERCEBE O SEMBLANTE PREOCUPADO QUE CELESTE ESTÁ DEPOIS QUE OS DOIS SAÍRAM DA SALA. LEILA
— Por que você ficou com essa cara? Não gostou da notícia?
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CELESTE
— Gostei.
LEILA
— Não tá parecendo. Pelo menos não agora. Foi só o seu marido sair por aquela porta que você ficou com essa cara amarrada.
CELESTE
— Estou preocupada, Leila. Muito preocupada.
LEILA
— Com o quê?
CELESTE
— Um tempo atrás o Heitor veio com uma história de que se essa hidrelétrica saísse, nós teríamos de passar uma temporada em Divinéia. Você tá lembrada disso.
LEILA
— Você comentou comigo.
CELESTE
— Pois é. A hidrelétrica é muito boa, todo mundo tá muito feliz, mas eu não vou me enterrar naquele fim de mundo que só tem mato e boi.
LEILA
— Falando assim você até parece a Bárbara.
CELESTE
— Tá aí uma coisa que eu concordo com ela. Aquela cidade... Se é que a gente pode chamar Divinéia de cidade. Aquilo lá é um fim de mundo. A última coisa que eu precisava na minha vida é de uma temporada country.
LEILA RI. CORTA PARA:
CENA 02. APARTAMENTO DE HEITOR. ESCRITÓRIO. INTERIOR. NOITE HEITOR E BRUNO CONVERSANDO. BRUNO
— Então nós não corremos mesmo mais nenhum risco?
HEITOR
— Nenhum, meu amigo. A hidrelétrica é nossa. Certo como dois e dois são quatro. Conversei com vários senadores, tanto do governo quanto da oposição. Já está nas nossas mãos.
BRUNO
— Ótimo. E quando sai a concorrência?
HEITOR
— Na semana que vem, mas claro que eu já tenho todas as especificações. A nossa proposta deve começar a ser feita hoje!
BRUNO
— Isso você pode deixar comigo. É só me passar tudo o que a licitação pede que eu começo a fazer.
HEITOR
— Você não imagina como eu estou feliz, Bruno! Nós vamos ganhar muito dinheiro! Muito!
FOGO SOBRE TERRA BRUNO
Capítulo 27
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— Heitor, e quanto à história do Diogo?
HEITOR FICA PREOCUPADO. HEITOR
— Ainda não sei. Mas agora isso precisa ser resolvido rapidamente. Tenho que dar um jeito do Diogo aceitar ser o engenheiro chefe. (p) A Eduarda deu alguma notícia?
BRUNO
— Pra mim, não.
HEITOR
— Eu falei com ela pelo telefone. Achei que estava um pouco hesitante. Sei que o Lucena a ajudou e eles deram um jeito de evitar o encontro do Diogo com o Pedro, mas não sei até quando.
BRUNO
— Por que você não liga pra ela e pergunta?
HEITOR
— É. É o que eu vou fazer.
HEITOR APANHA O TELEFONE. CORTA PARA:
CENA 03. FAZENDA DE HEITOR. SALA. INTERIOR. NOITE BÁRBARA, EDUARDA E ANDRÉ ESTÃO SENTADOS CONVERSANDO. DIOGO ENTRA. BÁRBARA
— Chegou o desaparecido!
EDUARDA
— Que demora, Diogo. A gente tava preocupado.
BÁRBARA
— A gente não. Quem tava preocupada era ela.
EDUARDA
— É que você saiu à tarde e já anoiteceu.
DIOGO
— Eu estava conversando com o Pedro.
EDUARDA
— Então... Vocês se encontraram mesmo?
DIOGO
— Lógico. Eu não ia sossegar se não falasse hoje com o meu irmão.
ANDRÉ
— Não falei que não precisava se preocupar? Dois irmão que não se vêem há tanto tempo. Esses dois tem muito assunto pra colocar em dia.
BÁRBARA
— E como foi o encontro?
DIOGO
— Ótimo. Muito melhor do que eu podia imaginar. Nós conversamos e... Eu vi que todo aquele medo que eu tinha de reencontrar o Pedro era uma besteira. Ele me recebeu de braços abertos. Disse que não tem nenhuma mágoa por eu ter ido embora e ficado tanto tempo longe.
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BÁRBARA
— Que ótimo, Diogo. Você tava tão preocupado com isso.
DIOGO
— É. Mas agora eu tô aliviado.
EDUARDA
— Eu queria muito conhecer o seu irmão. Quero ver se ele é tão bravo como dizem.
ANDRÉ
— Bravo? O Pedro?
EDUARDA
— É. Pelo que eu ouvi, ele adora uma confusão. Tá sempre metido em briga. Bem diferente do Diogo.
ANDRÉ
— Acho que você não tá falando do mesmo Pedro que eu conheço.
EDUARDA FICA SEM GRAÇA. EDUARDA
— Bom, pelo menos foi isso que eu ouvi nesses poucos dias que a gente está aqui.
ANDRÉ
— O Pedro é um cara ótimo. Respeitado pela população de Divinéia. É íntegro, honesto.
EDUARDA
— Nem eu estou dizendo o contrário. Pelo amor de Deus! Só tô falando porque, pelos comentários, eu pensei que ele tivesse... Uma personalidade difícil. Só isso.
ANDRÉ
— Impressão errada, Eduarda.
BÁRBARA
— O que interessa é que os dois se entenderam.
DIOGO
— É, mas a gente ainda têm muito o que conversar. Amanhã eu vou voltar lá. Se vocês quiserem, podem ir junto.
EDUARDA
— Eu quero sim.
ANDRÉ
— Eduarda, você não acha que talvez os dois prefiram conversar sozinhos?
DIOGO
— Não tem problema nenhum. Você vai comigo sim. E se a Bárbara quiser, também vai.
BÁRBARA
— Vou pensar no assunto. Tô conhecendo caipira demais nessa minha turnê rural. Mas como ele é irmão do meu irmãozinho querido, eu vou fazer o sacrifício. (p) Agora o senhor trata de se arrumar que mais tarde nós temos o jantar na fazenda do rei do gado.
DIOGO
— É verdade. Eu tinha me esquecido. Vou tomar banho. Depois eu conto tudo do meu encontro com o Pedro.
