7 Set Em Bro

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O novo Portal Catolicanet, lançado no mês de junho, está ainda mais dinâmico e interativo, permitindo a você, internauta, acompanhar passo a passo a vida da Igreja Católica no Brasil e no mundo. Participe comentando notícias, votando em enquetes, en­viando mensagens e sugerindo novos temas para discussão.

www.catolicanet.com

Democracia e saúde no Brasil: uma realidade possível? Vivemos num país considerado democrático. Isso significa que somos os responsáveis diretos pelo bem-estar da comunidade, pelas regras que nos orientam e pela nossa realidade social. Dentre os nossos direitos está o da saúde. A garantia da saúde requer a atuação direta dos cidadãos. Assegurar esse direito custou organização e movimentação por parte da sociedade; mantê-lo e ampliá-lo requer capacidade de acreditar no nosso envolvimento direto. O livro de Humberto Dantas (Editora Paulus) é um convite à atuação social na área da saúde, demonstrando que, democraticamente, somos capazes de melhorar nossas condições de vida. Sua leitura é um estímulo à cidadania ativa.

Editora Paulus: (11) 3789-4000

EDITORIAL

A conferência do CELAM

Jaime C. Patias

A

V Conferência Geral dos Bispos da América Latina e do Caribe, a realizar-se de 13 a 31 de maio de 2007 em Aparecida, situa-se numa trajetória que vai desde o nascimento do CELAM até os dias de hoje, passando pelo Concílio Vaticano II, Medellín, Puebla e Santo Domingo. É tempo privilegiado para rever as opções feitas nessa trajetória e olhar para o presente e o futuro levantando as questões que merecem a atenção da Igreja no continente. Nesta edição, iniciamos a publicação de uma série de artigos intitulada “Pelos caminhos da América” para fazer memória das Conferências anteriores e ajudar na preparação da próxima. Nesse sentido, é importante destacar as opções que já fazem parte da história da caminhada continental e que são inegociáveis. A Conferência de Aparecida deve ter em conta essas opções básicas que iniciam com o Concílio Vaticano II como linhas orientadoras. Elas estão centradas na pessoa de Jesus Cristo, que anunciou o Reino de Deus fundamentado no serviço ao mundo. Assim, a Igreja não existe para si, mas para servir o mundo a partir da atitude fundamental de Jesus. Em primeiro lugar, o Concílio Vaticano II recuperou o primado da Palavra de Deus com a sua valorização nas liturgias, na produção teológica, na formação do clero e na vida dos fiéis. A segunda opção foi afirmar a base laical da Igreja como Povo de Deus. O leigo adquiriu nela o seu verdadeiro lugar e surgiram as primeiras Comunidades Eclesiais de Base. Mais tarde, nas ondas de Medellín, as CEBs desenvolveram-se. Em terceiro lugar, com a base laical, o Vaticano II criou um espírito colegial, valorizando a Igreja local com suas comunidades. Incrementaram-se as Conferências Episcopais e os Conselhos Diocesanos, Paroquiais e Comunitários. Como quarta opção temos uma nova relação da Igreja com o mundo. A Igreja da América Latina quis fazer na Conferência de Medellín (1968) uma aplicação do Concílio Vaticano II no continente. Algumas das decisões fazem parte da tradição eclesial a ser mantida e reforçada em Aparecida, tais como: a opção pelos pobres, pela libertação e pelas Comunidades Eclesiais de Base, o “novo jeito de ser Igreja”, a opção pela centralidade da justiça social e por uma Igreja profética. Na lista das opções feitas em Puebla (1979) algumas se confirmaram e outras surgiram. Assim, temos a opção pelos pobres, pelos jovens, pela comunhão e a participação e a opção pela defesa da dignidade da pessoa humana. A Conferência de Santo Domingo (1992) percebeu novos desafios e destacou: a inculturação, dando importância às culturas ameríndia, afro e de religiosidade popular como espaço de evangelização; o protagonismo dos leigos; a opção por uma solidariedade latino-americana e mundial ante a globalização, vendo a necessidade da afirmação das identidades regionais e a opção pela leitura da realidade a partir dos sinais dos tempos. Os tempos avançam e a Conferência de Aparecida precisa responder a novos desafios tais como: a revitalização e animação da estrutura interna da Igreja; a evangelização do novo sujeito que surge da sociedade globalizada que está gerando um novo tipo de pobre e excluído. Reunida às margens do Rio Paraíba, a Igreja do continente saberá reafirmar sua caminhada histórica e enfrentar a evangelização da cultura moderna e pós-moderna, inspirada no tema “Discípulos e Missionários de Jesus Cristo, para que Nele nossos povos tenham vida”.  - Setembro 2006

SUMÁRIO setembro 2006/07

1 - Santuário Nacional de Aparecida e papa Bento XVI. Fotos: Jaime C. Patias e divulgação

2 - Cartaz do Grito 2006.

