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Luís Afonso
A ideia de Junho
Miguel Esteves Cardoso Ainda ontem
N
ão reconheço nem estimo este tempo que tem estado. Os meteorologistas dizem sempre a mesma coisa, que é “normal para a época”. O pior é que a época deles tem mais de cem anos e as médias de tantos Junhos esbatem-se tanto que os verdadeiros valores do nosso Junho perderam-se na noite dos tempos. Bem que podiam abrir uma janela de vez em quando. É como os gritos dos bebés. Perante as dores do paxazinho nosso descendente só sabem dizer: “Não se preocupe, que isso é normal.” Sim, normal para eles. Para quem nunca teve um deles em casa, a liquefazer-se em lágrimas, é anormalíssimo. O mínimo que se pede aos entendidos é um empático “Que horror! Tem toda a razão!” Depois, sim, poderiam dizer que os climas e os bebés são, tal como o futebol, mesmo assim. Não é esta a nossa ideia de Junho. Parece Março. Ou Maio, mas na Irlanda. Onde está o Junho em que já se pode passar o dia inteiro na praia? Volta amanhã, dizem. E os dias de Junho que perdemos? Qual é o contrário de “Estes, já ninguém nos tira”? Esses, já ninguém nos devolve? Deveria haver crítica de tempo feita por meteorologistas falhados, cheios de ódio. Não fariam concessões, nem sequer às estações do ano. Nem tentariam apaziguar a populaça com murmúrios reconfortantes. Todos os dias exigiriam um dia perfeito. Mesmo no negrume chicoteado de Janeiro. Seriam perfeccionistas. Todos os dias teriam de ser dias de Junho. Como estes que ainda não tivemos, raios os partam.
O voto, de arma do povo passou a ser a arma de uma nova casta
A democracia circunstancial
T
erminou o primeiro acto eleitoral. Seguem-se mais dois e a questão, agora, é avaliar a hipótese de, com eles, algo mudar num país que se atola num pântano. Mas como poderemos esperar mudança se os protagonistas que se divisam são os mesmos e o que de negativo dizem uns dos outros se poderia aplicar, tudo junto, a cada um deles? Santana A curta história dos nossos 35 anos de democracia patenteia uma linear alternância entre ciclos eufóricos e Castilho depressivos, a que sempre tem faltado uma visão política de longo prazo e uma capacidade de mobilizar os portugueses a favor do verdadeiro interesse nacional e colectivo. Parafraseando James Clarke, têm-nos sobrado pequenos políticos que só pensam na próxima eleição e escasseado políticos que se preocupem com a próxima geração. A Educação é, actualmente, um belo paradigma do que afirmo. Partindo de diagnósticos correctos, orientou todas as medidas para um mesmo objectivo: fabricar resultados estatísticos imediatos, com criminoso desprezo pelo engano dramático em que envolveu milhares de jovens e adultos, embalados na miragem das novas oportunidades. Se nos virarmos para a Economia, núcleo central do debate político que a conjuntura sobreleva, encontramos a mesma natureza bipolar do nosso existir: ora gastamos à tripa forra, julgando que somos ricos, embalados pelo crédito fácil que convida ao consumismo irreflectido e predador, ora apertamos o cinto até ao limiar da própria fome e de privações desumanas. O traço comum entre estas duas realidades não me parece difícil de estabelecer: a um povo pouco esclarecido, po- Outra legislatura líticos sem escrúpulos têm dito que pode ad- crispada, quirir saber e conhecimento por osmose, tendo o Magalhães e as Novas Oportunidades como persistindo nos erros interfaces, e que é possível viver eternamente monumentais que gastando mais do que aquilo que se produz, pois a recuperação económica chegará se con- nesta foram cometidos, fiarem no seu charlatanismo e ainda sobrarão será suicidária para o trocos para o TGV e BPN. Uma reflexão que o acto eleitoral acabado país e para as gerações de viver permite, e que, obviamente, se projecta nos dois que se seguem, respeita ao afas- vindouras
tamento claro e continuado da vida política por parte da denominada sociedade civil. Por isto são responsáveis os partidos políticos dominantes e a sua lógica de apropriação da democracia. Em consequência da oligarquia partidária, uns (poucos) sentam-se diariamente à mesa do orçamento e só se lembram dos restantes de 4 em 4 anos, para os aliciarem a legitimar o logro. Embora a abstenção seja o que sabemos, espanta-me o tempo que o cidadão comum tem levado a interiorizar que a sua hipótese de intervir na vida política vale pouco mais que zero. De arma do povo, o voto, com esta lógica, passou a ser a arma de uma nova casta. Esta é a doença endémica da nossa democracia, que só terá correcção com a regeneração deste regime, podre e corrupto, dominado por gente que vive da política em vez de viver para a política. E para isso é necessário exibir publicamente os logros e os erros. Porque os erros não podem virar princípios por imposição autocrática daqueles que os cometem. Reside aí, aliás, a diferença entre a democracia madura e a democracia circunstancial (a que atrai a atenção dos governantes apenas em circunstância de eleições). Na primeira, as estruturas de participação activa da sociedade evitam a persistência nos erros e sujeitam o poder a um saudável escrutínio continuado. Na segunda, os régulos de serviço acenam com a legitimidade da eleição que os escolheu para transformar a República na sua própria quinta. Necessário, ainda, é guardar memória dos que mentiram e se serviram, quando deveriam servir, para não os repescar de uma qualquer travessia de deserto dourado, pouco tempo volvido (creio ter sido Churchil que comparou a política à guerra para dizer que na guerra só se morria uma vez, enquanto na política se podia ressuscitar várias vezes). Os problemas da Educação e da Economia, e com eles os da Saúde e da Justiça, só são solúveis (de forma a estancar a marcha no plano inclinado da perda da soberania em que nos encontramos) se soubermos gerar um consenso político e social que esteja nos antípodas dos comportamentos em que os líderes políticos foram pródigos nestas eleições. O país está cansado de ódios e golpes baixos. Prosseguindo assim, ganharão eleições, mesmo que o número de votos seja cada vez menor. Mas não
DANIEL ROCHA
ganharão soluções para os problemas de todos nós nem o respeito da nação. Outra legislatura crispada, persistindo nos erros monumentais que nesta foram cometidos, será suicidária para o país e para as gerações vindouras. Abandono-me ao critério dos que me podem apodar de pessimista porque é a minha consciência que grita que, pela má condução da Economia e da Educação, estamos a perder a independência nacional. Sei do que falo, meço o que digo e não estou a ser exagerado. Termino, remexendo na memória. O que Eça e Ramalho Ortigão diziam do povo em 1871 sugere que a nossa evolução é demasiado lenta: “O país é espectador distraído: nada tem de comum com o que se representa no palco; não se interessa pelos personagens e acha-os todos impuros e nulos; não se interessa pelas cenas e acha-as todas inúteis e imorais... Só às vezes, no meio do seu tédio, se lembra que para poder ver teve que pagar... Paga para ter ministros que não governam, deputados que não legislam, soldados que não defendem, padres que rezam contra ele. Paga àqueles que o espoliam e àqueles que são seus parasitas ... Paga tudo, paga para tudo”. Professor do ensino superior (
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