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VIP
Um motorista os busca às 23h. Ao chegar, Gustavo repara na fila para comprar ingressos. Suspira freelancer aliviado. É aquele freqüentador eventual de – Graças a Deus não áreas VIPs. Nessa categoria se vou aturar cambista venencaixam as mulheres muito bonitas, dendo convite – esnoba. que, dependendo do local, podem Passam pelo tapete verser convidadas na própria fila. melho, ganham pulseiriEsforçados e insistentes nhas e sobem ao camarote também têm vez. VIP, ainda vazio. Instalam-se em uma mesa reservada e recebem um champanha de corteO sonho de viver uma noite sia. Depois, ganham a compainteira em posição vipésima nhia de Julius Rigotto. não é para o bico de qualquer – Acho bem legal a atitude um. A experiência para quem do idealizador da festa convernão é do meio foi propiciada sar com os VIPs, afinal estão por ZH Donna para os namo- todos ali para prestigiar o rados Gustavo Polidoro, 25 evento dele – opina Graziele. Quando a ilustre visita se reanos, e Graziele Fortes, 20 anos. Eles se conheceram na tira, o casal vai dançar. Graziepista do Manara há dois anos e le, antes preocupada por estar meio. O camarote de uma festa arrumada demais para o local, realizada há duas semanas em fica mais à vontade: – Não gosto de lugares tuPorto Alegre foi a estréia do multuados, onde fica um moncasal em um espaço VIP.
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te de gente suada encostando nos outros. Aqui é outro nível. No banheiro, Gustavo se impressiona: sem filas, o local é limpo e há até sofás para relaxar. – Realmente, ali fica a plebe, aqui fica a elite. É como no seriado do Chaves, onde alguém diz “não se misture com essa gentalha” – brinca Gustavo. Nenhum dos dois se anima a descer para o meio da multidão. – Eu gostaria de ser VIP. Quem é que não quer entrar sem pagar e ser muito bem tratado? Os VIPs são os que podem pagar e não pagam, enquanto eu tenho menos recursos e não tenho nome para fazer pose – admite Graziele. – Achei 100% a área VIP. As regalias são legais. Gostei de tudo, mas a música... Bom, não tocou pagode, né? – resigna-se Gustavo, que não é lá grande fã de música eletrônica.
Se há um ano o ator gaúcho Werner Schunemann, 44 anos, conseguia passear tranqüilamente em lugares famoso públicos, hoje não consegue ir nem ao supermercado. Na última vez em Jogadores de futebol, artistas e que tentou, acabou sendo levado pe- celebridades (mesmo as instantâneas) los seguranças e escondido na câmara têm passe livre em qualquer evento, frigorífica do shopping, tamanho o afinal seus rostos e nomes são tumulto. Outro dia, em um engarrafaconhecidos. Muitos recebem mento em São Paulo, recebeu acenos cachês para freqüentar e aplausos. Zagallo e Parreira já pedialgumas festas ram para tirar fotos com ele. – Senti como se as coisas estivessem de ponta-cabeça – confessa o intér- nhecimento o deixa honrado, mas o prete de Bento Gonçalves na minissé- desafio, segundo ele, é manter a morie global A Casa das Sete Mulheres. déstia e a serenidade frente ao assédio O mais novo VIP nacional do Estado das fãs. passou a ser convidado para todo tipo – Estou há tanto tempo na estrada de eventos – baile de debutantes, ho- que chega a ser um soco no peito. menagens, inaugurações. Tenta aten- Ainda estou decifrando isso – conder a todos, sempre que pode. O reco- fessa.
Gustavo e Graziele bebem champanha e divertem-se como VIPs por uma noite ao lado do empresário da noite Julius Rigotto Fotos Dulce Helfer/Agência RBS
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por natureza
formador de opinião
Nasceram em berço esplêndido. O dono do restaurante os trata pelo nome, e eles sempre têm mesas reservadas. São socialites, empresários, membros de famílias tradicionais e endinheirados em geral.
A sociedade porto-alegrense mudou muito nos últimos anos, mas o perfil dos VIPs por natureza ainda é o mesmo: pessoas com um bom círculo social, com destaque em suas carreiras ou negócios, que freqüentam os lugares mais exclusivos e tradicionais da cidade. – Nos anos 60 e 70, os VIPs tradicionais eram as grandes estrelas de Porto Alegre. Hoje não é mais assim. O dinheiro mudou de mãos, razão pela qual nos sentimos perdidos. Há pessoas com sobrenome famoso, porém falidas, e outras com situação financeira excelente, mas desconhecidas - explica o relações-públicas Jacintho Pilla. A artista plástica Cláudia Tellechea, 52 anos, freqüentadora habitual de eventos badalados, critica o uso pejorativo do termo “socialite”: – As pessoas empregam de uma maneira muito fútil e superficial essa palavra. Usam como algo depreciativo. E quem vive nesse meio não é sempre assim – argumenta.
