Processo Civil

  • October 2019
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PRINCÍPIOS ESTRUTURANTES DO PROCESSO CIVIL ACESSO À JUSTIÇA GARANTIAS DO PROCESSO JUSTO NOVO MODELO PROCESSUAL

ACESSO À JUSTIÇA 1.

Direito à jurisdição O art. 10º Declaração Universal dos Direitos do Homem estabelece que “toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um Tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida”. Este direito à justiça sem qualquer discriminação por motivos económicos é uma consequência do Estado social de direito que se encontra consagrado no art. 2º CRP. O acesso à justiça não é, aliás, o único direito fundamental assegurado ao cidadão na área da protecção dos direitos: adequadamente, o art. 20º/1 CRP atribui, a par da garantia de acesso aos Tribunais, uma garantia de acesso ao próprio direito. Sem este “direito ao direito”, a garantia do acesso aos Tribunais poderia tornar-se vazia e ilusória, dado que não importa criar as condições para aceder aos Tribunais se, simultaneamente, não se possibilitar o conhecimento dos direitos que se podem defender através desses órgãos. Nesta perspectiva, percebe-se que, nos termos do art. 20º/2 CRP, a garantia do acesso ao direito envolva o direito à informação e consultas jurídicas e, em caso de necessidade, ao patrocínio judiciário e que o art. 6º DL 387-B/87, de 29/12, englobe o direito à consulta jurídica e ao patrocínio judiciário num mais vasto direito à protecção jurídica. 2.

Garantias do acesso à justiça Quando considerada na perspectiva do acesso à justiça, qualquer reforma do processo civil deve orientar-se para a eliminação dos obstáculos que impedem, ou, pelo menos, dificultam, esse acesso. Cappellitti considera os seguintes obstáculos ao acesso à justiça: o obstáculo económico, se os interessados não estiverem em condições de aceder aos Tribunais por causa da sua pobreza; o obstáculo organizatório, porque a tutela de certos interesses colectivos ou difusos impõe uma profunda transformação nas regras e institutos tradicionais do direito processual; finalmente, o obstáculo propriamente processual, porque os tipos tradicionais de processo são inadequados para algumas tarefas de tutela. a) Obstáculo económico: A garantia do acesso à justiça, para ser efectiva, pressupõe a não discriminação por insuficiência de meios económicos (art. 20º/1 CRP). O art. 6º

DL 387-B/87 garante, no âmbito da protecção jurídica, o chamado apoio judiciário, o qual compreende a dispensa, total ou parcial, ou o diferimento do pagamento dos serviços do advogado ou solicitador (art. 15º/1 DL 387-B/87). Este apoio judiciário destina-se a evitar que os custos relacionados com o processo seja utilizados pela parte economicamente mais poderosa como um meio de pressão sobre a parte mais fraca. b) Obstáculo organizatório: O art. 26º-A regula a legitimidade para as acções e procedimentos cautelares destinados à tutela de interesses difusos, como os que se referem à saúde pública, ao ambiente e qualidade de vida, ao património cultural, ao domínio público e ao consumo de bens e serviços. O art. 26º-A contém apenas uma norma remissiva para a lei regulamentadora da acção popular, mas, ainda assim, apresenta a vantagem de integrar no âmbito do processo civil a legitimidade popular, isto é, a legitimidade para a defesa dos interesses difusos através da acção popular prevista no art. 52º/3 CRP. Esclareça-se, a propósito, que, nos termos do art. 12º/2 Lei 83/95, a acção popular civil pode revestir qualquer das formas previstas no Código de Processo Civil, pelo que essa legitimidade abrange qualquer acção ou procedimento admissível na área processual civil. c) Obstáculo processual: O processo declarativo segue uma tramitação, comum ou especial, fixada pela lei (art. 460º/1 CPC). Abandonada qualquer correspondência entre o direito subjectivo e a respectiva actio, são fundamentalmente motivos ligados à necessidade prática de adaptar a tramitação processual a certas situações específicas que conduzem à previsão de certos processos especiais. Mas, os processos especiais previstos na lei só abrangem certas situações particulares, o que significa que a grande maioria das acções propostas em Tribunal é regulada para a tramitação comum (art. 460º/2 CPC). Segundo o art. 265º-A CPC, quando a tramitação processual prevista na lei não se adequar às especificidades da causa, o juiz deve, mesmo oficiosamente, determinar, depois de ouvidas as partes, a prática dos actos que melhor se ajustem ao fim do processo e definir as necessárias adaptações no seu procedimento. Deve entender-se que a iniciativa da adaptação pode pertencer quer ao juiz, quer a qualquer das partes. A adaptação pode consistir tanto na realização de actos que não sejam previstos na tramitação legal e que se mostrem indispensáveis ao apuramento da verdade e ao acerto da decisão, como na dispensa de actos que se revelem manifestamente inidóneos para o fim do processo. O art. 265º-A CPC, não o diz, mas é claro que a tramitação sucedânea tem de respeitar estritamente a igualdade das partes (art. 3º-A CPC) e, em particular, o princípio do contraditório (art. 3º/2/3 1ª parte CPC). Mesmo que, como o art. 265º-A CPC, o exige, a parte tenha sido previamente ouvida, ela não fica impedida de invocar o desrespeito daqueles princípios na tramitação sucedânea. A prática ou a omissão de um acto que implica a ofensa daqueles princípios traduz-se numa nulidade processual (art. 201º/1 CPC), pois que são directamente violados os preceitos que os consagram (arts. 3º/2/3 1ª parte e 3º-A CPC) e essa violação influi certamente no exame ou decisão da causa. Nas hipóteses de cumulação de vários objectos processuais numa mesma acção, o problema da inadequação formal surge numa outra vertente: sempre que uma certa situação da vida jurídica comporte aspectos a que, quando

considerados parcelarmente, correspondam processos comuns e especiais ou diferentes processos especiais, coloca-se o problema de saber se essa diferença formal deve impedir o seu tratamento unitário num mesmo processo. É evidente que é desejável que motivos formais não impliquem um desmembramento de uma mesma situação jurídica por vários processos.

GARANTIAS DO PROCESSO JUSTO 3.

Direito ao processo justo Não basta assegurar a qualquer interessado o acesso à justiça: tão importante como esse acesso é garantir que o processo a que se acede apresenta, quanto à sua própria estrutura, garantias de justiça. Este direito ao processo justo encontra-se expressamente consagrado no art. 10º Declaração Universal dos Direitos do Homem, no art. 14º/1 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e no art. 6º/1 Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Todos estes preceitos atribuem o direito a um julgamento equitativo, que, aliás, eles próprios concretizam nas garantias de imparcialidade e de independência do Tribunal, de igualdade das partes, de publicidade das audiências, do juiz legal ou natural e de proferimento da decisão num prazo razoável. Estes princípios são, todos eles, susceptíveis, de moldar o regime processual. Assim, é indispensável garantir àquele que recorre aos Tribunais um julgamento por um órgão imparcial, uma plena igualdade das partes, o direito ao contraditório, uma duração razoável da acção, a publicidade do processo e a efectivação do direito à prova. 4.

Imparcialidade do Tribunal A administração da justiça não é possível sem um Tribunal independente e imparcial: a imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo. As garantias de imparcialidade do Tribunal podem ser vistas, quer como garantias do Tribunal perante terceiros, quer como garantias das partes perante o Tribunal. Naquela primeira perspectiva, as garantias de imparcialidade costumam classificar-se em materiais e pessoais: as garantias materiais respeitam à liberdade do Tribunal perante instruções ou quaisquer intromissões de outro órgão do estado (art. 206º CRP, art. 4º/1 EMJ – Estatuto dos Magistrados Judiciais, Lei n.º 21/85, de 30/7, alterada pelo DL n.º 342/88, de 28/9, e pelas Leis n.º 2/90, de 20/1, e 10/94, de 5/5); as garantias pessoais protegem o juiz em concreto: são elas a irresponsabilidade (art. 5º EMJ) e a inamovibilidade (art. 6º EMJ). Na perspectiva das partes, as garantias de imparcialidade referem-se à independência do juiz e à sua neutralidade perante o objecto em causa. Constitui ainda uma garantia das partes a chamada independência interna do juiz. Refere-se esta às influências a que o juiz está sujeito pela sua origem, educação ou processo de socialização. É este aspecto da independência interna que justifica a proibição da prática de actividade político-partidárias de carácter público e de ocupação de cargos políticos pelos magistrados judiciais em exercício de funções (art. 11º EMJ), bem como a proibição do desempenho pelos mesmos de qualquer outra função pública ou privada, salvo as funções docentes ou de investigação jurídica, desde que não remuneradas (art. 218º/3 CRP, art. 13º EMJ). 5.

Igualdade das partes

Ambas as partes devem possuir os mesmos poderes, direitos, ónus e deveres, isto é, cada uma delas deve situar-se numa posição de plena igualdade perante a outra e ambas devem ser iguais perante o Tribunal. Esta igualdade das partes, que deve ser assumida como uma concretização do princípio da igualdade consagrado no art. 13º CRP, é agora um princípio processual com expressão legal no art. 3º-A CPC, este preceito estabelece que o Tribunal deve assegurar, durante todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso dos meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais. Um primeiro problema suscitado pelo art. 3º-A e pela referida igualdade substancial entre as partes é o de nem sempre é viável assegurar essa igualdade. Em certos casos, não é possível ultrapassar certas diferenças substanciais na posição processual das partes; noutras hipóteses, não é possível afastar certas igualdades formais impostas pela lei. Devem ser respeitadas todas as situações de igualdade formal entre as partes determinadas pela lei processual. Há que observar alguns preceitos que visam directamente a igualdade formal entre as partes (arts. 42º/2 e 512º-A/1 CPC). Portanto, também neste campo não existe qualquer possibilidade de assegurar uma igualdade substancial entre as partes. O art. 3º-A tem como destinatário o Tribunal, pois que é a este órgão que o preceito atribui a função de garantir a igualdade substancial das partes. Mas esta função pode ser entendida de duas formas bastantes distintas: se essa função for concebida com um conteúdo positivo, aquele preceito impõe ao Tribunal o dever de promover a igualdade entre as partes e de, eventualmente, auxiliar a parte necessitada; se, pelo contrário, essa função for entendida com um conteúdo negativo, só se proíbe que o Tribunal promova a desigualdade entre as partes. O direito português concede ao Tribunal certos poderes instrutórios (arts. 535º/1, 612º/1 e 653º/1 CPC) e inquisitórios: quanto estes últimos, resulta do disposto nos arts. 264º/2 e 265º/3 CPC, que o Tribunal pode investigar e considerar os factos instrumentais relevantes para a decisão da causa. Mas o uso destes poderes instrutórios e inquisitórios é orientado, não pela necessidade de obter a igualdade entre as partes, mas pela de procurar proferir uma decisão de acordo com a realidade das coisas. A expressão do princípio da igualdade deve ser procurada fora daqueles poderes instrutórios ou inquisitórios, o que de modo algum exclui um amplo campo de aplicação desse princípio. Esta aplicação verifica-se tanto no referido conteúdo positivo, que impõe ao Tribunal um dever de constituir a igualdade entre as partes, como no conteúdo negativo, que o proíbe de originar, pela sua conduta, uma desigualdade entre as partes. A referência à igualdade substancial que consta no art. 3º-A não pode postergar os vários regimes imperativos definidos na lei, que originam desigualdades substanciais ou que se bastam com igualdades formais. Quer supressão dos factores de igualdade formal, mas através de um auxílio suplementar a favor da parte carenciada do auxílio. Essa igualdade substancial não é obtida através de um minus imposto a uma das partes, mas de um maius concedido à parte necessitada. O princípio da igualdade substancial não choca com o princípio da imparcialidade do Tribunal. Esta imparcialidade traduz-se numa independência

perante as partes, mas, no contexto do princípio da igualdade, imparcialidade não é sinónimo de neutralidade: a imparcialidade impõe que o juiz auxilie do mesmo modo qualquer das partes necessitadas ou, dito de outra forma, implica, verificadas as mesmas condições, o mesmo auxílio a qualquer delas; a neutralidade determina a passividade do juiz perante a desigualdade das partes. Portanto, o juiz tem de ser neutro perante as situações de desigualdade que existam ou que se possam criar entre as partes, mas deve ser imparcial perante elas, dado que, quando tal se justifique, deve auxiliar qualquer delas. O conteúdo negativo do princípio da igualdade substancial destina-se a impedir que o juiz crie situações de desigualdade substancial entre as partes. Assim, por exemplo, esse princípio obsta a que o Tribunal fixe, para cada uma das partes, prazos diferentes para o exercício da mesma faculdade ou o cumprimento do mesmo ónus. Quanto às decisões sobre o mérito da causa, elas são determinadas pelos critérios resultantes da lei ou que por ela seja permitidos, como a equidade (art. 4º CC) e a discricionariedade própria dos processos de jurisdição voluntária (art. 1410º CPC). Assim, o Tribunal só pode introduzir na sua decisão as correcções que a lei permita ou que resultem de qualquer daqueles critérios formais de decisão. 6.

Garantia do contraditório O direito do contraditório – que é, em si mesmo, uma decorrência do princípio da igualdade das partes estabelecido no art. 3º-A – possui um conteúdo multifacetado: ele atribui à parte não só o direito ao conhecimento de que contra ele foi proposta uma acção ou requerida uma providência e, portanto, um direito à audição antes de ser tomada qualquer decisão, mas também um direito a conhecer todas as condutas assumidas pela contraparte e a tomar posição sobre elas, ou seja um direito de resposta. a) Direito à audição prévia: O direito à audição prévia encontra-se consagrado no art. 3º/1 (o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a acção pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição) CPC in fine, embora possa sofrer as excepções genericamente previstas no art. 3º/2 (só nos casos excepcionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida) CPC: assim, num procedimento cautelar comum, o Tribunal só ouvirá o requerido se a audiência não puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência (art. 385º/1 CPC); a restituição provisória da posse e o arresto são decretados sem a audiência da parte requerida (arts. 394º e 408º/1 CPC). É ainda o direito à audição prévia que justifica todos os cuidados de que há que revestir a citação do réu e a tipificação dos casos em que se considera que ela falta (art. 195º CPC) ou é nula (art. 198º/1 CPC) e que está subjacente à possibilidade de interposição do recurso extraordinário de revisão contra uma sentença proferida num processo em que tenha faltado a citação ou esta seja nula (art. 771º-f CPC) e de oposição e anulação da execução com base nos mesmos vícios (arts. 813º-d e 921º CPC). b) Direito de resposta: O contraditório não pode ser exercido e o direito de resposta não pode ser efectivado se a parte não tiver conhecimento da conduta processual da

contraparte. Quanto a este aspecto, vale a regra de que cumpre à secretaria notificar oficiosamente as partes quando, por virtude de disposição legal, elas possam responder a requerimentos, oferecer provas ou, de um modo geral, exercer algum direito processual que não dependa de prazo a fixar pelo juiz, nem de prévia citação (art. 229º/2 CPC). Concretizações desta regra constam dos arts. 146º/5, 174º/1, 234º/1, 542º e 670º/1 CPC. O direito de resposta consiste na faculdade, concedida a qualquer das partes, de responder a um acto processual (articulado, requerimento, alegação ou acto probatório) da contraparte. Este direito tem expressão legal, por exemplo, no princípio da audiência contraditória das provas constante do art. 517º CPC. O art. 3º/3 1ª parte CPC, impõe ao juiz, de modo programático, o dever de observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório. Significativa é também, quanto a este aspecto, a supressão dos processos sumários e sumaríssimos como processos cominatórios plenos (arts. 784º e 794º/1 CPC): neste caso, não é o contraditório que se garante, mas as consequências do seu exercício que se atenuam. A violação do contraditório inclui-se na cláusula geral sobre as nulidades processuais constante do art. 201º/1 (fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa) CPC: dada a importância do contraditório, é indiscutível que a sua inobservância pelo Tribunal é susceptível de influir no exame ou decisão da causa. Uma concretização desta regra encontra-se no art. 277º/3 (são nulos os actos praticados no processo posteriormente à data em que ocorreu o falecimento ou extinção que, nos termos do n.º 1, devia determinar a suspensão da instância, em relação aos quais fosse admissível o exercício do contraditório pela parte que faleceu ou se extinguiu) CPC. 7.

Duração razoável do processo A lentidão processual encontra causa endógenas e exógenas. Como causas endógenas podem ser referidas as seguintes: a excessiva passividade – se não legal, pelo menos real – do juiz da acção; a orientação da actividade das partes, não pelos fins da tutela processual, mas por razões frequentemente dilatórias; alguns obstáculos técnicos, como os crónicos atrasos na citação do réu e a demora no proferimento do despacho saneador devida às dificuldades inerentes à elaboração da especificação e do questionário. Outras causas da morosidade processual são exteriores ao próprio processo: falta de resposta dos Tribunais ao crescimento exponencial da litigiosidade, dada a exiguidade dos meios disponíveis; maior complexidade do direito material e crescente uso nele de conceitos indeterminados e de cláusulas gerais, cuja concretização, deficiência na preparação técnica dos profissionais forenses. Uma consequência da morosidade da justiça é o recurso cada vez mais frequente às providências cautelares como forma de solucionar os litígios, especialmente quando elas podem antecipar a tutela definitiva ou mesmo vir a dispensá-la. São várias as soluções habitualmente seguidas (ou tentadas) para obviar à morosidade processual. Salientam-se, entre ela, as seguintes soluções: o estabelecimento entre as fases do processo, ou mesmo no seu interior, de

regras de preclusão, que obstam a que um acto omitido possa vir a ser realizado fora do seu momento legalmente fixado; o reforço do controlo do juiz sobre o processo; a concentração do processo numa audiência na qual a causa possa ser discutida e, eventualmente, decidida. O art. 2º/1 CPC, atribui à parte o direito de obter, num prazo razoável, a decisão da causa, o que significa que o Estado tem do dever de disponibilizar os meios necessários para assegurar a celeridade na administração da justiça. Assim, a concessão deste direito à celeridade processual possui, para além de qualquer âmbito programático, um sentido preceptivo bem determinado, pelo que a parte prejudicada com a falta de decisão da causa num prazo razoável por motivos relacionados com os serviços da administração da justiça tem direito a ser indemnizada pelo Estado de todos os prejuízos sofridos. Esta responsabilidade do Estado é objectiva, ou seja, é independente de qualquer negligência ou dolo do juiz da causa ou dos funcionários judiciais. Para obter a indemnização dos prejuízos causados pelo atraso no proferimento da decisão tem sido utilizada, com alguma frequência, a petição dirigida à Convenção Europeia dos Direitos do Homem (art. 25º/1), para que esta solicite a apreciação da violação pelo Estado português da garantia da decisão do processo num prazo razoável pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (arts. 44º e 48º/1 Convenção Europeia dos Direitos do Homem) e, se for caso, a atribuição ao lesado de uma reparação adequada (art. 50º Convenção Europeia dos Direitos do Homem). 8.

Publicidade do processo O Processo Civil é – diz enfaticamente o art. 167º/1 CPC – público. A publicidade do processo tornou-se possível com a introdução da oralidade e contínua a possuir a justificação tradicional: ela é um meio para combater o arbítrio e assegurar a verdade e a justiça das decisões judiciais. A essa publicidade estão subjacentes os princípios fundamentais do Estado de direito, nomeadamente a possibilidade de um controlo popular dos órgãos que – como sucede com os Tribunais – exercem poderes de soberania (art. 110º/1 CRP). É nesta perspectiva que se deve entender a garantia da publicidade das audiências dos Tribunais, que se encontra consagrada no art. 206º CRP e no art. 656º/1 CPC, bem como a garantia do acesso aos autos por todos os interessados estabelecida no art. 167º/2 CPC. A publicidade das audiências dos Tribunais constitui uma importante garantia numa dupla dimensão: em relação às partes, ela assegura a possibilidade de um controlo popular sobre as decisões que as afectam directamente; relativamente à opinião pública, essa publicidade permite combater a desconfiança na administração da justiça. A publicidade das audiências é, no entanto, excluída quando circunstâncias ponderosas o aconselham. Esses motivos encontram-se constitucionalmente tipificados (art. 206º CRP) e são repetidos no respectivo preceito da lei ordinária (art. 656º/1 CPC): são eles a salvaguarda da dignidade das pessoas e da moral pública e a garantia do normal funcionamento da audiência (art. 9º lei 3/99). A publicidade do processo implica o direito, reconhecido a qualquer pessoa capaz de exercer o mandato judicial ou a quem nisso revele um interesse atendível, de exame e consulta dos autos na secretaria do Tribunal e de obtenção de cópias ou certidões de quaisquer peças nele incorporadas pelas

partes (art. 167º/2 CPC). Este acesso aos autos é, porém, limitado nos casos em que a divulgação do seu conteúdo possa causar dano à dignidade das pessoas, à intimidade da vida privada ou familiar ou à moral pública ou pôr em causa a eficácia da decisão a proferir (art. 168º/1 CPC). 9.

Direito à prova A prova é a actividade destinada à formação da convicção do Tribunal sobre a realidade dos factos controvertidos (art. 341º CC), isto é, dos factos que constituem a chamada base instrutória (art. 508º-A/1-e, 508º-B/2, e 511º/1 CPC). Essa actividade incumbe à parte onerada (art. 342º CC), que não obstará uma decisão favorável se não satisfazer esse ónus (art. 516º; art. 346º CC). Para cumprir o ónus da prova, a parte tem de utilizar um dos meios de prova legal ou contratualmente admitidos ou não excluídos por convenção das partes (art. 345º CC). Dada a importância do cumprimento do ónus para a contraparte e para terceiros, costuma falar-se de um direito à prova. Este direito é habitualmente deduzido, para a generalidade dos processos jurisdicionais, do disposto no art. 6º/3-d Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que garante ao acusado o direito de interrogar ou fazer interrogar as testemunhas de acusação e obter a convocação e o interrogatório das testemunhas de defesa nas mesmas condições daquelas. O direito à prova contém limites impostos pela protecção de direitos de terceiros: aquele direito cede perante direitos de terceiros que mereçam do ordenamento jurídico uma tutela mais forte. Em geral, os limites do direito à prova consubstanciam-se nas chamadas provas proibidas, que podem ser tanto provas que são materialmente lícitas mas processualmente proibidas, como provas que são materialmente e processualmente proibidas. Algumas provas são materialmente lícitas, mas, apesar disso, não são processualmente admissíveis. Estas provas podem conduzir a uma proibição de produção ou de valoração. Noutros casos, a prova pode ser produzida num processo, mas não pode ser valorada numa outra acção. Outras provas são materialmente proibidas e, portanto, ilícitas. São exemplo de provas ilícitas todas aquelas que são obtidas através dos métodos previstos no art. 32º/8 CRP ou no art. 519º/3 CPC. As provas ilícitas são, em regra, insusceptíveis de ser valoradas pelo Tribunal, isto é, não podem servir de fundamento a qualquer decisão judicial. Mas, quanto ao real âmbito destas provas insusceptíveis de valoração, parece haver que distinguir entre aqueles meios de prova cuja produção é, ela própria, um acto ilícito (é o caso das provas previstas no art. 32º/8 CRP e no art. 519º/3 CPC) e aquelas provas cuja produção não representa, em si mesma, qualquer ilicitude. NOVO MODELO PROCESSUAL 10. Premissas gerais As características do processo liberal, dominado pela passividade judicial, são essencialmente as seguintes; às partes é concedido o controlo sobre o processo e os factos relevantes para resolução do litígio e é minimizado o contributo do juiz e de terceiros para essa resolução; a decisão requer apenas

uma legitimação dependente da observância das regras e dos pressupostos processuais. Em contrapartida, são as seguintes as linhas essências do processo submetido ao activismo judiciário: as partes repartem com o Tribunal o domínio sobre o processo e ela próprias são consideradas uma fonte de informações relevantes para a decisão da causa; as partes e terceiros estão obrigados a um dever de cooperação com o Tribunal; a legitimação da decisão depende da sua adequação substancial e não apenas da sua correcção formal; as regras processuais podem ser afastadas ou adaptadas quando não se mostrem idóneas para a justa composição do litígio. O processo é poder. Nas sociedades modernas, submetidas ao poder político do Estado e organizadas em torno deste, o poder jurisdicional dos juízes é expressão de posição que o sistema jurídico lhes concede para a resolução dos conflitos de interesses públicos e privados (art. 202º/2 CRP). Isto reconduz a análise para o problema da legitimação do processo jurisdicional, ou seja, para a adequação da instituição processual para realizar os fins que o Estado e a sociedade lhe atribuem. Os processos jurisdicionais de natureza declarativa destinam-se a obter o proferimento de uma decisão pelo Tribunal. A correcção desta decisão depende da sua coerência com as premissas de facto e de direito que foram adquiridas durante o processo e da própria não contradição entre essas premissas: se essa decisão for correcta, será possível encontrar na sua fundamentação naquelas premissas ou, pelo menos, reconstitui-las a partir dela. A esta coerência da decisão com as sua premissas pode chamar-se legitimação interna. Esta legitimação assegura a coerência da decisão com as suas premissas, mas nada garante quanto à verdade ou aceitabilidade dessas premissas e, portanto, daquela decisão: do facto de esta ser coerente com as suas premissas não se segue que ela corresponda à realidade das coisas, pois que, para tal, é necessário que estas premissas estejam, elas próprias, de acordo com tal realidade. A esta correspondência da decisão com a realidade extraprocessual pode chamar-se legitimação externa. O Estado social de direito que se encontra plasmado no art. 2º CRP pressupõe uma democracia económica, social e cultural. O processo jurisdicional não pode deixar de reflectir essas preocupações sociais e de ser impregnado por uma concepção social: a solução dos conflitos não é uma matéria de mero interesse dos litigantes e estes não devem ser tratados como titulares abstractos da situação litigiosa, mas antes como indivíduos concretos com necessidades a que o direito e o processo devem dar resposta. O Estado social de direito representa um compromisso entre a esfera do Estado e a da sociedade, dos grupos e dos indivíduos. Também este compromisso se reflecte em vários aspectos dos modernos processos jurisdicionais. 11. Cooperação inter-subjectiva O art. 266º/1 CPC, dispõe que, na condução e intervenção no processo, os magistrados, os mandatários judiciais e as próprias partes devem cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio. Este importante princípio da cooperação destina-se a transformar o processo civil numa “comunidade de trabalho” e a responsabilizar as partes e o Tribunal pelos seus resultados. Este dever de cooperação dirige-

se quer às partes, quer ao Tribunal, pelo que importa algumas consequências quanto à posição processual das partes perante o Tribunal, deste órgão perante aquelas e entre todos os sujeitos processuais em comum. a) Posição das partes: Dever de cooperação assenta, quanto às partes, no dever de litigância da boa fé (art. 266º-A – As partes devem agir de boa fé e observar os deveres de cooperação resultantes do preceituado no artigo anterior – CPC). A infracção do dever do honeste procedere pode resultar de má fé subjectiva, se ela é aferida pelo conhecimento ou não ignorância da parte, ou objectiva, se resulta da violação dos padrões de comportamento exigíveis. Segundo o art. 456º/2 CPC proémio, essa má fé pressupõe quer o dolo, quer tão-só a negligência grave. Qualquer das referidas modalidades da má fé processual pode ser substancial ou instrumental: é substancial, se a parte infringir o dever de não formular pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar (art. 456º/2-a CPC), alterar a verdade dos factos ou omitir factos relevantes para a decisão da causa (art. 456º/2-b CPC), isto é, violar o dever de verdade; é instrumental, se a parte tiver omitido, com gravidade, o dever de cooperação (art. 456º/2-c CPC) ou tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão (art. 456º/2-d e art. 720º CPC). A má fé processual obriga a parte ao pagamento de uma multa e, se a parte contrária o pedir, de uma indemnização (art. 456º/1 CPC). Esta indemnização pode consistir, segundo a opção do juiz (art. 457º/1-b 2ª parte CPC), no reembolso das despesas a que a má fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos (art. 457º/1-a CPC), ou no reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência directa ou indirecta da má fé (art. 457º/1-b CPC). O dever de cooperação das partes estende-se igualmente à importante área da prova. O art. 519º/1 CPC, estabelece, na sequência do direito do Tribunal à coadjuvação de outras entidades (art. 206º/3 CRP), que todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, têm o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendo-se às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados. Este dever de colaboração é independente da repartição do ónus da prova (arts. 342º a 345º CC), isto é, vincula mesmo a parte que não está onerada com a prova. A recusa da colaboração devida pela parte implica uma de duas consequências: se a parte recusar a sua própria colaboração, o Tribunal aprecia livremente, para efeitos probatórios, o valor desse comportamento (art. 519º/2 1ª parte CPC); se a violação de dever de colaboração resultar da circunstância de a parte ter culposamente tornado impossível a prova à contraparte onerada, o ónus da prova (art. 519º/2 in fine CPC; art. 344º/2 CC). Como o dever de colaboração pode recair sobre a parte que não está onerada com a prova do facto, esta inversão do ónus da prova pode implicar, com base na regra do non liquet (art. 516º CPC; art. 346º CC), o proferimento de uma

decisão de mérito contra a parte à qual não cabia inicialmente a demonstração do facto. O dever de cooperação da parte também encontra expressão na acção executiva: se o exequente tiver dificuldade em identificar ou localizar os bens penhoráveis do executado, o Tribunal pode determinar que este preste todas as informações indispensáveis à realização da penhora, sob a comunicação de ser considerado litigante de má fé (art. 837º-A/2 CPC). b) Posição das partes Existe um dever de cooperação das partes com o Tribunal, mas também há um idêntico dever de colaboração deste órgão com aquelas. Este dever desdobra-se, para esse órgão, em quatro deveres essenciais: 1) Um é o dever de esclarecimento, isto é, o dever de o Tribunal se esclarecer junto das partes quanto às dúvidas que tenha sobre as suas alegações, pedidos ou posições em juízo (art. 266º/2 CPC), de molde a evitar que a sua decisão tenha por base a falta de informação e não a verdade apurada; 2) Um outro é o dever de prevenção, ou seja, o dever de o Tribunal prevenir as partes sobre eventuais deficiências ou insuficiências das suas alegações ou pedidos (art. 508º/1-b, 508º-A/1-c, 690º/4 e 701º/1 CPC); 3) O Tribunal tem também o dever de consultar as partes, sempre que pretenda conhecer de matéria de facto ou de direito sobre a qual aquelas não tenham tido a possibilidade de se pronunciarem (art. 3º/3 CPC), porque, por exemplo, o Tribunal enquadra juridicamente a situação de forma diferente daquela que é a perspectiva das partes ou porque esse órgão pretende conhecer oficiosamente certo facto relevante para a decisão da causa; 4) Finalmente, o Tribunal tem o dever de auxiliar as partes na remoção das dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades ou no cumprimento de ónus ou deveres processuais (art. 266º/4 CPC). O dever de esclarecimento implica um dever recíproco do Tribunal perante as partes e destas perante aquele órgão: o Tribunal tem o dever de se esclarecer junto das partes e estas têm o dever de o esclarecer (art. 266º-A CPC). Encontra-se consagrado, quanto ao primeiro aspecto, no art. 266º/2 CPC: o juiz pode, em qualquer altura do processo, ouvir qualquer das partes, seus representantes ou mandatários judiciais, convidando-os a fornecer os esclarecimentos sobre a matéria de facto ou de direito que se afigurem pertinentes e dando-se conhecimento à outra parte dos resultados da diligência. O segundo dos referidos aspectos (dever de esclarecimento do Tribunal pelas partes) está previsto no art. 266º/3 CPC: as pessoas às quais o juiz solicita o esclarecimento são obrigadas a comparecer e a prestar os esclarecimentos que lhe forem pedidos, salvo se tiverem uma causa legítima para recusar a colaboração requerida. Deve considerar-se legítima a recusa baseada em qualquer das circunstâncias referidas no art. 519º/3 CPC. O dever de prevenção, é um dever do Tribunal perante as partes com uma finalidade assistencial, pelo que não implica qualquer dever recíproco das partes perante o Tribunal. O dever de prevenção tem uma consagração no convite ao aperfeiçoamento pelas partes dos seus articulados (arts. 508º/1-b, e 508º-A/1-c CPC) ou das conclusões das suas alegações de recurso (arts. 690º/4, e 701º/1 CPC). Aquele primeiro convite deve ser promovido pelo Tribunal sempre que o articulado enferme de irregularidades (art. 508º/2 CPC)

ou mostre insuficiências ou imprecisões na matéria de facto alegada (art. 508º/3 CPC). Mas o dever de prevenção têm um âmbito mais amplo: ele vale genericamente para todas as situações em que o êxito da acção a favor de qualquer das partes possa ser frustrado pelo uso inadequado do processo. São quatro as áreas fundamentais em que a chamada de atenção decorrente do dever de prevenção se justifica: a explicitação de pedidos pouco claros, o carácter lacunar da exposição dos factos relevantes, a necessidade de adequar o pedido formulado à situação concreta e a sugestão de uma certa actuação. O dever de consulta, é um dever de carácter assistencial do Tribunal perante as partes. Este dever encontra-se estabelecido no art. 3º/3 CPC: salvo no caso de manifesta desnecessidade, o Tribunal não pode decidir uma questão de direito ou de facto, mesmo que seja de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de se pronunciarem sobre ela. O escopo deste preceito é evitar as chamadas “decisões surpresa”, isto é, as decisões proferidas sobre matéria de conhecimento oficioso sem a sua prévia discussão pelas partes. O dever de auxílio, o Tribunal tem o dever de auxiliar as partes na supressão das eventuais dificuldades que impeçam o exercício de direitos ou faculdades ou o cumprimento de ónus ou deveres processuais. O princípio da cooperação determina, a imposição ao Tribunal, além de um dever de auxílio, dos deveres de esclarecimento, de prevenção e de consulta. Coloca-se então a questão de saber quais as consequências que resultam da omissão pelo Tribunal de qualquer destes deveres. O problema é particularmente complexo, porque a previsão destes deveres nem sempre é uma situação completamente definida por lei, antes faz apelo, em muitos casos, a uma ponderação do Tribunal. Alguns desses deveres de cooperação assentam numa previsão “fechada”, que não deixa ao Tribunal qualquer margem de apreciação quanto à sua verificação; outros, pelo contrário, decorrem de uma previsão “aberta”, que necessita de ser preenchida pelo Tribunal de acordo com a sua ponderação. Esta distinção é importante quanto aos efeitos do não cumprimento dos referidos deveres. Se o dever for estabelecido por uma revisão “fechada” – isto é, se a situação em que ele tem de ser observado não deixar ao Tribunal qualquer margem de apreciação –, a sua omissão constitui uma nulidade processual, se, como em regra sucederá, essa irregularidade puder influir ou exame ou decisão da causa (art. 201º/1 CPC). A violação do dever de cooperação pela parte constitui, quando seja grave, uma das situações que a lei tipifica com má fé processual (art. 456º/2-c CPC). Aquela gravidade da omissão do dever de cooperação pressupõe o dolo ou a negligência grave da parte (art. 456º/2 proémio CPC).

