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VIEIRA, Alberto (1997), O Algarve e a Madeira
COMO REFERENCIAR ESTE TEXTO: VIEIRA, Alberto (1997), O Algarve e a Madeira, Funchal, CEHA-Biblioteca Digital, disponível em: http://www.madeira-edu.pt/Portals/31/CEHA/bdigital/avieira/algarve.pdf, data da visita: / /
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O ALGARVE E A MADEIRA É comum afirmar-se que os primeiros povoadores da Madeira são oriundos do Algarve. Esta ideia filia-se na tradição algarvia da gesta expansionista e na seguinte expressão de Jerónimo Dias Leite: «muitos do Algarve», que a copia de Francisco Alcoforado. Mais uma vez estamos perante uma dedução apressada, uma vez que faltam provas que a corroborem. Senão, vejamos. Numa listagem dos primeiros povoadores referidos nos documentos e crónicas, a presença nortenha (64%) é superior à algarvia (25%). Por outro lado, os registos paroquiais da freguesia da Sé (desde 1539), no período de 1539 a 1600, confirmam essa ideia, uma vez que os nubentes oriundos de Braga, Viana e Porto representam 50% do total, enquanto os provenientes de Faro não ultrapassam os 3%. A mesma ideia é reafirmada por recente estudo em que se analisa a situação das demais freguesias da Madeira no século XVI. Mais uma vez somos remetidos para o norte do país, onde se destacam Braga(11%), Viana do Castelo(8,4%). Todavia o estudo de Alberto Iria, publicado em 1974 pretende estabelecer uma forte vinculação entre a Madeira e a costa algarvia. Os mais eminentes investigadores madeirenses hesitam entre a procedência minhota ou algarvia dos primeiros colonos. Ernesto Gonçalves, no entanto, é peremptório em apontar a ascendência minhota dos primeiros obreiros do povoamento do arquipélago. Tendo em consideração que o povoamento da Madeira é um processo faseado, em que intervêm colonos oriundos dos mais recônditos destinos, e que de todo o reino surgem gentes empenhadas nesta tentadora experiência, é de prever a confluência de várias localidades, em especial a norte do Tejo Aveiro, Porto e Viana -, adestradas no arroteamento de terras incultas ou nas lides do mar. Se é certo que do Algarve partem muitos dos apaniguados da casa do infante, com uma função importante no lançamento das bases institucionais do senhorio, não é menos certo que do norte de Portugal, nomeadamente da região de Entre Douro e Minho, provêm os cabouqueiros das ilha. Não obstante estas insolúveis incógnitas é evidente a vinculação dos moradores na costa algarvia(Tavira, Lagos, Silves, Aljezur e Sagres) ao início do processo de povoamento da ilha e ao estabelecimento das linhas de força do mercado externo. A iniciativa das primeiras viagens algarvias traçou um rumo que perdurará por algum tempo como uma via privilegiada de circulação de homens e mercadorias. Por isso mesmo de ambos os lados do circuito é evidente o reflexo dessa realidade. Muitos dos que aparecem na ilha pertencem à casa do infante. São criados, escudeiros, cavaleiros e fidalgos que o acompanham nas suas andanças algarvias e aderem ao projecto de descobrimentos, que tem na Madeira o primeiro passo. Note-se que, não obstante a iniciativa da viagem de reconhecimento fosse iniciada no Algarve, foi de Lisboa que partiram as embarcações. Conta Jerónimo Dias Leite que o infante recomendou em 1419 a João Gonçalves Zarco que fosse a Lisboa, oferecendo-se ao rei para tal tarefa. Acompanharam-no alguns homens atreitos a qualquer feito de guerra no mar e em terra e ”mais alguus homes de Lagos como forão Antonio Gago, Lourenço Gomes,...” De entre todos estes que se empenharam no povoamento e comércio na Madeira podemos referenciar João Vaz de Faro, João de Tavira e Pedro Álvares de Lagos ou do Trauto. O segundo foi um destacado