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VIEIRA, Alberto(1996), A Autonomia XX aniversário. Breves Notas históricas,
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PARAA HISTÓRIADA AUTONOMIANA MADEIRA
Introdução A criação do conceito História da autonomia Para a História da Administrativa na Madeira Cronologia Bibliografia Textos
Autonomia
político-
"Dar autonomia à Madeira, é construi-la em unidade política e administrativa. (...) É reconhecer que a Madeira pela sua situação geográfica, pela qualidade e número das suas relações com o mundo, pelos usos e costumes do seu povo, pelo grau de desenvolvimento moral, intelectual, agrícola, industrial e comercial, adquiriu uma fisionomia própria e especiais interesses colectivos próprios, que a individualizam como região e como agregado social. Daqui surge a necessidade duma diferenciação nos processos políticos e administrativos a aplicar-lhe" (Manuel Pestana Reis, 1922)
A Autonomia é para nós uma palavra mágica. Diz tudo o que sentimos e nada do que ficou lavrado na definição dos velhos dicionários e enciclopédias. A Autonomia é uma realidade vivencial que não se compadece com a frieza dos conceitos. A Autonomia pertence-nos e só nós a entendemos, através da sua fruição diária. É o reconhecimento do estatuto de diferença dentro da unidade nacional. Sim, porque a autonomia hoje implica necessariamente esta relação umbilical. A Autonomia não é geradora de consensos: amada por uns, é odiada e incompreendida por outros. Esses outros que maldizem o nosso estatuto de diferença estão do lado dos que sempre nos amordaçaram. A Autonomia, segundo Apessoada Reis (1921), Anão é grito de revolta, mas simplesmente petição de justiça". Também, não deve ser entendida como uma conquista do momento mas sim a concretização de um direito histórico. A conjuntura realça apenas a necessidade da sua concretização como via para ultrapassar o diálogo de surdos entre o centro e a periferia, isto é a metrópole e a "colónia". Aqui, abre-se a ferida da orfandade só sarada com o reconhecimento deste estatuto de diferença. Entre a metrópole e a Acolónia@ fala-se de uma forma de escravidão, cujas mordaças só serão cortadas com a autonomia. Para o homem da primeira metade do século XIX, empenhado na luta pela abolição da escravatura, tudo o que indiciasse uma relação de subordinação era condenado e anametizado com o epíteto de escravatura. A Autonomia cresce e frutifica-se na consciencialização política e cultural dos intervenientes e projecta-se no pleno exercício dos órgãos de governo próprio. A Celebração dos vinte anos da autonomia deve ser, por isso mesmo, uma forma de apelo a essa ancestral aspiração que todos nós temos a felicidade de ver concretizada. A Autonomia mantém-se viva através da prática e do conhecimento que dela temos. Daí a necessidade de sondar o passado para compreender o presente e construir o futuro. Divulgar a História e debater a realidade sócio-política que ela encerra é também construir a autonomia. A Autonomia, na verdade, não se esgota na dimensão política, pois precisa da histórica e cultural que a enformam e lhe retiram a carga negativa do imediatismo. A Autonomia, enfim, é uma conquista fruto de várias batalhas do passado e presente. Recordá-la é carregar energias para embates presentes e futuros.
A 20 de Outubro de 1922 lia-se no Diário de Notícias que "no dia em que for decretada a completa autonomia, ter-se-á descoberto a Madeira pela segunda vez". O momento era oportuno para esta associação. Comemorava-se, então, o V Centenário do descobrimento da Madeira. A isto juntava-se o fervor dos intelectuais e políticos madeirenses na defesa da autonomia. Os jornais abriramse ao debate, marcado pela defesa de uma ampla autonomia, condição necessária para a evocação do sucesso destes cinco séculos de História. Daqui surgiu a ideia dos partidos regionalista que, depois, se desfizeram com o fascínio do Estado Novo. Num folheto evocativo do quinto centenário do descobrimento da ilha, coordenado pelo Padre Fernando Augusto de Silva, foi feito o panegírico à autonomia, pela pena de Manuel Pestana Reis. Aliás, o autor começa o seu texto com a evocação da descoberta henriquina:" há quinhentos anos as caravelas do infante entregaram às penedias da ilha, os primeiros povoadores. (...) Em quinhentos anos a árvore genealógica dos primeiros povoadores desenvolveuse em linha recta. Os madeirenses não podem renegar a Pátria pela razão natural de não poderem negar a Raça". Daqui resulta que a História estabelece esta relação umbilical mas também projecta a autonomia, a nossa carta de alforria. Nada disto era estranho à sociedade madeirense da década de vinte, um dos mais promissores momentos de debate e reivindicação da autonomia. A crise económica foi a origem de tudo isto, porque era nestes momentos que mais se fazia sentir o opressivo abandono a que a ilha fora votada pela metrópole. E a situação era mais grave quando as receitas do estado arrecadadas na ilha eram conduzidas para Lisboa e usadas em empreendimentos, como o do porto de Leixões. A história da autonomia tem neste primeiro quartel do século uma página dourada. Lamentavelmente, este debate foi sol de pouca dura pois que se afogou na esperança adiada, que foi o Estado Novo. Este apagou a autonomia o político e procurou trazer para o seu seio alguns dos principais arautos, como foi o caso de Manuel Pestana Reis. A autonomia ficou adormecida até que nova mudança política veio trazer ao de cima esta ancestral reivindicação que nos possibilitou as armas para vencer os desafios do presente e projectar os rumos do futuro. Não sabemos se aqueles que estabeleceram o dia 1 de Julho, como o da Região Autónoma e, acima de tudo, da autonomia tiveram por inspiração o texto de Manuel Pestana Reis e todo o debate da década de vinte. Copiada ou original, esta decisão merece o nosso aplauso. A 1 de Julho evoca-se (ainda que para muitos esta data da descoberta oficial ofereça dúvidas) o descobrimento português da Madeira. É o momento de encontro dos navegadores quatrocentistas com o espesso negrume. Este singelo gesto permitiu que a Ilha se projectasse no mundo luso como a primeira jóia atlântica.
A autonomia, finalmente conseguida com a constituição de 1976, é a segunda descoberta da Madeira. Isto é, a Europa descobriu este estatuto de diferença e o madeirense revelou-se a si próprio nas suas capacidades de auto governo. Deste modo autonomia combina com descobrimento e a esta coincidência num só dia de comemoração não deve ser entendida como ocasional. Abril de 1976 trouxenos a segunda descoberta. Agora, resta saber se o futuro nos reserva novas descobertas para que a autonomia continue a sua marcha. A autonomia pode ser enquadrada na tradição localista, materializada no municipalismo. A criação desta estrutura descentralizada de poder obedece precisamente a essa necessidade de aproximação dos governados aos governantes. Note-se que antes das transformações ocorridas no século dezanove reconhecia-se ao município o carácter autónomo da administração, sendo o seu poder assente na jurisdição local (foral e posturas) e no exercício dos magistrados eleitos. Por isso, recordar a autonomia será também o recordar desta multissecular instituição. A autonomia é hoje a mais perfeita materialização da dimensão regional e a melhor via para a solução dos seus problemas. Ela fundamenta-se na História, afirma-se pela consciencialização política e cultural dos seus intervenientes e projecta-se no pleno exercício dos órgãos de governo próprio. Hoje podemos dizer que a autonomia política não é uma palavra vã e que nos foi dada a possibilidade de afirmação da nossa vontade e especificidades próprias. E, tal como referiu M. Pestana Reis em 1922, podemos repetir hoje com segurança que "a autonomia não é um grito de revolta, mas simples petição de justiça. Adquirimos direitos, exigimos que os reconheçam e nos garantam o seu livre gozo e exercício".
A criação do conceito e a realidade envolvente
AUTONOMIA é um conceito polifacetado com múltiplos significados, todos de acordo com a posição do seu emissor. Fala-se em autonomia política, administrativa, da junção das duas; da autonomia especial ou ordinária (caso da constituição italiana de 1948); da autonomia ao nível filosófico e psicológico. O político, o economista, o historiador poucas vezes estão de acordo sobre isso. Cada qual vê o fenómeno pelo seu primaz, intencionalmente reducionista. Para a historiografia o conceito adquire varias matizes conforme o momento histórico a que se orienta a nossa análise: no antigo regime tem contornos jurídico-constitucionais distintos daqueles que terá com o advento do movimento liberal. É, aliás, em fins do século XIX que o conceito ganha a necessária consistência jurídica, sendo para ingleses e americanos o @home rule@. A autonomia é a mais perfeita materialização dos nossos ensejos e a melhor solução para os seus problemas. Ela fundamenta-se na História, afirma-se pela consciencialização política e cultural dos seus intervenientes e projecta-se no pleno exercício dos órgãos de governo próprio. O conceito, na sua expressão actual, é uma conquista do século dezanove mas não será anacronismo o seu uso para momentos anteriores, desde que lhe seja atribuído um significado adequado. Anacrónica é sim a projecção do seu actual significado às conjunturas passadas. Deste modo, a primeira preocupação do historiador está em questionar a documentação para extrair a definição que mais se coaduna com o ambiente da época. A autonomia (o nomos do grego pode significar região, província, usos e costumes), que surgiu na Grécia antiga por oposição à alteronomia e anomia, é o direito de uma região governar-se por leis próprias. Filipo foi o primeiro exemplo disso. De acordo com S. Tomás de Aquino a sociedade assemelhava-se a um organismo cujo bem-estar resultava do exercício autónomo das suas funções. Esta visão antropomórfica da sociedade tinha implicações na organização política da autonomia funcional, que quer significar "jurisdictio", isto é, poder de fazer leis e posturas, julgar e emitir ordens. É a partir daqui que se extrai a ideia cooperativa de sociedade que marcou a evolução das nossas instituições. Por isso mesmo, ao longo do processo histórico variam apenas as formas da sua expressão institucional.
O outro nível importa destacar que a autonomia não é só nossa, ela expressa-se de uma forma difusa em diversos espaços e tem um porvir semelhante em regiões insulares ou não. Deste modo a análise da "nossa" autonomia deve ser enquadrada no contexto global: a nossa e a dos outros, próximos ou afastados. Este é um posicionamento que não temos visto no discurso histórico e, também, político, da autonomia. É necessária uma nova postura, aberta aos outros, e um reenquadrar do fenómeno no contexto do mundo actual e da sua emergência no devir histórico global, com especial relevo para o espaço mediterrânico, aqui considerado como o berço da autonomia. A actual autonomia das regiões insulares portuguesas ficou consagrada na constituição de 1976. Os argumentos justificativos deste processo não são novos, nem tão pouco se esgotam com o texto da nossa constituição. À partida esta argumentação leva-nos a colocar algumas questões para reflexão. Serão as "históricas aspirações autonomistas das populações insulares" mera criação e mistificação abrilista, como o afirma Fernando Jasmins Pereira, ou então uma realidade palpável do nosso devir histórico? Só quem desconhece o debate resultante da Revolução liberal e da Republica poderá ficcionar esta realidade. Todavia, o parágrafo da constituição não restringe o fundamento da autonomia apenas a isso, pois fala também em especificidades de ordem económica, social e cultural (este último acrescentado com a revisão). São estas também invenção do legislador? Note-se que a região não se define apenas por uma homogeneidade de condições e co-sistémicas. Ela é mais do que isso, sendo uma realidade sentida e vivida pelos seus habitantes. É, no entender de André Frémont, o "espaço vivido". A isto acrescenta Juan Beneyto a dimensão histórico e cultural. A história é mesmo o cimento desta solidariedade. Por isso, não são apenas as condições de uniformidade do espaço que a definem, mas, acima de tudo, a consciência colectiva daí resultante. A região é uma totalidade espácio-humana. A ilha assume-se como uma região particular, tendo uma identidade própria. É, no entender de Lucien Febvre, um "pequeno quadro natural". É por si só uma unidade social, económica e política, constituindo uma forma singular de ser mundo. O mar, factor de aproximação e isolamento, é o principal gerador dessa individualização. Por tudo isto é possível falar do mundo insular, assente numa singular personalidade, numa particular cosmovisão, ou melhor ainda, numa forma de ser e estar no mundo. Folheando os múltiplos textos que definem o processo autonómico na bacia mediterrânica é evidente a valorização das dominantes geográficas e históricas. Para a constituição italiana (1948) existem dois tipos de regiões, às quais é atribuída uma autonomia diversa. A espanhola de 1982 diferencia três formas de expressão: 1. regiões definidas por "características históricas, culturais e económicas comuns"; 2.os territórios insulares; 3.as "províncias com identidade regional histórica". A constituição apresenta-a, ainda, como resultado de uma "entidade regional histórica". Depois os estatutos de cada região dão a
justificação: em 1982 nas Canárias a autonomia é apresentada como a "expressão da sua identidade", enquanto nas Baleares em 1983 fala-se em "identidade histórica". Entretanto em França os estatutos da Córsega de 1982 definem uma organização político-institucional específica, fundamentada na geografia e História. A distância geográfica e a diferença territorial inviabilizam uma eficaz acção governativa desde o centro (o Terreiro do Paço). Estas condições radicam o direito à diferença na orgânica governativa e são factor de promoção do desenvolvimento. A ideia está expressa na lei fundamental, mas também foi percebida pelos defensores da autonomia em épocas anteriores: aristides da Mota para os Açores (1892) e Manuel Pestana Reis na Madeira (1922).
