Da Necessidade De Calar

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FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - Escrivinhação n.º 744

DA NECESSIDADE DE CALAR Redigido em 14 de fevereiro de 2009, quinta semana do Tempo Comum, dia de Santo Cirilo e de Santo Metodio. Por Dartagnan da Silva Zanela "A nossa dignidade consiste no pensamento. Procuremos, pois pensar bem. Nisto reside o princípio da moral". (Blaise Pascal)

- - - - - + - - - - Em várias outras oportunidades enfatizamos o quão significativo é a imersão da alma humana no silêncio para o seu crescimento interior. Para falar a verdade, é apenas

na

sociedade

praticamente

absoluto

hodierna em

que

relação

se

tem

a

este

de

uma

um

desdém

elemento

tão

simplório quanto basilar. Se

fôssemos

fazer

uso

analogia

para

melhor explicar o papel singular do silêncio na formação de uma pessoa, faríamos com a água e um barquinho de papel. Aliás, faremos. A água seria o ambiente a nossa volta e em nosso interior. Poderá ser ela turbulenta e turva tal qual a sociedade moderna, ou caudalosa e tranqüila como a muito não há. O barquinho de papel, por sua deixa, seria como a nossa alma: frágil e que facilmente se deixa levar pela força das águas. Todavia, está faltando dois elementos que na sociedade moderna, na maioria das vezes, são desdenhados. Um deles é a razão, a capacidade humana de discernir o

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - certo do errado, de avaliar e ponderar a realidade que se apresenta para a janela da alma. O outro é a vontade, que é a força que pode ser guiada pela razão ou simplesmente deixada a mercê de nossas paixões mais vulgares e de nossos desejos mais chulos. Em nossa analogia, a do barquinho e das águas, que figuras utilizaríamos para representar o logos e a vontade? Qual? Uma criança que brinca. Uma criança que toma em suas

mais

a

papel

com

o

qual

moldará

o

seu

barquinho

(mente) e que escolherá quais águas ele irá singrar, pois, as possibilidades do papel são muitas, não infinitas. Tal qual em nossas vidas onde uma série de escolhas nos levam a sermos o que somos, são decisões que tomamos que nos fazem caminhar em direção daquilo que é mais nós do que nós mesmos, ou que nos atira para longe daquilo que deveríamos ser e, com o tempo, acabamos por esquecer. Se

continuarmos

a

meditar

sobre

o

dever

de

educar-se, de construir a sua própria pessoa, o leitor pode com grande tranqüilidade questionar o fato de a sociedade moderna

praticamente

apresentar-nos

apenas

águas

turbulentas e turvas e indagar: o que o garotinho poderia fazer em uma situação desta? O que nós podemos fazer em uma situação como esta?

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

O coração irradiante

Recorrer a uma bacia ou desviar a água do rio para um local onde ela deixe de sofrer a agitação das corredeiras.

É

impossível

que

possamos

ter

um

real

crescimento interior, um fortalecimento de nosso “Eu” se nos mantemos imersos ininterruptamente no agito da vida secular

que

desejamos

nos

é

oferecido.

realmente

crescer

Por

essa

enquanto

razão ser

que,

se

humano

é

fundamental que reservemos para nós momentos de isolamento, de solidão e silêncio. Não estamos falando aqui daquela babaquice do “nadismo”. Estamos nos referindo ao que todas as grandes tradições

religiosas

ensinaram

e

e

praticaram

sapienciais que

é

a

sempre

procura

defenderam,

por

uma

vida

centrada. O papel primeiro desta prática, a do silenciar, é nos encontrarmos com a própria realidade da vida. Vivemos o tempo todo imersos em simulacros de realidade, ou transitando de um simulacro para outro. Do trabalho para o lazer, do lazer para a balada, da balada para

noitada,

da

noitada

para

festa,

da

festa

para

o

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - trabalho, do trabalho para o trânsito, e por aí segue o andor. Mas, que momento de nossas vidas é reservado para o silêncio, para a solidão, para a oração, para esse encontro conosco mesmo? O que indignamente escrevemos aqui nestas mal fadadas linhas parece ser banal, entretanto o apatetamento do homem moderno chegou a tal ponto que somos incapazes de suportar

mesmo

alguns

instantes

de

silêncio

em

nosso

translado pelas ruas. É comum vermos dia após dia pessoas caminhando

com

o

seu

“MP

não

sei

o

que”

