60 ABUSO DE INCAPAZES
_____________________________ 60.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO CRIME A descrição típica está no art. 173 do Código Penal: “Abusar, em proveito próprio ou alheio, de necessidade, paixão ou inexperiência de menor, ou da alienação ou debilidade mental de outrem, induzindo qualquer deles à prática de ato suscetível de produzir efeito jurídico, em prejuízo próprio ou de terceiro.” A pena cominada é reclusão, de dois a seis anos, e multa. O bem jurídico protegido é o patrimônio, especialmente o das pessoas incapazes e menores. Sujeito ativo é qualquer pessoa que realizar a conduta descrita no tipo penal. Sujeito passivo é o menor, o alienado ou o débil mental.
60.2 TIPICIDADE 60.2.1 Conduta A conduta típica é induzir o sujeito passivo a praticar ato capaz de causar prejuízo a ele ou a outra pessoa. Induzir quer dizer fazer nascer na mente de alguém uma idéia, uma vontade, um pensamento. Induzir à prática de um ato é conduzir o outro a realizar alguma coisa. É convencer o outro a fazer alguma coisa. O tipo exige que o induzimento se faça com abuso, o que significa seja feito de maneira reprovável, prevalecendo-se o agente da situação pessoal da vítima.
2 – Direito Penal II – Ney Moura Teles
60.2.2 Elementos objetivos e normativos O sujeito passivo deve ser menor, alienado ou débil mental. Cuida-se do menor de dezoito anos. Alienado mental é o débil mental, o deficiente psíquico. São pessoas que não têm, em virtude da doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto ou retardado, a plena capacidade de entendimento ou de determinação. Assim os idiotas, os imbecis, os oligofrênicos. Para realizar o tipo o agente, em face do sujeito passivo menor de 18 anos, abusa de sua necessidade, paixão ou inexperiência ou, então, do estado mental do sujeito passivo que seja débil ou alienado mental. Cuidando-se de vítima menor, é necessário que se verifique que o abuso tenha efetivamente decorrido também da situação em que ela se encontrava, de necessidade, paixão ou inexperiência. Se o menor é, contudo, pessoa com alguma experiência de vida e que não esteja sob o domínio ou influência de estado passional, ou atravessando uma situação de necessidade, não há tipicidade. Quanto ao débil ou alienado mental, a norma não exige essa situação de menor capacidade de resistência, presumindo-a. O agente aproveita-se da situação psíquica da vítima para fazer nascer, na mente dela, a vontade de praticar o ato capaz de prejudicá-la ou a outrem. Sem a plena capacidade de discernimento ou de determinação, o sujeito passivo, induzido, realiza o ato pretendido pelo agente. Esse ato deve ser capaz de produzir efeito jurídico em relação ao patrimônio da vítima ou de terceira pessoa, com potencialidade para causar prejuízo, cuja ocorrência não é indispensável para a caracterização do crime. Atos nulos como a venda de imóvel por pessoa absolutamente incapaz, segundo a lei civil, por não produzirem qualquer efeito, não configuram o crime, mas os atos anuláveis, sim. Quando o ato praticado pelo sujeito passivo resultar em vantagem a que o agente tinha direito, o crime será o de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP).
Abuso de Incapazes - 3
60.2.3
Elementos subjetivos
É crime doloso. Além de estar consciente de que induz a vítima a praticar o ato potencialmente lesivo, deve o agente conhecer o estado da vítima e o abuso que comete, e agir com vontade livre e com o fim de obter proveito, para si ou para outrem. Ausente a consciência de um dos elementos do tipo, há erro de tipo, excludente do dolo e, portanto, da tipicidade.
60.2.4
Consumação e tentativa
É crime formal, consumando-se no momento em que a vítima pratica o ato capaz de causar prejuízo, não se exigindo a obtenção efetiva do proveito por alguém. A tentativa é possível quando, antes de praticar o ato, a vítima é impedida ou, por qualquer razão, o ato não se concretiza.
60.2.5
Conflito aparente de normas
O art. 106 da Lei nº 10.741/2003 definiu como crime a conduta de quem “induzir pessoa idosa sem discernimento de seus atos a outorgar procuração para fins de administração de bens ou deles dispor livremente”, cominando pena de reclusão de dois a quatro anos. Idosa é a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos. Exige o tipo que ela não tenha discernimento de seus atos, isto é, que não tenha a plena capacidade de entender as conseqüências de seus atos da vida civil. Embora a norma não mencione o abuso exigido pelo tipo do art. 173 do CP, é óbvio que ele está ínsito na conduta, em face da incapacidade de discernimento da vítima. Essa norma não exige que o idoso seja alienado ou débil mental, bastando a idade e a menor capacidade de discernimento.
60.3 AÇÃO PENAL A ação penal é de iniciativa pública incondicionada. É condicionada à representação do ofendido que seja o cônjuge judicialmente separado, irmão, tio ou sobrinho com quem o agente coabita (art. 182, I a III, CP).