12. Objecto do processo O processo civil é regido, quanto à relevância da vontade das partes, pelo princípio dispositivo e da disponibilidade privada: aquele primeiro assegura a autonomia das partes na definição dos fins que elas procuram obter através da acção pendente; este último determina o domínio das partes sobre os factos a alegar e os meios de prova a utilizar para conseguir aqueles objectivos. Pode dizer-se que o princípio dispositivo representa a autonomia na definição dos fins prosseguidos no processo e que o princípio da disponibilidade objectiva assegura o domínio das partes sobre os meios de os alcançar. O âmbito dos poderes do Tribunal e das partes relativamente à matéria de facto relevante para a apreciação da causa constitui um dos aspectos essenciais de qualquer regime processual. a) Factos relevantes: Como resulta do estabelecido no art. 264º CPC, a solução legal baseia-se numa distinção, talvez demasiado esquemática, entre factos essenciais, instrumentais e complementares ou concretizadores: Os factos essenciais: são aqueles que integram a causa de pedir ou o fundamento da excepção e cuja falta determina a inviabilidade da acção ou da excepção; Os factos instrumentais, probatórios ou acessórios: são aqueles que indicam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos; Os factos complementares ou concretizadores: são aqueles cuja falta não constitui motivo de inviabilidade da acção ou da excepção complexa e que, por isso, são indispensáveis à procedência dessa acção ou excepção. A cada um destes factos corresponde uma função distinta: Os factos essenciais realizam uma função constitutiva do direito invocado pelo autor ou da excepção deduzida pelo réu: sem eles não se encontra individualizado esse direito ou excepção, pelo qual a falta da sua alegação pelo autor determina a ineptidão inicial por inexistência de causa a pedir (art. 193º/2-a CPC); Os factos complementares possibilitam, em conjugação com os factos essenciais de que são complemento, a procedência da acção ou da excepção: sem eles a acção era julgada improcedente; Os factos instrumentais destinam-se a ser utilizados numa função probatória dos factos essenciais ou complementares. Importa acentuar que esta classificação não assenta num critério absoluto, mas relativo: um mesmo facto pode ser essencial em relação a um certo objecto e complementar ou instrumental perante outro objecto; por seu turno, um facto é sempre complementar ou instrumental em relação a um certo facto essencial. · Factos principais: A procedência da acção ou da execução pressupõe certos factos: os factos necessários a essa procedência podem ser designados por factos principais. Estes factos englobam, na terminologia do art. 264º CPC, os factos essenciais e os factos complementares, cuja distinção se traça do seguinte modo: os

factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na acção ou na excepção; os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa acção ou excepção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte. Os factos essenciais são necessários à identificação da situação jurídica invocada pela parte e, por isso, relevam, desde logo, na viabilidade da acção ou da excepção. · Factos instrumentais: São utilizados para realizar a prova indiciária dos factos principiais, isto é, esses factos são aqueles de cuja a prova se pode inferir a demonstração dos correspondentes factos principais. Portanto, o âmbito de aplicação dos factos instrumentais coincide com a prova indiciária, pelo que esses factos não possuem qualquer relevância na prova histórica ou representativa. As presunções judiciais são aquelas em que a inferência do facto presumido assenta em regras de experiência, isto é, são aquelas em que o Tribunal deduz, com base nessas regras, o facto presumido. Podem ser qualificados como factos instrumentais aqueles que constituem a base das presunções judiciais, ou seja, aqueles que permitem inferir, através de regras de experiência, o facto principal constante da base instrutória (arts. 508º-A/1-e, e 508º-B/2 CPC). b) Disponibilidade e oficiosidade: Factos principais: Assente a distinção entre factos essenciais, complementares e instrumentais, o regime legal é o seguinte: · Incumbe às partes alegar os factos essenciais que integram a causa de pedir ou que fundamentam a excepção (art. 264º/1 CPC); · O Tribunal pode considerar os factos complementares que resultem da instrução e discussão da causa, desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado, quanto a eles, o exercício do contraditório (art. 264º/3 CPC); · O Tribunal pode considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais que resultem da instrução e julgamento da causa (art. 264º/2 CPC). Deste enunciado resulta claramente que a disponibilidade objectiva vale quanto aos factos essenciais e aos factos complementares, pois que o Tribunal não os pode considerar, quanto àqueles primeiros, se eles não forem alegados pelas partes e, quanto a estes últimos, se a parte interessada não manifestar vontade de se aproveitar deles. Portanto, os factos principais estão sujeitos à disponibilidade das partes. Factos instrumentais: Há que reconhecer que não é totalmente claro o âmbito dos poderes que são conhecidos ao Tribunal pelo art. 264º/2 CPC. É certo que este preceito estipula que o Tribunal pode considerar oficiosamente os factos instrumentais; mas isto pode significar que, se os factos surgirem na instrução e discussão da causa, o Tribunal pode considerá-los na sua decisão ainda que nenhuma das partes o requeira, como querer dizer que o Tribunal pode promover, por iniciativa própria, a investigação desses factos durante a instrução e discussão da causa. A favor do reconhecimento de poderes inquisitórios do Tribunal sobre os factos instrumentais pode invocar-se, antes de mais, a comparação entre os

ns.º 2 e 3 do art. 264º CPC: neste último concede-se ao Tribunal o poder de considerar os factos complementares, mas sujeita-se esse poder à condição de a parte interessada desejar o seu aproveitamento na acção pendente; naquele primeiro, atribui-se ao Tribunal o poder de considerar os factos instrumentais e não se submete o uso desse poder a qualquer condição. É, no entanto, na conjugação entre os arts. 264º/2 e 265º/3 CPC, que se encontra o apoio mais firme para entender que o Tribunal possui poderes inquisitórios sobre os factos instrumentais. Os factos sobre os quais o Tribunal pode exercer estes poderes inquisitórios com a finalidade de apurar a verdade ou de obter a justa composição do litígio são precisamente os factos instrumentais. Factos instrutórios: O art. 265º/3 CPC, dispõe que incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer. Os factos sobre os quais o Tribunal possui poderes instrutórios são não só os factos instrumentais alegados pelas partes ou investigados pelo Tribunal, como os factos principais alegados pelas partes. Da conjugação entre os poderes inquisitórios atribuídos pelo art. 264º/2 CPC, e os poderes instrutórios estabelecidos no art. 265º/3 CPC, resulta o seguinte regime legal: os poderes inquisitórios respeitam exclusivamente aos factos instrumentais (art. 264º/2 CPC); os poderes de instrução referem-se tanto aos factos principais, como aos factos instrumentais, o Tribunal pode não só investigá-los, com ordenar quanto a eles as actividades instrutórias que sejam da sua iniciativa; pelo contrário, quanto aos factos principais, o Tribunal não possui poderes inquisitórios, pelo que, relativamente a eles, só pode ordenar as actividades oficiosas de instrução legalmente permitidas. c) Ónus de alegação: Segundo o estabelecido no art. 264º/1 CPC, cabe às partes alegar os factos que integram a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções: estes factos devem ser alegados nos articulados das partes (arts. 467º/1-c, 489º/1, 502º/1, 503º/1, 785º, 793º e 794º/1 CPC). Todavia, o art. 264º/1 CPC, não abarca a totalidade do ónus de alegações que deve ser cumprido nos articulados. Este ónus não se restringe à indicação da causa de pedir ou do fundamento da excepção, ou seja, aos factos essenciais: ele recai sobre todos os factos necessários à procedência da acção ou da excepção, ou seja, sobre os factos principais. Portanto, o art. 264º/1 CPC, refere-se apenas a uma fracção do ónus de alegação que as partes devem cumprir nos seus articulados. Ao contrário dos factos principais – que são submetidos ao ónus de alegação nos articulados –, os factos instrumentais destinam-se a ser utilizados numa função probatória e, por essa razão, não estão sujeitos a esse ónus. Os factos instrumentais não estão submetidos a qualquer ónus de alegação nos articulados. Aliás, como a alegação dos factos instrumentais é uma actividade instrutória, esses factos, mesmo que sejam invocados nos articulados, podem sempre ser alterados enquanto for possível requerer os meios de prova (arts. 508º-A/2-a, 512º/1 e 787º CPC) ou alterar ou aditar o rol de testemunhas (arts. 512º-A/1 e 787º CPC). Portanto, mesmo que a parte invoque um facto instrumental no seu articulado, ela não está impedida de usar qualquer outro facto na demonstração do respectivo facto principal.

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Preclusão: A distinção entre factos essenciais, complementares e instrumentais é relevante quanto a vários aspectos do tratamento da matéria de facto em processo. É o que sucede quanto ao regime da sua preclusão: o art. 264º/2 CPC, mostra que podem ser considerados factos instrumentais não alegados e, quanto aos factos complementares, é nítido que não existe em relação a eles qualquer preclusão quando não sejam alegados nos articulados, precisamente porque o art. 264º/3 CPC, permite a sua consideração quando eles só sejam adquiridos durante a instrução e discussão da causa. Os factos essenciais devem ser invocados nos articulados (art. 264º/1 CPC), mas importa referir que a sua omissão não implica necessariamente a preclusão da sua alegação posterior. Mais discutível é saber se a alegação de um facto essencial depois dos articulados é possível mesmo que a parte tenha agido de má fé, ou seja, ainda que a omissão da invocação desse facto tenha resultado de negligência grave ou dolo da parte (art. 456º/2-b CPC). Parece impor-se uma resposta negativa da questão, dado o disposto no lugar paralelo da alegação dos factos supervenientes. Com efeito, se esses factos podem ser considerados se a sua alegação não atempada não for culposa (art. 506º/4 CPC), isto é, se, quanto a esses factos, só se admite uma invocação extemporânea desde que ela não seja culposa, o mesmo há que concluir, por maioria de razão, quanto aos factos essenciais. Assim, a alegação destes factos fora dos articulados só deve ser aceite quando a parte não tenha agido com negligência grave ou dolo. Portanto, a má fé da parte na omissão do facto essencial nos seus articulados tem como consequência, além da sua condenação no pagamento de uma multa e de uma indemnização à contraparte (art. 456º/1 CPC), a inadmissibilidade da sua alegação posterior do facto. Neste caso, verifica-se uma preclusão decorrente da má fé processual. O art. 264º/3 CPC, demonstra que os factos complementares podem ser adquiridos durante a instrução e discussão da causa, pelo que a omissão da alegação desses factos nos articulados não implica qualquer preclusão. Importa acentuar, no entanto, que o art. 264º/3 CPC, não concede qualquer opção quanto ao momento da alegação desses factos, mas apenas a oportunidade de sanar uma insuficiência na alegação da matéria de facto que só foi detectada na instrução e discussão da causa. Relativamente aos factos instrumentais, o problema da preclusão equaciona-se de modo diverso. Estes factos não são nem constitutivos da situação jurídica alegada pela parte, nem indispensáveis à procedência da acção ou da excepção. A sua função é apenas a de servir de prova indiciária dos factos principais, pelo que o momento da sua relevância processual não é o da alegação da matéria de facto, mas o da apresentação ou requerimento dos meios de prova: é neste momento que devem ser invocados os factos instrumentais que se pretende demonstrar com esses meios de prova (arts. 552º/2, 577º/1, 612º, 633º e 789º CPC). Portanto, a preclusão da sua alegação só ocorre quando não for possível indicar ou requerer os meios de prova (quanto ao processo ordinário e sumário, arts. 508º-A/2-a, 512º/1 e 787º CPC) ou alterar os que anteriormente foram apresentados ou requeridos (quanto aos mesmos processos, arts. 512º-A/1 e 787º CPC).

13. Prevalência da decisão de mérito O art. 265º/2 CPC, estabelece que o juiz providenciará, mesmo oficiosamente, pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância ou, quando estiver em causa alguma modificação subjectiva da instância, convidando as partes a praticá-los. Esta sanação oficiosa das excepções dilatórias visa diminuir, tanto quanto possível, os casos de absolvição da instância e favorecer, sempre que isso seja viável, a apreciação do mérito. Segundo a doutrina tradicional, os pressupostos processuais devem ser apreciados antes do julgamento do mérito da causa. Ou seja, segundo esta orientação nunca é possível o proferimento de uma decisão de mérito antes da averiguação do preenchimento de todos os pressupostos processuais. Essa posição redunda, assim, num dogma da prioridade da apreciação dos pressupostos processuais. Na valoração crítica deste dogma devem ser consideradas duas situações. Uma primeira refere-se aos casos em que o Tribunal, no momento em que conclui pelo não preenchimento de um pressuposto processual, ainda não pode proferir qualquer decisão sobre o mérito da causa por falta de elementos suficientes. Uma segunda situação engloba aquelas hipóteses em que o Tribunal, no próprio momento em que aprecia a falta de um pressuposto processual, está em condições de julgar a acção procedente ou improcedente. Em geral, os pressupostos processuais podem realizar uma de duas funções: esses pressupostos podem destinar-se quer a assegurar o interesse público da boa administração da justiça, quer a garantir o interesse público na boa administração de uma tutela adequada e útil. A generalidade dos pressupostos processuais visa acautelar os interesses das partes, ou seja, assegurar que a parte possa defender convenientemente os seus interesses em juízo e não seja indevidamente incomodada com a propositura de acções inúteis ou destituídas de objecto. É para estas situações que o art. 288º/3, 2ª parte CPC, estipula que, ainda que a excepção dilatória subsista, não deverá ser proferida a absolvição da instância quando, destinando-se o pressuposto em falta a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste, no momento da sua apreciação, a que se conheça do mérito da causa e a decisão possa ser integralmente favorável a essa parte. Segundo o disposto no art. 288º/3 (as excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada, nos termos do n.º 2 do artigo 265.º; ainda que subsistam, não terá lugar a absolvição da instância quando, destinando-se a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste, no momento da apreciação da excepção, a que se conheça do mérito da causa e a decisão deva ser integralmente favorável a essa parte) CPC, o Tribunal pode pronunciar-se sobre o mérito da causa, ainda que se verifique uma excepção dilatória sanável ou não sanável. A aplicação do art. 288º/3, 2ª parte CPC, pressupõe uma distinção entre pressupostos processuais dispensáveis e não dispensáveis. O art. 288º/3 CPC, refere-se aos pressupostos processuais e às excepções dilatórias, pelo que se pode perguntar se um idêntico regime deve valer quanto aos pressupostos de actos processuais. A resposta deve ser negativa, porque a consequência da falta do

pressuposto do acto processual é a ineficácia do acto e o Tribunal nunca pode decidir como se o acto não fosse ineficaz.

O REGIME DO DIREITO PORTUGUÊS SOBRE A COMPETÊNCIA INTERNACIONAL LEGAL 14. Função As facilidades de deslocação de pessoas, bens e capitais potenciam o surgimento de litígios que apresentam, através quer das partes interessadas, quer do seu próprio objecto, conexões com várias ordens jurídicas. Quando emerge um desses litígios plurilocalizados, coloca-se o problema de determinar qual o Tribunal que, no âmbito das várias ordens jurídicas envolvidas, tem competência para o dirimir. Esta selecção incumbe às regras sobre a competência internacional directa, às quais cabe determinar, em cada uma das jurisdições com as quais o litígio tem contacto, se os Tribunais de alguma delas são competentes para resolver o conflito. Essas regras são, por isso, verdadeiras normas de conflitos, semelhantes na função que desempenham às regras próprias do Direito Internacional Privado. As regras relativas à competência internacional utilizam certos elementos de conexão para determinar a jurisdição nacional competente. Esses elementos podem ser, por exemplo, o domicílio de uma das partes, o lugar de cumprimento da obrigação ou o da ocorrência do facto ilícito. Coloca-se então o problema de saber como se procede à qualificação desses elementos de conexão, sendo duas as orientações possíveis: de acordo com uma delas, esses elementos são qualificados pela lex cause, ou seja, por uma lei que é determinada pelas normas de conflitos de foro. As regras sobre competência internacional não são, consideradas em si mesmas, normas de competência, porque não se destinam a aferir qual o Tribunal concretamente para apreciar o litígio, mas apenas a definir a jurisdição na qual se determinará, então com o recurso a verdadeiras regras de competência, qual o Tribunal competente para essa apreciação. Dada esta função, as normas de competência internacional podem ser designadas por normas de recepção, pois que visam somente facultar o julgamento de um certo litígio plurilocalizado pelos Tribunais de uma jurisdição nacional. É esta a estrutura da generalidade dos critérios que constam do art. 65º/1 CPC, e de muitas das regras contidas nos arts. 2º a 24º Convenção de Bruxelas e da Convenção de Lugano. 15. Limites Para orientar a escolha da jurisdição competente para resolver o conflito plurilocalizado não existem na comunidade internacional regras fixas e, menos ainda, uniformes. Apenas se pode esperar que, cada Estado actue de tal forma que os critérios definidores da sua competência internacional possam valer simultaneamente como princípios de uma legislação universal. Quer isto dizer que cada Estado pode determinar quais os elementos de conexão que considera relevantes para abrir a sua jurisdição ao julgamento de litígios plurilocalizados. Esses elementos podem ser escolhidos pela lei do Estado, mas também é frequente que se reconheça relevância à vontade das partes

nesta matéria: é esse o caso da competência internacional convencional (art. 99; art. 17º Convenção de Bruxelas e da Convenção de Lugano).

QUESTÕES RELATIVAS À COMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO 16. Normas de recepção As normas de competência internacional servem-se de alguns elementos de conexão com a ordem jurídica nacional para atribuir competência aos Tribunais do foro para o conhecimento de uma certa questão. As normas de conflitos que definem as condições em que os Tribunais do foro são competentes para a apreciação de um objecto que apresenta uma conexão com várias ordens jurídicas podem designar-se por normas de recepção. É essa a função dos vários critérios enunciados no art. 65º/1 CPC (A competência internacional dos tribunais portugueses depende da verificação de alguma das seguintes circunstâncias: a) Ter o réu ou algum dos réus domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro; b) Dever a acção ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; c) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na acção, ou algum dos factos que a integram; d) Não poder o direito invocado tornar-se efectivo senão por meio de acção proposta em território português, ou não ser exigível ao autor a sua propositura no estrangeiro, desde que entre o objecto do litígio e a ordem jurídica nacional haja algum elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real). Estas normas de recepção definem a competência internacional dos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Elas decorrem tanto da regra segundo a qual, quando, o caso em apreciação apresenta uma conexão relevante com uma ordem jurídica, os seus Tribunais devem ser competentes para a acção, como do princípio de que, perante a existência de uma tal conexão, os

Tribunais daquela ordem devem recusar a competência internacional, pois que isso pode equivaler a uma denegação de justiça. Note-se que a conexão com uma certa ordem jurídica pode ser mais fraca do que aquela que determina a aplicação do direito nacional ao caso sub iudice, porque não há qualquer paralelismo necessário entre a atribuição da competência internacional e a aplicação da lei material do foro. A diferença entre a competência interna e a internacional consiste no seguinte: a competência interna respeita às situações que, na perspectiva da ordem jurídica portuguesa, não possuem qualquer conexão relevante com outras ordens jurídicas; a competência internacional refere-se aos casos que apresentam uma conexão com outras ordens jurídicas. As normas de recepção só determinam, através da referida conexão, que os Tribunais de uma jurisdição nacional são competentes para apreciar uma relação plurilocalizada. Essas normas não são normas de competência, porque não a atribuem a um Tribunal, antes se limitam a determinar as condições em que uma jurisdição nacional faculta os seus Tribunais para a resolução de um certo litígio com elementos internacionais. As normas de recepção preenchem, no âmbito processual, uma função paralela àquela que as normas de conflitos realizam no âmbito substantivo: estas determinam qual a lei aplicável a uma relação jurídica plurilocalizada (se a lei do foro ou uma lei estrangeira); aquelas aferem se essa mesma relação pode ser apreciada pelos Tribunais de uma certa ordem jurídica. a) Necessidade: Nem sempre a circunstância de a questão em apreciação se situar no âmbito da competência internacional (porque o objecto em apreciação é uma relação jurídica plurilocalizada) implica a utilização dos critérios específicos da competência internacional para a atribuição de competência aos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Para que haja necessidade de aferir a competência internacional dos Tribunais de um certo Estado, é indispensável que se verifique um de dois factores: que a conexão com a ordem jurídica nacional seja estabelecida através de um elemento que não é considerado relevante por nenhuma das normas da competência territorial e que, portanto, não possa ser atribuída competência aos Tribunais de um certo Estado utilizando exclusivamente as regras de competência territorial dos seus Tribunais; ou que o Estado do foro esteja vinculado, por convenção internacional, a certas regras de competência internacional. b) Unilateralidade: As normas de recepção funcionam unilateralmente. Isto significa que essas normas se limitam a facultar os Tribunais de uma jurisdição para a resolução de uma certa questão. Ou seja, essas normas atribuem competência aos Tribunais de uma ordem jurídica para a resolução de um certo litígio, mas não excluem a apreciação dessa mesma questão por um Tribunal estrangeiro. c) Previsão: Quando a acção apresenta uma conexão objectiva, relativa ao objecto do processo, ou subjectiva, referida às partes em causa, com uma ou várias ordens jurídicas estrangeiras, pode ser necessário determinar a competência internacional dos Tribunais portugueses. Essa aferição deve restringir-se às situações em que os Tribunais portugueses não são competentes segundo as regras da competência interna, pois que, como se verificou, só importa averiguar a competência internacional quando os Tribunais de uma certa ordem

jurídica não sejam competentes para apreciar uma relação jurídica plurilocalizada segundo as suas regras de competência territorial. Essa é a função dos critérios constantes do art. 65º/1 CPC. A competência legal internacional dos Tribunais portugueses é determinada, segundo uma ordem decrescente de aplicação pratica, pelos critérios da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), do domicílio do réu (art. 65º/1-a CPC), da causalidade (art. 65º/1-c CPC) e a necessidade (art. 65º/1-d CPC). 17. Critério da exclusividade Segundo o critério da exclusividade, a acção deve ser proposta em Portugal quando os Tribunais portugueses sejam exclusivamente competentes para a apreciação da causa (arts. 65º/1-b, 65º-A CPC). A competência internacional resulta, assim, da coincidência com as regras de competência exclusiva constantes do art. 65º-A CPC. Esta competência exclusiva é manifestação da protecção de determinados interesses através de uma reserva de jurisdição e, portanto, de soberania. Nesse sentido, ela é semelhante à reserva de ordem pública do Estado do reconhecimento no processo de revisão de sentenças estrangeiras (art. 1096º-f CPC). O art. 65º-A estabelece a competência exclusiva dos Tribunais portugueses para as seguintes situações: a) No caso de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre bens imóveis sitos em território português; b) Para os processos especiais de recuperação da empresa e de falência, relativamente a pessoas domiciliadas em Portugal ou a pessoas colectivas ou sociedades cuja sede esteja situada em território português; c) Para as acções referentes à apreciação da validade do acto constitutivo ou ao decretamento da dissolução de pessoas colectivas ou sociedades que tenham a sua sede em território português, bem como para as destinadas a apreciar a validade das deliberações dos respectivos órgãos; d) Para as acções que tenham como objecto principal a apreciação da validade da inscrição em registos públicos de quaisquer direitos sujeitos a registo em Portugal. A relevância prática da competência exclusiva dos Tribunais portugueses reside no seguinte: como, nessa hipótese, a jurisdição portuguesa não aceita a competência de nenhuma outra jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição estrangeira pode preencher as condições para ser ou se tornar eficaz na ordem jurídica portuguesa. Uma sentença proferida por um Tribunal estrangeiro não é, em princípio, imediatamente eficaz na ordem jurídica portuguesa; para que se lhe conceda essa eficácia é necessária a sua revisão e confirmação, nos termos e nas condições do correspondente processo de revisão de sentenças estrangeiras (arts. 1094º a 1102º CPC). Ora, do elenco dos requisitos enunciados pelo art. 1096º CPC, para a concessão do exequatur à sentença estrangeira consta que essa decisão só pode ser confirmada pelo Tribunal português (que é uma das Relações, art. 1095º CPC) se provier de Tribunal seja competência não ofenda a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 1096º-c CPC in fine). 18. Critério do domicílio do réu

Segundo o critério do domicílio do réu, a acção pode ser proposta nos Tribunais portugueses quando o réu ou algum dos réus tenha domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro (art. 65º/1-a CPC). Como a competência internacional só deve ser apreciada se da aplicação das regras da competência territorial não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, o critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser aplicado quando os Tribunais portugueses não forem competentes segundo aquelas regras. Os critérios territoriais podem ser especiais (arts. 73º a 84º e 89º CPC) ou gerais (arts. 85º a 87º CPC): o critério geral é o domicílio do demandado (arts. 85º/1, 86º/2 CPC) ou dos demandados (art. 87º/1 CPC). Assim, se à acção for aplicável o critério territorial geral e se da sua aplicação resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, está determinado, sem necessidade de aplicação do critério do domicílio do réu, o Tribunal que é territorial e internacionalmente competente. Se, pelo contrário, a aplicação desse critério de competência interna não a conceder a um Tribunal português (porque o réu não tem domicílio em Portugal), essa competência também nunca poderá resultar do critério de competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). Quando a causa se inclui no âmbito do critério territorial geral, a competência internacional nunca pode ser determinada pelo critério do domicílio do demandado, seja porque aplicação daquele critério territorial torna dispensável a aferição da competência internacional, seja porque, quando é impossível empregar o critério territorial, também é impossível aplicar aquele critério de competência internacional. Se o objecto da acção fizer funcionar um dos critérios territoriais especiais, também aqui são viáveis duas situações. Se da aplicação de um desses critérios resulta a atribuição de competência a um Tribunal português, não importa averiguar a competência internacional deste Tribunal segundo nenhum dos critérios enunciados no art. 65º/1 CPC. Se, pelo contrário, à situação concreta for aplicável um critério especial, mas da sua aplicação não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, justifica-se aferir a competência internacional dos Tribunais portugueses pelo critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). O critério da competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) nunca é aplicável quando o seja o critério territorial de domicílio do réu e também não pode ser aplicado quando um critério territorial especial atribua competência a um Tribunal português. Em conclusão: o critério de domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português. A competência exclusiva que o art. 65º/1-a CPC, estabelece como limite à determinação da competência segundo o critério do domicílio do demandado não pode operar no âmbito de aplicação material das Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano: nesta situação, a única competência exclusiva relevante é aquela que se encontra definida no art. 16º Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O art. 65º/2 CPC, estabelece que, para efeitos da aplicação do critério do domicílio do demandado, considera-se domiciliada em Portugal a pessoa

colectiva cuja a sede estatutária ou efectiva se localize em território português ou que aqui tenha sucursal, agência, filial ou delegação. 19. Critério da causalidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando o facto que integra a causa de pedir, ou algum dos factos que a constituem, tiver sido praticado em território português (art. 65º/1-c CPC). Assim, por exemplo, os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando, apesar de o facto ilícito ter ocorrido no estrangeiro, parte dos danos se produziram em Portugal (RC – 23/10/1990, CJ 90/4, 83) ou o contrato de seguro foi celebrado em território português (Assentos/Supremo Tribunal de Justiça 6/94, 30/3 = BMJ 434, 61). 20. Critério da necessidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando uma situação jurídica, que apresenta uma ponderosa conexão, pessoal ou real, com o território português, só possa ser reconhecida em acção proposta nos Tribunais nacionais (art. 65º/1-d CPC). Com esse critério procura-se obstar à denegação de justiça decorrente da impossibilidade de encontrar um Tribunal competente para a apreciação da acção: verifica-se então um reenvio da competência aos Tribunais portugueses. O critério da necessidade abarca não só a impossibilidade jurídica, por inexistência de Tribunal competente para dirimir o litígio em face das regras de competência internacional das diversas ordens jurídicas com as quais ele apresenta uma conexão relevante, mas também a impossibilidade prática, derivada de factos anómalos impeditivos do funcionamento da jurisdição competente. 21. Tribunal territorialmente competente Para analisar qual é o Tribunal territorialmente competente quando os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes segundo o critério da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), há que considerar cada uma das situações previstas no art. 65º-A. Exceptua-se desta análise a hipóteses prevista no art. 65º-A-a CPC, porque, ela é sempre afastada pelo regime constante do art. 16º/1 Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só é susceptível de ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial (arts. 73º a 84º e 89º CPC) e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português. Se os Tribunais portugueses forem internacionalmente competentes pelo critério da causalidade ou da necessidade, também há que averiguar qual dos Tribunais portugueses é o territorialmente competente. Para a determinação deste Tribunal só podem ser utilizados critérios aos quais não possa ser concedida a dupla funcionalidade característica das normas sobre a competência territorial, porque, de outro modo, a competência internacional dos Tribunais portugueses já teria decorrido dessa competência territorial. Está nessas condições o art. 85º/3 (Se o réu tiver o domicílio e a residência em país estrangeiro, será demandado no tribunal do lugar em que se encontrar; não se encontrando em território português, será demandado no do domicílio do autor,

e, quando este domicílio for em país estrangeiro, será competente para a causa o tribunal de Lisboa) CPC. Assim, se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro mas se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do local em que se encontrar em Portugal (art. 85º/3, 1ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do domicílio do autor (art. 85º/3, 2ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português e se o autor também tiver domicílio em território estrangeiro, é territorialmente competente o Tribunal de Lisboa (art. 85º/3 in fine CPC).

COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO 22. Pactos de competência A competência interna é determinada através de um pacto de competência (pactum de foro prorrogando). Em regra, o pacto de competência refere-se a uma questão que não apresenta qualquer conexão com outras ordens jurídicas, mas isto não significa que não haja pactos de competência referidos a relações jurídicas plurilocalizadas. O pacto de competência só pode incidir sobre a competência em razão do valor e do território (art. 100º/1 CPC). O pacto de competência só é válido se acompanhar a forma de contrato substantivo, se este for normal, ou se tiver a forma escrita, se aquele for consensual (art. 100º/2 CPC). Mas considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documentos assinados pelas partes ou o resultante de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido (arts. 110º/2, 1ª parte, e 99º/4 CPC). Além disso, o pacto de competência deve designar as questões submetidas à apreciação do Tribunal e o critério de determinação do Tribunal ao qual é atribuída a competência (art. 100º/2, 2ª parte CPC). O pacto de competência contém implicitamente uma renúncia antecipada – isto é, anterior à propositura da acção – à arguição da excepção de incompetência relativa (art. 108º CPC), pois que é atribuída competência territorial a um Tribunal que, sem esse contrato processual, não seria competente. Essa renúncia exige, como requisito ad substantiam, a forma escrita (art. 100º/2, 1ª parte CPC), pois que condiciona as possibilidades de defesa do réu na acção proposta naquele Tribunal e, concretamente, exclui a invocação da excepção de incompetência relativa. A competência convencional interna é vinculada para as partes (art. 100º/3 CPC), pelo que a sua infracção determina a incompetência relativa do Tribunal onde a acção foi indevidamente proposta (art. 108º CPC). 23. Pactos de jurisdição A competência convencional internacional pode ser determinada através de um pacto de jurisdição (art. 99º/1 CPC). Esse pacto pode ser, quando considerado pela perspectiva da ordem jurídica portuguesa, atributivo ou privativo. O pacto é atributivo, quando concede competência a um Tribunal ou a vários Tribunais portugueses; a competência atribuída pode ser concorrente ou exclusiva. O pacto é privativo, quando retira competência a um ou a vários Tribunais portugueses e a atribui em exclusivo a um ou vários Tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Como o carácter atributivo ou privativo do pacto de jurisdição é definido em relação à ordem jurídica portuguesa, a validade de um desses pactos não é vinculativa para os Tribunais de ordens jurídicas estrangeiras.

O pacto de jurisdição só pode incidir sobre situações subjectivas disponíveis (art. 99º/3-a CPC). Esta condição é suficiente para possibilitar a celebração de um pacto de jurisdição sobre a generalidade das situações patrimoniais. O pacto de jurisdição só é válido se for justificado por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que, neste último caso, não envolva inconveniente grave para a outra (art. 99º/3-c CPC). Este requisito destina-se essencialmente a salvaguardar a posição da parte mais fraca. O pacto de jurisdição não pode ofender a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-a CPC); sobre esta competência, art. 65º-A CPC, isto é, o pacto não pode privar os Tribunais portugueses da sua competência exclusiva. Se as partes, através de uma convenção de arbitragem (art. 1º Lei da Arbitragem Voluntária – lei 31/86, de 29/8), atribuírem competência para o julgamento de certo litígio ou questão emergente de uma relação jurídica plurilocalizada a um Tribunal Arbitral (funcionando em território português ou no estrangeiro), é igualmente aplicável a esse negócio o requisito respeitante à observância da competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-d CPC). O pacto deve mencionar expressamente a jurisdição competente (art. 99º/3-e in fine CPC). A designação do Tribunal competente (pertencente à ordem jurídica de uma das partes, de ambas ou de nenhuma delas) pode ser feita directamente: nesta eventualidade, as partes indicam um Tribunal específico. Mas essa indicação também pode ser realizada indirectamente através de uma remissão para o Tribunal que for competente segundo as regras de competência vigentes na jurisdição designada: nessa hipótese, as partes designam globalmente os Tribunais de uma jurisdição. O pacto de jurisdição só é válido se constar de acordo escrito ou confirmado por escrito (art. 9º/3-c CPC). Para este efeito, considera-se reduzido a escrito o acordo que consta de documentos assinados pelas partes ou que resulta de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula que remeta para algum documento que o contenha (art. 99º/4 CPC). Como a incompetência absoluta decorrente da infracção das regras da competência internacional é uma excepção dilatória que o Tribunal aprecia oficiosamente (arts. 102º/1, 494º-a, 495º CPC), não é configurável a celebração tácita de um pacto atributivo de jurisdição pela preclusão da invocação daquela excepção num processo pendente. MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA 24. Enunciado A incompetência é a insusceptibilidade de um Tribunal apreciar determinada causa que decorre da circunstância de os critérios determinativos da competência não lhe concederem a medida de jurisdição suficiente para essa apreciação. Infere-se da lei a existência de três tipos de incompetência jurisdicional: a incompetência absoluta, a incompetência relativa e a preterição de Tribunal Arbitral.

25. Incompetência absoluta Segundo o disposto no art. 101º (A infracção das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional, salvo quando haja mera violação dum pacto privativo de jurisdição, determina a incompetência absoluta do tribunal) CPC, a incompetência absoluta provém da infracção das regras da competência internacional legal (arts. 65º e 65º-A CPC) e da competência interna material (arts. 66º, 67º CPC; art. 46º LOTJ – Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) e hierárquica (arts. 70º, 71º, 72º CPC). A incompetência absoluta referida no art. 101º CPC, é, naturalmente, apenas aquela que se verifica no âmbito do processo civil. A incompetência internacional resulta da impossibilidade de incluir a relação jurídica plurilocalizada na previsão de uma das normas de recepção do art. 65º. A incompetência hierárquica verifica-se se a acção é instaurada num Tribunal de 1ª instância quando o devia ter sido na Relação ou no Supremo, ou vice-versa. Finalmente, a incompetência material decorre da propositura no Tribunal comum de uma acção da competência dos Tribunais especiais ou da instauração de uma acção num Tribunal de competência especializada incompetente. A incompetência absoluta resultante da infracção da competência material decorrente da circunstância de a acção ter sido instaurada num Tribunal judicial quando o deveria ter sido perante um outro Tribunal judicial até ao despacho saneador ou, se este não tiver lugar, até ao início da audiência final (art. 102º/2 CPC). A incompetência material que resulta do facto de a acção ter sido proposta num Tribunal judicial quando o deveria ser num Tribunal não judicial pode ser arguida pelas partes e conhecida oficiosamente pelo Tribunal até ao trânsito em julgado da decisão de mérito (art. 102º/1 CPC). Se houver despacho de citação (art. 234º/4 CPC), a incompetência absoluta deve ser conhecida oficiosamente no despacho limiar (arts. 105º/1, 234º-A/1 CPC). O conhecimento oficioso da incompetência absoluta é realizado, em regra, no despacho saneador (arts. 510º/1-a, 494º-a CPC). O conhecimento da incompetência absoluta no momento do despacho de citação determina o indeferimento limiar da petição inicial (arts. 105º/1, 234ºA/1 CPC); se for apreciada em momento posterior, essa incompetência conduz à absolvição do réu da instância (arts. 105º/1, 288º/1-a, 494º-a, 493º/2 CPC). 26. Incompetência relativa O art. 108º (A infracção das regras de competência fundadas no valor da causa, na forma do processo aplicável, na divisão judicial do território ou decorrentes do estipulado nas convenções previstas nos artigos 99º e 100º, determina a incompetência relativa do tribunal) CPC, enuncia as situações que originam a incompetência relativa: esta incompetência resulta da infracção das regras da competência fundadas no valor da causa (art. 68º CPC; arts. 47º e 49 LOTJ), na forma do processo aplicável (art. 68º CPC; art. 48 LOTJ), na divisão judicial do território (arts. 73º a 95º CPC) ou decorrentes de um pacto de competência ou de jurisdição (arts. 99º e 100º CPC). Note-se que a violação das regras de competência territorial pode verificarse não só na competência interna, quando são infringidas as regras que

definem, de entre os vários Tribunais, qual o territorialmente competente, mas também na competência internacional. Perante os Tribunais portugueses apenas pode relevar, quanto à competência internacional directa, a infracção de um pacto privativo de jurisdição. Esta violação verifica-se quando, apesar de as partes terem estipulado a competência exclusiva de um Tribunal estrangeiro para apreciar certa questão, a acção vem a ser proposta num Tribunal português. Confirmando a disponibilidade das partes sobre a competência relativa (art. 100º CPC), a correspondente incompetência não é, em princípio, de conhecimento oficioso (art. 495º CPC). Neste caso, a incompetência pode ser arguida pelo réu no prazo de contestação (art. 109º/1; arts. 486º/1, 783º, 794º/1 CPC). O autor pode responder no articulado subsequente ou, não havendo lugar a este, em articulado próprio, a apresentar nos 10 dias seguintes à notificação da entrega do articulado do réu (art. 109º/2 CPC). Conjuntamente com a alegação da incompetência relativa, as partes devem apresentar as respectivas provas (art. 109º/3 CPC). Produzidas estas, o Tribunal decide qual é o Tribunal competente para a acção (art. 111º/1 CPC). São várias as situações em que a incompetência relativa é de conhecimento oficioso. É o que sucede, nos termos do art. 110º/1-a CPC, nas acções relativas a direitos reais sobre imóveis, a responsabilidade civil extracontratual e naquelas em que seja parte o juiz, seu cônjuge ou certas partes, nos processos de recuperação da empresa e de falência, nos procedimentos cautelares e diligências antecipadas, na determinação do Tribunal ad quem, bem como na acção executiva fundada em sentença proferida por Tribunais portugueses e nas acções executivas para a entrega de coisa certa ou por dívida com garantia real. A incompetência relativa também é de conhecimento oficioso quando decorra da infracção das regras da competência respeitantes à forma do processo ou do valor da causa (art. 110º/2 CPC), ou seja, do disposto nos arts. 48º e 49º LOTJ. Como a competência em razão do valor da causa (art. 49º LOTJ) se reflecte na competência do Tribunal de círculo (art. 81º LOTJ) e do Tribunal singular (art. 83º LOTJ), o art. 110º/2 (a incompetência em razão do valor da causa ou da forma de processo aplicável é sempre do conhecimento oficioso do tribunal, seja qual for a acção em que se suscite) CPC, engloba igualmente a violação da competência destes Tribunais. Finalmente, a incompetência relativa deve ser apreciada oficiosamente nos processos em que não se verifique a citação do demandado ou requerido (art. 110º/1-b CPC), ou seja, nos processos que não constam da lista do art. 234º/4 CPC, e nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo (art. 110º/1-c CPC), como sucede, por exemplo, com o incidente de habilitação (art. 372º/2 CPC). A decisão de procedência sobre a incompetência relativa determina, em regra, a remessa do processo para o Tribunal competente (art. 111º/3 CPC). Exceptua-se a hipótese de a incompetência resultar da violação de um pacto privativo de jurisdição, dado que o Tribunal português não pode enviar o processo para o Tribunal estrangeiro competente: neste caso, a consequência desta excepção dilatória, não podendo ser a referida remessa, é a absolvição do réu da instância (art. 111º/3 in fine CPC). 27. Preterição de Tribunal Arbitral

