Heitor Moura 2005 Um Precursor Das Estatisticas Censitarias - Figueira De Mello

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UM PRECURSOR DAS ESTATÍSTICAS CENSITÁRIAS: FIGUEIRA DE MELLO SOBRE PERNAMBUCO DA 1ª METADE DO SÉCULO XIX1

Heitor Pinto de MOURA FILHO

A primeira tentativa de recenseamento do Brasil, no século XIX, decorreu de decisão do governo português em 1808, possivelmente dirigida para expandir a milícia, da qual se conhece o resultado agregado de 4 milhões de habitantes2. Em 1819, em relatório preliminar à criação de novos arcebispados, o conselheiro Antonio Rodrigues Velloso de Oliveira apresenta uma população brasileira de menos de 4,4 milhões, aí incluídos 800 mil “índios bravios”, o que Souza e Silva argumentou posteriormente ser fortemente subestimado, avaliando a realidade em pelo menos 6 milhões de habitantes. Durante o meio século entre a independência e a realização do recenseamento geral de 1872, a produção sistemática de estatísticas populacionais amargou um longo recesso no Brasil. Apesar das tentativas determinadas em 1829 e em 1850, não foi possível estruturar nem executar levantamentos de âmbito nacional durante esse período (Marcílio, 2000:40-43; Smith, 2002). Em âmbito provincial, houve alguns recenseamentos mais abrangentes e sistemáticos, mas os levantamentos sobre Pernambuco durante o século XIX não podem ser incluídos nestes casos3. Durante as primeiras sete décadas do século, enquanto os governos provinciais obtinham levantamentos pouco fidedignos, viajantes, diplomatas, funcionários públicos e políticos propuseram estimativas de precisão talvez por vezes mais acurada. Apesar das falhas dos primeiros censos, as informações sobre o tamanho da população só vieram a adquirir uma confiabilidade mínima com os recenseamentos gerais, em 1872, 1890 e 1900. Neste ambiente avesso às contagens censitárias, Jeronymo Martiano Figueira de Mello (1809-1878)

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Este trabalho se baseia em trecho da dissertação de mestrado Um século de pernambucanos mal contados: estatísticas demográficas nos oitocentos, defendida no Programa de Pós-graduação em História Social do IFCS-UFRJ em junho de 2005. E-mail: [email protected]. 2 Aviso de 16/03/1808 expedido por D.Rodrigo de Souza Coitinho, depois Conde de Linhares, então ministro dos Negocios da Guerra (Silva, 1870) e (Alden, 1963:194-5). 3 Contrariamente, Dauril Alden considera que, dos levantamentos coloniais das últimas décadas dos setecentos, o de Pernambuco seria talvez o mais completo “The census of 1782 is in some ways the most complete demographic record available for any part of Brazil, and was included in a long economic report sent to the crown in that year. The data appear to derive mainly from the mid-1770’s...” (Alden, 1963:180).

destacou-se pelo esforço em analisar os dados reunidos pelo governo provincial e procurar produzir estatísticas minimamente confiáveis. De família cearense, formou-se pela Faculdade de Direito de Olinda, serviu como secretário da Província de Pernambuco na gestão de Rego Barros, como chefe da polícia em Pernambuco, durante a Revolução Praieira, e também na Corte, além breves períodos como presidente das províncias do Maranhão (janeiro a setembro de 1843) e do Rio Grande do Sul (outubro de 1871 a junho de 1872). Estas funções nas administrações provinciais foram entremeadas pelo exercício de cargos no poder judiciário (juiz, desembargador e, por fim, ministro do Supremo Tribunal de Justiça) e no legislativo (deputado na Assembléia-Geral Legislativa pelo Ceará durante 4 legislaturas e por Pernambuco durante uma, além de senador pelo Ceará a partir da década de 1860). Seu trabalho sobre estatística pernambucana assumiu um caráter especial a partir do contrato firmado com o governo provincial para a produção de estatísticas políticas e demográficas em 1841 do que resultaram um longo artigo publicado no Diário de Pernambuco em 1845 e, posteriormente, um texto maior (de cerca de 300 páginas, com muitos quadros estatísticos) pouquíssimo divulgado na época e somente republicado em 1979, pelo Conselho Estadual de Cultura de Pernambuco.

