1995-madeira Trafico Negreiro

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DEPTP DE WISTORIA DE AMERICA «FERNANDEZ DE OVIEDO» CENTRO DE ESTUDIOS HISTORICOS

REVISTA

Revista de I n d k , 1 995, vol LI/ núm 204

-'

A ILHA DA MADEIRA E O TRAFICO NEGREIRO NO SÉCULOXVI POR

ALBERTO VIEERA Centro de Estudios de Historia do Atlántico

Funchal-Madeira

Este ti-ubajo sobre Ius reluciot~escoprzerciu1e.s de lu isla de Madeira sostiene la in~portanciude acrividudes nzei-cai?rilescoij erros a~chipiélagaspróximos así como c011otrvs nzár uiejndos desde e1 siglo XK coivzercio de cereal& y trúfico negrero, tais en contra de /a /I zitooi-iografia tradicioi~alqzie defiende unicamente lu vincuhción de la isla c011 e1 Viejo Mzii?do /zasta e1 siglo XVIJ fecha en que se esfablecieroi? relacioi?es c011 el N~levo.Todo ello destacado a través de un raro e importante testamei?ta, e1 de1 co171ei-ciuiltei7zadeirense Frai?cisco Dúrz (1559).

A historiografia vem defendendo única e exclusivamente a vinculação da ilha ao Velho Mundo, realçando apenas a importância desta relação umbilical com a mãe-pátria. Neste sentido os séculos xv e xvx seriam definidos como os momentos áureos deste relacionamento, enquanto a conjuntura setecentista seria a expressão da viragem para o Novo Mundo, em que o vinho assume o papel de principal protagonista e responsável destas

trocas comerciais. Os estudos por nós realizados vieram a confirmar que o relacionamento e-xterior da Madeira não se resumia a enas a estas situações A margem destas vias e mercados su sistiam outras que activaram também a economia rnadeirense, desde o século XV. Neste contexto as conexões com os arqui. élagos próximos (Açores e Canárias) ou afastados (Cabo Ver ! c e, S. Tomé e

!

(1) Alberto VIEIRA, "O comércio de cereais dos Açores ara a Madeira no seculo XVU1', in Os A ~ o r e se o Ati&i~rico(sécrilos XW-XVY, Angra do Heroismo, 1984: "O comércio de cereais das Canarias para a Madelra nos séculos XVI e XVII", in VI ColQuio de Hisrória Cat?urioAnzericanq Las Palmas, 1984; "Madeira e Lanzarote. Comércio de escravos e cereais no século XVII", in W Jornadas de Hissória de L a n ~ r o t e Ftlei-tevei?ttli-a,Arrecife de Lanzarote, 1989.

ALBERTO m R A

Príncipe) foram já motivo de uma aprofundada explanação, que propiciou a sua necessária valorização na estrutura comercial madeirense (2). Aqui ficou demonstrada a importância assumida por estes contactos humanos e comerciais que, no primeiro caso, resultaram da necessidade de abastecimento de cereais e, no segundo, das possibilidades de intervenção no trafico negreiro, mercê da vinculação as áreas africanas da Costa da Guiné, Mina e Angola. A praça comercial madeirense, para além do privilegiado relacionamento com o mundo insular, foi protagonista de outros destinos no litoral africano ou americano e rosário de ilhas das Antilhas. No primeiro rumo ressalta a costa marroquina, onde os portugueses assentaram algumas praças, defendidas, a ferro e fogo, pelas gentes da ilha (3). No século XVI, com a paulatina afirmação do novo mundo americano costeiro e insular, deparase a ilha um novo destino e mercado, que pautou o seu relacionamento externo nas centurias posteriores. Este novo mundo e mercado foi para muitos uma esperança de enriquecimento ou a forma de assegurar a posse de bens fundiários. Gaspar Frutuoso testemunha este protagonisrno madeirense: "A ilha da Madeira... que Deus pos no mar ocidental para escala, refúgio, colheita e remédio dos navegantes, que de Portugal e de outros regnos vão, e de outros portos e navegações vêm para diversas partes, além dos que para ela somente navegam, levandolhe mercadorias estrangeiras e muito dinheiro para se aproveitar do retorno que dela levam para suas terras..." (4). Em qualquer das situações o estreitamente dos contactos depende, primeiro, da presença de uma comunidade madeirense que pretende manter o contacto com a terra-mãe e depois das possibilidades de uma troca favorável. Neste contexto a oferta de vinho e a sua procura pelos agentes do trafico negreiro, para enganadoramente oferecerem aos sobas africanos, ou do outro lado do Atlântico saciar a sede do europeu a troco do açiicar, foi o principal motor deste relacionamento. A situação influenciou f2b O comércio inter-insular (Madeiro, Açores e Candriar) nos séculos XV e X V , unchal, 1987. (3) A. A. SARMEMTO, A Madeira e as pmçm de África. dum caderno de apontamentos, Funchal, 1932: Robert RICARD, "Les places luso-rnarxaines e t les Iles rrtu$aises de Mdantique", in Anais da Academia Portuguesa de Historh Lisboa, séne, vol. 11, 1949; António Dias FARINHA, "A Madeira e o Norte de Africa nos séculos XV e XVI", in Actas do I Coló uio Inrernacional a% História de Madeira 1986, Funchal, vol. I, 1989, páps. 360-379. (4) Gas ar FRUTUOSO, Livro primeiro das Saudades da Terra, Ponta Delgada, 1979,págr. $9- L W.

R. I., 1995, n g 204

A ILHA DA MADELRA E O TRAflCO NEGREIRO

decisivamente a estrutura comercial da ilha, a partir da segunda metade da s&culo XW. Desde então as conexões comerciais adquirirarn uma maior complexidade, fazendo com que a Madeira, através do vinho, se transformasse n u m ponto importante do circuito de triangulação, que passou a dominar os contactos entre os portos da costa ocidental africana, americana e as Antiihas. Neste contexto foi exemplar e decisiva a acção do madeirense Francisco Dias, que terá continuidade no século XWI com Diogo %mandes Branco.

