Fogo Sobre Terra Cap.06

  • June 2020
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  • Words: 6,814
  • Pages: 27
TV DESTINO Central Destino de Produção

Cap. 06

12/01/2009

FOGO SOBRE TERRA Novela de

Walter de Azevedo Inspirada no original de

Janete Clair Colaboração de Eduardo Secco Direção Claudio Boeckel e Marco Rodrigo Direção Geral Luiz Fernando Carvalho Núcleo

Luiz Fernando Carvalho Personagens deste capítulo ARTHUR ISABEL PEDRO BICHO-BRABO LUCENA RITA SANDOVAL ZULMIRA PADRE LUÍS CORINA

BALBINA MADALENA TIANA ZORAIDE HILDA CHICA NILO-GATO FRIDA NARA DIOGO

CHRISTIANE CELESTE LEILA VIVI BRISA IVONE ZÉ MARTINS

Atenção “ Este texto é de propriedade intelectual exclusiva da TV DESTINO LTDA e por conter informações confidenciais, não poderá ser copiado, cedido, vendido ou divulgado de qualquer forma e por qualquer meio, sem o prévio e expresso consentimento da mesma.No caso de violação do sigilo, a parte infratora estará sujeita às penalidades previstas em lei e/ou contrato.”

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 2

CENA 01. FAZENDA DE ARTHUR. EXTERIOR. TARDE CONTINUAÇÃO. ARTHUR ESTÁ PARADO NO MEIO DA ESCADARIA DA FAZENDA, OLHANDO PARA O HOMEM HUMILDE E A FILHA, QUE ESTÃO NA SUA FRENTE. ARTHUR

— E então? É você que quer falar comigo?

O HOMEM PARECE INTIMIDADO COM A PRESENÇA DE ARTHUR. ARTHUR

— Fala homem! Tenho mais o que fazer do que ficar aqui olhando pra sua cara!

HOMEM

— Me adiscurpa, coroné. Sou eu sim.

ARTHUR

— E o que você quer?

HOMEM

— É que... É que a vida tá difícil, coroné. A gente num consegue o bastante pra sustentá os filho.

ARTHUR

— Você não é colono aqui da minha fazenda.

HOMEM

— Não senhor. Quem me dera.

ARTHUR

— Continue.

HOMEM

— Bom coroné. É que eu ouvi dizê. (p) Eu ouvi dizê que o senhô costuma ajudá. (p) Ainda mais quando tem filha. (p) Qui nem essa minha aqui.

A MENINA MANTÉM O OLHAR BAIXO. ARTHUR A OBSERVA, COMO SE A PERCEBESSE PELA PRIMEIRA VEZ. ELE DESCE AS ESCADAS E SE APROXIMA LENTAMENTE DOS DOIS. O FAZENDEIRO OLHA A MENINA COM UMA EXPRESSÃO DE COBIÇA. ARTHUR

— E... Quantos anos tem a sua filha?

HOMEM

— Treze. Ela tá com treze.

ARTHUR PASSA A MÃO PELOS CABELOS DA MENINA, QUE SE ENCOLHE. ARTHUR

— De vez em quando aparecem umas meninas aqui e eu... Eu ajudo. Arranjo lugar pra trabalhar. Casa de família. Nem sempre é por aqui. As vezes é longe.

HOMEM

—Num tem pobrema coroné. Só de o senhor consegui uma colocação pra ela, já tá bão demais. (p) Assim é bão pra ela e bão pra mim. É menos uma boca coroné. E ela ainda pode ajudá a gente.

ARTHUR

— Eu vou ajudar a sua filha. Ela vai ficar aqui comigo uns dias e depois eu vejo algum lugar pra ela trabalhar. (p) Vou fazer mais que isso. Vou lhe

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 3

dar uma ajuda. Uma ajuda em dinheiro enquanto ela não começa a trabalhar e lhe dar algum. ARTHUR TIRA UM MAÇO DE DINHEIRO DO BOLSO, DEPOIS OLHA A MENINA, COMO SE A AVALIASSE. ELE PEGA UMA PARTE DO DINHEIRO E O ENTREGA AO HOMEM. ARTHUR

— Eu acho que isso aqui tá bom. Você veja se tá do seu agrado.

O HOMEM HESITA UM POUCO, DEPOIS APANHA O DINHEIRO, CONFERE E SORRI. HOMEM

— Tá bão. Tá bão demais.

ARTHUR

— Você pega a menina e vai pelos fundos da casa. Lá na cozinha tem comida pros dois.

HOMEM

— Muito obrigado coro né. Deus lhe pague.

O HOMEM PEGA A FILHA E VAI EM DIREÇÃO AOS FUNDOS DA CASA, ENQUANTO ARTHUR FICA OBSERVANDO A MENINA ANDAR. ELE SORRI E SOBE AS ESCADAS DA FAZENDA. CORTA PARA:

CENA 02. FAZENDA DE ARTHUR. SALA. INTERIOR. TARDE ARTHUR ENTRA, VINDO DE FORA. ISABEL ESTÁ À SUA ESPERA. ARTHUR

— Mandei os dois pra cozinha. Você serve alguma coisa pra eles comerem.

ISABEL

— Eu já havia avisado a Ivone. Ela já os está esperando com um prato de comida.

ARTHUR

— Bom.

ARTHUR ANDA EM DIREÇÃO AO ESCRITÓRIO. ISABEL

— A menina vai ficar?

ARTHUR

— Vai. Você prepara aí um quarto pra ela. A menina fica uns dias. (p) Até eu arranjar alguma coisa pra ela. O mesmo de sempre.

ISABEL

— Sim senhor.

ARTHUR SAI, INDO PARA O ESCRITÓRIO. ISABEL NÃO DEMONSTRA NENHUMA EMOÇÃO E SAI LOGO DEPOIS EM DIREÇÃO À COZINHA. CORTA PARA:

CENA 03. FAZENDA DE HEITOR. EXTERIOR. TARDE

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 4

PEDRO E BICHO-BRABO CHEGAM À CAVALO. LUCENA VÊM NA DIREÇÃO DELES. OS DOIS APEIAM DOS CAVALOS. PEDRO

— Tarde Lucena.

LUCENA

— Tarde Pedro. Tarde Bicho-Brabo.

BICHO-BRABO — Tarde Lucena. LUCENA

— Ocês já cuidaram da boiada?

PEDRO

— Já. Já tá tudo recolhido.

LUCENA

— Isso é bom. Num quero sabe de roubo de gado aqui por essas terra.