A História da Autonomia
A aspiração da autonomia nasceu com o homem, mas foi com a civilização grega que ela mereceu a necessária teorização política e aplicação prática. As cidades-estados, as províncias romanas, poderão ser a sua expressão. As primeiras têm continuidade nas cidades italianas, situação só desfeita no século dezanove com a formação do reino de Itália (1856-70). O Senhorialismo medieval deu continuidade a esse processo. Mas tudo se esboroou com o advento dos tempos modernos. As teses de Maquiavel e Jean Bodin foram o seu suporte. O caso da vizinha Espanha em 1492, com a conquista de Granada e a total unificação dos reinos, é exemplo disso. Mas o movimento continuou Europa fora. As disputas autonómicas entraram na ordem do dia da política europeia a partir do século XVII, dando-nos exemplo a Irlanda. Todavia, foi só em 1885 que se discutiu o AHome Rule@ por Charles Parnell, aprovado só em 1893 e levado à prática em 1914. Esta política surgira nos EUA em 1872 com John F. Dillon. Antes disso tivemos em 1755 na Córsega o movimento autonomista liderado por Pascal Paoli que conduziu ao projecto não concretizado da independência a 8 de Maio de 1769. A Revolução francesa não deu continuidade às teorias federalistas dos EUA, antes pelo contrário, procurou reforçar a estrutura centralista do poder. Esta onda varreu, no século seguinte, toda a Europa. A oposição a isso surgiu apenas nos alvores do século XX, contrariada, pelo comunismo e nazismo (1933-45), e a conjuntura difícil das guerras mundiais. Passada a guerra, a autonomia foi um facto e o regionalismo passou para a ordem do dia: a Sicília tornou-se região autónoma em 15 de Maio de 1946; os ideais regionalistas passaram para a ordem do dia do debate político, a partir da década de setenta.
AUTONOMIA NA HISTÓRIA DE PORTUGAL
Segundo Borges de Macedo a tradição de ampla autonomia dos "poderes políticos periféricos" é antiga e está enraizada na História Portuguesa. Mas, não sucede apenas entre nós, também em Espanha e Itália. Aliás o nascimento de Portugal radica-se nessa opção autonomista do antigo regime. Em Itália, tenha-se em consideração o peso das cidades-estado e o reverso da medalha com o movimento de reunificação do século XIX. Na vizinha Espanha as Cortes de Tortosa em 1400 são os marcos emblemáticos da autonomia da Catalunha, Aragão e Valença, sendo 1492 o princípio do uniformismo peninsular, que tem em 1580 o seu ponto máximo. E o processo regressivo da autonomia continuou até ao século XX. Ela é cerceada com o avanço do processo histórico, demarcado, primeiro pelo despotismo iluminado e, finalmente, com o liberalismo, o momento máximo dessa tendência do processo de centralização do poder. A república mais não fez que lhe dar continuidade. A tradição localista, materializada no municipalismo, não chega, por razões várias, a adquirir uma dimensão regional. Tudo isto foi resultado do processo de transformação do edifício institucional do Antigo Regime. Neste contexto a conjuntura política que serve de base aos descobrimentos, momento de aparecimento das ilhas, é o início do esmorecimento desta virtual autonomia, o princípio para a afirmação da centralização expressa nos séculos XVII e XVIII. O regimento das eleições de 1670 materializa essa opção ao definir uma maior intervenção da coroa na estrutura institucional. Esta situação é secundada pela lei de 16 de Maio de 1832, que retira todos os poderes executivos aos municípios. O município subordina-se ao provedor, funcionário de nomeação régia. Depois, é o aparecimento dos distritos pela lei de 25 de Abril de 1835, fundamentado pelo código administrativo de Passos Manuel (1836) que define uma hierarquia institucional: 1. distritos, 2. Municípios, 3. Freguesia. A perda de autonomia do município acentua-se na República e prolonga-se com o Estado Novo (1936). Mesmo assim as ilhas usufruíram, no século XV, de condições especiais que as diferenciam das demais partes do reino. Surge, assim, o senhorio e a capitania (1433). As cartas de doação definem a precariedade desse processo e a capacidade de mandar e julgar e nunca de legislar. Neste último aspecto deveriam os capitães sujeitar-se aos forais ou regimentos gerais do reino. Esta capacidade de legislar surgiu apenas com a afirmação do município. As posturas são a materialização desse anseio, sendo os seus capítulos uma tentativa de dar voz às legítimas aspirações de uma região, no caso a área do município. A criação desta estrutura descentralizada de poder obedece precisamente a isso. A ela se reconhece o carácter autónomo da administração,
sendo o seu poder assente na jurisdição local (foral e posturas) e no exercício dos magistrados eleitos. Destes últimos, os juízes estavam acometidos de alguma capacidade jurisdicional. A afirmação desta capacidade autonómica avança de acordo com o progresso sócio-económico da ilha e das dificuldades de alcançar os centros de decisão. Mais uma vez a geografia é condicionante. Sucede assim na Ponta do Sol (1501), Calheta (1502), S. Vicente (1743). No caso de Santa Cruz (1515) são mais razões sócio-económicas. Em todas as cartas de criação dos três primeiros municípios é expressamente referida a dificuldade de comunicação com a sede do município, no Funchal ou em Machico. Os alvores do século XVI marcaram um passo atrás neste movimento. Há uma nítida afirmação do poder régio: acabou o senhorio (1498), surgem nova figuras institucionais subordinadas à coroa (corregedor, Provedoria...). Tudo isto abriu caminho para o palco da centralização régia. A situação piora com o domínio filipino, ao surgir uma figura - o geral - que centraliza todos os poderes na ilha, tendo continuidade até ao século XVIII. O sistema definido pelo Marquês de Pombal em 1766 é a materialização disso. O primeiro golpe contra o centralismo político absolutista teve lugar em 1822, mas depois desfez-se no calor da luta partidária. Depois, foi o desabrochar da consciência dos interesses locais e a luta por uma alteração da orgânica de poder, apagados com a República e Estado Novo A crise económica da segunda metade do século XIX foi a ambiência geradora deste movimento. Ora, sendo a autonomia indissociável do problema de como governar o arquipélago, é natural que ela surja, com maior evidência, em momentos de crise. É precisamente que se sente a distância entre os centros de decisão e o lugar. Todavia, a autonomia não é resultado disso, mas é a partir daí que ela emana e torna-se inteligível, por consequência, não é uma necessidade de momento, mas uma aspiração e um direito histórico. É, aliás, nestas conjunturas difíceis que o discurso autonomista se enraíza na classe política e na população, expressando-se em revoltas (do leite, da farinha...) contra a intervenção centralizadora do governo, ou nos discursos e manifestos inflamados dos políticos. O discurso autonomista, difundido na imprensa ou nas tribunas parlamentares, é quase sempre o mesmo. A crise é resultado da situação institucional, que não permite respostas rápidas, por isso era necessário encontrar uma alternativa, através de um governo próximo, capaz e eficiente. Depois, este ideal reforça-se com o sentimento base de desprezo, manifesto na ingratidão da pátria, na imagem de um povo sofredor e órfão, sendo a autonomia o caminho para a metrópole assumir da adequada paternidade. A análise da maioria das intervenções evidencia a falta de originalidade na produção ideológica. Acresce também que este movimento não adquiriu a adequada consciência política capaz de fazer singrar essa opção política em
pleno. O grande momento de debate entre nós foi o primeiro quartel do nosso século. A principal diferença entre o processo autonómico nos Açores e Madeira radica-se na fraca dimensão do movimento político-cultural que lhe serviu de base. Nos Açores a sua expressão, sobre a forma de bairrismo das ilhas ou distritos do arquipélago, favoreceu a discussão e a anterior elaboração de uma autonomia administrativa em 1895. O debate sobre a divisão administrativa do arquipélago, desde a revolução liberal, favoreceu essa discussão. Mas, também foi o bairrismo o principal obstáculo à sua afirmação.
PARA A HISTÓRIA DA AUTONOMIA POLÍTICO-ADMINISTRATIVA NA MADEIRA
A verdadeira consciência da autonomia, da qual somos hoje herdeiros, nasce na ilha no primeiro quartel do nosso século e tem, de certeza como vaga de fundo o processo desencadeado nos Açores a partir de 1895 e a ingente crise económica que então se vivia. O caso da nossa ilha é significativo. A Madeira que, desde muito cedo, adquiriu a sua consciência política viu-se, de repente com o Estado Novo envolta numa quase secular penumbra. A crise, que se arrastava desde meados do século XIX, não encontrou na presente centúria qualquer resposta concreta da sociedade política. A pertinácia de alguns, na luta por um projecto integrado de desenvolvimento, como foi o caso do Visconde da Ribeira Brava não encontraram na sociedade política capacidade para carrear estes desafios.
A ilha, no limiar do primeiro quartel do século, estava a braços com uma profunda crise: a aguardar solução para as suas tradicionais exportações (vinho, bordados e vimes) com uma agricultura moribunda a aguardar por grandes projectos de aproveitamento hídrico e traçado viário, ficará por algum tempo entregue a si própria. Algo se avançou neste domínio mas muito mais ficou a aguardar solução. Tardavam as soluções mas também os gritos lancinantes do ilhéu não chegam ao Terreiro do Paço. Esta conjuntura de crise foi o alento gerador dos ideais autonómicos, o cadinho onde germinou a consciência política da autonomia, brevemente abafada pelo Estado Novo. As opções estavam perfeitamente delineadas. A concentração e distância do poder não favoreciam a pronta resposta aos problemas e geravam nos madeirenses a desconfiança aos políticos centralistas. O centralismo, que ficou conhecido pela designação de Terreiro do Paço, é o estigma que cavou o fosso multissecular entre nós, insulares, e a terra mãe. Esta condição foi considerada pelos liberais madeirenses como uma forma de escravidão. Em 1822, dizia o articulista do Patriota Funchalense, "A escravidão consiste em viver algum sujeito absolutamente à vontade de outrem; uma província, que deve sujeitar seus interesses aos da metrópole, que a seu turno a não interessa, deixa de ser província, he de facto colónia e vive escrava". E para soltar os grilhões que mantinham esta histórica servidão, o madeirense bateu-se em diversos momentos sem o alcançar. Na Madeira a autonomia ganhou letra de forma no plano constitucional em 8 de Agosto de 1901, quando Hintze
Ribeiro assinou o primeiro decreto concedendo à Madeira o estatuto atribuído em 1895 aos distritos de Ponta Delgada e Angra do Heroísmo. A crise agravou-se e as soluções ficaram a vegetar nos gabinetes. Com isto adveio a desconfiança popular: a revolta da farinha (Fevereiro de 1931) e do leite (1936). E, neste intervalo de tempo, tivemos de suportar a culpa de uma revolução falhada dos deportados do regime (a 4 de Abril de 1931), onde os ideais autonomistas se misturaram com a militância republicana dos deportados. O governo da ditadura procurou desvalorizar a reivindicação autonómica expressa por muitos dos madeirenses aderentes ao movimento, acusando-os de independentistas. Estes são alguns dos espinhos que atingiram o Estado Novo e testemunham a nossa luta pela liberdade e democracia. Nada disto foi esquecido pelo Dr. Oliveira Salazar que como ministro das Finanças e, depois, presidente do conselho, resolveu vingar-se da rebeldia insular com o ataque à autonomia e no abandono a que fomos votados, não obstante algumas medidas de cosmética que não conseguiram solucionar os problemas mas apenas adiar. Mais, tentouse apagar a forte consciência autonómica que animou a politica madeirense nos anos vinte. A Junta Geral é a expressão desta nova realidade, adquirindo nas ilhas uma estrutura distinta na sua organização e funcionamento. Todavia esta autonomia administrativa não convenceu os madeirenses. À crise política junta-se a económica, esta última agravada com a primeira grande guerra. O isolamento a que ficou votada a ilha testemunha mais uma vez a orfandade da mãe-pátria. Deste modo em 1917 a autonomia surge como uma emanação prática. A solução da crise passa por uma autonomia, aqui considerada como a via para a solução desses problemas. No post-guerra mantiveram-se os problemas a acalentar a opção autonómica. As comemorações do descobrimento da ilha em 1922 serviram de pano de fundo para nova reivindicação da autonomia. No folheto evocativo da efeméride Manuel Pestana Reis lançou o mote. O debate passou às páginas dos jornais. Foi o responsável da comissão executiva da Junta Geral, Dr. Fernando Tolentino da Costa, quem reclamou perante o presidente da República de passagem na ilha, a revisão do estatuto de autonomia das ilhas. A intenção era criar um grande movimento em prol da autonomia, trazendo também os açorianos para esta causa. Em 16 de Dezembro os madeirenses, convocados pela Junta Geral, reúnem-se em assembleia para discutir a questão da autonomia. Das opções postas na mesa sobressaem as de Manuel Pestana Reis que remetem para uma autonomia administrativa muito mais ampla. Uma das apostas era a capacidade de legislar, só conseguida em 1976. Este entusiasmo levou mesmo à ideia de criação de partidos regionais. Todavia, a conturbada vida política nacional fez acicatar as rivalidades e intriga política, esmorecendo a autonomia. Deste modo as intenções de revisão do estatuto das ilhas ficaram adiadas até ao Governo saído do golpe de estado de 1926. Foi em 1928 que as ilhas tiveram novo estatuto. Os poderes das juntas são ampliados
mas estão longe das propostas avançadas em 1922. Isto marca o início da solução política que tomará corpo com o Estado Novo. O fervor autonomista foi abafado pela retórica do principal apaziguado do Governo da Ditadura, o Dr. Oliveira Salazar. Os autonomistas de 1922, como Manuel Pestana Reis, acomodaram-se a um estatuto de fiéis seguidores do novo regime.