se no facto de que as Cmhrias e os Açores foram os

rotagonistas do comkrcio com o Novo Mundo, e a Madeira para uma p i @ o excEntrica. Todavia, dos dados disponíveis na do~urnentqãorevelam a ontribuindo para isso a facto de a Madeira ter servido para todas as tentativas de valorização económica do do. Esta última situação favoreceu uma pronta ernie madeirenses, especializados nas diversas tarefas, e manutenção do relacionamento, ainda que por vezes S. Além disso a posição saiu reforçada com a oferta e de produtos demandados pelos novos mercados. E, nte, deverá juntar-se a activa participação dos mercadores nestes circuitos comerciais, então trasados para o forneto de mão-de-obraescrava ou escoamento do açiicar. ercado negreiro da costa ocidental africana foi alvo da dos madeirenses, que cedo se intrometeram no trafico estino à ilha, ao velho continente e, mais tarde, ao novo Os madeirenses participaram activamente na, ecirnento das terras da Sul. Aliás; desde 1470 cionou como u m importante entrepasto para o comércio africano. Este relacionamento progrediu mercê de uma Con'unturã favorável aos contactos com estas paragens: em 1483 0. anue1 recomendou as maiores facilidades na podo do Funchal para os navios de Cabo Verde; depois, a partir de 1507, foi a isenção do pagamento de direitos nos produtos exportados de Cabo Verde para as ilhas e reino. Tudo isto facilitou o acesso do madeirase ao mercado de escravos. Desk modo a ilha foi um dos primeiros datino dos escravos resultantes das primevas razias na costa ocidental africana.

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2. A MADEIRA E O MERCADO DE ESCRAVOS

A Madeira, porque próxima do continente africano e envolvida no seu processo de reconhecimento, ocupação e defesa do controlo lusiada, tinha as portas abertas a este vantajoso comércio. Deste modo a ilha e os madeirenses demarcaram-se nas iniciais centúrias pelo empenho na aquisição e comércio desta pujante e promissora mercadoria do espaço atlântico. A ilha chegaram os primeiros escravos guanches, marroquinos e africanos, que contribuiram para o arranque económico do arquipélago. O comércio entre a ilha e os principais mercados fornecedores existiu, desde o começo da ocupação do arquipélago, e foi em alguns momentos fulgurante. Impossível é estabelecer com exactidão a quantidade de escravos envolvida. A deficiente disponibilidade documental, para os séculos xv a xw, não o permite. Carecemos dos registos de entrada da alfândega do Funchal e dos contratos exarados nas actas notariais (5). Os escravos que surgem no mercado madeirense são na quase totalidade de origem africana, sendo reduzida ou nula a presença dos de outras proveniências, como o Brasil, Antilhas e India.Isto pode ser resultado, por um lado, da distância ou das dificuldades no trafico e, por outro, das assíduas medidas limitativas ou de proibição, como sucedeu no Brasil e India. Apenas o mercado africano, dominado pela extensa costa ocidental, em poder dos portugueses, não foi alvo de quaisquer proibições. Ai as únicas medidas foram no sentido de regular o tráfico, como sucedeu com os contratos e arrendamentos. O litoral Atlântico do continente africano, definido, primeiro, pelas Canárias e Marrocos e, depois, pela Costa e Golfo da Guiné e Angola, era a principal fonte de escravos. E ai a Madeira foi buscar a mão-de-obra necessária para abrir os poios e, depois, plantar os canaviais. Primeiro forarn os escravos brancos das Canárias e Marrocos. Depois os negros das partes da Guiné e Angola. As condições particulares da presença portuguesa no Norte de África definiram uma forma peculiar de aquisição. Os escravos eram sinonimo de presas de guerra, resultantes das múltiplas pelejas, em que se envolveram portugueses e mouros. Para os madeirenses, que defenderam com valentia a soberania portuguesa nestas paragens, os escravos mouros surgem ao mesmo (5) Confronte se nosso estudo sobre Os escravos no arquipélago ah Madeira, séculos XV a XVII, Funchal, 1993. R. I., 1995, nQ 204

A ILHG D A MADEIRA E O TRAFICO NEGRERO

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@mio e testemunho dos seus feitos bélicos. Outra ição era o corso marítimo e costeiros, prática de um a arnbas as partes. Idêntica situação ocorreu os madeirenses também se evidenciaram nas diaí travadas, como sucedeu com Trktão Vaz da ta Africana, além do Bojador, os meios de abasteciravos eram outros: primeiro tivemos os assaltos e is o trato pacifico com as populações indígenas. Tudo uma dinâmica diferente para os circuitos de coporte. Aqui os cavaleiros e corsários são substituiença dos guanches na Madeira é um facto natural. contribuíram a proximidade da Madeira e o empenho eirenses na iniciativa henriquina, Decorridos, apenas, 26 cio do povoamento da Madeira, os madeirenses e na complexa disputa pela posse das Canárias ao do senhor, o infante D. Henrique. Tais condições definiram nça madeirense neste mercado de escravos, surgindo, na a metade do século xv,algumas incursões de que resultou risionamento de escravos. Destas referem-se três (1425, 1427, 3 que partiram da Madeira. Mais tarde, com a expedição a p t a africana de 1445 o madeirense Álvaro de Ornelas fez um +vi0 a ilha de La Palma onde tomou alguns indígenas que m d u z i u a Madeira. Aliás, nas inúmeras viagens organizadas por p u g u e s e s entre 1424 e 1446, surgem escravos que, depois, h m m vendidos na Madeira ou em Lagos. A partir de meados do século XV, são assíduas as referências a escravos canários na ilha da Madeira como pastores e mestres de engenho (6). A sua presença na ilha deveria ser importante íImas últimas décadas do século XV. Os documentos clamando por medidas para acalmar a sua rebeldia são indicio disso. Muitos deles, fiéis a tradição de pastoreio, mantiveram-se na Madeira fiéis a este ofício. Estranhamente, nos testamentos do século xv, não encontramos indicação de qualquer escravo guanche. Para além dos dois escravos que possuía o capitão Simão Gonçalves da Câmara, sabe-se que João Esmeralda, na Lombada da Ponta (6) Lothar SEMENS Liliana BARRETO, "Los esclavos aborígenes canarim en ia isla de la Madera (14;s-1505)", Anuario de E r t u d k Anrerkai*os, Seviiia, d 20, 1974, ags 11 143 Aqui utilizamos o termo canário para designar os escravos oriunfos do - ui &o das Canárias, não ob-te esse temono querer signihcar os habitantexe grm Car~árhMas d ,o FRUTWOSO [4] iivro p,&o, p. 73) "desta (Gran Canaria tomaram o nome gerd da canários os habitadores daç

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outras, ainda que tam ém seus particulares nomes".