PEDRO

— Isso nunca aconteceu com boi que tava debaixo das minhas vistas, Lucena.

LUCENA

— Eu sei disso, Pedro. Por isso mesmo que eu... Eu tenho um serviço pra você.

PEDRO

— Que serviço?

CORTA PARA:

CENA 04. FAZENDA DE HEITOR. SALA. INTERIOR. TARDE LUCENA, PEDRO E BICHO-BRABO ESTÃO SENTADOS CONVERSANDO. PEDRO

— Você quer que eu leve uma boiada pra São Paulo, hoje?

LUCENA

— É. Seu Heitor disse que só confia em ocê pra esse trabalho.

PEDRO

— Mas os bois não vão no caminhão?

LUCENA

— Vão, mas o seu Heitor quer que ocê acompanhe tudo. Que entregue as cabeça na mão do dono.

PEDRO

— Mas não tem necessidade disso.

RITA ENTRA, TRAZENDO CAFÉ PARA TODOS. ELA OS SERVE ENQUANTO ELES CONTINUAM A CONVERSA. RITA

— Ocês dá licença. Eu trouxe um cafezinho.

LUCENA

— Bom, se ocê preferi, Pedro, eu ligo pro seu Heitor e digo que ocê num qué ir.

PEDRO

— Por que ele não manda o Nilo?

FOGO SOBRE TERRA LUCENA

Capítulo 06

Pag.: 5

— Ocê sabe que o Nilo num cuida desse tipo de assunto. E pra essa história de boi, de terra, seu Heitor gosta que ocê trate.

RITA VOLTA PARA A COZINHA ENQUANTO PEDRO FICA PENSATIVO SOBRE O QUE LUCENA FALOU. LUCENA

— Ocê vai ou num vai?

CORTA PARA:

CENA 05. FAZENDA DE HEITOR. COZINHA. INTERIOR. TARDE RITA ESTÁ CONVERSANDO COM SANDOVAL. RITA

— Duvido que seu Heitor tenha dado essa orde.

SANDOVAL

— Duvida por que?

RITA

— E desde quando seu Heitor se preocupa com os boi daqui? Ele quase nem vêm. Nem telefoná, telefona.

SANDOVAL

— Então por que ocê acha que o Lucena tá querendo mandá o Pedro nessa viagem?

RITA

— E eu que vô sabe? As vez é só pra arrelia o pobre. Só pra mostra quem manda.

SANDOVAL

— Isso é poblema deles, Rita. Nóis num tem nada que vê com isso. Quando a gente chegô aqui, com uma mão na frente e outra atrás, Lucena deu emprego e casa. Se ele qué ficar arreliando o Pedro, isso é poblema dos dois.

RITA

— Ocê é muito acomodado, Sandoval. Às vez eu penso que não devia te tê casado cocê.

SANDOVAL

— Ocê num fale uma coisa dessa, Rita. (p) Ocê sabe o quanto eu lhe amo.

RITA OLHA PARA O MARIDO E SORRI. RITA

— Eu sei. (p) Já acabou o café?

SANDOVAL

— Acabei.

RITA

— Então trata de vortá pra lida antes que Lucena veja que ocê num tá trabaiando.

SANDOVAL

— Tá bão.

SANDOVAL SE LEVANTA E DÁ UM BEIJO NO ROSTO DE RITA.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

SANDOVAL

— Na hora de i embora eu passo aqui pra móde nóis i junto.

RITA

— Tá bão.

Pag.: 6

SANDOVAL SAI E RITA VOLTA PARA O SERVIÇO. CORTA PARA:

CENA 06. FAZENDA DE HEITOR. EXTERIOR. TARDE PEDRO E BICHO-BRABO SAEM DA FAZENDA E CAMINHAM ATÉ SEUS CAVALOS. BICHO-BRABO — Achei que ocê num ia aceitá. PEDRO

— Vontade eu tive, mas não posso, Bicho. É meu trabalho. Ainda mais na situação que eu tô. A fazenda não se sustenta. Dependo desse dinheiro.

BICHO-BRABO — Eu sei. PEDRO

— Ocê vai fazê um favor pra mim.

BICHO-BRABO — Pode pidi. PEDRO

— Os dias que eu tiver fora, quero que você durma lá na fazenda. Pode ser?

BICHO-BRABO — Claro que pode, mas por que? PEDRO

— Não gosto de deixar a Nara sozinha lá. É cisma minha, mas não gosto.

BICHO-BRABO — Pode viaja tranqüilo, Pedro. Eu fico lá sim. OS DOIS MONTAM NOS CAVALOS. CORTA PARA:

CENA 07. DIDIVÉIA. EXTERIOR. TARDE TOMADAS MOSTRANDO DIVINÉIA E SEUS HABITANTES NO DIA A DIA, AO SOM DA MÚSICA “DIVINÉIA” DE EUSTÁQUIO SENA. CORTA PARA:

CENA 08. IGREJA. SACRISTIA. INTERIOR. TARDE ZULMIRA ESTÁ SENTADA ESPERANDO PADRE LUÍS, QUE ENTRA E SE ESPANTA AO VER A DONA DO BORDEL ALI. PADRE

— Dona Zulmira?

ZULMIRA

— Até que enfim, Padre!

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 7

PADRE

— O que...O que a senhora está fazendo aqui?

ZULMIRA

— Tô esperando o senhor. Tô doida pra lhe falar.

PADRE

— Eu...Eu não sabia.

ZULMIRA

— Claro que não! O senhor não pára na Igreja! Se parasse ia ficar sabendo. Vim aqui ontem à tarde, esperei, esperei e nada do senhor. Agora já tô plantada aqui pra mais de hora.

PADRE

— E...Em que eu posso lhe ajudar?

ZULMIRA

— Isso lhe pergunto eu. Em que eu posso lhe ajudar?

O PADRE FICA OLHANDO PRA ZULMIRA SEM SABER DO QUE ELA ESTÁ FALANDO. ZULMIRA

— Tô falando da quermesse, Padre.

O PADRE COMPREENDE E PARECE FICAR ALIVIADO. PADRE

— Ah! É sobre isso.

ZULMIRA

— Claro. O senhor pensou que eu tivesse vindo aqui fazer o que? (p) Padre, eu quero colaborar na quermesse.

O PADRE PARECE FICAR SEM SABER O QUE DIZER. PADRE

— Dona Zulmira...Bem...O que acontece é que...

ZULMIRA

— Eu sei muito bem o que acontece, Padre. Não precisa ficar com essa cara de quem não sabe o que dizer. Eu sei que... Não iam aceitar se eu montasse uma barraca na quermesse.