A preterição de Tribunal Arbitral resulta da infracção da competência de um Tribunal Arbitral que tem competência exclusiva para apreciar um determinado objecto. A preterição pode verificar-se quando um Tribunal Arbitral necessário, quando for proposta num Tribunal comum uma acção que pertence à competência de um Tribunal Arbitral imposto por lei (art. 1525º - se o julgamento Arbitral for prescrito por lei especial, atender-se-á ao que nesta estiver determinado. Na falta de determinação, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes – CPC), ou quando a um Tribunal Arbitral voluntário, quando for instaurada num Tribunal comum uma acção que devia ter sido proposta num Tribunal Arbitral convencionado pelas partes (art. 1º LAV). QUESTÕES RELATIVAS À COMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO 16. Normas de recepção As normas de competência internacional servem-se de alguns elementos de conexão com a ordem jurídica nacional para atribuir competência aos Tribunais do foro para o conhecimento de uma certa questão. As normas de conflitos que definem as condições em que os Tribunais do foro são competentes para a apreciação de um objecto que apresenta uma conexão com várias ordens jurídicas podem designar-se por normas de recepção. É essa a função dos vários critérios enunciados no art. 65º/1 CPC (A competência internacional dos tribunais portugueses depende da verificação de alguma das seguintes circunstâncias: a) Ter o réu ou algum dos réus domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro; b) Dever a acção ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; c) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na acção, ou algum dos factos que a integram; d) Não poder o direito invocado tornar-se efectivo senão por meio de acção proposta em território português, ou não ser exigível ao autor a sua propositura no estrangeiro, desde que entre o objecto do litígio e a ordem

jurídica nacional haja algum elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real). Estas normas de recepção definem a competência internacional dos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Elas decorrem tanto da regra segundo a qual, quando, o caso em apreciação apresenta uma conexão relevante com uma ordem jurídica, os seus Tribunais devem ser competentes para a acção, como do princípio de que, perante a existência de uma tal conexão, os Tribunais daquela ordem devem recusar a competência internacional, pois que isso pode equivaler a uma denegação de justiça. Note-se que a conexão com uma certa ordem jurídica pode ser mais fraca do que aquela que determina a aplicação do direito nacional ao caso sub iudice, porque não há qualquer paralelismo necessário entre a atribuição da competência internacional e a aplicação da lei material do foro. A diferença entre a competência interna e a internacional consiste no seguinte: a competência interna respeita às situações que, na perspectiva da ordem jurídica portuguesa, não possuem qualquer conexão relevante com outras ordens jurídicas; a competência internacional refere-se aos casos que apresentam uma conexão com outras ordens jurídicas. As normas de recepção só determinam, através da referida conexão, que os Tribunais de uma jurisdição nacional são competentes para apreciar uma relação plurilocalizada. Essas normas não são normas de competência, porque não a atribuem a um Tribunal, antes se limitam a determinar as condições em que uma jurisdição nacional faculta os seus Tribunais para a resolução de um certo litígio com elementos internacionais. As normas de recepção preenchem, no âmbito processual, uma função paralela àquela que as normas de conflitos realizam no âmbito substantivo: estas determinam qual a lei aplicável a uma relação jurídica plurilocalizada (se a lei do foro ou uma lei estrangeira); aquelas aferem se essa mesma relação pode ser apreciada pelos Tribunais de uma certa ordem jurídica. a) Necessidade: Nem sempre a circunstância de a questão em apreciação se situar no âmbito da competência internacional (porque o objecto em apreciação é uma relação jurídica plurilocalizada) implica a utilização dos critérios específicos da competência internacional para a atribuição de competência aos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Para que haja necessidade de aferir a competência internacional dos Tribunais de um certo Estado, é indispensável que se verifique um de dois factores: que a conexão com a ordem jurídica nacional seja estabelecida através de um elemento que não é considerado relevante por nenhuma das normas da competência territorial e que, portanto, não possa ser atribuída competência aos Tribunais de um certo Estado utilizando exclusivamente as regras de competência territorial dos seus Tribunais; ou que o Estado do foro esteja vinculado, por convenção internacional, a certas regras de competência internacional. b) Unilateralidade: As normas de recepção funcionam unilateralmente. Isto significa que essas normas se limitam a facultar os Tribunais de uma jurisdição para a resolução de uma certa questão. Ou seja, essas normas atribuem competência aos Tribunais de uma ordem jurídica para a resolução de um certo litígio, mas não excluem a apreciação dessa mesma questão por um Tribunal estrangeiro. c) Previsão:

Quando a acção apresenta uma conexão objectiva, relativa ao objecto do processo, ou subjectiva, referida às partes em causa, com uma ou várias ordens jurídicas estrangeiras, pode ser necessário determinar a competência internacional dos Tribunais portugueses. Essa aferição deve restringir-se às situações em que os Tribunais portugueses não são competentes segundo as regras da competência interna, pois que, como se verificou, só importa averiguar a competência internacional quando os Tribunais de uma certa ordem jurídica não sejam competentes para apreciar uma relação jurídica plurilocalizada segundo as suas regras de competência territorial. Essa é a função dos critérios constantes do art. 65º/1 CPC. A competência legal internacional dos Tribunais portugueses é determinada, segundo uma ordem decrescente de aplicação pratica, pelos critérios da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), do domicílio do réu (art. 65º/1-a CPC), da causalidade (art. 65º/1-c CPC) e a necessidade (art. 65º/1-d CPC). 17. Critério da exclusividade Segundo o critério da exclusividade, a acção deve ser proposta em Portugal quando os Tribunais portugueses sejam exclusivamente competentes para a apreciação da causa (arts. 65º/1-b, 65º-A CPC). A competência internacional resulta, assim, da coincidência com as regras de competência exclusiva constantes do art. 65º-A CPC. Esta competência exclusiva é manifestação da protecção de determinados interesses através de uma reserva de jurisdição e, portanto, de soberania. Nesse sentido, ela é semelhante à reserva de ordem pública do Estado do reconhecimento no processo de revisão de sentenças estrangeiras (art. 1096º-f CPC). O art. 65º-A estabelece a competência exclusiva dos Tribunais portugueses para as seguintes situações: a) No caso de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre bens imóveis sitos em território português; b) Para os processos especiais de recuperação da empresa e de falência, relativamente a pessoas domiciliadas em Portugal ou a pessoas colectivas ou sociedades cuja sede esteja situada em território português; c) Para as acções referentes à apreciação da validade do acto constitutivo ou ao decretamento da dissolução de pessoas colectivas ou sociedades que tenham a sua sede em território português, bem como para as destinadas a apreciar a validade das deliberações dos respectivos órgãos; d) Para as acções que tenham como objecto principal a apreciação da validade da inscrição em registos públicos de quaisquer direitos sujeitos a registo em Portugal. A relevância prática da competência exclusiva dos Tribunais portugueses reside no seguinte: como, nessa hipótese, a jurisdição portuguesa não aceita a competência de nenhuma outra jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição estrangeira pode preencher as condições para ser ou se tornar eficaz na ordem jurídica portuguesa. Uma sentença proferida por um Tribunal estrangeiro não é, em princípio, imediatamente eficaz na ordem jurídica portuguesa; para que se lhe conceda essa eficácia é necessária a sua revisão e confirmação, nos termos e nas condições do correspondente processo de revisão de sentenças estrangeiras

(arts. 1094º a 1102º CPC). Ora, do elenco dos requisitos enunciados pelo art. 1096º CPC, para a concessão do exequatur à sentença estrangeira consta que essa decisão só pode ser confirmada pelo Tribunal português (que é uma das Relações, art. 1095º CPC) se provier de Tribunal seja competência não ofenda a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 1096º-c CPC in fine). 18. Critério do domicílio do réu Segundo o critério do domicílio do réu, a acção pode ser proposta nos Tribunais portugueses quando o réu ou algum dos réus tenha domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro (art. 65º/1-a CPC). Como a competência internacional só deve ser apreciada se da aplicação das regras da competência territorial não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, o critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser aplicado quando os Tribunais portugueses não forem competentes segundo aquelas regras. Os critérios territoriais podem ser especiais (arts. 73º a 84º e 89º CPC) ou gerais (arts. 85º a 87º CPC): o critério geral é o domicílio do demandado (arts. 85º/1, 86º/2 CPC) ou dos demandados (art. 87º/1 CPC). Assim, se à acção for aplicável o critério territorial geral e se da sua aplicação resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, está determinado, sem necessidade de aplicação do critério do domicílio do réu, o Tribunal que é territorial e internacionalmente competente. Se, pelo contrário, a aplicação desse critério de competência interna não a conceder a um Tribunal português (porque o réu não tem domicílio em Portugal), essa competência também nunca poderá resultar do critério de competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). Quando a causa se inclui no âmbito do critério territorial geral, a competência internacional nunca pode ser determinada pelo critério do domicílio do demandado, seja porque aplicação daquele critério territorial torna dispensável a aferição da competência internacional, seja porque, quando é impossível empregar o critério territorial, também é impossível aplicar aquele critério de competência internacional. Se o objecto da acção fizer funcionar um dos critérios territoriais especiais, também aqui são viáveis duas situações. Se da aplicação de um desses critérios resulta a atribuição de competência a um Tribunal português, não importa averiguar a competência internacional deste Tribunal segundo nenhum dos critérios enunciados no art. 65º/1 CPC. Se, pelo contrário, à situação concreta for aplicável um critério especial, mas da sua aplicação não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, justifica-se aferir a competência internacional dos Tribunais portugueses pelo critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). O critério da competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) nunca é aplicável quando o seja o critério territorial de domicílio do réu e também não pode ser aplicado quando um critério territorial especial atribua competência a um Tribunal português. Em conclusão: o critério de domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português.

A competência exclusiva que o art. 65º/1-a CPC, estabelece como limite à determinação da competência segundo o critério do domicílio do demandado não pode operar no âmbito de aplicação material das Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano: nesta situação, a única competência exclusiva relevante é aquela que se encontra definida no art. 16º Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O art. 65º/2 CPC, estabelece que, para efeitos da aplicação do critério do domicílio do demandado, considera-se domiciliada em Portugal a pessoa colectiva cuja a sede estatutária ou efectiva se localize em território português ou que aqui tenha sucursal, agência, filial ou delegação. 19. Critério da causalidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando o facto que integra a causa de pedir, ou algum dos factos que a constituem, tiver sido praticado em território português (art. 65º/1-c CPC). Assim, por exemplo, os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando, apesar de o facto ilícito ter ocorrido no estrangeiro, parte dos danos se produziram em Portugal (RC – 23/10/1990, CJ 90/4, 83) ou o contrato de seguro foi celebrado em território português (Assentos/Supremo Tribunal de Justiça 6/94, 30/3 = BMJ 434, 61). 20. Critério da necessidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando uma situação jurídica, que apresenta uma ponderosa conexão, pessoal ou real, com o território português, só possa ser reconhecida em acção proposta nos Tribunais nacionais (art. 65º/1-d CPC). Com esse critério procura-se obstar à denegação de justiça decorrente da impossibilidade de encontrar um Tribunal competente para a apreciação da acção: verifica-se então um reenvio da competência aos Tribunais portugueses. O critério da necessidade abarca não só a impossibilidade jurídica, por inexistência de Tribunal competente para dirimir o litígio em face das regras de competência internacional das diversas ordens jurídicas com as quais ele apresenta uma conexão relevante, mas também a impossibilidade prática, derivada de factos anómalos impeditivos do funcionamento da jurisdição competente. 21. Tribunal territorialmente competente Para analisar qual é o Tribunal territorialmente competente quando os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes segundo o critério da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), há que considerar cada uma das situações previstas no art. 65º-A. Exceptua-se desta análise a hipóteses prevista no art. 65º-A-a CPC, porque, ela é sempre afastada pelo regime constante do art. 16º/1 Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só é susceptível de ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial (arts. 73º a 84º e 89º CPC) e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português. Se os Tribunais portugueses forem internacionalmente competentes pelo critério da causalidade ou da necessidade, também há que averiguar qual dos Tribunais portugueses é o territorialmente competente. Para a determinação

deste Tribunal só podem ser utilizados critérios aos quais não possa ser concedida a dupla funcionalidade característica das normas sobre a competência territorial, porque, de outro modo, a competência internacional dos Tribunais portugueses já teria decorrido dessa competência territorial. Está nessas condições o art. 85º/3 (Se o réu tiver o domicílio e a residência em país estrangeiro, será demandado no tribunal do lugar em que se encontrar; não se encontrando em território português, será demandado no do domicílio do autor, e, quando este domicílio for em país estrangeiro, será competente para a causa o tribunal de Lisboa) CPC. Assim, se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro mas se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do local em que se encontrar em Portugal (art. 85º/3, 1ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do domicílio do autor (art. 85º/3, 2ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português e se o autor também tiver domicílio em território estrangeiro, é territorialmente competente o Tribunal de Lisboa (art. 85º/3 in fine CPC).

COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO 22. Pactos de competência A competência interna é determinada através de um pacto de competência (pactum de foro prorrogando). Em regra, o pacto de competência refere-se a uma questão que não apresenta qualquer conexão com outras ordens jurídicas, mas isto não significa que não haja pactos de competência referidos a relações jurídicas plurilocalizadas. O pacto de competência só pode incidir sobre a competência em razão do valor e do território (art. 100º/1 CPC). O pacto de competência só é válido se acompanhar a forma de contrato substantivo, se este for normal, ou se tiver a forma escrita, se aquele for consensual (art. 100º/2 CPC). Mas considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documentos assinados pelas partes ou o resultante de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido (arts. 110º/2, 1ª parte, e 99º/4 CPC). Além disso, o pacto de competência deve designar as questões submetidas à apreciação do Tribunal e o critério de determinação do Tribunal ao qual é atribuída a competência (art. 100º/2, 2ª parte CPC). O pacto de competência contém implicitamente uma renúncia antecipada – isto é, anterior à propositura da acção – à arguição da excepção de incompetência relativa (art. 108º CPC), pois que é atribuída competência territorial a um Tribunal que, sem esse contrato processual, não seria competente. Essa renúncia exige, como requisito ad substantiam, a forma escrita (art. 100º/2, 1ª parte CPC), pois que condiciona as possibilidades de defesa do réu na acção proposta naquele Tribunal e, concretamente, exclui a invocação da excepção de incompetência relativa. A competência convencional interna é vinculada para as partes (art. 100º/3 CPC), pelo que a sua infracção determina a incompetência relativa do Tribunal onde a acção foi indevidamente proposta (art. 108º CPC). 23. Pactos de jurisdição A competência convencional internacional pode ser determinada através de um pacto de jurisdição (art. 99º/1 CPC). Esse pacto pode ser, quando considerado pela perspectiva da ordem jurídica portuguesa, atributivo ou privativo. O pacto é atributivo, quando concede competência a um Tribunal ou a vários Tribunais portugueses; a competência atribuída pode ser concorrente ou exclusiva. O pacto é privativo, quando retira competência a um ou a vários Tribunais portugueses e a atribui em exclusivo a um ou vários Tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Como o carácter atributivo ou privativo do pacto de jurisdição é definido em relação à ordem jurídica portuguesa, a validade de um desses pactos não é vinculativa para os Tribunais de ordens jurídicas estrangeiras.

O pacto de jurisdição só pode incidir sobre situações subjectivas disponíveis (art. 99º/3-a CPC). Esta condição é suficiente para possibilitar a celebração de um pacto de jurisdição sobre a generalidade das situações patrimoniais. O pacto de jurisdição só é válido se for justificado por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que, neste último caso, não envolva inconveniente grave para a outra (art. 99º/3-c CPC). Este requisito destina-se essencialmente a salvaguardar a posição da parte mais fraca. O pacto de jurisdição não pode ofender a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-a CPC); sobre esta competência, art. 65º-A CPC, isto é, o pacto não pode privar os Tribunais portugueses da sua competência exclusiva. Se as partes, através de uma convenção de arbitragem (art. 1º Lei da Arbitragem Voluntária – lei 31/86, de 29/8), atribuírem competência para o julgamento de certo litígio ou questão emergente de uma relação jurídica plurilocalizada a um Tribunal Arbitral (funcionando em território português ou no estrangeiro), é igualmente aplicável a esse negócio o requisito respeitante à observância da competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-d CPC). O pacto deve mencionar expressamente a jurisdição competente (art. 99º/3-e in fine CPC). A designação do Tribunal competente (pertencente à ordem jurídica de uma das partes, de ambas ou de nenhuma delas) pode ser feita directamente: nesta eventualidade, as partes indicam um Tribunal específico. Mas essa indicação também pode ser realizada indirectamente através de uma remissão para o Tribunal que for competente segundo as regras de competência vigentes na jurisdição designada: nessa hipótese, as partes designam globalmente os Tribunais de uma jurisdição. O pacto de jurisdição só é válido se constar de acordo escrito ou confirmado por escrito (art. 9º/3-c CPC). Para este efeito, considera-se reduzido a escrito o acordo que consta de documentos assinados pelas partes ou que resulta de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula que remeta para algum documento que o contenha (art. 99º/4 CPC). Como a incompetência absoluta decorrente da infracção das regras da competência internacional é uma excepção dilatória que o Tribunal aprecia oficiosamente (arts. 102º/1, 494º-a, 495º CPC), não é configurável a celebração tácita de um pacto atributivo de jurisdição pela preclusão da invocação daquela excepção num processo pendente. MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA 24. Enunciado A incompetência é a insusceptibilidade de um Tribunal apreciar determinada causa que decorre da circunstância de os critérios determinativos da competência não lhe concederem a medida de jurisdição suficiente para essa apreciação. Infere-se da lei a existência de três tipos de incompetência jurisdicional: a incompetência absoluta, a incompetência relativa e a preterição de Tribunal Arbitral.

25. Incompetência absoluta Segundo o disposto no art. 101º (A infracção das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional, salvo quando haja mera violação dum pacto privativo de jurisdição, determina a incompetência absoluta do tribunal) CPC, a incompetência absoluta provém da infracção das regras da competência internacional legal (arts. 65º e 65º-A CPC) e da competência interna material (arts. 66º, 67º CPC; art. 46º LOTJ – Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) e hierárquica (arts. 70º, 71º, 72º CPC). A incompetência absoluta referida no art. 101º CPC, é, naturalmente, apenas aquela que se verifica no âmbito do processo civil. A incompetência internacional resulta da impossibilidade de incluir a relação jurídica plurilocalizada na previsão de uma das normas de recepção do art. 65º. A incompetência hierárquica verifica-se se a acção é instaurada num Tribunal de 1ª instância quando o devia ter sido na Relação ou no Supremo, ou vice-versa. Finalmente, a incompetência material decorre da propositura no Tribunal comum de uma acção da competência dos Tribunais especiais ou da instauração de uma acção num Tribunal de competência especializada incompetente. A incompetência absoluta resultante da infracção da competência material decorrente da circunstância de a acção ter sido instaurada num Tribunal judicial quando o deveria ter sido perante um outro Tribunal judicial até ao despacho saneador ou, se este não tiver lugar, até ao início da audiência final (art. 102º/2 CPC). A incompetência material que resulta do facto de a acção ter sido proposta num Tribunal judicial quando o deveria ser num Tribunal não judicial pode ser arguida pelas partes e conhecida oficiosamente pelo Tribunal até ao trânsito em julgado da decisão de mérito (art. 102º/1 CPC). Se houver despacho de citação (art. 234º/4 CPC), a incompetência absoluta deve ser conhecida oficiosamente no despacho limiar (arts. 105º/1, 234º-A/1 CPC). O conhecimento oficioso da incompetência absoluta é realizado, em regra, no despacho saneador (arts. 510º/1-a, 494º-a CPC). O conhecimento da incompetência absoluta no momento do despacho de citação determina o indeferimento limiar da petição inicial (arts. 105º/1, 234ºA/1 CPC); se for apreciada em momento posterior, essa incompetência conduz à absolvição do réu da instância (arts. 105º/1, 288º/1-a, 494º-a, 493º/2 CPC). 26. Incompetência relativa O art. 108º (A infracção das regras de competência fundadas no valor da causa, na forma do processo aplicável, na divisão judicial do território ou decorrentes do estipulado nas convenções previstas nos artigos 99º e 100º, determina a incompetência relativa do tribunal) CPC, enuncia as situações que originam a incompetência relativa: esta incompetência resulta da infracção das regras da competência fundadas no valor da causa (art. 68º CPC; arts. 47º e 49 LOTJ), na forma do processo aplicável (art. 68º CPC; art. 48 LOTJ), na divisão judicial do território (arts. 73º a 95º CPC) ou decorrentes de um pacto de competência ou de jurisdição (arts. 99º e 100º CPC). Note-se que a violação das regras de competência territorial pode verificarse não só na competência interna, quando são infringidas as regras que

definem, de entre os vários Tribunais, qual o territorialmente competente, mas também na competência internacional. Perante os Tribunais portugueses apenas pode relevar, quanto à competência internacional directa, a infracção de um pacto privativo de jurisdição. Esta violação verifica-se quando, apesar de as partes terem estipulado a competência exclusiva de um Tribunal estrangeiro para apreciar certa questão, a acção vem a ser proposta num Tribunal português. Confirmando a disponibilidade das partes sobre a competência relativa (art. 100º CPC), a correspondente incompetência não é, em princípio, de conhecimento oficioso (art. 495º CPC). Neste caso, a incompetência pode ser arguida pelo réu no prazo de contestação (art. 109º/1; arts. 486º/1, 783º, 794º/1 CPC). O autor pode responder no articulado subsequente ou, não havendo lugar a este, em articulado próprio, a apresentar nos 10 dias seguintes à notificação da entrega do articulado do réu (art. 109º/2 CPC). Conjuntamente com a alegação da incompetência relativa, as partes devem apresentar as respectivas provas (art. 109º/3 CPC). Produzidas estas, o Tribunal decide qual é o Tribunal competente para a acção (art. 111º/1 CPC). São várias as situações em que a incompetência relativa é de conhecimento oficioso. É o que sucede, nos termos do art. 110º/1-a CPC, nas acções relativas a direitos reais sobre imóveis, a responsabilidade civil extracontratual e naquelas em que seja parte o juiz, seu cônjuge ou certas partes, nos processos de recuperação da empresa e de falência, nos procedimentos cautelares e diligências antecipadas, na determinação do Tribunal ad quem, bem como na acção executiva fundada em sentença proferida por Tribunais portugueses e nas acções executivas para a entrega de coisa certa ou por dívida com garantia real. A incompetência relativa também é de conhecimento oficioso quando decorra da infracção das regras da competência respeitantes à forma do processo ou do valor da causa (art. 110º/2 CPC), ou seja, do disposto nos arts. 48º e 49º LOTJ. Como a competência em razão do valor da causa (art. 49º LOTJ) se reflecte na competência do Tribunal de círculo (art. 81º LOTJ) e do Tribunal singular (art. 83º LOTJ), o art. 110º/2 (a incompetência em razão do valor da causa ou da forma de processo aplicável é sempre do conhecimento oficioso do tribunal, seja qual for a acção em que se suscite) CPC, engloba igualmente a violação da competência destes Tribunais. Finalmente, a incompetência relativa deve ser apreciada oficiosamente nos processos em que não se verifique a citação do demandado ou requerido (art. 110º/1-b CPC), ou seja, nos processos que não constam da lista do art. 234º/4 CPC, e nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo (art. 110º/1-c CPC), como sucede, por exemplo, com o incidente de habilitação (art. 372º/2 CPC). A decisão de procedência sobre a incompetência relativa determina, em regra, a remessa do processo para o Tribunal competente (art. 111º/3 CPC). Exceptua-se a hipótese de a incompetência resultar da violação de um pacto privativo de jurisdição, dado que o Tribunal português não pode enviar o processo para o Tribunal estrangeiro competente: neste caso, a consequência desta excepção dilatória, não podendo ser a referida remessa, é a absolvição do réu da instância (art. 111º/3 in fine CPC). 27. Preterição de Tribunal Arbitral

A preterição de Tribunal Arbitral resulta da infracção da competência de um Tribunal Arbitral que tem competência exclusiva para apreciar um determinado objecto. A preterição pode verificar-se quando um Tribunal Arbitral necessário, quando for proposta num Tribunal comum uma acção que pertence à competência de um Tribunal Arbitral imposto por lei (art. 1525º - se o julgamento Arbitral for prescrito por lei especial, atender-se-á ao que nesta estiver determinado. Na falta de determinação, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes – CPC), ou quando a um Tribunal Arbitral voluntário, quando for instaurada num Tribunal comum uma acção que devia ter sido proposta num Tribunal Arbitral convencionado pelas partes (art. 1º LAV).

QUESTÕES RELATIVAS À COMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA

COMPETÊNCIA INTERNACIONAL: DIREITO INTERNO 16. Normas de recepção As normas de competência internacional servem-se de alguns elementos de conexão com a ordem jurídica nacional para atribuir competência aos Tribunais do foro para o conhecimento de uma certa questão. As normas de conflitos que definem as condições em que os Tribunais do foro são competentes para a apreciação de um objecto que apresenta uma conexão com várias ordens jurídicas podem designar-se por normas de recepção. É essa a função dos vários critérios enunciados no art. 65º/1 CPC (A competência internacional dos tribunais portugueses depende da verificação de alguma das seguintes circunstâncias: a) Ter o réu ou algum dos réus domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro; b) Dever a acção ser proposta em Portugal, segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; c) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na acção, ou algum dos factos que a integram; d) Não poder o direito invocado tornar-se efectivo senão por meio de acção proposta em território português, ou não ser exigível ao autor a sua

propositura no estrangeiro, desde que entre o objecto do litígio e a ordem jurídica nacional haja algum elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real). Estas normas de recepção definem a competência internacional dos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Elas decorrem tanto da regra segundo a qual, quando, o caso em apreciação apresenta uma conexão relevante com uma ordem jurídica, os seus Tribunais devem ser competentes para a acção, como do princípio de que, perante a existência de uma tal conexão, os Tribunais daquela ordem devem recusar a competência internacional, pois que isso pode equivaler a uma denegação de justiça. Note-se que a conexão com uma certa ordem jurídica pode ser mais fraca do que aquela que determina a aplicação do direito nacional ao caso sub iudice, porque não há qualquer paralelismo necessário entre a atribuição da competência internacional e a aplicação da lei material do foro. A diferença entre a competência interna e a internacional consiste no seguinte: a competência interna respeita às situações que, na perspectiva da ordem jurídica portuguesa, não possuem qualquer conexão relevante com outras ordens jurídicas; a competência internacional refere-se aos casos que apresentam uma conexão com outras ordens jurídicas. As normas de recepção só determinam, através da referida conexão, que os Tribunais de uma jurisdição nacional são competentes para apreciar uma relação plurilocalizada. Essas normas não são normas de competência, porque não a atribuem a um Tribunal, antes se limitam a determinar as condições em que uma jurisdição nacional faculta os seus Tribunais para a resolução de um certo litígio com elementos internacionais. As normas de recepção preenchem, no âmbito processual, uma função paralela àquela que as normas de conflitos realizam no âmbito substantivo: estas determinam qual a lei aplicável a uma relação jurídica plurilocalizada (se a lei do foro ou uma lei estrangeira); aquelas aferem se essa mesma relação pode ser apreciada pelos Tribunais de uma certa ordem jurídica. a) Necessidade: Nem sempre a circunstância de a questão em apreciação se situar no âmbito da competência internacional (porque o objecto em apreciação é uma relação jurídica plurilocalizada) implica a utilização dos critérios específicos da competência internacional para a atribuição de competência aos Tribunais de uma certa ordem jurídica. Para que haja necessidade de aferir a competência internacional dos Tribunais de um certo Estado, é indispensável que se verifique um de dois factores: que a conexão com a ordem jurídica nacional seja estabelecida através de um elemento que não é considerado relevante por nenhuma das normas da competência territorial e que, portanto, não possa ser atribuída competência aos Tribunais de um certo Estado utilizando exclusivamente as regras de competência territorial dos seus Tribunais; ou que o Estado do foro esteja vinculado, por convenção internacional, a certas regras de competência internacional. b) Unilateralidade: As normas de recepção funcionam unilateralmente. Isto significa que essas normas se limitam a facultar os Tribunais de uma jurisdição para a resolução de uma certa questão. Ou seja, essas normas atribuem competência aos Tribunais de uma ordem jurídica para a resolução de um certo litígio, mas não excluem a apreciação dessa mesma questão por um Tribunal estrangeiro.

c)

Previsão: Quando a acção apresenta uma conexão objectiva, relativa ao objecto do processo, ou subjectiva, referida às partes em causa, com uma ou várias ordens jurídicas estrangeiras, pode ser necessário determinar a competência internacional dos Tribunais portugueses. Essa aferição deve restringir-se às situações em que os Tribunais portugueses não são competentes segundo as regras da competência interna, pois que, como se verificou, só importa averiguar a competência internacional quando os Tribunais de uma certa ordem jurídica não sejam competentes para apreciar uma relação jurídica plurilocalizada segundo as suas regras de competência territorial. Essa é a função dos critérios constantes do art. 65º/1 CPC. A competência legal internacional dos Tribunais portugueses é determinada, segundo uma ordem decrescente de aplicação pratica, pelos critérios da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), do domicílio do réu (art. 65º/1-a CPC), da causalidade (art. 65º/1-c CPC) e a necessidade (art. 65º/1-d CPC). 17. Critério da exclusividade Segundo o critério da exclusividade, a acção deve ser proposta em Portugal quando os Tribunais portugueses sejam exclusivamente competentes para a apreciação da causa (arts. 65º/1-b, 65º-A CPC). A competência internacional resulta, assim, da coincidência com as regras de competência exclusiva constantes do art. 65º-A CPC. Esta competência exclusiva é manifestação da protecção de determinados interesses através de uma reserva de jurisdição e, portanto, de soberania. Nesse sentido, ela é semelhante à reserva de ordem pública do Estado do reconhecimento no processo de revisão de sentenças estrangeiras (art. 1096º-f CPC). O art. 65º-A estabelece a competência exclusiva dos Tribunais portugueses para as seguintes situações: a) No caso de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre bens imóveis sitos em território português; b) Para os processos especiais de recuperação da empresa e de falência, relativamente a pessoas domiciliadas em Portugal ou a pessoas colectivas ou sociedades cuja sede esteja situada em território português; c) Para as acções referentes à apreciação da validade do acto constitutivo ou ao decretamento da dissolução de pessoas colectivas ou sociedades que tenham a sua sede em território português, bem como para as destinadas a apreciar a validade das deliberações dos respectivos órgãos; d) Para as acções que tenham como objecto principal a apreciação da validade da inscrição em registos públicos de quaisquer direitos sujeitos a registo em Portugal. A relevância prática da competência exclusiva dos Tribunais portugueses reside no seguinte: como, nessa hipótese, a jurisdição portuguesa não aceita a competência de nenhuma outra jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição para apreciar a acção, nenhuma decisão proferida numa jurisdição estrangeira pode preencher as condições para ser ou se tornar eficaz na ordem jurídica portuguesa. Uma sentença proferida por um Tribunal estrangeiro não é, em princípio, imediatamente eficaz na ordem jurídica portuguesa; para que se lhe conceda essa eficácia é necessária a sua revisão e confirmação, nos termos e nas

condições do correspondente processo de revisão de sentenças estrangeiras (arts. 1094º a 1102º CPC). Ora, do elenco dos requisitos enunciados pelo art. 1096º CPC, para a concessão do exequatur à sentença estrangeira consta que essa decisão só pode ser confirmada pelo Tribunal português (que é uma das Relações, art. 1095º CPC) se provier de Tribunal seja competência não ofenda a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 1096º-c CPC in fine). 18. Critério do domicílio do réu Segundo o critério do domicílio do réu, a acção pode ser proposta nos Tribunais portugueses quando o réu ou algum dos réus tenha domicílio em território português, salvo tratando-se de acções relativas a direitos reais ou pessoais de gozo sobre imóveis sitos em país estrangeiro (art. 65º/1-a CPC). Como a competência internacional só deve ser apreciada se da aplicação das regras da competência territorial não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, o critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser aplicado quando os Tribunais portugueses não forem competentes segundo aquelas regras. Os critérios territoriais podem ser especiais (arts. 73º a 84º e 89º CPC) ou gerais (arts. 85º a 87º CPC): o critério geral é o domicílio do demandado (arts. 85º/1, 86º/2 CPC) ou dos demandados (art. 87º/1 CPC). Assim, se à acção for aplicável o critério territorial geral e se da sua aplicação resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, está determinado, sem necessidade de aplicação do critério do domicílio do réu, o Tribunal que é territorial e internacionalmente competente. Se, pelo contrário, a aplicação desse critério de competência interna não a conceder a um Tribunal português (porque o réu não tem domicílio em Portugal), essa competência também nunca poderá resultar do critério de competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). Quando a causa se inclui no âmbito do critério territorial geral, a competência internacional nunca pode ser determinada pelo critério do domicílio do demandado, seja porque aplicação daquele critério territorial torna dispensável a aferição da competência internacional, seja porque, quando é impossível empregar o critério territorial, também é impossível aplicar aquele critério de competência internacional. Se o objecto da acção fizer funcionar um dos critérios territoriais especiais, também aqui são viáveis duas situações. Se da aplicação de um desses critérios resulta a atribuição de competência a um Tribunal português, não importa averiguar a competência internacional deste Tribunal segundo nenhum dos critérios enunciados no art. 65º/1 CPC. Se, pelo contrário, à situação concreta for aplicável um critério especial, mas da sua aplicação não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português, justifica-se aferir a competência internacional dos Tribunais portugueses pelo critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC). O critério da competência internacional do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) nunca é aplicável quando o seja o critério territorial de domicílio do réu e também não pode ser aplicado quando um critério territorial especial atribua competência a um Tribunal português. Em conclusão: o critério de domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só pode ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português.

A competência exclusiva que o art. 65º/1-a CPC, estabelece como limite à determinação da competência segundo o critério do domicílio do demandado não pode operar no âmbito de aplicação material das Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano: nesta situação, a única competência exclusiva relevante é aquela que se encontra definida no art. 16º Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O art. 65º/2 CPC, estabelece que, para efeitos da aplicação do critério do domicílio do demandado, considera-se domiciliada em Portugal a pessoa colectiva cuja a sede estatutária ou efectiva se localize em território português ou que aqui tenha sucursal, agência, filial ou delegação. 19. Critério da causalidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando o facto que integra a causa de pedir, ou algum dos factos que a constituem, tiver sido praticado em território português (art. 65º/1-c CPC). Assim, por exemplo, os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando, apesar de o facto ilícito ter ocorrido no estrangeiro, parte dos danos se produziram em Portugal (RC – 23/10/1990, CJ 90/4, 83) ou o contrato de seguro foi celebrado em território português (Assentos/Supremo Tribunal de Justiça 6/94, 30/3 = BMJ 434, 61). 20. Critério da necessidade Segundo este critério, a acção pode ser instaurada nos Tribunais portugueses quando uma situação jurídica, que apresenta uma ponderosa conexão, pessoal ou real, com o território português, só possa ser reconhecida em acção proposta nos Tribunais nacionais (art. 65º/1-d CPC). Com esse critério procura-se obstar à denegação de justiça decorrente da impossibilidade de encontrar um Tribunal competente para a apreciação da acção: verifica-se então um reenvio da competência aos Tribunais portugueses. O critério da necessidade abarca não só a impossibilidade jurídica, por inexistência de Tribunal competente para dirimir o litígio em face das regras de competência internacional das diversas ordens jurídicas com as quais ele apresenta uma conexão relevante, mas também a impossibilidade prática, derivada de factos anómalos impeditivos do funcionamento da jurisdição competente. 21. Tribunal territorialmente competente Para analisar qual é o Tribunal territorialmente competente quando os Tribunais portugueses são internacionalmente competentes segundo o critério da exclusividade (art. 65º/1-b CPC), há que considerar cada uma das situações previstas no art. 65º-A. Exceptua-se desta análise a hipóteses prevista no art. 65º-A-a CPC, porque, ela é sempre afastada pelo regime constante do art. 16º/1 Convenção de Bruxelas e de Convenção de Lugano. O critério do domicílio do demandado (art. 65º/1-a CPC) só é susceptível de ser usado quando ao caso concreto for aplicável um critério territorial especial (arts. 73º a 84º e 89º CPC) e da aplicação deste não resultar a atribuição de competência a um Tribunal português. Se os Tribunais portugueses forem internacionalmente competentes pelo critério da causalidade ou da necessidade, também há que averiguar qual dos Tribunais portugueses é o territorialmente competente. Para a determinação

deste Tribunal só podem ser utilizados critérios aos quais não possa ser concedida a dupla funcionalidade característica das normas sobre a competência territorial, porque, de outro modo, a competência internacional dos Tribunais portugueses já teria decorrido dessa competência territorial. Está nessas condições o art. 85º/3 (Se o réu tiver o domicílio e a residência em país estrangeiro, será demandado no tribunal do lugar em que se encontrar; não se encontrando em território português, será demandado no do domicílio do autor, e, quando este domicílio for em país estrangeiro, será competente para a causa o tribunal de Lisboa) CPC. Assim, se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro mas se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do local em que se encontrar em Portugal (art. 85º/3, 1ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português, é territorialmente competente o Tribunal do domicílio do autor (art. 85º/3, 2ª parte CPC). Se o réu tiver domicílio e residência em país estrangeiro e não se encontrar em território português e se o autor também tiver domicílio em território estrangeiro, é territorialmente competente o Tribunal de Lisboa (art. 85º/3 in fine CPC).

