Sobre A Morte E O Renascimento

  • June 2020
  • PDF

This document was uploaded by user and they confirmed that they have the permission to share it. If you are author or own the copyright of this book, please report to us by using this DMCA report form. Report DMCA


Overview

Download & View Sobre A Morte E O Renascimento as PDF for free.

More details

  • Words: 10,329
  • Pages: 14
Entre a Morte e o Renascimento Este artigo, escrito por Yoichi Kawata, Vice-presidente da Soka Gakkai, foi publicado em três partes. A versão completa apareceu pela primeira vez sob o titulo de "Budismo e Ciência Médica: Para o Estabelecimento de uma Perspectiva Correta da Morte e o Renascimento" (Buppo to Igaku: Shieseikan no Kakuritsu no Tame ni) no periódico Kyogaku Kenya Koza, vol. 6 (Instituto de Filosofia Oriental de Tokyo, 1.985).

PRIMEIRA PARTE: ATRAVÉS DA BARREIRA DA MORTE. Explicações provenientes do Kusha Ron O que experimenta o "eu" subjetivo, que imagens se desenrolam diante dele à medida que se aproxima da barreira entre a vida e a morte? No Mundo Ocidental, além dos aproximadamente 150 casos estudados pelo Dr. Raymond A. Moody (1), há informações de muitos relatos semelhantes relativos a experiências que acontecem ao aproximar-se o momento da morte. Entre os casos estudados pelo Dr. Moody, encontramos os seguintes relatos: "O primeiro que aconteceu, e muito rapidamente, foi que passei através dum vazio muito obscuro a uma alta velocidade. Suponho que poderia ser comparado com um túnel. Sentia-me como se estivesse numa montanha russa num parque de diversões, atravessando este túnel a uma velocidade tremenda" (2). "Encontrava-me em meio de um vazio totalmente obscuro. É muito difícil de explicar, mas sentia-me como se estivesse me movimentando no vazio, passando através da escuridão. Ainda assim, encontrava-me totalmente consciente". (3) "...entrei de cabeça numa passagem estreita e muito, muito escura. Tinha a impressão de que apenas podia passar por ela. Comecei a deslizar-me para baixo, baixo, baixo". (4) O Dr. Kenneth Ring tem chamado tais impressões de "entrada na escuridão", uma etapa que descreve como "transição entre este mundo e o que for que houver além". (5) Entre os registros dos casos clínicos do Dr. Ring lemos, por exemplo, a seguinte descrição: "Era como de noite. Estava escuro mas era como, como (pausa), como o céu escuro. Espaço. Escuridão. E não havia nada ao redor. Não havia estrelas nem nenhum objeto ao redor". (6) Recentemente, começou-se a informar a respeito destas experiências no Japão, e seu conteúdo parece ser bastante similar. As seguintes citações foram tomadas do livro "As Frases da Morte" (japonês: Shi no Issogaku) de Yoshimoto Takaaki. "Embora já encontrava-me envolto na escuridão, sentia-me como se estivesse caindo por um buraco ainda mais escuro". "Sentia-me como se estivesse voando através do espaço no qual não havia nada, somente uma completa escuridão". "Fiquei totalmente envolto na escuridão. E tinha a sensação de que estava sendo atraído para uma escuridão ainda mais profunda, como se estivesse num elevador". "Era uma sensação apavorante. Encontrava-me num lugar frio. Como uma passagem ou túnel subterrâneo". A experiência de aproximar-se dessa barreira, literalmente "o ponto sem retorno", durante a transição da vida para a morte ou da consciência para a inconsciência significa, em termos científicos, que devido à morte cerebral a vida aproxima-se ao estado de morte biológica ou celular. As imagens que surgem neste momento podem descrever a paisagem interior de uma vida que desce de níveis conscientes a inconscientes. Talvez podemos afirmar que são manifestações do processo mediante o qual a energia psico-somática, que tinha se manifestado até esse momento nos cinco componentes de forma, percepção, concepção, volição e consciência (7) entra em estado latente, passando do âmbito da sexta consciência e da consciência “mano” ao da consciência “alaya” (8). As imagens descritas durante as experiências que acontecem ao aproximar-se o momento da morte parecem corresponder ao começo do que chama-se no Budismo "a viagem através da existência intermediária" (japonês: tyu-u) (9), que dizer, o intervalo entre esta existência e a seguinte.

Embora aqueles que têm sobrevivido a uma experiência no limiar da morte para contá-la não atravessaram, no fim das contas, a barreira que separa a vida da morte, a viagem através da existência intermediária continua além do momento da morte, adentrando-se profundamente no mundo que existe além da mesma. Este processo pode incluir uma expedição ao âmbito interno da vida, quer dizer, ao universo psíquico. O volume 8 do Kusha Ron (sânscrito: Abhidharma-koshashastra), um tratado escrito pelo erudito budista Vasubandhu, do século IV ou V, explica a existência intermediária como segue: "Os cinco componentes, tal como existem entre as duas etapas da vida e o renascer chamam-se 'existência intermediária'. Não chegou ainda ao seu destino portanto, não pode dizer-se que tem nascido. Depois da etapa da morte e antes do nascimento, quer dizer, durante o intervalo entre ambas, surge uma existência que possui um corpo para movimentar-se para o lugar onde renascerá". Portanto, "existência intermediária" indica o intervalo de tempo entre a morte e o renascer. A vida, tal como existe durante este intervalo, é chamada "corpo provisional", o qual, segundo se afirma, consta dos cinco componentes. A "existência" a que se faz referência nesta passagem do Kusha Ron indica os cinco componentes. Porém, os cinco componente do corpo provisional diferem dos que formavam o indivíduo enquanto estava vivo. De acordo ao significado que indicado aqui, o termo parece referir-se à energia latente dos cinco componentes que se manifestarão na seguinte existência. Desde o ponto de vista do Mahayana, poderíamos afirmar que referem-se às “sementes" dos cinco componentes armazenadas na consciência alaya. O componente "forma" que a vida possui na fase da existência intermediária se conhece como "corpo sutil" e afirma-se que possui olhos e outros órgãos dos sentidos. O Kusha Ron e o Daibibasha Ron (sânscrito: Abhidharma-mahavibhasha-shastra), um tratado do século II, descreve detalhadamente o "corpo provisional", ou a vida na etapa de existência intermediária. Aqui gostaria focalizar os nove aspectos da existência intermediária explicados no Kusha Ron. 1.- Visibilidade: No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "O corpo provisional é visível só para outras existências intermediárias do mesmo tipo. Se uma pessoa obtém, mediante um esforço tenaz, o mais puro olho divino, será capaz de vê-lo. Mas o olho com o qual temos sido dotados pela natureza não pode discerni-lo devido à extrema sutileza desse corpo". Esta passagem explica que o corpo provisional é extremadamente sutil; portanto, não é visível pelo olho comum. Porém, as existências intermediárias podem ver-se umas às outras e afirma-se também que os seres humanos que obtiveram uma visão clarividente ou outros poderes semelhantes podem vê-las. No que respeita ao fato de que as existências intermediárias podem ver-se umas às outras, no volume 17 do Daibibasha Ron afirma-se o seguinte: (a) Entre as existências intermediárias dos Seis Caminhos, aquelas que encontram-se num caminho particular podem ver às que estão no mesmo caminho. Por exemplo, as existências intermediárias que encontram-se no estado de inferno podem discernir a outras que se acham no mesmo estado; as existências intermediárias que encontram-se no estado de Alegria podem ver todas as existências intermediárias que acham-se no mesmo estado, e assim sucessivamente. (b) Além disso, as existências que encontram-se nos Seis Caminhos podem perceber às que encontram num estado inferior. Quer dizer, aquelas que se encontram no estado de inferno só podem ver às outras existências intermediárias que acham-se no mesmo estado, mas aquelas que encontram-se no estado de Alegria podem ver todas as existências intermediárias que acham-se nos Seis Caminhos. 2.- Poder para movimentar-se. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "A existência intermediária, esta dotada do poder sobrenatural, derivado do seu carma, de viajar com a máxima velocidade. Nem sequer os Budas podem detê-lo, devido a que está investido do poder do carma. Esta passagem explica que, devido à força do seu carma, o corpo provisional pode movimentar-se livremente através do espaço e nem sequer um Buda é capaz de detê-lo. 3.- Possessão de órgãos dos sentidos. No volume 9 de Kusha Ron afirma-se: "As existências intermediárias estão, em todos os casos, dotadas dos cinco órgãos dos sentidos". Estos órgãos dos sentidos são aqueles possuídos pelo "corpo sutil".

