Será que Espinho os tem? Li, recentemente, que a população portuguesa estagnou em relação a 2007 e que só não recuou porque os imigrantes ajudaram a manter o equilíbrio, factor que, dizem os peritos, está para acabar porque este sítio já lhes deu muito mais oportunidades do que agora. Apesar disso, o volume de construção de habitações tem sido tal que, ultrapassando em muito a procura, tem transformado enormes zonas de betão em cenários fantasma semelhantes a tantos outros vulgarizados por jogos de computadores, estéreis de gente e prenhes de criminalidade. Segundo o INE, as licenças concedidas para construção na Figueira da Foz ultrapassavam as de qualquer outro munícipio da região, apesar de a própria autarquia admitir que há habitações a mais, que não há compradores para segunda habitação e que o crescimento da população é nulo. Em São João da Madeira, em seis anos, a habitação cresceu 6% e a população 3%. Perguntar-se-á, para quem será metade das habitações construídas e, por enquanto, vazias? A Câmara Municipal de Vila Real de Santo António fez aprovar uma alteração ao Plano Director Municipal com o objectivo de transformar uma zona até agora de turismo em zona de habitação consolidada. De revisão em revisão, a autarquia algarvia poderá, dentro de alguns anos, e esgotados os terrenos do município, licenciar moradias flutuantes ao largo da sua costa. Estes exemplos, - há muitos mais que dariam para encher esta edição do Maré Viva -, mostram o caminho errado que os responsáveis pela coisa pública têm tomado. Dando rédea solta aos construtores, patos bravos incluídos, de investirem fora das vilas e cidades, os responsáveis têm promovido a insustentabilidade. Diz quem sabe, que construir fora da malha urbana exige mais tubaria, mais acessibilidades, mais energia, mais combustível, mais tempo em deslocações, um ror de desperdícios aproveitados por abutres que, a manter-se a lógica deste sistema autofágico, serão, um dia, obrigados a bicar e a comer as suas próprias patas e garras. Poucas têm sido as autarquias a remar contra esta espécie de tsunami e a travar a ânsia de construção fora dos centros urbanos e a obrigar os construtores a investir na requalificação dos milhares de casas abandonadas ou devolutas. Só mantendo os edifícios construídos na malha urbana, só requalificando os edifícios abandonados e em ruínas nas vilas e cidades poderão os cidadãos usufruir de segurança e qualidade de vida. Só assim terão mais e melhores espaços verdes onde se distrair e repousar em redor das suas vilas e cidades porque não serão invadidos e ocupados por mais alcatrão e mais betão. "A habitação é, há décadas, um dos maiores problemas sociais do país. Teria uma solução, rápida e fácil, com políticos corajosos. Ou seja, em Portugal, não tem solução." escrevia Paulo Morais, no JN de 21Jan2009. Será que Espinho os tem? Octávio Lima, publicado no Maré Viva de 17 Novembro 2009