2ª Edição Eletrônica BENEDITA SILVA DE AZEVEDO Autora
Edição Eletrônica: L P Baçan Novembro de 2009 Direitos exclusivos para língua portuguesa: Copyright © 2009 da Autora Distribuição exclusiva através de BIBLIOTECA VIRTUAL DA AVLLB e PDFCOKE Autorizadas a reprodução e distribuição gratuita desde que sejam preservadas as características originais da obra. http://www.avllb.org
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SUMÁRIO
A AUTORA DEDICATÓRIA APRESENTAÇÃO – L P Baçan NOVO DESAFIO
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BENEDITA SILVA DE AZEVEDO
Benedita Silva de Azevedo – Nasceu em Itapecuru-Mirim -Maranhão. Morou na cidade de São Luís – MA, São Paulo – Capital, em Blumenau e Itajaí – SC, na cidade do Rio de Janeiro e há 16 mora na Praia do Anil – Guia de Pacobaíba – Magé-RJ. Recebeu o título de cidadã mageense, em 09 de junho de 2003. Busca concretizar a instalação de um Centro Cultural em Mauá, onde possa ministrar cursos profissionalizantes e culturais, bem como, colocar a sua biblioteca particular, com 3.000 títulos, à disposição da população, principalmente, das crianças e adolescentes. Licenciada em Letras, com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura. Especializada em Educação e Pós-graduada em lingüística. Possui um vasto currículo de Cursos de Atualização, Seminários e Palestras, assistidos e ministrados, nos três Estados onde residiu e trabalhou ao longo de 30 anos no magistério. Professora e escritora. Pertence à Academia Mageense de Letras, cadeira 38, Patrono: Aluísio Tancredo de Azevedo. www.acadmageenseletras.hpg.com.br. Ao Grêmio de Haicai Ipê/SP, à Academia Virtual de Letras Luso-Brasileira (AVLLB), Acadêmico fundador, cadeira 63, Patrono: Viriato Correia. www.avllb.org e ao Portal CEN " Cá Estamos nós". Livros publicados: Marista, 60 anos a serviço da comunidade maranhense (1985); Voltando a viver, no Rio (2000); Trajetória (2001); Participação em "Outonos" Antologia (2001); Shena e Hércules (infantil – 2002); Coordenadora do Projeto: Escritores do C.E. Mauá, com publicação dos livros I e II (2002 e 2003); Organizadora da Antologia em Prosa e Verso I, II e III (2003, 2004 e 2005) da Academia Mageense de Letras; O dia-a-dia de uma professora (2004) e Nas Trilhas do Haicai – poesia (2004) Livros eletrônicos: Fatalidades da Vida (2005) Participação nas Antologias: A Gosto e Receitas de Família E-mail:
[email protected] 4
DEDICATÓRIA
Ao meu marido, filhos e netos pela atenção, carinho e cuidados a mim dispensados. Aos amigos do magistério, pelas experiências vividas no tempo em trabalhamos juntos. Á minha amiga Aparecida Pelas experiências vividas E à confiança em mim depositada
"O problema não é inventar. É ser inventado, hora após hora e nunca ficar pronta a nossa edição final" (Carlos Drumonnd de Andrade) Forjarei a minha essência até a morte. (Benedita Azevedo)
Rio de Janeiro, Novembro / 2009
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APRESENTAÇÃO
Há, nas narrativas de Benedita, não apenas a intenção de contar uma história, mas a de expor um drama, ou dramas, da atualidade. Só que ela o faz de uma forma natural, verossímil e abrangente, sem exagerar nas pinceladas, sem desconectar suas personagens do mundo real. Aliás, a grande personagem de Benedita é o mundo real, de onde pinça situações aparentemente corriqueiras, mas altamente significativas. Em "Novo Desafio", aborda o problema da mulher que se divide entre o trabalho e a casa, mostrando a tremenda carga emocional a que é submetida, as decisões e opções que tem que tomar e a forma como a atividade profissional acaba envolvendo-a. O que deveria ser prazeroso acaba se tornando um pesado fardo, forçando-a a anularse como mulher e esposa, provocando sofrimentos. Só isso justificaria a narrativa, mas Benedita não perde contato com o mundo real e expõe as mazelas de nosso sistema educacional, os problemas da saúde pública, a ingerência política nas instituições e, de forma sutil, o que há de melhor e pior na natureza humana. Tudo sem deixar de ser didática e mostrar que "benvindo" é tão correto quanto bendito e benfazejo. É ler para descobrir.