PADRE

— Veja bem. Isso não é uma escolha minha, mas...

ZULMIRA

— Eu sei, Padre. Eu sei que isso é coisa daquele bando de carola. O senhor sempre me tratou muito bem. (p) Acontece, Padre, que assim como quase todo mundo aqui em Divinéia, eu também sou devotada da santa. E tô vendo como a igreja tá precisando de dinheiro, de uma boa reforma.

PADRE

— Nem me fale, dona Zulmira. Eu tenho medo de que qualquer dia o teto caia em cima dos fiéis. Eu tentei falar com o Heitor Gonzaga pra ver se ele mexia os pauzinhos e conseguia o tombamento histórico do prédio. Assim ficaria mais fácil conseguir que o patrimônio histórico ajudasse, mas ele não me deu resposta nenhuma.

ZULMIRA

— Se o senhor ficar esperando o Heitor Gonzaga pra conseguir o tombamento histórico, o que vai acabar acontecendo é o tombamento de

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 8

verdade. A igreja vem abaixo. (p) É por causa disso que eu estou aqui. Padre. Já que eu não posso montar uma barraca como qualquer outra pessoa, eu quero dar uma quantia em dinheiro pra festa. O PADRE FICA SEM SABER O QUE DIZER. PADRE

— Eu... Eu não sei, dona Zulmira.

ZULMIRA

— Padre, eu sei que o que eu faço é... Bom, não é muito certo ponto de vista, mas o meu dinheiro é igual a qualquer outro. (p) dinheiro, pelo menos o senhor sabe de onde vem, como é Honestamente ganho, diga-se de passagem. Já o do prefeito, o pode garantir?

do seu O meu ganho. senhor

O PADRE OLHA PARA ZULMIRA POR ALGUNS SEGUNDOS E DEPOIS SORRI. ZULMIRA

— Deixa eu ajudar, Padre. Eu e as meninas somos tão devotas da santa quanto qualquer um.

PADRE

— Está bem, dona Zulmira. Eu vou aceitar a sua oferta. Sei que a senhora está fazendo de coração.

ZULMIRA SORRI. ZULMIRA

— Que bom, Padre.

ZULMIRA TIRA UM PACOTE DA BOLSA E O ENTREGA AO PADRE. ZULMIRA

— Eu já trouxe o dinheiro porque sabia que o senhor ia resistir, resistir, mas acabar aceitando. (p) Não é muito, mas é o que nós podemos oferecer.

PADRE

— Muito obrigado, dona Zulmira. Obrigado à senhora e às... Suas meninas.

ZULMIRA

— Elas vão ficar muito contentes em saber que o senhor aceitou.

CORINA ENTRA E FICA ESPANTADA AO VER ZULMIRA NA SACRISTIA. CORINA

— Pa...Padre!

ELA FAZ O SINAL DA CRUZ. CORINA

— Mas o que essa... Mulherzinha faz aqui na igreja?

ZULMIRA SE LEVANTA. ZULMIRA

— Bom, Padre. É melhor eu ir embora.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 9

O PADRE SE LEVANTA. ZULMIRA

— Ao contrário de outras pessoas que se dizem tementes à Deus, eu não fico querendo criar confusão dentro da casa Dele. O senhor tenha um bom dia.

PADRE

— Um bom dia pra senhora também, dona Zulmira.

ZULMIRA SAI, MAS ANTES OLHA CORINA DE CIMA ABAIXO E SORRI ZOMBETEIRA, DEIXANDO A BEATA FURIOSA. CORINA

— Mas essa mulherzinha é muito petulante, Padre. Aonde já se viu ela vir pisar aqui, na casa de Deus?

PADRE

— Dona Corina, ela só veio oferecer ajuda pra quermesse.

CORINA

— Ajuda?! O senhor não aceitou, não é? Não me diga uma coisa dessas!

PADRE

— Não... Eu não aceitei.

CORINA

— Graças à Deus! A nossa paróquia não precisa do dinheiro de gentinha como essa. Dinheiro sujo! Dinheiro do pecado, padre!

PADRE

— Falando em dinheiro, seu marido ficou de me mandar um dinheiro pra ajudar na compra do material das barracas. (p) Ele mandou?

CORINA FICA SEM GRAÇA. CORINA

— Não. Não mandou. (p) Mas vai mandar! Logo ele vai mandar!

O PADRE FAZ UMA EXPRESSÃO DE QUEM NÃO ACREDITA. PADRE

— Sei.

CORTA PARA:

CENA 09. CLUBE DE RECREAÇÃO. INTERIOR. TARDE ZULMIRA, BALBINA, MADALENA, TIANA E ZORAIDE ESTÃO CONVERSANDO E RINDO. ZULMIRA

— Vocês precisavam de ter visto a cara daquela carola quando ela me viu na igreja. Parecia que tava vendo o cão!

TIANA

— Eu queria era ver a cara dela se soubesse que o marido vem aqui quase toda noite.

ZORAIDE

— Ele e quase todos os maridos dessas papa-hóstia.

ZULMIRA

— Mas o que interessa é que o Padre aceitou a nossa ajuda.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 10

MADALENA

— Que bom. (p) Eu queria tanto poder participar da quermesse.

TIANA

— Eu também. Ia sê bom demais nóis tê nossa própria barraca.

BALBINA

— Era capaz dessas maluca botarem fogo.

ZULMIRA

— Barraca nós não podemos ter, mas eu quero vocês todas muito bonitas e perfumadas no dia, porque nós vamos sim na quermesse!

ZORAIDE, TIANA E MADALENA SE SURPREENDEM. TIANA

— A senhora tá falando sério?

ZULMIRA

— E eu lá sou de brincar com coisa séria? Tá pra nascer quem vai me impedir de fazer alguma coisa. Posso não ter barraca, mas que elas vão ter de me engolir, ah isso vão.

MADALENA

— Faz tanto tempo que eu não vou numa festa assim que nem lembro como é.

ZORAIDE

— Nem eu.

ZULMIRA

— Agora chega de prosa e vamo prepara tudo pra função.

ZULMIRA SE LEVANTA, MAS SENTE UMA FORTE DOR NO ESTÔMAGO E SE SENTA. BALBINA E AS MENINAS A AJUDAM. MADALENA

— O que foi madrinha? Tá sentindo alguma coisa?

ZULMIRA

— Não é nada. É só uma dorzinha.

ZORAIDE

— Vai pega um copo de água pra ela, Tiana!