12 DONNA ZH 1º DE JUNHO DE 2003
Vale desde jornalistas, escritores, fotógrafos, publicitários, RPs até profissões descoladas como decoradores, estilistas e personals. A tribo dos modernos e alternativos também é multiplicadora de opinião.
Miltinho e Simone: todo mundo se acha VIP em Porto Alegre
De VIPs a dupla Simone Perrenoud, 39 anos, e Miltinho Talaveira, 39 anos, entende. A jornalista comandou o programa Gentalha, na Rádio Atlântida, em 1998, e o publicitário era convidado freqüente na atração. – Todo mundo em Porto Alegre se acha VIP. Ninguém gosta de comprar convite, todos gostam de ganhar. Ser VIP, então, já é uma chinelagem. Todo mundo quer se destacar, mas é sempre uma mesma panelinha – opina Miltinho, gerente de comunicação da Agência Escala. O publicitário, que se autodefine um “birô de convites” e “central de ingressos” na Capital, conhece as agruras de não ser ninguém no Rio. Mesmo passando todos os verões na cidade maravilhosa, não está satisfeito em ser um não-VIP lá. – Tenho três sonhos a realizar: ser convidado para camarote de cerveja no carnaval, entrar no mailing de Liége Monteiro ou Alicinha Cavalcanti e ir para a Ilha de Caras. A cada verão, eu subo um degrau – diz. A jornalista Simone Perrenoud ri do amigo e lembra que “uma carreira não se faz em um ano”. – Minha dica para alguém ser VIP é: nasça de novo, meu filho. Porque tem uns chatos que não vão ser pessoas importantes nunquinha – sentencia Simone, que cansou da vida noturna e abriu uma banca de revistas.
VIP TRANSIT, GLORIA MUNDI ROGER LERINA Engraçado como a gente passa de VUP para VIP num vapt por aqui. Até coisa de quatro anos – não por coincidência, desde que passei a escrever a coluna Contracapa em Zero Hora –, eu era mais um porto-alegrense VUP. (“Very unimportant person”, pessoa muito desimportante, sabe?) Subitamente, a partir de então, saí do anonimato e virei o que o meu colega de jornalismo Jimi Joe chama de “microcelebridade”, um sujeito que é reconhecido por alguns na rua, convocado a opinar sobre qualquer coisa que não entenda direito (de jardinagem à taxa Selic) e, principalmente, convidado permanente de festas – porque todo dia tem uma em Porto Alegre, né? Mas não me entendam mal, por favor. Eu adoro essa função toda. Certo: não vou a 90% dos eventos a que sou convidado, tento evitar de falar (muito) sobre o que não sei, não me preocupo em ser “famoso”. Porém, gosto de verdade do calor que emana dessa fogueira de vaidades e me divirto horrores com toda essa cena. Há alguma coisa de democrática nesse “vipismo” instantâneo em voga agora: grosso modo (expressão que não cabe muito bem quando se fala em boa colocação social, mas vá lá), qualquer um pode pular de VUP para VIP – basta participar de um reality show, posar nua para uma grande revista feminina, con-
seguir entrar em mailing list de um promotor de eventos poderoso. O lado nada-a-ver desse circo todo é a voracidade com que algumas pessoas buscam virar notórias, topando literalmente qualquer parada para cavar seu lugar ao sol e passando a virar o nariz para aqueles mortais que não merecem o favor dos porteiros e têm que esperar na fila. Além de muito feio, esse esnobismo de quem vive à caça de flashes nem sempre é producente. Preste atenção no que diz um VUP recentemente promovido: em muitas casas noturnas, bares, shows, o tal espaço VIP é um inferno – às vezes está lotado de gente (pois em Porto Alegre é a capital brasileira dos “amigos do dono”), noutras é tão distante do centro das atenções que você não consegue ver/ouvir a atração da festa, em outras ainda as pessoas interessantes estão todas fora do brete dos VIPs (que nem naquele filme Memórias, em que o Woody Allen fica preso no vagão errado e perde a folia). Mais uma dica: o segredo está na misturinha. Coisa mais sem graça chegar nas baladas e encontrar no tal reservado dos ungidos aquelas caras de sempre... O segredo, acho, é não encanar muito se você é barrado na tal função vipérrima e a hostess não chega na sua frente na porta e diz “pode entrar”. Dá pra curtir a vida do outro lado do cercadinho. Palavra de quem passou 30 anos se divertindo à beça do lado de fora.
ZERO HORA