L P Baçan Escritor, webeditor e webmaster
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NOVO DESAFIO
Sim...sim...sim...sim....não...sim...sim... Aquele monótono repetir de apuração de eleição com chapa única fez Lucília refletir no que seria daquela escola após as eleições. Observou a Diretora que estava na função há cinco anos. No semblante denunciava o descontentamento por ter de deixar o cargo. Sabia que ela não se candidatara por não querer se indispor com sua adjunta que a abandonara, praticamente sozinha, para resolver todos os problemas administrativos e pedagógicos. Para candidatar-se precisaria arranjar outra pessoa para compor sua chapa. Preferiu abrir mão da candidatura a romper com sua companheira de função. Sim...sim...sim...sim...sim...sim....não...Sim. A monotonia continuaria ainda por algum tempo. Lucília observava a colega de trabalho e pensou: "Como ficará a situação de Patrícia? Deve ser bastante desagradável voltar para a sala de aula após tantos anos na direção e com mais de sessenta anos. Os nossos alunos às vezes perdem os limites. Alguns precisariam ter aulas de Ética e Moral. Fazem falta as aulas de Moral e Civismo. Eles às vezes não sabem discernir o comportamento de estar em uma sala de aulas e de estar num ambiente informal, onde podem falar à vontade o que lhes vem à cabeça. Sem respeitar ninguém. Seria bom que ela tirasse umas férias. Ela me falou que tem direito a uma licença de seis meses. Acho que é hora de aproveitá-la." E a apuração continuava. O Colégio possuía mais de mil alunos, pais, professores e funcionários. Nem todos foram votar, mesmo assim ainda teriam muitos votos para apurar. Do outro lado do salão estava Patrícia. Percebia também o olhar perdido de Lucília em suas divagações: "Lucília precisa de alguns tempos para trabalhar no Projeto Pedagógico. Ela gosta de fazer atividades culturais com os alunos, com vinte e quatro tempos de aulas, em nove turmas, ficava difícil trabalhar as atividades extra classe. Bem que poderia ficar na coordenação, agora que a coordenadora vai para a direção com o Professor de Matemática." Lucília confabulou com a Professora que estava à sua frente: – Estou achando Patrícia triste. Será que se arrependeu de não se ter candidatado?
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– Acho que não, ela tem uma neta que está com problemas de saúde. Soube do resultado dos exames hoje e parece que não foi muito animador. – Mesmo assim, acho que também está preocupada com a possibilidade de voltar para a sala de aula. – Pode até ser, mas por que ela não se candidatou? Acho que a direção cansa mais que as aulas. E depois, mesmo nas férias, elas têm que vir à escola. Sim...sim...sim...sim...sim...sim...sim...sim.. a professora que lia os votos já estava cansada. Anunciou que faltavam poucos. O marido de Patrícia chegou com a filha e as netas. Lucília sondou: – Qual das duas está com problemas? – É a mais magra, aquela que está atrás. – Ela me parece triste. Você sabe qual é o problema? – Ela falou qualquer coisa, mas eu não entendi direito. Depois você fala com ela. Terminou! Ganhou quase por unanimidade. Só dois votos contra.
* Todos cumprimentaram os eleitos. Patrícia falou que a escola ficaria em boas mãos, pois conhecia o novo diretor desde pequeno e era uma boa pessoa. Falou também da nova diretora adjunta, disse que em sua última gestão fora "o anjinho que caíra do céu" para ajudá-la na coordenação pedagógica. O novo diretor agradeceu a confiança que todos depositaram nele e pediu a colaboração de Adriano, marido de Patrícia, para lhe dar uma força quanto à manutenção elétrica e hidráulica que eram um pouco complicadas. Principalmente a hidráulica, que trazia água de um poço artesiano a 600 metros de distância. Os aplausos estouraram, foram unânimes. Mais uma vez, abraços e beijos. Lucília encontrou-se com Patrícia e inquiriu: – Você me parece preocupada, não era bem isso que queria, não é verdade? – Você, como sempre, é muito observadora. Depois conversaremos. Mas eu a estava observando e percebi que estava longe, preocupada. Está acontecendo alguma coisa? – Estava pensando em você. De como poderá sentir falta da direção quando voltar para a sala de aula. – Estou pensando em me aposentar por idade. A turma lá de casa está precisando muito de mim. Adriano pediu-me para ficar pelo menos durante
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seis meses. Tenho férias vencidas. Nos cinco anos que trabalhei na direção nunca as tirei. – Mas, o que está acontecendo com a sua neta? Soube que não está bem. – Esse é outro ponto que me leva a querer permanecer em casa por algum tempo. Soubemos hoje o resultado dos exames. Ela está com um tumor na cabeça. O médico falou que a cirurgia custa R$ 15.000,00 (quinze mil reais). – Patrícia, a Santa Casa é um hospital muito bem aparelhado. Se você quiser, falo com minha filha. Ela tem muitos amigos médicos. Alguns trabalham lá. – Quero sim, vou falar com meu filho. Vá lá em casa amanhã e converse com ele. Pode ser que assim se anime um pouco. Ele e a mulher andam arrasados. – Vou sim, pedirei à minha filha que fale com sua amiga neurologista para saber se há possibilidades de marcar uma consulta. – Ficaremos muito agradecidos se isso for possível.