TIANA VAI CORRENDO ATÉ A COZINHA. ZULMIRA

— Não é nada. Isso vai passar logo. Balbina, me ajuda a ir até o quarto.

BALBINA AJUDA ZULMIRA A SE LEVANTAR. TIANA VOLTA COM O COPO DE ÁGUA. TIANA

— Beba um pouco da água, madrinha.

ZULMIRA

— Não precisa, minha querida. Obrigado.

BALBINA

— Ocês façam o que Zulmira mandou. Comecem a arrumar a casa pra função. Daqui a pouco eu venho aqui pra vê se tá tudo direitinho.

ZULMIRA E BALBINA SAEM PARA O QUARTO. ZORAIDE, TIANA E MADALENA FICAM PREOCUPADAS. ZORAIDE

— Num tô gostando disso não.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 11

TIANA

— Disso o que?

ZORAIDE

— Mas ocê é mesmo muito da lesada! Num viu que agora vira e mexe a madrinha têm essas dor?

MADALENA

— Zoraide tá certa. Não é a primeira vez que a madrinha sente isso. (p) Será que é coisa séria?

TIANA FAZ O SINAL DA CRUZ. TIANA

— Deus que me livre!

ZORAIDE

— Se for, do jeito que madrinha é, é bem capaz de esconde da gente.

MADALENA

— Vamos arrumar o salão. Depois eu vou conversar com a Balbina. Madrinha pode não falar, mas a Balbina fala.

CORTA PARA:

CENA 10. CLUBE DE RECREAÇÃO. QUARTO DE ZULMIRA. INT. TARDE ZULMIRA ESTÁ SE SENTANDO NA CAMA COM A AJUDA DE BALBINA. ZULMIRA

— Eu já tô bem, Balbina.

BALBINA

— Tá bem nada. Tô vendo na sua cara que ainda tá com dor.

ZULMIRA

— Só um pouco.

BALBINA

— Zulmira, ocê tem que ir no médico! Não pode deixá essa doença assim, sem fazer nada.

ZULMIRA

— Eu tô tomando o remédio.

BALBINA

— Que remédio? Ocê precisa é fazer tratamento! Aquelas coisa com um monte de remédio.

ZULMIRA

— Sei. Aqueles que deixam a gente careca. De jeito nenhum!

BALBINA

— Não acredito que por vaidade ocê vai deixá essa doença lhe consumi.

ZULMIRA

— Não é por isso, Balbina. É que não tem mais jeito mesmo. Demorei demais pra descobrir que tava com essa doença. Não tem mais nada que eu possa fazer.

BALBINA

— Não tô lhe reconhecendo, Zulmira. Ocê sempre foi uma mulher batalhadora. Sempre enfrentou tudo de frente e agora vai se entregá desse jeito?

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 12

ZULMIRA

— Sempre fui batalhadora mesmo. Só que eu também sempre soube reconhecer uma briga perdida. Balbina, não quero ficar falando desse assunto. Quero que você fique de olho nas meninas. Eu vou descansar um pouco pra poder ficar à noite no salão.

BALBINA

— Tá bom. Ocê é que sabe!

BALBINA SAI E ZULMIRA SE DEITA, INCOMODADA COM A DOR. CORTA PARA:

CENA 11. CASA DE HILDA. SALA. INTERIOR. TARDE CORINA E HILDA ESTÃO CONVERSANDO. HILDA

— Você está querendo me dizer que aquela messalina, aquela rameira, estava conversando com o Padre Luís e querendo ajudar na quermesse?

CORINA

— Foi isso mesmo, dona Hilda. Essa fulaninha é mesmo muito abusada.

HILDA

— E não me diga que o Padre aceitou?

CORINA

— Ele disse que não, mas eu vi que ele estava com um pacotinho nas mãos.

HILDA

— Pacotinho?

CORINA

— É.

HILDA

— Eu vou ter uma conversa muito séria com o Padre Luís. Eu não vou deixar essa... Pecadora meter o dedo na nossa quermesse. Era só o que me faltava. Uma mulher da vida envolvida na festa da santa.

CORTA PARA:

CENA 12. SÍTIO DE ZÉ MARTINS. EXTERIOR. TARDE PEDRO E CHICA ESTÃO ANDANDO DE BRAÇOS DADOS E CONVERSANDO. CHICA

— Mas viaja assim, de repente?

PEDRO

— Pois é. Lucena disse que seu Heitor faz questão.

CHICA

— Duvido. Isso é coisa do peste do Lucena. Ocê sabe que ele faz de tudo pra lhe botá debaixo das bota dele.

PEDRO

— Sei, mas eu não posso dizer não. Ele mandou, eu tenho que fazer. Já pedi pro Bicho-Brabo ficá lá com a Nara.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 13

CHICA

— Ocê tá certo. (p) E qué sabê de uma coisa? Eu vô pra lá também. Pego Brisa e nóis passa a noite com ela.

PEDRO

— Ocê faz isso por mim?

CHICA SORRI. CHICA

— É claro que eu faço. Sei que assim ocê vai ficá mais sossegado.

OS DOIS SE BEIJAM. PEDRO

— Deixa eu ir. Ainda tenho que arrumá as minhas coisas pra viagem.

CHICA

— Tá certo. Avisa pra Nara que dispois eu mais Brisa passamo lá.

PEDRO

— Aviso.

CHICA

— Boa viagem procê.

PEDRO E CHICA VOLTAM A SE BEIJAR, DEPOIS ELE VAI EMBORA EM SEU CAVALO. CHICA

— Esse Lucena é memo um diabo.

CHICA ANDA NA DIREÇÃO DA CASA DO SÍTIO. CHICA

— Brisa! Ô Brisa!

CORTA PARA:

CENA 13. DIVINÉIA. EXTERIOR. TARDE TOMADA DE DIVINÉIA AO SOM DA MÚSICA “COWBOY SOLITÁRIO” DE EDSON CORDEIRO. NILO GATO VEM DIRIGINDO SEU JEEP PELA PRAÇA PRINCIPAL. AS MOÇAS DA CIDADE OLHAM PARA ELE E SORRIEM. O RAPAZ RETRIBUI. ELE ESTACIONA O JEEP NA FRENTE DO CLUBE RECREATIVO E ENTRA. CORTA PARA:

CENA 14. CLUBE DE RECREAÇÃO. SALÃO. INTERIOR. TARDE MADALENA ESTÁ TERMINANDO DE ARRUMAR AS MESAS. NILO ENTRA. NILO

— Tarde, Madalena.

MADALENA

— Oi Nilo.

NILO

— Ocê aqui no salão?

