A fenomenologia tem por palavra-de-ordem o retorno às próprias coisas, se propõe a ir além dos sistemas construídos no ar. A expressão ´fenomenológica´ significa antes de mais nada um conceito de método (…). O termo expressa um lema que poderia ser assim formulado: voltemos às próprias coisas! E isso em contraposição às construções desfeitas no ar e às descobertas casuais, em contraposição à aceitação de conceitos só aparentemente justificados e aos problemas aparentes que se impõem de uma geração à outra como verdadeiros problemas.[2] Esta filosofia se sustenta partindo da base de dados indubitáveis para neles construir o edifício filosófico. “Sem evidência, não há ciência” diria Husserl nas Investigações lógicas, então na fenomenologia se procura evidências estáveis. “Os limites da evidência apodítica representam os limites do nosso saber. Assim, é preciso buscar coisas manifestas, fenômenos tão evidentes que não possam ser negados”[3]. Portanto, a fenomenologia ainda procura tais coisas manifestas ou evidentes através da descrição dos “fenômenos” que se anunciam e apresentam à consciência depois da epoché. E este ponto de aproximação da epoché dos fenomenólogos, o resíduo fenomenológico, é encontrado na consciência: “a existência da consciência é imediatamente evidente”[4] . A fenomenologia, a partir dessa evidência, já que é uma ciência de essências e não de fatos, pretende descrever os modos típicos como as coisas e os fatos se apresentam à consciência, ou seja, as essências eidéticas. Naturalmente, esta fenomenologia é a ciência das essências. Eis, portanto, o que a fenomenologia pretende ser: ciência, fundamentada estavelmente, voltada à análise e à descrição das essências. Com base nisso, podemos compreender como a fenomenologia se distingue da análise sicológica ou da análise científica. Diferentemente do psicólogo, o fenomenólogo não manipula dados de fato, mas essências; não estuda fatos particulares, senão idéias universais.[5]
A intuição intelectual, emotiva e volitiva. Quando na atitude da intuição o filósofo põe principalmente em jogo suas faculdades intelectuais, então temos a intuição intelectual. Esta intuição intelectual tem no objeto seu correlato exato. Já sabemos que todo ato do sujeito, todo ato do espírito na sua integridade, se encaminha para os objetos, e o ato do sujeito tem então sempre seu correlato objetivo, consistente, para tal intuição, na essência do objeto. A intuição intelectual é um esforço para captar diretamente mediante um ato direto do espírito, a essência, ou seja, aquilo que o objeto é.
Mas existe, além. disso, outra atitude intuitiva do sujeito em que atuam predominantemente motivos de caráter emocional. Esta segunda espécie de intuição, que chamamos intuição emotiva, tem também seu correlato no objeto. O correlato a que se refere intencionalmente a intuição emotiva já não é a essência do objeto, já não é aquilo que o objeto é, mas o valor do objeto, aquilo que o objeto vale. No primeiro caso a intuição nos permite captar o éidos, como se diz em grego, a essência ou a consistência do objeto. No segundo caso, ao contrário, o que captamos não é aquilo que o objeto é, mas aquilo que o objeto vale, ou seja, se o objeto é bom ou mau, agradável ou desagradável, belo ou feio, magnífico ou mísero. Todos estes valores que estão no objeto são captados por uma intuição predominantemente emotiva. E existe uma terceira intuição na qual as motivações internas do sujeito, que se coloca nessa atitude, são predominantemente volitivas. Esta terceira intuição em que os motivos que se entrechocam são derivados da vontade, derivados do querer, tem também seu correlato no objeto. Não se refere nem â essência, como a intuição intelectual, nem ao valor, como a intuição emotiva. Refere-se à existência, à realidade existencial do objeto. Por meio da intuição intelectual propende o pensador filosófico a desentranhar aquilo que o objeto é. Por meio da intuição emotiva propende a desentranhar aquilo que o objeto vale, o valor do objeto. Por meio da intuição volitiva desentranha, não aquilo que é, senão que é, que existe, que está aí, que é algo distinto de mim. A existência do ser manifesta-se ao homem mediante um tipo de intuição predominantemente volitiva.