4.- Capacidade de atravessar qualquer obstáculo. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "O corpo provisional é coextensivo. Nem sequer um diamante é impenetrável para o corpo provisional. Portanto chamase-lhe coextensivo". Como o movimento do corpo provisional não pode ser bloqueado nem sequer por algo tão duro como o diamante, diz-se que não pode ser obstruído. Quer dizer, que pode passar livremente através da matéria mais densa. 5.- Destino imutável. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "Uma vez que surge o corpo provisional, destinado a um certo renascimento, nenhum poder pode desviá-lo desse destino. Uma existência intermediária humana não deixará de ser tal para converter-se numa existência intermediária de nenhum outro tipo. O mesmo é certo com respeito às existências intermediárias dos outros caminhos. O corpo provisional existe com o fim de movimentar-se para seu destino e somente pode movimentar-se nessa direção, nunca outra. Esta passagem indica que as circunstâncias nas quais renascerá a existência intermediária já estão determinadas pelas suas ações de existências anteriores. Por exemplo, se enquanto estava viva uma pessoa tem criado o carma para renascer no estado de Tranqüilidade, só poderá renascer nesse estado e não no de inferno ou qualquer outro. Depois da morte, nenhum poder pode alterar seu destino cármico (com exceção do poder das orações oferecidas pelos falecidos, que serão explicadas depois). 6.- Uso de odores como alimento. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: Alimentam-se ou não as existências intermediárias no mundo do desejo? (10) Sim, mas alimentam-se só de odores... Aquelas que não têm acumulado boa sorte só se alimentam de odores desagradáveis, enquanto que as que têm acumulado boa sorte fazem dos odores agradáveis seu alimento. De acordo com esta passagem, as existências intermediárias subsistem usando odores como alimento. Além disso, devido a que os órgãos dos sentidos (neste caso, o sentido do olfato) são muito sutis, também o são os odores dos que alimentam-se. Quer dizer, a o sentido do olfato possuído pelo corpo provisional permite perceber odores de uma natureza sutil. Além disso, o texto afirma que aqueles que têm acumulado boa sorte podem alimentar-se de odores agradáveis, enquanto que os que não têm acumulado, quer dizer, os que têm acumulado carma negativo, somente podem alimentar-se de odores desagradáveis. 7.- Duração. Existem várias opiniões referentes à duração da existência intermediária. Aqui gostaria de citar quatro explicações que encontram-se no volume 17 do Daibibasha Ron. 1) "Pergunta: Durante quanto tempo mora a existência intermediária nesse estado? Resposta: Só durante um curto período de tempo, porque busca rapidamente o renascimento. De acordo a esta primeira explicação, a existência intermediária somente dura um curto período. Devido a que as condições externas necessárias são harmonizadas pela energia cármica da vida que encontra-se em estado provisional, sua estadia nesse estado é muito breve. 2) O Venerável Shamadatta afirma: "A existência intermediária dura somente sete períodos de sete dias. Antes de transcorridos 49 dias, o renascimento fica definitivamente garantido. "Esta opinião estima a duração da existência intermediária em sete semanas, ficando o renascimento definitivamente assegurado depois de transcorrido esse período. 3) O Venerável Vasumitra afirma o seguinte: "A existência intermediária dura, quanto muito, sete dias, porque o corpo provisional é extremadamente sutil e não pode existir por muito tempo". Esta terceira explicação estima a duração da existência intermediária numa semana, devido à fragilidade do corpo provisional que não lhe permitirá persistir durante um período muito longo. 4) "O Buda, o Homem de Grande Virtude, tem afirmado: Não existe duração fixa (para a existência provisional). Quer dizer, que quando as condições para o renascimento concretizam-se rapidamente, o corpo provisional durará somente um curto período de tempo. Mas se depois de transcorrido um longo período, as condições não estiverem completas ainda, esse corpo provisional persistirá durante um tempo considerável. "De acordo com esta quarta opinião o intervalo entre a morte e o renascimento não é fixo. Para alguns, as condições necessárias para o renascimento manifestam-se rapidamente, enquanto que para outros a materialização destas condições requer de um tempo maior.

8.- Certeza do renascimento. (Este tema será tratado mais adiante) 9.- Forma de locomoção. No volume 9 do Kusha Ron afirma-se: "As existências intermediárias destinadas ao estado de Alegria movimentam-se para cima com a cabeça para o alto, como ao levantar-nos de um assento. As destinadas aos estados de Tranqüilidade, Fome ou Animalidade movimentam-se para a frente, horizontalmente. As destinadas ao Inferno têm suas cabeças para baixo e seus pés para o alto, e assim caem nas profundezas". Esta descrição reflete a noção de um céu localizado acima do mundo humano e um inferno que acha-se por abaixo do mesmo. Os destinados ao céu movimentam-se para cima com a cabeça nessa direção, enquanto que aqueles destinados ao inferno caem no mesmo de cabeça. Os corpos provisionais daqueles destinados ao estado de Tranqüilidade, Animalidade ou Fome têm suas cabeças para cima e seus pés para abaixo, movimentando-se como o fazem os seres humanos. Ao ler estas passagens, devemos lembrar que o Kusha Ron e o Daibibasha Ron são tratados Hinayana, e como tais, estão profundamente influenciados pelo ponto de vista filosófico Hinayana, que afirma que os dharmas, ou componentes básicos de todas as coisas, existem na realidade. Portanto, referem-se ao corpo provisional como algo que tem existência real e substancial, mas ao revisar nossa compreensão dos mesmos à luz do Budismo Mahayana, encontramos dados importantes relativos à forma em que existe a vida após da morte. Sob o ponto de vista do Budismo Mahayana, podemos afirmar que a vida depois da morte existe no estado de vazio ou não substancialidade (ku), dissolvendo-se de novo no grande cosmos e fluindo com a vida cósmica. Dito em outras palavras, o corpo provisional não é, de fato, outra cosa que, a consciência alaya, a estrutura da existência individual que transmigra de uma vida à seguinte, contendo dentro de si mesma o potencial de todas as funções físicas e mentais na forma de "sementes”. O chamado "corpo provisional" existe no estado de vazio ou não substancialidade, no qual funde-se com a grande vida do cosmos, enquanto mantém um estado latente, quer dizer, como sementes na consciência alaya, as funções que fazem que os cinco componentes tomem forma e se unam. As passagens provenientes do volume 9 do Kusha Ron que temos citado anteriormente podem interpretar-se adequadamente como uma descrição da forma em que as sementes dos cinco componentes existem de maneira latente na consciência alaya; que encontra-se, por sua vez, no estado de vazio, representado isto como algo que tivesse existência substancial e manifesta. Porém, embora a vida no estado de não-substancialidade, vazio ou ku dissolva-se de novo no próprio cosmos, isto não significa que perca seu caráter ou personalidade individual. Em outras palavras, mesmo quando se torne um com o grande cosmos, mantém simultaneamente sua identidade como indivíduo. Esta forma de existir é o estado de ku, que não pode ser entendido nem como existência nem como não-existência. Os fatores que determinam esta individualidade encontram-se impressos na consciência alaya, achandose contidos dentro das mesmas como "sementes". As sementes do carma, desempenham um papel importante a este respeito (11). Durante o processo posterior à morte o "eu" subjetivo de cada existência individual é influenciado pelas sementes, especialmente as do carma, contidas na consciência alaya. Em outras palavras, enquanto encontra-se fundido com a vida cósmica, o "corpo provisional" ou eu subjetivo experimenta a força latente do seu carma e outras sementes e, enquanto recebe prazer ou sofrimento, percebe diversas imagens. As sensações ou imagens reais que uma vida individual recebe no estado de existência intermediária forma a "paisagem interior" dessa vida depois da morte e corresponde às descrições existentes em várias escrituras budistas, relativas à "viagem através da existência intermediária". O próprio Nitiren Daishonin descreve esta viagem detalhadamente numa das suas primeiras escrituras, "Em louvor aos dez Reis" (japonês: Juo Santan Sho). Agora gostaria considerar o que experimenta a vida depois da morte, segundo o descrito neste Gosho.