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do Sol, era também detentor de escravos desta origem, sem referir o número (7). Cadamosto, na primeira passagem pelo Funchal em 1455, refere ter visto um canário cristão que se dedicava a fazer apostas sobre o arremesso de pedras (8). Será que o Pico Canário (Santana) e o lugar do Canário (Fonta de Sol) referem-se ao escravo ou ao pássaro tão comum nestes arquipélagos? Nos anos de 1445 e 1446 estão documentadas diversas expedições às Canárias, que contribuiram para o aumento das presas de escravos do arquipélago na Madeira. Em 1445 ambos os capitães da ilha -Tristão Vaz e Gonçalves Zarco- enviaram caravelas de reconhecimento a costa africana, mas o fracasso da viagem leyou-os a garantirem a despesa com uma presa em La Gomera. Alvaro Fernandes fez dois assaltos em La Gomera e em 1446 foi enviado por João Gonçalves Zarco, referindo Zurara a intenção de realizar alguma presa. A última expedição, bem como as acima citadas, revelam que os escravos canários adquiriram u m a dimensão importante na sociedade madeirense pela sua intervenção na pastoncia e actividade dos engenhos. Na Madeira, a exemplo das Canárias, eles, nomeadamente, os fugitivos foram um quebra-cabeças para as autoridades. Foi como resultado desta situação insubmissa, de livres e escravos, que o senhorio da Madeira determinou em 1483 (91, uma devassa, seguida de ordem de expulsão em 1490 (10). De acordo com este último documento todos os escravos canarios, oriundos de Tenerife, La Palma, Gomera e Gran Canaria, exceptuando-se os mestres de açúcar as mulheres e as crianças, deveriam ser expulsos do arquipélago. As reclamações dos funchalenses, sintoma de que se sentiam prejudicados e de que esta comunidade era importante, levou o infante a considerar apenas os forros (1 I). A 4 de Dezembro de 1491 houve reunião extraordinária da camara para deliberar sobre o assunto. A ela assistiram o capitão do Funchal, Simão Gonçalves da Camara, os oficiais concelhios e homens bons. Ao todo eram vinte e cinco, destes onze votaram a favor da saída de todos, nove apenas dos forros e quatro à sua continuidade na ilha. Das primeiros registese a opinião de João de Freitas e Martim Lopes, que justificam a opção, por todos os (7) FRUTOSO (41, pág. 124. (8) José Manuel GARC~A, Viagens dos descobrimentos, Lisboa, 1983, pag. 86. (91 nmw,V O ~ .xv, p á g ~122. i 34. (1 0) Zbidem, vol. XVI, págs. 240-244. (1 1) Zbidem, vol. XVI, págs. 260-265.

A L H A DA MADEIRA E O TRAFICO NEGREIRO

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livr & b s o nso e

escravos, serem ladrões. Todavia para Mendo assim que se castigava tais atropelos, pois existia '"dução. Se consideramos, por hipótese, que cada s pretendia defender os seus interesses, podemos Wt,oxze dos presentes eram proprietários de escravos ,1503(12) o problema ainda persistia, ordenando o eles fossem expulsos num prazo de dez meses. De pw i retrocedeu abrindo uma excepção para aqueles que de açúcar e dois escravos do capitão -Bastiam Catarina-, por nunca terem sido pastores (13). h i o isto podemos concluir que as Canárias afirmaram-se xv como o principal fornecedor de escravos, complejorn as presas dos assaltos i costa mamquina e viagens 8.Os canários foram na ilha pastores e mestres de engen-

mrmios,

~onistasdo século xv e xvx relevam o activo protagonismo

aeirenses na manutensão e defesa das praças de Marrocos. :I al aristocracia da ilha fez delas o meio para o reforço ~ & õ e sda cavalaria medieval, uma forma de serviqo ao !h* e fonte grangeadora de títulos e honras. Esta acção foi ,,e, e imprescindível a presença portuguesa, na primeira $de do século XVI, destacando-se diversas armadas de socorro Azamor, Mazagão, Santa Cruz de Cabo Gué, Safirn. Aí FmZncipais ptotagonistas foram os capitães do Funchal e Ma%r, bem como a aristocracia da Ribeira Brava e Funchal. %tadupla intervenção dos madeirenses na conquista e ma:n@o das praças marroquinas e portos da costa além do dor contribuíu para a abertura das rotas de comércio de avos, daí oriundos. No caso de Marrocos a assídua presença es na defesa trouxe-lhes algumas contrapartidas favoráveis termos das presas de guerra. Dai terão resultado os escravos uriscos que encontrámos. Gaspar Frutuoso refere, quanto a de S. Miguel (Açores), que em 1522, quando do sismo e cada de terras que soterraram Vila Franca do Campo, era w e r o s o o gmpo de escravos mouros que o capitão Rui GonGaIves da Câmara e acompanhantes detinham, quando anos antes haviam ido a socorrer a Tanger e Arzila (14) IdEntico foi o comportamento dos madeirenses que participaram com assiduidade

p&,

(12) Ibídem vol. XVII, pags. 440-441. (13) Ibidem vol. XViI, pags. 450-451. (14 Francisco de Athayde M. de Faria e M m , Capifãa das DoimfáriaE (1439- 7661, Lkboa, 1972, 60.

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nestas campanhas. Talvez, por isso mesmo, os rnouriscos surgem com maior incidência no Funchal e Ribeira Brava, áreas em que os principais vizinhos mais se distinguiram nas guerras marroquinas. Hes situam-se, quase que exclusivamente, no século XVI, se exceptuarmos um caso isolado do Funchal da década de 1631 a 1640. Poder-se-á entender a situação como corolário das medidas restritivas a posse de escravos mouros, estabelecidas pela coroa a partir 15971 (15). O comprometimento dos madeirenses com as viagens de exploração e comércio ao longo da costa africana, e a importância do porto do Funchal no traçado das rotas, definiram para a iiha uma posição preferencial no comércio dos escravos negros da Guiné. Deste modo não seria difícil de afirmar, embora nos faltem dados, que os primeiros negros da costa ocidentai africana chegaram a Madeira muito antes de serem alvo da curiosidade das gentes de Lagos e Lisboa. A situação da Madeira e dos madeirenses nas navegações supracitadas, a par da extrema carência de mão-de-obra para o arroteamento das diversas clareiras abertas na ilha pelos primeiros povoadores, geraram, inevitavelmente, o desvio da rota do comércio de escravos, surgindo o Funchal, em meados do século xv, como um dos principais mercados receptores. E nenhum outro local o escravo era tão importante como na Madeira. São vários indícios de que o comércio de escravos era activo e de que a Madeira foi, por algum tempo, a piaca giratória para o negócio com a Europa. Em 1492 (16) a coroa isentava os rnadeirenses do pagamento da dizima dos escravos que trouxessem a Lisboa. Esta situação, resultante da petição de Fernando Pó, revela que havia já na ilha um grupo numeroso de escravos e que-muitos deles eram daí levados para o reino. E pouca a informação disponível sobre o assunto, mas o suficiente para revelar a importância que assumiu na Madeira o comércio com o litoral africano, onde os escravos deveriam preencher uma posição dominante. Todavia, ela' impede-nos de avaliar com segurança o nível deste movimento e a importância que os mesmos escravos assumiram, no século XV, na sociedade madeirense. A insistente referência, na documentação da época, aos negros, óbviamente desta área africana,poderá ser o teste(15) Vitorino WGALHAES GODINHO, Os Descobrimentos e a Economia Mu~tdiaL Lisboa, vol. IV,1983, pág. 191. (16) A.R.M., CMF., tomo i,fls. 223 vo-225, sentença régia isentando os moradores da Madeira do pagamento de dizima nos escravos que levarem para Lisboa, para seus eMço, publ. in A.H.IM, vol. XVI, 1973, nQ 161, págs. 269-271.