COMPETÊNCIA CONVENCIONAL: DIREITO INTERNO 22. Pactos de competência A competência interna é determinada através de um pacto de competência (pactum de foro prorrogando). Em regra, o pacto de competência refere-se a uma questão que não apresenta qualquer conexão com outras ordens jurídicas, mas isto não significa que não haja pactos de competência referidos a relações jurídicas plurilocalizadas. O pacto de competência só pode incidir sobre a competência em razão do valor e do território (art. 100º/1 CPC). O pacto de competência só é válido se acompanhar a forma de contrato substantivo, se este for normal, ou se tiver a forma escrita, se aquele for consensual (art. 100º/2 CPC). Mas considera-se reduzido a escrito o acordo constante de documentos assinados pelas partes ou o resultante de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula de remissão para algum documento em que ele esteja contido (arts. 110º/2, 1ª parte, e 99º/4 CPC). Além disso, o pacto de competência deve designar as questões submetidas à apreciação do Tribunal e o critério de determinação do Tribunal ao qual é atribuída a competência (art. 100º/2, 2ª parte CPC). O pacto de competência contém implicitamente uma renúncia antecipada – isto é, anterior à propositura da acção – à arguição da excepção de incompetência relativa (art. 108º CPC), pois que é atribuída competência territorial a um Tribunal que, sem esse contrato processual, não seria competente. Essa renúncia exige, como requisito ad substantiam, a forma escrita (art. 100º/2, 1ª parte CPC), pois que condiciona as possibilidades de defesa do réu na acção proposta naquele Tribunal e, concretamente, exclui a invocação da excepção de incompetência relativa. A competência convencional interna é vinculada para as partes (art. 100º/3 CPC), pelo que a sua infracção determina a incompetência relativa do Tribunal onde a acção foi indevidamente proposta (art. 108º CPC). 23. Pactos de jurisdição A competência convencional internacional pode ser determinada através de um pacto de jurisdição (art. 99º/1 CPC). Esse pacto pode ser, quando considerado pela perspectiva da ordem jurídica portuguesa, atributivo ou privativo. O pacto é atributivo, quando concede competência a um Tribunal ou a vários Tribunais portugueses; a competência atribuída pode ser concorrente ou exclusiva. O pacto é privativo, quando retira competência a um ou a vários Tribunais portugueses e a atribui em exclusivo a um ou vários Tribunais estrangeiros (art. 99º/2 CPC). Como o carácter atributivo ou privativo do pacto de jurisdição é definido em relação à ordem jurídica portuguesa, a validade de um desses pactos não é vinculativa para os Tribunais de ordens jurídicas estrangeiras.

O pacto de jurisdição só pode incidir sobre situações subjectivas disponíveis (art. 99º/3-a CPC). Esta condição é suficiente para possibilitar a celebração de um pacto de jurisdição sobre a generalidade das situações patrimoniais. O pacto de jurisdição só é válido se for justificado por um interesse sério de ambas as partes ou de uma delas, desde que, neste último caso, não envolva inconveniente grave para a outra (art. 99º/3-c CPC). Este requisito destina-se essencialmente a salvaguardar a posição da parte mais fraca. O pacto de jurisdição não pode ofender a competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-a CPC); sobre esta competência, art. 65º-A CPC, isto é, o pacto não pode privar os Tribunais portugueses da sua competência exclusiva. Se as partes, através de uma convenção de arbitragem (art. 1º Lei da Arbitragem Voluntária – lei 31/86, de 29/8), atribuírem competência para o julgamento de certo litígio ou questão emergente de uma relação jurídica plurilocalizada a um Tribunal Arbitral (funcionando em território português ou no estrangeiro), é igualmente aplicável a esse negócio o requisito respeitante à observância da competência exclusiva dos Tribunais portugueses (art. 99º/3-d CPC). O pacto deve mencionar expressamente a jurisdição competente (art. 99º/3-e in fine CPC). A designação do Tribunal competente (pertencente à ordem jurídica de uma das partes, de ambas ou de nenhuma delas) pode ser feita directamente: nesta eventualidade, as partes indicam um Tribunal específico. Mas essa indicação também pode ser realizada indirectamente através de uma remissão para o Tribunal que for competente segundo as regras de competência vigentes na jurisdição designada: nessa hipótese, as partes designam globalmente os Tribunais de uma jurisdição. O pacto de jurisdição só é válido se constar de acordo escrito ou confirmado por escrito (art. 9º/3-c CPC). Para este efeito, considera-se reduzido a escrito o acordo que consta de documentos assinados pelas partes ou que resulta de troca de cartas, telex, telegramas ou outros meios de comunicação de que fique prova escrita, quer tais instrumentos contenham directamente o acordo, quer deles conste uma cláusula que remeta para algum documento que o contenha (art. 99º/4 CPC). Como a incompetência absoluta decorrente da infracção das regras da competência internacional é uma excepção dilatória que o Tribunal aprecia oficiosamente (arts. 102º/1, 494º-a, 495º CPC), não é configurável a celebração tácita de um pacto atributivo de jurisdição pela preclusão da invocação daquela excepção num processo pendente. MODALIDADES DE INCOMPETÊNCIA 24. Enunciado A incompetência é a insusceptibilidade de um Tribunal apreciar determinada causa que decorre da circunstância de os critérios determinativos da competência não lhe concederem a medida de jurisdição suficiente para essa apreciação. Infere-se da lei a existência de três tipos de incompetência jurisdicional: a incompetência absoluta, a incompetência relativa e a preterição de Tribunal Arbitral.

25. Incompetência absoluta Segundo o disposto no art. 101º (A infracção das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional, salvo quando haja mera violação dum pacto privativo de jurisdição, determina a incompetência absoluta do tribunal) CPC, a incompetência absoluta provém da infracção das regras da competência internacional legal (arts. 65º e 65º-A CPC) e da competência interna material (arts. 66º, 67º CPC; art. 46º LOTJ – Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais) e hierárquica (arts. 70º, 71º, 72º CPC). A incompetência absoluta referida no art. 101º CPC, é, naturalmente, apenas aquela que se verifica no âmbito do processo civil. A incompetência internacional resulta da impossibilidade de incluir a relação jurídica plurilocalizada na previsão de uma das normas de recepção do art. 65º. A incompetência hierárquica verifica-se se a acção é instaurada num Tribunal de 1ª instância quando o devia ter sido na Relação ou no Supremo, ou vice-versa. Finalmente, a incompetência material decorre da propositura no Tribunal comum de uma acção da competência dos Tribunais especiais ou da instauração de uma acção num Tribunal de competência especializada incompetente. A incompetência absoluta resultante da infracção da competência material decorrente da circunstância de a acção ter sido instaurada num Tribunal judicial quando o deveria ter sido perante um outro Tribunal judicial até ao despacho saneador ou, se este não tiver lugar, até ao início da audiência final (art. 102º/2 CPC). A incompetência material que resulta do facto de a acção ter sido proposta num Tribunal judicial quando o deveria ser num Tribunal não judicial pode ser arguida pelas partes e conhecida oficiosamente pelo Tribunal até ao trânsito em julgado da decisão de mérito (art. 102º/1 CPC). Se houver despacho de citação (art. 234º/4 CPC), a incompetência absoluta deve ser conhecida oficiosamente no despacho limiar (arts. 105º/1, 234º-A/1 CPC). O conhecimento oficioso da incompetência absoluta é realizado, em regra, no despacho saneador (arts. 510º/1-a, 494º-a CPC). O conhecimento da incompetência absoluta no momento do despacho de citação determina o indeferimento limiar da petição inicial (arts. 105º/1, 234ºA/1 CPC); se for apreciada em momento posterior, essa incompetência conduz à absolvição do réu da instância (arts. 105º/1, 288º/1-a, 494º-a, 493º/2 CPC). 26. Incompetência relativa O art. 108º (A infracção das regras de competência fundadas no valor da causa, na forma do processo aplicável, na divisão judicial do território ou decorrentes do estipulado nas convenções previstas nos artigos 99º e 100º, determina a incompetência relativa do tribunal) CPC, enuncia as situações que originam a incompetência relativa: esta incompetência resulta da infracção das regras da competência fundadas no valor da causa (art. 68º CPC; arts. 47º e 49 LOTJ), na forma do processo aplicável (art. 68º CPC; art. 48 LOTJ), na divisão judicial do território (arts. 73º a 95º CPC) ou decorrentes de um pacto de competência ou de jurisdição (arts. 99º e 100º CPC). Note-se que a violação das regras de competência territorial pode verificarse não só na competência interna, quando são infringidas as regras que

definem, de entre os vários Tribunais, qual o territorialmente competente, mas também na competência internacional. Perante os Tribunais portugueses apenas pode relevar, quanto à competência internacional directa, a infracção de um pacto privativo de jurisdição. Esta violação verifica-se quando, apesar de as partes terem estipulado a competência exclusiva de um Tribunal estrangeiro para apreciar certa questão, a acção vem a ser proposta num Tribunal português. Confirmando a disponibilidade das partes sobre a competência relativa (art. 100º CPC), a correspondente incompetência não é, em princípio, de conhecimento oficioso (art. 495º CPC). Neste caso, a incompetência pode ser arguida pelo réu no prazo de contestação (art. 109º/1; arts. 486º/1, 783º, 794º/1 CPC). O autor pode responder no articulado subsequente ou, não havendo lugar a este, em articulado próprio, a apresentar nos 10 dias seguintes à notificação da entrega do articulado do réu (art. 109º/2 CPC). Conjuntamente com a alegação da incompetência relativa, as partes devem apresentar as respectivas provas (art. 109º/3 CPC). Produzidas estas, o Tribunal decide qual é o Tribunal competente para a acção (art. 111º/1 CPC). São várias as situações em que a incompetência relativa é de conhecimento oficioso. É o que sucede, nos termos do art. 110º/1-a CPC, nas acções relativas a direitos reais sobre imóveis, a responsabilidade civil extracontratual e naquelas em que seja parte o juiz, seu cônjuge ou certas partes, nos processos de recuperação da empresa e de falência, nos procedimentos cautelares e diligências antecipadas, na determinação do Tribunal ad quem, bem como na acção executiva fundada em sentença proferida por Tribunais portugueses e nas acções executivas para a entrega de coisa certa ou por dívida com garantia real. A incompetência relativa também é de conhecimento oficioso quando decorra da infracção das regras da competência respeitantes à forma do processo ou do valor da causa (art. 110º/2 CPC), ou seja, do disposto nos arts. 48º e 49º LOTJ. Como a competência em razão do valor da causa (art. 49º LOTJ) se reflecte na competência do Tribunal de círculo (art. 81º LOTJ) e do Tribunal singular (art. 83º LOTJ), o art. 110º/2 (a incompetência em razão do valor da causa ou da forma de processo aplicável é sempre do conhecimento oficioso do tribunal, seja qual for a acção em que se suscite) CPC, engloba igualmente a violação da competência destes Tribunais. Finalmente, a incompetência relativa deve ser apreciada oficiosamente nos processos em que não se verifique a citação do demandado ou requerido (art. 110º/1-b CPC), ou seja, nos processos que não constam da lista do art. 234º/4 CPC, e nas causas que, por lei, devam correr como dependência de outro processo (art. 110º/1-c CPC), como sucede, por exemplo, com o incidente de habilitação (art. 372º/2 CPC). A decisão de procedência sobre a incompetência relativa determina, em regra, a remessa do processo para o Tribunal competente (art. 111º/3 CPC). Exceptua-se a hipótese de a incompetência resultar da violação de um pacto privativo de jurisdição, dado que o Tribunal português não pode enviar o processo para o Tribunal estrangeiro competente: neste caso, a consequência desta excepção dilatória, não podendo ser a referida remessa, é a absolvição do réu da instância (art. 111º/3 in fine CPC). 27. Preterição de Tribunal Arbitral

A preterição de Tribunal Arbitral resulta da infracção da competência de um Tribunal Arbitral que tem competência exclusiva para apreciar um determinado objecto. A preterição pode verificar-se quando um Tribunal Arbitral necessário, quando for proposta num Tribunal comum uma acção que pertence à competência de um Tribunal Arbitral imposto por lei (art. 1525º - se o julgamento Arbitral for prescrito por lei especial, atender-se-á ao que nesta estiver determinado. Na falta de determinação, observar-se-á o disposto nos artigos seguintes – CPC), ou quando a um Tribunal Arbitral voluntário, quando for instaurada num Tribunal comum uma acção que devia ter sido proposta num Tribunal Arbitral convencionado pelas partes (art. 1º LAV). QUESTÕES RELATIVAS ÀS PARTES PERSONALIDADE JUDICIÁRIA CAPACIDADE JUDICIÁRIA REPRESENTAÇÃO JUDICIÁRIA INCAPACIDADE JUDICIÁRIA E VÍCIOS DA JUDICIÁRIA LITISCONSÓRCIO INICIAL: MODALIDADES LITISCONSÓRCIO INICIAL: CONSEQUÊNCIAS

REPRESENTAÇÃO

PERSONALIDADE JUDICIÁRIA 28. Noção A personalidade judiciária é a susceptibilidade de ser parte processual (art. 5º/1 CPC). Só pode ser parte processual quem tiver personalidade jurídica. 29. Critérios atributivos A personalidade judiciária é atribuída em função do critério da coincidência, da diferenciação patrimonial, da afectação do acto e da protecção de terceiros. a) Critério da coincidência: A personalidade judiciária é concedida a todas as pessoas jurídicas, singulares ou colectivas (art. 5º/2 CPC). Assim, todo o ente juridicamente personalizado tem igualmente personalidade judiciária, activa ou passiva. Relativamente a estrangeiros, há que considerar o art. 26º/1 CC, segundo o qual o início e o termo da personalidade judiciária são fixados pela lei pessoal de cada indivíduo, que é a lei da sua nacionalidade (art. 31º/1 CC) ou, se o indivíduo for apátrida, a lei do lugar onde ele tiver a sua residência habitual ou, se for menor ou interdito, o seu domicílio legal (art. 32º/1 CC). Quanto às pessoas colectivas (excepto sociedade comerciais), a sua lei pessoal é a do Estado onde se encontra situada a sede principal e efectiva da sua administração (art. 33º/1 CC) ou, se for uma pessoa colectiva internacional, a designada na convenção que a criou ou nos respectivos estatutos ou, na sua falta, a do país onde estiver a sede principal (art. 34º CC). As sociedades comerciais têm como lei pessoal a lei do Estado onde se encontre situada a sede principal e efectiva da sua administração (art. 3º/1, 1ª parte. CSC). b) Critério da diferenciação patrimonial: A personalidade judiciária é atribuída a determinados patrimónios autónomos (art. 6º CPC): a) A herança jacente e os patrimónios autónomos semelhantes cujo titular não estiver determinado;

b) c) d)

As associações sem personalidade jurídica e as comissões especiais; As sociedades civis; As sociedades comerciais, até à data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem, nos termos do artigo 5º do Código das Sociedades Comerciais; e) O condomínio resultante da propriedade horizontal, relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador. f) Os navios, nos casos previstos em legislação especial. Em certos casos, além do património autónomo, podem ser demandadas outras partes. A enumeração constante no art. 6º CPC, não deve ser considerada taxativa. Não se deve excluir que outros patrimónios autónomos também possam ter personalidade judiciária: é o caso, por exemplo, do Estabelecimento Individual de Responsabilidade Limitada, regulado pelo DL 248/86, de 25/8. c) Critério da afectação do acto: Têm personalidade judiciária as sucursais, agências, filiais, delegações ou representações de uma pessoa colectiva relativamente a actos que por elas tenham sido praticados (art. 7º/1 CPC). Quer dizer: quem praticou o acto pode igualmente estar em juízo quanto à acção que o tenha por objecto ou fundamento. 30. Falta de personalidade judiciária Quando a acção foi indevidamente instaurada pela ou contra a sucursal, agencia, filial, delegação ou representação, a falta da sua personalidade judiciária é sanável mediante a ratificação ou repetição pela administração principal dos actos praticados por aquelas entidades (art. 8º - a falta de personalidade judiciária das sucursais, agências, filiais, delegações ou representações pode ser sanada mediante a intervenção da administração principal e a ratificação ou repetição do processado – CPC). Quando a acção foi proposta pelo representante de uma parte falecida ou contra uma parte falecida, esta falta de personalidade judiciária cessa com a habilitação dos sucessores (art. 371º CPC) ou da herança jacente (art. 6º-a CPC). A falta não sanada de personalidade judiciária é uma excepção dilatória nominada (art. 494º-c CPC) que é de conhecimento oficioso (art. 495º CPC). Os seus efeitos são os seguintes: Se houver despacho de citação (art. 234º/4 CPC) e se essa excepção for sanável (art. 8º CPC), ela justifica o indeferimento liminar da petição inicial (art. 234º-A/1 CPC); Se a falta de personalidade judiciária for conhecida no despacho saneador, ela conduz à absolvição do réu da instância (arts. 494º-c, 493º/2, 288º/1-c CPC), mas, quando ela for sanável (art. 8º CPC), o Tribunal deve procurar, antes de proferir qualquer absolvição da instância, que a administração principal realize essa sanação (art. 265º/2 CPC).

CAPACIDADE JUDICIÁRIA 31. Noção A capacidade judiciária é a susceptibilidade de a parte estar pessoal e livremente em juízo ou de se fazer representar por representante voluntário (art. 9º/1 – a capacidade judiciária consiste na susceptibilidade de estar, por si, em juízo – CPC). Assim, não possuem capacidade judiciária quer os que podem intervir pessoal mas não livremente (os inabilitados), quer os que não podem actuar nem pessoal, nem livremente (os menores e os inabilitados). 32. Aferição A capacidade judiciária é aferida pela capacidade de exercício para a produção dos efeitos decorrentes da acção pendente (art. 9º/2 – a capacidade judiciária tem por base e por medida a capacidade do exercício de direitos – CPC). O que revela para essa aferição é a capacidade de exercício quanto a esses efeitos e não quanto à prática do acto que constitui ou integra o objecto do processo. Exceptuam-se do âmbito da incapacidade judiciária os actos que o incapaz pode excepcionalmente praticar pessoal e livremente (art. 10º/1 in fine – os incapazes só podem estar em juízo por intermédio dos seus representantes, ou autorizados pelo seu curador, excepto quanto aos actos que possam exercer pessoal e livremente – CPC). A capacidade judiciária dos estrangeiros e apátridas (que depende, da sua capacidade de exercício, art. 9º/2 CPC) determina-se pela sua lei pessoal (art. 25º CC). Essa lei é a da sua nacionalidade (art. 31º/1 CC) ou, no caso dos apátridas, a do lugar onde tiverem a residência habitual ou, na hipótese da sua menoridade ou interdição, a do domicílio legal (art. 32º/1 CC). 33. Meios de suprimento A incapacidade judiciária é suprida mediante assistência e representação (art. 10º/1 – os incapazes só podem estar em juízo por intermédio dos seus representantes, ou autorizados pelo seu curador, excepto quanto aos actos que possam exercer pessoal e livremente – CPC). A assistência por curador supre a incapacidade dos inabilitados (art. 153º/1 CC): a autorização do curador é necessária para os actos praticados pelo inabilitado quando seja parte activa ou passiva, embora, como o inabilitado pode estar pessoalmente em juízo, ele possa intervir em qualquer acção e deva ser citado quando seja réu (art. 13º/1 – os inabilitados podem intervir em todas as acções em que sejam partes e devem ser citados quando tiverem a posição de réus, sob pena de se verificar a nulidade correspondente à falta de citação, ainda que tenha sido citado o curador – CPC). A representação legal do menor cabe aos progenitores (arts. 124º e 1877º CC), ao tutor (arts. 124º e 1921º/1 CC) ou ao administrador de bens (art. 1922º CC). A representação legal do interdito incumbe ao tutor (art. 139º CC). Se houver representação legal do inabilitado quanto à administração de um património, a sua representação incumbe ao curador (art. 154º/1 CC).

A representação legal do menor, interdito ou inabilitado pode caber a um curador ad litem (ou provisório), que é um representante cujos os poderes estão limitados a uma determinada acção. Utiliza-se a representação pelo curador ad litem em dois casos: quando o incapaz não tem representante legal (art. 11º/1 CPC); e quando, apesar de o ter, ele está impossibilitado de exercer a representação (art. 11º/3 CPC). A nomeação do curador ad litem pode ser requerida quando o incapaz não tiver representante legal, situação que pode ser verificada antes do início da causa ou na sua pendência. O curador provisório também pode ser nomeado quando o representante (ou os representantes) do incapaz estiver impossibilitado de exercer os seus poderes de representação. Isso pode suceder em várias eventualidades: Quando, na pendência da causa, os progenitores não acordam na orientação da defesa dos interesses do menor representado (art. 12º/2/3 CPC); Quando os interesses do incapaz se opõem aos interesses do seu representante ou aos interesses de outro representado pelo mesmo representante (art. 1329º/1 CPC; arts. 1846º/3, 1881º/2, 1956º-c CC); Quando o representante for parte conjuntamente com o representado (art. 1846º/1 e 3 CC) Em ambos os casos, a nomeação do curador provisório pode ser requerida pelo Ministério Público ou por qualquer parente sucessível, se incapaz for autor, ou por esta parte, se incapaz for réu (art. 11º/4 CPC). O Ministério Público deve ser ouvido, sempre que não seja o requerente (art. 11º/5 CPC) e a nomeação do curador ad litem compete ao juiz da causa (art. 11º/1 e 3 CPC). Se o incapaz não deduzir oposição, a defesa incumbe ao Ministério Público ou, se ele representar o autor, a um defensor oficioso (art. 15º/1/2 CPC): é a chamada sub-representação. Assim, antes de o réu incapaz se considerar na situação de revelia por falta de contestação do seu representante legal, deve ser facultada ao Ministério Público a possibilidade de deduzir oposição. Como a sub-representação pelo Ministério Público ou pelo defensor oficioso cessa logo que seja constituído mandatário judicial ao incapaz (art. 15º/3 CPC), pode concluir-se que o seu regime nunca é instituído se o incapaz tiver mandatário judicial. 34. Regime de suprimento a) Menores: Nos menores, a incapacidade judiciária é suprida pelo poder paternal, pela tutela e pela administração de bens (art. 124º e 1992º CC). O poder paternal é exercido por ambos os progenitores (art. 1901º/1 CC), pelo que ambos devem estar de acordo quanto à propositura da acção (art. 10º/2 CPC) e ambos devem ser citados quando o menor seja réu (art. 10º/3 CPC). Se houver desacordo dos progenitores acerca da conveniência de propor a acção, pode qualquer deles requerer ao Tribunal competente a resolução do conflito (art. 12º/1 CPC). Esse Tribunal é o de Família (art. 61º/1-d LOTJ; art. 146º-d OTM) e o processo é previsto no art. 184º OTM. Se algum dos progenitores tiver sido preterido na representação do menor – isto é, se este for representado por um único deles – o progenitor preterido deve ser notificado para que venha ao processo ratificar, no prazo fixado, os actos realizados pelo outro progenitor (art. 23º/3, 1ª parte CPC). Se, nessa

ocasião, se verificar um desacordo entre os progenitores, aplica-se à resolução desse conflito o regime constante do art. 12º CPC (art. 23º/3, 2ª parte CPC). Para determinados actos, os progenitores necessitam, conforme se dispõe no art. 1889º CC, de autorização do Tribunal (de Família, art. 61º/1-g LOTJ; art. 146º-g OTM), são eles nomeadamente: A representação de bens do menor (art. 1889º/1-a CC); A representação do menor na transacção ou na convenção de arbitragem referida aos mesmos actos (art. 1889º/1-o CC) e ainda, por maioria de razão, na desistência e confissão do pedido; A representação do menor para convencionar ou requerer em juízo a divisão de coisa comum ou a liquidação e partilha de patrimónios sociais (art. 1889º/1-n CC). O menor fica sujeito a tutela se os progenitores não puderem exercer o poder paternal (art. 1921º CC). O tutor necessita de autorização judicial em todas as situações em que ela é exigida aos progenitores (arts. 1935º/1 e 1938º/1-a CC) e ainda para propor qualquer acção, salvo se ela for destinada à cobrança de prestações periódicas ou se a demora na sua propositura for susceptível de causar prejuízos ao menor (art. 1938º/1-e CC). O administrador de bens (instituído nos casos previstos no art. 1922º CC) tem, os mesmos direitos e obrigações do tutor (art. 1971º/1 CC), pelo que necessita de autorização judicial nas mesmas situações em que dela carece o tutor (art. 1938º/1-a-e CC). b) Interditos: A incapacidade judiciária dos interditos é suprida pela tutela e pela administração de bens (art. 139º CC), cujos regimes são idênticos aos do suprimento da incapacidade do menor. c) Inabilitados: A incapacidade judiciária dos inabilitados é suprida através da curatela (arts. 153º/1, 154º/1 CC). A curatela incumbe ao curador, que pode intervir ao regime de assistência ou de representação. O curador assiste o inabilitado quanto aos actos que forem especificados na sentença de inabilitação (art. 153º/1 CC); o curador representa o inabilitado nos actos de administração do seu património (art. 154º/1 CC). Para instaurar quaisquer acções em representação do inabilitado, o curador está sujeito ao regime do tutor do interdito (art. 156º, 1938º/1-a-e CC). Mesmo quando o inabilitado seja representado pelo curador, aquele incapaz pode intervir na acção proposta em seu nome e deve ser citado quando seja réu (art. 13º/1 CPC). Em caso de divergência entre o curador e o inabilitado, prevalece a orientação daquele representante (art. 13º/2 CC).

REPRESENTAÇÃO JUDICIÁRIA 35. Noção A representação judiciária é a representação de entes que estão submetidos a uma representação orgânica ou que podem ser representados pelo Ministério Público. 36. Regime a) Estado: O Estado é representado pelo Ministério Público, sem prejuízo dos casos em que seja permitida a representação por mandatário judicial próprio (art. 20º/1 CPC) ou em que as entidades autónomas possam constituir advogado que intervenha no processo conjuntamente com o Ministério Público (art. 20º/2 CPC). Segundo o disposto no art. 4º/1 LOMP, o Ministério Público é representado no Supremo Tribunal de Justiça pelo Procurador-geral da República, nas Relações por Procuradores-Gerais-Adjuntos e nos Tribunais de 1ª instância por Procuradores da República e Delegados do Procurador da República. b) Pessoas colectivas e sociedades: Sobre a representação das pessoas colectivas e das sociedades, há que distinguir entre as acções dessas entidades com terceiros e as causas entre elas e o seu representante. Nas acções com terceiros, as pessoas colectivas e as sociedades são representadas por quem a lei, os estatutos ou o pacto social designarem (art. 21º/1 CPC). As sociedades em nome colectivo e as sociedades por quotas são representadas pelos gerentes, as sociedades anónimas pelo conselho de administração e as sociedades em comandita pelos sócios comanditados gerentes. Nas acções entre pessoa colectiva ou a sociedade e o seu representante, aquelas entidades são representadas por um curador ad litem (art. 21º/2 CPC). Este regime justifica-se pela impossibilidade de o representante assumir, nesse caso, as suas funções de representação. c) Incapazes e ausentes: Os incapazes e ausentes são representados pelo Ministério Público em todas as acções que se mostrem necessárias à tutela dos seus direitos e interesses (art. 17º/1 CPC; art. 5º/1-c LOMP). A representação pelo Ministério Público cessa se for constituído mandatário judicial do incapaz ou ausente ou se, tendo o respectivo representante legal deduzido oposição a essa representação, o juiz, ponderado interesse do representado, a considerar procedente (art. 17º/2 CPC; art. 5º/3 LOMP). d) Incertos: Quando a acção seja proposta contra incertos, por o autor não ter a possibilidade de identificar os interessados directos em contradizer, eles são representados pelo Ministério Público (art. 16º/1 CPC; art. 5º/1-c LOMP), excepto se este representar o autor, caso em que é nomeado um defensor oficioso para servir como agente especial do Ministério Público naquela representação (art. 16º/2 CPC). Esta representação cessa quando os citados

como incertos se apresentam para intervir como réus e a sua legitimidade se encontrar reconhecida (art. 16º/3 CPC). e) Pessoas judiciárias: As pessoas judiciárias – isto é, as entidades que só possuem personalidade judiciária – são representadas da seguinte forma: A herança jacente, por um curador (art. 22º CPC; art. 2048º/1 CC); As associações sem personalidade judiciária, pelo órgão da administração (art. 22º CPC; art. 195º/1 CC); As comissões especiais pelos administradores (art. 22º CPC; art. 996º/1 CC); As sociedades comerciais não registadas, pelas pessoas a que as cláusulas do contrato atribuam a representação (art. 22º CPC); O condomínio, pelo administrador (art. 22º CPC; art. 1437º/2 CC); As sucursais ou equivalentes, pelos directores, gerentes ou administradores (art. 22 CPC).

INCAPACIDADE JUDICIÁRIA E VÍCIOS DA REPRESENTAÇÃO JUDICIÁRIA 37. Incapacidade judiciária lato sensu O não suprimento da incapacidade judiciária pelo representante legal ou pelo curador determina a incapacidade strictu sensu da parte. O suprimento daquela incapacidade pode ainda ser afectado por uma irregularidade de representação, se o incapaz estiver representado ou assistido por sujeito diverso do verdadeiro representante ou curador, ou por uma falta de autorização, se o representante ou o curador do incapaz não tiver obtido a necessária autorização judicial. A incapacidade judiciária strictu sensu encontra-se prevista, como tal, nos arts. 23º/1, e 494º-c CPC; a irregularidade de representação nos arts. 23º/1, e 288º/1-c CPC, a falta de autorização ou deliberação nos arts. 25º/1, 288º/1-c, e 494º-d CPC. 38. Incapacidade judiciária strictu sensu A incapacidade judiciária strictu sensu pode verificar-se relativamente à parte activa ou à parte passiva: quanto ao autor, essa incapacidade existe quando o incapaz propõe uma acção sem a intervenção do seu representante legal ou a assistência do seu curador; quanto ao réu, essa incapacidade surge quando é proposta uma acção legal contra um incapaz sem a indicação pelo autor do representante legal ou do curador daquele demandado. Logo que o juiz se aperceba da incapacidade judiciária strictu sensu, incumbe-lhe, oficiosamente e a todo o tempo, providenciar pela regularização da instância (art. 24º/1, 265º/2 CPC). Essa incapacidade sana-se mediante a intervenção ou a citação do representante ou do curador do incapaz. Quanto à actividade exigida ao Tribunal para procurar obter a sanação desse vício, há que considerar duas situações (art. 24º/2 CPC): Se o vício afectar a parte passiva, o Tribunal deve ordenar a citação do réu e quem o deva representar, para que este ratifique ou renove o processado anteriormente; Se o vício respeitar à parte activa, o Tribunal deve ordenar, para esse mesmo efeito, a notificação de quem a deva representar. A incapacidade fica sanada se o representante do incapaz ratificar os actos anteriormente praticados no processo ou se os renovar no respectivo prazo (art. 23º/2 CPC). Se o representante não ratificar nem renovar os actos praticados, a incapacidade não se pode considerar sanada, importando verificar quais as consequências daí decorrentes. Elas são distintas consoante o vício afecte a parte activa ou passiva. Se o representante do autor não sanar a incapacidade, o processo não pode continuar quando esse vício afectar a própria petição inicial: neste caso, releva a falta de um pressuposto processual e réu deve ser absolvido da instância (arts. 494º-c, 493º/2, 288º/1-c CPC). Mas se o representante do réu não sanar a incapacidade, então falta apenas um pressuposto de um acto processual e a contestação e os demais actos praticados pelo incapaz ficam sem efeito, pelo que se aplica ao incapaz, se ele não tiver mandatário judicial constituído, o regime da sub-representação (art. 15º/1 CPC).

Se o incapaz for autor e se o processo tiver sido anulado desde o início, o prazo de prescrição ou de caducidade, mesmo que já tenha terminado ou nos dois meses subsequentes à anulação, não se considera completado antes de findarem esses dois meses (art. 24º/3 CPC). É o regime que também resulta dos arts. 327º/3, 332º/1 CC. 39. Irregularidades de representação A irregularidade de representação verifica-se quando a parte, embora esteja representada ou assistida, não está pelo verdadeiro representante ou curador. O regime de sanação da irregularidade de representação é semelhante ao da incapacidade judiciária strictu sensu, tal como o são os efeitos da sua não sanação (arts. 23º e 24º CPC). 40. Falta de autorização ou deliberação Verifica-se a falta de autorização ou deliberação quando o representante legal ou o curador do incapaz não as tiver obtido antes de propor a acção ou de praticar o acto. É o que sucede quando, o representante de uma sociedade requerer, sem a necessária deliberação social, uma providência cautelar. Se a parte estiver devidamente representada, mas o seu representante não tiver obtido alguma autorização ou deliberação legalmente exigida, o Tribunal deve fixar oficiosamente o prazo dentro do qual o representante a deve obter, suspende-se entretanto a instância (arts. 25º/1, 265º/2 CPC, quanto ao tutor, art. 1940º/3 CC). As consequências da não sanação do vício são distintas consoante ele afecte o autor ou o réu. Se o vício não for sanado e respeitar à parte activa, falta um pressuposto processual, pelo que o réu é absolvido da instância (arts. 25º/1, 1ª parte, 494ºd, 493º/2, 288º/1-c CPC). Se a falta de autorização ou deliberação afectar o representante da parte passiva e não for sanada, a contestação fica sem efeito (art. 25º/2, 2ª parte CPC) e o incapaz beneficia da sub-representação do Ministério Público se não tiver mandatário judicial constituído (art. 15º/1 CPC).

LITISCONSÓRCIO INICIAL: MODALIDADES 41. Sistematização geral A pluralidade de partes que caracteriza o litisconsórcio coincide, em princípio, com uma pluralidade de titulares do objecto do processo. Pode assim dizer-se que, relativamente à legitimidade singular dos titulares daquele objecto, o litisconsórcio representa uma legitimidade de segundo grau, isto é, uma legitimidade que se demarca, através de critérios específicos, entre esses titulares, de molde a determinar as condições em que todos eles podem ou devem ser partes numa mesma acção. A legitimidade plural não é, por isso, um conjunto ou somatório de legitimidades singulares, mas uma realidade com características próprias. 42. Classificações O litisconsórcio é susceptível de várias classificações: pode-se classificá-lo quanto à origem, ao reflexo na acção e ao conteúdo da decisão, ou seja, podese atender, nessa classificação, ao momento da propositura da acção, às consequências da sua verificação na acção, ao momento do proferimento da decisão e ainda à posição dos litisconsortes. Dado que se referem a realidades distintas, essas classificações podem classificar-se entre si. a) Origem do litisconsórcio: Quanto à sua origem, o litisconsórcio pode ser: voluntário, todos os interessados podem demandar ou ser demandados, mas não se verifica qualquer ilegitimidade se não estiverem todos presentes em juízo ou; necessário, todos os interessados devem demandar ou ser demandados, originando a falta de qualquer deles uma situação de ilegitimidade. Assim, enquanto o litisconsórcio voluntário decorre exclusivamente da vontade dos interessados, o litisconsórcio necessário é imposto ao autor ou autores da acção. b) Reflexo na acção: Atendendo aos reflexos na acção, o litisconsórcio pode ser: simples, é aquele em que a pluralidade de partes não implica um aumento do número de oposições entre as partes; ou recíproco, é aquele em que a pluralidade de partes determina um aumento do número de oposições entre elas. c) Conteúdo da decisão: Atendendo ao conteúdo da decisão, o litisconsórcio pode ser: unitário, é aquele em que a decisão tem de ser uniforme para todos os litisconsortes; ou simples, pelo contrário, a decisão pode ser distinta para cada um dos litisconsortes. d) Posição das partes: Atendendo à posição das partes, o litisconsórcio pode ser: conjunto, verifica-se quando todos os litisconsortes activos formulam conjuntamente o pedido contra o demandado ou quando o autor formula o pedido conjuntamente contra todos os litisconsortes demandados; ou subsidiário, pressupõe que o objecto da causa só é apreciado em relação a um litisconsorte activo ou passivo se um outro autor ou réu não for considerado titular, activo ou passivo, desse mesmo objecto.

43. Litisconsórcio voluntário Sempre que existe uma pluralidade de interessados, activos ou passivos, opera, quanto à constituição do litisconsórcio, uma regra de coincidência, pois que a acção pode ser proposta por todos esses titulares ou contra eles (art. 27º/1, 1ª parte CPC). O litisconsórcio voluntário verifica-se por iniciativa da parte ou partes em causa: são os vários interessados que decidem instaurar a acção conjuntamente, é o autor da acção que resolve propor a acção contra vários réus e é esse autor ou o réu que opta por promover a intervenção de outras partes durante a pendência da acção. Apesar de o litisconsórcio voluntário se encontrar na disponibilidade das partes, que o podem constituir ou não, isso não significa que a sua constituição seja irrelevante, isto é, que a parte que o pode conformar possa conseguir os mesmos benefícios e vantagens com ou sem a sua conformação. a) Litisconsórcio comum: A parte que o conforma pretende apenas integrar determinados sujeitos no âmbito subjectivo do caso julgado, numa situação em que, sem a sua participação na acção, eles não ficariam abrangidos por ele. b) Litisconsórcio conveniente: A parte que o constitui visa alcançar uma vantagem que não poderia obter sem essa pluralidade de partes, activas ou passivas. Quer dizer: a constituição do litisconsórcio é uma condição indispensável para alcançar um certo resultado ou efeito. São vários os motivos que podem determinar o litisconsórcio conveniente. Este litisconsórcio verifica-se em relação a obrigações conjuntas, pois que, sem a participação de todos os credores ou devedores, a acção só pode ser procedente na quota-parte respeitante ao sujeito presente em juízo (art. 27º/1, 2ª parte CPC). 44. Litisconsórcio necessário No litisconsórcio necessário, todos os interessados devem demandar ou ser demandados. Os critérios que orientam a previsão do litisconsórcio necessário são essencialmente dois: o critério da indisponibilidade individual (ou da disponibilidade plural) do objecto do processo e o critério da compatibilidade dos efeitos produzidos. Aquele primeiro critério tem expressão no litisconsórcio legal e convencional; este último, no litisconsórcio natural. a) Litisconsórcio legal: O litisconsórcio necessário legal é aquele que é imposto pela lei (arts. 28º/1, 28º-A CPC). Quanto ao litisconsórcio necessário entre os cônjuges, há que analisar o disposto no art. 28º-A/1/2 CPC (acções que devem ser propostas por ambos os cônjuges) e 28º-A/3 CPC (acções que devem ser instauradas contra ambos os cônjuges). Relativamente à propositura da acção, o litisconsórcio entre os cônjuges é necessário quanto a direitos que apenas possam ser exercidos por ambos ou a bens que só possam ser administrados ou alienados por eles, incluindo a casa de morada de família (art. 28º-A/1 CPC). Para se saber quais são esses direitos e bens, há que distinguir entre as acções relativas a actos de administração e a actos de disposição.