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DIOGO SAI. ANDRÉ OBSERVA EDUARDA, DEIXANDO CLARO PARA O PÚBLICO QUE ELE DESCONFIA DE ALGUMA COISA. BÁRBARA
— Falando nisso, como diria meu querido amigo Duhzinho, eu também preciso cuidar da minha beleza. Não é porque eu tô na roça que vou de noiva da quadrilha nesse jantar. Até depois, meus queridos.
BÁRBARA SAI, DEIXANDO EDUARDA E ANDRÉ. ANDRÉ
— O que você tá aprontando, Eduarda?
EDUARDA
— Eu? Tá doido?
ANDRÉ
— Te conheço não é de hoje. Só tô prestando atenção no seu jeito. Primeiro de conversa com o Lucena.
EDUARDA
— Você cismou com essa história.
ANDRÉ
— Não cismei. Eu tô vendo. Olha bem o que você tá fazendo, Eduarda. O Pedro é um cara muito legal. É como se fosse meu irmão. Eu não vou deixar que...
Sonoplastia: - TOQUE DO CELULAR DE EDUARDA. EDUARDA
— Meu celular.
EDUARDA VÊ QUEM ESTÁ FAZENDO A CHAMADA. PARECE FICAR PREOCUPADA. EDUARDA
— É... A minha mãe. Eu vou até o quarto falar com ela.
EDUARDA SAI SOB OS OLHARES DESCONFIADOS DE ANDRÉ. CORTA PARA:
CENA 04. FAZENDA DE HEITOR. QUARTO DE EDUARDA. INTERIOR. NOITE EDUARDA ENTRA FALANDO AO CELULAR E FECHA A PORTA. EDUARDA
— Pronto, doutor Heitor. Agora eu já posso falar. (p) Tá tudo bem. Eu estou fazendo o que nós combinamos. (p) Já. Eles já se encontraram. (p) Eu sei. Sei que vim até Divinéia pra impedir isso e fiz tudo o que estava ao meu alcance. Inclusive contei com a ajuda do Lucena, mas teve uma hora que... (p) Claro. Eu sei que o meu cargo dependia disso. Mas eu disse pro senhor que ia convencer o Diogo a tocar a construção da hidrelétrica e vou fazer isso. Eu lhe dei a minha palavra. Talvez a coisa não saia do jeito que nós havíamos planejado, mas no final, o senhor vai conseguir o que quer. (p) Claro. E eu também. (p) Eu vou mantê-lo informado. Até logo.
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EDUARDA DESLIGA O CELULAR, PREOCUPADA. EDUARDA
— Eduarda, você está deixando as coisas saírem do seu controle. Pensa, mulher! Você precisa fazer alguma coisa pra separar esses dois irmãos. Ou pelo menos pra convencer o Diogo de que a hidrelétrica é o melhor pra Divinéia. (p) Agora que eu já tô quase colocando a mão no que eu quero, não vou voltar atrás. Não vou perder!
CORTA PARA:
CENA 05. FAZENDA DE ARTHUR. QUARTO. INTERIOR. NOITE ARTHUR ARRUMA A MALA APRESSADO ENQUANTO ISABEL OBSERVA. ISABEL
— Mas Coronel, o senhor vai sair assim no meio da noite? E o jantar? Daqui a pouco os convidados...
ARTHUR
— Você liga pra lá e diz que aconteceu um imprevisto. Diz que foi um problema de doença na família e que eu tive de viajar. Peça desculpas por mim. Eles vão entender. (p) Em vez de telefonar, vá até lá pessoalmente. Explique o que aconteceu e diga que logo que eu voltar a gente marca um novo jantar.
ISABEL
— Mas explicar, como? O senhor... Nem me disse o que aconteceu. Ficou transtornado ao telefone e depois veio pra cá arrumar a mala.
ARTHUR
— A Leonor me ligou para...
ARTHUR PÁRA DE ARRUMAR AS MALAS E OLHA PARA ISABEL. ARTHUR
— A Leonor me ligou pra dizer que meu filho sofreu um acidente. Ele caiu de uma porcaria de uma cachoeira e... Meu filho está paralítico, Isabel.
REAÇÃO ESPANTADA DE ISABEL. ISABEL
— O Vinícius? Mas que tragédia, Coronel! Como foi isso?
ARTHUR
— Não entendi direito. A Leonor estava muito nervosa ao telefone. Eu quero ir até lá e ver com os meus próprios olhos.
ISABEL
— Pode deixar que eu arrumo a sua mala.
ARTHUR
— Não. Eu prefiro que você vá até a fazenda e avise que o jantar foi cancelado. Pode deixar que eu me viro aqui.
ISABEL
— Sim senhor. Eu vou imediatamente.
ISABEL SAI.
FOGO SOBRE TERRA ARTHUR
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— Meu filho. O que é que eu vou fazer?
ARTHUR VOLTA A ARRUMAR A MALA. CORTA PARA:
CENA 06. FAZENDA DE HEITOR. SALA. INTERIOR. TARDE ISABEL FALANDO COM DIOGO. ANDRÉ, BÁRBARA, EDUARDA E RITA EM CENA. ISABEL
— O Coronel Arthur pede mil desculpas. Espera que vocês entendam ele ter desmarcado o jantar assim, em cima da hora.
DIOGO
— Claro que nós entendemos.
BÁRBARA
— Coitado do rapaz.
ANDRÉ
— Mas como é o estado dele?
ISABEL
— Ele ainda não sabe direito. Por isso está indo hoje mesmo para Cuiabá. Quer tomar pé da situação.
EDUARDA
— Diga para o Coronel Arthur não se preocupar conosco, e também que, se ele precisar de alguma coisa, é só avisar.
DIOGO
— Claro. Eu ia dizer exatamente isso. Se precisarem do avião...
ISABEL
— Obrigado, mas não é necessário. O Coronel Arthur tem um avião na fazenda. Aliás, a essa hora ele já deve ter ido embora. (p) Bem, era isso. Agora, se vocês me derem licença, eu preciso voltar pra fazenda.
DIOGO
— Claro. A senhora quer que alguém a acompanhe?
ISABEL
— Não. Eu vim de carro. Obrigado. Tenham uma boa noite.