A LHA DA MADEIRA E O TRAFICONEGREIRO

m1: ser

de

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ortãncia. Em 1466 (17) os moradores repreçada sobre os moços ondicionava a presença em favor dos negros em que temiam «vir algum perigo». Passados o capitão do Funchal representara ao duque o tava a ilha, por os vizinhos saírem para Lisboa africano, «por bem dos rnuytos negros que hai . disso, já em 1474 (19) a infanta D. Beatriz, em 3es do Funchal e Machico, estabelecera medidas escravos e forros quanto a posse de casa, para que vinham sucedendo. rencia ao envio de um escravo de Cabo Verde O) no testamento de cruzados e sete ou es para lhe trazer enzo Pita de Gran e em Cabo Verde a compra a troco de vinho. Manuel

pação activa no trato das Canárias com a Guiné (21). da existência deste activo comércio de escravos entre e Cabo Verde temo-la em 1562 (22) e 1567 (23). Nesta dificuldades sentidas na cultura do açúcar levaram os a solicitarem junto da coroa, faciiidades para o proviescravos na Guiné, com o envio de uma embarcação efeito. O rei acedeu a esta legítima aspiração dos lavraadeirenses e ordenou que, após o terrninus do contrato darnento com António Gondves e Duarte Leao, isto é,

, t. I, fls. 226-229 vo., 7 de Novembro de 1466. "ApntaFernando, em resposta de outros", in A.HM, XV, 1972,

&dia

do Funchal nQ 710,a.308-3118, testamento de 3 de

R L, 1995, nQ 104

ALBERTO VIEIRA

escravos, dos quais cem ficariam no Funchal e cinquenta na

Calheta. A Madeira não se resumiu apenas a acolher os africanos, pois na ilha também surgiram escravos de outras áreas, onde os rnadeirenses tiveram uma activa intervenção, como o Brasil e as Antilhas. A par disso existia um intenso comércio entre os dois destinos e a Madeira mercê da constante solicitação do vinho, que ai se trocava por açúcar, aguardente e farinha. Acresce, ainda, no caso do Brasil, que a Madeira foi, durante a segunda metade do século XVI, um importante entreposto para o contrabando de açúcar brasileiro, Esta foi uma das formas usadas pelos mercadores, que se haviam empenhado no comércio do açUcar madeirense para minorarem os prejuízos da quebra de produção, motivada pela concorrência do brasileiro. Foi também na mesma época que comecou a florescer o comércio do Wiho com as Antilhas. Num e noutro caso está testemunhado a presença de escravos, sendo de realçar para o século XVE o caso de Rarbados e no imediato o Brasil. Mas estes tanto poderiam ser indígenas ou africanos, uma vez que apenas é indicado o local de origem e nunca a situação étnica. Das possessões portuguesas no Indico está também referenciada a presença de escravos, ainda que em niimero diminuto. Esta origem, ainda que fugaz, marca outra rota de envio de mão-de obra para a Madeira, resultando, de modo especial, da intervenção e rnadeirenses no processo de ocupagão e conquista. 3. FRANCISCO DIAS E OS NEGREIROS MADEIRENSES

Nos entrepostos do trafico negreiro em Santiago, S. Tomé ou Angola, a presença de madeirenses era frequente. Eles gozavam mesmo, desde 1562, de privilégios especiais na captura de escravos para as suas fazendas ou venda aos seus cornpatrícios que as possuíam. Outros procuravam intervir no rendoso contrabando, alargando aos seus negócios até ao Brasil ou Antilhas. Muitos, fascinados pela aventura destas paragens, decidiram-se por uma intervenção directa, fixando-se em Santiago ou na Costa da Guiné. Note-se que a situação de vizinho era condição obrigatória para participar neste trafico negreiro (24). Privados da família e (24) Confronte-se António CALRURA,Cabo Verde, Lisboa, 1983, págs. 29-53.

DA MADEIRA E O TRAFICO NEGREIRO

um, entre muitos destes, que se lançou a

ela morte numa operação comercial na o teve tempo para lavrar o testamento, o

se iniciava na Costa h Guhé e estendia-se a Grande em amplos aposens de boas mobiiias (no testamento refere: «leito e

Joana Lopes, dois escrae urna negra com dois geneàlogia de Francisco r em Cabo Verde, quer identificação e o seu ente expresso no tesãs Isabel e Beatriz Fernandes. Joham &bmo tráfico negreiro da Guiné.

Ao apelido Dias associa-se uma tradição de famílias judaicas, (25) Arquivo Regional da Madeira Misericórdia da F~incbtaknQ 684, h.78579W, em anexo deverá ser o mesmo ue em 1514 se encontrava em Cabo Verde (26) com memporteim mor da rendi@ aoos cativos. e dificilmente pderá ser identificado com um Joharn Fernandes, mestre de navia e capiEo, qsia no período de I513 a 15 15 trouxe da costa da Guiné 56 peças c$ escmm (confronte-se História Geral de Cabo Verde, corpo documental v01 4 Lisboa. k940).