SEGUNDA PARTE: INTERMEDIÁRIA

A

VIAGEM

ATRAVÉS

DA

EXISTÊNCIA

Descrições provenientes do Juo Santan Sho O Juo Santan Sho (“Em louvor aos dez Reis”) (12), uma das primeiras escrituras de Nitiren Daishonin, descreve a viagem através da existência intermediária, quer dizer, através do intervalo entre a morte e o renascimento, fazendo referência a crenças populares dessa época, provavelmente de origem chinesa, em dez reis do outro mundo que, segundo afirmava-se, julgam aos falecidos. A descrição começa com a cena de uma pessoa falecida caminhando a sós através de uma vasta e escura planície. “Quando uma pessoa falece, ela caminha sozinha através de uma vasta planície. Essa é a chamada viagem através da existência intermediária. Se ela tentar continuar na estrada, não terá mantimentos para levar consigo; se tentar parar ao meio do caminho, não terá onde ficar. Embora queira ir adiante, não haverá suprimentos; embora deseje parar, não há onde ficar. Além disso, afirma-se que a escuridão é como na calada da noite. A pessoa vê somente a luz das estrelas, e como ela viaja na escuridão, adiante e atrás, à direita e à esquerda, tudo são trevas. Não há ninguém a lhe fazer companhia, e não há ninguém a preocupar-se com seu bem-estar. Se imaginar-mos como são as coisas para essa pessoa, nós nos sentiremos tristes e desamparados. Embora ela seja sua amada esposa e filhos no mundo saha, não existe caminho para voltar, e a pessoa deslocase para cada vez mais longe delas. Como ela não sabe aonde vai, não há caminhos que possa discernir. Faça o que fizer, sua única companhia são suas próprias lágrimas de tristeza”. Avançamos a sós e com dificuldade por uma vasta planície, a pessoa falecida aproxima-se gradualmente às montanhas da morte. São descritas como altas e traiçoeiras, como penhascos tão afiados como espadas. Nitiren Daishonin também faz referência a estas montanhas numa carta ao Lorde Yaguenta, na qual afirma o seguinte: " O Nammyoho-rengue-kyo será o seu bastão inquebrável que o conduzirá com segurança através das montanhas da morte". (MW-1, pág. 124) Tendo atravessado estas escarpadas montanhas, no sétimo dia depois da sua morte, afirma-se que a pessoa falecida chega ao local onde habita o primeiro dos dez reis, chamado Rei Shinko. Embora seja submetido a juízo na corte deste rei, não se determina ainda o peso relativo dos seus bons e maus atos, e antes de decidir o lugar do seu próximo renascimento, quer dizer, em qual dos seis caminhos renascerá, é enviado ao segundo dos dez reis, o Rey Shoko. Durante sua viagem, a pessoa falecida chega ao famoso "rio das três travessias". No que refere-se à origem deste nome, no Juo Santan Sho afirma-se o seguinte: “No caminho em direção a esse rei, o falecido chega a um grande rio, chamado Rio das Três Travessias”, cuja largura é de quarenta yojana. Ele é também chamado Rio do Inferno, e pode ser atravessado em três lugares; por isso é chamado o Rio das Três Travessias”. Um yojana equivale aproximadamente a sete quilômetros, de maneira que com uma largura de quarenta yojana, este rio mediria aproximadamente duzentos e oitenta quilômetros de uma ribeira à outra. Afirma-se que existem três lugares onde o falecido pode atravessá-lo. O primeiro encontra-se rio acima, onde o rio é pouco profundo. Aqueles que em vida cometeram somente faltas menores cruzam aqui. O segundo acha-se rio abaixo. Aqui a corrente corre tão rapidamente como uma flecha lançada por um arqueiro, e as ondas levantam-se como elevadas montanhas. Além disso, afirma-se que as águas estão infestadas de serpentes venenosas. Aqueles que cometeram grandes faltas cruzam aqui. O terceiro cruzamento encontra-se no meio do rio: aqui acha-se uma ponte adornada com ouro, prata e sete tipos de jóias. Somente os que têm realizado bons atos cruzam aqui. Na ribeira oposta do rio levanta-se uma grande árvore, em cuja sombra esperam um par de demônios, masculino e feminino. Eles despojam o falecido de todas suas vestimentas, até a ultima túnica, e as penduram nos galhos da árvores. Diz-se que as ramas curvam-se de acordo ao peso das faltas que o falecido tenha cometido. Com relação a isto, Nitiren Daishonin afirma na "Carta a Jakuniti-bo": “Avance no caminho da iluminação do Sutra de Lótus, tendo em mente o momento em que demônios, espíritos diabólicos e os guardiões do inferno o privarão de suas vestes às margens do rio das três travessias. O Sutra de Lótus é o manto que o preservará da desgraça após esta vida”. (MW-1, pág. 237)

E incentiva à Dama Nanjo, depois da morte do seu filho (um irmão menor de Tokimitsu), escrevendo o seguinte: “Quando o falecido Nanjo Goro atravessar as montanhas da morte e o rio das três travessias, os soldados que o acompanharão para subjugar os maus feitores montanheses das delusões e os piratas das ofensas cármicas, possibilitando-lhe alcançar com segurança a Terra Pura do Pico da Águia, serão as frases do Sutra Muryogui, que dizem: ‘Nestes mais de quarenta anos, não revelei ainda a verdade’”. (Gosho Zenshu, pág. 1.569)(13) Tendo cruzado o rio das três travessias, afirma-se que a pessoa falecida se apresenta perante a corte do Rei Shoko durante o décimo quarto dia após sua morte. Aqui, também, investigam-se os bons e maus atos que realizou enquanto estava viva, mas antes de chegar-se a um veredicto, é enviada ao seguinte rei. Afirma-se que, desta maneira, se apresenta ante os dez reis. Com relação a isto, no Gosho "A Herança da Lei Última da Vida" afirma-se o seguinte com relação a quem comete uma calúnia: "Os dez reis do inferno o julgarão, e os mensageiros celestes que estiveram com ele desde o seu nascimento irão censurá-lo pelos seus maus atos”. (MW-1, pág. 23) Afirma-se que os dez reis julgam as boas e más ações dos falecidos desde o sétimo dia após sua morte, até o seu segundo aniversário. Cumprem com o papel de decidir as circunstâncias do seu renascimento, de acordo com suas boas e más ações passadas. Os dez reis são na realidade Budas e Bodhisattvas. Porém, para conscientizar o falecido das faltas que cometeu durante sua vida e permitir-lhe arrepender-se das mesmas, ocultam sua grande benevolência e manifestam externamente um aspecto feroz e colérico. A verdadeira identidade dos dez reis, segundo se estabelece no Juo Santan Sho, assim como o dia após de nossa morte em que se afirma julgam nossos atos, são os seguintes: 7º dia: Rei Shinko (deus budista Fudo). 14º dia: Rei Shoko (Buda Sakyamuni). 21º dia: Rei Shutei (Bodhisattva Monjushiri). 28º dia: Rei Gokan (Bodhisattva Fugen). 35º dia: Rei Emma (Bodhisattva Jizo). 42º dia: Rei Henjo (Bodhisattva Miroku). 49º dia: Rei Taissan (Buda Yakushi). 100º dia: Rei Byodo (Bodhisattva Kanzeon). 1º ano: Rei Tocho (Bodhisattva Seshi). 2º ano : Rei Godotenrin (Buda Sakyamuni) (14) Durante o trigésimo quinto dia após sua morte, a pessoa falecida chega ao palácio do Rei Emma. Na China, chama-se a Emma Rei Hsi-cheng ("aquele que cala os protestos"), o que quer dizer que silencia as objeções da pessoa falecida relativas a um tratamento injusto. Afirma-se que o palácio do Rei Emma tem quatro entradas, para o norte, sul, leste e oeste, respectivamente. À direita e esquerda de cada entrada encontram-se uns postes, como as usadas para os estandartes, na parte superior dos quais se posa um deus com a forma de uma cabeça humana. Às vezes chama-se a estes deuses "mensageiros celestes" e identificados geralmente a Dosho ("mesmo nascimento") e Domyo ("mesmo nome"), deuses que, segundo se afirma, acompanham às pessoas desde o momento do seu nascimento e tomam nota das suas boas e más ações. Quando o Rey Emma pronuncia uma sentença, informa ao falecido o seguinte: “Estes mensageiros celestes nasceram no mesmo momento que o senhor, e desde então o acompanharam como uma sombra acompanha o corpo, jamais separando-se de sua pessoa por um momento sequer. Como eles anotaram todas as suas ações em suas tábuas, não pode haver nenhuma margem a erro”. Além disso, quando o falecido chega à corte do Rei Shoko, durante o décimo quarto dia após sua morte, afirma-se que alí também encontram-se os postes, à esquerda e direita, sobre cada uma das quais pousa-se de maneira similar uma deidade em forma de cabeça humana. A da esquerda é masculina; a da direita é feminina. O Juo Santan Sho diz o seguinte: “O deus da esquerda registra todos os maus atos, sem esquecer a menor ofensa. A deusa da direita registra todos os atos virtuosos, sem esquecer o menor bem. Juntos, formam o par de divindades dos mastros. Com suas cabeças humanas, elas podem ver todas as atividades humanas tão claramente quanto as palmas das próprias mãos”.