BÁRBARA
— A senhora também.
ISABEL SAI. TODOS UM POUCO ATORDOADOS COM A NOTÍCIA, INCLUSIVE RITA, QUE ESTÁ MAIS NERVOSA DO QUE OS OUTROS. DIOGO
— Coitado do Arthur.
BÁRBARA
— Coitado do menino que tá lá sem poder andar. Nessa idade. (p) Não que faça diferença a idade. A gente precisa das pernas a vida toda, mas assim novinho, acho que deve ser pior.
EDUARDA
— Caindo de uma cachoeira. Coisa mais sem sentido.
ANDRÉ
— Com ou sem sentido, a gente ficou sem o jantar.
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DIOGO, BÁRBARA E EDUARDA OLHAM SURPRESOS PARA ANDRÉ. ANDRÉ
— O que foi gente? Não falei nada demais. Vai dizer que vocês não estão com fome?
OS TRÊS SE OLHAM. BÁRBARA
— Morrendo!
CORTA PARA:
CENA 07. FAZENDA DE HEITOR. COZINHA. INTERIOR. NOITE RITA COZINHA, MAS ESTÁ PREOCUPADA. SANDOVAL ENTRA E A ABRAÇA POR TRÁS. SANDOVAL
— Saudade de ocê, minha preta.
RITA
— Que susto, Sandoval!
SANDOVAL VIRA RITA PARA SI E COMEÇA A BEIJAR O PESCOÇO DA MULHER. SANDOVAL
— Quando é que ocê vorta pra casa? Num aguento mais dormi sozinho.
RITA SE SOLTA DE SANDOVAL. RITA
— Ocê sossege esse facho, que eu tô trabalhando!
SANDOVAL
— Num vejo a hora desse povo todo vortá pra São Paulo.
RITA
— Mas pelo jeito, a coisa vai demorá.
SANDOVAL
— Por quê? Num vá me dizê que eles tão querendo ficá mais tempo aqui em Divinéia?
RITA
— Num sei. Num costumo me metê em vida de patrão. Tô falando porque inté agora num escutei ninguém falando em ir embora.
SANDOVAL
— Acho que eles num deve de ficá mais muito tempo. Povo da cidade grande num aguenta ficá vivendo aqui no meio do mato.
RITA
— Se aguenta ou num aguenta, num é poblema meu. Sandoval, vai caçá o que fazê! Me deixa aqui que eu tô trabalhando!
SANDOVAL
— Diaxo, Rita. Que humor do cão que ocê tá. Aconteceu arguma coisa?
RITA
— Aconteceu! Aconteceu que eu tô irritada e num quero conversa! Ocê me deixe.
SANDOVAL
— Tá bão. Tô indo. Vô pra nossa casa dormi sozinho.
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— Bom sono. Agora vai.
SANDOVAL SAI SEM ENTENDER O HUMOR DE RITA. DEPOIS ELA SE ENCOSTA À PIA, PENSATIVA. RITA
— Coitado do Arthur. Deve de tá sofrendo demais com essa história do menino dele. Queria tanto podê fazê arguma coisa pra ajudá.
CORTA PARA:
CENA 08. HOTEL. RECEPÇÃO. INTERIOR. NOITE FRIDA FAZ ALGUMAS ANOTAÇÕES EM UM CADERNO. BRISA ENTRA PREOCUPADA. BRISA
— Dona Frida! Que bom que a senhora tá aí!
FRIDA
— O que aconteceu, Brisa? Parece que viu um gespent. Um fantasma.
BRISA
— Fantasma eu num vi não, mas tô achando é que vai acontecê uma desgraça!
FRIDA
— Unheil?! Uma desgraça! Mas o que aconteceu?
BRISA
— Pai me disse que contou pra Chica a história da tar da reunião que dona Hilda tá fazendo na casa dela. (p) Ela foi pra lá!
FRIDA
— Pra casa de dona Hilda?!
BRISA
— É!
FRIDA
— Mein Gott! Chica vai arrumar confusão!
BRISA
— E eu não sei? Por que a senhora acha que eu tô desse jeito? Tenho que arrumá um jeito de tirá Chica de lá. A senhora vai comigo?
FRIDA
— Claro! Só um minuto.
FRIDA VAI ATÉ A PORTA QUE DÁ PARA O INTERIOR DO HOTEL. FRIDA
— Lino! Lino, venha cá!
LINO ENTRA. LINO
— Pronto, dona Frida.
FRIDA
— Eu vou precisar sair. Você toma conta do hotel.
LINO
— Sim senhora. Pode deixar.
FRIDA
— Vamos, Brisa.
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FRIDA E BRISA SAEM. CORTA PARA:
CENA 09. CASA DE HILDA. SALA. INTERIOR. NOITE VÁRIAS MULHERES FALAM AO MESMO TEMPO. ENTRE ELAS ESTÃO CORINA E MINERVINA. CHICA, SENTADA, APENAS OBSERVA COM AR DE DESDÉM ENQUANTO HILDA TENTA SER OUVIDA. MUNDICA TAMBÉM ESTÁ EM CENA. HILDA
— Senhoras, por favor. Vamos falar uma de cada vez, porque assim...
CONTINUAM FALANDO SEM PRESTAR ATENÇÃO EM HILDA. HILDA
— Senhoras, desse jeito nós não vamos...
AS MULHERES SEGUEM FALANDO, SEM OUVIR HILDA. HILDA
— Mas será possível que ninguém me ouve.
CHICA COLOCA OS DEDOS NA BOCA E DÁ UM ASSOBIO FORTE. AS MULHERES PÁRAM DE FALAR. CHICA
— Será que ocês num pode pará de matraqueá um pouco? Num tão vendo a dona aí se esgoelando pra falá com ocês? (p) Depois a sem educação sou eu. Pode falá... Mas antes a senhora pede pra Mundica servi mais daqueles biscoitinho que tão bom por demais.
HILDA, IRRITADA, FAZ UM SINAL COM A CABEÇA PARA QUE MUNDICA SIRVA CHICA. A EMPREGADA OBEDECE. HILDA
— Como eu estava dizendo, já resolvi todos os últimos detalhes sobre a quermesse e ela vai mesmo ocorrer no dia previsto. Não adiaremos nem uma hora.