com ramificações na Madeira, Açores e, mesmo, Cabo Verde. Em qualquer destes espaços aos indivíduos identificados com este apelido surge, quase sempre, associada a origem judaica e a actividade mercantil (27). Na Madeira são vários os individuos com o apelido Dias associados ao sector comercial, havendo dois como o nome Francisco. Destes apenas um, Lopo Dias, é conhecido como judeu (28). O mesmo se poderá dizer em relação aos Açores, onde encontrámos onze, sendo três judeus (29). Neste grupo poder-se-á incluir os Dias de S. Miguel, a que se encontra associado o Dr. Gaspar Frutuoso, considerado filho de um Frutuoso Dias, activo rnercador da cidade de Ponta Delgada (30). Em Cabo Verde é também evidente a presença destes, relacionados com a administração e trafico negreiro. Assim surgenos dois como almoxarifes (Alvaro e Gaspar Dias), outro como contador (Darnião Dias) e dois envolvidos no trafico negreiro (Francisco e Vicente Dias). Também aqui esta comunidade judaica era por demais evidente, o que terá levado António Correa de Sousa, o capitão da cidade da Ribeira Grande, a afirmar que a Guiné estava uperdida, por cauza desta ilha e guiné estar coalhada de christãos novas que levam para lá muitas mercadorias, que se deve ao corregedor que os traz tão favorecidoip (3 1). Por isso não será dificil enquadrar a figura de Francisco Dias nesta comunidade de cristãos novos das ilhas. Note-se que é sintomático o facto de o mesmo não fazer no testamento qualquer referencia aos seus progenitores. Não é conhecida a data em que Francisco Dias se fixou em Santiago, todavia é pouco provável que seja o mesmo que em 1513 surge a declarar ao alrnoxarife duas peças, avaliadas em dez mil réis, que trouxe no navio aconceição~,armado por Rui (27) Sobre a intervenção dos cristãos-novos neste comércio veja-se Jose GONÇALVES SALVAWR, OS crista-novos e O cowzércio no Atkãntim rnedional S. Paulo, 1978,págs. 1-36; idem, Os magnatas dos tráfico negreiro, S. Paulo, 1981. (28) Confronte-se nosso estudo O com~rciointer-insular. séculos XV e Funchd, 1987, págs. 167- 168.

(29) bidem pág. 177. (30) Rodrigo RODRIGUES. "Nutícia biográfica do Dr. Gaspar Frutuoso", in Livro prinzeiro das S a a e s da Terra, Ponta Delgada, 1966, págs. XV-CXW; Confronte-se António Ferreira de SERPA, Suum Quique (...), Porto, 1925; e Maria Ana M. G. Borges COUTINHO, "Cristãos-Novos nos Açores. O caso de Gaspar Dias", in Boletim do Instituto Nkrórico da iiha Terceirq vol. XLV, tomo I, Angra do Heroismo, 1988, pá@. 625-664. 21) Citado por J. de Senna BARCELLOS, Subsúiios paro a Histbrin de Cabo Ver e e mine 1. parte, Lisboa, 1899,pág. 120.

k U A DA MADERA E O TRAFICO mGRElRO

345

aja coincidência, então, teremos a fazer comércio nestas paragens, cisco Dias estava no trafico com a o os cargos de memposteiro mór do alrnoxarife um meio mais para reforçar ctos com a costa africana eram ompanhia de outros, como Lupo lves e Manuel Aragão, por interAntónio (35), ou, indirectamente, por iniIhercadores, como sucedia com Diogo Fernandes (36)

Francisco Dias, a exemplo dos demais nde, estivesse integrado na rede de trato com a Costa da Guiné, como mercador e armador. e de negocios, o Verde e Ma. Aqui estávamos uavarn, por exemrrpdes. Este João Alvaro Fernandes, ando se encontrava em missão comercial ando os seus negócios entregues ao tio. co o s contactos com os mercados nesentavam-no Manuel Diogo Cavalheiro no importante das suas operações era de alguns madeirenses (João Gonçalias) poderão indiciar um activo trafico negreiro. produtos de troca consistiam em nmiudezasu e e

tónk Geral de Cabo Verde, corpo docadmei~ta[vd 11, págs. 62, 121,

~ck!

(33) NZo era caso único, o mesmo sucedendo com Almro Dias, h o x a n f ~veja-se Iva Maria Ataide V. C m t u , "A fazenda real, carn o ~adi~õe entre r a coroa e os moradores de Santiqo. o exemplo de &varo Dia dmoxarife da Ribeira Grande, na la metade do seculo XW",in Mugma, nQ 5-6, Fogo, 1990-, págs. 34-36. (34) Organkmu várias expediçEes à Costa da Guiné, algumas delas de parceria com Rui Pereira, confronte-se Hisfória Geral de Cabo Verde. corpo documental t. H, págs. 57-58, 91, 93, 126-127, 163. (351 Era habito o uso pelos mercadores de escravos ara os auxiliarem nas operaçoes da costa africana. &ta situaqão resultava das Ecilidades no contacto com as gentes africanas, erce do conhecimento da língua e da geografia da área. (36) Parece-nos haver vários com o mesmo nome, sendo um vizinho da Terceira, que em 1514 armou um navio para as partes da
panos da produção local ou importados da Bretanha, que se trocavam por escravos. O seu testemunho é extenso testemunho da sua vivência de negreiro em Cabo Verde, não sendo esquecido o mais ínfimo pormenor das operações comerciais. A partir dos empréstimos, dívidas e doações é possível reconstituir parte da sua fortuna, avaliada em mais de três miihões de réis. Ele enuncia 9 devedores, que totalizavam 105$050 réis assim distribuídos: DEVEDORES Diogo Garcia Fenião Gomes Gaspar Soares Juiz dos orfaos

Lopo Fernandes Manuel Lopes Martirn Albernaz Pero Vaz Rui Dias Simão de Oliveira Salvador Alvarez

OBSERVAÇÕES

REIS

criado de B. Esteves

Madeira corretor almoxarife

TOTAL

135$650

A isto associam-se alguns créditos recentes, resultantes de operações comerciais em curso na Costa da Guiné, Antilhas e Madeira, o que denota estar o mesmo em plena actividade quando caiu doente: NOME Álvaro Dias Antonio Gonçalves Jerónimo Mendes João Gonçalves Jorge Fernandes Mariscai Diogo Cavalheiro

LOCALIDADE

S . Domingos

Madeira Ra Grande Honduras

VALOR

686 35$000 25$000

pesos réis

im$or>o 951$000

700

pesos

347

D A ~ E r S ~ O M E G R E I R O

além dos seis escravos ao seu serviço em

declara auttos vinte e quatro, em dívidas trato na Costa da Guiné e Honduras.