A constituição de 1933 dava mostra de deliberado empenho de Estado Novo em conter o movimento autonómico ao declarar a intenção de estabelecer um estatuto especial para as ilhas, o que veio a acontecer em 1939 com o estatuto dos distritos autonómicos das ilhas adjacentes, da responsabilidade do Prof. Marcelo Caetano. A isto sucederam-se revisões em 1940 e 1947. Neste lapso de tempo esmoreceu a reclamação autonomista e só em 1969 surge com novo fulgor através de uma exposição de um grupo de cidadãos apresentada ao governador a 22 de Abril. A questão do Planeamento Regional, estabelecido por decreto de 11 de Março é o mote para este debate que tem reflexo nas páginas do jornal AO Comércio do Funchal@, e, depois, estende-se ao AEco do Funchal@ e AVoz da Madeira@. Entretanto, nos Açores sucederamse as semanas de estudo que aglutinam as forças perdidas do movimento autonómico. A comunhão de interesses deu origem à cimeira insular no Funchal, convocada pelo nosso governador para 29 a 31 de Maio de 1970. A "primavera marcelista" foi apenas uma fugaz esperança e a consagração da figura da região autónoma, da revisão constitucional de 1971 só abrange o Ultramar. As ilhas tiveram que esperar mais cinco anos. Em todos os momentos da nossa História recente havia consciência plena da importância que assumia para o arquipélago a tão almejada autonomia, mas só com o processo democrático decorrente de vinte e cinco de Abril de 1974 foi possível a sua concretização. Para trás ficaram as camufladas opções do Estado Novo e a humilhante designação de ilhas adjacentes. A constituição de 1933 previa um estatuto especial, estabelecido em 1940. Aqui ficou expressa a visão corporativista do estado que fez passar à História algumas conquistas anteriores. Foi na chamada Primavera marcelista que se deu um passo em frente com as chamadas estruturas de Planeamento Regional, que pretendia fazer o levantamento dos problemas e o equacionar das soluções ao nível local. A luta contra o regime político caído em 1974 esteve muitas vezes ligada à batalha pela autonomia. Desde a década de vinte que se haviam bloqueado todas as saídas. Por isso a queda do regime abriu a porta para a afirmação dos impulsos autonomistas, refreados por mais de cinquenta anos. O vinte e cinco de Abril é o princípio do processo de mudança, legitimado em pleno com a Constituição da República de 1976. Pela primeira vez na História de Portugal a autonomia política não é uma palavra vã e às ilhas foi dada a possibilidade de afirmação da sua vontade e especificidades próprias. Deste modo, para nós, madeirenses, o vinte e cinco de Abril de 1974 é também sinónimo de
autonomia. Ele pode ser definido pela seguinte trilogia: liberdade, democracia e autonomia. Foi, na verdade, um virar de página e, por isso, assume particular significado. Para trás ficou um passado de sofrimento e de angústia, mas também de luta permanente pelos nossos interesses e direitos políticos. Foi o começo de uma nova era na História do nosso arquipélago. Em 1922 autonomia confundia-se com descoberta, ansiando-se por uma segunda descoberta da ilha. Hoje, passados setenta e quatro anos podemos testemunhar esse momento histórico, consequência do vinte e cinco de Abril. Estamos perante a segunda descoberta da Madeira. Nos princípios do século XV os portugueses revelaram ao mundo este rincão e colocaram-no na periferia dos grandes centros económicos e políticos. Com isto agravou-se a situação de dependência e abandono. Com a autonomia, consagrada na Constituição de 1976, fomos confrontados com uma nova descoberta. Isto é a Europa descobriu o estatuto de diferença e o madeirense revelou-se a si próprio nas suas capacidades de auto governo. O império desfez-se. A metrópole deixou de deter o total controlo político sobre a periferia. O nosso sonho tornou-se realidade. As nossas frustrações passaram a desafios. A autonomia, uma aspiração incessantemente adiada ou camuflada de acordo com a conjuntura e interesses políticos, foi assumida e concretizada, possibilitando-nos as armas para vencer os desafios do presente e projectarmos os rumos do futuro. Não mais a solução dos nossos reais problemas terá de passar pelo crivo de alguém distante. Todos eles têm ou podem ter resposta no momento certo em instituições próprias. É esta capacidade de opção, de definir o rumo e de encontrar soluções para o dia a dia. Que nos permite aquilatar quão importante é para nós esta data. Ela não deve ser entendida como um corte com o passado, mas sim a passagem daquilo que nos impuseram para o que queremos ser e estamos a construir. Hoje somos uma região autónoma, com governo e assembleia legislativa própria, e os resultados desta nova realidade política são evidentes ao nível da economia. As grandes vias de caminho para o futuro estão lançadas. Os problemas que no passado deram força ao movimento autonómico, de um modo geral, estão sanados e a sua solução é a prova mais evidente do reforço e defesa da autonomia.
CRONOLOGIA (acontecimentos e documentos) 1892/Março/ 31 - Aristides de Mota apresenta à Câmara dos deputados o projecto de regime autonómico para os Açores. 1895/Março/ 2 - Decreto concedendo a autonomia administrativa aos Distritos Açorianos. 1901/Maio/ 22 - Carta de lei modificando algumas das disposições do decreto de 2 de Março de 1895 e autorizando o governo a torná-las extensivas à Madeira. 1901/Agosto/8 - Decreto estabelecendo a autonomia administrativa ao distrito do Funchal, de acordo com o decreto de 2 de Março de 1895, alterado pela lei de 12 de Junho de 1901. 1913/Agosto/7 - Lei nº 88 em que se mantêm o decreto de 1895, de autonomia dos distritos. 1928/Fevereiro/16 - Decreto nº 15:035 do governo da ditadura criando o lugar de delegado especial do governo da República nos distritos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo. 1928/Julho/31 - Decreto nº 15:805 do governo da ditadura que estabelece a forma de transição dos serviços dos ministérios para as Juntas Gerais. 1931/Fevereiro/4. Greve e manifestação popular no Funchal contra o decreto nº.19273 de 26 de Janeiro, conhecido com o decreto da fome e do monopólio da farinha. 1931/Abril/4 - Revolta da Madeira, iniciada pelos militares e que contou com a adesão dos populares e dos políticos republicanos. Até 2 de Maio a ilha esteve sob a miragem de um governo local. A autonomia confunde-se aqui com independência 1935/Maio/23- Carta do Dr. Oliveira Salazar ao governador do distrito do Funchal, Dr. João Abel de Freitas, apresentando soluções para a crise e a sua resposta às reclamações de autonomia. 1936/Agosto/6. Revolta do leite. A população das freguesias rurais manifesta-se contra o decreto nº.26655, sobre os lacticínios.
1938/Abril/30 - Lei nº 1967 estabelecendo as bases de administração do território das ilhas adjacentes. 1939/Dezembro/22. Decreto-lei nº.30214 que aprova o estatuto dos distritos autónomos das ilhas adjacentes e a lei orgânica dos serviços das respectivas juntas gerais 1940/Dezembro/31 -Primeiro estatuto dos distritos autónomos das ilhas adjacentes. 1947/Agosto/4 - Estatuto definitivo dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, que se manteve até 25 de Abril de 1974. 1969/Março/11- Decreto -lei nº.48905 criando a Comissão de Planeamento Regional 1969/Abril/22 - Exposição apresentada por um grupo de madeirenses ao governador em que analisa a situação da região e reclama por autonomia 1970/Maio/29 - Reunião no Palácio de S. Lourenço dos governadores e deputados dos distritos insulares a fim de estudarem a revisão do estatuto dos distritos autónomos. 1974/Maio/6. Chegada ao Funchal do Tenente Coronel Carlos Azeredo, investido nas funções de comandante militar da Madeira. 1974/Maio/9. Chegada ao Funchal do novo bispo do Funchal, D. Francisco Santana 1974/Outubro/29. O Dr. Alberto João Jardim assume a direcção do Jornal da Madeira, dando início à Tribuna livre 1975/Janeiro/5 - O movimento de Autonomia das Ilhas Atlânticas divulga o seu programa, em que preconiza o fim de estatuto de colónia e o estabelecimento do regime de autonomia. 1975/Março/11- decreto-lei nº.139/75, criando a Junta de Planeamento, constituída pelo governador civil e mais quatro vogais, ficando sob a sua tutela a Junta Geral e a Comissão Regional de Planeamento. 1975/Março/25 - Tomada de posse da Junta de Planeamento para a Madeira. 1975/Agosto/5 - A Junta de Planeamento pediu a exoneração ao governo. 1975/Dezembro/13 - Anunciada a criação da Junta Governativa e de Desenvolvimento Regional da Madeira, directamente dependente do Primeiro-
Ministro, por decreto-lei nº.101/76 de 3 de Fevereiro. A tomada de posse teve lugar a 20 de Fevereiro de 1976. 1976/Abril/2 - Aprovação pela Assembleia Constituinte da constituição da República Portuguesa, que no parágrafo segundo do artigo 61 define os arquipélagos dos Açores e Madeira, como@ regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos próprios 1976/Abril/29 - Aprovação pelo conselho de ministros do Estatuto provisório da Madeira, publicado no dia 30 no Diário da Republica, alterado em 1 de Junho. 1976/Junho/27 - 10s eleições para a Assembleia Regional. 1976/Julho/19 - Aprovação da constituição da República - Inauguração da Assembleia Regional 1976/Setembro/6. Lino Miguel, o primeiro-ministro da República para a Madeira 1976/Setembro/16 - Anúncio do 11 Governo Regional, chefiado pelo Eng. Ornelas Camacho 1976/Outubro/1 - Acto de posse do II Governo Regional da Madeira. 1977/Janeiro/18 - Aprovado o decreto regional que cria o Instituto do Bordado, Tapeçarias e Artes da Madeira. 1977/Março/8 - Aprovado o decreto que cria o Jornal Oficial da Região. 1977/Março/15 - Início da discussão do projecto de estatuto definitivo da região. 1978/Março/3 - Remodelação no Governo Regional. O Dr. Alberto João Jardim assume a presidência. 1978/Março/7 - Assembleia aprovou o projecto de decreto regional das insígnias da região, publicado no Diário da República a 11 de Agosto. 1978/Novembro/1. A bandeira da região é içada pela primeira vez no edifício do Governo Regional à Avenida Zarco 1980/Fevereiro/27 - A Assembleia Regional aprovou o projecto de Estatuto político-administrativo da região. 1980/Julho/15 - Aprovação do hino da região.