* Lucília foi para casa e pediu para que a filha se informasse com uma das amigas médicas, se haveria possibilidades de marcar uma consulta. Ela ofereceu ajuda e quis saber se a pessoa era carente. Ela disse que não, mas que tinha dificuldades para desembolsar uma quantia tão alta, assim como nós. Lucília telefonou para Patrícia e comentou o resultado da conversa que a filha teve com a amiga. – Patrícia, minha filha acabou de conversar com uma amiga que se colocou à disposição, se precisar de uma tomografia. – Ela já fez a tomografia. Ele solicitou uma ressonância magnética para continuar a pesquisa. – A ressonância é mais difícil. – Ela já fez a ressonância, ele disse que ela está com um tumor na cabeça. – Nesse caso, marque uma consulta com a neurologista, para que ela avalie os exames e dê um parecer. – Você poderá fazer isso pela gente? Lá em casa anda todo mundo de cabeça quente. – Pedirei para que Joseane fale com as amigas.
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No outro dia, tentaram falar, pelo telefone, com a neurologista, mas não conseguiram. Joseane foi até à clínica onde trabalhavam e expôs os fatos para a amiga. Ela marcou uma consulta para avaliar o caso. Pediu que levassem todos os exames feitos. Tentaria reunir a equipe de neurocirurgiões para avaliar os exames e dar uma opinião.
* Lucília tentou entrar em contato com Patrícia, pelo telefone, para lhe falar sobre a consulta. Ligou várias vezes, mas não conseguiu. Ao chegar do Colégio soube que ela ligara várias vezes. Pensou que tinha acontecido alguma coisa com a neta e estava tentando telefonar quando a campainha tocou. Joseane atendeu e gritou lá de baixo: – Mamãe, é a dona Patrícia e o marido. Posso mandar subir? – Pode! – respondeu, preocupada com o que poderia estar acontecendo. Teria acontecido alguma coisa com a neta? Lucília deslocou-se até o topo da escada para receber a amiga. Ao vê-la adiantou-se preocupada. – Como está a sua neta? – Está bem! Não tem sentido as dores de cabeça após tomar os remédios. Mas, estou aqui para fazer um convite a você. Fui convidada para trabalhar na Coordenadoria e indiquei o seu nome para a Gerência de Ensino. Estou tentando ligar a um bom tempo, mas não consegui. Então resolvi vir pessoalmente. – Para quando será isso? – Solange vai ligar daqui a pouco para conversar com você. Mas parece que é para começar logo. – Logo agora, que deixei a GLP para ficar pelo menos mais dois dias em casa! O telefone tocou. Era Solange. Falou que estava formando sua equipe de trabalho e gostaria de que ela fizesse parte dela. – Você pode me dar um tempo para pensar? – Não, gostaria de que você estivesse amanhã às dez horas para assumirmos todas juntas. – Há algum curso preparatório, para se tomar conhecimento do trabalho que se vai fazer? – Não, vamos pegar no tranco. – Quantas horas de trabalho por dia? – Oito. Você pode escolher das oito às dezessete horas ou das nove às dezoito. 10
– Além do dinheiro das aulas, há algum adicional? conversar com você. Mas parece que é para começar logo. – Logo agora, que deixei a GLP para ficar pelo menos mais dois dias em casa! O telefone tocou. Era Solange. Falou que estava formando sua equipe de trabalho e gostaria de que ela fizesse parte dela. – Você pode me dar um tempo para pensar? – Não, gostaria de que você estivesse amanhã às dez horas para assumirmos todas juntas. – Há algum curso preparatório, para se tomar conhecimento do trabalho que se vai fazer? – Não, vamos pegar no tranco. – Quantas horas de trabalho por dia? – Oito. Você pode escolher das oito às dezessete horas ou das nove às dezoito. – Além do dinheiro das aulas, há algum adicional? – Há, tenho certeza de que você vai gostar. Posso contar com você? – Pode. Amanhã estarei aí às dez horas. Lucília desligou o telefone e Patrícia festejou: – Esta nortista é arretada! Podemos ir juntas. Você pode me apanhar as oito e meia? Poderemos dividir a gasolina, o que você acha? – Acho ótimo irmos juntas. Se tiver de gastar dez reais de gasolina por dia, não valerá a pena. O salário vai todo.
* No outro dia foram para Magé. Chegando lá os outros elementos da equipe já estavam reunidos na sala de Solange, com o subsecretário de Estado que fora dar apoio na troca de pessoal. A antiga equipe deixava a Coordenadoria e a nova assumia. Lucília sentiu-se constrangida ao ser apresentada para a Gerente de ensino que saía. – Esta é Lucília, será a nova Gerente de Ensino. Se você puder, passe o serviço para ela. A Gerente mostrou os armários e disse que ali ela encontraria tudo de que precisava para trabalhar e saiu. Lucília ficou meio perdida, sem saber o que fazer.
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Na sala, ao lado, a assessora da Gerência de Administração, também acabara de assumir. Fez o seguinte comentário: – Não sei o que vou fazer. – Eu também não. Acho que vou vasculhar os armários e ver o que há neles – comentou Lucília e começou a ação. Na equipe da gerência permaneceu somente a tia de Solange. Foi a salvação de Lucília. Ela conhecia alguns aspectos do trabalho e muito bem tudo a respeito de matrículas, sua área de atuação.