Além disso, na corte do Rei Emma encontra-se um salão separado, chamado o Salão do Brilho da Luz. Neste salão acha-se pendurado o espelho johari, conhecido também como o espelho do carma. Quando uma pessoa culpada de uma falta tem sido enviada à corte de Emma o rei procede a interrogá-lo. Indica que, enquanto se achava-se no mundo saha, o falecido tem se comportado de maneira silenciosa e cruel, carecendo de benevolência. Ajudou-lhe a riqueza que tem acumulado com tanta avareza na viagem da morte?, perguntalhe Emma. Tomariam seu lugar os filhos que amou tão ternamente, vendo o seu estado atual? E assim continua interrogando o falecido. Esta descrição significa que a riqueza, autoridade, posição e amor da esposa e os filhos que uma pessoa desfruta neste mundo não servem de ajuda alguma durante a existência intermediária. De maneira similar, a imagem dos falecidos despojados de suas vestimentas pelos dois demônios no rio das três travessias ilustra o fato de que inclusive os que têm acumulado incontáveis riquezas no mundo, possuindo muitas vestimentas elegantes para usar de acordo com a ocasião, e dispondo de numerosos serventes e conhecidos, serão no final despojados de tudo, e terão que vagar sozinhos durante a viagem da existência intermediária. Depois o Rei Emma lê ao falecido o conteúdo das tábuas de ferro sobre as quais os mensageiros celestes têm tomado nota de suas ações. Ao ouvir isto, o falecido protesta, afirmando que, embora lembrando algumas das faltas que lhe foram lidas, o restante é certamente um erro da parte dos mensageiros celestes. “Mesmo aqui, após a morte, continuaras com tuas faltas, mentindo?”, pergunta-lhe Emma. "Não temos acrescentado sequer uma simples falta no seu registro. O senhor está recebendo simplesmente o efeito das suas próprias ações". Desta maneira, repreende à pessoa falecida. Além disso, para demostrar a essa pessoa que o registro mantido pelos mensageiros celestes não contém erro algum, faz com que a mesma olhe no espelho johari, onde refletem-se todas as ações da sua vida. Em termos modernos, seria algo parecido a assistir uma gravação de vídeo. Perante isto, a pessoa falecida pára de discutir com o Rei Emma. Afirma-se que ele passa unicamente a esperar pelas orações da sua esposa, filhos e dos conhecidos ainda vivos, para sua iluminação. No Juo Santan Sho afirma-se o seguinte: “No final, o que determina se a pessoa falecida irá levantar-se ou cair são as orações oferecidas para ela. Contemplando estes princípios, o indivíduo é estimulado a aprofundar a sua fé e a oferecer orações pelas seis espécies de parentes. São particularmente importantes as orações do trigésimo quinto dia em memória ao falecido, quando este passa por grandes sofrimentos na corte do rei Emma. Se uma pessoa praticar a virtude (de oferecer orações ao falecido) nessa ocasião, tudo se refletirá no espelho e então o rei Emma e seus oficiais alegrar-se-ão. E a satisfação do transgressor, ao receber essas orações, não terá limites”. Quer dizer que, ainda quando o falecido devesse, de outra forma, estar destinado a cair no inferno, se forem oferecidas orações por ele, então, de acordo à quantidade e profundidade dos benefícios provenientes das mesmas, pode atingir imediatamente a iluminação, renascer nos reinos celestial ou humano, ou ser enviado ao seguinte rei com sua sentença protelada. Como se ilustra simbolicamente no Juo Santan Sho mediante as imagens do Rei Emma e sua corte, as circunstâncias do renascimento de uma pessoa falecida são determinadas só pelas boas e más ações que ela mesma realizou quando estava viva. Ou seja, a pessoa falecida escolhe efetivamente um renascimento correspondente às sementes cármicas que encontram-se na sua consciência alaya, de acordo com a lei de causalidade cármica, o princípio que o indivíduo colhe os efeitos das suas próprias ações. O papel simbólico dos dez reis é o de julgar se a pessoa falecida tem reconhecido genuinamente suas faltas, e se está aplicandose corretamente ou não a lei da causalidade cármica. Em outras palavras, o julgamento dos dez reis descrito no Juo Santan Sho e outros textos parece ser uma imagem percebida por uma vida que encontra-se na fase intermediária, simbolizando o rigor da lei causal que não pode admitir exceção alguma. Os implementos que o Rei Emma usa para emitir uma sentença, são as tábuas de ferro sobre as quais os mensageiros celestes anotam as boas e más ações do falecido, e o espelho johari, chamado também o espelho do carma. Os mensageiros celestes simbolizam a função mediante a qual registram-se sem exceção todos nossos pensamentos, palavras e ações na consciência alaya. O espelho johari pode ser considerado um reflexo preciso do carma, armazenado na consciência alaya durante a existência intermediária. De acordo com a descrição que encontra-se no Juo Santan Sho, o quadragésimo nono dia marca quase a última oportunidade para o "ser" que se encontra na fase da existência intermediária, escolher seu