CORINA
— Mas dona Hilda, e como fica a história da epidemia?
HILDA
— Fica lá no hospital. Bem longe da nossa festa. Até parece que um vírus delinqüente e desagradável ia impedir a quermesse pra santa. Era só o que me faltava.
MINERVINA
— E a construção do palanque?
HILDA
— Isso é obrigação do prefeito. Ele não quer fazer discurso? Então que providencie o palco.
CHICA
— Eu quero perguntá uma coisa.
HILDA SEMPRE REAJE COM EXPRESSÃO DE DESAGRADO QUANDO CHICA FALA.
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HILDA
— Fale.
CHICA
— A senhora falô que vai fazê umas mudança nas barraca. Eu quero sabê que mudança são essas.
HILDA
— Mudanças... necessárias pro bom andamento da festa.
CHICA
— Dona Hilda, num enrola. Dá nome aos boi. Que raio de mudança a senhora tá querendo fazê?
HILDA
— Bem, eu andei... Eu andei fazendo um remanejamento nas barracas. Na disposição delas.
CHICA
— Como é?
HILDA
— É isso mesmo. Achei que algumas das barracas deveriam ter um pouco mais de destaque.
CHICA
— Como a sua, por exemplo.
HILDA
— Claro! Nada mais justo. Eu estou organizando a quermesse, vou ter a barraca mais bem feita e com os melhores produtos...
CHICA
— Quem disse?!
HILDA
— Eu! É claro que por todos esses motivos, a minha barraca deve ser a melhor localizada.
CHICA
— Sabia que a senhora tava aprontando arguma coisa!
CHICA SE LEVANTA. HILDA
— Eu não estou aprontando nada! Você me respeite! Estou apenas estruturando melhor a festa.
CHICA
— A senhora é uma véia pilantra!
HILDA E TODAS AS MULHERES SE CHOCAM. Sonoplastia: TOQUE DE CAMPAINHA. MUNDICA VAI ATENDER. HILDA
— Chica Martins, você não pode falar assim comigo!
CHICA
— Véia pilantra, safada e mequetrefe! E se não fosse tão véia eu dava na sua cara!
MUNDICA ABRE A PORTA E BRISA E FRIDA ENTRAM, VENDO A CONFUSÃO. BRISA
— O que tá acontecendo?
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CHICA
— Tá acontecendo que a surucucú do pantanal tá querendo passá a perna na gente!
HILDA
— Grossa! Sem educação!
CHICA
— Sô isso tudo mesmo! Tá pensano o quê? Que eu vô ficá quieta enquanto a senhora coloca as manguinha de fora? Pode tirá o cavalinho da chuva!
BRISA
— Chica, pelo amor de Deus, pára com isso!
MUNDICA
— Dona Chica, a senhora num qué uns biscoitinho pra acarmá?
CHICA
— Ocê sai com esses biscoitinho da minha frente antes que eu lhe mande fazê uma coisa muito feia com eles!
MUNDICA
— Virgem Maria!
HILDA
— Chega! Ponha-se daqui pra fora!
CHICA
— Eu vô! Mas antes quero saber onde foi que a senhora colocô a minha barraquinha!
HILDA
— No canto!
CHICA
— Canto? Que canto?!
HILDA
— No cantinho! Na saída da feira!
BRISA
— Que absurdo!
CHICA
— E a senhora por acaso acha que Chica Martins é mulher de canto? De cantinho?
HILDA
— É o lugar perfeito pra você vender aqueles trapinhos horríveis! Aquelas coisas de péssimo gosto!
FRIDA
— Mas... E no centro da feira? No lugar onde ficaria a barraca de Chica e Brisa?
HILDA
— Vai ficar a minha.
CHICA
— A senhora ainda tinha arguma dúvida disso, dona Frida? Tá na cara que a cascavel de dentadura aí ia querê o melhor lugar da feira!
HILDA
— Eu não vou ficar sendo ofendida dentro da minha casa! Se vocês não saírem imediatamente, vou chamar a polícia!
FRIDA
— Chica, é melhor nos irmos embora. Isso pode acabar em unklarheit!
FOGO SOBRE TERRA
Capítulo 27
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CHICA OLHA PARA FRIDA SEM ENTENDER. FRIDA
— Confusão.
CHICA
— A senhora também têm cada hora pra começá a enrolá essa língua!
BRISA
— Vamo embora, Chica.
CHICA
— Tá bão! Eu vô! Só quero dizê uma coisa pra essa bruxa. Se a senhora pensa que vai se dá bem nessa história, tá é muito enganada!
HILDA
— Eu já me dei bem, Chica Martins.
CHICA
— A senhora me aguarde!
FRIDA, CHICA E BRISA SAEM. HILDA
— Gentinha mais desagradável.
CORTA PARA:
CENA 10. CLUBE RECREATIVO. SALÃO. INTERIOR. NOITE CASA CHEIA. ZORAIDE E TIANA DANÇAM COM OS CLIENTES ENQUANTO BALBINA ATENDE NO BAR. ZULMIRA OBSERVA TUDO DE UM CANTO, SORRINDO E DANÇANDO. BICHO-BRABO, SENTADO À UMA MESA ESTÁ TRISTE. NILO, QUE ESTAVA EM UM CANTO, SEM SER VISTO, SE APROXIMA. NILO
— Posso sentá?
BICHO-BRABO — Faz favor. NILO SE SENTA. ZULMIRA VÊ DE LONGE E AMEAÇA IR, MAS BALBINA A SEGURA. FAZ UM GESTO PARA QUE ELA ESPERE. ZULMIRA FICA OBSERVANDO. NILO
— Faz tempo que ocê num aparece por aqui. Pelo menos não que eu tenha visto.
BICHO-BRABO — É. NILO
— Aconteceu arguma coisa com ocê? Parece que num tá pra conversa.
BICHO-BRABO — Num tô mesmo. Me aconteceram umas coisa. NILO
— Home quando fica assim, só pode ser por dois motivo: Dinheiro ou mulher. (p) Aposto que é por causa de Brisa.
BICHO-BRABO — É isso memo.
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— Ocê é mesmo um bobão, Bicho-Brabo. Num cansa de corrê atrás de uma mulher que não lhe qué?