Durante o período colonial, as estruturas eclesiástica e militar foram incumbidas de listar e contar a população. (Silva & Linhares, 1995) lembram que “decorria...com naturalidade que o poder público recorresse aos párocos para obter informações e serviços de que necessitava, compondo-se, assim, a estrutura básica do padroado.” Joaquim Norberto de Souza e Silva, em seu relatório sobre os recenseamentos havidos no Brasil até então, aponta a estrutura eclesiástica como a primeira a servir como rede de coleta de informações demográficas: “O que hoje seria de difficil execução, não o era tanto para aquelle tempo, em que toda a população era conhecida pelas listas das desobrigas das freguezias. Orçava-se então o número dos habitantes pela designação de commungantes ou freguezes, limitando-se unicamente à communhão catholica, como observa Roberto Southey, na sua History of Brasil (sic)” (Silva, 1870:6).

No entanto, conforme adverte o conselheiro João Manoel Pereira da Silva, já se depositava pouca confiança nesses levantamentos: ”Confiavão [os bispos] nos parochos para os arrolamentos de seus districtos pastoraes. Incluião elles com exactidão os moradores que conhecião e que procuravão os seus serviços espirituaes, e lhes pagavão os emolumentos a que tinhão direito. Formavão hypotheticamente o resto do calculo” (Silva, 1870).

Souza e Silva afirma que havia sistemática subcontagem, por omitirem os menores de 7 anos (não relacionados nas listas de desobriga pascal) ou as tropas pagas, e que ainda “...deve-se ter presente que os vigarios, de commum accôrdo com os capitães móres, diminuião o numero da população para

obstarem a divisão das freguezias...”4 Havia, sem dúvida, dificuldades bastante objetivas para realizar os levantamentos populacionais: longas distâncias, viagens penosas, chefes de família recalcitrantes e um número excessivo de pessoas, de hierarquias distintas, envolvidas. Além desses problemas, Dauril Alden lembra que “a compilação de relatórios precisos talvez excedesse a competência técnica da burocracia portuguesa”, à semelhança do que acontecia com as espanholas e inglesas. O único país que possivelmente então tivesse tais condições teria sido a Suécia (Alden, 1963). O próprio governo português não teria confiança nos levantamentos organizados pela estrutura eclesiástica. Ainda nas palavras de Alden: “...a coroa estava dissatisfeita com os resultados de censos eclesiásticos anteriores e, portanto, determinou às autoridades seculares que assumissem os futuros levantamentos”5. Sendo exatamente a paróquia o local para onde convergiam os momentos definidores da vida oficial dos cidadãos – seu início, com o batismo, e seu fim, com o enterro em terreno consagrado – era a caprichosa estrutura eclesiástica, também subordinada às presidências das províncias, o alvo de grande parte dessas reclamações. Escapavam ao controle da Igreja os protestantes em geral, tendo como contrapartida a impossibilidade de obterem os ritos religiosos associados a esses momentos fora das instâncias – igrejas e cemitérios – criados a partir da chegada da corte joanina. O depoimento do pastor Kidder, falando sobre o cemitério norte-americano de Salvador, é esclarecedor: “Não somente os súditos britânicos se beneficiam dessa louvável atitude do governo inglês. Protestantes de todas as nacionalidades, especialmente cidadãos norte-americanos, devem grande soma de obrigações à colônia inglesa, pelo fato de freqüentemente facilitar, esta última, o enterramento de seus mortos. Não fora a cortesia dos ingleses, os nossos conterrâneos ver-se-iam embaraçados, principalmente em países essencialmente católicos, quando tivessem que realizar funerais” (Kidder, 1951:38).