renascimento de acordo com as causas cármicas que encontram-se na consciência alaya. Afirma-se que durante este dia, o falecido comparece perante o rei Taissan. No Gosho afirma-se o seguinte: “Quando aparecem diante desse rei, todos os pecadores têm os locais de renascimento determinados”. Em casos excepcionais, o falecido pode ser enviado ao seguinte rei, com as circunstâncias do seu renascimento ainda por decidir, mas na grande maioria dos casos, o local onde o falecido renascerá é determinado neste momento. Portanto, esta ocasião é chamada "a realização dos cinco componentes da existência intermediária". Ante a corte do Rei Taissan encontram-se seis portas, levando cada uma delas a um dos seis sendeiros. De acordo com suas causas cármicas, quer dizer, sua tendência vital, o falecido passa por uma ou outra destas portas. O momento no qual a pessoa falecida passa por uma das portas corresponde ao seu seguinte renascimento. Neste momento acaba a viagem através da existência intermediária, e nasce num ou outro dos seis sendeiros. Parece que entre as quatro opiniões mencionadas anteriormente, concernentes à duração da fase de existência intermediária segundo se estabelece no Kusha Ron e o Daibibasha Ron, o Juo Santan Sho segue geralmente a segunda, que afirma que os cinco componentes da existência intermediária persistem durante sete semanas. Mas, o Kusha Ron afirma que nenhum poder pode alterar o carma do falecido formado na sua existência anterior. E, de fato, é verdade que o carma de uma vida na fase da existência intermediária não pode ser alterado por poder algum tal como a autoridade, a posição social, a riqueza ou o afeto e preocupação dos parentes que a pessoa falecida tem deixado para trás. O Juo Santan Sho esclarece, que nem sequer a benevolência dos dez reis pode alterar o carma do falecido ou mudar o local no qual está destinado a nascer. Porém, de acordo com o Gosho, a transferência, por parte dos vivos, dos benefícios conquistados mediante a prática budista, ou seja, as orações pelo falecido, são o único poder que pode efetuar uma mudança no carma deste, e inclusive alterar as circunstâncias do nascimento ao qual está destinado. Em outras palavras, a suprema boa sorte inerente à iluminação, oferecida pelos vivos mediante suas orações, penetra a consciência alaya da pessoa falecida e efetua um câmbio nessa vida num nível muito fundamental. Por exemplo, mesmo quando uma vida encontra-se submetida aos sofrimentos dos três maus caminhos na fase da existência intermediária, se os vivos enviam a essa vida a grande boa sorte do estado de iluminação, seus sofrimentos se converterão imediatamente em prazer, e poderá encaminhar-se para um renascimento mais feliz baseado numa condição de vida repleta de boa sorte. Devido a isto, Nitiren Daishonin indica repetidamente no Juo Santan Sho a importância do oferecimento de orações pelos falecidos. Por exemplo, ao descrever o que acontece na corte do Rei Shoko, afirma o seguinte nesse Gosho: “A todo instante, o pecador espera que a sua esposa e os filhos enviem orações em sua memória, mas isso é exatamente o que eles não fazem. Pelo contrário, seus filhos sobreviventes desentendem-se com as riquezas que ele deixou, cometendo muitos maus atos, e o falecido sofre ainda mais... Observando isso, o rei diz: ‘Seus filhos são ingratos. Agora, não há esperanças’. E o falecido cairá no inferno. Entretanto, se os vivos oferecerem orações em sua memória e por eles recitarem a Lei Mística que reverte a calúnia e proporciona salvação, o falecido pode atingir o estado de Buda. E então o rei exultará, e o prazer do falecido não conhecerá limites”. Além disso, ao descrever o que ocorre durante o quadragésimo segundo dia na corte do Rei Henjo, o Gosho refere-se aos três tipos de devoção filial. Prover nossos pais de alimentos e vestimentas, representa o primeiro nível de devoção filial. Servi-los, cumprindo com sua vontade, representa o segundo nível. E afirma que o nível mais elevado de devoção filial consiste em oferecer a nossos pais os benefícios conquistados mediante a prática budista. Afirma ademais que, dado que oferecer a nossos pais os benefícios de nosso Daimoku quando ainda estão em vida, constitui uma forma superior de devoção filial, a forma mais elevada desta consiste em oferecer os benefícios de nosso Daimoku aos pais que já faleceram. Portanto, o Daimoku oferecido ao falecido constitui a oferenda suprema de benefícios para ele, e tem o poder de permitir que uma vida que vaga através da existência intermediária alcance a Iluminação. Os magníficos efeitos do Daimoku podem eliminar o sofrimento e tornar realidade a iluminação, inclusive no caso de uma vida que tenha caído no inferno dos incessantes sofrimentos. Com relação a isto, no Ongui Kuden (Registro dos Ensinos Transmitidos Oralmente) Daishonin afirma o seguinte:

“Agora, quando Nitiren e seus seguidores oferecem orações pelos falecidos, recitando o Sutra de Lótus e o Nam-myoho-rengue-kyo, a luz do nosso Daimoku alcança o inferno dos incessantes sofrimentos e lhes possibilita a atingir o estado de Buda em suas formas presentes. Vem daí o conceito de ‘transferência de benefícios’. Mesmo que um indivíduo não creia no Sutra de Lótus e caia no inferno dos incessantes sofrimentos quando um filho dedicado lhe envia a luz do Daimoku, oferecendo sua orações em sua memória, como devoto do Sutra de Lótus, como poderia o falecido deixar de atingir a iluminação?”. (Gosho Zenshu, pág. 712) Aqui termina nossa explicação da existência intermediária; mas antes de passar ao assunto do renascimento, devemos referir-nos a uma passagem importante do Juo Santan Sho concernente àqueles que, depois da morte, não passam pela fase da existência intermediária. Na passagem em questão afirma-se o seguinte: “À parte destes, quem realizou o extremo mal ou o extremo bem não experimenta a existência intermediária. Aqueles que realizaram o supremo bem atingem imediatamente o estado de Buda, enquanto os que cometeram o supremo mal caem imediatamente nos maus caminhos. Assim, em casos de extremo bem ou mal, não há existência intermediária”. Aqueles que cometem o supremo mal de caluniar o Sutra de Lótus, depois de passar pelas agonias da morte, não podem evitar cair de imediato no inferno dos incessantes sofrimentos. Devido à clareza da natureza maligna dos seus atos, não há necessidade de esperar a sentença dos dez reis. Por outro lado, aqueles que têm realizado o supremo bem, quer dizer, aqueles que em vida recitaram Daimoku e estabeleceram o estado vital da iluminação, uma vez que têm passado pelo momento da morte, são recebidos de imediato pelos Budas, Bodhisattvas e divindades benevolentes, e podem ir de imediato à Terra Pura do Pico da Águia. Em várias das suas escrituras, Nitiren Daishonin descreve a "paisagem interior" que apresenta-se depois da morte de alguém que, em vida, fez surgir continuamente o estado de Iluminação mediante a fé na Lei Mística. Por exemplo, em "A Herança da Lei Última da Vida" afirma-se o seguinte: “Para aquele que concentra sua fé e recita Nam-myoho-rengue-kyo com a profunda visão de que agora é o último momento da vida, o sutra proclama: ‘Após seu falecimento, mil Budas estenderão suas mãos para livrá-los de todo o temor e evitar que ele caia nos maus caminhos’. Como nos seria possível reter as lágrimas com a inexpressável alegria de saber que não apenas um ou dois, nem somente uma ou duas centenas, mas tantos quantos mil Budas virão receber-nos de braços abertos”. (MW-1, pág. 22) De maneira semelhante, em "Sobre a Prática dos Ensinos do Buda", afirma-se: “Mesmo que alguém esteja a ponto de cortar nossas cabeças com uma serra, empalar-nos com lanças ou algemar nossos pés para furá-los com uma verruma, enquanto estivermos vivos devemos continuar recitando Nam-myoho-rengue-kyo, Nam-myoho-rengue-kyo. Então se recitarmos até o exato momento da morte, Sakyamuni, Taho e todos os outros Budas do universo virão instantaneamente, exatamente como prometeram durante a cerimônia no Pico da Águia. Tomando nossas mãos e colocando-nos sobre os seus ombros levarnos-ão ao Pico da Águia. Os dois santos, os dois deuses celestes e as Dez Deusas nos protegerão, enquanto todos os deuses budistas erguerão uma cúpula sobre nossas cabeças e desfraldarão bandeiras ao alto. Eles nos acompanharão, sob sua proteção, até o Pico da Águia”. (MW-1, págs. 106 e 107) E no Gosho intitulado "As Catorze Calúnias"; Nitiren Daishonin descreveu ao Lorde Matsuno a Terra Pura do Pico da Águia a ser experimentada depois da morte, encorajando-o assim a manter uma fé forte até o último momento da sua vida: “Continue sua prática sem se abalar até o último momento da sua vida e, quando chegar o momento, veja cuidadosamente! Quando subir à montanha da maravilhosa iluminação e contemplar ao redor em todas as direções, para seu assombro verá que todo o universo é a Terra da Luz Tranqüila. O chão será de lápis-lazúli, e os oitos caminhos estarão separados por cordas de ouro. Quatro espécies de flores cairão dos céus, e a música ressoará no ar. Todos os Budas e bodhisattvas estarão presentes em total alegria, acariciados pelas brisas da eternidade, felicidade, verdadeiro eu e pureza. Aproxima-se rapidamente o momento em que nós também estaremos entre eles. Porém, se tivermos fraqueza na fé, jamais chegaremos a esse lugar maravilhoso”. (MW-3, págs. 216-217)