BICHO-BRABO — Nilo, ocê me deixe aqui no meu canto. NILO
— Um home que honra as calça que veste num faz esse papel que ocê tá fazendo, não. Divinéia inteira sabe que, desde pequena, Brisa gosta de André, o filho do beato. Tá certo que, enquanto ele tava fora, ocê inté podia de tê alguma esperança, mas agora que ele voltou, pode desistir.
BICHO-BRABO — Nilo, eu num quero sabê dessa história. NILO
— Precisa vê se ele ainda vai querê ela. O rapaz deve de tá acostumado com mulher da cidade grande, fina, cheirosa, que nem a tal da dona Eduarda que chegou com eles. Acho que ele num vai querê uma caipirona que nem Brisa, por mais jeitosa que seja. Só se ele tivé pensando em se diverti com ela, num é memo?
BICHO-BRABO LEVANTA E PEGA NILO PELO COLARINHO. BICHO-BRABO — Ocê lave essa boca antes de falá de Brisa! Eu mato ocê, Nilo Gato! NILO RI COM CINISMO. NILO
— Ocê é mesmo um bobalhão, Bicho-Brabo. Vai preparando a testa porque logo a Brisa vai lhe colocar um par de enfeites aí.
BICHO VAI DAR UM SOCO EM NILO, MAS PÁRA COM A CHEGADA DE ZULMIRA. ZULMIRA
— Pare, Bicho-Brabo! Não faça isso!
BICHO-BRABO — Ele tá pedindo, dona Zulmira! ZULMIRA
— Eu sei. Ele sempre pede, mas por favor, não faça isso.
BICHO-BRABO HESITA UM POUCO, MAS DEPOIS SOLTA NILO. ZULMIRA
— Nilo Gato, mas será possível que você vai continuar infernizando a minha vida? Já cansei de dizer que não lhe quero por aqui. Saia!
NILO SORRI E VAI EMBORA. BICHO-BRABO — A senhora me desculpe, dona Zulmira, mas é que Nilo ficou me provocando. Eu perdi a cabeça. ZULMIRA
OS DOIS SORRIEM.
— Não tem problema. Conheço muito bem aquele traste. E também conheço você. Sei que não é de confusão... Apesar desse apelido.
FOGO SOBRE TERRA ZULMIRA
Capítulo 27
Pag.: 16
— Senta.
BICHO E ZULMIRA SE SENTAM. ZULMIRA
— Antes do Nilo vir aqui lhe azucrinar, eu tava percebendo a sua tristeza. Chegou, sentou aqui, pediu uma cerveja e não abriu a boca. Não chamou uma das meninas, não dançou. O que aconteceu?
BICHO-BRABO — Ah, dona Zulmira. É duro... é duro gostar de quem não gosta da gente. ZULMIRA
— Você não tá querendo me dizer que têm uma moça nessa cidade que não lhe quer, está?
BICHO-BRABO — É isso mesmo. ZULMIRA
— E quem é essa moça?
BICHO-BRABO — Brisa. ZULMIRA
— É uma moça muito bonita. Uma menina de ouro.
BICHO-BRABO — É sim, mas não gosta de mim. Tô cansado de correr atrás dela e num conseguir nem uma migalha de atenção. ZULMIRA
— Esses assuntos são complicados. Os assuntos do coração. Posso te dar um conselho?
BICHO-BRABO — Claro que pode. ZULMIRA
— Corre atrás dela, não. Deixa a Brisa sentir a sua falta. Deixa ela ter vontade de lhe ver, de falar com você.
BICHO-BRABO — Só que eu acho que ela num vai sentir essa falta é nunca. ZULMIRA
— Se tiver de ser assim, que seja. O que não pode é você ficar desse jeito por causa dela. Você é um moço bom e não merece ficar com essa tristeza toda.
BICHO-BRABO — A senhora é uma pessoa muito boa, dona Zulmira. Tá sempre querendo ver todo mundo feliz, querendo ajudar. ZULMIRA
— Não faço mais do que a minha obrigação. Se todo mundo fosse assim, se tivesse o interesse de ver as outras pessoas felizes, o mundo seria bem melhor.
BIHCO-BRABO — A senhora tá certa. ZULMIRA
— Acaba com essa tristeza, menino.
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Capítulo 27
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ZULMIRA FAZ UM GESTO PARA TIANA E A MOÇA SE APROXIMA. TIANA
— Chamou, Madrinha?
ZULMIRA
— Chamei. Quero que você leve Bicho-Brabo pra dançar. Ele tá um pouco triste e você sabe que isso eu não aceito. Na casa de Zulmira Batalhão só têm alegria.
TIANA
— Vai ser um prazer dançá com Bicho-Brabo.
BICHO-BRABO — Num sei se é uma boa idéia. Hoje eu num tô uma boa companhia. ZULMIRA
— Nada disso. Vai dançar sim. Lhe garanto que Tiana vai deixar você bem animadinho. Pode levar o moço pra pista de dança, Tiana.
TIANA
— Sim senhora.
TIANA SEGURA BICHO PELA MÃO E O LEVA PARA A PISTA DE DANÇA. OS DOIS CONVERSAM E COMEÇAM A RIR ENQUANTO DANÇAM. ZULMIRA OLHA, SORRIDENTE. CORTA PARA:
CENA 11. SÃO PAULO. EXTERIOR. NOITE Sonoplastia: “AMARGO” – ZECA BALEIRO. TOMADAS DE SÃO PAULO À NOITE CORTA PARA:
CENA 12. APARTAMENTO DE HEITOR. QUARTO. INTERIOR. NOITE CELESTE DE CAMISOLA, SENTADA EM UMA POLTRONA COM UM LIVRO NA MÃO E HEITOR SE PREPARANDO PARA DEITAR. HEITOR
— De onde você tirou essa idéia maluca, Celeste?
CELESTE
— Maluca, não. É uma ótima idéia, como todas que eu tenho.
HEITOR
— Colocar o Gustavo pra trabalhar na empresa.
CELESTE
— Você não vive dizendo que ia adorar que ele e a Bárbara se acertassem?
HEITOR
— Ia, mas eu não vejo no que isso pode ajudar a juntar os dois. Você sabe que a Bárbara quer distância do rapaz. Imagina se ele começa a trabalhar comigo.