* Os trabalhos estavam todos atrasados e Lucília começou atendendo às cobranças da SEE. Foi um desafio tentar cumprir tudo que era cobrado pela manhã para estar pronto à tarde. Ela chegava às sete e meia e começava despachando o que ficara do dia anterior. O telefone e o fax entravam em ação e as cobranças se multiplicavam. Ela e sua assistente trabalhavam sem parar e quando percebiam já passava das catorze horas. Elas saíam para o almoço, as quatro juntas: Solange, Patrícia, sua assessora, Lucília e sua assistente. Comiam no Semi-Deus, um restaurante que servia comida a quilo; e tomavam sorvete de passas ao rum, na praça em frente, depois voltavam para trabalhar até às dezoito horas e algumas vezes até às dezenove.
* A folga a que todos tinham direito uma vez por semana ninguém conseguia usufruir, pois o trabalho acumulado não permitia. Ao final do primeiro mês Lucília pretendeu folgar, pois tinha alguns compromissos particulares inadiáveis para resolver. Ao meio dia, na hora do almoço, o telefone tocou, era Patrícia pedindo que ela passasse mais tarde para resolver uma pendência. Ela desligou e voltou à mesa. Cinco minutos depois, novo telefonema, ela deveria ir imediatamente. – Por favor, me deixa terminar de almoçar que vou logo – respondeu Lucília – já um pouco aborrecida. Pois tinha dois compromissos marcados naquela tarde: um com o pedreiro que já aguardava alguns dias para continuar as obras da casa da Rua Antônio Pinheiro e outro com um senhor para contratar a abertura de um poço artesiano, pois o de manilhas estava quase seco.
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Quando levantou da mesa, novo telefonema de Patrícia apressando-a. Ela apressou a neta de seis anos que estudava naquele horário, pois às sextas a filha trabalhava o dia todo e ela ficava encarregada de cuidar dos deveres dos netos e levá-los à escola. A criança menor começou a chorar dizendo que era muito cedo e que não teria ninguém para ficar com ela, na escola. Ela se acalmou e achou que a criança estava com a razão. As aulas começavam às treze horas e naquela hora as portas ainda estavam fechadas.
* Ela deixou a criança na escola e foi para Magé. Chegando lá as duas estavam na sala de Solange. Lucília perguntou o que havia para ser resolvido com tanta urgência. – Eu estava conversando com Dona Patrícia e cheguei a algumas conclusões e precisava conversar com você, pois estão diretamente ligadas à Gerência de Ensino. – Alguma coisa para ser aplicada ainda hoje? – perguntou incrédula. – Não, mas eu precisava falar logo com a equipe, para que na segundafeira, cedo, coloquemos tudo em prática. – Agora eu tenho de ir. Dona Patrícia, a senhora pode passar as idéias para Lucília. – Eu não acredito que vocês me tiraram da mesa e de dois compromissos marcados, com muita antecedência, para me falarem de algo que, afinal, não tinha tanta urgência assim. – Desculpe Lucília, eu achei melhor lhe chamar porque Solange estava um pouco ansiosa. – Mas se não era assim tão urgente, e se era você Quem ia me passar o assunto, porque não me falou por telefone ou me pediu para passar em sua casa mais tarde?! Assim eu não teria de adiar meus compromissos, para domingo, e atrapalhar o final de semana que eu ia sair com meu marido, para Miguel Pereira, onde íamos visitar a minha cunhada que não anda bem de saúde. – E o teu marido não pode resolver essas questões do pedreiro e do homem do poço? Lá em casa quem cuida desses assuntos é o meu marido. – Pois na minha, se eu não estiver por perto, ele acaba pagando uma obra com o dinheiro que eu pago as duas. Ele não sabe fazer negócios. – Eu não acredito. – Isso não vem ao caso. Os problemas são meus e só eu posso resolvêlos. Não gosto de misturar assuntos particulares com trabalho.
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* Lucília só voltou para casa às dezoito horas. Essa foi a única vez que tentou folgar. Diante do acontecido achou melhor não criar perspectivas em casa e disse que a partir daquele dia não teria mais nenhuma folga durante a semana. A família não gostou da idéia, pois ela saía de casa, diariamente, às seis e meia e chegava depois das dezenove horas, muito cansada, e na maioria das vezes, sentava-se em frente à televisão tentando ouvir o noticiário e dormia sem banho e sem jantar. Os trabalhos prosseguiam. Semanalmente a Gerência de Ensino tinha reunião na SEE e Lucília, às vezes, ia ao Rio três vezes por semana, numa viagem de setenta quilômetros de distância. Certa vez, ela e Solange passaram o dia inteiro no prédio da Rua da Ajuda nº 5, indo de setor em setor, tentando descobrir os projetos em andamento. Alguns já estavam sendo tocados de acordo com as cobranças. Outros estavam com datas vencidas e não poderiam mais ser desenvolvidos. Outros, ainda, estavam com datas vencidas, mas poderiam ser retomados. A pressão aumentou. Havia necessidade de se compor a equipe do Ensino. Vários professores foram convidados. Alguns não aceitavam porque tinham GLP (dobra de aulas com um salário adicional), outros porque o horário era incompatível com a disponibilidade que tinham, outros ainda, por não quererem deixar suas salas de aula e perderem a docência e precisarem trabalhar 30 anos ao invés de 25. Só então Lucília soube que perderia a docência nas duas matrículas. Ficou muito preocupada e procurou Solange para esclarecer o assunto. Ela sugeriu que desse 8 aulas naquela que faltasse menos tempo para se aposentar e continuasse com 24 tempos na Coordenadoria. A princípio, levou um memorando ao CIEP 128, para assumir duas turmas. Não conseguiu compatibilizar o horário. Ofereceram 4 tempos no CIEP 444. Ela não aceitou, pois ficava longe. Para ir de Mauá até lá eram 25 quilômetros. Gastaria o dinheiro da matrícula com gasolina. Acabou aceitando quatro tempos de aulas e quatro no (Projeto Pedagógico), na Oswaldo Cruz, em Mauá, a oito quilômetros de sua casa.