4 WGas

i bixaguo

cunhado Madeira Terceira

680 pesos

85$000 1O$rxn> 22$250

AGRACIADOS

OBSERVAÇÕES

Álvaro Fernandes Andrk Ferreira Antonio Gonçalves Beatnz Álvares Beatriz hvares Isabel Álvares João Femandes Florença Misericórdia

sobrinha e filha de.. Madeira tes~amenteiro

VALOR

irmã

filhas de... irmã sobrinho escrava Ra Grande

Orfãos (10)

Se da R" Grande

TOTAL

ornamentos

2332$000

Francisco Dias morreu no Outono de 1559 deixando um vazio nas suas operações comerciais. Entregou tudo nas mãos do seu testamenteiro a quem incumbira de encerrar as suas contas, não deixava descendente para dar continuidade as suas operações. Mas outros rnadeirenses seguiram o seu encalço, afirmando-se com destacados intervenientes do contrabando de escravos para as colónias castelhanas. No século dezassete as terras ocidentais galvanizaram todo a atenção, tornando-se no principal pólo de animação da vida comercial do Novo Mundo. Mais uma vez a Madeira e as suas gentes são activos protagonistas (37).

(37) Como poderá ser testemunhado nos estudos de Enriqueta VILAVILAR,

His nu-America v e1 comercio de esclavos, Sevilla, 1977, pág. 17% Alberto VIEIRA, 0 s~ c r a m no a,uipéhgo & Madeirq Funchd, 1991, págs. 46-47.

r

ILHA DA MADEIRA E O TRAFICO NEGRURO

I

APÉNDICEDOCUMENTAL

(JSCO D

~ ZNATURAL , DE MADEIRA QUE FALECE0 NO CABO

Santiago, 23 octubre 1559 por graça de Deos Rey de Portogal e dos dgarves maar em f i c a senhor de Guine e da comquysta rcio dethiopia Arabia Persia e da India pera todolos ores provedores de minha fazenda e de fazenda dos es e justiças oficiaes e pessoas de meus Reinos e seus &ta minha carta testemunhavel com ho t r e h d o de hum mostrado e outros com dito pertencer. Saude. r que a mim enviou dizer por sua petição Johã Feriiadez Francisco Dias escrivão que foy dos comtos e almoxarifado e ja defuto que o dito Francisco Diaz deixara por seu m o ha Antonio Gonçalvez morador na ilha da Madeira pera o ra necesario o treilado do dito testamento do dito Francisco orne lho mãodase dar nesta carta testemunhavel pera ho dito Antonio Gonçalvez ha ilha da Madeira no que lhe faria merce. E vemdo e ao que ele asy pedir me enviou mãdei que o das fazendas dos defuntos destas ilhas ouvese vista a que e semdo e temdo respondido rnãodei que me fose (. ..} e renunciei por meu desernbargo que o testamento se poderia se e me tornase conta ao que o satysfes asy certo prenunciei de eilado que pello que mãodei se trelladase aquy todo de verbo o cujo treliado he ho seguinte. Nome de Deos Amem e qoantos esta çeduila de testamento que no anno do nacimento de Noso Senhor Jeshu Christo de mil @)bentae nove annos aos vinte he dous dias do mes doutubro do dito %mo nesta ilha de S W Tyago na cydade da Ribeira Grãode nas pousadas de Francisco Dias escrivão dahoxarifado e morador da dyta cydade btando hele doente em cama em todo seu siso e entendimento que noso Senhor Ihe deu mãodou chamar ha mim Duarte Roiz e me dise e mgou que fie firese este testamento pera nele declarar sua derradeira vtítade de comas de sua consiencia o qual testamento he o seguinte. Dise que se Noso Senhor por servido de o levar desta vyda presemte desta doença de que hora estava enfermo ele encomendava a sua alma a noso Senhor Deos que a fez deixa huma cousa (?)e a nosa Senhora a virgem Santa Maria que ka tenha por bem de rogar hao seu bemto pelo Noso Senhor Jeshú Christo que a queria levar ha sua sarnta gloria pera honde foi levada amem.

ALBERTO VIE.iRA

Dise que sendo caso que hele faleça desta enfermidade que era por bem que seu corpo seja sepultado em Nosa Senhora da Concepção dentro na igreja ha rnao direita detras da porta e haa por bem que o dia de seu enterrarnento se ouver tempo e se não ha houtro dia ihe digão hum oficio de nove iliçõcs ofertado com hum saquo de farinha e hurn quarto de vinho e ao dito oficio estarao todos os padres que nesta sydade ouver e os mais que a ele quyserom estar e ser%pagos ha custa de lhe darem esmolas. Dise mais que pedia aos senhores do cabido que todos acompanhassem seo corpo ate ser enterrado e lhes mande dar esmolla pello dito acompanhamento dez cruzados. M%da que por sua alma se digão cem misas rezadas ha omrra das cinquo chagas que Noso Senhor recebe0 na arvore da Vera Cruz pellos pecadores e outras cinquo lia omrra de Nosa Senhora de ComcepçãIo queira ser sua a avogada diante de seu fiho por sua allma. que Mãoda que de sua fazenda ha casa de nosa Senhora de Concepção desta cydade dez cruzados pera ajuda de sua cera. Mãoda que de ha confraria do Santissimo Sacramento outros dez cruzados pera ajuda da cera da dita confraria. Mãroda que se de ha casa da Santa Misericordia desta sydade trinta d reis e que sejão pagos logo. Dise hele testador que hele nao he casado nem nunca ho foi e que a o tem pai nem mai nem filho nem filha nem houtro nenhum herdeiro pra sy que sua fezemda aja de herdar e por asy ser hele hordena e despemde sua fazenda desta maneira seguinte. Dise que hele tem em poder de Jorge Fernandez Alrnoxarife de sisa dos pannos dallfandega da sydade novecentos mil reais os quoaes ele testador lhe remeteo por hua letra pasada por Duarte Roiz sobre Pero Pardo. Dise mais que erh poder do dito Jorge Fernandez esta mais cinqoenta e hurn d que hele Ihe remeteo por hua letra pasada por Jacome Fernandez sobre Jeronimo Cajado. Dise que Lopo Fernandez irmão do dito Jorge Fernandez lhe deve por hum asinado seu trinta e tantos mill reais. Dise que hele tem em poder do Mariscall Diogo Cavalhero vizinho de desa villa setecentos pezos os quoais ihe trouxe Rodrigo de Sallinas de Humduras e estes ihe escreve0 dito Maryscall que estão na Casa da Contratação. Dise que em p d e r do dito Mariscd estão duzentos e vinte e s e i d maravedis que lhe remeteo Luis de Mercado de seis peças que daquy ihe rnaodou na mão de Gramilho. Dise que tem mays em poder do Maryscall de resto de huum escravo R.I., 1995, nP 204