Além dos protestantes, fugiam a essa estrutura católica índios “bugres”, africanos não batizados e quilombolas, todos de fato inexistentes como população para a burocracia brasileira6. Depois de historiar os registros paroquiais, desde sua criação pelo Concílio de Trento, Maria Luíza Marcílio lembra que “O estatuto do Padroado Régio no Brasil até pelo menos a Constituição Republicana (...) deu aos Registros Paroquiais uma cobertura praticamente universal da população brasileira (...)” (Marcílio, 2004). 4

Na população de 207 mil da Comarca (eclesiástica) de Olinda, listada em “Mapa que mostra o numero dos habitantes das quatro capitanias deste governo...” de 1782, incluindo as freguesias de Alagoas, conforme apresentada por (Silva, 2003:76), calculamos uma proporção de 25% do total de habitantes abaixo de 7 anos. 5 “...the crown was dissatisfied with the results of previous ecclesiastical censuses and therefore directed secular authorities in Brazil to take charge of future enumerations” (Alden, 1963:194). 6 Gilberto Freyre, no mapa-diagrama incluído em seu Ingleses no Brasil, intitulado “Pontos do Brasil onde os ingleses primeiro se instalaram depois da abertura dos portos (1808)” coloca cemitérios em Belém, São Luis, Recife, Salvador e Rio de Janeiro (Freyre, 1948). O relatório do Ministro dos Negócios do Império para o ano de 1853 cita as estatísticas de óbitos, inclusive de estrangeiros enterrados nos cemitérios da corte, excetuando explicitamente aqueles sepultados no Cemitério dos Ingleses, sobre os quais não oferece informações (Brasil. Ministério Do Império, 1853:15).

Generalização semelhante aventada por (Paiva et al., 1990:23) de que “tanto a Igreja Católica com o Corpo Militar possuíam uma organização institucional suficientemente preparada para a realização da tarefa pretendida pela Coroa, isto é, relacionar em cada ano, nominalmente, todos os habitantes do domicílio (...)” apesar de colidir com as restrições mencionadas mais acima, poderia ser eventualmente verdadeira para a corte e outras capitanias, mas de fato não pode ser aplicada a Pernambuco. Nos diversos relatórios apresentados pelos presidentes de Pernambuco à Assembléia Legislativa Provincial ao longo do século XIX, aparecem inúmeras estatísticas sobre efetivos militares, estruturas e processos judiciais, além de detalhes sobre orfanatos, hospitais e escolas. Vacinações e doenças também ganham particular destaque, principalmente em vista das recorrentes epidemias sofridas pela província, no entanto são bem menos freqüentes as estatísticas sobre população, sua natalidade e mortalidade7. Podemos buscar nas estruturas burocráticas responsáveis pelos levantamentos estatísticos uma primeira explicação para essa ausência. Ao longo do Império, os governantes de Pernambuco reclamaram regularmente da displicência de seus subordinados, que, sendo testemunhas ex oficio de eventos cuja compilação era de interesse do governo, não se mostravam confiáveis nem como geradores dos registros primários, nem como produtores das estatísticas. Esta incapacidade (ou recusa) dos funcionários de seguir instruções explícitas, mesmo que só dissessem respeito a seus restritos domínios burocráticos, impediu a compilação regular e confiável de estatísticas agregadas para a província. O contexto mais amplo dessas dificuldades remete, sem dúvida, aos embates entre as múltiplas estruturas burocráticas (a politico-administrativa, a eclesiástica, a judicial, a policial, a militar) e, atravessando essas mesmas estruturas, entre os divergentes interesses de segmentos sociais. É ilustrativa a impotência de Francisco do Rego Barros, presidente de Pernambuco, em sua fala por ocasião da abertura da Assembléia Legislativa Provincial, em 1838: “STATISTICA – He este, Snrs., um dos ramos da Sciencia Administrativa, que mais em atraso se acha em nossa Provincia, e que entre tanto muito deve coadjuvar o Governo em suas providencias. Pouco acostumados á estes trabalhos os Empregados Publicos deixão quazi sempre, sob diversos pretextos de cumprir as ordens que lhe são expedidas para a organisação ao menos de certas partes da statistica geral, não obstante ser esta uma das attribuições dos seus respectivos Cargos, certos como estão de que a authoridade se cançará de ordenar” (Pernambuco. Presidente, 1838:53).