* Depois de muitas tentativas formaram a equipe do Ensino. Alguns se adaptaram outros foram trocados e outra começou uma corrida para conquistar espaço. Numa das saídas da gerente para a SEE, para um Seminário do
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"Projeto Nova Escola", onde foram discutidas as grades curriculares do Ensino Fundamental e Médio, num trabalho cansativo e desgastante, ao voltar ela percebeu um ambiente estranho. A assistente da gerência chamou-a na sala de reuniões e lhe expôs os fatos: A professora da equipe da gerência, encarregada do trabalho com os professores do Ensino Fundamental, teria procurado a Coordenação para reclamar de que gostaria de ter mais liberdade para trabalhar, pois a gerente pedira para ver os ofícios que saíam da gerência e que eram assinados pela coordenadora. Ela fez uma reunião com a equipe e esclareceu que o fato de pedir para ver os ofícios, fazia parte do gerenciamento do setor. Que se tudo estivesse certo a equipe teria acertado, porém, se desse errado, a responsabilidade seria da gerente. Para isso existia o cargo, do contrário cada um receberia suas funções e levaria diretamente à Coordenação. Tudo se esclareceu e os trabalhos seguiram seu rumo.
* A Coordenadoria Regional recebeu dois projetos de capacitação para professores. "Ler, Escrever e Contar", para professores de primeira à quarta séries e "Concretizando as Grandes Áreas do Conhecimento" para professores do Ensino Médio e de quinta à oitava série. O primeiro com inscrições para 100 professores e o segundo para 160. Foram mandados ofícios para as escolas. Houve algumas argumentações com diretores que achavam muito difícil dispensar tantos professores ao mesmo tempo, mas tudo ficou resolvido. Houve alguns problemas com a alimentação para todo esse pessoal, pois o Projeto não previa esse item. Só com a colaboração das escolas, que enviaram contribuições, foi possível a concretização dos referidos projetos.
* A situação em casa ficava complicada. O marido de Lucília andava aborrecido, pois como disse à enteada, perdera a companheira de dança as sextas e de todas as horas, pois ela chegava tão cansada que não dava mais conta de nada. Às vezes dormia sentada com a roupa que chegava do serviço. O marido começou a sair de casa sem dizer para onde ia. Num domingo em que todos estavam em casa, ele saiu às oito horas da manhã e só retornou depois da meia noite. Lucília quis saber por onde andou, ele disse que não tinha mais mulher e que ela o tinha abandonado às traças. E que se soubesse
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que um dia isso iria acontecer, não teria casado com ela. Perguntou se ela não lembrava que pedira para ela deixar o trabalho para poderem levar uma vida em companhia um do outro. Principalmente, agora, que poderia lhe oferecer uma vida mais tranqüila, até porque, ela não poderia estar se matando daquele jeito, devido aos problemas de visão. A primeira reação de Lucília foi de revolta. Disse a ele que mesmo que ela estivesse com problemas, ele não tinha o direito de querer manipulá-la daquele jeito. Que o que ele estava fazendo era chantagem e não aceitava esse tipo de pressão. O marido ficou assustado com a reação dela e ponderou: – Você acha que vale a pena comprometer um relacionamento de catorze anos, por um trabalho que não te está dando nada em troca? Você está gastando o que ganha na gasolina e no almoço no restaurante e trabalhando quanto tempo mais do que suas duas matrículas? Faça as contas e veja se está sendo racional! Ele tinha razão, mas ela não queria se convencer de que, realmente não estava valendo o sacrifício. A gratificação que lhe fora prometida não tinha previsão para sair. Nem tinha sido publicada em Diário Oficial a sua função como Gerente de Ensino.
* Ela continuou a trabalhar, saía de casa às seis e meia da manhã e chegava depois das dezenove horas. Começou a perceber que o marido nunca estava em casa. Sentava-se na poltrona para ver o Jornal Nacional e acabava não vendo nada. Acordava no meio da noite, e todos já estavam dormindo. Num fim de semana, o marido disse que não estava com vontade de dançar. Esse era um hábito que tinham. Dançavam uma vez por semana, não só porque gostavam, mas por recomendação médica, para prevenir e combater a artrose. Lucília ficou preocupada. Primeiro as saídas, agora recusar-se a dançar, a coisa que ele mais gostava como lazer? Alguma coisa não estava bem. Ela precisava tomar uma atitude.