A ILHA DA MADEIRA

E O TRAFICO NEGREIRO

Perez pilloto vinte e tantos mill reais ou ho que sua o mais lhe cõprou e gastou em voz e licenças. em poder do cõtador de Sãto Domingo e de Alvaro oatro peças (...) por carta que são seiscemtos e oytenta

oail dinheiro pera der ir ha mão do M q s c a l l ou ho ter carta que estava carregado em seu navio de dor em Vylla Nova. em poder de Antonio Gonçalvez tratador trinta e os quaes lhe mãodou tres cailabrestos e certas varas hele disse que lhe resta ht dever se cobrara de sua em que foi Llopo Fernandez em que hele testador

certas miudezas pera se venderem as quoaes avia erro mãodou que ho que quer que montaase cobre.

em poder de João Gonçalves morador na ilha da Madeira tantos mil1 reais ou aquiilo que por seu liivro se achar e tem tres qyntaes e meio de cera e asi lhe remete0 que Jeronimo Mendez que desta ilha vinte e cinquo mil1 reais avia de entregar Francisco Afonso e asy emprestou hele to Francisco Fernandez tres rnill reis que avia de dar ao onio Gonçalvez e asy ihe tem o dito Antonio Gonçalvez huurn e que hele tem em Giné o seguinte, no navio de Manoell daragzío

-

aliabretos que o mestre João Roiz Ieva a seu cargo, e tem mais tas e sessenta varas de C..) que leva o negro Antonio pera ha Diogo Fernandez das quoaes a metade he o retorno de or Alvarez a hele testador lhe deve a outra arnetade e posto que que ihe deve ha outra metade diz que as duzetas he trinta ihe prestou Gravyell Nunes que mãodase lhe paguem. Dise que Diogo Fernãodez do Rio Grãode lhe deve dous escravos que o dito Antonio seu escravo hade arrecadar. Dise que Basta0 Visente e Simão Vicente que andão Bastiso Mendez ihe deve huurn escravo de huma ncomenda que lhe levou a fora outras que tem por seu rol1 em seu llivro. Dise elle testador que mãoda he quer e haa por bem que se de a duas sobrinhas suas filhas de Beatriz Allvarez sua irmãa mays velha mill cruzados que sã mãoda quese cobrem delle. Dise hele testador que hele quer e haa por bem que de sua fazenda se tomem corenta mil1 reais nesta iiha os quoais serão pera se comprar em huurn ornamento pera a see desta sydade ou serão pera ajuda da see nova do feytyo della e sera destas duas cousas quoall ho senhor bispo dom Francisco quiser e melhor lhe parecer e que os ditos cem

352

ALBERTOVLEIRA

cruzados se gastem porque ho que hele ordenar destas duas cousas hele testador ha asy por bem. Dise que hurn rnãocebo por nome Garcia ~ernãodezcriado de Diogo de Crasto lhe deve trinta cruzados que lhe emprestou mãoda que se

cobrem dele. Dise que Pero Vaz corretor Ihe devia trinta e nove mill e cento e cinquo reais como se veraa por seu livro do dito Pero Vaaz mãoda que se cobrem dele. Dise que hele não he ilembrado que deva a nenhua possoa cousa allguma e porem se allgurna pessoa mostrar ailgum certo llyqydo per que ele deve allgurna çousa mãoda que os pagase. Dise mais que hele deixa nesta testamento trinta mill reais ha Misencordia desta sydade mãoda que se sejão cem cruzados que são mais dez miü reais que dhodo vinte rniil reais por sy que seja forra e asy ha porbem de lhe forrar dous pellos que a dita negra tem que em casa Lhe nacerão ha macho e ouka fernea. Dise que devia a Sailvador Alvarez mais dous mill e quoatrocentos reis mãoda que hos dem. Dtçe que o Juiz dos orfãos Ihe deve ha cabre que ihe vendeo por quinze mil1 reais e allem disso lhe deve mays oito mil reais, digo oito mil1 e qynhentos reais e ele ihe deve ao dito juiz dos orfãos o que parece por ha mãodado do senhor corretor de frete e quoartos e vinte nas que pegou a Diogo Nunez que terão de seu sobrinho que deos aja a nesta parte mgoda que se lhe page. Dise que hele he encargo ao genro dolirn Pedro e dom miü he tantos reais e que Diogo Barrosa sabe quem he a mãoda que de sua fazenda ihe sejão pagos. Dise que devia ha capitoa da ilha da Madeira vinte e dous mil1 e duzentos e cinquoenta reais de resto doque lhe devia mãoda que lhos pagem. Dise que Ihe devia Ruy Dias dmaxarife dous mil reais Pedro Monteiro da ilha do Fogo. Dise que lhe devia Gaçpar Soares seis mil e tantos reais manda que de ha molher de Simão doliveira catorze miil reais silicet seis que ihe arrecadou dez e João Fdeyro e oyto que lhe hele daa mais. Mãoda que sua fazenda se partão cem mill reais opor cinqo orfãos pera ajuda de seus casamentos a vinte mil1 reais cada hum e serzo a contente de sua irmãa Beatriz Alvarez tomão direito e parecendo seos Antonio Gonçalvez que por servyço de Noso Senhor lhe dara dos orf%os e não naturaes da dha da Madeira. Mãoda que se diga hurn oficio comprido de nove liições na ilha da R I., 1995, n9 204

w pai e de sua mai ofertado com hum quoarto

escravos hti por nome Antonio que he em de que em Portugd os quoaes forros deste dia pera todo sempre poquoanto

m huua escrava sua por nome Florença mãoda duzentos cada huua pera seos casamentos OS seja0 dados por m8o de Antonio Gonçalves amentos sejão alli do contento da dito Antonio Gonçalvs que lhe pede que a Senhor e p d a confiança que tem e sua

hde he encargo ha dita sua irmaa Beatriz Alvares em se os m o tem ele deiira ha outra sua irmãa por nome Isabeii Alvarez cruzados os quoais sem asy pera ajuda do casamento de emedio de sua vyda e pobreza. Fernandez seu cunhado oytenta ficamo elygydos da fazenda de fdeceo os quoaiç oitenta e ele Ihos tem mãodado dar mmda que se lhos não tem reais a qual he moradora

da Madeira mãoda que hos de. que dez d reais e que

Dise hele testador que na ilha Terceira na cydade de Angra vive h homem omrrado por nome Moraes orne omrrado o q u d seu pai ou seu arroo £aieceo nata no amo de vinte e oito ou vinte e nove e tinha outra fazenda em poder de Martim Ailbernaz o quad ja hele testador veio da ilha Terceira para o arrecadar e lhe parece em sua conciemcia que Ihe pode ser em encargo ate dez mili reais moda que Ikos dem. Diçe h& testador que do remanecente de sua fazenda &que se de has ditas suas duas sobrinhas pera da dita sua irmãaa Beatriz Alvares a l h do que lhe doixa d cruzados mays qynhetos a cada huua pera seos casamentos.