 MURAL DO LEITOR--------------------------------------04 Cartas

 OPINIÃO--------------------------------------------------05 Uma avaliação da Campanha da Fraternidade Valeriano Paitoni

 PRÓ-VOCAÇÕES----------------------------------------07 Ser Jeremias hoje! Jaime Carlos Patias

 VOLTA AO MUNDO-------------------------------------08 Notícias do Mundo Desarme / Fides / Rádio Vaticano

 ESPIRITUALIDADE----------------------------------------10 A Palavra de Deus nos gritos de hoje Ramón Cazallas Serrano

 TESTEMUNHO-------------------------------------------12 Quando Deus bate o olho em alguém Eudóxa Alves Sicupira

 FÉ E POLÍTICA--------------------------------------------14 Votar na fé ou no direito? Humberto Dantas

 FORMAÇÃO MISSIONÁRIA----------------------------15 Pelos caminhos da América - V Conferência CELAM Giovanni Crippa

 MISSÃO HOJE-------------------------------------------19 Missão e inclusão Joaquim Gonçalves

 DESTAQUE DO MÊS------------------------------------20 A Igreja e o Grito dos Excluídos Luiz Bassegio

 ATUALIDADE----------------------------------------------22 A hora da verdade Humberto Dantas

 INFÂNCIA MISSIONÁRIA-------------------------------24 É tempo de aprender Roseane de Araújo Silva

 CONEXÃO JOVEM--------------------------------------25 Mito: uma verdade simbólica Marinei Ferrari

 ENTREVISTA ELIANE COSTA SANTANA---------------26 Timor Leste no meu coração Jaime Carlos Patias

 AMAZÔNIA-----------------------------------------------28 Descaso na educação indígena José Rosha

 Volta ao Brasil---------------------------------------30 Notícias do Brasil Adital / CNBB / CNBB Sul 1 / OSID

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Mural do Leitor A no XXXIII -

no

07 S etembro 2006

Diretor: Jaime Carlos Patias Editor: Maria Emerenciana Raia Equipe de Redação: Joaquim F. Gonçalves, José Tolfo e Rosa Clara Franzoi Colaboradores: Vitor Hugo Gerhard, Lírio Girardi, Luiz Balsan, Roseane de Araújo Silva, Júlio César, Manoel Aparecido Monteiro, Humberto Dantas, Ramón Cazallas, Luiz Carlos Emer, Giovanni Crippa Agências: Adital, Adista, CIMI, CNBB, Dom Hélder, IPS, MISNA, Pulsar, Vaticano Diagramação e Arte: Cleber P. Pires Jornalista responsável: Maria Emerenciana Raia (MTB 17532) Administração: Eugênio Butti Sociedade responsável: Instituto Missões Consolata (CNPJ 60.915.477/0001-29) Impressão: Edições Loyola Fone: (11) 6914.1922 Colaboração anual: R$ 40,00 BRADESCO - AG: 545-2 CC: 38163-2 Instituto Missões Consolata (a publicação anual de Missões é de 10 números)

Missões é produzida pelos Missionários e Missionárias da Consolata Fone: (11) 6256.7599 - São Paulo/SP (11) 6231.0500 - São Paulo/SP (95) 3224.4109 - Boa Vista/RR Membro da PREMLA (Federação de Imprensa Missionária Latino-Americana) e da UCBC (União Cristã Brasileira de Comunicação Social)

Redação

Rua Dom Domingos de Silos, 110 02526-030 - São Paulo Fone/Fax: (11) 6256.8820 Site: www.revistamissoes.org.br E-mail: [email protected]