* Na segunda-feira, ao chegar na Coordenadoria, leu no jornal, O Dia, a notícia de que todos os professores aprovados nos concursos de 1998 e 2001 seriam nomeados, ainda no mês de outubro. Ela ficou preocupada. Sabia que na transição do governo do Estado, quando o governador renunciasse, para se
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candidatar à presidência, tudo iria mudar. E como seu cargo era de confiança, ela provavelmente, seria dispensada da Gerência. Precisaria tomar uma atitude imediatamente. Suas duas vagas, no Colégio Estadual Mauá, ocupada naquele momento, por duas professoras, uma contratada e a outra com GLP, provavelmente seriam preenchidas pelas novas nomeações e ela, sabe Deus, onde iria parar. Com dificuldades para dirigir a noite, devido à falta de visão no olho direito, não poderia arriscar-se a ser mandada para uma escola longe da sua residência. A condição que impôs a si, para assumir suas matrículas, era que as aulas fossem perto de casa, com fácil acesso. Naquele momento começou a pensar em deixar seu trabalho na Coordenadoria. Precisava retomar suas duas lotações no Colégio onde optara para trabalhar, por ocasião da escolha de vagas dos concursados de 1997 e 1998, a duas quadras de sua residência. Era uma decisão séria que teria de tomar imediatamente. O trabalho burocrático, decididamente, não era o seu forte, principalmente se não tinha liberdade para formar a sua equipe de trabalho. Nas indicações feitas por políticos, nem sempre as pessoas estão preparadas, para desempenhar as funções que lhe são oferecidas, gerando uma série de problemas administrativos. Na maioria das vezes faltam-lhes competência e habilidades. Não sou contra a política, mas que haja critérios; que não sejam mandadas para a educação pessoas que não estejam preparadas. Para isso existe a lei exigindo a formação adequada para o professor, e por que não, para as pessoas que vão acompanhar todo o trabalho desses profissionais?
* Naquele dia chegou em casa e não encontrou o marido. Tinha saído às nove, para o Rio, e não dissera o que fora fazer. Ela decidiu que no outro dia pediria o seu retorno ao Colégio. Só lhe faltava perder a lotação na Unidade Escolar perto de sua residência, e ainda por cima, perder seu par dançante e companheiro de todas as horas. Não perdeu tempo. Sentou-se ao computador e escreveu a carta seguinte e o pedido de retorno à sua Escola de origem. Praia do Anil – Magé, 02 / 10 / 2001 Caríssima amiga Solange. O trabalho de qualquer cidadão deve ser gratificante a ponto de lhe deixar a vontade de retornar no outro dia, mesmo que tenha a mesa repleta de despachos deixados do dia anterior. Mas, para isso é preciso ter-se objetivos pessoais claros e acreditar que o seu trabalho é ponte, elo entre você e o outro. 17
Nessas condições pode-se encarar um horário rígido e desgastante sem se incomodar com as reivindicações dos entes queridos que se preocupem com a sua saúde e o seu bem estar. Embora eu tenha vibrado com o convite feito por você, às dez e meia da noite, para assumir no outro dia, às dez da manhã, um trabalho que julguei livrar-me-ia do abuso de alguns alunos e de uma desgastante rotina de correções de trabalhos e redações sem nexo, nada se compara à maratona de uma Gerência de Ensino de uma Coordenadoria Regional, se você realmente se preocupa e assume o que precisa ser feito. Nos primeiros dias, julguei que o desconforto e cansaço que sentia eram em razão de não ter recebido a relação das atividades que deveria executar e por estar com apenas um elemento efetivo na equipe. Tentei de todas as maneiras executar com a equipe, as atividades que me eram cobradas via ofícios, fax e telefones. Desde o dia vinte de agosto, quando assumi, tentei fechar a porta, fazer um levantamento e relatar as condições em que foram encontrados os trabalhos. Mas em uma Gerência de Ensino não adianta somente fechar a porta para não ser interrompido. Há de se desligar o telefone para não se receber cobranças de resultados com prazos vencidos a cada hora. Com o passar dos dias troquei os braços do meu marido pelos braços da poltrona, pois chegava a casa tão cansada que dormia em frente à televisão ao tentar repousar um pouco antes de tomar banho e jantar. Acordava pela madrugada sem banho e sem jantar. Ele, penalizado, deixava-me dormir um pouco e acabava dormindo também. No outro dia saía para caminhar e eu para o trabalho e voltávamos a nos encontrar, por alguns minutos, antes de mais uma vez eu adormecer. No final da primeira semana ele reagiu dando-me o troco e deixando-me sozinha sem dar satisfações. Quando reclamei, disse que estava abandonado feito um vira-latas e que de nada tinha adiantado o esforço que fizera para tirar-me da sala de aula, pelo menos por dois dias na semana, dando-me uma