1982/Abril/29 - O plenário do Governo Regional aprovou o projecto de recuperação do edifício de Alfândega da ilha para instalações da Assembleia Regional. 1983/Julho/1 - Primeira comemoração do dia da Região Autónoma. 1986/Julho/1 . Lançamento da primeira pedra do monumento à autonomia política da Madeira em Santa Cruz. 1987/Julho/1 - Inauguração do Monumento à Autonomia em Santa Cruz. 1987/Dezembro/17 - O plenário da Assembleia Regional estabeleceu o dia 4 de Dezembro como "Dia da Assembleia Regional". 1989/Julho/7 - Promulgação do decreto da Assembleia Regional que aprova a 20 revisão Constitucional. 1990/Fevereiro/22 - Aprovação da proposta de estatuto político-administrativo da RAM, a submeter à Assembleia da República.
BIBLIOGRAFIA
Os estudos sobre a autonomia na Madeira são ainda esparsos, sendo necessária uma maior aposta na investigação desta temática. A publicação, a exemplo do que sucedeu nos Açores com J. Reis Leite, das principais peças que dão corpo ao nosso processo autonómico pode ser um bom princípio para essa necessária valorização do tema. Eis alguns dos textos publicados que merecem o nosso interesse. CALISTO, Luís, Achas na Autonomia, Funchal, 1995. CAMACHO, Augusto da Silva Branco, Em defesa administrativa das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1962
da
autonomia
- Estatuto dos distritos autónomos das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1972 CARREIRO, José Bruno, A autonomia administrativa dos Açores, Ponta Delgada, 1994 FERREIRA, Fernando Amâncio, As Regiões Autónomas na Constituição Portuguesa, Coimbra, 1980 FREITAS, João Abel de, Madeira, Construir o Futuro, Lisboa, 1984. JANES, Emanuel, "A implantação da República na Madeira" in Atlântico, n1 18, 1989. JARDIM, Alberto João Jardim, Tribuna Livre. 1974-78, 3 vols., Ponta Delgada, 1995. JOÃO, Maria Isabel, Os Açores no século XIX - Economia, sociedade e movimento autonomista, Lisboa, 1991. JORDÃO, Carlos A. R. Carvalho, Tutela administrativa dos Governos Regionais sobre as Regiões Autónomas, Braga, 1980 - Administração regional autónoma um percurso ao redor da própria dinâmica evolutiva da autonomia, Funchal, 1983
LEITE, José Guilherme Reis, "A Autonomia das Ilhas Atlânticas, os Açores e a Madeira. A experiência açoriana no século XIX" in Actas do I Colóquio Internacional de História da Madeira, Vol. I, 1989. - Sobre a autonomia dos Açores, Ponta Delgada, 1990 -"O segundo movimento autonomista açoriano e a importância da Madeira no seu desenvolvimento" in Actas do II Colóquio Internacional de História da Madeira, Funchal, 1990. -A Autonomia dos Açores na legislação portuguesa 1892-1947, Horta, 1987. -Política e administração nos Açores de 1890 a 1910. O 11 movimento autonomista, Ponta Delgada, 1995. MONJARDINO, Álvaro, As autonomias regionais jurisprudência. 1976-1986, 2 tomos, Horta, 1987
em
10
anos
de
-"Raízes da autonomia constitucional", in Actas do II Colóquio Internacional de História da Madeira, Funchal, 1990. MOTTA, Aristides da, Autonomia administrativa dos Açores, Ponta Delgada, 1994
PEREIRA, Fernando Jasmins, O destino das ilhas, Lisboa, 1979 ROSA, Eduardo F.(introdução), escolhidas, Ponta Delgada, 1989
Açorianidade
e
autonomia.
Páginas
VERÍSSIMO, Nelson, "Em 1917 a Madeira reclama autonomia" Atlântico, nº 3, 1985. - "O alargamento da autonomia dos distritos insulares. O debate na Madeira (1922-1923) in Actas do II Colóquio Internacional de História da Madeira, Funchal, 1990. -"A nossa autonomia", in Atlântico nº 19, Funchal, 1990. -"Autonomia Insular - as ideias de Quirino de Jesus" in Islenha, nº 7, 1990. -"Autonomia Insular - o debate na primavera marcelista" in Islenha, nº 9, 1991.
Anexo: textos e documentos
REGIONALISMO. AUTONOMIA DA MADEIRA
Há quinhentos anos as caravelas do Infante entregaram às penedias da Ilha, os primeiros povoadores. Gente portuguesa, o seu sangue e o seu génio transmitiram-se de geração em geração sem mistura sensível. Os actuaes habitantes da Madeira são portugueses, portuguesa é a sua língua, portugueses são os seus costumes. Por cá passaram hespanhoes e inglezes em continuas caravanas de nómadas do cosmopolitismo, e a larga porta da emigração espalhou pelo mundo colónias de naturaes cujo número d'almas deve ascender presentemente a bem um milhão. Todavia, a natureza Étnica deste povo permanece inalterável. A fixidez dos caracteres específicos antropológicos e psicológicos resistiu a todos os contactos, a todas as misturas, a todas as infiltrações. Em quinhentos anos a árvore genealógica dos primeiros povoadores desenvolveu-se em linha recta. Os madeirenses não podem renegar a Pátria pela razão natural de não poderem negar a raça. Madeirenses e ingleses, madeirenses e americanos, são elementos que se repelem. Não é só o facto do sangue que impede essa união fantasiada, essa osmose repugnante de raças diferentes, mas uma civilização secular com raízes profundas na vida e na história. Nestas circunstâncias, é tão impossível o separatismo ou independência como uma substituição ou troca de bandeira nacional. Autonomia quer dizer descentralização, ou melhor, desconcentração política e administrativa, apenas. Isto significa que a sombra da bandeira de todos os portugueses se levantará a bandeira regional, particular dos madeirenses, com seu escudo e brasão d'armas. Não é um grito de revolta, mas simples petição de justiça. Adquirimos direitos, exigimos que os reconheçam e nos garantam o seu livre gozo e exercício. Esses direitos. E aqui está porque a nossa voz soa a quebrado, colidem, de certo modo com os princípios da democracia pura. E digo de certo modo, porque o sistema político, dito democrático, que nos rege, é manifestamente híbrido. Em boa democracia a centralização é a regra. Todas as funções se concentram nas mãos do Estado. A Nação resume-se numa abstracta consciência colectiva que se define pela lei do número que por sua vez, se concretiza nos poderes legislativo e executivo. Uma republica individualista e egualitaria, como parece
ser a nossa, só aberrativamente comporta uma, administração diferenciada e fraccionada por autonomias locaes. O Estado dividiu o Paiz em províncias, distritos, concelhos e freguezias. Administrativamente a província nada significa, é uma designação que ficou dos velhos tempos que se conserva em atenção à história. As restantes divisões são arbitrárias. Criou-as o Estado para escalonar e facilitar a sua administração. A sua base J o cadastro populacional. O Estado define-as e limita-as pelo número de habitantes, de contribuintes e deleitares. Por cada uma distribua um número certo de funcionários que o representam e executam serviços em seu nome. Tudo isto J uniforme e puramente mechanico. As câmaras municipaes gozam hoje duma ténue autonomia que se traduz na consignação dum mínimo e dum máximo de faculdades que se exercem no todo ou em parte conforme as necessidades locaes, critério e vontade dos vereadores. Mas o seu estatuto J o mesmo para todas. O mesmo acontece com as Juntas Geraes, <excecção das Ilhas a que foram dadas atribuições especiais. Em tudo isto não se verifica a livre iniciativa ou a auto-determinação políticoadministrativa, condicionadas, que, a meu ver, deve ser a essencial característica definidora da autonomia. O hibridismo do regímen reside na incompleta equação entre os princípios e a pratica. A uma república individualista e egualitaria deveria repugnar a excepção e a diferenciação. Todavia, inúmeros exemplos podem apontar-se do contrario, a começar no sufrágio que é restrito, o mais restrito possível, apenas extensivo aos dez ou quinze por cento da população masculina tida por saber ler e escrever, e a acabar nos novos cavaleiros da Ordem de Cristo. Nem é preciso recordar a situação criada à Igreja Católica, e, muito menos, a, Fénix dos tribunaes especiais. Sob o ponto de vista administrativo, olhe-se para as Colónias. Quão longe estamos d'aquela voz de puritano que num dos últimos parlamentos da monarquia bradava:--percam-se as colónias, mas salvem-se os princípios!... Não vem a preposito discutir se a republica neste andar de mala-posta aos solavancos para a esquerda e para a direita, corre bom caminho. O que importa, e constatar que este regímen político em que se vive, deante do facto consumado ou inevitável, parte de parte os princípios para atender B realidade. Esta nossa democracia, mau grado as aparências, é um regime de bem fácil acomodação as necessidades e ideias novas dos novos tempos. O regimen, à medida que se afasta do 5 d'outubro, reprodução serôdia de 89., mais se aproxima do século xx. E ainda bem. Posto isto, podemos esperar que sejam satisfeitas as nossas reivindicações sem duras resistências por parte do Governo e do Congresso da Republica. Basta que todos os madeirenses queiram! E todos os madeirenses hão-de querer quando tiverem uma consciência esclarecida e forte dos seus direitos.
Mas não se pode querer, sem crer. A fé transporta montanhas! I preciso, pois, que este sentimento tenha a violência da vara de Moysés batendo na rocha. O milagre virá depois. Quais são, porem, os nossos direitos? Tem-se dito: são os da maioridade. São, portanto, aqueles direitos definidos e compreendidos na capacidade de regermos a nossa pessoa e bens, ou seja a auto-administração da nossa pessoa e bens. Mas porque se trata duma pessoa colectiva, duma pessoa moral chamada de direito publico, esses direitos são determinados e limitados pela sua natureza e fins. Dar autonomia à Madeira, J constitui-la em unidade política e administrativa. E outorgar-lhe a carta constitucional dos seus direitos políticos e públicos, compatíveis com os direitos de soberania nacional e em bases conformes com as condições d'existencia do agregado regional. I reconhecer que a Madeira pela sua situação geográfica, pela qualidade e numero das suas relações com o mundo, pelos usos e costumes do seu povo, pelo grau do seu desenvolvimento moral, intelectual, agrícola, industrial e comercial, adquiriu uma fisionomia própria e especiais interesses colectivos próprios, que a individualizam como Região e como agregado social. Daqui surge a necessidade duma diferenciação nos processos políticos e administrativos a aplicar-lhe. Para que a autonomia que se pretende dar a Madeira corresponda a uma verdadeira carta d'alforria, tem de assentar nestas ou semelhantes bases: 1. Função representativa: desempenhada por um governador civil que não seja exclusivamente um alter-ego do Ministro do Interior, mas apenas um representante do Estado. 2. -Função governativa: compreendendo um Conselho Legislativo e um Conselho Executivo. As atribuições do Conselho Legislativo são especiais, restritas aos interesses puramente regionaes, quer públicos, quer privados. Sãolhe interditas as questões de Soberania (formas de governo, exercito e relações exteriores, a função judicial, a instrução secundaria e superior. Eleição indirecta. O Conselho Executivo, saído do Conselho Legislativo por eleição, recolhe e administra as receitas, orçamenta e fiscaliza as despesas. Sob a sua direcção, estão todas as obras de fomento e instituições de assistência distritaes (Junta Geral, Obras Publicas, Juntas autónomas, Região Agrícola, serviços de saúde e asilos)
3. Função administrativa: Câmaras Municipaes. 4. Função educativa: Liberdade d'ensino. Instrução primaria a cargo dos municípios. Protecção às escolas livres sob forma de prémios às que melhores provas darem no seu ensino. Escolas industriaes e profissionaes. Museus regionaes d'arte e historia natural.