mercador e tabelião, tendo ainda hoje direito a uma rua na cidade do Funchal. Este último totalmente comprometido com o comércio africano e interessado no monopólio do comércio do açúcar da ilha. Na listagem de mercadores que conseguimos reunir para os séculos XV e XVI temos 9 do Algarve, sendo destes 7 de Lagos, todavia os principais destinos do comércio madeirense situar-se-ão em Lisboa e Viana do Castelo. Uma das raras referências ao comércio com a costa algarvia surge em 1476 com a sardinha de fumo de Lagos. O retorno não se ficava apenas pela novidade das produções da ilha, mas também pela presença de alguns que não conseguiram adaptar-se ao novo meio. Estes retornados adquiriam o título da ilha, nome que popularizou a Madeira no século. Serão deste grupo Beltrão da Ilha, Gastão da Ilha e Lançarote da ilha. A par disso Gaspar Frutuoso refere que Tristão Vaz, também conhecido como o Tristão da Ilha, o primeiro capitão da capitania de Machico, se deslocava com frequência ao Algarve e aí terá falecido em 1470, sendo sepultado na catedral de Silves. O mesmo sucedeu ao capitão do Porto
Santo, Bartolomeu Perestrelo, que escolheu para sepultura Aljezur. O Reflexo dessa presença algarvia na Madeira faz-se sentir a vários níveis na sociedade madeirense, deixando também as suas marcas na toponímia da ilha. Primeiro é a associação que se faz de Machico a Monchique, sendo considerado o último uma corruptela do primeiro. Outros locais mostram essa relação com maior evidência: Algarvio(na freguesia de S. Gonçalo), Boliqueime (freguesia de Sto António) e vila Baleira (no Porto Santo).
BIBLIOGRAFIA FUNDAMENTAL: O debate resulta da referência de Jerónimo Dias Leite[Descobrimento da ilha da Madeira e discurso da vida e feitos dos capitães da dita ilha, Coimbra, 1947, pp.5-6]. O debate iniciou-se com um estudo de Ernesto Gonçalves[«No Minho ao sol de Verão», in Das Artes e da História da Madeira, vol. IV, nº 21, 1955, 45-46, Fernando M. Vaz Famílias da Madeira e Porto Santo, vol. I, Funchal, s.d., pp. 224 (nº 1) e 248 (nº 1)]. São divergentes as opinões da historiografia local: Fernando Augusto da SILVA, «Do começo do povoamento madeirense», in Das Artes e História da Madeira, Vol. VIII, nº 37, 5; Joel SERRÃO, «Na alvorada do mundo atlântico», in Ibidem, vol. VI, nº 31, 1961, 6. O tema ganhou novo interesse com o estudo de Alberto IRIA[O Algarve e a Madeira no Século XV, Lisboa, 1974, sep. de Ultramar], que mereceu a crítica de Fernando Jasmins Pereira[O Algarve e a Madeira, Braga, 1975]. Jorge Dias, Nótulas de Etnografia Madeirense. Contribuição para o Estudo das Origens Étnico-Culturais da População da Ilha da Madeira, in Biblos, Lisboa, 1953, 25-36. No seguimento deste debate assinalam-se estudos de MATOS, A.T., "Do contributo algarvio no povoamento de Madeira e dos Açores" in Actas das I Jornadas de História do Algarve e Andaluzia, Loulé, 1987, 173-183; "Origem e reminiscências dos povoadores das ilhas atlânticas", in Congresso Internacional. Bartolomeu Dias e a sua Época, Vol. III, Porto, 1989, 241-252, Luís Francisco de Sousa MELO, "A imigração da Madeira" in História e Sociedade, nº 6, 1979, 39-57; Idem, "O Problema de origem geográfica do povoamento" in Islenha, nº 3, 1988, 19-34, Maria Luís Rocha PINTO e Teresa Maria Ferreira RODRIGUES, "Aspectos do povoamento das ilhas da Madeira e Porto Santo nos séculos XV e XVI", in Actas III Colóquio Internacional de História da Madeira, Funchal ,1993, pp.403-471, João Silva de SOUSA, “A casa do infante D. Henrique e o arquipélago da Madeira(algumas notas para o seu estudo)”, in Actas do I Colóquio de História da Madeira(1986) , Funchal, 1989, pp. 108-127, Alberto Vieira, O comércio inter-insular nos séculos XV e XVI, Funchal, 1986, pp.87-88.