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Cristo me chamou

Não pensem que foi fácil deixar minha família, minha comunidade, minhas atividades pastorais, enfim, deixar para trás toda minha vida para atender ao chamado Dele. Nunca tive coragem de partilhar com alguém o desejo de ingressar no Seminário propedêutico dos missionários da Consolata, mas desde há muito tempo já tinha a certeza de que Deus queria isso de mim, por isso antes de comunicar minha decisão aos meus familiares, sofri muito. Mas tudo o que sentia foi bem mais forte, e com a ajuda de Deus, disse meu sim. A cada dia que passava, aumentava o nervosismo, só em pensar que, um dia, deixaria para trás a vida tão bela que tinha. Sei que o Senhor jamais me abandonará e, por isso, fui capaz de deixar meus pais, meus irmãos, meu sobrinho e todos os meus amigos a quem muito estimo. Deixálos para seguir a Cristo não significa que deixei de os amar, muito pelo contrário, continuo a nutrir por todos eles o maior carinho e tenho certeza de que o amor de Deus é bem maior. Decidi atender ao chamado do Senhor, hoje, pois não sei (servindo-me das palavras do Bem-aventurado José Allamano, fundador dos missionários e missionárias da Consolata) se Ele me chamará amanhã. E quando atendemos seu chamado não estamos fazendo um favor a Ele, pois é Ele, que nos escolhe dentre muitos para sermos seus “operários”.

Luiz Antônio de Brito Propedêutico IMC Feira de Santana, BA

A vocação

Sou seminarista do propedêutico em Manaus, tenho 21 anos e gostaria de dar meu testemunho vocacional: estou muito feliz por fazer parte desta família tão bonita dos missionários da Consolata, que conheci em Roraima, trabalhando na área do Caranã, dando seu testemunho no meio do povo. Animado por este trabalho é que eu estou no Seminário dando o meu sim a Deus e a tantos povos espalhados por esta terra. Quero parabenizar à equipe da revista Missões por suas excelentes matérias!

Antônio José Araújo Propedêutico IMC Manaus, AM

Revista Missões

Parabéns à revista Missões pela evangelização. Não deixem este coração parar de bater. A revista é muito importante para todos nós. Deus em seu infinito amor sempre está presente em nossa vida, nos ajudando a superar todos os obstáculos. A partir do momento que nos despojamos e seguimos seus ensinamentos Ele nos capacita para suportarmos as pedras no nosso caminho e nos dá forças para transpô-las. “Vinde a mim, vós todos que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei” (Mt 11, 28). “A palavra de Deus é viva, eficaz, mais penetrante que uma faca de dois gumes”, mas é através de nosso testemunho que conseguiremos realmente arrastar as pessoas para junto de Deus. O nosso modo de viver e agir é que traz cada um de nossos irmãos mais perto de nós. Por isso é que devemos viver mais unidos, e digo mais, maridos e esposas, jovens, coordenadores de pastorais, devemos amar através das dificuldades do dia-a-dia, seguindo os ensinamentos de Jesus e transmitindo a todas as pessoas a verdadeira paz e alegria que só Ele traz. Aquela alegria que contagia, que converte, que ilumina o coração e vai até os confins da alma. Nossas palavras sem obras são vazias. O nosso testemunho de vida fala muito mais que mil palavras. Como disse a minha Dora na celebração do dia 15 de julho de 2006, quando completamos 25 anos de casados: “quando tiver champanhe brinde com champanhe, quando não tiver champanhe brinde com água, mas continue brindando".

Ronaldo e Dora Comunidade Santo Alfredo e Nossa Senhora do Monte Lauzane Paulista, SP Vocês estão de parabéns pelos artigos da edição de julho/ agosto, em especial Espiritualidade e Missão, Romaria dos Mártires e Cidadania plena. Obrigada pelo trabalho, continuem assim.

Ir. Edilene, pddm Via E-mail Setembro 2006 -

OPINIÃO

Uma avaliação

da Campanha da Fraternidade

Os desafios e esperanças da Igreja no Brasil se refletem na CF, promovida pela Conferência dos Bispos. de Valeriano Paitoni

Q

uando cheguei ao Brasil, em 1978, encontrei uma Igreja viva e atuante em todas as camadas da sociedade. A esperança de uma sociedade fraterna e mais justa era a alegria que permeava todo o povo cristão. Mal terminávamos uma Campanha da Fraternidade (CF) e já sonhávamos com a próxima. Sentíamos o fogo do Espírito Santo que queimava e destruía os erros do passado para plantar e cultivar a semente do Reino de Deus no coração de todos. Imbuídos dos temas da CF, sempre nos questionávamos, até encontrar caminhos novos de pastoral que se concretizavam nas ações como novas respostas aos antigos problemas da humanidade. A conjuntura religiosa que a nossa Igreja vive nos tempos atuais acabou atingindo a vitalidade que vinha alimentando desde a celebração do Concílio Ecumênico Vaticano II. Não há mais aquele entusiasmo em fazer da CF a alma de todas as nossas ações pastorais. Isto revela uma diminuição de uma ação libertadora que era a característica vital da Igreja no Brasil. A causa de tudo isso talvez esteja no secularismo da nossa sociedade e na globalização massificante que nos pegou despreparados para dar respostas apropriadas aos múltiplos desafios. Perdemos o rumo da nossa ação pastoral. Mas, existe também, a meu ver, questões internas: a nossa Igreja, medrosa em buscar novas respostas e incapaz de falar a linguagem do - Setembro 2006