nos

ouvidos,

fugindo da monotonia de sua alma com um alarido de um simulacro de conteúdo para invadir os seus ouvidos como se já não bastasse todas as outras parafernálias tecnológicas que

nos

convidam

ininterruptamente

a

fugirmos

de

nós

mesmos. Exemplo degrado disso que apontamos acima são aqueles que

viram

a

noite

com

suas

almas

entregues

ao

bisbilhotar sorrateiro de fotos em perfis do Orkut ou em games

baratos

para

assim,

deste

modo

parvo,

poderem

preencher, mesmo que superficialmente, a sua vida vazia em mais uma noite vazia. Aí, meus caros, não é à toa que as dificuldades de aprendizagem abundam e a incapacidade para concentra-se aflora nos dias hodiernos.

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Santo Antônio de Pádua, Santo Doutor da Igreja, exemplo de uma vida silente e sábia.

Por

essa

razão,

podemos,

neste

ínterim,

perguntar: Quantos foram os momentos que um indivíduo como este reservou para disciplinar a sua mente? Quantas vezes, como um atencioso garotinho, ele cuidou de seu barquinho de papel? Quantas vezes ele se importou com o seu barquinho? Quantas vezes ele se importou mais com ele sem confundir o que ele é com as suas paixões e desejos desordenados? Se, ao menos, nos dedicássemos a responder a estas indagações, com o mínimo de sinceridade necessária e, com o mínimo de franqueza, nos dedicássemos a procurar a via

silenciosa

distinta

da

que

do

autoconhecimento,

temos

hoje.

teríamos

Teríamos,

porém,

uma a

vida

via

do

silêncio é uma via que exige algo que a maioria das pessoas peremptoriamente se recusa a fazer: calar-se. Ficar sem falar. Entregar-se abnegadamente a quietude e a mansidão.

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - Quem realmente se entrega a esta prática? Quem realmente tem a virtude da paciência para deleitar-se nos átrios da disciplina silenciosa do cultivo dos talentos? De mais a mais, o que torna a situação mais caricata, é o fato que quanto mais tempo o indivíduo se vê entregue a vida vivida no ritmo da turba, menos apto ele se encontra para lidar com os problemas mais elementares da vida

humana.

Quanto

mais

descentrada

é

a

vida

dos

indivíduos, mais fragilizados, em termos de caráter, eles ficam, ou melhor, tornam-se incapazes de tomar uma decisão com autonomia. Os indivíduos, na sociedade atual, vivem desde tenra idade, imersos, nos mais variados simulacros de vida humana e, quando se defrontam com algo que lembra, mesmo que vagamente, o que é um ser humano e o que é uma vida humanamente vivida, ficam perdidos, sem saber o que fazer por não saberem o que são e o que deveriam ser.

O que eleva o ser humano é o que há de melhor na humanidade

FALSUM COMMITTIT, QUI VERUM TACET - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -

Aliás, o que você deveria ser? Não indagamos o que você gostaria que fosse a sua vida, mas sim, o que deve ser sua vida para ser digna de ser vivida? Com toda certeza nem

seu

mp3,

nem

seu

Orkut

e

muito

menos

sua

banda

preferida poderão ajudá-lo nesta solitária jornada interior se

você

realmente

estiver

disposto

a

trilhá-la.

Este

caminho, para ser devidamente trilhado, não pode, de modo algum, ser algo imposto por outrem ou por meio de pressões externas. O caminho para o autoconhecimento sempre foi e sempre será uma fornada solitária, que deve ter como tensão primordial vontade

do

a

razão

Espírito

individual para

assim

que

se

deixa

orientar

a

guiar sua

pela

própria

vontade de acordo com esta e, deste modo, gradativamente, tornar-se senhor de si e não mais um reles escravo de si, pois, como nos ensina Goethe, "Digno de liberdade só é quem sabe conquistá-la todos os dias". Nenhuma conquista pode ser obtida sem um mínimo de sacrifício, nenhuma conquista digna de ser humanamente desejada, não é mesmo? E você, meu caro, é digno de seus desejos? É digno daquilo que você é? Por fim, é digna a imagem que você finge ser? O que o silêncio de sua alma tem a dizer sobre isso? Pax et Bonum Site: http://professordartagnan.tk

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