MADALENA

— Tô ajudando as meninas a arrumar o salão pra noite.

NILO

— Sei.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 14

NILO OLHA MADALENA COM COBIÇA. NILO

— Pena que... Ocê não participa da função.

MADALENA FICA INCOMODADA COM O COMENTÁRIO E CONTINUA A ARRUMAR AS MESAS. NILO

— Eu acho que se ocê viesse uma noite, ia gostá. Principalmente se essa noite fosse comigo.

MADALENA PÁRA DE ARRUMAR A MESA E OLHA SERIAMENTE PARA NILO. MADALENA

— Eu acho que ia gostar mais ainda de contar isso pro seu patrão. Você não acha que o Heitor ia gostar de saber dessa proposta que você me fez?

NILO SORRI. NILO

— Calma, Madalena. Eu tô só brincando.

MADALENA

— Acho bom você pensar antes de ficar fazendo essas brincadeiras. (p) Nilo, a casa tá fechada. O que você quer?

NILO

— Quero falar com a Zoraide.

ZORAIDE APARECE SORRIDENTE NA PORTA QUE LEVA DO SALÃO AOS QUARTOS. ZORAIDE

— Nilo!

ZORAIDE CORRE ATÉ NILO E PULA NO RAPAZ, COLOCANDO AS PERNAS EM TORNO DA CINTURA DELE. ZORAIDE

— Que surpresa boa!

OS DOIS SE BEIJAM. MADALENA

— Eu vou deixar vocês dois.

MADALENA SAI. ZORAIDE SE SOLTA DE NILO, MAS CONTINUA COM OS BRAÇOS EM TORNO DE SEU PESCOÇO. ZORAIDE

— O que ocê tava falando com essa nojentinha?

NILO

— Nada. Tava só proseando. Perguntando de ocê.

ZORAIDE

— Ela que não se meta a besta pro seu lado. Acabo com a raça dessa sujeita.

NILO

— Larga a mão de sê besta. Ela é mulhé do patrão.

OS DOIS SE SENTAM.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

ZORAIDE

— Ocê vem hoje de noite?

NILO

— Venho sim. Ocê pode me esperá.

ZORAIDE

— Vô recusa os outros hóme só pra ficá lhe aguardano.

Pag.: 15

BALBINA ENTRA. BALBINA

— Dexa Zulmira lhe escutá falando isso que lhe bota pra fora, Zoraide.

ZORAIDE

— Ocê agora fica escutando atrás das porta, Balbina?

BALBINA

— Num tô atrás de porta nenhuma. Tô entrando no salão e escutei. Seu Nilo, a casa ainda tá fechada.

NILO

— Eu sei Balbina. Só passei pra vê Zoraide.

BALBINA

— Então ocês marca outro lugar ou então de noite ocê vorta. Zulmira não gosta de ninguém por aqui antes da função.

NILO SE LEVANTA. NILO

— Tá certo, Balbina. Já tô indo. De noite eu volto.

NILO VAI EMBORA. ZORAIDE

— Precisava falá assim com ele?

BALBINA

— Precisava. Ocê tá cansada de sabê que Zulmira num qué ele por aqui com a casa fechada.

ZORAIDE VAI PARA O QUARTO DE CARA FEIA. BALBINA

— Esses dois ainda vão dá trabalho.

CORTA PARA:

CENA 15. DIVINÉIA. EXTERIOR. TARDE NILO GATO VEM ANDANDO PELA PRAÇA PRINCIPAL E VÊ CHICA CHEGANDO NA CHARRETE. ELE FICA SORRINDO ENQUANTO ELA PÁRA E DESCE. NILO

— Chica Martins.

CHICA

— O que ocê qué, Nilo Gato?

NILO

— Nada. Só tô lhe cumprimentando.

CHICA

— Então já tá cumprimentado. Agora ocê me dêxa.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 16

CHICA VAI SAIR, MAS NILO SE COLOCA NA FRENTE DELA. NILO

— Calma, Chica. Pra que essa brabeza toda?

CHICA

— Porque eu tenho mais o que fazê do que ficá aqui lhe dando trela.

NILO

— Ocê é mêmo brava, Chica Martins. (p) Adoro mulhé assim.

CHICA

— O tipo de mulhé que ocê gosta, num me interessa, Nilo Gato. Ocê me dá licença.

CHICA VAI SAIR, MAS NILO A SEGURA COM FORÇA PELO BRAÇO, VIRANDO-A PARA SI. NILO

— Eu ainda num acabei de falá com ocê!

CHICA PUXA UMA FACA E A ENCOSTA ENTRE AS PERNAS DE NILO, QUE FICA ASSUSTADO. CHICA

— Ocê tem certeza que qué mêmo falá comigo? Se quisé, acho que ocê vai acará perdendo umas coisa pra qual dá muito valor.

NILO

— Calma, Chica.

CHICA

— Eu tô carma. Tô carma até demais. Em outros tempo, em vez de falá o que ia fazê, eu já tinha feito. (p) Ocê vai me largá ou eu vô precisá lhe convencê?

NILO SOLTA CHICA E SORRI. NILO

— Num precisava ficá brava desse jeito. Eu só queria trocá uns dedo de prosa.

CHICA

— Eu num quero prosa nenhuma cocê, Nilo Gato. Num gosto de gente que nem ocê. É bão ficá longe de mim.

FRIDA APARECE NA PORTA DO HOTEL. FRIDA

— Chica! Chica, eu preciso falar com você!

CHICA

— Ocê tá avisado.

CHICA SAI ANDANDO EM DIREÇÃO À FRIDA E AS DUAS SEGUEM CONVERSANDO PARA O HOTEL. NILO OBSERVA. NILO CORTA PARA:

— Ocê ainda há de sê minha, Chica Martins. Ainda há.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 17

CENA 16. HOTEL. RECEPÇÃO. TARDE FRIDA E CHICA ESTÃO CONVERSANDO. CHICA

— Mas afinar, a senhora descobriu arguma coisa ou não?

FRIDA

— Descobrir mesmo, não. Mas eu vou lhe contar tudo o que consegui tirar dos forasteiros.

CHICA

— Pode começá a falá que eu sô toda orelha.

FRIDA

— Assim como quem não quer nada, eu perguntei pros rapazes o que eles estavam fazendo aqui.

CHICA

— E o que foi que eles disseram?

FRIDA

— Desconversaram um pouco, mas acabaram falando que estão fazendo umas medições no Jurapori.

CHICA

— Isso eu já sabia, dona Frida!