Nas acções relativas a actos de administração, o litisconsórcio activo é necessário quanto aos actos de administração de bens comuns do casal (art. 1678º/3 in fine CC). Nas acções referidas a actos de disposição, o litisconsórcio activo é necessário quando o objecto do processo for nomeadamente, um acto de disposição de bens comuns administrados por ambos os cônjuges (art. 16628º/1 CC). Note-se que o litisconsórcio activo entre os cônjuges podem ser substituído pela propositura da acção por um deles com o consentimento do outro (art. 28º-A/1 CPC), o que constitui uma situação de substituição processual voluntária. Se o cônjuge não der o seu consentimento para a propositura da acção, o outro pode supri-lo judicialmente (art. 28-A/2 CPC), utilizando para tanto o processo regulado no art. 1425º CPC. Relativamente à demanda dos cônjuges, o litisconsórcio é necessário quando o objecto do processo for um facto praticado por ambos os cônjuges, uma divida comunicável, um direito que apenas pode ser exercido por ambos os cônjuges ou um bem que só por eles pode ser administrado ou alienado, incluindo a casa de morada de família (art. 28º-A/3 CPC). O litisconsórcio necessário definido pelo art. 28º-A/3 CPC, também pode operar depois da dissolução, declaração de nulidade ou anulação do casamento. b) Litisconsórcio convencional: O litisconsórcio necessário convencional, é aquele que é imposto pela estipulação das partes de um negócio jurídico (art. 28º/1 CPC). Para a determinação do âmbito deste litisconsórcio convencional há que analisar o regime das obrigações divisíveis e indivisíveis. Se a obrigação for divisível, o litisconsórcio é, em princípio voluntário, porque, se não estiverem presentes todos os interessados activos e passivos, o Tribunal conhece apenas da quota-parte do interesse ou da responsabilidade dos sujeitos presentes em juízo (art. 27º/1, 2ª parte). Assim, quanto a uma obrigação divisível, o litisconsórcio só é necessário se as partes estipulam que o seu cumprimento apenas é exigível por todos os credores ou a todos os devedores. Quanto à obrigação indivisível (por natureza, estipulação legal ou convenção das partes), há que distinguir entre a pluralidade de devedores e a de credores. Se forem vários os devedores, o art. 535º/1 CC, estipula que o cumprimento só pode ser exigido de todos eles, pelo que, quanto a esta hipótese, vale um litisconsórcio necessário legal e, por isso, o caso não se pode enquadrar no litisconsórcio convencional. Pelo contrário, se houver uma pluralidade de credores, o art. 538º/1 CC, dispõe que qualquer deles pode exigir a prestação por inteiro, resultando daí que, na falta de estipulação das partes, o litisconsórcio de vários credores de uma obrigação indivisível é meramente voluntário. Por isso, relativamente a uma obrigação indivisível, o litisconsórcio necessário convencional só se verifica se for estipulado que essa obrigação apenas pode ser exigida por todos os credores. c) Litisconsórcio natural: O litisconsórcio necessário natural, é aquele que é imposto pela realização do efeito útil normal da decisão do Tribunal (art. 28º/2 CPC). A concretização deste referido efeito útil normal suscita muitas dificuldades.

Pode entender-se que o litisconsórcio natural só existe quando a repartição dos vários interessados por acções distintas impeça uma composição definitiva entre as partes da causa. Mas também pode defender-se que o litisconsórcio é natural não só quando a repartição dos interessados por acções diferentes impeça a composição definitiva entre as partes, mas também quando a repartição dos interessados por acções distintas possa obstar a uma solução uniforme entre todos os interessados. Segundo a definição legal do art. 28º/2, 2ª parte CPC, o efeito útil normal é atingido quando sobrevem uma regulação definitiva da situação concreta das partes (e só delas) quanto ao objecto do processo. De acordo com a mesma definição, o efeito útil normal pode ser conseguido ainda que não estejam presentes todos os interessados ou, dito de outra forma a ausência de um deles nem sempre constitui um obstáculo a que esse efeito possa ser atingido: é o que resulta do facto de nessa definição se admitir expressamente a não vinculação de todos os interessados. Assim, deve concluir-se que decorre do art. 28º/2, 2ª parte CPC, que, na determinação do litisconsórcio, releva apenas a eventualidade de a sentença não compor definitivamente a situação jurídica das partes, por esta poder ser afectada pela solução dada numa outra acção entre outras partes. 45. Litisconsórcio unitário O litisconsórcio unitário é aquele em que a decisão do Tribunal tem de ser uniforme para todos os litisconsortes. Este litisconsórcio corresponde a situações em que o objecto do processo é um interesse indivisível, pelo que sobre ele não podem ser proferidas decisões divergentes. A uniformidade do objecto, quer de uma relação de prejudicialidade entre vários objectos. São pensáveis situações de litisconsórcio unitário voluntário. Se, por exemplo, vários comproprietários propuserem uma acção de reivindicação contra um detentor, o litisconsórcio é voluntário, porque a acção podia ter sido proposta por um único dos comproprietários (art. 1405º/2 CC), mas é igualmente unitário, porque a causa não pode ser julgada procedente quanto a um dos comproprietários e improcedente quanto a um qualquer outro. O litisconsórcio unitário também pode ser necessário. Suponha-se que o presumido pai instaura, contra o filho e a mãe, uma acção de impugnação da paternidade; esse litisconsórcio é necessário (art. 1846º/1 CC) e unitário, porque essa acção de impugnação só pode ser procedente ou improcedente simultaneamente contra ambos os demandados. Convém acentuar, no entanto, que nem todo o litisconsórcio necessário é unitário. Por exemplo: se as partes estipulam que a dívida só pode ser exigida de ambos os devedores e se, portanto, construíram uma situação de litisconsórcio necessário convencional (art. 28º/1 CPC), isso não impede que, se um dos devedores demandados puder invocar contra o credor a extinção da sua quota-parte da dívida, um dos réus seja condenado e o outro seja absolvido do pedido. O litisconsórcio unitário releva no momento do proferimento da decisão, pois que ele implica o proferimento de uma mesma decisão para todos os litisconsortes. Note-se que o litisconsórcio unitário não impõe, em si mesmo, a presença de nenhum interessado em juízo, pelo que só há que garantir a

uniformidade da decisão relativamente aos litisconsortes que se encontrem na acção no momento do seu proferimento. Esses litisconsortes podem não ser as partes iniciais da acção, quer porque algumas delas se afastaram da acção, quer porque alguns terceiros intervieram nela durante a sua pendência. 46. Litisconsórcio subsidiário e alternativo Segundo o disposto no art. 31º-B CPC, é admitida a formulação subsidiária do mesmo pedido por autor ou contra réu diverso do que demanda ou é demandado a título principal, desde que exista uma dúvida fundamentada sobre o sujeito do objecto do processo. Isto significa que é admissível tanto um litisconsórcio em que um dos autores só será reconhecido como titular activo de uma situação jurídica se um outro demandante não o for, como um litisconsórcio em que se pede que um dos réus seja condenado se a acção não for procedente quanto a um outro demandado. A admissibilidade do litisconsórcio subsidiário coloca o problema de saber se é sempre exigível que um dos autores se apresente numa posição subsidiária perante uma outra ou se é necessário que o autor defina como subsidiário um dos demandados. Isto é, importa averiguar se o autor, em vez de se colocar numa posição subsidiária perante um outro demandante, se pode apresentar numa relação de alternatividade com ele ou se o autor, em vez de demandar um réu numa posição subsidiária, pode demandar em alternativa vários réus. Não parece que a atribuição por um dos autores de uma posição de subsidiariedade perante um outro demandante ou que a concessão pelo autor de uma idêntica posição a um dos demandados corresponda a um ónus dessa parte. Na mesma situação de dúvida sobre o titular do objecto do processo (art. 31º-B in fine CPC), parece admissível que nenhum dos autores se coloque na posição de subsidiariedade perante o outro e que nenhum dos réus seja qualificado como subsidiário, podendo antes os vários autores ou réus apresentar-se ou ser apresentados numa relação de alternatividade. LITISCONSÓRCIO INICIAL: CONSEQUÊNCIAS 47. Constituição do litisconsórcio O litisconsórcio voluntário encontra-se na disponibilidade da parte, que o pode constituir ou não. Diferentemente, o litisconsórcio necessário não permite qualquer opção da parte, pois que a acção tem de ser proposta por todos ou contra todos os interessados. Importa assim determinar como pode uma parte ultrapassar uma recusa dos demais interessados em proporem, conjuntamente com ela, a acção: tem-se entendido que essa parte pode instaurar sozinha a acção e, simultaneamente, requerer a intervenção principal, como autores dos demais interessados. A pluralidade de partes relativamente às quais o litisconsórcio é imposto pode ser activa ou passiva. Normalmente, o litisconsórcio é imposto a uma pluralidade de autores ou a um autor relativamente a uma pluralidade de réus. Mas o litisconsórcio também pode ser imposto a uma pluralidade de réus ou a um réu quanto a uma pluralidade de autores. Quanto aos efeitos da sua não constituição, no caso do litisconsórcio voluntário verifica-se apenas o desaproveitamento de certos benefícios ou

vantagens, mas na sua hipótese do litisconsórcio necessário conforma-se a ilegitimidade da parte (activa ou passiva) que está em juízo desacompanhada dos demais interessados (art. 28º/1 CPC). A ilegitimidade proveniente da preterição de litisconsórcio necessário é sanável, embora haja que distinguir o litisconsórcio relativo aos cônjuges das demais hipótese. No litisconsórcio entre os cônjuges, a ilegitimidade activa é sanável mediante a obtenção do consentimento do outro cônjuge ou o seu suprimento (art. 28º-A/2 CPC); a ilegitimidade passiva é sanável através da intervenção principal do cônjuge não presente, provocada quer pelo autor da acção (art. 269º/1 CPC), mesmo nos 30 dias subsequentes ao trânsito em julgado da decisão de absolvição da instância (art. 269º/2 CPC), quer pelo cônjuge demandado (art. 325º/1 CPC). Nas demais situações de litisconsórcio necessário, a ilegitimidade (activa ou passiva) é sanável mediante a intervenção principal provocada da parte cuja falta gera ilegitimidade (art.. 269º/1 CPC). Essa intervenção é admissível mesmo depois do trânsito em julgado do despacho saneador que apreciou a ilegitimidade, situações em que a instância se renova (art. 269º/2 CPC). 48. Posição dos litisconsortes O art. 29º estabelece a seguinte diferença entre o litisconsórcio voluntário e o necessário: enquanto no litisconsórcio necessário as partes se apresentam externamente como a única parte (art. 29º, 1ª parte CPC), no litisconsórcio voluntário as partes mantêm uma posição de autonomia (art. 29º, 2ª parte CPC). Assim, segundo este critério, as partes de um litisconsórcio necessário comungam de um destino comum e as de um litisconsórcio voluntário mantêm uma posição de autonomia. A distinção estabelecida no art. 29º CPC, justifica os diferentes regimes que se encontram na lei em matéria de falta de citação (art. 197º CPC), de separação do pedido reconvencional que envolve a intervenção de terceiros (art. 274º/5 CPC), de confissão, desistência ou transacção (art. 298º CPC), de aproveito do recurso interposto por um dos litisconsortes (art. 683º/1 CPC) e de exclusão pelo recorrente de algum dos litisconsortes vencedores (art. 684º/1 CPC). Uma outra consequência da autonomia entre os litisconsortes voluntários encontra-se no decurso dos prazos processuais, que correm separadamente para cada uma das partes. A comunidade constituída pelas partes de um litisconsórcio necessário verifica-se também quanto aos pressupostos processuais, no sentido de que esse litisconsórcio exige que eles estejam preenchidos em relação a todos os litisconsortes. Na verdade, se faltar um dos pressupostos que afecta um dos litisconsortes e se isso determina a sua absolvição da instância, e os demais litisconsortes deverão ser absolvidos por ilegitimidade, dado que aquela absolvição os tornou partes ilegítimas; se o litisconsórcio se verificar na parte activa, é o réu que deverá ser absolvido da instância, com base na ilegitimidade dos autores. Nem sempre releva, quanto à posição recíproca das partes, a distinção entre o litisconsórcio voluntário e necessário. A origem do litisconsórcio também é irrelevante quanto ao aproveitamento da contestação de um dos litisconsortes, pois que esta aproveita sempre aos demais réus, não relevando se o litisconsórcio é necessário ou voluntário (art.

485º-a CPC). Idêntica extensão vale, por maioria de razão, para o caso de algum dos litisconsortes não cumprir o ónus de impugnação (art. 490º/1 CPC): também nesta hipótese o litisconsorte que não impugnou certo facto beneficia da sua impugnação por um outro réu. 49. Decisão da acção O art. 29º CPC, estabelece que, no litisconsórcio necessário, as partes se apresentam externamente como uma única parte e que, no litisconsórcio voluntário, elas mantêm uma posição de autonomia. Esta distinção parece concretizar-se em algumas disposições de autonomia. Esta distinção parece concretizar-se em algumas disposições avulsas. Assim, no litisconsórcio voluntário, cada parte pode desistir ou confessar a quota-parte do pedido ou transigir sobre essa quota-parte (art. 298º/1 CPC), o recurso interposto por alguma das partes vencidas não aproveita, em regra, aos não recorrentes (art. 683º/1 CPC) e o recorrente pode exclui do recurso alguma das partes vencedoras (art. 684º/1 CPC); em contrapartida, no litisconsórcio necessário, a confissão, desistência ou transacção só podem ser realizadas com a intervenção de todos os litisconsortes (art. 298º/2 CPC), o recurso interposto por qualquer dos litisconsortes aproveita sempre aos demais (art. 683º/1 CPC) e o recorrente nunca pode excluir nenhum dos litisconsortes vencedores (art. 684º/1 CPC). Aparentemente, este regime demonstra que, no litisconsórcio voluntário, a decisão pode ser diversa para cada um dos litisconsortes e que, no litisconsórcio necessário, tal nunca se pode verificar.

AS FORMAS DE COMPOSIÇÃO DA ACÇÃO COMPOSIÇÃO PROVISÓRIA: PROVIDÊNCIAS CAUTELARES 50. Aspectos gerais Nem sempre a regulação dos interesses conflituantes pode aguardar o proferimento da decisão do Tribunal que resolve, de modo definitivo, aquele conflito. Por vezes, torna-se necessário obter uma composição provisória da situação controvertida antes do proferimento da decisão definitiva. Essa composição justifica-se sempre que ela seja necessária para assegurar a utilidade e a efectividade da tutela jurisdicional (art. 2º/2, in fine CPC) e, na medida em que contribui decisivamente para o êxito dessa tutela, encontra o seu fundamento constitucional na garantia do acesso ao direito e aos Tribunais (art. 20º/1 CRP). A composição provisória realizada através das providências cautelares pode prosseguir uma de três finalidades: ela pode justificar-se pela necessidade de garantir um direito, toma-se providências que garantem a utilidade da composição definitiva; de definir uma regulação provisória, as providências definem uma situação provisória ou transitória; ou de antecipar a

tutela pretendida ou requerida, as providências atribuem o mesmo que se pode obter na composição definitiva. As providências cautelares fornecem uma composição provisória. A provisoriedade destas providências resulta quer da circunstância de elas corresponderem a uma tutela que é qualitativamente distinta daquela que é obtida na acção principal de que são dependentes (art. 383º/1 CPC), quer a sua necessária substituição pela tutela que vier a ser definida nessa acção. A tutela processual é instrumental perante as situações jurídicas decorrentes do direito substantivo, porque o direito processual é o meio de tutela dessas situações. A composição provisória realizada através das providências cautelares não deixa de se incluir nessa instrumentalidade, porque ela também serve os fins gerais de garantia que são prosseguidos pela tutela jurisdicional. Não, contudo, de uma forma imediata, porque aquela composição provisória destina-se a garantir a eficácia e a utilidade da própria tutela processual, pelo que é instrumental perante esta tutela e só mediante as próprias situações jurídicas. O objecto da providência cautelar não é a situação jurídica acautelada ou tutelada, mas, consoante a sua finalidade, a garantia da situação, a regulação provisória ou a antecipação da tutela que for requerida no respectivo procedimento. Para atingir a finalidade de evitar a lesão ou a sua continuação, a composição provisória tem de ser concedida com celeridade: as vantagens dessa composição serão tanto maiores quanto mais cedo ela puder garantir o direito, regular provisoriamente a situação ou antecipar a composição definitiva. Por isso, as providências cautelares implicam necessariamente uma apreciação sumária (summaria cognitio) da situação através de um procedimento simplificado e rápido. A summaria cognitio justifica que certas providências cautelares possam ser decretadas sem a prévia audição da contraparte, isto é, sem ser concedida a esta parte o uso do contraditório. Esta possibilidade – que é coberta pelo desvio ao princípio do contraditório admitido pelo art. 3º/2 CPC – encontra-se prevista em dois níveis: num deles, proíbe-se a audição do requerido (arts. 394º e 408º/1 CPC; 1279º CC); no outro, permite-se (mas não se impõe) que a providência seja decretada sem a audição do requerido (art. 385º/1 CPC). Aos procedimentos cautelares são subsidiariamente aplicáveis as disposições gerais sobre os incidentes da instância (art. 384º/3 CPC). Existem, todavia, algumas especialidades, mesmo nos procedimentos onde são apreciadas as providências comuns. Os procedimentos cautelares constituem uma das situações em, que a citação do réu depende de prévio despacho judicial (art. 234º/4-b CPC). Por conseguinte, o juiz, em vez de ordenar a citação, pode indeferir liminarmente o requerimento, quando o pedido seja manifestamente improcedente ou ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias insanáveis e de que o juiz deva conhecer oficiosamente (art. 234º-A/1 CPC). 51. Pressupostos A necessidade da composição provisória decorre do prejuízo que a demora na decisão da causa e na composição definitiva provocaria na parte cuja situação jurídica merece ser acautelada ou tutelada. A finalidade específica das providências cautelares é, por isso, a de evitar a lesão grave e dificilmente

reparável (art. 381º/1 CPC) proveniente da demora na tutela da situação jurídica, isto é, obviar ao chamado periculum in mora. Esse dano é aquele que seria provocado quer por uma lesão iminente quer pela continuação de uma lesão em curso, ou seja, de uma lesão não totalmente consumada. Se faltar o periculum in mora, ou seja, se o requerente da providência não se encontrar, pelo menos, na iminência de sofrer qualquer lesão ou dano, falta a necessidade da composição provisória e a providência não pode ser decretada. Quer dizer: esse periculum é um elemento constitutivo da providência requerida, pelo que a sua inexistência obsta ao decretamento daquela. Nas providências cautelares existem apenas a prova sumária do direito ameaçado, ou seja, a demonstração da probabilidade séria da existência do direito alegado (arts. 403º/2, 407º/1 e 423º/ CPC), bem como do receio da lesão (arts. 381º/1, 384º/1, 387º/1, 406º/1, 407º/1, 421º/1 e 423º/1 CPC). As providências só requerem, quanto ao grau de prova, uma mera justificação, embora a repartição do ónus da prova entre o requerido e o requerente observe as regras gerais (art. 342º/1/2 CC). Assim, para o decretamento da providência cautelar exige-se apenas a prova de que a situação jurídica alegada é provável ou verosímil, pelo que é suficiente a aparência desse direito, ou seja, basta um fumus boni iuris. O fumus boni iuris decorre da suficiência da mera justificação, mas não tem qualquer tradução numa discricionaridade do Tribunal quanto aos fundamentos da providência; se isso não suceder, o Tribunal não a pode decretar, ainda que isso se pudesse justificar por outros factores. As providências cautelares exigem todos os pressupostos processuais gerais. Especificamente quanto ao interesse processual, importa referir que ele falta sempre que o requerente possa atingir a garantia do direito, a regulação provisória ou a antecipação da tutela através de um meio mais adequado que o procedimento cautelar, ou seja, quando, em função das circunstâncias, aquele procedimento não for meio mais célere e económico para obter a tutela dos interesses do requerente. 52. Providências especificadas A regulamentação legal das providências cautelares assenta na seguinte dicotomia: a lei define várias providências nominadas e admite, sempre que nenhuma delas seja aplicável, uma providência comum de âmbito residual (art. 381º/3 CPC). As providências nominadas são a restituição provisória da posse (arts. 393º a 395º CPC), a suspensão de deliberações sociais (arts. 396º a 398º CPC), os alimentos provisórios (arts. 399º a 402º CPC), o arbitramento de reparação provisória (arts. 403º a 405º CPC), o arresto (arts. 406º a 411º CPC), o embargo de obra nova (arts. 412º a 420º CPC) e o arrolamento (arts. 421º a 427º CPC). No grupo das providências nominadas, algumas visam garantir a realização de um direito, outras destinam-se a regular provisoriamente uma situação e outras ainda procuram antecipar a tutela jurisdicional que se pretende obter através da acção principal. a) Providências de garantia · Arresto O arresto e o arrolamento são providências cautelares cuja finalidade específica é garantir a realização de uma pretensão e assegurar a sua execução. O arresto pode ser requerido pelo credor que demonstre a

probabilidade da existência do seu crédito e tenha justo receio de perda da sua garantia patrimonial (arts. 406º/1 CPC; 601º e 619º/1 CC). O arresto consiste na apreensão judicial de bens do devedor (arts. 406º/2 CPC; 619º/1 CC) ou de bens transmitidos pelo devedor a um terceiro (arts. 407º/2 CPC; 619º/2 CC) · Arrolamento Enquanto o arresto visa assegurar a garantia patrimonial do credor, o arrolamento destina-se a evitar o extravio ou a dissipação de bens, móveis ou imóveis, ou de documentos (art. 421º/1 CPC), que, para esse efeito, são descritos, avaliados e depositados (art. 424º/1 CPC). Essa providência visa a conservação de bens ou documentos determinados (art. 422º/1 CPC), sendo por isso que os credores só a podem requerer quando haja necessidade de proceder à arrecadação de herança ou dos próprios bens (arts. 422º/2 e 427º/2 CPC; 90º e 2048º/2 CC). b) Providências de regulação · Restituição provisória da posse O possuidor que for esbulhado com violência, isto é, que for violentamente privado do exercício, da retenção ou da fruição do objecto possuído, tem o direito de ser restituído provisoriamente à sua posse, desde que alegue e prove os factos que constituem posse, o esbulho e a violência (arts. 393º CPC; 1279º CC). A reconstituição provisória da posse é justificada não só pela violência ou ameaças contra as pessoas, mas também por aquela que é dirigida contra coisas, como muros e vedações. · Embargo de obra nova O embargo de obra nova pode ser judicial ou extrajudicial. O embargo judicial pode ser requerido por quem se sentir ofendido no seu direito de propriedade (ou de compropriedade), num outro direito real ou pessoal de gozo ou na sua posse, em consequência de obra, trabalho ou serviço que lhe cause ou ameace causar prejuízo (art. 412º/1 CPC). · Suspensão de deliberações sociais Se alguma associação ou sociedade tomar, em assembleia-geral, deliberações contrárias à lei, aos estatutos ou ao contrato, qualquer sócio pode requerer, no prazo de 10 dias, que a execução dessas deliberações seja suspensa, desde que, além de provar a sua qualidade de sócio, mostre que essa execução pode causar dano apreciável (art. 396º/1 CPC). O dano causado deve ser apreciável, mas não tem de ser irreparável ou de difícil reparação. Assim, por não poder causar qualquer dano considerável, não pode ser requerida a suspensão da deliberação respeitante ao recebimento de dividendos. c) Providências de antecipação · Alimentos provisórios A providência de alimentos provisórios pode ser requerida como dependência da acção em que, principal ou acessoriamente, seja pedida uma prestação de alimentos (arts. 399º/1 CPC; 2007º/1 CC). Essa causa pode ser, por exemplo, uma acção de reconhecimento da maternidade ou paternidade (arts. 1821º, 1873º e 1884º/1 CC). Os alimentos provisórios são fixados numa quantia mensal (art. 399º/1 CPC), tomando em consideração o que for estritamente necessário para o sustento, a habitação e o vestuário do requerente e ainda para as despesas da acção, se o autor não puder beneficiar de apoio judiciário (art. 399º/2 CPC). · Arbitramento de reparação

Como dependência da acção de indemnização fundada em morte ou lesão corporal, pode o lesado, bem como aqueles que lhe podiam exigir alimentos ou aqueles a quem o lesado os prestava no cumprimento de uma obrigação natural, requerer o arbitramento de uma quantia certa, sob a forma de renda mensal, como reparação provisória do dano (art. 403º/1 CPC). O mesmo pode ser requerido nos casos em que a pretensão indemnizatória se funda em dano susceptível de pôr seriamente em causa o sustento ou habitação do lesado (art. 403º/4 CPC). A providência requerida é decretada se se verificar uma situação de necessidade em consequência das lesões sofridas e se estiver indiciada a existência da obrigação de indemnizar a cargo do requerido (art. 403º/2 CPC). O montante da reparação provisória é fixado equitativamente e é subtraído ao quantitativo indemnizatório que vier a ser apurado na acção principal (art. 403º/3 CPC). 53. Providências comuns Não cabendo nenhuma das providências nominadas, a garantia da execução da decisão final, a regulação provisória e a antecipação da tutela podem ser obtidas através de uma providência cautelar não especificada (art. 381º/3 CPC). As providências não especificadas só podem ser requeridas quando nenhuma providência nominada possa ser utilizada no caso concreto: nisto consiste a subsidiariedade dessas providências. Esta subsidiariedade pressupõe que nenhuma providência nominada seja abstractamente aplicável e não que a providência aplicável em abstracto deixe de o ser por motivos respeitantes ao caso concreto. Para que uma providência cautelar não especificada possa ser decretada são necessários, além do preenchimento das condições relativas à referida subsidiariedade (art. 381º/3 CPC), vários pressupostos específicos: O fundado receio de que outrem, antes de a acção ser proposta ou na pendência dela, cause lesão grave e dificilmente reparável ao direito do requerente (arts. 381º/1 e 387º/1 CPC); A adequação da providência concretamente requerida à efectividade do direito ameaçado (art. 381º/1 CPC); O excesso considerável do dano que se pretende evitar com a providência sobre o prejuízo resultante do seu decretamento (art. 387º/2 CPC). As providências cautelares comuns destinar-se-ão primordialmente a regular provisoriamente uma situação e a antecipar a tutela definitiva. O art. 381º/1 CPC, refere explicitamente providências com eficácia conservatória e antecipatória do efeito da decisão principal, mas isso não parece revestir-se de qualquer significado limitativo. As providências cautelares não especificadas também podem ser utilizadas para obter a antecipação da tutela de uma situação jurídica. 54. Características a) Dependência As providências cautelares têm por função obter uma composição provisória. Essas providências são decretadas em processos especiais próprios (os procedimentos cautelares, arts. 381º a 427º CPC) e, porque visam compor provisoriamente a situação das partes, são dependência de uma acção

cujo objecto é a própria situação acautelada ou tutelada (arts. 383º/1, 399º/1, 403º/1 e 421º/2 CPC). Essa acção pode ser declarativa ou executiva (art. 383º/1 in fine CPC), embora, nesta última, não sejam frequentes as hipóteses em que está assegurado o interesse processual no decretamento da providência. A acção principal pode decorrer perante um Tribunal estadual ou Arbitral. Dada esse dependência, as providências caducam se a acção principal vier a ser julgada improcedente (art. 389º/1-c CPC) ou se o réu for nela absolvido da instância e o autor não propuser, dentro do prazo legal, uma nova acção (art. 389º/1-d; sobre esse prazo art. 289º/2 CPC). Se a acção principal for julgada procedente, verifica-se, em regra a substituição da composição provisória pela definitiva resultante dessa decisão. As providências cautelares podem ser requeridas antes da propositura da acção principal ou durante a pendência desta última (art. 383º/1, 2ª parte CPC), mas nunca após o trânsito em julgado da decisão dessa acção. Como dependência da mesma causa não pode ser requerida mais do que uma providência relativa ao mesmo objecto, ainda que uma delas seja julgada injustificada ou tenha caducado (art. 381º/4 CPC). As providências cautelares podem ser solicitadas mesmo quando não esteja pendente nenhuma acção (art. 383º/1, 2ª parte CPC). Isso possibilita a situação em que a providência é requerida, mas a acção principal nunca chega a ser proposta pelo requerente. b) Celeridade As providências cautelares são apreciadas e decretadas nos procedimentos cautelares. Dada a celeridade indispensável a essas providências, estes procedimentos revestem sempre carácter urgente e os respectivos actos precedem qualquer outro serviço judicial não urgente (art. 382º/1 CPC); como consequência desta urgência, os prazos processuais neles previstos não se suspendem sequer durante as férias judiciais (art. 144º/1 CPC). c) Modificação O Tribunal não está adstrito à providência requerida (art. 392º/3, 1ª parte CPC), isto é, pode decretar uma providência distinta daquela que foi solicitada (art. 661º/3 CPC). Esta faculdade concedida ao Tribunal decorre da não vinculação deste órgão à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (art. 664º, 1ª parte CPC) e pressupõe, naturalmente, que os factos alegados pelo requerente possibilitem essa conversão. Desse regime também decorre que uma idêntica modificação da providência pelo próprio requerente não é condicionada pelo disposto no art. 273º/1/2 CPC. d) Cumulação O requerente pode solicitar o decretamento de várias providências cautelares num mesmo procedimento cautelar, desde que a tramitação para cada uma delas não seja absolutamente incompatível e essa cumulação corresponda a um interesse relevante ou seja indispensável para a justa composição do litígio (art. 392º/3, 2ª parte CPC). Isso significa que se podem cumular tanto diferentes providências especificadas, como providências nominadas e providências comuns.

Podem cumular-se duas ou mais providências cautelares se, na acção de que são dependentes (art. 383º/1 CPC), for admissível a cumulação dos respectivos pedidos. e) Proporcionalidade A provisoriedade cautelares e a sua finalidade de garantia, de regulação ou de antecipação justificam que as medidas tomadas ou impostas devam ser as adequadas às situações que se pretende acautelar ou tutelar. As relações entre aquelas medidas e estas situações devem orientar-se por uma regra de proporcionalidade: as medidas provisórias não podem impor ao requerido um sacrifício desproporcionado relativamente aos interesses que o requerente deseja acautelar ou tutelar provisoriamente (arts. 387º/2; 397º/2, 408º/2/3 e 419º CPC). f) Eficácia relativa Uma das consequências da summaria cognitio e da suficiência da mera justificação no julgamento da providência é a insusceptibilidade de a decisão proferida na procedimento cautelar produzir qualquer efeito de caso julgado na respectiva acção principal: o julgamento da matéria de facto e a decisão final proferida no procedimento cautelar não têm qualquer influência no julgamento da acção principal (art. 383º/4 CPC). Como a providência decretada caduca se a acção vier a ser julgada improcedente por sentença transitada em julgado (art. 389º/1-c CPC), também isso demonstra que o seu decretamento, não é vinculativo na acção principal (que, apesar desse decretamento, vem a ser julgada improcedente). Pela mesma razão, a desistência da providência e a confissão do pedido (art. 293º/1 CPC) realizadas no procedimento cautelar não podem condicionar a apreciação da acção principal. g) Substituição por caução As providências cautelares destinam-se a obter uma composição provisória que tutela ou acautela o interesse na efectividade da tutela jurisdicional. Isso não impede, contudo, que esse interesse possa ser acautelado de outra forma. Uma delas consiste na prestação de uma caução pelo requerido em substituição do decretamento da providência: é o que é admissível nas providências cautelares não especificadas (art. 387º/3 CPC) e no embargo de obra nova (art. 419º/1 CPC). A substituição da providência cautelar pela prestação de caução pelo requerido pressupõe, no entanto, que através desta se pode obter o mesmo efeito a que se destina aquela providência. Normalmente, a providência cautelar pode ser substituída por caução, sempre que ela vise evitar um prejuízo patrimonial. h) Garantia e execução De molde a assegurar a efectividade da providência cautelar decretada, é admissível a fixação de uma sanção pecuniária compulsória, se a providência impuser uma prestação de facto infungível e esta não exigir especiais qualidades científicas ou artísticas do requerido (arts. 384º/2 CPC; 829º-A/1 CC). 55. Caducidade As providências cautelares fornecem, uma composição provisória, pelo que elas caducam se a decisão que vier a ser proferida na acção principal não for compatível com a medida provisória decretada. É o que acontece quando essa

acção for julgada improcedente por uma sentença transitada em julgado (art. 389º/1-c CPC). A caducidade da providência cautelar decorrente da extinção do direito acautelado (art. 389º/1-e CPC) é apenas uma das situações possíveis de inutilidade superveniente dessa providência (art. 287º-e CPC), pelo que essa inutilidade pode decorrer de outros fundamentos. Normalmente a caducidade da providência abrange-a na totalidade, mas também são pensáveis situações de caducidade parcial da providência. Se, por exemplo, a acção for julgada parcialmente improcedente no despacho saneador (art. 510º/1-b CPC), a providência decretada só caduca na parte respectiva (art. 389º/1-c CPC); o mesmo sucede se o direito acautelado se extinguir apenas em parte (art. 289º/1-e CPC). A caducidade da providência não opera automaticamente e nem sequer é de conhecimento oficioso. O levantamento da providência com fundamento na sua caducidade depende de solicitação do requerido, que é apreciada após a audição do requerente (art. 389º/4 CPC). 56. Responsabilidade do requerente Pode suceder que a providência requerida venha a mostrar-se injustificada pela falta quer do próprio direito acautelado ou tutelado, quer do fundamento do seu decretamento; também pode acontecer que a providência decretada, inicialmente justificada, venha a caducar por facto imputável ao requerente (art. 389º/1 CPC). Em todos estes casos, o requerente, se não tiver agido com a prudência normal, é responsável pelos danos causados ao requerido (art. 390º/1; quanto ao arresto, art. 621º CC). Essa responsabilidade está instituída na lei como uma contrapartida da provisoriedade das providências cautelares e é garantida pela caução que o Tribunal, mesmo sem solicitação do requerido, pode exigir ao requerente (art. 390º/2 CPC). A responsabilidade do requerente pressupõe que a providência é injustificada no momento em que é requerida ou não vem a ser confirmada pela decisão proferida na acção principal. COMPOSIÇÃO POR REVELIA 57. Noção A composição da acção pode ser decisivamente influenciada pela omissão de um acto processual: trata-se da revelia do réu, que consiste na abstenção definitiva da contestação. A contestação – na qual o réu pode impugnar as afirmações do autor ou deduzir uma excepção (art. 487º/1 CPC) – constitui um ónus da parte, não existindo, assim, qualquer dever de contestar. Daí decorre que a revelia não determina a aplicação ao réu de qualquer sanção (pecuniária, nomeadamente), mas antes certas desvantagens quanto à decisão da acção. 58. Modalidades a) Revelia absoluta e relativa A revelia é absoluta quando o réu não pratica qualquer acto na acção pendente; é relativa se o réu não contesta, mas pratica em juízo qualquer outro acto processual, designadamente a constituição de mandatário judicial. b) Revelia operante e inoperante

A revelia – quer a relativa, quer a absoluta – pode ser operante ou inoperante. É operante quando produz efeitos quanto à composição da acção; é inoperante quando esses efeitos não se realizam, isto é, quando a falta de contestação nada implica quanto à decisão da causa (arts. 233º/1; 484º/1; 485º-b, 2ª parte; 233º/6 e 248º; 485º-a; 485º-c CPC; art. 354º-b CC; art. 485º-d CPC; art. 364º CC). As situações que conduzem à inoperância da revelia são comuns ao processo ordinário, sumário e sumaríssimo, pois, na falta de uma regulamentação específica, vale para estes últimos o que se encontra estipulado para o processo ordinário (arts. 463º/1 e 464º CPC). 59. Efeitos A revelia operante implica uma importante consequência quanto à decisão da acção. Essa consequência, que se produz ex lege e não ex voluntate, consiste no seguinte: a revelia operante implica a confissão dos factos articulados pelo autor (art. 484º/1 CPC; quanto à aplicação dessa regra ao processo sumário e sumaríssimo, arts. 463º/1 e 464º CPC). O efeito cominatório realizado pela revelia não prevalece sobre a matéria de conhecimento oficioso, nomeadamente as excepções dilatórias de que o Tribunal deva conhecer ex officio (art. 495º CPC) e que obstem à apreciação do mérito da causa (art. 288º/3 CPC). O efeito cominatório da revelia operante também não pode prevalecer sobre os efeitos ilegais pretendidos pelo autor. Se a confissão ficta ou presumida que resulta da revelia respeitar a factos impossíveis ou notoriamente inexistentes ou se o autor tiver formulado um pedido ilegal ou juridicamente impossível, essa confissão não é admissível (art. 354º-c CC) e o Tribunal não os deve considerar admitidos por um acordo e deve abster-se de apreciar esse pedido.