5. Função judicial: alteração no numero de comarcas e da sua jurisdição territorial de modo a evitar-se a ausência de magistrados de carreira e a facilitar-lhes o acesso dos povos das varias freguesias da ilha. Uma possível criação dum tribunal de 20 instancia no Funchal. Um juiz de paz em cada concelho que desempenhe a mais as funções dos atuaes administradores. 6. Função d'Ordem Publica: Guarda Fiscal e Guarda Civil, compreendendo esta uma Policia d'investigação Criminal, uma Policia de Segurança Publica. Uma Policia rural e uma Policia Florestal. 7. Sobre o produto bruto das receitas criadas e arrecadadas no arquipélago, será deduzida uma percentagem fixa para o Estado. 8.A organização administrativa e social fundar-se-ha na família (restrição do divorcio e creação do homestead), parochia e municipio + associações de classe. 9. Religião: a católica reconhecida e protegida como sendo a tradicional e a única capaz de produzir a unidade moral do agregado regional. Liberdade de culto, d'ensino religioso e assistência religiosa. Estas bases são lançadas sem preocupações scientificas, apenas na intenção de focar pontos de vista que me parecem fundamentaes quando se trata de elaborar o estatuto autonômico da Madeira Outros aspectos ha a atender e os que ahi ficam demandam um estudo mais detido e uma explanação mais detalhada. Isso porem, não cabe nos limites deste artigo destinado a suscitar ideas e a interpretar sentimentos que andam na consciência pública ainda em estado incoerente. Na base não falo num corpo legislativo, Esta função é importante e essencial. Basta atender-se ao que se está passando com as questões que mais interessam a nossa vida económica. E já vasta a legislação especial aplicada unicamente < Madeira. O regime sacarino, o regime dos trigos e farinhas, o regime vinícola, etc. Mas ha ainda o regime dos bordados, das manteigas, do turismo, das obras e exploração do porto, afora as questões d'aguas, de colonia, de baldios, de florestas e outras sobre que nos temos de pronunciar criando formulas jurídicas que satisfaçam as suas especiais condições e os seus fins. E não nos digam que tudo isso nos pôde vir por meio dum parlamento nacional! A mecânica e composição do Congresso da Republica obstam a que taes assuntos sejam resolvidos a nosso contento. O sistema parlamentar, entregue a partilhas partidárias, pouco mais produz do que intriga política. Os nossos interesses, as nossas necessidades não são atendidas, porque se não cura do seu estudo e porque os senhores deputados nos ignoram completamente, quando nos não desprezam. Ora nós, se queremos viver e progredir, temos de fugir à intriga política e acomodar-nos dentro de fórmulas políticas e administrativas que nos permitam regular as questões regionaes por nós mesmos, livres da acção imoral de agenciadores de votos.
A base 70 consigna uma percentagem fixa das nossas receitas para o Estado. I a inversa do que se dá presentemente. Mas assim J que deve ser. O produto do nosso trabalho, das nossas riquezas, deve ser aplicado em nosso proveito. O que não faz sentido é que se esteja a contribuir para as obras do Porto de Leixões, para o sorvedouros dos bairros sociaes e de todas as revoluções que a irrequieta gente da Capital queira fazer e alimentar. (Manuel Pestana Reis, "Regionalismo. A autonomia da Madeira", in Quinto Centenário do Descobrimento da Madeira, Publicação comemorativa, Funchal, Dezembro 1922)
Hei por bem decretar, para valer como lei, o seguinte: Artigo 1.° Os serviços dependentes dos Ministérios do Comércio e Comunicações, da Agricultura e da Instrução e bem assim os dos governos civis, polícia cívica, saúde pública, assistência e previdência dependentes dos Ministérios do Interior e das Finanças, nos distritos do Funchal, Ponta Delgada e Angra do Heroísmo, transitarão, a partir de 1 de Julho de 1928, com todas as suas despesas e com todas as suas receitas privativas, para as juntas gerais dos mesmos distritos, nos termos deste decreto com força de lei. Artigo 13.° As juntas gerais dos distritos autónomos serão constituídas por quinze membros, dos quais nove electivos, sendo seis eleitos pela maioria e três pela minoria, e os restantes seis vogais natos, que serão os seguintes: o secretário-geral do governo civil ou o funcionário que o substituir, quando aquele exerça funções de governador civil; o reitor do liceu, o inspector de sanidade marítima, o inspector de sanidade terrestre, o engenheiro director dos serviços de obras públicas e o engenheiro agrónomo chefe dos serviços respectivos ou o intendente de pecuária do distrito, pertencendo a efectividade ao mais velho dos dois.
(Decreto do governo da ditadura, nº. 15805 de 31 de Julho de 1928)
INDEPENDÊNCIA?
O governo da Ditadura nem sequer procura defender-se com nobreza, com elevação de processos, perante a opinião estrangeira. Deturpa, falseia e não hesita em lançar o label de traidor sobre o povo da Madeira, sobre este amargurado povo, sofredor e valente, tão arreigadamente português e tão afervoradamente dedicado à sua Pátria. E que fez, pois, a Ditadura? Através dos seus arautos, cúmplices do mesmo crime, atirou para além-fronteiras a notícia infame é que o Movimento de 4 de Abril tinha propósitos separatistas, que pretendíamos proclamar a independência da ilha! Não, Srs. da Ditadura! Não se atira assim, com tanta leveza de ânimo Cor que não dizê-lo? Com tanta insensatez, o brio, o orgulho, os claros sentimentos patrióticos dos madeirenses, para a crítica severa do estrangeiro, que, de boa fé, aceitará a informação, supondo-a correspondendo a uma verdade. Não, oh Srs. da Ditadura! Através das nossas paixões, das nossas relações políticas, uma coisa deve haver a pairar mais alto: a unidade da nossa dedicação à Pátria, o desejo ardente de todos os portuguesesseja qual for o torrão que pisem de bem servir a Pátria, de engrandecer e dignificar Portugal. Para os estrangeiros, para a opinião estrangeira, deve-se sempre acentuar, firmemente, esta verdade: nas nossas lutas, mesmo no seu entrechoque mais vivo ou mais sangrento, nunca esquecemos o nosso orgulho de sermos portugueses, portugueses acima de tudo! Por febril patriotismo, que é bem do nosso feitio e timbre de Raça, e atépor elegância moral. O que disse o Governo da Ditadura para o estrangeiro foi uma calúnia. Uma calúnia grave, ignominiosa, que repetimos! É certo que a Madeira tem ainda o seu problema local por resolver; é certo que a Madeira pugna, e tem pugnado, sem desfalecimentos, para que os Poderes Públicos lhe dêem aquela necessária autonomia administrativa que permita desenvolver as suas estupendas fontes de riqueza, as suas extraordinárias possibilidades económicas; é certo também que o povo madeirense possue um vibrante sentimento regionalista, um grande amor por este sagrado torrão, que é uma maravilha bem-dita da Natureza. É absolutamente verdade! Mas, autonomia política, mas independência política, não a desejamos, não a queremos. Orgulhamo-nos tanto de ser portugueses, que só uma História nos serve, a de Portugal! (Notícias da Madeira, 17 de Abril de 1931)
2. Parece desnecessário insistir na conveniência de um regime administrativo insular diverso do adoptado para o continente: estão os dois arquipélagos dos Açores e da Madeira separados de Portugal continental pelo Oceano, longe portanto das vistas directas dos governantes e ligados a Lisboa por comunicações marítimas muito espaçadas (sobretudo com os Açores); constituem-nos um grande número de pequenas ilhas que não mantêm entre si laços de tam estreita cooperação como por vezes se pensa, mas que são solidárias pela posição geográfica, pelo estado social e pelas necessidades dos seus habitantes, cuja índole e modo de viver diferem bastante dos do maior número das populações continentais; por isso, a descentralização se impõe e a desconcentração também uma e outra em benefício dos povos e com vantagem para a boa administração. (...) 6. Queixam-se os distritos insulares de que o regime de 1928 lhes é incomportável, porque as receitas não chegam para cobrir as despesas, e há quem, perdendo de vista o equilíbrio que tem de haver entre a riqueza existente e a satisfação das necessidades públicas, sustente que se deve progredir ainda na autonomia, negando-se ao Estado o direito de ir buscar um ceitil que seja à economia das ilhas. E este modo de ver filho de um vicioso particularismo regional, que esquece a solidariedade que liga as diversas partes da Nação e a existência de órgãos políticos e administrativos de interesse geral, para cuja manutenção todos os cidadãos têm o dever de contribuir. A administração das circunscrições está longe de ser um circuito fechado entre as suas receitas próprias e as próprias despesas: o Estado unitário compreende e indissoluvelmente liga as comunidades locais, acorrendo com os recursos da Fazenda Pública onde for mais conveniente e útil para o interesse nacional. Formam as ilhas adjacentes um todo com o continente, é o mesmo o seu sistema de administração e governo, como o mesmo é o grau de civilização dos habitantes e de progresso social: seria, pois, contrário ao bem comum consagrar uma forma egoísta de plena autonomia financeira que parecesse realizar a desintegração do Estado de - uma parte do seu território metropolitano.
(Lei nº. 1967 de 30 de Abril de 1938. bases da administração do território das ilhas adjacentes)
A Madeira e os Açores, situados em pleno Atlântico, a alguns dias de viagem de Lisboa, estão fora do contacto, da influência directa do Governo; as suas economias têm caracteres próprios, que as diferenciam das províncias do continente: o espírito das suas populações, pela natureza insular do território, pelo clima, pelo intercâmbio com o estrangeiro, pela sua vida económica e social, oferece, em certos aspectos, uma feição típica. Para governar e administrar as nossas ilhas adjacentes é indispensável conhecêlas na intimidade, ter não só a inteligência dos seus problemas, mas também o sentido da sua sensibilidade. As dificuldades que destas circunstancias resultam para a administração central, na apreciação e resolução dos assuntos insulares, na adaptação dos serviços às necessidades locais, na adopção de medidas urgentes ou peculiares, impõem evidentemente um sistema que torne, principalmente, dependente de órgãos locais a direcção dos negócios administrativos das ilhas. Só assim se podem evitar em grande parte os inconvenientes que a 263 morosidade burocrática, que a falta de conhecimento directo dos assuntos, a divergência de informações, a luta de influências determinam, em regra, quando as questões insulares se subordinam inteiramente à mecânica das repartições ou serviços centrais. Ninguém ignora, de resto, as relações que existem entre a vida económica e política de determinada região e a sua orgânica administrativa: interinfluenciam-se continuamente e os defeitos do meio podem, muitas vezes, I ser atenuados ou corrigidos pela virtude do sistema. (discussão na Assembleia Nacional da proposta de lei do regime administrativo das ilhas adjacentes. ordem do dia 3 de Março de 1938. Intervenção Favila Vieira)
A autonomia administrativa vem de mais longe. Nasce com o próprio povoamento das ilhas adjacentes e processa-se desde então. O Infante D. Henrique, sempre com larga visão de homem genial, depressa se convenceu de que não poderia de tão longe governar as ilhas descobertas ou encontradas. Razões imperativas da geografia assim o recomendavam. (...) As cartas de doação a que o ilustre autor se refere são, quanto a nós, os primeiros instrumentos públicos definidores de uma amplíssima autonomia, então, plenamente aceitável. Ao seu conteúdo faremos a seguir uma breve referência, bem justificável para o ponto de vista em que nos colocamos. (...) Repetimos a conclusão a que, então, chegámos: n a relativa autonomia de que gozam actualmente os distritos das ilhas adjacentes, tem uma tradição tão longínqua que vai encontrar as suas mais profundas raízes no período das descobertas e se prolonga até ao regime liberal que, com a introdução do tipo uniforme de administração, cerceou aquelas liberdades de acção dos governos locais que não eram concessões de favor ou privilégios, mas antes resultavam de uma experiência feita de longos anos, onde o bom senso e o tino de bem servir os povos sempre estiveram presentes (Augusto Branco Camacho, Em defesa da autonomia administrativa das ilhas adjacentes, Ponta Delgada, 1962, pp. 20-23)
1947-Estatuto dos distritos autónomos
TITULO I Da divisão do território art. 1.° O território das ilhas adjacentes divide-se, para efeitos administrativos, em concelhos, que se subdividem em freguesias e se agrupam em distritos autónomos. Art. 2.° Os distritos autónomos do Funchal e de Ponta Delgada são de 1.a ordem; os restantes distritos autónomos são de 2.a ordem. TÍTULO II Dos distritos autónomos CAPÍTULO I Dos Órgãos da administração distrital Art. 3.° Cada distrito das ilhas adjacentes constitui uma pessoa moral de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira. Art. 4 - O órgão da administração distrital autónoma é a junta geral, que exerce as suas atribuições e competência directamente ou por intermédio de uma comissão executiva. Art. 5 ° O Governo da República é representado em cada distrito por um governador civil, a cujo cargo está a gestão dos interesses políticos e administrativos do Estado, a superintendência na polícia geral e a inspecção e fiscalização tutelar da administração distrital autónoma. Art. 6.° As juntas gerais poderão deliberar a criação de quaisquer órgãos privativos de consulta, de carácter permanente ou transitório, com a composição que determinarem e para fins relativos ao exercício das suas atribuições e competência. Único·É obrigatório para os funcionários do Estado que desempenhem funções no distrito autónomo a aceitação das funções dos órgãos consultivos distritais para que sejam designados pela junta geral Art. 7.° As juntas gerais poderão sempre solicitar o parecer dos órgãos consultivos da administração central do Estado acerca de negócios dos serviços públicos que lhes estejam confiados e sobre que tenham de deliberar. CAPITULO II Da Junta Geral SECÇÃ0 I Composição, Constituição, Sessões e Reuniões
Art. 8.° A junta geral do distrito é composta por sete procuradores, dos quais três natos e quatro eleitos quadrienalmente. 1.° A junta geral tem presidente, nomeado por quatro anos, pelo governador do distrito, de entre os procuradores eleitos, podendo excepcionalmente recair a nomeação em pessoa estranha ao corpo administrativo desde que tenha revelado méritos extraordinários em serviços prestados ao Estado 2.° Nos casos em que o governador do distrito use a faculdade conferida na parte final do parágrafo anterior, o presidente acresce ao número dos procuradores e tem os mesmos direitos e deveres. 3.° -- O presidente da junta geral pode ser reconduzido e a todo o tempo exonerado ou demitido pelo governador do distrito 4.° Nas suas faltas e impedimentos o presidente da junta geral será substituído por um presidente substituto, nomeado nos mesmos termos pelo governador do distrito, e na falta de um e outro exercerá as funções o procurador mais velho. 5.° As funções de presidente da junta geral são remuneradas conforme a tabela anexa a este Estatuto. 6.° Os funcionários do Estado ou os funcionários administrativos que sejam nomeados presidentes das juntas gerais serão considerados em comissão extraordinária de serviço e com direito a optar pelo seu ordenado ou pelo de presidente da junta geral, competindo a esta em qualquer caso o respectivo pagamento. 7.° Aos funcionários na situação a que se refere o parágrafo anterior será contado o tempo de serviço que prestarem na presidência das juntas gerais, para todos os efeitos legais, como se fosse prestado nos quadros permanentes a que pertencem. Art. 9 ° São procuradores natos à junta geral: a) o reitor do liceu da sede do distrito; b) o delegado distrital do Instituto Nacional do Trabalho e previdência; c) o engenheiro director técnico da Junta Autónoma dos Portos nos distritos de Ponta Delgada, Angra do Heroísmo e do Funchal e o engenheiro director das obras públicas no distrito da Horta. 1.° Os procuradores natos são substituídos, nas faltas e impedimentos legais, por quem suas vezes fizer nos lugares públicos que desempenham.