FRIDA

— Sim, mas o que eu vou lhe contar agora, você não sabia.

CHICA

— O que?

FRIDA

— Eles deixaram escapar que trabalham pra uma construtora lá de São Paulo.

CHICA

— Construtora de São Paulo?

FRIDA

— Foi o que ele disse.

CHICA PENSA POR ALGUNS INSTANTES. CHICA

— Tô pensano aqui comigo, dona Frida. O Heitor Gonzaga num tem uma construtora lá em São Paulo?

FRIDA

— Têm. Aliás, dizem que é uma das maiores do país.

CHICA

— É isso mêmo. Arguma coisa tá me dizeno que tem dedo do Heitor Gonzaga por trás desses hóme.

FRIDA

— Faz sentido.

CHICA

— E a senhora num conseguiu discubri o que é que eles qué construí?

FRIDA

— Não. Pra falar a verdade eles nem disseram se iam construir alguma coisa. Só falaram que estavam fazendo uns estudos.

FOGO SOBRE TERRA CHICA

Capítulo 06

Pag.: 18

— É dona Frida. Essa história tá ficano cada vez mais cheia di mistério. (p) O que será que esses hóme da tar construtora qué aqui em Divinéia?

CORTA PARA:

CENA 17. FAZENDA DE JOÃO. QUARTO DE PEDRO. INT. TARDE PEDRO ESTÁ ARRUMANDO AS MALAS ENQUANTO CONVERSA COM NARA. PEDRO

— Já falei com o Bicho-Brabo e ele vai ficar de noite aqui na fazenda. Chica também já disse que vem com Brisa.

NARA

— Num carece de nada disso, Pedro.

PEDRO

— Assim eu fico mais sossegado. Ocê sabe que não gosto de lhe deixá aqui sozinha. (p) Você tem muito inimigo, Nara.

NARA RI. NARA

— Até parece que arguém se preocupa comigo. Já foi tempo que eu era pedra no sapato dos ôtro. Agora eu fico aqui sossegada no meu canto.

PEDRO

— Como se eu não lhe conhecesse.

NARA

— Eu vô prepara arguma coisa procê levá na viagem.

PEDRO

— Tá certo.

NARA SAI. PEDRO COMEÇA A PROCURAR ALGUMA COISA NOS BOLSOS, MAS NÃO ACHA. PEDRO

— Onde foi que eu meti a minha carteira?

PEDRO ABRE A GAVETA DO CRIADO MUDO E A ENCONTRA. JUNTO À CARTEIRA EXISTE UMA FOTOGRAFIA. O RAPAZ A APANHA E OLHA. NO RETRATO ESTÃO ELE E O IRMÃO DIOGO, AINDA PEQUENOS. PEDRO SORRI. PEDRO

— Diogo. (p) Como será que ocê tá, meu irmão? Em que parte desse mundo?

CORTA PARA:

CENA 18. VANCOUVER. CANADÁ. EXTERIOR. TARDE VÁRIAS TOMADAS MOSTRANDO PONTOS TURÍSTICOS DE VANCOUVER, ALÉM DE PARTES DA CIDADE E SEUS HABITANTES AO SOM DA MÚSICA “NEVER SURRENDER” DE COREY HART. A CENA TERMINA MOSTRANDO O PRÉDIO DE DIOGO.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 19

CORTA PARA:

CENA 19. APARTAMENTO DE DIOGO. QUARTO. INTERIOR. TARDE DIOGO ESTÁ ARRUMANDO AS MALAS ENQUANTO CHRISTIANE O OBSERVA COM CARA DE CHORO. ELE OLHA PARA A MULHER. DIOGO

— Não fica assim, Christiane.

CHRISTIANE

— Você queria que eu ficasse como? Tô vendo você dar um passo em direção ao precipício e não posso fazer nada pra impedir.

DIOGO

— Não faz drama. A gente já conversou sobre isso.

DIOGO VAI ATÉ CHRISTIANE E SEGURA SEUS BRAÇOS CARINHOSAMENTE. DIOGO

— Eu vou e volto. Em uma semana no máximo eu tô de volta.

CHRISTIANE

— Volta, mas eu te conheço, Diogo. Eu sei que se seu tio lhe pedir pra voltar, você vai querer voltar.

DIOGO

— Christiane...

CHRISTIANE

— Eu sei! Eu já sei tudo o que você vai dizer. Também não vou mais ficar perdendo o meu tempo. Tô cansada de falar a mesma coisa. (p) Eu vou dar uma volta e depois pegar a Vivi.

CHRISTIANE SAI. COMEÇA A TOCAR A MÚSICA “NEVER SURRENDER” DE COREY HART. DIOGO FAZ UMA EXPRESSÃO TRISTE PELA SITUAÇÃO. CORTA PARA:

CENA 20. VANCOUVER. EXTERIOR. TARDE AINDA AO SOM DA MÚSICA, CHRISTIANE CAMINHA PELAS RUAS DE VANCOUVER. A MOÇA ESTÁ PROFUNDAMENTE TRISTE CORTA PARA CHRISTIANE EM UM PARQUE. ELA SE SENTA EM UM DOS BANCOS E COMEÇA A CHORAR. O CHORO VAI CRESCENDO AOS POUCOS ATÉ SE TORNAR COMPULSIVO. CORTAR PARA:

CENA 21. SÃO PAULO. EXTERIOR. TARDE TOMADA DE SÃO PAULO À TARDE AINDA AO SOM DA MÚSICA DAS CENAS ANTERIORES. CORTA PARA:

CENA 22. SHOPPING. EXTERIOR. TARDE

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 20

CELESTE ESTÁ SENTADA EM UM CAFÉ JUNTO COM LEILA. LEILA

— E ele foi dormir assim?

CELESTE

— Foi. Me deixou plantada lá na sala.

LEILA

— E você não fez nada?

CELESTE

— Vou fazer o que, Leila?

LEILA

— Não sei. Grita com ele! Xinga! Arma um barraco.

CELESTE

— Até parece que você não me conhece.

LEILA

— Você é passiva demais, Celeste. Heitor faz o que quer e você fica com essa cara de rainha da Inglaterra. Ah se fosse comigo!

CELESTE

— Mas Leila, o Heitor é assim mesmo. Sempre foi. Ele é um bom marido. Me trata bem, me agrada, mas têm esse jeito meio distante. Nunca foi amoroso, carinhoso. Mas eu sei que ele gosta de mim. Lá do jeito dele, mas gosta.

LEILA

— Tudo bem. Pode até ser. Mas ele também lhe apronta poucas e boas.

