A morte do Magister Dixit Luísa Lopes
A pouco e pouco vai morrendo esta figura irreal e agora quase surrealista do Magister Dixit que marcou o ensino e a sociedade e que foi, acima de tudo, a figura modeladora de uma determinada sociedade que se pretendia igual, ou seja, igualmente analfabeta, com um pequeno núcleo detentor da sabedoria, ideia um pouco medieval, mas que criou sistematicamente elites intelectuais. A figura em questão está agora morta. Pequenos fantasmas clonados nessa ideia atormentam ainda nalguns pontos recônditos do
nosso
sistema.
Estão
sem
dúvida
baralhados,
revoltados e em grande desassossego. A maioria, porém, adapta-se e cresce. Alguns porque renegaram a figura e introduziram novos ships, outros formaram-se já como pequenos astronautas em busca do novo universo do conhecimento. Todos aprendemos agora a “voar”. O único elemento diferenciador é que uns utilizam os instrumentos
correctos e chegam à lua (ou a uma lua), outros continuam a construir asas de cera que derretem como as do ambicioso Ícaro. Essas asas conduzirão sempre a uma imensa queda.
Não é apenas a ideia de voar que conta, isso é uma utopia rudimentar. Precisamos agora de conquistar a grande utopia que é o conhecimento não de um mundo mas de todos os mundos diferentes que o tempo biológico nos deixa conhecer.
Se teoricamente a variedade e as grandes diferenças podem criar um caos aparente, na realidade a variedade só poderá conduzir à perfeição. Se tudo no universo é perfeito, tudo é réplica de qualquer coisa e por outro lado tudo possui uma imensa riqueza. O ser humano em si só é
um
mundo
em
termos
físicos,
emocionais
e
comportamentais. Tem, no entanto, a capacidade de coordenar o seu caos interior pois é uma espécie de máquina que coordena todos os “bits” da sua existência mesmo sabendo que a vida e o ser possuem uma insustentável leveza. Este ser complexo que vai gerindo a complexidade da sua própria vida é um mundo sempre em transformação e reunido com outros seres cria um sistema de enorme complexidade. Todos são sujeitos a todas as influências interiores e exteriores, todos são diferentes isolados ou em grupo. A imagem social é pois uma imagem feita de sombras e reflexos de todos esses seres que percorreram e percorrem caminhos diferentes e que por momentos se cruzam numa galáxia denominada sistema de ensino. Devido às diferenças existentes em cada uma das partes só pode haver um elemento
unificador que pode ser por exemplo um projecto de ensino.
Sabemos agora que é preciso projectar caminhos e construi-los a pouco e pouco, momento a momento para não
criar
abismos
educacionais
ou
aprendizagens
fragmentadas e sem nexo. Por isso a aprendizagem deve ser permanente e a escola encarada como um organismo vivo, dinâmico que leve a uma contínua transformação interior e do grupo. A velocidade da ciência e dos novos meios ao dispôr da sociedade obrigam-nos a estar a par, a saber , a querer conhecer sob pena de rapidamente perdermos a capacidade de comunicar por bloqueio, ou seja, somos postos de lado como peças de um museu humano e reinventam-nos o nome de “Velhos do Restelo”. Se não encararmos a escola centrada na pessoa humana e como um local de aprendizagem constante e recíproca nunca
conheceremos
poderemos
o
transformar.
verdadeiro Os
apelos
mundo
nem
exteriores
o
são
constantes, o conhecimento pode estar ao alcance de todos mas é impossível sabermos tudo. O “magister dixit” sabia “tudo” porque compilava nele um saber papagueado que os outros não atingiam. Ouviam-no com admiração porque ele é que sabia. Actualmente muitas crianças sabem em algumas áreas do conhecimento mais do que
muitos adultos. Os media e as novas tecnologias permitem acessos a conhecimentos diferentes e a escola deve considerá-los sob pena de se tornar uma coisa obsoleta. Assim, professores e alunos são aprendedores em estágios diferentes. Distingue-os o facto dos professores terem a capacidade de poder coordenar as aprendizagens várias e a escola pode ser então o local de troca de saberes. O conhecimento ancestral é sempre motivador e é inato no homem o gosto por “ouvir contar” que provem de uma tradição oral da formação da humanidade. Por isso para uma criança pode ser tão motivante um jogo em Cdrom, como uma história contado e mimada.
Desse encontro de saberes que se gera não pode excluirse a família, núcleo de outros saberes e outras vivências. A harmonia é essencial em termos de projecto, no sentido em que a escola não pode transmitir saberes que entrem em choque com valores familiares. Existe o direito à(s) diferença(s)
desde
que
encarado
como
diferentes
perspectivas de vida. O diálogo é por isso essencial e os próprios pais devem ser aprendedores dentro do mesmo sistema, ou seja, é da relação e do relacionamento de todas as partes que se pode criar um sentido ou uma direcção para o universo do conhecimento. Temos que saber para onde queremos ir para podermos escolher o caminho e essa decisão não pode ser nunca unilateral. Não depende também apenas do desejo dos interlocutores pois estes deverão considerar também o meio em que vivem e o mundo que os rodeia. Todos queremos um mundo melhor, uma escola melhor, pessoas melhores e mais solidárias. Só nesta perspectiva global e globalizante poderemos fazer parte da grande aldeia global a que todos pertencemos. A escola do século XXI deverá ser centrada na
pessoa
humana
tendo como finalidade
o seu
desenvolvimento pessoal, interpessoal e social. Tal só
será possível se a finalidade última for partilhada. A grande ideia não será criar falsos horizontes de expectativa será sim criar horizontes comuns que nos levem a um crescimento permanente e a uma aprendizagem mútua e constante.