2.° Quando o Ministro das Obras Públicas considere inconveniente a participação dos engenheiros a que se refere a alínea c) nas juntas gerais, serão substituídos por procuradores de nomeação do mesmo Ministério, escolhidos de preferência de entre indivíduos diplomados com curso superior de engenharia. Art 10.° Os restantes procuradores serão eleitos, em lista completa e por escrutínio secreto, pelas câmaras municipais e organismos corporativos morais, culturais e económicos do distrito 1.° Cada lista conterá quatro nomes para procuradores efectivos e quatro para procuradores substitutos. 2.° Enquanto não estiver completa a organização corporativa, a relação dos organismos com direito de sufrágio será elaborada pelo governador do distrito, ouvido a delegação do 1. N. T. P. e por modo a dar representação, tanto quanto possível, às diversas actividades sociais do distrito. 3 ° Elaborada a relação dos organismos, será publicada nos jornais locais e afixada nos paços do concelho da sede do distrito durante quinze dias, pelo menos, podendo os interessados reclamar contra ela para o governador do distrito, que decidirá definitivamente. 4.0--As câmaras municipais e os organismos corporativos serão representados no acto de eleição pelos seus presidentes, juízes ou provedores. Quando, porém, tenham sede fora da ilha onde estiver a sede do distrito, poderão votar por correspondência. 5.° Todas as listas serão encerradas num sobrescrito branco, fechado, sem quaisquer dizeres e com as dimensões que forem fixadas. Quando o voto seja por correspondência, será esse sobrescrito metido noutro, também fechado, lacrado e endereçado, como correspondência postal registada, ao governador do distrito, com a menção de só dever ser aberto no acto eleitoral. Neste caso, é ao governador que compete abrir o sobrescrito exterior quando chamado o eleitor que o remeteu e depor na urna o sobrescrito nele contido. 6 ° O acto eleitoral efectuar-se-á em dia designado pelo governador do distrito, entre 15 de Novembro e 5 de Dezembro, consoante as conveniências resultantes das comunicações marítimas (Estatuto dos Distritos Autónomos das ilhas Adjacentes, aprovado pelo decreto-lei nº.36453 de 4 Agosto de 1947)
Textos do Dr. A. J. JARDIM alusivos à autonomia
Há equívocos que convém desfazer até para evitar interpretações descabidas. Mas certamente involuntárias. Correm para aí boatos sobre "independência" da Madeira, e até se esgrime com o nome de pessoas, ligando-as a pretensos movimentos cuja existência desconhecem. (...) Tentar separar a Madeira do todo nacional, para além de ridículo constitui uma machadada grave na consciência do País. E significa abandonar esta minúscula porção de terra a ambições vorazes e estranhas, das quais não nos saberíamos, nem nos poderíamos defender. Também é de recusar uma autonomia que se destine a evitar a aplicação local duma legislação de forte pendor social. O problema sócio-económico da Madeira é grave, mas não se resolve nem pelo protelamento de situações injustas, nem através de imprudências de espectacular alcance feérico que, na prática, virão traduzir-se em descalabros. E o descalabro gera bancarrota, desemprego, fome. Porém, outra coisa é encarar a autonomia, já não com um sentido de defesa política da parte de quaisquer grupos particulares, mas num sentido de solução técnico-económico. Solução que nada tem que ver com a forma de regime político que o Povo elegerá. Mas que se destina a procurar encontrar a melhor fórmula de estruturar as ligações administrativas do Arquipélago com o Continente e de encontrar as instituições locais mais apropriadas. Apropriadas a quê? A justamente fazer também aplicar com eficiência à Madeira as leis vigentes em todo o espaço português. Leis que esperamos virem a ser justas porque de particular incidência na resolução dos problemas das classes mais desfavorecidas. Repare-se, portanto, que a palavra autonomia, neste sentido, já não se reveste dum manto separatista, quiçás adverso a uma correcta política social. Antes, autonomia aqui é solução de mero alcance técnico. Que só um incrível fenómeno de loucura colectiva poderia desprezar, face à evidente descontinuidade geográfica entre os territórios em consideração. Mas a tecnicidade é um meio para o objectivo comumdesenvolvimento nacional. A melhoria das condições de vida da população não pode ficar dependente de preconceitos de natureza partidária. O que se procura ao falar de autonomia em relação à Madeira é a solução estrutural que sirva a causa comum do progresso. Este não pode ser sustido por estratégicas de ocasião. 30-10-1974
(Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.12-13) Num correcto esquema de autonomia o Arquipélago terá necessariamente que dispor de um poder executivo e de um poder fiscalizador que controle e obrigue os órgãos executivos a uma acção no âmbito demarcado pelos reais interesses da população. Serão imprescindíveis dois órgãos: o Governador, poder executivo. e uma Assembleia Regional, poder fiscalizador. Quaisquer deles com representatividade de base. O Governador numa região autónoma deve ser eleito por sufrágio directo e universal, e por maioria absoluta. Um período de quatro anos pode considerarse razoável. Mas o princípio da não reeleição é útil porque não faz a governação cair numa rotina perniciosa, nem faz cultivar o gosto ou o vício pelo poder. Na Madeira, pois uma vez vigente uma lei orgânica a subordinar este território a uma estrutura efectivamente autónoma, seria num Governador assim eleito que se centralizariam os Serviços Distritais. Ele responderia politicamente perante o eleitorado, e legalmente perante os Tribunais. (...) Por outro lado, o Governador, como efectivo detentor do poder executivo regional. Tem que ser o principal mandatário do Governo Central na execução das deliberações cuja competência esteja centralizada em Lisboa. O que obriga por outro lado a aceitar um eficaz sistema de controlo pelo Governo Central. normal dado o direito de soberania. Visto que a Madeira como região autónoma elegeria o Governador, dentro do esquema proposto. O que leva o Governo Central a ter como mandatário uma personagem não designada por Ele, mas da base, pela população. 29-12-74 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, pp.88-89)
Os princípios da democratização e descentralização regional. Se efectivados na plenitude do seu significado, permitem às populações serem realmente as titulares dos seus destinos. Ora. Para que uma região autónoma possa conscientemente planear o seu futuro e repartir as receitas disponíveis pelas prioridades julgadas mais convenientes. Não ficando assim à mercê de contingências estranhas. Há um sector onde a autogerência deve indiscutivelmente manifestar-se. O campo financeiro. Se dispusermos da faculdade legal de elaborarmos um Orçamento Regional ao qual esteja adstrita a quase totalidade das receitas fiscais aqui cobradas isso significa que serão os Órgãos mandatários da população local. Porque por ela
eleitos, quem definirão os investimentos públicos prioritárias. De acordo com a vontade popular. 31.12.74 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.90-91)
A especificidade da autonomia que o caso concreto da Madeira exige, não se reduz a um mero esquema de descentralização igual ao de Vila Real ou de Silves. Efectivamente não estão em causa os laços com a Pátria comum. Mas como Já foi afirmado: "A Madeira é com efeito, em certos aspectos, um pequeno pais sob o ponto de vista económico, cercado pelo mar, exportando e importando em parte directamente do estrangeiro, com uma fronteira alfandegária estanque. Condicionam sobretudo a sua economia e interdependência dos sectores económicos locais, a mútua repercussão de suas actividades a variável extensão do terreno por onde se expande cada produto agrícola segundo a sua fortuita valorização os volumes de produção, consumo, rarefacção ou pletora do seu bem delimitado mercado interno e a possibilidade de absorção por parte dos mercados externos seus clientes 11.02.75 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.150-151)
Finalmente, o sistema de autonomia realiza um processo evolutivo de valorização com o fito de dirigir o território geograficamente descontínuo para que este assuma a defesa dos seus interesses próprios e diferenciados do restante espaço nacional em que se institucionalizou, através de um autogoverno nesses sectores. No aspecto administrativo, o sistema de sujeição identifica-se com a centralização, pois esta permite a subordinação permanente e total dos interesses específicos do território descontínuo à metrópole, o mesmo se dizendo no aspecto económico. Só no aspecto financeiro é que não é de estranhar o aparecimento às vezes de dois orçamentos diferentes, forma por exemplo de o território descontínuo não onerar demasiado a Metrópole. O sistema de integração traduz-se também numa forte centralização administrativa e numa ausência de especialidade legislativa. O que não quer dizer que não possa existir descentralização, se for esse o esquema metropolitano, mas agora só e exclusivamente numa óptica executiva. Política económica sem distinção, união aduaneira, ausência de orçamento regional, etc., são outras marcas de um sistema integrativo.