No relatório do ano seguinte, Rego Barros demonstra seu correto entendimento do que seriam estatísticas úteis ao governo e nomeia os inoperantes responsáveis diretos por sua produção:

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Foram consultados os relatórios a partir de 1838, quando se inicia a série disponibilizada pelo Brazilian Government Document Digitization Project do Center for Research Libraries (www.crl.edu).

“A reconhecida necessidade de uma Statistica provincial, e as difficuldades com que o Governo luta para organisal-a do melhor modo possível, me obrigão a pedir segunda vez os necessarios meios para a confecção de uma obra de tanta magnitude sobre as bases, que vos forão apresentadas no passado Relatorio. O Governo Provincial deo aos Vigarios e Juizes de Direito os modellos dos mappas, que deverião remetter, os primeiros de todos os casamentos, obitos e baptisados, que tiveram lugar em suas Freguesias, e os segundos de todos os Reos (...) a fim de que, sendo uniformes os mappas, podessem ser organisados os Mappas Geraes com as indicações, que forão julgadas necessarias. (Pernambuco. Presidente, 1839:38-39)”

Dois anos depois (no início de 1841), talvez descrente na capacidade da sua estrutura oficial, contrata com o secretário da província, Figueira de Mello, a feitura das estatísticas tão almejadas8. Em seu último relatório como presidente (1844), Rego Barros (já Barão da Boa Vista), após o recorde de 7 anos como presidente da província, relata que concedeu a Figueira de Mello prorrogação de mais um ano em seu contrato para que pudesse concluí-la, já que este ocupava, na época, a presidência da província do Maranhão9. Seu sucessor decide por nova prorrogação, de 2 anos agora, alegando que “as continuadas occupações deste Empregado o tem inhibido de cumprir o seu contracto dentro do tempo marcado”, mas também por “lhe não haverem sido subministrados todos os esclarecimentos por elle pedidos” (Pernambuco. Presidente, 1845:16). O funcionário público, individualmente contratado para produzir a estatística oficial da província, continua na dependência da estrutura de governo para as informações locais e de funcionários que “nenhum zelo ... põem em sua confecção...”. Em 1845, quatro anos depois de sua assinatura, a Assembléia Provincial, agora comandada por inimigos políticos10, resolveu buscar a rescisão judicial do contrato com Figueira de Mello, o que, contudo, lhe foi negado pela justiça (Pernambuco. Presidente, 1845:16). Neste mesmo ano, aparece longo artigo no Diário de Pernambuco, com autor anônimo, dissertando sobre a população provincial e 8

“Com o Secretario da Provincia contratei a confecção de huma Statistica na parte tão somente civil, e politica, e segundo hum programma, que lhe foi dado, vencendo elle a quantia de rs.4:000$000, consignados na Lei Provincial Nº87, Art.36, e ficando a obra sua propriedade. He de esperar que os seus trabalhos mereção a approvação dos homens, que se interessão pelo progresso dos conhecimentos statisticos do Paiz.” (Pernambuco. Presidente, 1841:7) Conforme relata Maria Luíza Marcílio, houve contratações semelhantes em São Paulo (1836) e, posteriormente, em Alagoas (1856) (Marcílio, 2000:412). Neste texto, no entanto, a autora não menciona Pernambuco. 9 “Estando á findar-se o prazo, em que devia ser apresentada a Estatistica d’esta Provincia, requereo o encarregado d’ella uma prorrogação. Attendendo á gavidade da commissão, que lhe foi incumbida pelo Governo Imperial, ha mais de um anno, e ao nenhum tempo, que resta ao Presidente de uma Provincia consideravel, como a do Maranhão, para empregar-se em qualquer outro objeto, e ainda menos na Estatistica civil, e politica de outra Provincia mais populosa, concedi-lhe um anno de prorrogaçao para ultimar tão importante trabalho, cuja falta, em geral, até hoje sente todo o Brasil” (Pernambuco. Presidente, 1844:17). Figueira de Mello apresentou o relatório da presidência do Maranhão em 7/9/1843, mas já não mais exercia o cargo em junho de 1844. 10 Figueira de Mello diz em introdução a seu Ensaio:”Na desgraçada época em que vivemos, divididos por partidos intolerantes e extremados, ralados de profundos ódios pessoais, alheios inteiramente a todas as idéias de bem público; em uma época em que as idéias políticas e as relações particulares servem de fundamento a mil prejuízos...” e mais “Estando a Presidência obrigada pelo contrato a ministrar-nos todos os documentos que pedíssemos, ela limitou-se, e com especialidade no tempo do Sr.Chichorro, a expedir as ordens precisas, sem se importar um só instante de exigir o seu exato e pronto cumprimento, nem de repreender, ao menos, a um só empregado que as desprezara, apesar de nossas contínuas reclamações.” (Mello, 1979:25-29)

