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CALICO

Calico corria pelas ruas sujas dos becos apertados e sujos da parte suja da cidade. As mãos banhadas em sangue e seu rosto salpicado pelo mesmo. Sua blusa já não era mais branca. A bolsa preta segura atravessada sobre peito. Depois que sentiu um suspiro de segurança parou em frente a uma lata de lixo. Vasculhou por algum pano velho ou mesmo papéis para limpar-se. Nada de útil encontrou. Soltou a bolsa no chão por alguns instantes. Retirou sua camisa e limpou-se com ela, mesmo. Jogou-a no lixo e a cobriu. Noite gelada na cidade e Calico sem camisa não iria agüentar muito nas ruas. Corpo magro e pequeno, não tinha muita resistência ao frio. Puxou sua carteira de cigarros e seu isqueiro. Assim conseguiria suportar aquela noite com mais facilidade. Tragando compulsivamente o cigarro e andando mais calmamente pelas ruas começou a recordar a cena que passara a poucos. Que loucura! – pensou ele. Tudo tinha acontecido muito rápido. Como ele poderia saber que eram policiais disfarçados? Ninguém podia. Era o trabalho dos tiras, infiltrarem-se nas organizações criminosas e desmantelá-las. Foi uma chacina. Calico não conteve as lágrimas ao lembrar-se do seu primo morrendo em seus braços. Deveria ter ficado. – murmurou a si. Mas seu primo insistira para ele pegar a bolsa e fugir dali poucos segundos antes de falecer em seus braços. Calico nunca levou jeito para o crime. Nascera para ser escritor, para viver da literatura que tanto apreciava. Inteligente e estudioso. Porém, com a morte de sua mãe, única incentivadora, e o misterioso sumiço de seu pai antes do seu nascimento, Calico ficou à mercê da vida indigna que levava. Acolhido por seus tios e primos, foi levado a um submundo cruel e mesquinho. Aos dezesseis anos matara pela primeira vez por uma mísera dívida de jogo que não pagaram a seus tios. Iniciara o negócio de drogas com seu primo mais velho o Maurício. Esse, sim,

saiu

do

ventre

de

sua

mãe

para

trazer

desgosto

a

ela

e

crueldade maleficidade aos alheios. Iniciara sua vida criminosa aos onze anos fazendo pequenos serviços ao mafioso local, conhecido como Baltazar Mão-deferro. Assumira os negócios da sua quadra aos quinze anos. E aos dezenove,

com a morte mal explicada de Baltazar, já comandava as ações criminosas de quatro quarteirões das ruas de baixo. Era, praticamente, o dono do bairro onde morava. Tinha o sangue frio, não pensava duas vezes antes de matar, se quer pensava. Deixava os assuntos financeiros e as relevâncias administrativas com Calico, que tinha frequentado até o segundo grau e tinha paciência com os números. Era firme e cauteloso, não lhe tinham meias palavras ou falsos compromissos. Cumpria o que dizia e punia aqueles que não cumpriam suas promessas com a morte. Confiava somente em si e em Calico. Agora se encontrava em um saco preto. E a culpa era de Calico – pelo menos era assim que Calico pensava. A transação com os falsos compradores parecia simples e lucrativa ao bando. Três quilos de cocaína e dez quilos de haxixe. Um pedido razoável para os compradores de costume. Um pedido razoável para nos persuadir e abocanhar.– refletiu Calico. Mas ele não entendia o porquê dos disparos sem aviso. Das prisões não efetuadas. Do banho de sangue sem prévia. Até chegara a conclusão de que era uma queima, a chamada renovação do comando da área. Alguém vendera as cabeças de seus primos aos policiais para tomar o ponto para si. Mas quem seria o mandante? Agora, Calico, estava realmente sozinho. Não lhe restara mais ninguém. Era o último de sua família. Com uma bolsa atravessada sobre seu peito, sem camisa, jeans rasgado e coturno descolado, andava sem rumo pelas vielas escuras. Pensara em se matar e acabar com aquela agonia que era e fora toda a sua vida, mas se lembrara do um milhão de dólares na bolsa preta, do olhar de seu primo antes de falecer e abandonara essa idéia de imediato. Pois, Calico, não era mais aquele jovem sonhador, aquele promissor escritor que defendia seus ideais com unhas e dentes. Calico, agora, era filho do submundo e como bom filho a lição de casa deveria ser feita. Os mandantes deveriam morrer.

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