O sistema de autonomia pressupõe poderes legislativos, que não meramente executivos, em matéria de aspectos especificamente regionais, distintos do todo nacional. Pressupõe uma política económica com o realismo de considerar duas regiões de conjunturação diferente. Pressupõe uma política económica com o realismo de considerar duas regiões · conjunturação diferentes. Pressupõe separação orçamental, embora haja participação do território descontínuo nas despesas comuns do Estado que também aproveitam esse mesmo território. Estamos, portanto, perante três sistemas diferentes, dos quais a autonomia, em função do interesse nacional e da realidade local, é indubitavelmente o que deve ser prosseguido no Arquipélago da Madeira. Autonomia que não é o mesmo do que descentralização. Esta é uma praxis que é possível até desenvolver em sistemas de integração. Bastando para tal uma especial distribuição de tarefas ao nível dos vários postos da hierarquia administrativa. Autonomia não significa uma mera execução mais responsabilizada. Vai mais longe. Robustece os laços entre as parcelas do todo nacional, através de um funcional Esquema de articulação em que os problemas específicos de cada território são legislados localmente com realismo, permitindo aos órgãos da cúpula nacional uma actuação mais preocupada com os problemas da comunidade no seu global, na potencial certeza que, por sua vez, constitui até um importante factor para uma actuação mais eficiente, mais à vontade, do poder central. Esta autonomia para as ilhas Adjacentes deve estar subordinada ao princípio da solidariedade, ao principio da especialidade de legislação, ao princípio da descentralização administrativa, ao principio da autonomia financeira, ao principio da especialidade da organização político-administrativa e ao princípio da unidade política. O principio da solidariedade, entendido como subjacente à autonomia para as ilhas Adjacentes, resulta da participação destas na República Portuguesa e significa contribuição destas no assegurar da integridade e defesa da República e na realização dos fins comuns ao Povo português, da forma que for democraticamente definida. O princípio da especialidade de legislação, para justamente permitir a existência de normas adequadas à específica conjuntura do território descontinuo. O princípio da descentralização administrativa, através de uma repartição de poderes às várias escalas hierárquicas da administração, consoante o esquema mais adequado à situação da região em causa. O princípio da autonomia financeira traduzido na existência de um orçamento regional, privativo para o território descontinuo, diferente do Orçamento Geral do Estado, onde no entanto se compreende também a participação desse
território no encarar-se as despesas e receitas que estejam adstritas aos fins essencialmente nacionais. O princípio da especialidade da organização político-administrativa, no fundo quererá dizer que não será exactamente o mesmo o estatuto a aplicar em cada Distrito das ilhas Adjacentes, mas estabelecido consoante as características próprias de cada um. 18.12.75 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, p.538-539)
É indubitável que um sentimento de sã autonomia é perfilhado pelos Povos dos dois Arquipélagos atlânticos. A liberdade representa isto mesmo os grupos humanos resolverem os problemas que lhes são intrínsecos e administrarem os bens que lhes pertencem. A não ser assim, a democracia considera-se viciada à nascença. E a política no seu sentido verdadeiro, naquela única concepção que suscita a adesão das populações e a confiança indispensável à construção estável de um futuro justo e próspero, exige que os problemas não sejam iludidos. Exige que eles sejam encarados corajosamente nas suas reais dimensões e consequências, tendo em vista as necessidades de quem depende das respectivas soluções. A problemática das ilhas só pode ser devidamente solucionada, se forem adoptadas as novas estruturas que são indispensáveis para que haja nestas regiões um desenvolvimento integral desenvolvimento simultaneamente económico, social, cultural e moral que a todos e cada um beneficie, mas que essencialmente seja alavanca da promoção, no progresso, da igualdade de classes. A História mais que comprovou que enquanto a Madeira não for governada do Funchal e definirem os Madeirenses as estruturas tidas por mais convenientes, as coisas correrão sempre mal no nosso Arquipélago, as necessidades populares não estão célere e correctamente atendidas. Mais. O descontentamento assim permanentemente gerado será sempre factor desagregador da sociedade portuguesa, em vez de obter-se a meta almejada do robustecimento da República, da Democracia e da Justiça Social. Também a História tem provado que nós, Madeirenses, capazes de fazer tanta coisa gigante em todo o canto do mundo como temos sabido executar, cá, dentro de casa, somos ilhas na Ilha. Ora, ou acabamos com o individualismo egoísta, com os interesses de clãs, com os espíritos de classe, ou então nunca seremos capazes de realizar cá dentro, a epopeia que diariamente erguemos em cada esquina do mundo. E a hora em que presentemente vivemos é de desafio. Ou arrancamos agora, mesmo no meio de uma crise ameaçadora, ou teremos de
esperar muito tempo. Muito tempo mesmo. Que os egoístas, os clãs, as falsas elites ao menos deixem os outros trabalhar... Há um grande problema que para já se põe. O Governo surge a tratar a Madeira e os Açores como apenas duas províncias, entre as sete que cria na regionalização administrativa do País. E está errado. A Madeira e os Açores não são apenas mais duas províncias. São regiões distintas integradas na República Portuguesa. As províncias do Continente, por serem contíguas, pelas actividades que entre si e permanentemente integram, formam um todo harmónico e com tão íntimas interdependências que só para efeitos de gestão administrativa se compreende a partilha de um todo que é um só. Mas essa íntima interdependência, a ponto de formar um todo só, não pode ser concebida em relação a áreas descontíguas, que formam uma individualidade geográfica, um espaço próprio distinto do continental. As fronteiras do nosso Arquipélago são tão radicalmente definidas, que o isolam como zona individualizadíssima. Insusceptível do mero tratamento de província em paridade por exemplo com o Algarve em relação ao Continente, por exemplo. Nós somos um inconfundível e diferente espaço atlântico que incontestáveis laços colocam no mesmo projecto nacional a República Portuguesa.
O Povo deste espaço ambiciona pela autonomia verdadeira, integrado no espaço português, e acabará por tê-la. A não ser que Lisboa tenha mesmo endoidecido e seja incapaz de alcançar as repercussões terríveis que terá na vida nacional um conflito aberto entre o Povo das Ilhas e o Governo Central. 15.01.76 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. II, p.2930) Vamos pensar a sério em nós, Povo Madeirense. Mas com o espírito aberto à autenticidade e não ao sectarismo nem ao pacto com a mediocridade. A Madeira será aquilo que os Madeirenses quiserem e fizerem. Por muito que custe ou por muito que demore. Mas é preciso acima de tudo saber querer e, principalmente saber fazer. 29-01-76 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, vol. II, 1995, p.53)
Princípios a que tem de obedecer a governação local. Primeiro, em função da actual situação do País e da vontade já expressa da população ao da autonomia.
Forma esta até (a única possível) de reforçar os laços da unidade dentro da República Portuguesa. Autonomia é uma solução política, feita através de opções, e só então depois materializada tecnicamente. A Junta é um órgão de governo. Governar não é uma mera questão. É optar. E optar é fazer política. (...) Foi para reivindicar a autonomia da Madeira e pela implantação a nível de governo local de uma representatividade democrática que se lutou pelo derrube da defunta Junta de Planeamento. Se lutou para que fossem os princípios de política nacional mais escolhidos pela população Madeirense, a nortearem os seus destinos. Daí que a única solução honrosa e COERENTE possível, fosse a de estar em oposição a partir do momento em que houvesse quem entendesse que o conjunto da nova Junta não oferecia garantias de reivindicar essa autonomia e a partir do momento em que ela não era representativa. E então mais, a partir da ocasião em que um partido minoritário cá da Madeira, fazendo gala da sua supremacia no Continente, recusou um possível acordo que faria já reunir aquele mínimo de condições que abriria uma possibilidade de se avançar no campo autonomista, e impôs a "sua" Junta a uma terra que lhe não reconhece representatividade para tal. (...) As Finanças são decisivas para a vitória da batalha da autonomia. Não posso admitir que diante das câmaras de televisão o Governador diga que não sabe o que estava por detrás do interesse pelo pelouro das Finanças. Até pode ser acintoso. Para além da contradição, outra em que caiu, dizendo primeiro que não havia números definidos quanto ao movimento de dinheiros do Funchal para Lisboa e vice-versa, e daí a bocado apresentar um quadro onde financeiramente a Madeira estaria esmoler do Continente. Então, há ou não há números? 30.02.76 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.87-89)
Mas é preciso também entender-se que a Autonomia é um meio necessário para a construção de uma sociedade nova, mais justa, destruindo na Madeira certos aspectos obscurantistas de hierarquismo social e de profundas e imorais diferenças de nível de vida. A Autonomia não é uma opção conservadora. É uma opção progressista, no autêntico sentido da palavra, destinada quer a evitar a marxização da Madeira, quer a continuidade de estruturas sócioeconómicas carcomidas pelo pó dos tempos. 16-05-7 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol.II, p.230-231)
Sou dos que venho criticando aqueles que tomam posições radicais nas relações Continente-llhas. Não embarco na história da "independência" porque nunca ninguém me demonstrou ser esse o destino que tornaria mais felizes as classes mais desfavorecidas do Povo Madeirense. Creio mesmo que não existe o que se poderá chamar uma "consciência nacional" com a generalização que ela por definição impõe. O que noto é que há um sentimento fortemente regionalista a correr sérios riscos de se transformar em "separatismo" na grande maioria da população, se o Governo Central continuar a fazer as asneiras que faz, continuar a praticar interpretações legais prepotentes - como a dos casos em que os Governos Regionais têm que ser ouvidos se os problemas da Madeira andarem por mãos de políticos ou autoridades que não sabem distinguir "regionalismo" de "separatismo"; que não compreendem, por dentro, a consciência regionalista e autonómica do Povo local.(...) O "separatismo" não se combate com represálias, nem com perseguições. Isso é criar "mártires", criar "heróis", engrandecer uma ideia, alimentando-a. O "separatismo" não se combate com a política do governo socialista em relação às ilhas, esta a meu ver, hoje, o principal agente do separatismo. Não se combate com as vergonhosas e escandalosas deturpações que a imprensa estatizada e outra, tecem à volta da realidade Insular. (...) Se na verdade as ilhas beneficiam da existência da ameaça 'separatista", se os Governos Regionais podem na verdade beneficiar dessa força de pressão, lá isso estou convencido que até se traduz num politicamente inteligente proveito de circunstâncias. 1.02.77 (Alberto João Jardim, Tribuna Livre, Ponta Delgada, 1995, vol. III p.55-57)
1977. Regime Politico Administrativo da Madeira e Açores
TÍTULO VII Regiões autónomas ARTIGO 227.° (Regime político-administrativo dos Açores e da Madeira) 1. O regime político-administrativo próprio dos arquipélagos dos Açores e da Madeira fundamenta-se nas suas características geográficas, económicas, sociais e culturais e nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares. 2. A autonomia das regiões visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses. 3. A autonomia político-administrativa regional não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição.
ARTIGO 228.° (Estatutos) 1. Os projectos de estatuto político-administrativos das regiões autónomas serão elaborados pelas assembleias legislativas regionais e enviados para discussão e aprovação à Assembleia da República. 2. Se a Assembleia da República rejeitar o projecto ou lhe introduzir alterações, remetê-lo-á à respectiva assembleia legislativa regional para apreciação e emissão de parecer. 3. Elaborado o parecer, a Assembleia da República procede à discussão e deliberação final. 4. O regime previsto nos números anteriores é aplicável às alterações dos estatutos.
ARTIGO 229. (Poderes das regiões autónomas)
1. As regiões autónomas são pessoas colectivas de direito público e têm os seguintes poderes, a definir nos respectivos estatutos: a) Legislar, com respeito da Constituição e das leis gerais da República, em matérias de interesse específico para as regiões que não estejam reservadas à competência própria dos órgãos de soberania; b) Legislar, sob autorização da Assembleia da República e com respeito da Constituição, em matérias de interesse específico para as regiões que não estejam reservadas à competência própria dos órgãos de soberania; c) Desenvolver, em função do interesse específico das regiões, as leis de bases em matérias não reservadas à competência da Assembleia da República, bem como as previstas nas alíneas N.S. n), v) e x) do n.° I do artigo 168.° ; d) Regulamentar a legislação regional e as leis gerais emanadas dos órgãos de soberania que não reservem para estes o respectivo poder regulamentar; e) Exercer a iniciativa estatutária, nos termos do artigo 228.° ; f) Exercer a iniciativa legislativa, nos termos do n.° I do artigo 170.° , mediante a apresentação à Assembleia da República de propostas de lei e respectivas propostas de alteração; g) Exercer poder executivo próprio; h) Administrar e dispor do seu património e celebrar os actos e contratos em que tenham interesse; i) Exercer poder tributário próprio, nos termos da lei, e dispor de receitas fiscais nelas cobradas e de outras que lhe sejam atribuídas e afectá-las às suas despesas, bem como adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais, nos termos de lei-quadro da Assembleia da República; J) Criar e extinguir autarquias locais, bem como modificar a respectiva área, nos termos da lei; l) Exercer poder de tutela sobre as autarquias locais; m) Elevar povoações à categoria de vilas ou cidades; n) Superintender nos serviços, institutos públicos e empresas públicas e nacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusiva ou predominantemente na região, e noutros casos em que o interesse regional o justifique; o) Aprovar o plano económico regional, o orçamento regional e as contas da região e participar na elaboração dos planos nacionais;
p) Definir actos ilícitos de mera ordenação social e respectivas sanções, sem prejuízo do disposto na alínea d) do artigo 1 68 .o; q) Participar na definição e execução das políticas fiscal, monetária, financeira e cambial, de modo a assegurar o controlo regional dos meios de pagamento em circulação e o financiamento dos investimentos necessários ao seu desenvolvimento económico-social; r) Participar na definição das políticas respeitantes às águas territoriais, à zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos; s) Participar nas negociações de tratados e acordos internacionais que directamente lhes digam respeito, bem como os benefícios deles decorrentes; t) Estabelecer cooperação com outras entidades regionais estrangeiras e participar em organizações que tenham por objecto fomentar o diálogo e a cooperação inter-regional, de acordo com as orientações definidas pelos órgãos de soberania com competência em matéria de política externa; u) Pronunciar-se por sua iniciativa, ou sob consulta dos órgãos de soberania, sobre as questões da competência destes que lhes digam respeito. 2. As propostas de lei de autorização devem ser acompanhadas do anteprojecto do decreto legislativo regional a autorizar, aplicando-se às correspondentes leis de autorização o disposto nos n.° s 2 e 3 do artigo 168.° . 3. As autorizações referidas no número anterior caducam com o termo da legislatura ou a dissolução, quer da Assembleia da República, quer da assembleia legislativa regional a que tiverem sido concedidas. 4. Os decretos legislativos regionais previstos nas alíneas b) e c) do n.° I devem invocar expressamente as respectivas leis de autorização ou leis de bases, sendo aplicável aos primeiros o disposto no artigo 172.o, com as necessárias adaptações.