COMPOSIÇÃO PELO TRIBUNAL 60. Decisão judicial A decisão é o acto do Tribunal no qual este órgão julga qualquer matéria que lhe compete apreciar por iniciativa própria, quer mediante solicitação das partes. A decisão é, assim, o acto processual que exprime, por excelência, o exercício da função jurisdicional pelo Tribunal. Toda a decisão comporta dois elementos essenciais: os fundamentos e a conclusão ou decisão em sentido estrito. Os fundamentos incluem a matéria de facto relevante e o regime jurídico que lhe é aplicável; a decisão em sentido estrito contém a conclusão que se extrai da aplicação do direito aos factos. Para a individualizar, a decisão inicia-se com um relatório, em que se identificam o processo a que respeita e as questões a resolver (art. 659º/1 CPC), e, para assegurar a sua genuinidade, ela deve ser assinada e datada (arts. 157º/1 e 2; 668º/1-a CPC). O dever de fundamentação das decisões judiciais constitui um imperativo constitucional, embora restringido aos casos e termos previstos na lei ordinária (art. 205º/1 CRP). 61. Modalidades A principal diferenciação nas decisões judiciais distingue-as em sentenças e despachos (art. 156º/1 CPC). As sentenças são, em regra, as decisões sobre o mérito da causa ou sobre um incidente com a estrutura de uma causa (art. 156º/2 CPC), mas também podem conhecer de aspectos processuais (art. 660º/1 CPC); das sentenças que conhecem do mérito da causa pode interporse recurso de apelação (art. 691º/1 CPC). Os despachos são, em princípio, decisões sobre aspectos processuais e, por isso, são, em regra, decisões interlocutórias, embora também possam incidir sobre o mérito (art. 510º/1-b CPC) e, mesmo fora destes casos, possam ser decisões finais (art. 510º/1-a CPC); dos despachos que não conhecem do mérito da causa cabe recurso de agravo (art. 733º CPC) e daqueles que apreciam esse mérito pode apelar-se (art. 691º CPC). Às decisões dos Tribunais colectivos atribui-se a designação especial de acórdãos (art. 156º/3 CPC). Quando o acórdão da Relação conhece do mérito da causa, dele cabe revista (art. 721º/2 CPC); quando isso não sucede, cabe agravo (art. 754º/1 CPC). Alguns despachos incidem somente sobre aspectos burocráticos do processo e da sua tramitação e, por isso, não possuem um conteúdo característico do exercício da função jurisdicional, nem afectam a posição processual das partes ou de terceiros. São os chamados despachos de mero expediente, que são aqueles que se destinam a prover ao andamento regular do processo e nada decidem quanto ao conflito de interesses entre as partes (art. 156º/4, 1ª parte CPC) Os despachos discricionários são aqueles cujo conteúdo é determinado pelo prudente arbítrio do julgador (art. 156º/4, 2ª parte CPC), ou seja, por critérios de conveniência e oportunidade. Assim, são despachos discricionários todos aqueles que estabelecem prazos judiciais (art. 144º/1 CPC), com ou sem limites legais (arts. 24º/2; 25º/1; 33º 40º/2; 486º/4 e 5; 508º/2 e 3 CPC).

Os despachos de mero expediente e os despachos discricionários não admitem recurso (art. 679º CPC), nem reclamação (art. 700º/3 CPC)

DINÂMICA DA INSTÂNCIA

VICISSITUDES FASES DO PROCESSO

VICISSITUDES 62. Início A instância inicia-se com a propositura da acção, entendendo-se que esta se considera proposta, intentada ou pendente quando for recebida na secretaria (art. 150º/3 CPC) a respectiva petição inicial ou, se esta tiver sido enviada pelo correio, na data do seu registo postal (arts. 267º/1; 150º/1 CPC). No entanto, em relação ao réu, os efeitos decorrentes da pendência da causa só se produzem, em regra, após a sua citação (art. 267º/2 CPC; sobre uma excepção a esta regra, art. 385º/6 CPC). 63. Suspensão São várias as circunstâncias que determinam a suspensão da instância: · Quando falecer ou se extinguir alguma das partes (arts. 276º/1-a; 277º/1 CPC), salvo se já tiver começado a audiência final ou se o processo já tiver inscrito em tabela para julgamento, hipótese em que a instância só se suspende depois de ser proferida a sentença ou o acórdão (art. 277º/1 CPC); · Nos processos em que for obrigatória a constituição de advogado (arts. 32º/1 e 3; 276º/1-b; 278º; 284º/1-b CPC); · Sempre que o Tribunal a ordene (arts. 276º/1-c; 279º/1; 97º/1; 284º/1-c CPC); · Sempre que a lei o determine (arts. 276º/1-d – 12º/2 e 5; 24º/2; 25º/1; 39º/3; 356º; 549º/3; 550º/3; e 551º-A/4; no art. 1940º/3 CC; no art. 14º/3 DL 329-A/95, de 12/12; no art. 24º/1-b, DL 387-B/87, de 29/12, e ainda no art. 3º/2, CRegP.); · A vontade das partes também constitui uma causa de suspensão da instância: as partes podem acordar nessa suspensão por um prazo não superior a seis meses (art. 279º/4 CPC). Durante a suspensão da instância só se podem praticar os actos urgentes destinados a evitar o dano irreparável (art. 283º/1, 1ª parte CPC) e os prazos judiciais não correm enquanto ela se mantiver (art. 283º/2, 1ª parte CPC). Mas

a suspensão não impede a desistência, confissão ou transacção, desde que estas não se tornem impossíveis ou não sejam afectadas pelo fundamento da suspensão (art. 283º/3 CPC). 64. Interrupção A instância interrompe-se quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento (art. 285º CPC). A interrupção da instância é, assim, consequência do incumprimento do ónus de impulso subsequente das partes (art. 265º/1 CPC). A interrupção cessa se o autor requerer algum acto do processo ou do incidente de que dependa o andamento dele (art. 286º CPC). A interrupção da instância provoca um importante efeito substantivo – é ele, aliás, que justifica a ressalva feita no art. 286º in fine CPC. Quando a caducidade se refere ao exercício jurisdicional de um direito potestativo, a interrupção da instância implica que não se conta, para efeitos dessa caducidade, o prazo decorrido entre a propositura da acção e aquela interrupção (art. 332º/2 CC). Isto é, o prazo de caducidade começa a correr de novo com a interrupção da instância, pelo que pode suceder que ele se esgote antes de cessar essa interrupção. 65. Extinção O meio normal de extinção da instância na acção declarativa é o julgamento (art. 287º-a CPC), que, aliás, pode decorrer de uma sentença de mérito ou de absolvição da instância (arts. 288º e 289º CPC). Mas existem outras causas de extinção da instância. São elas: A celebração de um compromisso Arbitral (arts. 287º-b; 290º CPC; art. 1º/1 e 2 LAV), ou seja, a atribuição da competência para o julgamento da acção pendente a um Tribunal Arbitral; A deserção da instância (art. 287º-c CPC), isto é, a interrupção da instância durante dois anos (art. 291º/1 CPC); A desistência, confissão ou transacção (art. 287º-d; 293º a 295º CPC); A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide (art. 287º-e CPC). Com a extinção da instância terminam todos os efeitos processuais e substantivos da pendência da acção (art. 481º CPC; arts. 323º/1 e 2; 805º/1; e 1292º CC). A desistência, absolvição e deserção da instância, bem como a caducidade do compromisso Arbitral (art. 4º LAV), implicam que o prazo prescricional – cujo decurso fora interrompido pela citação do réu (art. 323º/1 CC) ou passados 5 dias depois de esta ter sido requerida (art. 323º/2 CC) – começa a correr de novo (e desde o início) a partir desse acto interruptivo (arts. 327º/2 e 326º/1 CC).

FASES DO PROCESSO 66. Noção A tramitação da acção comporta uma sequência de actos que pode ser decomposta em várias fases. A fase processual pode ser construída através de um critério cronológico ou lógico: naquela primeira acepção, a fase engloba os actos temporalmente contíguos na marcha do processo, mesmo que realizem finalidades distintas; em sentido lógico, a fase abrange todos os actos, qualquer que seja o momento em que sejam praticados, que prossigam uma mesma finalidade. Assim, a fase do processo integra todos os actos que realizam uma mesma função, ainda que eles sejam praticados antes do início ou depois do termo da respectiva fase em sentido cronológico.

PROCESSO ORDINÁRIO FASES DOS ARTICULADOS FASE DA CONDENSAÇÃO FASE DA INSTRUÇÃO FASE DA AUDIÊNCIA FINAL FASE DA SENTENÇA

FASES DOS ARTICULADOS 67. Função da fase A fase dos articulados é aquela em que as partes da acção – o autor e o réu – apresentam as razões de facto e de direito que fundamentam as posições que defendem em juízo e solicitam a correspondente tutela judicial. É através dos articulados que as partes iniciam o seu diálogo na acção. 68. Articulados São as peças em que as partes expõem os fundamentos da acção e da defesa e formulam os pedidos correspondentes (art. 151º/1 CPC). Essas peças recebem o nome de articulados, porque, em princípio, nas acções, nos incidentes e nos procedimentos cautelares é obrigatória a dedução por artigos dos factos que interessam à fundamentação do pedido ou da defesa (art.

151º/2 CPC), isto é, cada facto deve ser alegado separadamente num artigo numerado. O processo ordinário comporta, na tramitação normal, quatro articulados: a petição inicial (art. 467º CPC), a contestação (art. 486º CPC), a réplica (art. 502º CPC) e a tréplica (art. 503º CPC); em determinadas situações, podem ainda ser apresentados articulados supervenientes (art. 506º CPC). 69. Apoio judiciário O apoio judiciário é, em conjunto com a consulta jurídica, uma das modalidades da protecção jurídica (art. 6º DL 387-B/87, de 29/12; art. 20º/2 CRP). Têm direito à protecção jurídica as pessoas singulares e colectivas que demonstrem não dispor de meios económicos bastantes para suportar os honorários dos profissionais da causa (art. 7º/1 e 4, DL 387-B/87), ou seja, as pessoas para as quais esses encargos possam constituir motivo inibitório do recurso ao Tribunal (art. 7º DL 391/88, de 26/10). Gozam da presunção de insuficiência económica aqueles que requeiram alimentos ou que os estejam a receber por necessidade económica, que reúnam as condições exigidas para a atribuição de quaisquer subsídios em razão da sua carência de rendimentos, que tenham rendimentos mensais provenientes do trabalho iguais ou inferiores a uma vez e meia o salário mínimo nacional, bem como o filho menor para efeitos de investigar ou impugnar a sua maternidade ou paternidade (art. 20º/1, DL 387-B/87). A protecção jurídica – e, portanto, o apoio judiciário – é concedido para as causas em que o requerente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos lesados ou ameaçados de lesão (art. 8º DL 387-B/87). O apoio judiciário aplica-se em todos os Tribunais, qualquer que seja a forma processual do requerente e da sua concessão à parte contrária (art. 17º/1, DL 387-B/87), e, se for atribuído, compreende a dispensa, total ou parcial, de taxas de justiça e do pagamento das custas, ou o seu diferimento, assim como a dispensa do pagamento dos serviços do advogado ou solicitador (art. 15º/1, DL 387-B/87). Essa dispensa abrange as despesas com os exames requeridos a organismos oficiais e as multas que condicionam o exercício de uma faculdade processual. 70. Petição inicial A petição inicial é o primeiro articulado do processo, no qual o autor alega os fundamentos de facto e de direito da situação jurídica invocada e formula o correspondente pedido contra o réu. A entrega da petição inicial é o resultado de uma actividade prévia do advogado do autor e, frequentemente, de várias opções quanto à estratégia a adoptar. Aquela actividade inclui a indagação dos factos relevantes para a fundamentação da posição do seu mandante e a averiguação dos meios de prova susceptíveis de ser utilizados por esta parte (art. 456º/2-a), b) CPC). A petição inicial contém, em termos formais, quatro partes: o intróito ou cabeçalho, a narração, a conclusão e os elementos complementares. A petição inicial começa por um intróito ou cabeçalho, no qual é designado o Tribunal onde a acção é proposta (art. 467º/1-a CPC), se identificam as partes através dos seus nomes, residências, profissões e locais de trabalho (art. 467º/1-a CPC) e se indica a forma do processo (art. 467º/1-b CPC). Se a petição inicial não contiver estes elementos, a secretaria deve recusar o seu recebimento (art. 474º-a), b), c) CPC).

Na narração, o autor deve expor os factos e as razões de direito que servem de fundamento à acção (art. 467º/1-c CPC). Esta parte da petição inicial contém a exposição dos factos necessários à procedência da acção, isto é, a alegação dos factos principais, bem como dos factos instrumentais para os quais seja oferecida prova documental que deva ser junta à petição inicial (art. 523º/1 CPC). Os factos devem ser deduzidos por artigos (art. 151º/2 CPC) e, se faltar qualquer facto essencial, a petição é inepta por falta de causa de pedir (art. 193º/2-a CPC). À narração dos factos e das razões de direito segue-se a conclusão. É nesta parte da petição inicial que o autor deve formular o pedido (art. 467º/1-d CPC), isto é, definir a forma de tutela jurídica que pretende a situação jurídica alegada. A falta de indicação do pedido ou a contradição deste com a causa de pedir apresentada na narração importam a ineptidão da petição inicial (art. 193º/2-a, b CPC). A petição inicial termina com algumas indicações complementares (arts. 467º/1-e/2; 474º-d, e; 523º/1; 255º/1; 32º/1-a, b; 40º CPC). A petição inicial deve ser entregue ou enviada à secretaria judicial do Tribunal competente (art. 150º/1 e 3 CPC). A acção considera-se proposta, intentada ou pendente logo que aquele articulado seja recebido na secretaria (art. 267º/1 CPC). O art. 234º/4 CPC, enumera as hipótese em que a citação do réu é precedida de despacho judicial e o art. 234º-A/1 CPC, estabelece os casos em que o juiz é chamado a proferir aquele despacho pode indeferir liminarmente a petição. O indeferimento limiar pode basear-se na improcedência manifesta da acção ou na existência de uma excepção dilatória insanável e de conhecimento oficioso (art. 234º-A/1 CPC). Esse indeferimento pode ser parcial, tanto quanto a um dos objectos cumulados, como quanto a um dos vários autores ou réus. O indeferimento liminar extingue a instância (art. 287º-a CPC), e produz caso julgado quanto ao seu fundamento. Por aplicação analógica do art. 476º CPC, o autor pode entregar, no prazo de 10 dias após a notificação do indeferimento liminar, uma nova petição inicial. O art. 234º-A/1 CPC, coloca o problema de saber se o único despacho admissível nesse momento é o de indeferimento liminar. Pode perguntar-se se, perante uma petição irregular ou deficiente, o juiz está impedido de solicitar a sanação da irregularidade ou de convidar o autor a aperfeiçoar esse articulado. 71. Citação do réu (art. 480º - art. 233º CPC) A citação é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender (art. 228º/1, 1ª parte – 480º CPC). Em regra, a citação é posterior à distribuição, mas, quando aquela não deva realizar-se editalmente (art. 233º/6 CPC), o autor pode requerer, invocando os respectivos motivos, que a citação preceda a distribuição (art. 487º/1 CPC). A citação do réu está submetida aos princípios da oficiosidade e da celeridade (arts. 234º/1 e 479º CPC). A citação pode ser pessoal ou edital (art. 233º/1 CPC). A citação pessoal é aquela que é feita através de contacto directo com o demandado ou que é efectuada em pessoa diversa do citando, mas encarregada de lhe transmitir o conteúdo do acto (art. 233º/4; sobre estas situações: arts. 233º/5, 236º/2 e 240º/2, 2ª parte CPC). A citação pessoal pode ser realizada através da entrega

ao cintando de carta registada com aviso de recepção, nos casos de citação postal (art. 233º/2-a CPC), mas também pode ser efectuada através de contacto pessoal do funcionário judicial (art. 233º/2-b CPC) ou do mandatário judicial do autor com o citando (art. 233º/3 CPC). Em regra, a citação é pessoal (art. 233º/6 CPC) e, em regra também, é realizada pela via postal (arts. 239º/1 e 245º/2 CPC). Modalidades de citações: * Citação postal (art. 236º/1 CPC); * Citação por funcionário judicial (arts. 235º; 239º/1; 240º/2, 4 – art. 348º CP – art. 241º CPC); * Citação por mandatário judicial (art. 245º/2 CPC) * Citação edital (art. 233º/6 CPC) * Citação no estrangeiro (art. 247º/1 CPC). A citação pode ser impossível por três circunstâncias: a incapacidade de facto do citando (art. 242º CPC), a ausência do citando em parte certa e por tempo limitado (art. 243º CPC) e a ausência dele em parte incerta (art. 244º CPC). No primeiro caso, se o juiz reconhecer a incapacidade do réu, é-lhe nomeado um curador provisório (art. 242º/3 CPC); no segundo, faculta-se ao Tribunal a opção entre proceder à citação postal ou aguardar o regresso do citando (art. 243º CPC); por fim, no terceiro, procura-se obter, junto de quaisquer entidades, serviços ou autoridades policiais, informações sobre paradeiro ou a ultima residência conhecida do citando (art. 244º/1 CPC), utilizando, em seguida, se essa ausência for confirmada, a citação edital (arts. 233º/6, e 248º CPC). A citação pode faltar (art. 195º CPC) e ser nula (art. 198º CPC). Segundo o disposto no art. 195º CPC, verifica-se a falta de citação quando o acto tenha sido completamente omitido, quando tenha havido erro de identidade do citado, quando se tenha empregado indevidamente a citação edital (arts. 233º/6 e 251º CPC), quando se mostre que foi efectuada depois do falecimento do citando ou da extinção deste e ainda quando se demonstre que o destinatário da citação deste e ainda quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável, ou seja, quando ele tenha ilidido a presunção estabelecida no art. 238º CPC, ou quando a citação tenha sido realizada apesar da sua incapacidade de facto (art. 242º CPC). A falta de citação considera-se sanada se o réu ou o Ministério Público intervierem no processo e não arguirem o vício (art. 196º CPC). A citação é nula quando, na sua realização, não hajam sido observadas as formalidades prescritas na lei (art. 198º/1 CPC) – arts. 235º e 246º/1 CPC), desde que essa inobservância possa prejudicar a defesa do citado (art. 198º/4 CPC) 72. Contestação A contestação é a resposta do réu à petição inicial do autor, ou seja, é a manifestação da posição do réu perante aquele articulado do autor. Pode ser entendida num sentido material ou formal. A contestação em sentido material é qualquer acto praticado pelo réu, no qual essa parte mostre a sua oposição ao autor e ao pedido formulado por esta parte (arts. 486º/2 e 487º/1 CPC). A contestação em sentido formal é o articulado de resposta do réu à petição inicial do autor: à contestação em sentido formal referem-se por exemplo os arts. 488º e 489º/1 CPC.

O réu pode tomar uma de duas atitudes fundamentais perante a petição inicial: opor-se ao pedido do autor ou não se opor a ele. A opção por uma destas condutas depende dos factos indagados pelo mandatário do réu e das provas de que esta parte possa dispor, havendo, naturalmente, que observar o dever de verdade que recai sobre essa parte (art. 456º/2-a, b CPC) e o dever de não advogar contra a lei expressa e de não usar meios ou expedientes ilegais que obriga o mandatário (art. 78º-b EOA). A contestação do réu marca a sua oposição relativamente ao pedido do autor. A contestação pode consistir na impugnação dos factos articulados pelo autor ou na invocação de uma ou várias excepções dilatórias ou peremptórias (art. 487º CPC). A escolha da modalidade da defesa (por impugnação ou por excepção) é condicionada pela posição que o réu pretende assumir na acção (arts. 487º/2 e 493º/2 e 3 CPC). Em conjunto com a contestação ou independente dela, o réu pode formular um pedido reconvencional contra o autor (art. 501º CPC). Sempre que o pedido reconvencional não esteja sujeito a qualquer preclusão se não for formulado na acção pendente, a opção pela sua formulação nessa acção só deve ser tomada quando for possível coligir, no prazo de contestação, todos os elementos necessários para a sua procedência. A reconvenção deve ser deduzida separadamente na contestação, na qual devem ser expostos os seus fundamentos, formulado o correspondente pedido e indicado o seu valor (art. 501º/1 e 2 CPC). O réu pode contestar no prazo de 30 dias a contar da sua citação (art. 486º CPC). A esse prazo acresce uma dilação de 5 dias quando a citação não tenha sido realizada na própria pessoa do réu (arts. 236º/2 e 240º/2 e 3 CPC) e quando o réu tenha sido citado fora da comarca sede do Tribunal onde pende a acção (art. 252º-A/1 CPC). O articulado de contestação apresenta o mesmo conteúdo formal da petição inicial (art. 488º CPC). A contestação (em sentido material) está submetida a uma regra de concentração ou de preclusão: toda a defesa deve ser deduzida na contestação (art. 489º/1 CPC), ou melhor, no prazo da sua apresentação (art. 486º/1 CPC), pelo que fica precludida quer a invocação dos factos que, devendo ter sido alegados nesse momento, não o foram, quer a impugnação, num momento posterior, dos factos invocados pelo autor. Se aqueles factos forem invocados fora do prazo determinado para a contestação, o Tribunal não pode considerá-los na decisão da causa; se o fizer, incorre em excesso de pronúncia, o que determina a nulidade daquela decisão (art. 668º/1-d, 2ª parte CPC). Para determinar a incidência desta regra de concentração ou de preclusão, importa ter presente que, na contestação, o réu tanto pode alegar factos novos que fundamentam uma excepção dilatória ou peremptória, como limitar-se a impugnar os factos invocados pelo autor na petição inicial (art. 487º/2 CPC). 73. Conteúdo material A contestação pode revestir as modalidades de defesa por impugnação e por excepção (art. 487º/1 CPC). A defesa por impugnação pode ser directa ou de facto ou indirecta ou de direito: – A impugnação directa ou de facto consiste na contradição pelo réu dos factos articulados na petição inicial (art. 487º/2, 1ª parte CPC);



A impugnação é indirecta ou de direito quando o réu afirma que os factos alegados pelo autor não podem produzir o efeito jurídico pretendido por essa parte (art. 487º/2, 1ª parte in fine CPC). A impugnação directa é um meio de defesa do réu; como o Tribunal conhece oficiosamente a matéria de direito (art. 664º, 1ª parte CPC), este órgão, mesmo sem essa impugnação, deve controlar se os efeitos jurídicos pretendidos pelo autor podem decorrer dos factos alegados por esta parte. A delimitação entre a impugnação indirecta e a excepção peremptória faz-se, por isso, através do seguinte critério: Se o réu se limita a negar o efeito jurídico pretendido pelo autor, isto é, a atribuir uma diferente versão jurídica dos factos invocados pelo autor, há impugnação indirecta; Se, pelo contrário, o réu opõe a esse efeito a alegação de um facto impeditivo, modificativo ou extintivo, verifica-se a dedução de uma excepção peremptória. a) Defesa por excepção: Consiste na invocação de factos que obstam à apreciação do mérito da acção ou que, servindo de causa impeditiva, modificativa ou extintiva do direito invocado pelo autor, importam a improcedência total ou parcial do pedido (art. 487º/2, 2ª parte CPC). No primeiro caso, o réu alega a falta de um pressuposto processual e invoca uma excepção dilatória (art. 493º/2 CPC); no segundo, o réu opõe uma excepção peremptória (art. 493º/3 CPC). b) Defesa por impugnação: A impugnação directa deve abranger os factos principais articulados pelo autor na petição inicial (art. 490º/1 CPC); se assim não suceder, consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados (art. 490º/2, 1ª parte CPC). A contestação produz efeitos processuais, inclui-se a possibilidade, admitida em certos casos, de réplica do autor (art. 502º/1 e 2 CPC). E substantivos, importa referir que a contestação torna litigioso o direito afirmado ou a coisa discutida em juízo, o que revela, por exemplo, para a proibição da cessação daquele direito (art. 579º CC) e da venda desse direito ou coisa (art. 876º CC). 74. Réplica É a resposta do autor à contestação do réu. A réplica pode ser entendida num sentido formal ou material: naquela primeira acepção, a réplica é o articulado que o autor apresenta em resposta à contestação do réu; em sentido material, a réplica consiste na contestação de uma excepção oposta pelo réu ou na dedução de uma excepção contra o pedido reconvencional formulado pelo réu (art. 502º/1 e 2 CPC). Se aquele articulado contiver aquela impugnação ou a dedução daquela excepção, a réplica em sentido formal é-o também em sentido material. A réplica é admissível sempre que o réu deduza alguma excepção ou formule um pedido reconvencional (art. 502º/1 CPC): naquele primeiro caso, a réplica destina-se a possibilitar a impugnação pelo autor da excepção invocada pelo réu ou a alegação de uma contra-excepção; no segundo, a réplica permite a apresentação pelo autor de qualquer contestação, por impugnação ou por excepção (art. 487º/1 CPC), do pedido reconvencional. A réplica encontra a sua

justificação nos princípios da igualdade das partes (art. 3º-A CPC) e do contraditório (art. 3º/1 e 3 CPC). A falta da réplica ou a não impugnação dos factos novos alegados pelo réu implica, em regra, a admissão por acordo dos factos não impugnados (art. 505º CPC). Esta admissão não se verifica nas situações previstas do art. 490º/2 CPC, e, além disso, há que conjugar o conteúdo da réplica com o da petição inicial, pelo que devem considerar-se impugnados os factos alegados pelo réu que forem incompatíveis com aqueles que constarem de qualquer desses articulados do autor. Se o réu tiver formulado um pedido reconvencional, a falta de réplica implica a revelia do reconvindo quanto a esse pedido (art. 484º/1 CPC). Essa revelia é inoperante nas condições referidas no art. 485º CPC, mas, se for operante, determina a confissão dos factos articulados pelo réu como fundamento do seu pedido reconvencional (art. 484º/1 CPC). Acessoriamente a estas funções, a réplica pode ser utilizada para o autor alterar unilateralmente o pedido ou a causa de pedir (art. 273º/1 e 2 CPC) 75. Tréplica É a resposta do réu à réplica do autor. Também a tréplica pode ser referida numa acepção formal ou material: em sentido formal, a tréplica é o articulado de resposta do réu à réplica do autor; a tréplica em sentido material é a contestação pelo réu das excepções opostas à reconvenção na réplica, a impugnação da admissibilidade da modificação do pedido ou da causa de pedir realizada pelo autor na réplica (art. 273º/1 e 2 CPC) ou a contestação da nova causa de pedir ou do novo pedido apresentado pelo autor na réplica (art. 503º/1 CPC). A tréplica só é admissível em duas situações (art. 503º/1 CPC): Quando o autor tiver modificado na réplica o pedido ou a causa de pedir (art. 273º/1 e 2 CPC) e o réu pretender contestar quer a admissibilidade dessa modificação, quer o novo pedido formulado ou a nova causa de pedir invocada; Quando o réu tiver deduzido um pedido reconvencional, o autor tiver alegado contra esse pedido uma excepção e o réu desejar contestá-la por impugnação ou pela invocação de uma contra-excepção. A tréplica destinase, por isso, a assegurar o contraditório do réu a essas matérias. O ónus de impugnação também vale na tréplica. Assim, a falta da tréplica, a não impugnação da nova causa de pedir e a não contestação da excepção alegada pelo autor na réplica determinam, em regra, a admissibilidade por acordo desses factos e dessa excepção (art. 505º CPC). Se o réu tiver formulado um pedido reconvencional (art. 501º/1 CPC), o autor pode contestar na réplica esse pedido através da dedução de uma excepção, à qual o réu pode responder na tréplica com a alegação de uma contra-excepção. 76. Articulados supervenientes Os articulados supervenientes são utilizados para a alegação de factos que, dada a sua superveniência, não puderam ser invocados nos articulados normais (art. 506º/1 CPC). Essa superveniência pode ser objectiva ou subjectiva:

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É objectiva quando os factos ocorrem posteriormente ao momento da apresentação do articulado da parte (art. 506º/2, 1ª parte CPC); É subjectiva quando a parte só tiver conhecimento de factos ocorridos depois de findar o prazo de apresentação do articulado (art. 506º/2, 2ª parte CPC). A superveniência objectiva é facilmente determinável: se o facto ocorreu depois da apresentação do articulado da parte, ele é necessariamente superveniente. Mais complexa é a aferição da superveniência subjectiva, porque importa verificar em que condições se pode dar relevância desconhecimento do facto pela parte. O art. 506º/4 CPC, estabelece que o articulado superveniente deve ser rejeitado quando, por culpa da parte, ele for apresentado fora de tempo, isto é, quando a parte não tenha tido conhecimento atempado do facto por culpa própria (art. 506º/3 CPC). Portanto, a superveniência subjectiva pressupõe o desconhecimento não culposo do facto.

FASE DA CONDENSAÇÃO 77. Função da fase Realiza duas funções primordiais: uma respeitante aos aspectos jurídicoprocessuais da acção e uma outra relativa ao seu objectivo. Naquela primeira função, cabe a verificação da regularidade do processo e, sempre que possível, a sanação das excepções dilatórias e das nulidades processuais: é a função de saneamento. Na segunda, inclui-se o convite à correcção e ao aperfeiçoamento dos articulados e a determinação das questões de facto a resolver: é a função de concretização. A função de saneamento visa resolver os impedimentos à apreciação do mérito da acção e sanar as nulidades processuais e a função de concretização permite delimitar as questões de facto relevantes para a decisão da causa. 78. Despacho pré-saneador É proferido pelo juiz sempre que importe obter a sanação das excepções dilatórias (art. 508º/1-a CPC) ou a convidar as partes ao aperfeiçoamento ou à correcção dos articulados das partes (art. 508º/1-b CPC). Ao Tribunal incumbe providenciar, mesmo oficiosamente, pelo suprimento da falta de pressupostos processuais susceptíveis de sanação, quer determinando a realização dos actos necessários à regularização da instância, quer convidando as partes a praticá-los (art. 265º/2 CPC). Se o Tribunal ainda não tiver promovido essa sanação (tal como permite o art. 265º/2 CPC), o momento adequado para o fazer é o despacho pré-saneador (art. 508º/1-a CPC). O Tribunal pode utilizar o despacho pré-saneador para convidar as partes, dentro de prazos por ele fixados (art. 508º/2 e 3 CPC), a corrigirem ou a aperfeiçoarem os seus articulados (art. 508º/1-b CPC). Este despacho nunca é recorrível (art. 508º/6 CPC). São de dois tipos os vícios de que podem padecer os articulados das partes: a irregularidade e a deficiência. O articulado é irregular quando não observe os requisitos legais ou quando não seja acompanhado de documento essencial ou de qual a lei faça depender o prosseguimento da causa (art. 508º/2 CPC). O articulado é deficiente quando contenha insuficiências ou impressões na exposição ou concretização da matéria de facto (art. 508º/3 CPC), isto é, quando nele se encontrem todos os factos principais ou a sua alegação seja ambígua ou obscura. A deficiência respeita, por isso, ao conteúdo do articulado e à apresentação da matéria de facto; esse vício pode traduzir-se, por exemplo, na insuficiência dos factos alegados ou em lacunas ou saltos na sua exposição. Os factos alegados pela parte para o suprimento dessa deficiência não podem implicar uma alteração da causa de pedir ou da defesa anteriormente apresentadas (art. 508º/5 CPC) e, por isso, o réu não pode deduzir no novo articulado uma reconvenção que anteriormente não formulara. 79. Audiência preliminar

É marcada pelo Tribunal para os 30 dias subsequentes ao termo da fase dos articulados, ao suprimento das excepções dilatórias ou à correcção ou aperfeiçoamento dos articulados (art. 508º-A/1 proémio CPC). O despacho que a convoca deve indicar o seu objecto e finalidade (que é qualquer das previstas no art. 508º-A/1 CPC), mas não exclui a possibilidade de o Tribunal conhecer do mérito da causa no despacho saneador (arts. 508º/3; 510º/1-b CPC). Se a audiência preliminar for convocada, a falta das partes ou dos seus mandatários não constitui motivo do seu adiamento (art. 508º-A/4 CPC). A falta do mandatário pode reflectir-se, de modo significativo, na defesa dos interesses do seu constituinte, pelo que é susceptível de o fazer incorrer em responsabilidade perante a parte (art. 83º/1-d EOA). A audiência preliminar é dispensável quando, destinando-se à fixação da base instrutória, a simplicidade da causa não justifique a sua convocação (art. 508º-B/1-a CPC) A audiência preliminar também é dispensável quando a sua realização tivesse por finalidade facultar a discussão de excepções dilatórias (art. 508ºA/1-b CPC) e estas já tenham sido debatidas nos articulados, a sua apreciação se revista de manifesta simplicidade (art. 508º-B/1-b CPC) ou, segundo um outro critério legal, a sua discussão prévia seja manifestamente desnecessária (art. 3º/3 CPC). 80. Finalidades essenciais A audiência preliminar realiza-se com as seguintes finalidades essenciais, muitas das quais encontram a sua justificação no princípio da cooperação recíproca entre o Tribunal e as partes (art. 266º/1 CPC): Tentativa de conciliação das partes (art. 508º-A/1-a CPC); Discussão e produção de alegações pelas partes, se o juiz tiver de apreciar excepções dilatórias que as partes não hajam suscitado e discutido nos articulados ou tencionar conhecer, no todo ou em parte, do mérito da causa no despacho saneador (art. 508º-A/1-b CPC); Discussão das posições das partes, com vista à delimitação do litígio, e suprimento das insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam ou se tornem patentes na sequência do debate (art. 508º-A/1-c CPC); Proferimento do despacho saneador (art. 508º-A/1-d CPC); Finalmente, se a acção tiver sido contestada, selecção, após debate, da matéria de facto relevante para a apreciação da causa e decisão sobre as reclamações deduzidas pelas partes contra ela (art. 508º-A/1-e CPC). A audiência preliminar prossegue, assim, múltiplas funções: as principais são as da conciliação das partes, de audição prévia das partes, de saneamento do processo, de concretização do objecto do litígio e de selecção da matéria de facto (art. 508º-A/1-a, b, c, d, e CPC). 81. Concretização do litígio Visa-se atingir com essa função uma dupla finalidade: por um lado, procura-se circunscrever as divergências entre as partes, distinguindo-se aquilo que é essencial do que é acessório nas suas posições; por outro, pretende-se evitar que as insuficiências e imprecisões dos articulados na exposição da matéria de facto possam criar uma realidade processual distinta da verdade das coisas.

Para a delimitação do objecto do litígio relevam elementos de direito e de facto. Quanto àqueles primeiros, é sempre admissível uma modificação da qualificação jurídica que seja compatível com os factos alegados pelas partes. Relativamente aos elementos de facto, o problema que se coloca é o de saber se a discussão realizada para a delimitação do objecto do litígio pode ser acompanhada da modificação da causa de pedir. A resposta é positiva, mas não há qualquer motivo para entender que tal modificação deva ser admitida fora das condições legalmente previstas, isto é, para além dos casos enquadráveis na previsão do art. 272º CPC (quanto à modificação consensual) e 273º CPC (quanto à alteração unilateral). 82. Selecção da matéria de facto Escolher os factos que se devem considerar assentes e aqueles que devem ser julgados controvertidos: também esta importante tarefa se cumpre na audiência preliminar (art. 508º-A/1-e CPC). Quanto a esta selecção, a audiência visa não só prepará-la, mas também realizá-la efectivamente. A conjugação do disposto no art. 508º-A/1-e CPC, com o estabelecido no art. 511º/1 CPC, poderia levar a entender que a selecção da matéria de facto seria realizada pelo juiz depois da audiência preliminar, isto é, poderia conduzir ao entendimento de que essa audiência visaria somente a preparação da selecção a realizar posteriormente pelo juiz. A selecção da matéria de facto não pode conter qualquer apreciação de direito, isto é, qualquer valoração segundo a interpretação ou a aplicação da lei ou qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica. 83. Finalidades acessórias Sempre que a audiência preliminar se deva realizar, ela prossegue complementarmente as seguintes funções: A indicação pelas partes dos meios de prova e a decisão sobre a admissão e preparação das diligências probatórias, salvo se alguma das partes requerer a sua apresentação posterior (art. 508º-A/2-a CPC); Se o processo estiver em condições de prosseguir para julgamento (se o processo não dever terminar no despacho saneador, art. 510º/1 CPC), a designação da data de realização da audiência final (art. 508º-A/2-b CPC) e, em certas acções não contestadas, a solicitação da intervenção do Tribunal colectivo (art. 646º/2-a CPC); Finalmente, a apresentação do requerimento da gravação da audiência final (art. 508º-A/2-c; arts. 522º-B e 522º-C CPC). Conjuntamente com a indicação dos meios de prova (art. 508º-A/2-a CPC), as partes, quando não pretenderem provar os próprio facto principal seleccionado na base instrutória, têm o ónus de indicar os factos instrumentais que desejam utilizar para a prova desse facto. Isto é, como todas as provas constituendas exigem a preferência do facto com que se pretende provar com elas (arts. 552º/2; 577º/1; 612º e 633º CPC), a parte, se não quiser demonstrar com essas provas o próprio facto principal seleccionado, tem o ónus de alegar os factos instrumentais que pretende demonstrar com a prova requerida. Uma outra finalidade acessória da audiência preliminar é o exercício do contraditório. Se, em virtude da limitação legal do número de articulados, alguma das partes não puder responder a uma excepção deduzida no último

articulado admissível, ela pode responder à matéria desta na audiência preliminar (art. 3º/4 CPC).