TERCEIRA PARTE: CONDIÇÕES PARA O RENASCIMENTO

Uma perspectiva budista da concepção Do ponto de vista da medicina ocidental moderna, a simples união do esperma e o óvulo é condição suficiente para que ocorra a gravidez; quando o óvulo é fertilizado pelo esperma acontece a concepção. Porém, do ponto de vista budista, além da união do esperma e o óvulo, considera-se também condição essencial o surgimento da consciência alaya, o seja, o surgimento da vida desde a fase latente ou da existência intermediária. De acordo com isto, o Budismo resume as condiciones necessárias para o renascimento como "a união dos três fatores". No que respeita à "união dos três fatores", no qüinquagésimo quinto volume do Sutra Daihoseki se lê-se o seguinte: "Como então, Oh Ananda, entra a vida no útero da mãe? O pai e a mãe despertam na sua mente o desejo, a época do mês deve ser adequada e o corpo provisional deve manifestar-se. Adicionalmente, se não existe nenhuma das muitas alterações e doenças, tais como aquelas mencionadas anteriormente, e se encontram-se presentes as relações cármicas, então a vida entrará no útero". Aqui, os "três fatores" são definidos como a união sexual dos pais, o funcionamento apropriado do ciclo menstrual e o surgimento do corpo provisional desde a fase da existência intermediária. Além disso, para que estes três fatores se unam, não deve existir alteração física alguma que interfira com a gravidez e deve existir uma afinidade entre o carma dos pais e aquele armazenado na consciência alaya da vida que encontra-se na existência intermediária. No décimo sétimo volume do Daibibasha Ron afirma-se o seguinte: "A união dos três fatores significa a união do pai, a mãe e o corpo provisional", e o qüinquagésimo quinto volume do Sutra Daihoseki faz referência à "união dos fluidos masculino e feminino". Também Nitiren Daishonin, na "Carta de Sado" diz que seu espírito mora num corpo "concebido dos fluidos masculino e feminino" (MW, vol. 1, pág. 37) e em “Ouvindo pela Primeira Vez o Significado do Veículo do Buda” ele escreve o seguinte: “Quando investigamos exaustivamente as nossas origens, descobrimos que os nossos corpos foram formados pela união dos fluídos vermelho e branco, ou esperma e sangue dos nossos pais”. (Gosho Zenshu, pág. 983) Na terminologia médica moderna, o fluido vermelho ou feminino refere-se ao óvulo, e o branco ou masculino ao esperma. Portanto, a "união dos três fatores" refere-se à união do esperma, o óvulo e o corpo provisional. O corpo provisional joga um papel fundamental no nascimento da vida humana. As funções do esperma e o óvulo, que contêm sua informação genética, podem considerar-se como causas externas ou auxiliares que ajudam o corpo provisional a manifestar-se, passando da fase latente ou de existência intermediária para a fase manifesta do nascimento. Com relação ao mesmo tema, o Presidente da SGI Daisaku Ikeda observou num diálogo com o Dr. Koji Yakabi o seguinte: “Quando um bebê é concebido e nasce, o seu carma do passado é considerado como causa, e os pais que ele escolhe de acordo com este carma são a condição. Com a união da causa e da condição, nasce o ser humano”. Ele prosseguiu: “Assim, sob o ponto de vista do Budismo, o nascimento de um ser humano ocorre através da união de causas internas existentes na vida com as condições externas apropriadas”. (USHIO, abril de 1.986) A ciência médica moderna não pode explicar a razão pela qual certa informação genética é selecionada e transmitida a uma criança em particular de entre toda a informação genética combinada de ambos pais. É devido a este processo de seleção que, inclusive crianças nascidas dos mesmos pais, diferem tanto física como mentalmente, por exemplo, na sua personalidade, habilidades, temperamento e constituição física. Por quê razão, entre centenas de milhares ou, melhor, entre milhões de dados contidos nos genes, são transmitidos uns e não outros a uma criança em particular? Do ponto de vista da ciência médica, isto somente pode considerar-se como obra do acaso. Porém, do ponto de vista do Budismo, a vida na fase de existência intermediária não só escolhe os pais de acordo ao carma armazenado na consciência alaya, como também recebe deles aqueles genes específicos correspondentes ao seu próprio carma; ainda que os pais sejam os mesmos, sua informação genética será distribuída de maneira diferente entre seus filhos. Assim, mesmo quando os irmãos possam diferir geneticamente, tanto mental como fisicamente, devemos buscar a causa fundamental deste fato, nas diferenças do carma que levavam dentro deles enquanto achavam-se ainda na fase de existência intermediária. Uma passagem do Oko Kikigaki, um registro das preleções de Nitiren Daishonin sobre o Sutra de Lótus realizado por Mimbu Ajari Niko diz assim:

“Entre os filhos que uma mulher dá a luz, pode haver filhos bons e perversos; filhos bonitos e feios, filhos de pequena estatura e filhos grandes, meninos e meninas, e assim por diante” (Gosho Zenshu, pág. 841) Como foi explicado pelo Presidente Ikeda, o carma armazenado na consciência alaya da vida que encontra-se na existência intermediária atua como “causa", enquanto que a informação genética de ambos pais contida no óvulo e o esperma age como "condição". Podemos afirmar que mediante a união de causa e condição surge uma vida humana. Portanto, quando inquirimos, desde uma perspectiva budista, a respeito das causas de infertilidade, além das irregularidades do esperma e do óvulo, ou as obstruções físicas e mecânicas que impedem a fertilização, encontramos o problema muito mais grave do carma da vida que acha-se na existência intermediária. O primeiro volume do Yugashiji Ron (sânscrito: Yogacharabhumi-shastra) cita as seguintes três causas para a incapacidade de conceber: (1) os efeitos de alterações e doenças do útero; (2) os efeitos de alterações e doenças do sêmen; e (3) os efeitos de alterações e doenças do carma. No que respeita à terceira causa, nesta obra afirma-se o seguinte: “Que significa alterações e doenças do carma? Significa que o pai ou a mãe não criaram ou fomentaram o carma para ter filhos. Ou, por outra parte, pode significar que tanto o pai como a mãe carecem do carma para atrair filhos para eles. Ou pode significar que a existência intermediária não há criado ou fomentado o carma para atrair pais para sim”. Em outras palavras, "alterações e doenças do carma" refere-se a aqueles casos em que o pai, a mãe ou ambos não possuem o carma para ter filhos, ou aqueles em que a vida que encontra-se na fase intermediária não possui o carma para entrar em contato com seus pais. Em tais casos, ainda quando não exista uma causa física para a infertilidade, desde uma perspectiva médica, o casal será, a pesar disso, incapaz de conceber. Para curar as "alterações e doenças do carma", os pais devem transformar seu próprio carma, de maneira que possa estabelecer-se a conexão cármica entre suas próprias vidas e aquela que encontra-se na existência intermediária. Ao mesmo tempo, para ter um filho afortunado, os próprios pais devem desenvolver uma consciência alaya plena de boa sorte. No qüinquagésimo quinto volume do Sutra Daihoseki afirma-se o seguinte: Se o pai e a mãe forem dignos e nobres e possuírem grande sorte e mérito, enquanto a existência intermediária for desprezível e baixa; ou se a existência intermediária é digna e nobre e possui grande sorte e mérito, enquanto o pai e a mãe são desprezíveis e baixos, ou mesmo quando os dois lados possuem sorte e mérito, porém não têm o carma correspondente, então, em casos como esses, a vida não entrará no útero”. Então, nos casos em que exista uma atração ou afinidade entre o carma dos pais e o do filho, como responde a existência intermediária ao carma dos pais e emerge do estado latente ou de não-substancialidade (ku), manifestando-se no mundo fenomenal, o reino da existência temporal (ke)? Esta pergunta resume o problema da maneira como a vida passa da fase de existência intermediária à do nascimento. Anteriormente discutimos os nove aspectos da existência intermediária segundo são descritos no Kusha Ron. No que refere-se ao "assegurar o renascimento", nesta obra afirma-se o seguinte: “Uma existência intermediária dessa espécie (não iluminada), para alcançar o lugar onde nascerá, gera antes uma mente deludida e apressa-se em direção ao mundo que deseja. Através dos órgãos da visão que possui devido ao poder do seu carma, ela discerne seu pai e sua mãe unidos em cópula no local destinado de nascimento, mesmo que se encontrem a grande distância, e cria pensamentos pervertidos. Se for uma existência masculina, despertará o desejo masculino em relação à mãe, e se for feminina, despertará o desejo feminino pelo pai. Dessa forma, sentirá atração por um dos pais e a versão pelo outro”. O gosho intitulado "Itinen Sanzen como Princípio e Realidade" também faz referência a esta passagem do Kusha Ron afirmando o seguinte: “Ignorância refere-se ao despertar da paixão sexual no passado. Um homem sente ódio por seu pai e desejo por sua mãe. A mulher sente ódio por sua mãe e desejo por seu pai – assim lemos no Kusha Ron”. (Gosho Zenshu, pág. 406) O corpo provisional descreve-se no Kusha Ron e outros tratados Hinayana como possuidores de sutis órgãos visuais. Afirma-se que nenhum objeto material pode obstruir sua visão. Além disso, este sutil corpo provisional pode passar através de qualquer tipo de matéria sólida e viajar livremente através do ar. Portanto, diz-se que é capaz de viajar imediatamente ao lugar onde habitam os pais aos que esta destinado carmicamente, sem importar que tão grande possa ser a distância. Como afirmamos anteriormente, o Budismo Mahayana ensina que a vida depois da morte existe no estado de ku ou não-substancialidade, no qual tem se fundido novamente com a vida do cosmos. Neste