ARTIGO 230. (Limites dos poderes) É vedado às regiões autónomas: a) Restringir os direitos legalmente reconhecidos aos trabalhadores; b) Estabelecer restrições ao trânsito de pessoas e bens entre elas e o restante território nacional, salvo, quanto aos bens, as ditadas por exigências sanitárias;
c) Reservar o exercício de qualquer profissão ou acesso a qualquer cargo público aos naturais ou residentes na região.
ARTIGO 231.° (Cooperação dos órgãos de soberania e dos órgãos regionais) 1. Os órgãos de soberania asseguram, em cooperação com órgãos de governo regional, o desenvolvimento económico e social das regiões autónomas, visando, em especial, a correcção das desigualdades derivadas da insularidade. 2. Os órgãos de soberania ouvirão sempre, relativamente às questões da sua competência respeitantes às regiões autónomas, os órgãos de governo regional.
ARTIGO 232._ (Representação da soberania da República) 1. A soberania da República é especialmente representada, em cada uma das regiões autónomas, por um Ministro da República, nomeado e exonerado pelo Presidente da República, sob proposta do Governo, ouvido o Conselho de Estado. 2. Compete ao Ministro da República a coordenação da actividade dos serviços centrais do Estado no tocante aos interesses da região, dispondo para isso da competência ministerial e tendo assento em Conselho de Ministros nas reuniões que tratem de assuntos de interesse para a respectiva região. 3. O Ministro da República superintende nas funções administrativas exercidas pelo Estado na região e coordena-as com as exercidas pela própria região. 4. Nas suas ausências e impedimentos, o Ministro da República é substituído na região pelo presidente da assembleia legislativa regional. ARTIGO 233.'(Órgãos de governo próprio das regiões) 1. São órgãos de governo próprio de cada região a assembleia legislativa regional e o governo regional. 2. A assembleia legislativa regional é eleita por sufrágio universal, directo e secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional.
3. O governo regional é politicamente responsável perante a assembleia legislativa regional, e o seu presidente é nomeado pelo Ministro da República, tendo em conta os resultados eleitorais. 4. O Ministro da República nomeia e exonera os restantes membros do governo regional, sob proposta do respectivo presidente. 5. O estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas é definido nos respectivos estatutos político-administrativos .
ARTIGO 234.° (Competência da assembleia legislativa regional) 1. É da exclusiva competência da assembleia legislativa regional o exercício das atribuições referidas nas alíneas a), b) e c), na segunda parte da alínea d), na alínea), na primeira parte da alínea i) e nas alíneas j), m) e p) do n.° I do artigo 229.° , bem como a aprovação do orçamento regional, do plano económico e das contas da região e ainda a adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades da região. 2. Compete à assembleia legislativa regional elaborar e aprovar o seu regimento, nos termos da Constituição e do estatuto político-administrativo da respectiva região. 3. Aplica-se à assembleia legislativa regional e respectivos grupos parlamentares, com as necessárias adaptações, o disposto na alínea c) do artigo 178.° , nos n.° S 1, 2 e 3 do artigo 181.° e do artigo 182.° , com excepção do disposto nas alíneas e) e J) do n.° 3 e no n.° 4, bem como no artigo 183.° , com excepção do disposto na alínea b) do n.° 2.
ARTIGO 235 . (Assinatura e veto do Ministro da República) 1. Compete ao Ministro da República assinar e mandar publicar os decretos legislativos regionais e os decretos regulamentares regionais. 2. No prazo de quinze dias, contados da recepção de qualquer decreto da assembleia legislativa regional que lhe haja sido enviado para assinatura, ou da publicação da decisão do Tribunal Constitucional que não se pronuncie pela inconstitucionalidade de norma dele constante, deve o Ministro da República assiná-lo ou exercer o direito de veto, solicitando nova apreciação do diploma em mensagem fundamentada. 3. Se a assembleia legislativa regional confirmar o voto por maioria absoluta dos seus membros em efectividade de funções, o Ministro da
República deverá assinar o diploma no prazo de oito dias a contar da sua recepção. 4. No prazo de vinte dias, contados da recepção de qualquer decreto do governo regional que lhe tenha sido enviado para assinatura, deve o Ministro da República assiná-lo ou recusar a assinatura, comunicando por escrito o sentido dessa recusa ao governo regional, o qual poderá converter o decreto em proposta a apresentar à assembleia legislativa regional. 5. 0 Ministro da República exerce ainda o direito de veto, nos termos dos artigos 278.° e 279.° .
ARTIGO 236.° (Dissolução dos órgãos regionais) 1. Os órgãos de governo próprio das regiões autónomas podem ser dissolvidos pelo Presidente da República, por prática de actos contrários à Constituição, ouvidos a Assembleia da República e o Conselho de Estado. 2. Em caso de dissolução dos órgãos regionais, o governo da região é assegurado pelo Ministro da República. (Lei Constitucional Nº.1/92 de 25 de Novembro. 3 revisão da Constituição da República)
A Constituição portuguesa declarou o direito à autonomia dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, uma vez que reconheceu a existência de interesses particulares das comunidades territoriais que neles habitam, assegurando-lhes meios para a tornarem efectiva. Como notas distintivas dessa autonomia relevam as seguintes: a) Competência para legislar em matérias de interesse específico para as regiões, com respeito da Constituição e das leis gerais da República; b) Competência para regulamentar a legislação regional e as leis gerais emanadas dos órgãos de soberania que não reservem para estes o respectivo poder regulamentar: c) Exercício de poder executivo próprio; d) Superintendência nos serviços, institutos públicos e empresas nacionalizadas que exerçam a sua actividade exclusivamente na região e noutros casos em que o interesse regional o justifique;
e) Assunção de atribuições estaduais com a correspondente transferência de serviços periféricos dos órgãos de soberania; f) Eleição das assembleias regionais por sufrágio universal, directo e secreto, de harmonia com o princípio da representação proporcional, abrangendo o colégio eleitoral apenas círculos eleitorais das respectivas regiões. (Fernando Amâncio Ferreira, As Regiões Autónomas na constituição Portuguesa, Coimbra, 1980, pp.59-60)
Desde a extrema-direita à esquerda, se ainda há disso na política daí, desde os bons conservadores aos revolucionários ou conspiradores de profissão, desde os católicos aos indiferentes e aos ateus todos em comovedora unanimidade assentaram ou estão assentando em que a Madeira é uma "filha enjeitada". E não tenho visto que ninguém com os factos, só com os factos, tenha contrariado a campanha [...] E porque compreendo esse fenómeno, é que a Madeira continua sendo tratada como terra civilizada e com paciência, ao menos enquanto se não desmandarem demais. Porque, se o fizerem, é conveniente não esperar a doçura da repressão usada da outra vez. E podem continuar dizendo à vontade que os abandonam [...]. Todos os partidários da autonomia supuseram que esta consistia simplesmente na liberdade de gastar, dando o Poder Central quanto fosse necessário para isso [...]. A autonomia não é a autonomia de gastar, mas a de administrar um património ou uma receita, tirando de um ou de outra o maior rendimento. Do facto de a receita não chegar para tudo o que apetece ou há mesmo necessidade de fazer, não se segue que é ao Governo que incumbe cobrir as diferenças. Perdoe-me V. Ex.a a extensão desta carta. Ela lhe provará [...] o cuidado que me merece essa Madeira encantada e infinitamente ingrata. Em toda a parte há gente que não sabe agradecer, mas uma terra inteira, cheia de benefícios e desconhecedora deles, só a Madeira. E porquê? Porque no fundo deseja o que não pode ter, quer o que não é capaz de realizar e faz ideia que é ao Governo que cabe a responsabilidade dos erros e dos crimes praticados pelos seus naturais. (Carta do Dr. Oliveira Salazar, de 23 de Maio de 1935, ao Presidente da Junta Geral do distrito, Dr. João Abel de Freitas)
PREÂMBULO: ESTATUTO POLÍTICO-ADMINISTRATIVO DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea b) do artigo 164.° , do n.° 3 do artigo 169.° e do artigo 228.° da Constituição, precedendo proposta da Assembleia Regional da Madeira, nos termos do n.° I do artigo 228.° e da alínea e) do n.° 1 do artigo 2'29.° da Constituição. o seguinte:
TITULO I Artigo 1.° O arquipélago da Madeira, composto pelas ilhas da Madeira, do Porto Santo, Desertas, Selvagens e seus ilhéus, constitui uma região autónoma da Republica Portuguesa, dotada de personalidade jurídica de direito publico.
2A Região Autónoma da Madeira abrange ainda o mar circundante e seus fundos, definidos como águas territoriais e zona económica exclusiva, nos termos da lei. Art. 2.° I A autonomia política, administrativa e financeira da Região Autónoma da Madeira não afecta a integridade da soberania do Estado e exerce-se no quadro da Constituição e do seu Estatuto. 2A autonomia da Região Autónoma da Madeira visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico e social integrado do arquipélago e a promoção e defesa dos valores e interesses do seu povo, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses. Art. 3.° São órgãos de governo próprio da Região a Assembleia Legislativa Regional e o Governo Regional.
2As instituições autonómicas regionais assentam na vontade dos cidadãos, democraticamente expressa, e participam no exercício do poder político nacional. Art. 4.- representação da Região cabe aos respectivos órgãos de governo próprio. 2No âmbito das competências dos órgãos regionais, a execução dos actos legislativos no território da Região é assegurada pelo Governo Regional. Art. 5IA Região tem bandeira. brasão de armas, selo e hino próprios, aprovados pela Assembleia Legislativa Regional. 2Os símbolos regionais são utilizados nas instalações e actividades dependentes dos órgãos de governo próprio da Região ou por estes tutelados. 3Os símbolos regionais são utilizados conjuntamente com os correspondentes símbolos nacionais e com salvaguarda da precedência e do destaque que a estes são devidos, nos termos da lei. Art. 6.° A soberania da República Portuguêsa é especialmente representada na Região por um Ministro da Republica, nos termos definidos na Constituição. Art. 7.° A organização judiciária nacional tomará em conta as necessidades próprias da Região. Art. 8.° IA Região exerce poder tributário próprio nos termos da lei e dispõe das receitas fiscais nela cobradas, bem como de outras que lhe sejam, atribuídas, nomeadamente as geradas no seu espaço territorial. 2º Nos termos da Constituição, a Região tem o sistema fiscal próprio resultante da adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais. 3º Nos termos da Constituição, o sistema fiscal regional será estruturado por forma a assegurar a correcção das desigualdades derivadas da insularidade, a justa repartição da riqueza e dos rendimentos e a concretização de uma política de desenvolvimento económico e de justiça social.
(Lei nº.13/91 de 5 de Junho, Diário da República, nº.128, série I A de 5 de Junho de 1991)