CELESTE

— Imagina, Leila. Heitor nunca me deu problema.

LEILA

— Ah não? E a filha que ele teve com outra.

CELESTE

— Não. Espera aí. Vamos ser justas. Quando eu me casei com ele já sabia da filha. Ele me disse que havia tido um relacionamento e que dessa história havia nascido uma filha. Eu casei sabendo de tudo.

LEILA

— E teve de cuidar da filha da outra. Você sabe quem é essa mulher?

CELESTE

— Não. Ele nunca fala dela. Me disse que ela morreu quando teve a Bárbara. (p) Acabou me deixando esse fardo.

LEILA

— Vocês duas não se dão mesmo né?

CELESTE

— E tem como, Leila? Bárbara é insuportável. Desde pequena. Arrogante, prepotente. Não baixava o nariz pra nada. Nunca aceitou a minha autoridade. Vivia batendo de frente comigo.

LEILA

— E o Heitor achava lindo.

CELESTE

— Achava. Acha até hoje. Deu no que deu.

LEILA

— Depois ainda trouxe o menino.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 21

CELESTE

— Ah, mas com o Diogo foi completamente diferente. Eu confesso que quando ele me disse que ia trazer o filho do ex-sócio pra morar com a gente, eu quase tive um ataque, mas depois que conheci o Diogo vi que não ia ter problema. Ele era completamente diferente da Bárbara. Educado, prestativo, obediente. (p) Você sabe que eu gosto dele como se fosse um filho. Já que eu nunca pude ter um e que a Bárbara nunca permitiu que eu me aproximasse dela dessa forma, o Diogo acabou preenchendo esse espaço. Sabe que ele até me ajudou com ela? A Bárbara adora o Diogo. Sempre obedeceu a ele. Foi quem freou um pouco a impulsividade dela.

LEILA

— E falando na Bárbara, quando ela volta?

CELESTE

— Rezo todo dia para que não seja tão cedo.

AS DUAS RIEM. LEILA

— Celeste, tá na minha hora. Tenho massagem marcada.

CELESTE

— Eu também tenho que ir. Preciso falar com o Diogo pra ver quando ele vem pra cá.

LEILA

— Ele vai voltar?

CELESTE

— Vem passar uns dias. Coisa de trabalho. Vamos?

LEILA

— Vamos.

CELESTE E LEILA SE LEVANTAM E SAEM CONVERSANDO. CORTA PARA:

CENA 23. APARTAMENTO DE DIOGO. SALA. INTERIOR. TARDE DIOGO ESTÁ TRABALHANDO EM SEU COMPUTADOR QUANDO O TELEFONE TOCA. DIOGO

— Hello. (p) Yes. I’m Diogo Azulão. (p) Viviane is my daughter. Is that something wrong? (p) What? (p) Okay. I’m going right now. Thank you.

DIOGO DESLIGA O TELEFONE, APANHA O CASACO E SAI. CORTA PARA:

CENA 24. ESCOLA DE VIVI. EXTERIOR. TARDE DIOGO CONVERSA COM A PROFESSORA DE VIVI. A MENINA ESTÁ DE MÃOS DADAS COM ELE. DEPOIS DE ALGUNS SEGUNDOS, PAI E FILHA VÃO EMBORA. CORTA PARA:

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 22

CENA 25. APARTAMENTO DE DIOGO. SALA. INTERIOR. TARDE DIOGO ESTÁ SENTADO NO SOFÁ. CHRISTIANE CHEGA, VINDA DA RUA. DIOGO

— Aonde você se meteu?

CHRISTIANE

— Fui dar uma volta.

DIOGO

— E não esqueceu de nada?

CHRISTIANE

— Não.

DIOGO SE LEVANTA BRAVO. DIOGO

— Não? Por acaso você não esqueceu a sua filha na escola?

CHRISTIANE SE LEMBRA, ESPANTADA. CHRISTIANE

— Meu Deus! A Vivi!

DIOGO

— É. A Vivi.

CHRISTIANE

— Eu vou lá agora mesmo!

DIOGO

— Não precisa. Eu já a apanhei na escola. Eles ligaram pra cá quando você não apareceu.

CHRISTIANE

— Eu... Eu me esqueci completamente.

DIOGO

— Você foi dar uma volta e esqueceu da sua filha?

CHRISTIANE FICA NERVOSA. CHRISTIANE

— Não começa, Diogo! Esqueci! O que você quer que eu faça? (p) Eu ando com muita coisa na cabeça.

DIOGO

— Eu sei com o que você anda na cabeça. É por causa da viagem, não é?

CHRISTIANE NÃO RESPONDE. DIOGO

— Christiane, eu vou lhe dizer uma coisa. Até agora eu tenho relevado esse carnaval que você tem feito, mas dessa vez você passou dos limites.

CHRISTIANE

— Você não dá importância pro que eu sinto!

DIOGO

— Você é quem não dá importância pro que eu sinto!

CHRISTIANE

— Diogo, você não tem o direito de me falar isso. Eu sempre faço tudo o que você quer.

FOGO SOBRE TERRA DIOGO

Capítulo 06

Pag.: 23

— Desde que seja também o que você quer. (p) Christiane, eu não agüento mais esse tipo de atitude infantil. Tá na hora de você crescer. (p) Eu vou viajar e quando voltar nós vamos ter uma conversa. Uma conversa muito séria.

CHRISTIANE FICA PREOCUPADA. CHRISTIANE

— Que conversa? O que você quer dizer com isso?

DIOGO

— Eu tô querendo dizer que nós precisamos rever muitas coisas na nossa vida. Vai ser bom eu ficar uns dias fora. Eu quero que você pense nas suas atitudes. (p) Assim, desse jeito, pra mim não dá, Chris.

CHRISTIANE FICA CLARAMENTE CHOCADA E SEM AÇÃO. COMEÇA A TOCAR A MÚSICA “NEVER SURRENDER” DE COREY HART. DIOGO VAI PARA O QUARTO. LENTAMENTE, CHRISTIANE SE SENTA. PARECE QUE ALGUÉM TIROU O CHÃO SOB SEUS PÉS. CORTA PARA:

CENA 26. APARTAMENTO DE DIOGO. QUARTO. INTERIOR. TARDE A MÚSICA DA CENA ANTERIOR CONTINUA. DIOGO ENTRA NO QUARTO COM UMA EXPRESSÃO TRISTE. O RAPAZ VOLTA A ARRUMAR A MALA, MAS NÃO CONSEGUE SE CONCENTRAR. SENTA NA CAMA E COLOCA AS MÃOS NA CABEÇA. CORTA PARA:

CENA 27. FAZENDA DE JOÃO. EXTERIOR. TARDE PEDRO ESTÁ SE DESPEDINDO DE CHICA. NARA, BICHO-BRABO E BRISA ESTÃO JUNTO DOS DOIS. PEDRO

— Eu devo ficar uns dois, três dias fora.