homem da pós-modernidade, está se refugiando cada vez mais numa religiosidade popular e alienante e num fundamentalismo anacrônico. Devemos também admitir que a luta sistemática contra a Teologia da Libertação, característica vital da nossa Igreja, decepcionou de forma generalizada os agentes de pastoral que viam nos temas das CFs um incentivo forte que os levava a se doar pela causa do Reino de Deus.

Situações missionárias

Uma nova luz aparece no horizonte para dar à Campanha da Fraternidade uma veste não nova, mas sim, mais brilhante: o amadurecimento da dimensão missionária do nosso batismo. E nos levará a descobrir a grande importância que a CF ainda tem na nossa ação pastoral de conjunto. Analisando todos os temas das Campanhas podemos ver como eles tentaram dar respostas novas àquelas que no campo do anúncio definimos como “situações missionárias”. Vejo que hoje é urgente fazer uma releitura da CF à luz da dimensão missionária da nossa fé. Isso impedirá que a Igreja se torne um agente a mais que promove a cultura da morte por não incentivar um ampla e real inculturação do Evangelho. Tomara que descubramos em tempo que a articulação do projeto “Queremos ver Jesus, Caminho Verdade e Vida” só se tornará efetiva na medida em que a nossa ação pastoral se revista da pedagogia de Cristo, que na CF tem o seu ponto mais alto e expressivo. 

Valeriano Paitoni é missionário, pároco da Paróquia Nossa Senhora de Fátima, Imirim, SP.

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Jaime C. Patias

Bispo do Xingu é ameaçado

Dom Erwin Kräutler numa terra sem lei.

U

m Pará com terras sem lei. É assim que o estado fica registrado na mente do pequeno trabalhador do Oeste paraense, principalmente no interior de Santarém, e dos povos nativos do Parque Indígena do Xingu. Nessas regiões, morre quem se opor às ocupações latifundiárias pecuaristas, “sojeiras” e de exploração de madeira. A concentração da terra, do poder, e a impunidade são algumas das causas que levam o Pará a apresentar o maior índice do país de assassinatos relacionados com a disputa de terras. De 1.237 mortes no Brasil, entre 1985 e 2001, conforme a Comissão Pastoral da Terra, 40% aconteceram no Pará. Atualmente, toda pessoa defensora dos Direitos Humanos nas áreas de conflito é alvo de ameaças de morte. Não escapam nem religiosos. Segundo o Programa de Proteção à Testemunha, existe uma lista de 120 pessoas marcadas para morrer. O bispo da Prelazia do Xingu, dom Erwin Kräutler, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-Pará, padre José Boeing e o padre Edilberto Sena - detentor do prêmio de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção Pará - também são alvos de ameaça. A cidade de Santarém, localizada no encontro dos rios Amazonas e Tapajós, é uma das áreas conflituosas, que tem como protagonistas fazendeiros - vindos de outros estados (Paraná, Rio Grande do Sul e Mato Grosso) e defensores do plantio de soja nos arredores da cidade -, e o grupo formado por moradores antigos da região, membros da Igreja Católica e ambientalistas, que são a favor do desenvolvimento sustentável da Amazônia.

Conflitos eternos

Nunca é definido quem é o dono da terra. O governo afirma que é a União e os fazendeiros tentam a regularização junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e não conseguem. A demora e a indefinição levam os latifundiá­rios, detentores do poder econômico, ao desmatamento e à exploração das terras, prejudicando o meio ambiente e expulsando da região o pequeno trabalhador, que acaba seguindo em direção às periferias. Conforme as denúncias feitas ao Ministério Público, quem defender os excluídos e influenciá-los na luta pelos seus direitos, perde a vida em pouco tempo, tudo em função da impunidade. “Os religiosos são ameaçados porque são porta-vozes dos oprimidos”, diz o procurador Felício Pontes, do Ministério Público. Em 1998, a Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu um programa de proteção aos defensores e defensoras dos Direitos Humanos, e o governo federal só adotou essa medida em 2003. Já o Pará adotou apenas no ano passado por ocasião da morte da irmã Dorothy Stang. “Nas últimas ameaças que recebi, percebi que a equipe do programa de proteção aos defensores dos Direitos Humanos fez um levantamento de todas as pessoas ameaçadas no Oeste do Pará. Acredito que devemos colocar esse programa em atividade permanente, para fazer com que a defesa das pessoas aconteça, de fato, não somente quando sofrerem ameaça”, diz padre José Boeing. O desmatamento em Santarém é tamanho, que, entre 2004 e 2005, imagens de