84. Despacho saneador O despacho saneador pode apreciar tanto os aspectos jurídico-processuais da acção, como o mérito desta (art. 510º/1 CPC). Nestas funções atribuídas ao despacho saneador, a apreciação daqueles aspectos constitui a sua finalidade primária e o seu conteúdo essencial, enquanto o conhecimento do mérito é uma finalidade eventual. O julgamento do mérito realiza-se normalmente na sentença final (art. 658º CPC), pelo que quando o estado da causa o permitir (art. 510º/1-b CPC), ele pode ser antecipado para o despacho saneador. O despacho saneador destina-se, antes de mais, a verificar a admissibilidade da apreciação do mérito e a regularidade do processo (art. 510º/1-a CPC); havendo toda a vantagem em que o controlo dessa admissibilidade não seja relegada para uma fase adiantada da tramitação da acção, é ela que justifica a atribuição daquela função de saneamento àquele despacho. O momento do proferimento do despacho saneador depende da tramitação da causa em concreto. Se não houver que proceder à convocação da audiência preliminar (art. 508º-B/1 CPC), o despacho saneador é proferido no prazo de 20 dias a contar do termo da fase dos articulados (art. 510º/1 proémio CPC). No despacho saneador, o Tribunal deve conhecer das excepções dilatórias e das nulidades processuais que haja sido suscitadas pelas partes ou que, face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar oficiosamente (art. 510º/1-a CPC). Quanto àquelas nulidades, o Tribunal pode apreciar oficiosamente a ineptidão da petição inicial, a falta de citação, o erro na forma do processo e a falta de vista ou exame ao Ministério Público como parte acessória (art. 202º CPC). mas estas nulidades só são apreciadas no despacho saneador se o Tribunal ainda não tiver conhecido delas (art. 206º/1 e 2, 1ª parte CPC). Também as nulidades que não são de conhecimento oficioso deverão ser julgadas logo que sejam reclamadas (art. 206º/3 CPC), pelo que a sua apreciação não se realizará, em regra, no despacho saneador. Quando o despacho saneador conheça de uma excepção dilatória ou de uma nulidade processual, ele só adquire força de caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas (art. 510º/3 1ª parte CPC). Assim, apenas o julgamento concreto sobre a inexistência de uma excepção ou nulidade impede que essa matéria possa voltar a ser apreciada no processo pendente (art. 660º/1 CPC). Pelo contrário, a referência genérica no despacho saneador à inexistência de qualquer excepção dilatória ou nulidade processual não adquire força de caso julgado (art. 510º/3, 1ª parte CPC) e, por isso, não impede que o Tribunal venha a apreciar, na sentença final, uma dessas excepções ou nulidades (art. 660º/1 CPC). A apreciação do mérito e o proferimento da decisão sobre a sua pendência ou improcedência é realizada, em regra, na sentença final (art. 658º CPC). Mas, em certas condições, essa apreciação pode ser antecipada para o despacho saneador: Tribunal pode conhecer do mérito da acção nesse despacho sempre que o estado do processo permita, sem necessidade de mais provas, a apreciação do pedido, de algum dos pedidos cumulados, do

pedido reconvencional ou ainda da procedência ou improcedência de alguma excepção peremptória (art. 510º/1-b CPC). Neste caso, o despacho saneador fica tendo, para todos os efeitos, o valor de sentença (art. 510º/3, 2ª parte CPC) e dele cabe recurso de apelação (art. 691º/1 CPC). Nas condições referidas no art. 288º/3 CPC, o Tribunal pode conhecer do mérito ainda que verifique que falta um pressuposto processual. Esta situação será certamente mais frequente no despacho saneador do que na sentença final, dado que são raras as situações em que a falta do pressuposto se detecta apenas na fase da sentença ou em que a sua apreciação é relegada para esse momento (art. 510º/4 CPC).

FASE DA INSTRUÇÃO 85. Função da fase Os factos incluídos na base instrutória, porque são controvertidos ou porque nele foram inseridos por iniciativa do Tribunal (art. 264º/2 CPC), necessitam de ser provados (art. 513º CPC). A fase da instrução realiza uma função distinta consoante sejam utilizadas para a demonstração desses factos provas constituendas ou provas pré-constituídas. A produção de uma prova constituenda é realizada, em regra, na audiência final (art. 652º/3-a, b, c, d, CPC), mas essa actividade tem de ser previamente preparada: esta é uma das funções da fase da instrução, na qual são praticados os actos preparatórios da produção das provas constituendas. 86. Princípios estruturantes A fase da instrução rege-se pelo princípio da cooperação (art. 266º/1 CPC), tanto nas relações das partes e de terceiros com o Tribunal (art. 266º/1 e 519/1 CPC), como nas do Tribunal com as partes (art. 266º/4 CPC). Naquele primeiro aspecto, o princípio da cooperação impõe a todas as pessoas, mesmo que não sejam partes na causa, o dever de prestar a sua colaboração para a descoberta da verdade, respondendo ao que lhes for perguntado, submetendose às inspecções necessárias, facultando o que for requisitado e praticando os actos que forem determinados (art. 519º/1 CPC). A recusa de colaboração implica a condenação em multa, sem prejuízo dos meios coercivos que forem admissíveis (art. 519º/2, 1ª parte CPC; sobre essa multa, art. 102º-b CCJ). Este dever de colaboração é independente da repartição do ónus da prova (arts. 342º a 345º CC), pelo que abrange mesmo a parte que não está onerada com a prova do facto. A recusa de colaboração é legítima se esta implicar a violação da integridade física ou moral das pessoas (art. 519º/3-a CPC). A actividade de instrução também assenta na colaboração do Tribunal com as partes da acção (arts. 266º/4; 519º-A/1 CPC). Apesar de o objecto do processo se encontrar, em geral, submetido à disponibilidade das partes (arts. 264º/1; e 664º in fine CPC), a instrução comporta importantes poderes instrutórios do Tribunal. Esses poderes podem recair sobre factos essenciais, complementares e instrumentais e justificam-se pela necessidade de evitar que, pela falta de prova, a decisão da causa seja imposta pelo non liquet (art. 516º CPC; art. 346º CC) e não pela realidade das coisas averiguada em juízo. Nenhum facto relevante para a decisão da causa deve ficar por esclarecer. A actividade de instrução comporta importantes poderes inquisitórios do Tribunal sobre os factos instrumentais. Segundo o estipulado no art. 264º/2 CPC, o Tribunal pode considerar, mesmo oficiosamente, os factos instrumentais e utilizá-los na sentença quando resultem da instrução e julgamento da causa. Uma das consequências destes poderes inquisitórios sobre os factos instrumentais é a possibilidade de o Tribunal investigar factos que permitam provar os factos principais que constam da base instrutória (arts.

508º-A/1-e e 508º-B/2 CPC) e que constituem o objecto da instrução (art. 513º CPC). O princípio do contraditório (art. 3º/1 a 3 CPC) também releva na instrução da acção. Assim, as provas não são admitidas (nem produzidas) sem a audiência contraditória da parte a quem sejam opostas (art. 517º/1 CPC). Essa contrariedade concretiza-se de modo diferente nas provas pré-constituídas. Relativamente às provas pré-constituídas, qualquer das partes tem a faculdade de impugnar tanto a respectiva admissão, como a sua força probatória (art. 517º/2, 2ª parte CPC). Quanto às provas constituendas, a parte deve ser notificada, sempre que não seja relevante, para todos os actos de preparação e produção da prova e é admitida a intervir nesses mesmos actos (art. 517º/2, 1ª parte CPC). 87. Meios de prova Os meios de prova podem ser indicados ou requeridos na petição inicial (art. 467º/2 CPC) e, por analogia, em qualquer outro articulado. Se isso não tiver acontecido, esses meios devem ser apresentados ou requeridos na audiência preliminar, salvo se alguma das partes requerer, com motivos justificados, a sua apresentação ulterior (art. 508º-A/2-a CPC); se essa audiência não se realizar, os meios de prova devem ser apresentados ou requeridos nos 15 dias subsequentes à notificação do despacho saneador (art. 512º/1 CPC). Neste mesmo prazo, as partes podem alterar os requerimentos probatórios que hajam feito nos articulados (art. 512º/1, 2ª parte CPC). Depois deste prazo, o rol de testemunhas ainda pode ser alterado ou aditado até 20 dias antes da data da realização da audiência final (art. 512º-A/1 CPC), sendo a parte contrária notificada para usar, se quiser, de igual faculdade no prazo de 5 dias (art. 512º-A/1 in fine CPC). A apresentação das novas testemunhas incumbe às partes (art. 512º-A/2 CPC), isto é, o Tribunal não procede à sua notificação. Meios de prova: a) Prova por confissão (arts. 552º segs. CPC); b) Prova documental (arts. 523º segs. CPC) c) Prova pericial (arts. 568º segs. CPC); d) Prova testemunhal (arts. 616º segs. CPC); e) Inspecção judicial (arts. 612º segs. CPC); f) Apresentação de coisas.

FASE DA AUDIÊNCIA FINAL 88. Função da fase A fase da audiência final compreende as actividades de produção da prova (constituenda), de julgamento da matéria de facto e de discussão sobre a matéria de direito. Como resulta deste enunciado, esta fase realiza duas funções primordiais – que são a produção da prova e o consequente julgamento da matéria de facto – e uma função preparatória da sentença final – que é prosseguida pelas alegações de direito. 89. Princípios estruturantes Segundo o princípio da imediação, os meios de prova devem ser apresentados directamente perante o Tribunal, ou seja, o Tribunal deve ter um contacto directo com esses meios. É este princípio que orienta o disposto no art. 652º/3 CPC, quanto à realização da prova perante o Tribunal da audiência final. Sempre que a prova seja transmitida por pessoas, a imediação na produção da prova implica a oralidade nessa realização. a) Publicidade As audiências dos Tribunais são públicas, salvo quando o próprio Tribunal decidir, em despacho fundamentado, excluir essa publicidade para salvaguardar a dignidade das pessoas e a moral pública ou para garantir o seu normal funcionamento (art. 206º CRP; sobre essa publicidade, também art. 10º Declaração Universal dos Direitos do Homem; art. 14º/1 Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos; art. 6º/1 Convenção Europeia dos Direitos do Homem). A audiência final deve ser, com essas mesmas excepções, públicas (art. 656º/1 CPC). Mesmo quando a audiência seja pública, a publicidade pode ser excluída quando se proceda à exibição de reproduções cinematográficas ou de registos fonográficos (art. 652º/3-b, 2ª parte CPC). Dado que a lei não define os critérios para a exclusão da publicidade neste caso, deve entender-se que valem aqueles que se encontram enunciados no art. 206º CRP (bem como no art. 656º/1 CPC). b) Continuidade A audiência final é contínua, só podendo ser interrompida por motivos de força maior, por absoluta necessidade ou nos casos regulados na lei (art. 656º/2, 1ª parte CPC), como sucede naqueles que estão previstos nos arts. 650/4; 651º/3; 654º/2 CPC. Se não for possível conclui-la num dia, o presidente marcará a sua continuação para o dia útil imediato, ainda que compreendido em férias, e assim, sucessivamente (art. 656º/2, 2ª parte CPC). c) Plenitude Segundo o princípio da plenitude da assistência dos juízes, só podem intervir na decisão da matéria de facto aqueles que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final (art. 654º/1 CPC). A violação desta regra origina uma nulidade processual (art. 201º/1 CPC). Se durante a audiência, algum dos juízes falecer ou se impossibilitar permanentemente, os actos já realizados são repetidos perante um Tribunal com uma nova composição (art. 654º/2, 1ª parte CPC). Se a impossibilidade for temporária, interrompe-se a audiência ou, se parecer mais aconselhável,

repetem-se perante um novo Tribunal os actos já praticados (art. 654º/2, 2ª parte CPC). Se o juiz for transferido, promovido ou aposentado, conclui-se, em princípio, o julgamento antes da efectivação dessa deslocação ou aposentação, excepto se esta se fundamentar na incapacidade física, moral ou profissional para o exercício do cargo (art. 654º/3, 1ª parte CPC). d) Documentação A audiência final e os depoimentos, informações e esclarecimentos nela prestados são gravados, sempre que alguma das partes o requeira (arts. 508ºA/2-c, e 512º/1 CPC) ou o Tribunal o determine (art. 522º-B CPC). A gravação é efectuada por sistema sonoro, excepto quando possa ser realizada por meios audiovisuais ou semelhantes (art. 522º-C CPC), e abrange a discussão da causa (art. 652º/1 CPC), a tentativa de conciliação entre as partes (art. 652º/2 CPC), a produção da prova (art. 652/3-a, b, c, d, CPC), os debates sobre a matéria de facto (art. 652º/3-e; n.º 5 CPC), a leitura do acórdão de julgamento da matéria de facto e as eventuais reclamações deduzidas pelas partes (art. 653º/4 CPC) e ainda a discussão oral do aspecto jurídico da causa (arts. 653º/5 e 657º CPC). Se algum depoimento houver de ser prestado fora do Tribunal (art. 652º/4 CPC), também ele deverá ser gravado. e) Efectivação A produção da prova orienta-se por um princípio de efectividade, através do qual se procura evitar que essa actividade se torne impossível por não ter sido realizada no momento oportuno. Com vista a assegurar a efectividade da produção da prova, permite-se que, se houver justo receio de vir a tronar-se impossível ou muito difícil o depoimento de certas pessoas ou a verificação de certos factos por meio de arbitramento ou inspecção, a produção destas provas possa ser antecipada ou mesmo realizada antes da propositura da acção (art. 520º CPC). É o que se chama produção antecipada da prova (ou prova ad perpetuam rei memoriam), que como pressuposto especifico o receio da impossibilidade ou da dificuldade da realização da prova no momento normal. 90. Tribunal da audiência A discussão e o julgamento da causa são realizados, em regra, com a intervenção do Tribunal colectivo (art. 646º/1 CPC). Esse Tribunal é um Tribunal de círculo (art. 81º/1-b LOTJ) ou uma vara cível (art. 72º LOTJ); onde não os houver, é competente um Tribunal colectivo strictu sensu (art. 79º-b LOTJ). Mas, em certas situações, a audiência final decorre perante um Tribunal singular. Quanto às situações de revelia inoperante, há que distinguir três hipóteses: Se a revelia for inoperante por qualquer das circunstâncias previstas no art. 485º-b, c, d, CPC, a audiência final decorre perante o Tribunal singular excepto se as partes requererem a intervenção do Tribunal colectivo na audiência preliminar ou nos 15 dias subsequentes à notificação do despacho saneador (art. 646º/2-a; art. 512º-1 CPC); Se a inoperância da revelia resultar da contestação de algum dos litisconsortes (art. 485º-a CPC), a audiência final realiza-se perante o Tribunal colectivo (art. 646º/2-a CPC); Se a revelia for inoperante porque a citação do réu não foi pessoal (art. 484º/1 CPC), a audiência final decorre perante o Tribunal colectivo (art. 646º/1 CPC).

Se o julgamento for realizado por um Tribunal singular quando deveria ter intervindo um Tribunal colectivo, é aplicável – diz o art. 646º/3 CPC – o disposto no art. 110º/4 CPC, do qual resulta que aquela incompetência do Tribunal singular pode ser suscitada pela partes ou ser conhecida oficiosamente até ao termo da audiência final. Note-se que, apesar desta remissão, a incompetência prevista no art. 646º/3 CPC, é, como categoria processual, totalmente distinta daquela que é regulada pelo art. 110º/4 CPC: aquela é uma incompetência funcional, porque se refere à distribuição de poderes dentro do Tribunal competente para a apreciação da acção; esta última é uma incompetência jurisdicional. Assim, aquela incompetência do Tribunal singular não conduz à consequência da incompetência relativa (art. 111º/3 CPC), mas à nulidade do acto processual realizado pelo Tribunal singular, isto é, do julgamento da matéria de facto (art. 201º/1 CPC). 91. Realização da audiência A audiência inicia-se com a discussão da causa (art. 652º/1 CPC), isto é, com a apresentação por cada um dos advogados das partes os fundamentos das suas posições quer quanto à matéria de facto, quer quanto à matéria de direito. Se o objecto da acção for uma situação disponível, o presidente procurará conciliar as partes (art. 652º/2 CPC). Sempre que alguma das partes, em consequência da limitação legal do número de articulados, não possa responder a uma excepção deduzida pela outra no último articulado admissível, aquela parte pode exercer o contraditório no início da audiência final, se não se realizou a audiência preliminar (art. 3º/4 CPC). Produção de prova: a) Depoimento de parte, a produção de prova começa pela prestação de depoimento de parte (art. 652º/3-a CPC), quando ele tiver sido ordenado pelo Tribunal ou requerido pela outra parte, por uma comparte (arts. 552º/1, e 553º/3 CPC) ou pelo assistente (arts. 339º e 332º/1 CPC). b) Prova documental, embora deva ser apresentada, em regra, antes da audiência final (art. 523º/1 CPC), essa audiência é o momento adequado para a exibição de reproduções cinematográficas ou de registos fonográficos (art. 652º/3-b, 1ª parte; 527º CPC; arts. 206º CRP, 656º/1 CPC). c) Prova pericial, o resultado da perícia consta de um relatório (art. 596º/1 CPC), pelo que, em regra, os peritos não são chamados a depor na audiência final. Mas a presença dos peritos nesta audiência pode ser ordenada oficiosamente pelo Tribunal ou requerida por qualquer das partes, para que eles possam prestar os esclarecimentos verbais que lhes forem solicitados (art. 652º/3-c CPC). d) Prova testemunhal, as testemunhas são inquiridas na audiência final (arts. 621º proémio e 652º/3-d CPC), excepto se for requerida a sua inquirição antecipada (arts. 621º-a e 520º CPC) ou por carta (art. 621º-b CPC). A parte pode requerer a inquirição da testemunha por carta quando ela resida fora da área do círculo judicial ou da ilha (art. 623º/1 CPC) ou da área metropolitana da sede do Tribunal (art. 623º/4 CPC). Contra a prova testemunhal pode reagir-se por impugnação, contradita ou acareação: A impugnação questiona a admissibilidade do depoimento (arts. 636º; 637º CPC), ou seja, tem por fundamento a incapacidade natural ou a inabilidade legal da testemunha (arts. 616º e 617º CPC);

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A contradita baseia-se na alegação de qualquer circunstância capaz de abalar a credibilidade do depoimento, quer por efectuar a razão da ciência invocada pela testemunha, quer por diminuir a fé que ela possa merecer (arts. 640º; 641º CPC); A acareação consiste no confronto das testemunhas, ou das testemunhas e das partes, cujos depoimentos mostrem uma oposição directa acerca de determinado facto (arts. 642º; 643º CPC). e) Debates, após a produção da prova, realizam-se os debates sobre a matéria de facto (art. 652º/3-e CPC). Estes debates definem um importante momento na tramitação da acção. Eles marcam o termo ou encerramento da discussão, o qual determina o limite temporal da alteração do pedido (art. 273º/2 CPC), da apresentação dos articulados supervenientes (art. 506º/2 CPC), da junção de documentos (art. 523º/2 CPC), da ampliação da base instrutória pelo presidente do Tribunal colectivo (art. 650º/2-f CPC) e da consideração pelo Tribunal dos factos constitutivos, modificativos e extintivos (art. 663º/1 CPC). 92. Princípios do julgamento a) Aquisição processual Segundo o princípio da aquisição processual, o Tribunal deve tomar em consideração todas as provas realizadas no processo, mesmo que não tenham sido apresentadas, requeridas ou produzidas pela parte onerada com a prova (art. 515º, 1ª parte CPC). Uma das consequências deste princípio é a impossibilidade de retirar do processo uma prova apresentada (art. 542º/3 e 4 CPC). O mesmo processo justifica a inadmissibilidade da desistência da prova pericial pela parte requerente sem a anuência da parte contrária (art. 576º CPC). Exceptuam-se a submissão a este princípio da aquisição processual as situações em que a lei declare irrelevante a alegação e a prova de um facto quando não sejam feitas por uma certa parte (art. 515º, 2ª parte CPC). É o que sucede com a confissão, que só pode ser feita pela parte para a qual o facto reconhecido é desfavorável (art. 352º CC), e, mais casuisticamente, com a prova da maternidade na respectiva acção de investigação, a qual só pode ser realizada pelo filho investigante (art. 1816º/1 CC). b) Livre apreciação da prova Algumas das provas que permitem o julgamento da matéria de facto controvertida e a generalidade daquelas que são produzidas na audiência final (art. 652º/3-b, c, d, CPC) estão sujeitas à livre apreciação do Tribunal (art. 65º/1 CPC): é o caso da prova pericial (art. 389º CC; art. 591º CPC), da inspecção judicial (art. 391º CC) e da prova testemunhal (art. 396º CC). A prova livre está excluída sempre que a lei conceda um valor legal a um determinado meio de prova (arts. 358º/1 e 2, 371º/1, 376º e 377º CC), assim como quando a lei exigir, para a existência ou prova do facto jurídico, qualquer formalidade especial (art. 655º/2 CPC). c) Fundamentação Na decisão sobre a matéria de facto devem ser especificados os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador sobre a prova (ou falta de prova) dos factos (art. 653º/2 CPC). Como, em geral, as provas produzidas na audiência final estão sujeitas à livre apreciação (arts. 655º/1 e 652º/3-b, c, d, CPC), o Tribunal deve indicar os fundamentos suficientes para

que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado. A exigência da motivação da decisão não se destina a obter a exteriorização das razões psicológicas da convicção do juiz, mas a permitir que o juiz convença os terceiros da correcção da sua decisão. Através dessa fundamentação, o juiz deve passar de convencido a convincente. A fundamentação da apreciação da prova deve ser realizada separadamente para cada facto. A apreciação de cada meio de prova pressupõe conhecer o seu conteúdo, determinar a sua relevância e proceder à sua valoração. 93. Procedimento do julgamento Encerrada a discussão (art. 652º/3-e CPC), o Tribunal recolhe à sala das conferências para ponderar e decidir (art. 653º/1, 1ª parte CPC). Se não se julgar suficientemente esclarecido, pode voltar à sala da audiência, ouvir as pessoas que entender e ordenar quaisquer diligências necessárias (art. 653º/1, 2ª parte CPC). A matéria de facto é decidida por meio de acórdão ou despacho, se o julgamento incumbir a Tribunal singular (art. 653º/2, 1ª parte CPC). A decisão do Tribunal colectivo é tomada por maioria e o acórdão é lavrado pelo presidente, podendo qualquer dos juízes assinar vencido quanto a qualquer ponto da decisão ou formular declaração divergente quanto à sua fundamentação (art. 653º/4 CPC). Aquela decisão deve declarar quais os factos que o Tribunal julga provados e quais os que considera não provados e especificar, quanto a todos eles, os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (art. 653º/2 CPC). As partes podem reclamar contra a falta dessa motivação (art. 653º/4, 2ª parte CPC) e ela pode ser exigida pela Relação (art. 712º/5 CPC). Ao Tribunal compete, no julgamento da matéria de facto, analisar criticamente as provas (art. 653º/2 CPC). Esta análise refere-se às presunções legais e judiciais das quais pode ser inferida a prova do facto controvertido (arts. 349º a 351º CC). O Tribunal de audiência não pode pronunciar-se sobre matéria de direito, isto é, não pode ocupar-se da aplicação do direito aos factos provados. Considera-se inexistente qualquer resposta desse Tribunal sobre essa matéria (art. 646º/4, 1ª parte CPC). 94. Discussão da matéria de direito A fase da audiência final termina com a discussão da matéria de direito, que se destina a discutir a interpretação e aplicação da lei aos factos julgados provados (arts. 653º/5 in fine, e 657º in fine CPC) e que se pode realizar oralmente ou por escrito. Em regra, a discussão do aspecto jurídico da causa realiza-se oralmente perante o juiz a quem caiba lavrar a sentença final (arts. 653º/5, 1ª parte e 657º CPC), isto é, no caso do Tribunal colectivo, perante o seu presidente (art. 80º-c LOTJ). Mas se as partes não prescindirem da discussão escrita do aspecto jurídico da causa, a secretaria, uma vez concluído o julgamento da matéria de facto, faculta o processo para exame do advogado ao autor e depois ao do réu, pelo prazo de 10 dias a cada um, a fim de alegarem por escrito sobre a interpretação e aplicação da lei aos factos que

tiverem sido considerados provados e àqueles que deverem ser tidos por assentes (art. 657º CPC).

FASE DA SENTENÇA 95. Função da fase A fase da sentença é aquela em que é proferida a decisão final do procedimento em 1ª instância. O proferimento da sentença final depende da forma da discussão do aspecto jurídico da causa: Se essa discussão se realizou por escrito (art. 657º CPC), o processo é concluso ao juiz, para o proferimento da decisão no prazo de 30 dias (art. 658º CPC); Se essa discussão tiver sido oral (art. 653º/5 CPC), a sentença pode ser logo lavrada por escrito ou ditada para a acta (art. 659º/4 CPC). A sentença é proferida pelo juiz da causa ou pelo presidente do Tribunal colectivo (art. 80º-c LOTJ) ou do Tribunal de círculo (art. 81º/1-b LOTJ). 96. Conteúdo da sentença A sentença comporta os seguintes elementos: relatório, fundamentos, decisão e aspectos complementares. No relatório, o Tribunal identifica as partes e o objecto do litígio e fixa as questões que lhe cumpre solucionar (art. 659º/1 CPC). Ao relatório seguem-se os fundamentos, nos quais o Tribunal deve discriminar os factos que considera provados e admitidos por acordo e indicar, interpretar e aplicar as correspondentes normas jurídicas (art. 659º/2, 3 CPC). A sentença termina com a parte decisória ou dispositiva (art. 659º/2 in fine CPC), na qual se contém a decisão de condenação ou de absolvição, e deve ser assinada e datada (arts. 157º/1, e 668º/1-a CPC). A sentença deve ser motivada (art. 208º/1 CRP; art. 158º/1 CPC) através da exposição dos fundamentos de facto – respeitam aos factos relevantes para a decisão que foram adquiridos durante o processo – e de direito – à interpretação e aplicação das normas jurídicas aplicáveis a esses factos – (art. 659º/2 CPC). Como fundamentos de facto devem ser utilizados todos os factos que foram adquiridos durante a tramitação da causa. Nos termos do art. 659º/3 CPC, integram esses fundamentos: Os factos admitidos por acordo, ou seja, os factos alegados por uma parte e não impugnados pela contraparte (arts. 490º/2, e 505º CPC), mesmo que não tenham sido considerados assentes; Os factos provados por documentos juntos ao processo por iniciativa das partes (arts. 523º e 524º CPC) ou do Tribunal (arts. 514º/2, e 535º CPC); Os factos provados por confissão reduzida a escrito, seja ela uma confissão judicial ou extrajudicial (arts. 356º e 358º CC; art. 563º/1 CPC); Os factos julgados provados pelo Tribunal singular ou colectivo na fase da audiência final (art. 653º/2 e 3 CPC); Os factos que resultam do exame crítico das provas, isto é, aqueles que podem ser inferidos, por presunção judicial ou legal, dos factos provados (arts. 349º a 351º CC). A estes factos acrescem ainda os factos notórios (art. 514º/1 CPC) e os de conhecimento oficioso (art. 660º/2 in fine CPC).

O sentido da decisão depende dos factos fornecidos pelo processo (com consideração do princípio da aquisição processual, art. 515º CPC) e da análise do cumprimento do ónus da prova (art. 516º CPC; art. 346º, 2ª parte CC). 97. Conteúdo do julgamento A sentença começa por conhecer das excepções dilatórias que conduzem à absolvição da instância, segundo a ordem da sua precedência lógica (art. 660º/1 CPC). Estas excepções podem ser tanto aquelas que o Tribunal deixou de apreciar no despacho saneador, por entender que, nesse momento, o processo ainda não fornecia os elementos necessários (art. 510º/4 CPC), como aquelas que não foram apreciadas concretamente nesse despacho e sobre as quais não há, por isso, qualquer caso julgado (art. 510º/3, 1ª arte CPC). Dado que o despacho saneador genérico não produz caso julgado quanto à existência ou inexistência de qualquer excepção dilatória (art. 510º/3, 1ª parte CPC), o Tribunal não está impedido de a apreciar na sentença final. Entre o despacho saneador e o termo da discussão (art. 652º/3-e CPC) pode verificar-se a sanação ou a cessação de uma excepção dilatória. Aquelas eventualidades não podem deixar de ser consideradas na sentença final, podendo invocar-se a analogia com o disposto no art. 663º/1 CPC, quanto à consideração nessa sentença dos factos constitutivos, modificativos ou extintivos ocorridos até ao encerramento da discussão. Assim, na acção pendente na 1ª instância, é relevante qualquer sanação ou cessação de uma excepção dilatória, desde que ocorra até ao encerramento da discussão. O art. 660º/1 in fine CPC, impõe o conhecimento das excepções dilatórias segundo a ordem da sua precedência lógica. São dois os preceitos que contêm enumerações de excepções dilatórias – os arts. 288º/1 e 494º CPC –, mas elas não se subordinam a nenhuma ordenação lógica, porque, por exemplo, as excepções de litispendência e de caso julgado (art. 449º-i CPC, e que cabem na enumeração residual do art. 288º/1-e CPC) são referidas depois de outras excepções dilatórias, sendo certo que, se algumas destas excepções merecem uma apreciação prévia perante as demais, as excepções de litispendência e de caso julgado estão claramente entre elas. A apreciação de qualquer excepção dilatória na sentença final cede perante a possibilidade de um julgamento de mérito favorável à parte que seria beneficiada com a verificação do pressuposto processual que não está preenchido (art. 288º/3 CPC). Como consequência da disponibilidade das partes sobre o objecto da causa (arts. 264º/1 e 3, e 664º in fine CPC), o âmbito do julgamento comporta dois limites. Um limite mínimo decorre do dever de conhecimento na sentença de todas as questões submetidas pelas partes à apreciação do Tribunal, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (art. 60º/2, 1ª parte CPC). A falta de apreciação de qualquer dessas questões conduz à nulidade da sentença por omissão de pronúncia (art. 668º/1-d, 1ª parte CPC). 98. Formalidades complementares A sentença é registada num livro especial (art. 157º/4 CPC; art. 17º/1 LOSJ). Se a parte vencida pretender interpor recurso da decisão, deve fazê-lo por meio de requerimento dirigido ao Tribunal que a proferiu (art. 687º/1 CPC).

Passados três meses após o trânsito em julgado da sentença (art. 677º CPC), o processo é arquivado (art. 24º/1-b LOTJ). PROCESSO SUMÁRIO E SUMARÍSSIMO PROCESSO SUMÁRIO 99. Regime aplicável Ao processo são aplicáveis as disposições que lhe são próprias (constam dos arts. 783º a 792º CPC) e as disposições gerais e comuns (estabelecido nos arts. 137º a 459º; 463º/1, 1ª parte CPC); em tudo quanto não estiver regulado numas e noutras, deve observar-se o que se encontra estabelecido para o processo ordinário (ou seja, o disposto nos arts. 467º a 782º; 463º/1, 2ª parte CPC). Dada esta aplicação subsidiária do regime do processo ordinário, só interessa analisar as especialidades do processo sumário. Depois da apresentação da petição inicial, o réu é citado para contestar no prazo de 20 dias (arts. 183º, 785º, 784º - 158º/2; 786º; 484º/1 CPC). PROCESSO SUMARÍSSIMO 100. Regime aplicável Ao processo sumaríssimo são aplicáveis as disposições próprias (arts. 793º a 796º CPC) e as gerais e comuns (arts. 137º a 459º; 464º, 1ª parte CPC). O art. 464º, 2ª parte CPC, determina que, quando umas e outras sejam omissas ou insuficientes, observar-se-á primeiramente o que estiver estabelecido para o processo sumário (arts. 783º a 792º CPC) e depois o que estiver estabelecido para o processo ordinário (arts. 467º a 782º CPC). Considerando esta subsidiariedade das regulamentações dos processos sumário e ordinário. A petição inicial dispensa a forma articulada, mas conjuntamente com ela devem ser oferecidas as provas dos factos alegado (art. 793º; 151º/2 CPC). Isto significa que, ao contrário do que sucede no processo ordinário e sumário, o autor tem o ónus de alegar na petição inicial os factos instrumentais que pretenda demonstrar através dessas provas. O réu é citado para contestar no prazo de 15 dias, exigindo-se-lhe também a apresentação ou o requerimento dos meios de prova (art. 794º/1 CPC).

A IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS ASPECTOS COMUNS CONSIDERAÇÕES GERAIS 101. Formas de impugnação As decisões judiciais podem ser impugnadas mediante reclamação ou recurso. A reclamação consiste num pedido de reapreciação de uma decisão dirigido ao Tribunal que a proferiu, com ou sem a invocação de elementos novos pelo reclamante. Os embargos constituem uma modalidade de reclamação e são um meio de reacção contra medidas de carácter executivo.

Os recursos podem ser ordinários ou extraordinários (art. 676º/2, 1ª parte CPC). O recurso ordinário é um pedido de reapreciação de uma decisão ainda não tramitada, dirigido a um Tribunal de hierarquia superior, fundamentado na ilegalidade da decisão e visando revogá-la ou substitui-la por uma outra mais favorável ao recorrente. No direito português, os recursos ordinários são a apelação, a revista e o agravo (art. 676º/2 CPC). O recurso extraordinário pode incidir sobre uma decisão transitada em julgado e desdobra-se num pedido de anulação dessa decisão (juízo rescindente) e numa solicitação de repetição dos actos invalidados (juízo rescisório). No direito português, os recursos extraordinários são a revisão e a oposição de terceiro (art. 676º/2 in fine CPC). Assim, enquanto os recursos ordinários visam o controlo da aplicação do direito ao caso concreto e recaem, por isso, sobre uma sententia iniusta ou iniqua, os recursos extraordinários destinam-se a anular uma decisão com fundamento em vícios próprios ou do respectivo procedimento, isto é, têm por objecto uma sententia nulla. Desta forma, os recursos ordinários incidem sobre o juízo ou julgamento realizado pelo Tribunal na decisão; os recursos extraordinários recaem sobre a própria decisão enquanto acto processual. A reclamação e os recursos ordinários, como meios de impugnação de decisões não transitadas, produzem um efeito suspensivo do caso julgado da decisão impugnada, porque este só se verificará quando a reclamação ou o recurso forem definitivamente julgados. Mas, enquanto a reclamação não produz qualquer efeito devolutivo, isto é, não devolve a reapreciação da questão a um Tribunal de hierarquia superior, ao recurso ordinário é conatural, no direito português, esse efeito devolutivo (arts. 28º/3-a; 41º/1-a LOTJ; arts. 71º/2 e 72º/2 CPC). É por isso que, apesar de o art. 688º CPC, a qualificar como a reclamação, a impugnação do indeferimento ou da retenção do recurso pelo Tribunal a quo é realmente um recurso, porque ela é dirigida ao presidente do Tribunal superior que seria competente para conhecer do recurso não admitido ou retido (art. 688º/1 CPC). Diferentemente dos recursos ordinários, os recursos extraordinários não produzem qualquer efeito devolutivo, pois que a revisão e a oposição de terceiro são dirigidas ao próprio Tribunal que proferiu a decisão impugnada (arts. 772º/1, 778º/2 e 782º/1 CPC). Assim, no direito português, as decisões judiciais estão sujeitas a um controlo vertical, no caso dos recursos ordinários, e a um controlo horizontal, quanto às reclamações e aos recursos extraordinários. O recurso ordinário é a forma normal de impugnação das decisões judiciais, como se pode inferir do disposto no art. 670º/1 CPC. A reclamação só pode ser utilizada quando a lei o preveja especialmente (arts. 123º/2, 511º/2, 650º/5, 653º/4, 668º/3, 700º/3 e 725º/5 CPC), havendo que considerar que, em algumas situações, essa reclamação aparece sob a designação de oposição (art. 388º/1-b CPC). Portanto, a reclamação é um meio de impugnação especial relativamente ao meio geral ou comum, que é o recurso ordinário. A caracterização da reclamação como meio de impugnação especial perante o recurso ordinário implica duas consequências importantes: Quando a reclamação for admissível, não pode ser o recurso ordinário, ou seja, esses meios de impugnação não podem ser concorrentes;

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Se a reclamação for admissível e a parte não impugnar a decisão através dela, em regra está precludida a possibilidade de recorrer dessa mesma decisão. Possível é, no entanto, a impugnação da decisão através de reclamação e, perante a sua rejeição pelo Tribunal, a continuação da impugnação através de recurso ordinário. 102. Finalidades da impugnação a) Recursos ordinários e reclamações Os recursos ordinários podem ser configurados como um meio de apreciação e de julgamento da acção por um Tribunal superior ou como um meio de controlo da decisão recorrida. Naquele primeiro caso, o objecto dos recursos coincide com o objecto da instância recorrida, pois que o Tribunal superior é chamado a apreciar e a julgar de novo a acção: o recurso pertence então à categoria dos recursos de reexame. No segundo caso, o objecto dos recursos é a decisão recorrida, dado que o Tribunal ad quem só pode controlar se, em função dos elementos apurados na instância recorrida, essa decisão foi correctamente proferida, ou seja, é conforme com esses elementos: nesta hipótese, o recurso integra-se no modelo dos recursos de reponderação. b) Recursos extraordinários Os recursos extraordinários, porque podem incidir sobre decisões transitadas em julgado, prosseguem finalidades distintas dos demais meios de impugnação: do que se trata é de apurar se algum fundamento justifica a anulação da decisão e, em caso afirmativo, de refazer a decisão impugnada. Assim, enquanto visam determinar se se verifica algum dos fundamentos taxativos que justificam a anulação da decisão, isto é, quanto ao chamado juízo rescindente (arts. 771º e 779º/1 CPC), os recursos extraordinários são equiparáveis a qualquer acção constitutiva (art. 4º/2-c CPC) e os poderes do Tribunal nessa apreciação coincidem com aqueles que lhe são reconhecidos do caso julgado e da respectiva decisão, abre-se o chamado juízo rescisório, no qual esse Tribunal reconstitui a decisão anulada (arts. 776º e 778º/1 CPC).

DIREITO À IMPUGNAÇÃO 103. Direito ao recurso A impugnação das decisões judiciais satisfaz um interesse da parte prejudicada, que assim pode obter a correcção de uma decisão que lhe é desfavorável. Aquela impugnação também corresponde aos interesses gerais da comunidade, porque a eliminação de decisões erradas ou viciadas não só combate os sentimentos de insegurança e injustiça, como favorece o prestígio dos Tribunais e a uniformização jurisprudencial. Esta faculdade de impugnação é uma consequência da possibilidade de reacção dos particulares contra os actos públicos que ofendem os seus interesses e o conhecimento dessa impugnação pelos próprios Tribunais é uma imposição da sua independência (arts. 206º CRP; 4º/1, 1ª parte EMJ). A impugnação da decisão perante um Tribunal de hierarquia superior assenta no pressuposto de que aquele Tribunal se encontra em melhores condições de apreciar o caso sub iudice do que o Tribunal recorrido.