CHICA

— Ocê vai descansado. Eu e Brisa ficamo aqui com Nara o tempo que precisá.

BICHO-BRABO — E eu vô tá aqui, Pedro. Elas vão ficá sob a minha proteção. NARA

— Já disse que num precisa nada disso.

PEDRO

— Eu fico mais tranqüilo, Nara.

PEDRO VAI ATÉ NARA E A ABRAÇA. NARA

— Ocê vai com Deus, meu filho.

PEDRO

— Ocê fica com ele.

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 24

PEDRO SE DESPEDE DE BICHO-BRABO E DE BRISA, DEPOIS VAI, JUNTO COM CHICA, ATÉ A CAMINHONETE. CHICA

— Ocê telefona dando notícia.

PEDRO

— Telefono. E ocê não faz nenhuma besteira enquanto eu tiver fora. Não vai lá se meter com a dona Hilda.

CHICA

— Ocê pode fica sossegado que o que é daquela surucucu véia, tá guardado. Mas eu vô fazê na hora certa.

PEDRO

— Chica, Chica! Olha lá o que você vai fazê.

CHICA

— Ocê dêxa isso comigo.

PEDRO

— Tenho medo quando ocê fala isso.

CHICA SORRI E PEDRO RETRIBUI. COMEÇA A TOCAR A MÚSICA “SINÔNIMOS” DE CHITÃOZINHO & XORORÓ E ZÉ RAMALHO. OS DOIS SE BEIJAM, DEPOIS PEDRO ENTRA NA CAMINHONETE, DÁ PARTIDA E VAI EMBORA. CHICA ACENA PARA ELE ENQUANTO SE JUNTA À NARA, BRISA E BICHO-BRABO. OS QUATRO ENTRAM NA CASA DA FAZENDA. CORTA PARA:

CENA 28. FAZENDA DE HEITOR. SALA. INTERIOR. TARDE HEITOR ESTÁ SE PREPARANDO PARA SAIR E ISABEL ENTRA NA SALA, VINDA DA COZINHA. ISABEL

— O senhor vai sair, Coronel?

ARTHUR

— Vou sim. Tenho um encontro com o prefeito. (p) E a menina?

ISABEL

— Está na cozinha com a Ivone.

ARTHUR

— E o pai?

ISABEL

— Já foi embora.

ARTHUR

— Ocê já acomodou ela?

ISABEL

— Já sim senhor.

ARTHUR

— Ótimo. Depois eu cuido dela. Não demoro.

ARTHUR APANHA SEU CHAPÉU, COLOCA NA CABEÇA E SAI. CORTA PARA:

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 25

CENA 29. FAZENDA DE HEITOR. COZINHA. INTERIOR. TARDE IVONE ESTÁ COZINHANDO ENQUANTO A MENINA, SENTADA, A OBSERVA. IVONE

— O seu pai num devia de tê lhe dexado aqui. Ele num sabe o que fez. (p) Coroné parece que é bão, que ajuda as menina, mas num é nada disso não. Esse aí é ruim que nem o cão. Finge que é bom, mas não é. Só quem vive aqui dentro que sabe das coisa que ele faz.

A MENINA NÃO FALA NADA. IVONE OLHA PARA ELA E DEPOIS SE SENTA NA SUA FRENTE. IVONE

— Eu tenho uma filha mais o meno da sua idade. Um pouco mais velha. Num dêxo ela chegar aqui perto da fazenda por nada desse mundo. Pra móde o Coroné num bota os óio nela. (p) Já falei pro Quebra-Galho... Quebra-Galho é o meu marido. Já falei pra ele que nóis deve de caçá serviço em outro lugar. Mas é ruim de arranja otra colocação por essas banda.

ISABEL ENTRA NA COZINHA E IVONE SE LEVANTA. ISABEL

— Tá falando o que com a menina, Ivone?

IVONE

— Nada não, dona Isabel. Tô só trocando um dedinho de prosa. Nem isso. A pobre mais parece muda.

ISABEL

— Assim que é bom. Odeio quem fala demais. (P) Venha comigo, menina. Vou lhe preparar um banho e arranjar uma roupa decente.

A MENINA SE LEVANTA E ACOMPANHA ISABEL, QUE SAI DA COZINHA. CORTA PARA:

CENA 30. SÍTIO DE ZÉ MARTINS. EXTERIOR. TARDE ZÉ MARTINS ESTÁ SENTADO NA VARANDA FUMANDO UM CIGARRO DE PALHA. ELE VÊ NA ESTRADA, CERCA DE DEZ HOMENS PASSANDO À CAVALO. ZÉ MARTINS SE LEVANTA PARA OBSERVAR MELHOR. ZÉ MARTINS

— Mas que bando é esse?

OS HOMENS CONTINUAM SEU CAMINHO. ZÉ MARTINS

— Nunca vi nenhum desses peão por aqui. Será que é contratado de arguma fazenda?

ZÉ MARTINS FICA OLHANDO ENQUANTO OS HOMENS SE AFASTAM. CORTA PARA:

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 26

CENA 31. FAZENDA DE HEITOR. ESCRITÓRIO. INTERIOR. TARDE LUCENA E NILO ENTRAM NO ESCRITÓRIO. NILO

— Eu tava resolvendo uns assunto na cidade, mas já tô aqui.

LUCENA

— Ocê sabe que quando eu chamo, gosto de sê atendido.

LUCENA E NILO SE SENTAM. LUCENA

— Vô precisá de ocê hoje à noite, Nilo.

NILO

— Pra que?

LUCENA

— Um servicinho. Acho que ocê vai gostá.

NILO SORRI. NILO

— E qual é?

LUCENA

— Hoje nóis vai fazê uma visitinha na fazenda do Pedro Azulão. Vamo alivia ele do peso de umas cabeça de gado.

OS DOIS SORRIEM UM PARA O OUTRO. A IMAGEM SE CONGELA, UMA PAREDE DE LABAREDAS TOMA CONTA DA TELA E SE TRANSFORMA EM UM GRANDE MURO DE TERRA SÊCA.

FIM DO CAPÍTULO

FOGO SOBRE TERRA

Capítulo 06

Pag.: 27

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