mesada correspondente ao valor da GLP, no horário noturno, porque agora, além de passar todos os dias fora de casa, chegava inutilizada para qualquer atividade noturna. Mesmo assim, não lhe dei ouvidos, ainda estava cheia de entusiasmo pelo trabalho. Depois de cinco semanas, tentei ficar em casa no meu dia de folga, para resolver alguns projetos particulares urgentes. Quando o telefone começou a tocar solicitando a minha presença no trabalho, as coisas começaram a se complicar. Larguei tudo: o marido à mesa almoçando sozinho, os projetos que seriam executados naquela tarde foram transferidos para domingo, atrapalhando o final de semana. A neta de seis anos chorando por ter de acelerar a sua rotina, o almoço interrompido, tudo isso, acabou atrapalhando o 18
nosso projeto de dançar às sextas-feiras, seguindo uma sugestão médica de exercícios freqüentes para o alívio de sua artrose e também por ser a nossa opção de lazer. Gostamos muito de dançar. Tentei, sinceramente, dar o melhor de mim para realizar um bom trabalho. Não sei trabalhar sob pressão constante, além da que eu mesma imponho-me, devido ao meu temperamento agitado. Hoje, quando percebi que a minha presença seria indispensável para que os cursos de final de semana tenham um andamento satisfatório, cheguei à conclusão de que não agüento esse pique e de que não é esse o meu objetivo: Afastar-me de todas as minhas atividades intelectuais em prol do trabalho gerencial. Quero ler, escrever e contar histórias para meus netos e alunos, além de contextualizar a minha própria história. Portanto, para que eu não passe os anos que me restam sozinha, sem o meu companheiro dançante e para que eu possa desfrutar da convivência com meus netos, enquanto tenho essa oportunidade, peço que você entenda as minhas razões de querer voltar à sala de aula. Lá é o meu lugar. Espero que você seja muito feliz e atinja todos os seus objetivos. Um abraço Lucília Além da carta informal, Lucília redigiu um ofício encaminhando o seu pedido de demissão à função de Gerente de Ensino. Magé, 02 outubro de 2001 Ilmª. Srª. Coordenadora Da CR12–Serrana IV Prezada Senhora Atendendo aos apelos de meus familiares, que se estão sentindo abandonados por mim, solicito o meu desligamento da Gerência de Ensino e retorno à minha Unidade Escolar. Aproveito a oportunidade para manifestar a minha admiração pelo esforço e competência como V. S. vem administrando esta Coordenadoria. Desejo-lhe muito sucesso. Tenho certeza de que concretizará tudo que busca. Vossa Senhoria merece. Atenciosamente Lucília
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* A Coordenadora ao receber a carta ficou aborrecida, pediu desculpas e disse que naquele momento não poderia dispensá-la, pois era um momento de consolidação da equipe. Foi até à livraria "Sinal Verde". Ao retornar entregoulhe um belo cartão, com as seguintes mensagens: "Também vos digo que, se dois de vós concordardes na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, ser-lhes-á concedido por meu pai, que está nos céus. Pois onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles". Lucília, Pelos momentos que passamos juntas. "É tão bom saber que, ombro a ombro estás comigo, não atrás a me criticar, nem à frente para não me enxergar, mas ao meu lado, para crescermos e cultivarmos, todo amor, respeito e ajuda que em nossas vidas Jesus ministrar". Por isso, eu não posso ficar sem você em nossa equipe. Perdoe o meu egoísmo. Com muito carinho, Sua amiga: Solange Lucília ao sair de casa dissera aos familiares que iria apenas despedir-se dos colegas de trabalho. A filha achou ótima idéia e prometeu que naquele dia mandaria fazer um almoço especial para comemorar o retorno da harmonia familiar. E agora? Como avisar que teria de trabalhar mais um pouco, para que a amiga pudesse se organizar. A alegria transformou-se em preocupação. Teria de telefonar para casa dizendo que chegaria no mesmo horário de sempre: às dezenove horas. Pegou o telefone e deu a notícia. A filha achou que era brincadeira. Disse que ela não poderia fazer aquilo, principalmente, ao marido que estava todo feliz esperando-a para o almoço. Ela pediu à filha que procurasse conversar com o padrasto e dissesse que ela teria de ficar trabalhando até o final de outubro, para concluir os dois cursos que estava organizando. Mas que seria definitiva a sua saída. Não queria sair deixando inimizades. Afinal fora convidada por duas amigas que confiavam em seu trabalho.
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Desligou o telefone e foi até à sala da coordenadora. Prometeu que ficaria até o dia 30 de outubro e que faria o curso "Contextualizando as Grandes Áreas do Conhecimento", como professora da Área de Códigos e Linguagens e não como Gerente de Ensino. Ficou tudo acertado.