suas estimativas, transcrito do jornal Minerva Brasiliense, publicado no Rio de Janeiro. Seu autor foi sem dúvida Figueira de Mello, pois o texto corresponde precisamente ao do seu estudo, publicado em 1852 (Mello, 1975:435-448). É interessante constatarmos que um dos criadores do Minerva Brasiliense, Joaquim Norberto de Souza e Silva, iria escrever, nas décadas seguintes, importantes estudos sobre estatísticas populacionais, inclusive o relatório que se tornou uma das principais referências brasileiras sobre recenseamentos gerais, onde, na seção sobre Pernambuco, transcreve integralmente o texto de Figueira de Mello, a quem atribui “erudição e conhecimento na materia”11. Apesar da divulgação do artigo de jornal quatro anos antes, o trabalho é dado oficialmente como concluído em 1849, mas ficou sem ser publicado, possivelmente engavetado por presidentes menos interessados no tema (ou espicaçados pelo “furo” do Diário), já que em 1850 o autor ainda reclama sua publicação, prevista no contrato.

Tem sua publicação iniciada em 1852 (possivelmente ainda

inacabada dez ano depois), tornando-se desde então referência essencial sobre o assunto12. A sistemática dificuldade para reunir informações completas sobre toda a província é notória. No levantamento provincial promovido em 1838, o relatório dá uma população total de pouco mais de 289 mil habitantes. Figueira de Mello, que, na qualidade de secretário da província, assinava o resultado desse levantamento, criticou, comarca a comarca, os dados subestimados, chegando à conclusão de que a população de Pernambuco na realidade não poderia ser menor do que 620 mil !13 No relatório dos Negócios do Império de 1848, o Ministro escreve: “População – Subsistem ainda todas as difficuldades que de ha muito obstão á organisação de hum quadro estatistico da população do Imperio, e seria ocioso enumera-las, tendo-o feito os Relatorios anteriores. De raras Provincias tem vindo alguns trabalhos que se approximem á exactidão; de outras, e entre estas a mais populosa do Imperio, nenhuns dados se tem recebido, taes são as de Minas, Pernambuco, S.Paulo, e Ceará; da Bahia ha apenas o arrolamento de 14 dos seus 60 Municipios; 11

(Silva, 1870). Outros dos criadores do Minerva Brasiliense foram Francisco de Salles Torres Homem e Francisco Bernardino Ribeiro (Brasil. Biblioteca Nacional, 1881:438-9#5139). 12 “Tendo o dezembargador Jeronymo Martiniano Figueira de Mello concluído o trabalho, de que fora incumbido pelo contracto celebrado em 27 de fevereiro de 1841 em virtude da lei provincial n.87 de 6 de Maio do anno anterior, e recebido em 23 de Junho de 1849 o premio ajustado, reclama o cumprimento do art.3º do contracto na parte em que dispõe que a impressão da obra seja feita á custa dos cofres provinciaes.” (Pernambuco. Presidente, 1851:31) (Mello, 1979). (Galloway, 1968) escreve que “This book was never published. After the proofs were prepared, the printer’s blocks were destroyed in a fire. A copy of the proofs, with the author’s corrections, can be consulted in the library of the Colégio Estadual, Rua da Aurora, Recife, Pernambuco.” [“Este livro nunca foi publicado. Depois de preparadas as provas, as formas foram queimadas num incêndio. Uma cópia dessas provas, com as correções do autor, pode ser consultada na biblioteca do Colégio Estadual, na rua da Aurora, Recife, Pernambuco.”] O relatório de Souza e Silva (1870) também transcrece o texto de Figueira de Mello. José Antonio Gonsalves de Mello, em seu prefácio ao Ensaio, informa que, apesar de o livro ainda não estar totalmente revisto e brochado em 1863, foram certamente publicados alguns exemplares, dentre os quais o da biblioteca do Ginásio do Recife, do qual se fez a reedição em 1979. 13 “Mappa Statistico da População da Provincia de Pernambuco no Anno de 1838” em (Pernambuco. Presidente, 1839) e (Minerva Brasiliense, 1975).