354

ALBERTO V E E U

Dise que ha outra sua sobrinha filha daiivaro Fernãodez mzoda que aliem do que ihe deixa ihe deixe mays duzentos e mai ou com eles o qyserem partyr. Dise mays que do dito remanecente da dita sua fazenda pella mesma maneira maoda que na dita iiha da Madeira se casa mais dez orfãas ornrradas e naturaes da t e m que o ajão mister e ihes darão duzentos mili reais, vinte mill reais ha cada huua e sera c6 a propria declaração que das cinqo o r f sejm ~ de fazer. Dise que depois de caprydos seus liegados nesta iIha rnaoda que se fação todo ko remrtnwnte que lhe ficar perde a seu testamenteiro que abaixa declara que Iha faça ir ha ilha da Madeira a mar0 de Antonio Gonçalves a quem h& d&a vinte mili reais por seu trabalho. Dhe que h l e deixava a huum Andre Ferreira da Madeira doze mili reis p - aajuda de suas- necesydades. Dise que todo ho rnays que rernanecer de sua fazenda mãoda que depois de tudo coprido o que asy doclara e mãoda que se faça querer haa por bem que pouco ou meryto se dee ha Misericordia da ilha da Madeira da sydade do FunchaU. Dise que toda a fazenda que tem em Portogall como tem declarado neste testamento mãoda que se pase ha ilha da Madeira ha mão do dito Antonio Gonçalvez pera compryr seu Ilegados e asy tera cuidado de cobrar tudo aqyllo que neste testamento decliara que ele deve em Castelia pera se comprir seus Uegados. Diçe que todo ho movell de seu scilicet, leito e cortinas e cama e roupa de linho e caixas e toda Uouça e mesas he cadeiras que em sua casa ouver que se de a Johana Wopez por serviço que ihe tem feito. &e mays que em poder de Manueii Llopos que ora estaa nesta ilha tinha huua encomenda que lhe deo de oito mili reais mão da que se arrecade a dita encomenda. Dise que Johã Gdzo tem seu escravo que hele deixou forro tem em sua casa ha menino macho seu filho msoda que seja forro que asy ho haa por bem. Dise que Fernaão Gomes criado de Bernddim Estevez lhe deve d o u mil1 reais que ihe emprestou m o d a que se cobrem deile. E feito asy o dito testamento como acima e a t m parece todo respeito por Duarte Roíz em estas cinqo folhas que s%o dez laudas como estas ele dito Francisco Diaz testador estando em todo em siso e entendimento comprydo que a Senhor Deos ihe deu adoentado corpo deytado em haa cama suas pousadas nesta dita cydade de São Tyago por hele testador foy dito a mim escripvam ao diamte nomeado em presença das testemunhas hão diãote escritas que hele fazia seu testamenteiro ao dito Duarte Roiz em esta ilha porqoanto hele testador não tem herdeiro

1 !

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DA MADEIXA E O T M C O NEGREIRO

$i dito $e t

ele 10 €

355

aja de herdar na fazenda e Ihe pede he roga r amor de Noso Senhor ele qeyra aceptar cumpra este dito testamento inteiramente 1Ia sua quoando Deos for servido o levar e verdade me requere0 a mim tabeliam ihe acabase ento e lho aprouvase e pede e roga a todalias Senhor e eclesiasticaç lhe cumprão he fação comto testamento como se nele contem porque hele asi outorgou e aqui asinou e eu escrivão de mou oficio ne testamento seu oje vinte he tres dias mill e qynhentos e cinquoenta e nove anos e em fé rovaçao encerramento deste testamento escrevi. que for30 presentes Johã Marquez e Diogo Llopez Graviel Nunes e Vicente Femodez e Pero Llopez e e moradores nesta cydade e Gaspar morador em viila da Praia e eu Gaspar Fernandez das notas e judicial1 por ERey Noso Senhor nesta de e seus termos que este estrornento inei de meu publico sinaii % Marquez Graviel Nunez

dado asy o dito testamento como dito he por o dito Johão me foi pedido Lhe mãodase daar o treilado asy como pedido ue lho mãodei pasar e mando que lhe seja dado em todo he a fee e credito como se fora o proprio e originali do qual o quoall fica em poder do escrivão que esta for e se lhe e vai acresentado como ho o curnprio asy dada nesta sydade de São Tiago do Cabo verde aos he quatro dias do mes de Fevereiro Ell Rey Noso Senhor o rnãodou pelb doutor Luys Martinez evangelho doseu desembarguo que ha estas partes veio a prover nas cousas da justiça e fazenda corregedor com allçada provedor e contador de sua fazenda e povoador dos Resydos capellas e espritaes e provedor das fazendas dos defuntos em todas estas ilhas do Cabo Verde a fez anno do nacimento de Noso Senhor Jeshu Christo de rnill e quynhentos e sessenta amos e vai treslladado em dez folhas com esta pregou deste e dos autos que se fizerao por que dele se pedio quatrocentos reais e de asinar vinte reais. Doutor Lluis Martinez evangelho Açertado comigo tabeliam Pero Roub%o.Concertado com ho proprio Amador dalipoym pagou de sello corenta reais Amador dallpoim hhão Fernãodez.

ALBERTOVIEIRA

Foi comsertado este treiiado com houtro que esta em carta cestemunhavel que veyo de Cabo Verde que ficou em poder de Antonyo Guomsalvez por mim com ho tabailyam abaixo asynado não faça duvida no asertado em antreiiynha que diz haos duas porque se fez por verdade oje vinte e trez dias do mes dabriil de mil quynhentos e sesenta anos Pero Llopez trabaliyarn ho escrevy. Manuel1 Diaz Pero Lopez ARM. Misericordia do Funchal leg. 684, fols. 785-790v.

The paper reveab the imprtant exteiqr to ivhich the isiand of Madeira sustained frade relarions in grains and bhck slaves ivirh both neighboring archipelagos and farther uiva? ones since the 15th century. The evdence to this effect undermines the received, ivell-knaivn tkesiç thar Madeira had only trade relaíwns with the Oid World until rhe 17th centta?, and ivith the Netv WorU from thar time opiwards.

R. I., 1995, nQ204

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