* A agenda do mês de outubro estava recheada de grandes atividades: * Organização e execução do curso "Ler, Escrever e Contar" para professores do primeiro segmento do Ensino Fundamental; ministrado pelo corpo docente da UERJ. * Organização do curso "Contextualizando as Grandes Áreas do Conhecimento", para professores da Área de Códigos e Linguagens; ministrado pela ABEU no início de novembro, mas teria de ser organizado antes dela sair. * Recepção de todos os Gerentes de Ensino do Estado do Rio de Janeiro, decidido por sorteio, na última reunião da gerência, onde foi sugerido que, as reuniões mensais, a partir daquela data, fossem feitas nas Coordenadorias. Magé foi o primeiro município sorteado. A homenagem a Darcy Ribeiro seria o último evento que iria organizar e participar. * Todas as atividades da agenda foram realizadas. A homenagem a Darcy Ribeiro seria no dia 30. No dia anterior ao evento, fez reuniões distribuiu tarefas, providenciou tudo, carregou objetos para o CIEP 128, onde seria realizada a homenagem. No dia 30 ficaria na Coordenadoria concluindo seu trabalho, pois queria deixar tudo em ordem. Aquele seria o seu último dia na Gerência. Iria para o local da Homenagem às 15 horas para supervisionar todos os arranjos. Ao chegar, ficou decepcionada. Tudo que tinha combinado e planejado estava por fazer. Procurou a diretora e perguntou se havia alguma maneira dela colaborar. Precisava encher os balões, não daria para fazer o que tinha planejado, mas teria de fazer alguma coisa, pois tinha criado expectativas, contara para a Coordenadora do projeto, cuja culminância seria aquela homenagem, como tinha idealizado o evento. Às dezesseis horas a equipe encarregada achava que estaria tudo em ordem e que não precisava ficar tão 21
aflita. Felizmente, o caseiro do CIEP usou o compressor do gabinete dentário e encheu os balões para fazer o arranjo da entrada. O cavalete que tinha conseguido para montar o painel de boas vindas, com um desenho da foto de Darcy, feito por um aluno, estava dentro da barraca de uma escola, autorizada por uma pessoa da sua equipe da Gerência. Ela não teve dúvidas, pediu que colocassem na entrada, onde ela tinha planejado e para isso tinha solicitado, com bastante antecedência, a uma escola vizinha o empréstimo do tal cavalete... Pediu a colaboração de uma professora do CIEP 128 para montar o painel. Ficou tudo pronto, mas os balões que deveriam cair em cascata das cestas de basquete, não foram arranjados.
* Mais uma vez recorreu ao caseiro para organizar os fogos. Ao retornar as meninas da sua equipe tinham emendado o cartaz, trocando a frase; "Benvindos ao sonho!", por "Bem-vindos ao sonho". Ela perguntou quem o tinha feito? A diretora disse que tinha sido as meninas da gerência. Ela tentou explicar que as duas maneiras estavam certas, devido ao fato de o primeiro ser um verso destacado de um poema, onde se leva em conta a sonoridade. Mas teve de engolir os sorrisinhos de deboche, daqueles, que por lhes faltar conhecimento lingüístico, só conheciam a segunda forma. Embora o evento tenha sido um sucesso, Lucília deixou para trás uma certa angústia. Não gostara daquela atitude de rasurarem o cartaz e ainda aquele ar de superioridade. Numa atitude de afronta, aliás, o que já tinha acontecido antes, com os comentários feitos às costas, o que fizera ela tomar a decisão de deixar a Gerência. Como já ia mesmo sair, sublimou o assunto. Após o término do evento, pegou o carro e foi para casa, com a sensação de impotência diante da atitude das autoridades de contratarem pessoas não habilitadas para tratarem de um setor tão importante como a educação.
* No final de semana, Lucília fez uma visita a Patrícia, queria saber notícias da neta, aquela do problema na cabeça. Estava tudo sobre controle. A equipe da Santa Casa achou que não seria necessária uma cirurgia, pelo menos naquele momento. O problema deveria ser acompanhado com atenção, mas que não havia razão para ficarem desesperados.
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Após marcar consultas, algumas vezes, e não conseguirem encontrar o médico, na Santa Casa, a família resolveu permanecer com o médico particular para o acompanhamento do caso.
* No ano seguinte, ao organizar um exercício para sua turma de 1º ano do Ensino Médio, pesquisou em vários livros as palavras compostas, inclusive aquelas formadas pelo prefixo bem. Encontrou no Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa de Domingos Paschoal Cegalla a seguinte explicação: "Bem-vindo. Assim, com hífen de acordo com o código ortográfico oficial. Parece-nos melhor grafia benvindo. Tanto mais porque a pronúncia que se ouve, mesmo entre pessoas cultas, é / benvindo / e não / bêim-vindo /. A grafia deveria subordinar-se à fonética, tal como ocorre com bendito, benfazejo e benquisto. Advogamos essa grafia, simples e autêntica, para os demais vocábulos compostos formados com o prefixo bem, sempre que o segundo elemento o permitir". Lucília tirou xerox da explicação para seus alunos e levou uma cópia, também, para as meninas da Coordenadoria que emendaram o seu cartaz na homenagem a Darcy Ribeiro. Uma delas ficou meio sem graça, a outra riu pra valer e deu um abraço em Lucília e a terceira saiu correndo pra vê-la na moto com o marido.
Praia de Mauá – Magé – RJ, 10 / 01 / 2003 Benedita Silva de Azevedo
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