finalmente do proprio Municipio da Côrte apenas possue a Secretaria o censo da população que vos foi apresentado em 1838” (Brasil. Ministério Do Império, 1848:36).

A partir de meados do século, a criação de cemitérios públicos, inicialmente no Recife e logo em seguida por toda a Província, inicia a centralização administrativa das estatísticas de falecimentos fora da responsabilidade das paróquias. A exigência de registro para todo nascimento e óbito (bem como dos casamentos), estabelecida em 1851 e motivadora de diversas reações, em especial no Nordeste, veio concluir esse processo de criação de arcabouço legal para a compilação de estatísticas um pouco mais completas e confiáveis sobre natalidade e mortalidade. A definição precisa do número absoluto de habitantes, no entanto, continuaria a aguardar a realização do censo.

O relatório preparado por Jeronymo Martiniano Figueira de Mello como “estatística provincial” foi redigido em decorrência de contrato de 1841 com o governo da província, foi concluído em 1847, teve sua folha de rosto datada de 1852, mas em 1863, ao que consta, ainda não estava totalmente impresso. Restaram dele pouquíssimos exemplares até que o governo de Pernambuco o reeditasse em 1979. O Ensaio sobre a Estatistica Civil e Politica da Provincia de Pernambuco contém preciosas informações sobre Pernambuco nas primeiras décadas do século XIX, principalmente sobre sua população. Trata-se do único repositório agregado de dados demográficos da época e inclui estatísticas sobre população existente, óbitos, batizados e casamentos, muitas classificadas por sexo, idade, condição social e cor, em quadros separados por freguezia e comarca. Há, em especial, levantamentos detalhados da população que se prestam a análises mais pormenorizadas do que aquelas até agora realizadas. Entretanto, o próprio Figueira de Mello criticou, por subestimados, os totais que registrou nos quadros sobre população, culpando pelas falhas as estruturas burocráticas responsáveis por sua coleta: igreja, justiça e polícia. De fato, as fontes sobre estatísticas populacionais de Pernambuco no século XIX são poucas, pouco confiáveis e freqüentemente apresentam resultados incompatíveis entre si. Ao buscar reunir de forma coerente os dados necessários para produzir o compêndio estatístico contratado pelo governo provincial, o desembargador enfrentou a apatia de funcionários públicos subalternos e a oposição aguerrida de muitos de seus superiores, motivados por filiações políticas adversárias. Conseguiu, no entanto, maior quantidade de informações do que haviam sido reunidas até então. Procurou corrigir eventuais omissões nas remessas de dados demográficos pela busca de fontes alternativas e, quando plausível, pela introdução de médias referentes às freguezias faltantes. Em suas próprias palavras, na introdução à obra:

“... a Estatística é somente uma probabilidade maior ou menor, segundo o espírito de observação que presidiu à sua confecção, o cuidado que se mostrou na aquisição dos documentos, e a forma por que foi suprida a deficiência ou imperfeição de tais documentos.” (Mello, 1979:27-28)

Apesar dessas restrições – que não são poucas – aos números enquanto indicação sobre o total da população, cremos que os quadros montados por ele guardem informações relevantes, mas pouco úteis aos historiadores em seu atual formato, merecendo exploração mais detalhada do que foram alvo até o momento. Temos nos dedicado a esta tarefa, que esperamos possa transformar o esforço de Figueira de Mello em fonte mais bem utilizada sobre a população de Pernambuco na primeira metade do dezenove.

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