estado, o "corpo provisional", ou mais apropriadamente, a consciência alaya, tornou-se um com o próprio grande cosmos. Neste caso, ku identifica um modo de existência que transcende os limites do espaço-tempo do mundo fenomenal. A união dos pais que acontece de acordo com as causas cármicas armazenadas na consciência alaya atua como uma causa ou condição auxiliar, e quando a causa e condição harmonizam-se desta forma, o corpo provisional, que até este momento não estava limitado pelo espaço-tempo do mundo fenomenal, pode manifestar-se repentinamente, entrando na fase do "nascimento". A menção que se faz no Kusha Ron dos "órgãos visuais que possui devido ao poder do seu carma" expressa a função mediante a qual as sementes cármicas de uma vida que encontra-se na fase da existência intermediária usam a consciência alaya dos pais como causa ou condição auxiliar para sua reaparição. As sementes cármicas ou energias latentes que encontram-se na consciência alaya da vida que encontrase na existência intermediária tomam o DNA dos pais como campo no qual manifestar-se. De acordo com o Kusha Ron, quando essa vida passa da fase de existência intermediária à existência manifesta, se é uma vida masculina, então nesse momento as sementes das paixões do desejo pela mãe e o aborrecimento para com o pai encontram expressão. Por outro lado, se é uma fêmea, manifestam-se o amor pelo pai e o aborrecimento para a mãe. Esta interpretação sugeriria que pode-se deduzir que as raízes dos complexos de Édipo e de Electra postulados por Freud encontram-se no mesmo instante da concepção. Porém, tal entrada no útero através do desejo e o aborrecimento só se aplica aos seres que se encontram nos Seis Caminhos. Isto difere para aqueles dos dois veículos e para os Bodhisattvas. No decimo sétimo volume do Daibibasha Ron afirma-se o seguinte: “O comentador afirma: ‘Como o mérito e a sabedoria dos bodhisattvas são de tal forma desenvolvidos, quando eles desejam ingressar no útero, não têm pensamentos pervertidos, e não ficam presos a desejos licenciosos. Os reis giradores da roda e os pratyekabudas (16) possuem mérito e sabedoria, porém não desenvolvidos ao máximo. Assim, quando ingressam no útero, embora não tenham pensamentos pervertidos, não obstante prendem-se a desejos licenciosos”. Seguindo com a explicação do Bodhisattva, acrescenta o seguinte: “As diversas classes de seres vivos despertam, dessa maneira, pensamentos pervertidos e entram no útero materno. Somente o bodhisattva, quando ingressa no útero, discerne corretamente o seu pai como seu pai, e a sua mãe como sua mãe. Além disso, desperta o amor filial pela mãe, e através dessa forma entra no seu útero”. O pratyekabuda, que representa os dois veículos, e também aquele que governa mediante a sabedoria, possuem mérito e sabedoria e podem reconhecer corretamente como adequados para eles o pai e a mãe selecionados em virtude do seu carma quando ainda encontravam-se na fase da existência intermediária. Porém, nesse momento, ainda são possuídos pela paixão sexual. No caso dos bodhisattvas, devido a que seu mérito e sabedoria são do tipo mais elevado, não somente podem discernir corretamente mediante sua sabedoria o pai e a mãe mais adequados para eles; além disso, devido à sua extraordinária boa sorte, a diferença daqueles que encontram-se nos Seis Caminhos ou os dois veículos, não experimentam as paixões da luxúria ou o aborrecimento para com seus pais. Em vez disto, sentem amor e afeto para com a sua mãe e, graças ao poder deste amor, são capazes de entrar no seu útero. O que acontece então no caso de alguém que tenha morrido depois de estabelecer a iluminação como seu estado de vida fundamental?, de quê maneira manifesta-se uma vida como esta no mundo? No que diz respeito a isto, Nitiren Daishonin afirma no Gosho “Os Ensinos Confirmados por Todos os Budas Através do Tempo”: "Em acordo com a verdadeira intenção de todos os Budas das três existências, ele (o falecido) recebe a proteção dos dois sábios, das duas divindades celestes e das dez filhas-demônios e, sem encontrar impedimentos, obtém o renascimento da mais elevada espécie na Terra da Luz Tranqüila (17). E então, no espaço de um instante retorna ao sonho do nascimento e da morte nos nove mundos, abrangendo os mundos das dez direções com o seu corpo e permeando os corpos de todos os seres sensíveis com a sua mente. Compelido internamente e atraído externamente, com plena correspondência entre o interior e o exterior, as causas e condições se unem (e ele nasce outra vez no mundo), fazendo pleno uso dos poderes místicos derivados de sua benevolência, para beneficiar amplamente os seres”. (Gosho Zenshu, pág. 574) Como afirmamos anteriormente, no caso de uma pessoa que recita Daimoku e estabelece o estado de iluminação nesta vida, ela não tem que vagar depois da morte através da existência intermediária. Uma vez passado o momento da morte, essa pessoa é imediatamente recebida por todos os Budas, Bodhisattvas e deidades benévolas e é escoltada por eles até a Terra Pura do Pico da Águia. No gosho "Os Ensinos Confirmados por Todos os Budas Através do Tempo” expressa isto mediante a seguinte frase:

“(Ele) obtém o renascimento da mais elevada espécie na Terra da Luz Tranqüila”. Além disso, uma vida que tem acumulado o máximo bem volta "num instante" ao “sonho do nascimento e da morte nos nove estados", quer dizer, aos nove estados da realidade fenomenal. Afirma-se que as pessoas que cometem as faltas mais graves "caem durante mil kalpas no Inferno Aviti", sofrendo tormentos infernais durante um período de tempo imensamente longo. E afirma-se que aqueles que experimentam a fase da existência intermediária passam por este estado transitório durante um período variável de tempo, tal como 49 dias. Pelo contrário, uma vida que tem acumulado o supremo bem da iluminação volta a manifestar-se no mundo instantaneamente desde a Terra Pura do Pico da Águia. A passagem antes citada afirma também o seguinte: "abrangendo os mundos das dez direções com o seu corpo e permeando os corpos de todos os seres sensíveis com a sua mente". Como o indica esta passagem, a existência humana manifesta-se tanto física como espiritualmente no ambiente do grande universo. A matéria da qual compõe-se o corpo humano foi formada mediante a evolução do universo durante um período de vinte bilhões de anos. Podemos afirmar, na verdade, que dentro do corpo humano encontram-se contidos os mundos das dez direções e o próprio universo. Além disso, a informação genética que dá forma ao desenvolvimento do corpo humano inclui a história da evolução de formas de vida sobre a Terra durante, pelo menos, três bilhões de anos. Abarcando a história de vinte bilhões de anos da matéria e a de três bilhões de anos dos seres vivos, os seres humanos entram na fase da existência manifesta como o mais inteligente e altamente desenvolvido dos seres conscientes. A passagem do Gosho refere-se também à união de "causas e condições". Neste caso, "causas" refere-se às causas cármicas baseadas no estado de Buda que foram estabelecidas na vida daquele que, ao chegar o momento da morte, entra imediatamente na Terra Pura da Luz Tranqüila, enquanto que "condições" refere-se à união dos pais que será adequada para atuar como causa auxiliar para fazer que essa vida manifeste a recompensa das causas cármicas. Quando uma vida baseada na iluminação tornou-se a fundir no momento da morte com os "mundos das dez direções", que dizer, com o âmbito interno do universo ou o estado de ku, é urgido internamente para o ressurgimento pelas suas próprias causas cármicas, enquanto é atraído pelo âmbito externo do universo, ou o mundo fenomenal, pela união dos seus pais, que atua como causa ou condição auxiliar externa. Mediante esta união de "causas e condições", manifesta-se no mundo uma vida humana repleta de boa sorte e sabedoria. Ademais, no Gosho afirma-se que esta vida que está surgindo no mundo manifesto está plena do poder da benevolência que procura beneficiar livremente a todos os seres vivos. Em outras palavras, uma vida de supremo bem, uma vida submetida ao ciclo do renascimento com o estado de Buda como base, escolherá como causa auxiliar, mediante o poder da sua benevolência para salvar a todos os seres, os pais mais propícios para favorecer o cumprimento de sua missão, voltando assim ao âmbito do nascimento desde a Terra Pura do Pico da Águia. No caso de uma vida como esta, as paixões tais como o desejo sexual, a ira e a perversão não atuam no momento da concepção. Com sua grande sabedoria, reconhece corretamente seu pai e sua mãe e experimenta um amor ilimitado para com eles a medida que entra no mundo. Como já afirmamos, a vida de alguém que, enquanto estava vivo, tinha baseado-se no estado de Buda, chega imediatamente depois da morte à Terra Pura do Pico da Águia, e apenas tenha admirado com reverência os rostos de Sakyamuni, Taho e todos os outros Budas, volta a manifestar-se “num instante" no mundo fenomenal. O ponto importante aqui é que poder ou não ir depois da morte à Terra Pura do Pico da Águia, e que poder renascer ou não como indivíduos possuidores de boa sorte e sabedoria, dependem da nossa pratica budista na nossa presente existência. Para aqueles que reverenciam os ensinamentos de Nitiren Daishonin ao longo de suas vidas e lutam por propagar amplamente seus ensinamentos, desenvolvendo sua fé corajosamente e sem retroceder, seu ciclo do renascimento não será determinado pelo carma que criaram ao percorrer os seis caminhos. Em vez disso, poderão repetir o ciclo do nascimento e da morte plenos de sabedoria e boa sorte, com o poder da benevolência e seu senso de missão como força motriz. Estas são as funções do nascimento e da morte inerentes ao estado de Buda, baseadas na natureza eterna da Lei. NOTAS (1) Raymond A. Moody, Jr., Life after Life: The Investigation of a Phenomenon – Survival of Bodily Death (Covington, Georgia: Mockingbird Books 1975; reprint ed., New York: Bantam Books, 1976).

(2) Ibid., p.32. (3) Ibid. (4) Ibid. (5) Kenneth Ring, Life at Death: A Scientific Investigation of the Near-Death Experience (New York: Quill, 1982), p.53 (6) Ibid., p. 55. (7) Os cinco componentes, chamamos também os cinco agregados o SKANDHAS, são as categorias de elementos físicos e psíquicos que unem-se temporariamente para formar um ser vivo individual. A forma é o aspecto físico da vida, que possui cor e forma e inclui os cinco órgãos dos sentidos. A percepção é o processo pelo qual percebemos a informação captada mediante os seis órgãos dos sentidos (os cinco órgãos dos sentidos mais a mente, que integra as impressões recebidas pelos cinco sentidos). A Concepção significa as idéias ou noções formadas a respeito do que foi percebido. A volição é a vontade ou impulso de atuar em relação com o que o indivíduo tem percebido e sobre o qual tem formado um conceito. A Consciência é a função da vida que permite discernir, a qual pode emitir juízos de avaliação, distinguir entre o bom e o ruim, etc. Também integra os outros quatro componentes. (8) A sexta consciência integra as impressões recebidas pelos cinco sentidos e emite juízos a respeito do mundo externo. A consciência mano é a função da mente que ocupa-se do pensamento abstrato e discerne o mundo interior. Serve de ponte entre os estados consciente e inconsciente. Afirma-se que o amor próprio e a consciência de nós mesmos são funções da consciência mano. A consciência alaya, chamada também o depósito do carma, encontra-se abaixo do nível de percepção consciente e armazena as impressões de todas as ações mentais, verbais ou físicas como causas latentes que possuem o potencial de manifestar os correspondentes efeitos do futuro. Considera-se que a consciência alaya é a que está submetida ao ciclo do renascimento. As consciências mano e alaya são, respectivamente, a sétima e oitava das oito consciências postuladas pela escola Somente-Consciência, e das nove consciências postuladas pelas escolas Tien-tai e Hua-yen (Kegon). (9) A existência intermediária é uma das quatro fases que repetem-se no ciclo do renascimento: nascimento, existência contínua (até o momento da morte), morte e existência intermediária (entre a morte e o renascimento). (10) O mundo do desejo é a primeira divisão do mundo tríplice, o âmbito no qual transmigram os seres não iluminados. Compreende os estados de inferno, fome, animalidade, ira, tranqüilidade e as primeiras seis divisões do êxtase. Chama-se assim porque aqueles que o habitam estão dominados por vários desejos. (11) O termo "sementes" refere-se às causas ou impressões latentes armazenadas na consciência alaya, que possuem potencial de manifestar os correspondentes efeitos. O pensamento da escola Somente-Consciência distingue entre as "sementes do carma", que podem ser boas ou más e as sementes de natureza neutra. (12) Nova Edição Crítica das Escrituras de Nitiren Daishonin, Período Showa (jap. Showa Shintei Nichiren Daishonin Gosho) (Taiseki-ji, 1966; reedição, 1979), vol. 1, págs. 52-78. (13) Quer dizer, que Nanjo Goro estará protegido na morte devido a que, quando estava vivo, abraçou o Sutra de Lótus, rejeitando os ensinamentos provisórios. (14) As descrições dos dez reis diferem ligeiramente de acordo com o texto. Por exemplo, em algumas versões, o oitavo rei é o Rei Toshi, cuja verdadeira identidade é a do Buda Ashuku e o décimo rei, Godotenrin, afirma-se que é uma manifestação do Buda Amida. (15) Os "seis tipos de parentes" são pai, filho, irmão mais velho, irmão mais novo, esposo e esposa ou, de acordo a outra versão, pai, mãe, irmão mais velho, irmão mais novo, esposa e filho. (16) Pratyekabudas: Um dos dois tipos de sábios Hinayana, sendo o outro o dos Shravakas (shomon em japonês), ou aqueles que escutam as vozes. Considera-se um pratyekabuda como (a) "aquele iluminado às causas e condiciones" (engaku), ou seja, aquele que percebe a verdade da origem dependente do sofrimento, ou (b) "aquele iluminado independentemente" (dokkaku), alguém que busca a iluminação sem um mestre, por exemplo, num mundo onde não existe um Buda, mediante a observação dos fenômenos naturais e a meditação sobre os mesmos. Entre os Dez Estados, o pratyekabuda corresponde ao da Compreensão (Absorção). (17) Terra da Luz Tranqüila: lugar onde mora um Buda. Também indica o estado de iluminação.

Related Documents