CELESTE
— Mas vai ser diferente, meu bem. Hoje o Gustavo é só um cara chato que anda atrás dela.
FOGO SOBRE TERRA
Capítulo 27
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HEITOR OLHA PARA CELESTE COM AR DE REPROVAÇÃO. CELESTE
— É chato mesmo. Não adianta me olhar assim. Gosto do Gustavo. Acho ele um amor de rapaz, mas que é chato, é.
HEITOR SE SENTA NA CAMA. HEITOR
— E como você pretende mudar essa imagem dele?
CELESTE
— Quero que a Bárbara veja ele como um rapaz ativo, empreendedor. Um homem forte. Ela tá acostumada com esse Gustavo que tá aí. Um filhinho de papai que passou um pouco da idade. É isso que eu quero mudar. Se ele começar a trabalhar na construtora, vai virar um outro homem. Olha só o André. Quando chegou aqui era um bichinho de mato. Agora ganhou vida nova. Parece até que ficou mais bonito. Claro que não é só isso. Eu me comprometi a dar umas dicas pro Gustavo. Garanto que em pouco tempo a Bárbara vai começar a se interessar por ele.
HEITOR
— Não sei, Celeste. Essa história, pra mim, não faz o menor sentido. Se você quer saber, eu já estou até desistindo de juntar esses dois. É uma batalha perdida.
CELESTE
— De jeito nenhum! Vai desistir? Nem parece o Heitor Gonzaga que eu conheço.
HEITOR SORRI. HEITOR
— Acho que você tá dando importância demais pra esse assunto.
HEITOR SE DEITA E CELESTE VAI ATÉ ELE, SENTANDO AO SEU LADO NA CAMA. CELESTE
— Meu amor, você não confia em mim?
HEITOR
— Confio.
CELESTE
— Então me deixa tentar juntar os dois. O máximo que pode acontecer é não dar certo. Cada um pro seu lado.
HEITOR
— Por mim, tudo bem. Se você faz tanta questão.
CELESTE
— Então você vai contratar o Gustavo?
HEITOR
— Essa é a parte da história que eu não estou gostando.
CELESTE
— Mas por quê? O Gustavo é engenheiro. Pelo que consta, um bom profissional, não é?
HEITOR
— É. Nunca soube de nada que o desabonasse.
FOGO SOBRE TERRA
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CELESTE
— Então, meu amor. É impossível que numa construtora do tamanho da Gonzaga, não haja alguma coisa pra ele fazer! Não precisa ser coisa grande.
HEITOR
— Você não vai se dar por vencida, não é?
CELESTE
— Não.
HEITOR
— Tá bem. Eu vou ver o que posso fazer.
CELESTE
— Verdade?
HEITOR
— É.
CELESTE ABRAÇA HEITOR E O BEIJA. CELESTE
— Sabia que você ia concordar!
HEITOR
— Peça pro Gustavo ir até lá e falar comigo.
CELESTE
— Amanhã de manhã bem cedo eu já vou fazer isso.
CORTA PARA:
CENA 13. SÃO PAULO. EXTERIOR. MANHÃ Sonoplastia: “VIESTE” – LENINE. TOMADAS MOSTRANDO O AMANHECER EM SÃO PAULO E O COMEÇO DO MOVIMENTO NAS RUAS. CORTA PARA:
CENA 14. APARTAMENTO DE HEITOR. SALA. INTERIOR. MANHÃ CELESTE E LEILA CONVERSANDO. LEILA
— Então quer dizer que o Heitor concordou?
CELESTE
— Concordou. Disse que vai contratar o Gustavo.
LEILA
— Tomara que ele não mude de idéia.
CELESTE
— Claro que não. Na dúvida eu perguntei de novo hoje, antes dele sair pro clube.
LEILA
— Vou torcer pra tudo dar certo. Quem sabe assim você não fica livre da Bárbara de uma vez?
CELESTE
— É tudo o que eu mais queria nessa vida. Ela longe dessa casa, vivendo a vida dela e parando de me aborrecer. Parece até um sonho se realizando.
FOGO SOBRE TERRA
Capítulo 27
LEILA
— E quando você vai falar com o Gustavo?
CELESTE
— Agora.
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CELESTE VAI ATÉ O TELEFONE E FAZ A LIGAÇÃO. CELESTE
— Gustavo? (p) Gustavo, meu querido, aqui é Celeste. Como vai? (p) Ótima. Melhor impossível. Liguei porque tenho ótimas notícias. (p) Lembra daquela nossa conversa? (p) Isso. Heitor pediu pra que você passe na construtora. Ele quer falar com você. (p) Claro, meu bem. Ligue pra secretária dele, a dona Vera, e marque uma hora. Você tem o número? (p) Ótimo. Depois você me liga contando tudo. (p) Imagina, Gustavo. É um prazer poder ajudar você a conquistar a Bárbara. Um beijo. (p) Tchau.
CELESTE DESLIGA O TELEFONE. CELESTE
— Pronto. O primeiro passo já foi dado.
LEILA
— E agora?
CELESTE
— E agora é só dar tempo ao tempo... e dar um empurrãozinho também.
AS DUAS RIEM. CORTA PARA:
CENA 15. CONSTRUTORA. SALA DE HEITOR. INTERIOR. MANHÃ HEITOR E BRUNO CONVERSANDO. HEITOR
— Eu prometi pra Celeste que faria. Será que você consegue alguma colocação pro Gustavo na empresa?
BRUNO
— Claro. Sem problema nenhum. O Gustavo é ótimo profissional. Tenho ouvido falar muito bem do trabalho dele.
HEITOR
— Menos mal. Um problema a menos para eu me preocupar.
BRUNO
— Falando em problema, e a hidrelétrica?
HEITOR
— E você chama isso de problema? É uma benção, meu amigo.
BRUNO
— Sim. Eu estou dizendo em relação ao Diogo.
HEITOR
— Não gostei da conversa que tive com a Eduarda pelo telefone. Ela me garantiu que vai conseguir convencê-lo, mas confesso que fiquei na dúvida. (p) Andei pensando em agir diretamente nesse caso.
FOGO SOBRE TERRA
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BRUNO
— Como?
HEITOR
— Indo até Divinéia.