104. Exclusão legal Como a admissibilidade da reclamação depende de uma previsão legal específica, não se pode esperar que a lei consagre explicitamente a exclusão da reclamação, pois que esta não seja admissível, basta que não esteja prevista. Por isso, há que considerar como uma previsão meramente enfática a sua exclusão expressa nos arts. 606º/6 e 653º/4 in fine CPC, que parece justificar-se pela necessidade de marcar a diferença perante lugares paralelos em que tal impugnação é admissível (arts. 511º/2 e 653º/4, 2ª parte CPC). Assim, a análise subsequente recai apenas sobre a exclusão do recurso. O art. 679º CPC, exclui o recurso dos despachos de mero expediente e daqueles que forem proferidos no uso de um poder discricionário. Encontramse alguns exemplos destes últimos no exercício dos poderes instrutórios concedidos ao Tribunal (arts. 519º-A/1, 552º/1, 569º/1-a, 589º/2, 612º/1, 622º, 645º/1, 652º/3-c e 653º/1, 2ª parte CPC). Todavia, a circunstância de os despachos discricionários não serem recorríveis só impede o controlo pelo Tribunal superior do conteúdo do despacho. A ilegalidade imputada pelo recorrente ao despacho pode resultar de diversos factores: Da não verificação dos pressupostos de que a lei faz depender o uso do poder discricionário (por ex. art. 519º-A/1 CPC); Da inobservância pelo Tribunal das opções de decisão que lhe são abertas pela lei (por ex. art. 552º/1 CPC); De desvio de poder, isto é, do uso do poder pelo Tribunal para fins distintos dos legalmente definidos ou pressupostos. 105. Renúncia à impugnação A renúncia à impugnação é o acto ou acordo pelo qual uma ou ambas as partes aceitam não reclamar ou não recorrer de uma decisão proferida ou das decisões que vierem a ser preferidas num determinado processo. A lei trata apenas de uma das modalidades possíveis desta renúncia – que é a renúncia ao recurso (art. 681º CPC) –, mas o seu regime é facilmente extensível às demais formas de impugnação. A renúncia à impugnação distingue-se quer da omissão de impugnação, quer da desistência desta. Aquela renúncia não se confunde com a omissão da impugnação, porque ela pressupõe uma manifestação de vontade de não impugnar uma decisão. Essa renúncia é igualmente distinta da desistência da impugnação, porque aquela é sempre anterior à impugnação e esta verifica-se sempre na pendência da impugnação. A renúncia à impugnação pressupõe a disponibilidade da parte tanto sobre a própria impugnação, como sobre os seus fundamentos. Quanto àquela disponibilidade, há que distinguir entre a reclamação e os recursos ordinários, por um lado, e os recursos extraordinários, por outro: Quanto à reclamação e aos recursos ordinários, a regra é a admissibilidade da sua renúncia (art. 681º/1 CPC); Quanto aos recursos extraordinários, pelo contrário, a renúncia é inadmissível, não só porque a revisão é indisponível (art. 771º CPC), mas também porque nenhum acordo entre as partes pode impedir a terceiros

prejudicado de interpor um recurso de oposição de terceiro (art. 778º CPC). A renúncia à impugnação só é admissível quanto a fundamentos disponíveis, ou seja, essa renúncia nunca pode afastar a faculdade de impugnar uma decisão com base num fundamento indisponível. As partes podem renunciar aos recursos ordinários e às reclamações. É questão relativa à interpretação da vontade das partes determinar o âmbito dessa renúncia, isto é, verificar-se se elas renunciaram apenas aos recursos ou também às próprias reclamações. A renúncia à impugnação torna-a inadmissível. No caso da renúncia ao recurso, isso constitui fundamento para que o Tribunal a quo o rejeite (art. 687º/3 CPC) e para que o Tribunal ad quem se recuse a conhecer do seu objecto (art. 701º/1 – arts. 726º, 749º, 762º/1 CPC). Esta inadmissibilidade é, assim, de conhecimento oficioso, o que também parece dever valer para a renúncia à reclamação. A renúncia à impugnação pode ser, atendendo ao momento em que é realizada, anterior ou posterior ao proferimento da decisão. A renúncia antecipada só é eficaz se provier de ambas as partes (art. 681º/1 CPC), isto é, se for bilateral. Esta renúncia não exige, contudo, um encontro simultâneo de vontades das partes; ela também pode resultar de declarações unilaterais sucessivas. A renúncia posterior pode ser unilateral ou bilateral e, em qualquer destas modalidades, tácita ou expressa. Em regra, não pode recorrer a parte que tiver aceitado a decisão de ela ter sido proferida (art. 681º/2 CPC), podendo essa aceitação resultar de uma declaração tácita ou expressa (art. 681º/3, 1ª parte CPC). A aceitação tácita é a que deriva de qualquer facto inequivocamente incompatível com a vontade de recorrer (art. 681º/3, 2ª parte CPC; art. 217º, ª parte CC) ocorrido depois do proferimento da decisão. A renúncia à impugnação pode ser total ou parcial. É total se abrange toda a decisão, todos os possíveis fundamentos de impugnação e todos os eventuais recorrentes e recorridos; é parcial se vale apenas numa certa medida objectiva ou subjectiva, isto é, se atinge apenas uma parcela da decisão ou dos fundamentos da impugnação ou somente algumas das partes da acção. A mais importante renúncia parcial subjectiva é a que só atinge uma das partes da acção (o autor ou o réu), mas, também é possível uma renúncia que respeita somente a alguns dos litisconsortes. 106. Caducidade da impugnação De modo a evitar uma permanente insegurança sobre a eficácia da decisão proferida, todos os meios de impugnação estão submetidos a prazos peremptórios. As regras são as seguintes: As reclamações devem ser deduzidas no prazo de 10 dias a contar da notificação ou do conhecimento da decisão (art. 153º/1 CPC); Em geral, os recursos ordinários devem ser interpostos igualmente no prazo de 10 dias, contados da notificação da decisão (art. 685º/1, 1ª parte CPC); O recurso de revisão deve ser interposto dentro de 5 anos seguintes ao trânsito em julgado da decisão e, dentro destes, nos prazos referidos no art. 772º/2;

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Os recursos de oposição de terceiro devem ser interposto dentro dos 3 meses seguintes ao trânsito em julgado da decisão final da acção de simulação (art. 780º/1 CPC). Como todos estes prazos são peremptórios, o seu decurso implica a caducidade da impugnação (art. 145º/3 CPC). A caducidade do recurso ordinário é de conhecimento oficioso (art. 687º/3 CPC); o mesmo vale para a caducidade dos recursos extraordinários, à qual se aplica, dada a indisponibilidade das partes sobre esses recursos e a natureza substantiva daquele prazo, o regime estabelecido no art. 333º/1 CC.

RECURSOS ORDINÁRIOS GENERALIDADES 107. Enunciado dos recursos a) Sistematização da lei A regulamentação dos recursos consta dos arts. 676º a 782º CPC. A ordem da regulamentação dos recursos ordinários não acompanha completamente os graus hierárquicos dos Tribunais recorridos, antes obedece a um critério respeitante ao objecto da decisão impugnada. A ordem é a seguinte: Primeiro, são reguladas a apelação (arts. 691º a 720º CPC) e a revista (arts. 721º a 732º-B CPC), que são os recursos que cabem das decisões relativas ao mérito; Surgem depois os regimes do agravo em 1ª instância (arts. 733º a 753º CPC) e do agravo em 2ª instância (arts. 754º a 762º CPC), que são os recursos admissíveis das demais decisões. b) Recursos na 1ª instância Os recursos ordinários interpostos de decisões proferidas pela 1ª instância são a apelação e o agravo. A apelação cabe da sentença final e do despacho saneador que decidam do mérito da causa (art. 691º/1 CPC); também nos processos especiais se consideram de apelação os recursos interpostos da sentença ou de quaisquer despachos que decidam desse mérito (art. 463º/4º CPC). O âmbito do agravo em 1ª instância delimita-se perante o da apelação: ele cabe das decisões, susceptíveis de recurso, de que não possa apelar-se (art. 733º CPC) c) Recursos na 2ª instância Os recursos ordinários que cabem das decisões proferidas pela Relação são a revista e o agravo em 2ª instância. O âmbito da revista é definido pelo seu objecto e pelo seu fundamento específico: cabe recurso de revista do acórdão da Relação que decide do mérito da causa e do qual se recorre com fundamento na violação da lei substantiva (art. 721º/1 e 2 CPC). O agravo em 2ª instância possui um âmbito residual perante a revista: ele cabe dos acórdãos da Relação dos quais não se possa recorrer de revista (art. 754º/1 CPC), seja porque o acórdão não conheceu do mérito da causa, seja porque dele se recorrer com um fundamento processual (art. 755º/1 CPC). d) Recurso para o Tribunal Constitucional O recurso para o Tribunal Constitucional é igualmente um recurso ordinário, porque deve ser interposto antes do trânsito em julgado da decisão (arts. 70º/2, 75º/1 LTC). Esse recurso pode ter por fundamento a inconstitucionalidade de uma norma (art. 280º/1 CRP; art. 70º/1-a, b, g, h, LTC). Para esse efeito, entende-se como norma, segundo um conceito funcional e formal, qualquer acto de um poder normativo do Estado (lato sensu), ainda que de conteúdo individual e concreto. e) Erro na espécie de recurso O erro na espécie do recurso verifica-se sempre que o recurso interposto não seja o apropriado à decisão recorrida ou ao fundamento invocado. Este

erro constitui uma nulidade sanável: o próprio Tribunal no qual é interposto o recurso manda seguir, no despacho que o admite, os termos do recurso adequado (art. 687º/3, 2ª parte CPC). O controlo da propriedade do recurso também compete ao Tribunal ad quem: se o relator do recurso de apelação entender que o recurso apropriado é o agravo, ouvirá, antes de decidir, as partes e julgará depois qual o recurso adequado (arts. 701º/1-b, 702º/1 CPC). Este regime é aplicável, com as necessárias adaptações, ao agravo em 1ª instância (art. 749º CPC), à revista (art. 726º CPC) e ao agravo em 2ª instância (art. 762º/1 CPC). 108. Finalidades dos recursos As decisões proferidas pelos Tribunais de recurso – e, em especial, pelos Tribunais supremos – podem realizar uma de duas finalidades: eles podem visar exclusivamente a decisão do caso concreto ou destinar-se a obter, além da resolução deste, a uniformização jurisprudencial sobre a interpretação e a aplicação da lei. Na primeira destas situações, a decisão do Tribunal superior só se torna vinculativa no caso apreciado, pelo que o recurso onde é proferida pode ser designado como um recurso casuístico; na segunda, a decisão do Tribunal torna-se um critério de decisão de casos semelhantes, isto é, é aplicável sempre que os Tribunais se devam pronunciar sobre uma questão idêntica à apreciada: o recurso que conduz ao proferimento dessa decisão pode chamar-se recurso normativo. No direito português, os recursos ordinários visam a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal recorrido no momento do seu proferimento. Isto significa que, em regra, o Tribunal de recurso não pode ser chamado a pronunciar-se sobre matéria que não foi alegada pelas partes na instância recorrida ou sobre pedidos que nela foram formulados. Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais e não meios de julgamento de questões novas. Excluída está, por isso, a possibilidade de alegação de factos novos na instância de recurso, embora isso não resulte de qualquer proibição legal, mas antes da ausência de qualquer permissão expressa. O julgamento de uma causa pressupõe a aplicação de uma lei a certos factos, isto é, esse julgamento conjuga matéria de direito e de facto. A competência decisória de recurso pode abranger ambas essas matérias ou restringir-se à matéria de facto. A possibilidade de o Tribunal de recurso conhecer de matéria de facto pressupõe que a esse Tribunal são garantidas, pelo menos, as mesmas condições que estão asseguradas ao Tribunal recorrido. Ao Tribunal superior pode ser concedido apenas o poder de revogar a decisão recorrida ou o poder de a revogar e de a substituir por uma outra: no primeiro caso, o recurso pertence ao modelo de cassação e comporta somente um juízo rescindente; no segundo, o recurso integra-se no modelo de substituição e contém um juízo rescindente e um juízo rescisório. Estes modelos não são verdadeiramente incompatíveis, porque todo o recurso comporta um juízo rescindente e é, portanto, cassatório. O que pode suceder é que, além do juízo rescindente, o recurso também contenha um juízo rescisório, ou seja, permita que o Tribunal ad quem substitua a decisão revogada: nesta hipótese, o recurso integra-se no modelo de substituição.

O recurso de cassação favorece a harmonização jurisprudencial sobre a interpretação da lei, porque o Tribunal ad quem se limita a controlar o respeito da lei pelas instâncias, mas, ao pressupor uma separação entre a interpretação e a aplicação da lei, é dificilmente coadunável com as modernas tendências da metodologia jurídica. Em contrapartida, o modelo do recurso de substituição favorece a adequação da decisão ao caso concreto, embora dificulte a harmonização jurisprudencial sobre a interpretação da lei. 109. Instância de recurso O recurso é interposto no Tribunal que proferiu a decisão recorrida (art. 687º/1 CPC), pelo que, por analogia com o disposto no art. 267º/1 CPC, ele deve considerar-se interposto logo que seja recebida na secretaria desse Tribunal o respectivo requerimento do recorrente. A esse Tribunal compete controlar a admissibilidade do recurso (art. 687º/3 CPC); se o recurso for considerado admissível, ele sobe posteriormente ao Tribunal ad quem (arts. 699º, 724º/1, 744º/2, 760º e 761º/1 CPC). Portanto, o procedimento do recurso reparte-se entre o Tribunal a quo e o Tribunal ad quem. O dever de litigância de boa fé (art. 266º-A CPC) também vale na instância de recurso. Assim, qualquer das partes pode ser condenada como litigante de má fé por ter actuado quer com má fé substancial (art. 456º/2-a, b, c, CPC), quer com má fé instrumental (art. 456º/2-d CPC). Além disso, em sede de recursos, há que contar com o regime especial que se encontra previsto no art. 720º CPC (aliás aplicável a todos os demais recursos ex vi dos arts. 726º, 749º, 762º/1 CPC). 110. Efeitos de interposição A interposição do recurso realiza efeitos no próprio processo pendente e pode ainda produzi-los fora desse processo: na primeira hipótese, pode falar-se de efeitos intraprocessuais; na segunda, de efeitos extraprocessuais. a) Efeitos intraprocessuais Comportam um efeito suspensivo, efeitos translativos e um efeito suspensivo. O efeito suspensivo, refere-se à circunstância de a decisão recorrida não transitar em julgado e de, por isso, não receber o valor de caso julgado antes da sua confirmação pelo Tribunal de recurso ou de nem sequer vir a obter esse valor se for revogada por esse Tribunal. Os efeitos translativos, respeitam à transferência dos efeitos decorrentes da instância recorrida para a instância de recurso e são consequência da continuação da pendência do processo. A interposição do recurso também produz em efeito devolutivo. Esse efeito caracteriza-se pela atribuição do Tribunal superior do poder de confirmar ou revogar a decisão recorrida, sendo ele que justifica a chamada expedição ou subida do recurso (arts. 699º, 724º/1, 74º0/2, 760º e 761º/1 CPC). b) Efeitos extraprocessuais Traduzem-se segundo as expressões tradicionais, num efeito devolutivo ou suspensivo, mas estes possuem um recorte completamente diferente dos homónimos efeitos intraprocessuais. Existe, além de tudo o mais, uma distinção fundamental entre ambos: o efeito devolutivo e o efeito suspensivo, enquanto efeitos intraprocessuais, são essenciais aos recursos ordinários regulados no direito português e, por isso, coexistem em qualquer recurso; pelo contrário, o efeito devolutivo e o efeito suspensivo, enquanto efeitos

extraprocessuais, são características secundárias desses recursos, que são escolhidas pelo legislador para cada recurso e que são necessariamente alternativas. O efeito (extra-processual) devolutivo significa que a interposição do recurso não obsta à produção de efeitos da decisão recorrida fora do processo em que foi proferida. O efeito (extra-processual) suspensivo impede a produção de efeitos da decisão recorrida fora do processo em que foi proferida e, nomeadamente, a sua exequibilidade, mesmo provisória (art. 47º/1 CPC). A instância de recursos pode suspender-se nas circunstâncias referidas no art. 276º/1 CPC, e interrompe-se quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência de qualquer das partes (art. 285º CPC). Mas se essa parte for o recorrente ou o autor de um incidente suscitado em recurso, verifica-se a deserção do recurso (art. 291º/2, 3 CPC) e a consequente extinção da instância por simples despacho do juiz ou do relator (arts. 287º-c e 291º/4 CPC). ESTUDO ANALÍTICO 111. Fundamentos dos recursos a) Tipologia do erro judiciário A lei processual estabelece, a propósito do recurso de revista, que a violação de lei (substantiva ou processual) pode consistir no erro de interpretação ou de aplicação da norma ou no erro de determinação da norma aplicável (art. 721º/2, 1ª parte CPC). A distinção entre estes erros não é fácil, porque muito frequentemente o erro na determinação da norma aplicável resulta de um erro na sua interpretação. a) Erro na previsão O erro na determinação da norma aplicável consiste num equívoco quanto à norma que deve ser aplicada ao caso concreto. Este erro pode ocorrer em duas modalidades distintas: o erro na qualificação e o erro na subsunção. Aquele erro na qualificação verifica-se quando o Tribunal selecciona mal a norma aplicável ao caso concreto, isto é, quando esse órgão, ao procurar a lei reguladora desse caso, escolhe a norma errada. O erro na subsunção verifica-se quando os factos apurados são subsumidos a uma norma errada, ou seja, quando o Tribunal integra na previsão de uma norma factos ou situações que ela não comporta. b) Erro na estatuição Diferente de qualquer dos erros sobre a previsão é o erro na aplicação da norma, que decorre de um entendimento erróneo das consequências determinadas pela norma aplicada. b) Tipologia da violação da lei A violação da lei que resulta de um erro sobre a previsão ou de um erro sobre a estatuição respeita à própria norma que define o conteúdo da decisão proferida, situação em que o controlo exercido pelo Tribunal ad quem se traduz em aplicar correctamente a norma de decisão adequada. A esta violação da própria norma de decisão pode chamar-se violação primária. Mas também pode suceder que a violação da lei não incida sobre a norma que define, ou devia definir, o conteúdo de decisão, mas sobre uma norma que

tem por objecto a norma de decisão ou o acto jurídico que determina aquele conteúdo. Estas normas sobre normas de decisão ou sobre actos jurídicos que definem o conteúdo da decisão podem designar-se por normas secundárias e à respectiva violação pode chamar-se, por isso, violação secundária. A distinção entre violação primária e secundária da lei traça-se, em suma, do seguinte modo: Há violação primária do critério de decisão se o Tribunal recorrido aplicou um critério distinto daquele que era o adequado ao caso concreto ou errou na aplicação desse critério, ou seja, se o caso foi resolvido por um critério errado ou pela aplicação errada do critério adequado; Há violação secundária, se o recorrente alega, não o erro sobre o critério aplicável ou sobre a aplicação do critério adequado, mas a violação pelo Tribunal recorrido de uma norma secundária sobre o critério decisão, nomeadamente a violação de uma norma que determina a inexistência, a invalidade ou a ineficácia daquele critério.

112. Apelação Cabe apelação da sentença final e do despacho saneador que decidam do mérito da causa (art. 691º/1 CPC). Assim, a apelação é o recurso admissível das decisões sobre o mérito proferidas pela 1ª instância, pelo que são apeláveis todas as decisões que nela absolvam ou condenem o réu no pedido. A decisão que conhece do mérito e que, por isso, é apelável pode não ser uma decisão final do processo (art. 695º/1 CPC). O recurso de apelação delimita-se exclusivamente pelo seu objecto, que é a decisão proferida em 1ª instância sobre o mérito da causa (art. 691º/1 CPC), sendo irrelevante o fundamento invocado pelo apelante. Isso significa que, ainda que o recorrente pretenda alegar um fundamento processual contra a decisão recorrida, o recurso admissível é a apelação. 113. Agravo em 1ª instância O âmbito do agravo em 1ª instância delimita-se negativamente perante o do recurso de apelação: cabe agravo das decisões susceptíveis de recurso de que não possa apelar-se (art. 733º CPC), isto é, das decisões dos Tribunais de 1ª instância que não conhecem do mérito da causa. Dada a delimitação negativa do agravo perante a apelação (art. 73º CPC), pode dizer-se que aquele recurso é aplicável sempre que uma decisão for recorrível, mas dela não couber apelação por não ser uma decisão sobre o mérito. Cabe igualmente agravo, das decisões secundárias sobre as custas da acção (art. 46º/1 CPC; art. 62º CCJ), sobre a condenação em multa e indemnização como consequência da litigância de má fé (art. 456º/1 CPC) e ainda sobre a concessão ou denegação do apoio judiciário (art. 39º/1 DL 387B/87, de 29/12). 114. Revista O campo de aplicação do recurso de revista delimita-se duplamente pelo objecto e pelo fundamento: O objecto da revista é o acórdão da Relação que decide do mérito da causa (art. 721º/1 CPC), isto é, que prenuncia uma condenação ou absolvição do pedido; O fundamento específico do recurso de revista é a violação da lei substantiva (art. 721º/2, 1ª parte CPC), embora, acessoriamente, o recorrente também possa alegar a violação da lei processual (arts. 721º/2 in fine, 722º/1 CPC). Note-se que, como a revista cabe do acórdão da Relação sobre o mérito da causa (art. 721º/1 CPC), ela é igualmente admissível da decisão que conhece desse mérito no agravo em 1ª instância (art. 753º/1 CPC) e que é impugnada com fundamento na violação da lei substantiva (art. 721º/2 CPC). A revista é o recurso ordinário pelo qual se impugna uma decisão de mérito da 2ª instância com fundamento na violação de lei substantiva. A revista deve ser admissível, por isso, sempre que um Tribunal de 2ª instância se pronuncie sobre o mérito da causa e a decisão seja recorrível. Como, em certos casos, essa decisão da Relação se pode verificar depois do julgamento de um outro recurso pelo Supremo, existem algumas situações de revista diferida e outras de segunda revista.

Encontram-se também situações em que é admissível a interposição de uma segunda revista. Tal sucede nos casos em que, como resultado da procedência de uma revista pendente, o supremo manda baixar o processo à Relação e esta profere uma decisão sobre o mérito da causa: desta última decisão pode interpor-se uma nova revista. 115. Agravo em 2ª instância O agravo em 2ª instância possui um âmbito de aplicação residual perante os recursos de revista e de apelação (art. 754º/1 CPC). Dado que a revista cabe do acórdão da Relação que conheça do mérito da causa (art. 721º/1 CPC) e do qual seja interposto recurso com fundamento na violação da lei substantiva (art. 721º/2 CPC), o recurso de agravo em 2ª instância é admissível nas seguintes situações: Quando o acórdão da Relação não aprecie o mérito da causa (ex. art. 493º/2 CPC); Quando o acórdão da Relação conheça do mérito da causa, mas o recorrente pretenda impugnar dessa decisão exclusivamente com um fundamento processual (ex. arts. 493º/2, 494º-a CPC). Em certos casos, a Relação funciona como Tribunal de 1ª instância: no âmbito civil, tal sucede quanto às acções de indemnização propostas contra juízes de direito, procuradores da República e delegados do Procurador da República e baseadas em actos praticados durante o desempenho das suas funções (art. 41º/1-b LOTJ; art. 1083º/1 CPC). Do acórdão da Relação que conheça do objecto dessas acções cabe recurso de apelação para o Supremo (art. 1090º/1 CPC), pelo que, dada a delimitação negativa do agravo em 2ª instância perante a apelação (art. 754º/1 CPC), aquele agravo cabe apenas das decisões que, naquelas acções, não se pronunciem sobre o mérito da causa. Como o agravo em 2ª instância incide sobre decisões que não conhecem do mérito (art. 754º/1 CPC), nem sempre é exigível assegura-lhes um controlo pelo Supremo: é essa a justificação para a exclusão, imposta pelo art. 754º/2, 1ª parte e 3º CPC, da admissibilidade de recurso para o Supremo do acórdão da Relação que confirme, ainda que por diverso fundamento mas sem voto de vencido, a decisão interlocutória proferida na 1ª instância. O regime não vale, contudo, quando, nos termos do art. 678º/2/3 CPC, o recurso seja admissível independentemente dos valores da causa e da sucumbência da parte.

OBJECTO DOS RECURSOS ORDINÁRIOS 116. Constituição O objecto do recurso é constituído por um pedido e um fundamento. O pedido consiste na solicitação de revogação da decisão impugnada e o fundamento na invocação de um vício no procedimento (error in procedendo) ou no julgamento (error in iudicando). O pedido de revogação fundamenta-se num error in procedendo ou in iudicando, mas importa salientar um aspecto especialmente importante. Para que o recurso seja procedente não basta que o Tribunal ad quem verifique qualquer desses erros; é ainda indispensável que a decisão impugnada, apesar de padecer do vício invocado pelo recorrente, não possa ser confirmada por um fundamento diferente do utilizado pelo Tribunal recorrido. O pedido do recorrente deve ser formulado no requerimento de interposição do recurso, no qual, em certos casos, também devem ser apresentados os respectivos fundamentos (art. 687º/1 CPC). Esse pedido pode ser restringido nas conclusões das alegações do recurso (art. 684º/3 CPC) através, por exemplo, da exclusão de um dos recorridos ou da aceitação da decisão quanto a um dos pedidos cumulados, mas não pode ser ampliado em relação àquele que consta do requerimento de interposição, porque qualquer restrição realizada neste último vale como aceitação da decisão não impugnada e, portanto, como renúncia ao recurso (art. 681º/2 e 3 CPC). 117. Âmbito O âmbito do recurso é triplamente delimitado. Antes do mais, esse âmbito é determinado pelo objecto da acção e pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida. Dado que o direito português consagra o modelo do recurso de reponderação, o âmbito do recurso encontra-se objectivamente limitado pelas questões colocadas ao Tribunal recorrido, pelo que, em regra, não é possível solicitar ao Tribunal ad quem que se pronuncie sobre uma questão que não se integra no objecto da causa tal como for apresentada na 1ª instância. Dentro do objecto do processo e com observância dos casos julgados formados na acção, o âmbito do recurso delimita-se objectivamente pela parte dispositiva da sentença que for desfavorável ao recorrente (art. 684º/2, 2ª parte CPC) ou pelo fundamento ou facto em que a parte vencedora decaiu (art. 684ºA/1 e 2 CPC). Quer dizer: o objecto do recurso não é sequer a totalidade da decisão, mas apenas o que nela for desfavorável ao recorrente ou recorrido, o que, aliás, implica que o Tribunal de recurso não pode apreciar a parte da decisão que não foi impugnada. Finalmente, o âmbito do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Sempre que a parte dispositiva da sentença contenha decisões distintas sobre vários objectos, o recorrente pode distinguir o recurso a qualquer delas (art. 684º/2, 1ª parte CPC). 118. Limites A função do recurso ordinário é a reapreciação da decisão recorrida e não um novo julgamento da causa. Dessa circunstância decorre a proibição da

reformatio in melius e in peius. A proibição da reformatio in melius tem o seguinte enunciado: como o objecto do recurso é delimitado pela impugnação do recorrente, esta parte não pode alcançar através do recurso mais do que a revogação e eventual substituição da decisão recorrida. A proibição da reformatio in peius (que se encontra consagrada no art. 684º/4 CPC) traduz-se no seguinte: a decisão do Tribunal de recurso não pode ser mais desfavorável ao recorrente que a decisão impugnada. A violação das proibições da reformatio in melius e in peius pressupõe que o Tribunal de recurso conhece de matéria que não podia apreciar, porque excede o âmbito da sua competência decisória. Assim, é nulo, por excesso de pronúncia, o acórdão do Tribunal de recurso que não observa aquelas proibições (arts. 668º/1-d, 2ª parte CPC, 716º/1, 732º, 752º/3, 762º/1 CPC). A proibição da reformatio in melius é uma consequência da vinculação do Tribunal superior à impugnação do recorrente: por isso, esse Tribunal não pode conceder a essa parte mais do que ela pede no recurso interposto. Esta proibição da reformatio in melius mantém-se mesmo quando o Tribunal de recurso tem de apreciar matéria de conhecimento oficioso. Não viola a proibição da reformatio in melius a circunstância de o Tribunal de recurso confirmar a procedência da acção no quantitativo total do pedido do autor, ainda que com diferentes montantes de cada uma das parcelas. A decisão do Tribunal de recurso não pode ser mais desfavorável ao recorrente do que a decisão recorrida: é nisto que consiste a proibição da reformatio in peius (art. 684º/4 CPC). A possibilidade de o Tribunal de recurso conhecer oficiosamente de certa matéria não o isenta da sujeição à proibição da reformatio in peius. 119. Decisão O âmbito da competência decisória do Tribunal depende do tipo de recurso. Se esse recurso pertence ao modelo de cassação, o Tribunal ad quem só pode revogar a decisão impugnada; se o recurso se integra no modelo de substituição, o Tribunal ad quem pode não só revogar a decisão impugnada, mas também substitui-la por outra. Esta substituição nem sempre é limitada pelo objecto do recurso: se a Relação considera procedente o agravo interposto, esse Tribunal pode substituir a decisão de forma impugnada por uma decisão sobre o mérito (art. 753º/1 CPC). Se o Tribunal superior, só podendo julgar segundo o modelo de cassação e, portanto, podendo apenas revogar a decisão recorrida, substitui essa decisão por uma outra, verifica-se um excesso de pronúncia, porque esse Tribunal conhece de uma matéria que não pode apreciar. Tal excesso determina a nulidade da sua decisão (arts. 668º/1-d, 2ª parte, 716º/1, 732º, 752º/3, 762º/1 CPC). A improcedência do recurso e a consequente confirmação da decisão recorrida podem resultar da modificação pelo Tribunal ad quem do fundamento dessa mesma decisão. Isto é, o Tribunal superior pode aceitar a procedência do recurso, mas encontrar um outro fundamento, distinto daquele que foi utilizado pelo Tribunal recorrido, para confirmar a decisão recorrida. Tal hipótese sempre que a decisão possa comportar vários fundamentos. Esta pluralidade pode resultar, quanto a uma decisão de mérito, de um concurso de pretensões ou de excepções peremptórias e, quanto a uma

decisão de forma, de um concurso de excepções dilatórias. No entanto, esta possibilidade depende de duas condições: Uma delas é que o Tribunal de recurso possa conhecer do fundamento que justifica a confirmação da decisão recorrida; Uma outra é que a procedência do recurso não impeça a confirmação da decisão com base noutro fundamento.

PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS 120. Enunciado Na instância de recurso relevam três tipos de pressupostos processuais: os gerais, os especiais e os específicos. Os pressupostos gerais são comuns à acção no seu todo: é o caso, por exemplo, da competência do Tribunal a quo e da legitimidade das partes; os pressupostos especiais são adaptações à instância de recurso dos pressupostos gerais: são eles a competência do Tribunal ad quem e o patrocínio judiciário obrigatório do recorrente; finalmente, os pressupostos específicos são restritos à instância de recurso: esses pressupostos são a recorribilidade da decisão e a legitimidade para recorrer. 121. Apreciação Os pressupostos processuais específicos condicionam a admissibilidade do conhecimento do objecto do recurso, o que significa que, se eles não se encontrarem preenchidos, o Tribunal ad quem não se pronuncia sobre a procedência ou improcedência do recurso. Os pressupostos específicos podem tornar-se, eles próprios, objecto de um recurso. Esta solução é ditada pelo princípio da auto-suficiência do processo, segundo o qual a aparência vale como realidade até se averiguar se efectivamente ela corresponde a qualquer realidade. Os pressupostos específicos da instância de recurso beneficiam, embora não exclusivamente, a parte recorrida, dado que definem as condições em que o recurso é admissível e em que pode ser impugnada uma decisão favorável a essa parte. Isso significa que lhes é aplicável a dispensa, estabelecida no art. 288º/3, 2ª parte CPC, da necessidade da sua apreciação prévia relativamente ao conhecimento do mérito do recurso. Os pressupostos específicos devem ser controlados oficiosamente pelo próprio Tribunal a quo (art. 687º/3, 1ª parte CPC). Mas a decisão desse Tribunal não vincula o Tribunal ad quem (art. 687º/4 CPC), pois que lhe incumbe controlar aqueles pressupostos (arts. 701º/1, 704º/1 CPC, aplicáveis à revista – art. 726º CPC – e aos agravos – arts. 749 e 762º/1 CPC). Esta duplicidade de momentos de apreciação dos pressupostos específicos implica que há que considerar eventuais alterações entre o momento da apreciação no Tribunal a quo e o julgamento no Tribunal ad quem. Além dos pressupostos processuais específicos, na instância de recuso também devem estar preenchidos os pressupostos gerais. Quanto ao seu controlo pelo Tribunal de recurso, há que considerar duas situações. Esses pressupostos podem constituir o próprio objecto do recurso, isto é, a impugnação pode incidir sobre uma decisão relativa a esses pressupostos. Mas, ainda que esses pressupostos não constituam o objecto de recurso, o Tribunal ad quem pode sempre apreciar aqueles que forem de conhecimento oficioso (art. 495º CPC) e absolver o réu da instância com base na falta de qualquer deles (art. 493º/2 CPC). Pode assim dizer-se que os pressupostos de conhecimento oficioso constituem um objecto implícito do recurso, porque o Tribunal ad quem pode apreciá-los em qualquer recurso. Em qualquer destes casos, ou seja, tanto na hipótese em que o objecto do recurso é um pressuposto processual geral, como na eventualidade em que o

Tribunal superior pode controlar um pressuposto de conhecimento oficioso, este Tribunal não deve ocupar-se desse pressuposto se a decisão sobre o mérito puder ser favorável à parte que beneficiaria com o seu preenchimento: é a solução imposta pelo art. 288º/3, 2ª parte CPC. É por isso que, se estiverem simultaneamente pendentes uma apelação relativa à decisão de mérito desfavorável ao autor e um agravo relativo à decisão sobre os pressupostos processuais interposto pelo réu, o art. 710º/1 CPC (aplicável à revista ex vi do art. 726º CPC), determina que este agravo só deva ser apreciado se a decisão sobre o mérito não for confirmada. Os pressupostos especiais dos recursos são a competência do Tribunal ad quem (arts. 71º e 72º CPC; arts. 27º-a, 28º/1-a, 41º/1-a LOTJ) e o patrocínio judiciário obrigatório do recorrente (art. 32º/1-c CPC). Quanto à possibilidade de o Tribunal superior conhecer do mérito do recurso numa situação em que esses pressupostos não se encontram preenchidos, há que verificar, segundo o critério subjacente à desnecessidade da apreciação prévia dos pressupostos processuais estabelecida o art. 288º/3, 2ª parte CPC, se aqueles pressupostos são disponíveis e, em caso afirmativo, se a sua falta não prejudica a parte que seria beneficiada com a sua verificação. 122. Recorribilidade da decisão A recorribilidade da decisão pressupõe o esgotamento de outras eventuais formas de impugnação, como é o caso da reclamação (arts. 123º/2, 511º/2, 650º/5, 653º/4, 668º/3, 700º/3, 725º/5 CPC). É nisto que consiste a subsidiariedade do recurso perante a reclamação (art. 700º/3 e 5 CPC). Se a parte recorrer em vez de reclamar, há falta de interesse processual, porque a parte não utilizou o meio mais célere e menos dispendioso para a impugnação da decisão. Mas o art. 688º/5 CPC, permite a conversão do recuso indevidamente interposto na reclamação dirigida ao presidente do Tribunal superior e, mediante aplicação analógica do disposto no art. 687º/3, 2ª parte CPC, quanto ao erro na espécie de recurso, pode entender-se que o Tribunal perante o qual foi interposto o recurso indevido deve mandar seguir os termos da reclamação apropriada: obtém-se desta forma a sanação dessa falta de interesse processual. A decisão recorrida pode ser tanto uma decisão final, como uma decisão interlocutória. A recorribilidade das decisões interlocutórias apresenta vantagens e inconvenientes: ela revela-se útil, se o Tribunal de recurso vier a revogar a decisão recorrida, porque, nesse caso, a impugnação permite evitar as repercussões da decisão impugnada na acção pendente; mas se o Tribunal de recurso confirmar a decisão recorrida, o recurso pode contribuir para atrasar o andamento e decisão do processo. 123. Legitimidade para recorrer A legitimidade para recorrer pode ser aferida segundo um critério formal ou material. Segundo o critério formal, tem legitimidade para recorrer a parte que não obteve o que pediu ou requereu; portanto, não pode recorrer a parte que consegui na acção aquilo que solicitou ou que está de acordo com a sua conduta na acção. Diferentemente, segundo o critério material, tem legitimidade para recorrer a parte para a qual a decisão for desfavorável, qualquer que tenha sido o seu comportamento na instância recorrida e independentemente dos pedidos por ela formulados no Tribunal a quo.

A legitimidade ad recursum é, apesar da sua designação, uma modalidade do interesse processual e não uma concretização, no âmbito dos recursos, da legitimidade processual. Também na legitimidade para recorrer se observa a correlatividade que caracteriza o interesse processual. Se a uma das partes for reconhecido um interesse a recorrer, isto é, um interesse em obter a tutela decorrente da procedência do recurso, à contraparte é automaticamente atribuído um interesse em contradizer, ou seja, um interesse em evitar o prejuízo relevante daquela procedência. O art. 68º/3 CPC (aplicável às decisões proferidas na 2ª instância ex vi dos arts. 716º/1, 752º/3 CPC) estabelece que, quando for admissível interpor recurso ordinário da decisão, a nulidade desta pode constituir um dos fundamentos desse recurso; o recurso interposto pode mesmo ter como único fundamento aquela nulidade (arts. 722º/3, 1ª parte, 755º/1-a CPC).

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