BRUNO
— Agora?
HEITOR
— Entre hoje e amanhã. Quero ir enquanto eles ainda estão por lá. Fazer com que o Diogo perceba as coisas da mesma forma que eu.
BRUNO
— Acho uma boa idéia.
HEITOR
— E eu também tenho alguns outros assuntos que preciso resolver por lá. Logo a notícia sobre a obra vai vasar na imprensa. Preciso conversar com os meus aliados políticos. Nada pode dar errado. Preciso me cercar de aliados por todos os lados, porque sei que vou ter uma batalha dura pela frente. Muita gente vai ser contra, vai tentar impedir a construção da hidrelétrica.
BRUNO
— Vai ser uma guerra, meu amigo.
HEITOR
— Eu sei, mas nunca tive medo de guerras. Se tivesse, não tinha chegado aonde cheguei. Garanto que essa vai ser mais uma que eu vou ganhar.
CORTA PARA:
CENA 16. CUIABÁ. EXTERIOR. MANHÃ TOMADAS MOSTRANDO CUIABÁ DE MANHÃ. CORTA PARA:
CENA 17. CUIABÁ. HOSPITAL. CORREDOR. INTERIOR. TARDE LEONOR FALA AO CELULAR. ARTHUR SAI DO ELEVADOR E COMEÇA A PROCURAR O QUARTO. LEONOR VÊ O EX-MARIDO, DESLIGA O CELULAR E VAI ATÉ ELE. LEONOR
— Arthur!
ARTHUR
— Leonor! Cadê o Vinícius?
LEONOR
— No quarto, dormindo.
ARTHUR
— Como ele está?
LEONOR
— Bem, na medida do possível. Tirando o fato de ele não ter movimento da cintura pra baixo, não há mais nenhum problema.
ARTHUR
— Você fala como se isso fosse pouca coisa.
FOGO SOBRE TERRA
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LEONOR
— Claro que não! Só que poderia ter sido pior! Vinícius poderia estar morto agora.
ARTHUR
— Deus me livre! Não fala uma coisa dessa que me dá até um aperto no peito. Passei a viagem toda tentando entender o que aconteceu, já que você não conseguiu falar direito no telefone.
LEONOR
— Eu não sei o que deu em mim. Fiquei nervosa. Quando comecei a falar parecia que havia aberto uma represa em mim. Eu me descontrolei. Me desculpe.
ARTHUR
— Não precisa se desculpar. Você agüentou tudo isso sozinha. Uma hora tinha que botar pra fora. (p) Eu quero ver o Vinícius. Quero ver como o meu filho está.
LEONOR
— Arthur, eu quero que você saiba que sou contra isso. Só lhe chamei porque o Vinícius fez questão e...
ARTHUR
— Leonor, você acha mesmo que é hora pra esse tipo de conversa? Eu sei que nós tivemos os nossos problemas, mas o Vinícius é meu filho. Eu tenho o direito de estar ao lado dele numa hora dessas. E ele também. Nada mais justo do que ter o pai ao lado pra enfrentar isso.
LEONOR
— Eu sei. Foi por isso que eu concordei.
ARTHUR
— Será que agora eu posso ver o Vinícius?
LEONOR
— Eu levo você até o quarto.
OS DOIS SEGUEM CAMINHANDO PELO CORREDOR. CORTA PARA:
CENA 18. CUIABÁ. HOSPITAL. QUARTO DE VINÍCIUS. INTERIOR. DIA VINÍCIUS DORME. ARTHUR E LEONOR ENTRAM NO QUARTO. LEONOR
— Ele ainda está dormindo. Os remédios dão sono.
ARTHUR SE APROXIMA DA CAMA E, EMOCIONADO, FICA OLHANDO O FILHO. ARTHUR
— Como o meu filho tá crescido. Já é um homem.
LEONOR
— É. Mas têm cabeça de criança ainda. Não sei por que cismou de subir na tal da cachoeira.
ARTHUR
— Ele escorregou?
LEONOR
— É. Escorregou e caiu de costas numa pedra.
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ARTHUR
— E o que o médico disse?
LEONOR
— Que nós precisamos esperar. Ele pode recuperar os movimentos, mas também pode acontecer o pior.
ARTHUR PASSA A MÃO PELOS CABELOS DE VINÍCIUS, QUE ACORDA. VINÍCIUS
— Pai?
ARTHUR
— Sou eu, meu filho.
LEONOR
— Eu não disse que ia ligar pro seu pai?
VINÍCIUS
— Disse, mas eu não acreditei muito.
ARTHUR
— Mas eu estou aqui. Como você está se sentindo?
VINÍCIUS
— Bem. Pelo menos da metade pra cima. Da metade pra baixo eu não sinto nada.
ARTHUR
— Nós vamos dar um jeito nisso, Vinícius. Escuta o que o pai tá dizendo. Mando você pra qualquer lugar do mundo. Você vai ser atendido pelos melhores médicos, mas eu tiro você dessa cama.
VINÍCIUS
— Não sei, pai. Eu tô desanimado.
LEONOR
— Não pode, meu filho. Você precisa acreditar. Precisa se esforçar, fazer os exercícios.
ARTHUR
— Sua mãe tá certa. Vai fazer tudo o que precisa fazer. Não quero ver você desanimado e nem derrotado. Quero meu filho lutando! Entendeu?
VINÍCIUS
— Entendi.
ARTHUR
— Isso. Assim que eu quero ver você falando.
VINÍCIUS
— Obrigado por ter vindo pai. É bom ter o senhor aqui ao meu lado.
ARTHUR
— Eu vou estar sempre ao seu lado, meu filho. Sempre.
ARTHUR BEIJA A TESTA DO FILHO ENQUANTO LEONOR OBSERVA, PARECENDO NÃO GOSTAR DA SITUAÇÃO. CORTA PARA:
CENA 19. DIVINÉIA. PRAÇA. EXTERIOR. MANHÃ Sonoplastia: “DIVINÉIA” – EUSTÁQUIO SENA. TOMADA MOSTRANDO O MOVIMENTO NA PRAÇA PRINCIPAL. PESSOAS ENTRAM E SAEM DA IGREJA E NAS LOJAS.
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CORTA PARA:
CENA 20. SÍTIO DE ZÉ MARTINS. COZINHA. INTERIOR. MANHÃ CHICA, BRISA E ZÉ MARTINS TOMAM CAFÉ DA MANHÃ CHICA
— Se aquele maracujá de gaveta acha que as coisa vão ficá assim, ela tá é muito enganada. Só porque ela qué quê vai ficá com o lugar da minha barraca! Nem que eu tenha que botá fogo na quermesse, mas que ela num vai, num vai!
BRISA
— Que horror falá uma coisa dessa, Chica! É pecado. Imagina! Botá fogo na festa da santa. Ela pode castigá ocê.
CHICA
— Ia sê muita injustiça! A outra apronta e eu é que pago o pato!
ZÉ MARTINS
— Chica, num adianta ocê ficá assim. Parece até que num conhece dona Hilda. Ela vai mexê os pauzinho até tudo ficá do jeitinho que ela qué.
CHICA
— E por causa disso eu tenho que ficá de braço cruzado só vendo? Só se eu num me chamasse Chica Martins! (p) Claro que eu num vô botá fogo na quermesse.
BRISA
— Graças a Deus. De ocê eu num duvido nada.
CHICA
— Mas eu tô com umas idéia aqui. Aliás, já tão faz é tempo na minha cabeça. Desde que eu soube que a jararaca engomada ia fazê uma barraca de bordado que nem que a nossa.
BRISA
— E que idéia é essa?
CHICA
— Quando chegá a hora eu lhe conto.
ZÉ MARTINS
— Mudando de assunto, ocê por acaso já falô com o seu noivo desde que ele vortô de viagem?
CHICA
— Pedro?
ZÉ MARTINS
— E por acaso ocê tem outro noivo?
CHICA
— Ele já vortô?
ZÉ MARTINS
— Ontem. Pelo menos foi o que Tonho mais Sandoval me falaram.
CHICA
— E por que esse infeliz num veio falá comigo, que sô noiva dele?
ZÉ MARTINS
— Vai sabê. Deve de tá bravo com aquelas coisa que ocê andô falano pra ele.
FOGO SOBRE TERRA CHICA
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— Num me fartava mais nada. Quanto mais eu rezo, mais assombração, aparece!
CHICA LEVANTA E COLOCA SEU XALE. BRISA
— Onde ocê vai?
CHICA
— Tê uma conversinha com seu Pedro Azulão! Ele que num se meta a besta comigo!
CHICA SAI. CORTA PARA:
CENA 21. FAZENDA DE HEITOR. EXTERIOR. MANHÃ EDUARDA E BÁRBARA CONVERSANDO NA FRENTE DA CASA. BÁRBARA
— Tem certeza que não quer vir comigo?
EDUARDA
— Absoluta. Morro de medo de cavalo. Quando eu era pequena fui passar as férias em Águas de Lindóia e minha mãe caiu do cavalo. Não passo nem perto.
BÁRBARA
— Faz tempo que eu não monto, mas não têm segredo.
TONHO CHEGA TRAZENDO O CAVALO. TONHO
— Tá aqui, dona Bárbara. Pronto pra senhora montar.
BÁRBARA
— Muito obrigada.
TONHO
— Quer ajuda pra subir?
BÁRBARA
— Não. Pode ir. Obrigada.
TONHO
— Licença.
TONHO SE AFASTA. A CAM MOSTRA PEDRO CHEGANDO À CAVALO E DEPOIS VOLTA PARA EDUARDA E BÁRBARA. EDUARDA
— Bom passeio.
BÁRBARA
— Obrigada.
BÁRBARA MONTA NO CAVALO E ELE FICA INQUIETO. BÁRBARA
— Calma, cavalinho. Não fica nervoso. Eu sou boazinha.
EDUARDA
— Bárbara, esse cavalo tá bravo demais.
FOGO SOBRE TERRA BÁRBARA
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— Ele só tá assustado. Calma, cavalinho.
O ANIMAL FICA AINDA MAIS AGITADO E COMEÇA A EMPINAR. BÁRBARA SEGURA FIRME PARA NÃO CAIR. EDUARDA
— Segura firme, Bárbara! Tonho! Tonho!
O CAVALO SAI EM DISPARADA. BÁRBARA AGARRADA À ELE PARA NÃO CAIR. BÁRBARA
— Socorro!
PEDRO PERCEBE O QUE ESTÁ ACONTECENDO E SAI GALOPANDO ATRÁS DO CAVALO DE BÁRBARA. TONHO SE APROXIMA DE EDUARDA. TONHO
— O que aconteceu?
EDUARDA
— O cavalo disparou! Um dos peões foi atrás da Bárbara!
TONHO
— Eu vou pegar meu cavalo!
TONHO SAI CORRENDO. CLOSE EM EDUARDA, PREOCUPADA. CORTA PARA:
CENA 22. CAMPO. EXTERIOR. MANHÃ O CAVALO DE BÁRBARA SEGUE EM DISPARADA PELO PASTO. ELA GRITA PARA QUE ELE PARE, MAS O ANIMAL NÃO OBEDECE. PEDRO VEM LOGO ATRÁS, TAMBÉM EM GRANDE VELOCIDADE. CORTE PARA UM PONTO MAIS À FRENTE DO CAMINHO, NUM BRAÇO DO RIO JURAPORI. A CAM MOSTRA UMA PONTE QUEBRADA. BÁRBARA PERCEBE E FICA TENTANDO FREAR O ANIMAL, MAS NÃO CONSEGUE. PEDRO TAMBÉM VÊ PARA ONDE O ANIMAL ESTÁ SE DIRIGINDO. PEDRO
— A ponte quebrada! Minha Nossa Senhora, me ajuda a alcançá essa moça!
UMA TOMADA AÉREA MOSTRA O PLANO GERAL, COM OS DOIS CAVALOS GALOPANDO EM DIREÇÃO À PONTE QUEBRADA. A IMAGEM CONGELA E UMA BARRAGEM DE HIDRELÉTRICA SE FECHA SOBRE ELA. A BARRAGEM SE ROMPE E UMA INUNDAÇÃO TOMA CONTA DA TELA.
FIM DO CAPÍTULO
FOGO SOBRE TERRA
Capítulo 27
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