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satélite revelaram que 1,2 milhão de hectares de terra viraram plantações de soja, uma área correspondente a mais de um milhão de campos de futebol. O porto de Santarém é outro exemplo do poder da soja no Norte do Brasil. É de lá que se escoa a soja para ser consumida na Europa. A existência do porto, construído por uma empresa norte-americana, é contestada na Justiça. “A região do Alto Xingu é considerada a última fronteira agrícola do Pará e é, ao mesmo tempo, a região em que problemas de todo tipo se concentram. Às vezes se assemelha ao faroeste dos filmes de bangue-bangue”. Esse é o trecho de uma carta do bispo do Xingu, dom Erwin Kräutler, às autoridades, em 2004, denunciando a violência no campo. Dois anos depois, o problema continua e o prelado é um dos ameaçados de morte. Dom Erwin é ameaçado por ser porta-voz dos trabalhadores superexplorados e dos povos indígenas que se concentram no Alto Xingu. O bispo se preocupa também com o desmatamento excessivo na região. O mapa do Parque Indígena do Xingu, onde vivem 14 etnias diferentes, é uma prova dos prejuízos ao meio ambiente, pois se percebe que ao redor do verde de 2,8 milhões hectares de extensão do parque predominam queimadas e desmatamentos, associados à formação de lavouras e pastagens.

Desmatamento contínuo

Há seis anos, quando o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou um dos mais elevados índices de desmatamento das áreas de floresta da Bacia do Rio Xingu, localizadas fora de áreas protegidas, somou 2,9 milhões de hectares, o equivalente a pouco mais de um Parque do Xingu. No mesmo período, do total da área desmatada, apenas 1,46% era das terras indígenas e 3,8% de unidades de conservação ecológica. No Alto Xingu, quem lutar contra a ocupação desordenada da terra (grilagem), desmatamento ilegal, exploração ilegal de madeira, trabalho escravo, superexploração de mão-de-obra e tráfico de drogas, acaba sendo alvo de fazendeiros detentores de poder econômico. Ainda na carta às autoridades, em 2004, dom Erwin definia o Alto Xingu como uma terra sem lei: “a atuação de pistoleiros a mando de ambiciosos grileiros e usurpadores de terras indígenas ou pertencentes à União, os assassinatos no campo e na cidade, roubos e assaltos em plena luz do dia, execuções de pessoas ‘non gratas’ em praça pública por motoqueiros protegidos por capacetes escuros, tudo isso e mais outros crimes, na maioria impunes, fazem esta região parecer uma terra sem lei”.  Setembro 2006 -

de Jaime Carlos Patias

A

história da humanidade, e da Salvação, está repleta de relatos sobre personagens que souberam corresponder aos apelos de Deus, se converteram e transformaram o ambiente em que viveram. Hoje, é importante fazer memória dessas pessoas que marcaram a história. Se elas conseguiram, por que nós também não tentamos? Vocação é um chamado de Deus para uma missão. A pessoa que sente o chamado, geralmente tem muitas objeções, cria resistências, sente medo, levanta dúvidas, arranja desculpas... Tudo isso faz parte do processo de discernimento antes de assumir a vocação. Dentre os relatos vocacionais contidos na Bíblia, o do profeta Jeremias chama a nossa atenção. Vale a pena recordá-lo para, quem sabe, nos servir de inspiração. Jeremias é da tribo de Benjamim e nasceu no povoado de Anatot, pertinho de Jerusalém, entre 650 e 640 a.C. Embora fosse de família sacerdotal, está mais ligado às tradições proféticas do Norte, e não às tradições do sacerdócio e da corte de Jerusalém,

Quer ser um missionário/a? Irmãs Missionárias da Consolata - Ir. Dinalva Moratelli Av. Parada Pinto, 3002 - Mandaqui 02611-001 - São Paulo - SP Tel. (11) 6231-0500 - E-mail: [email protected]

Centro Missionário “José Allamano” - Pe. Manoel A. Monteiro (Néo) Rua Itá, 381 - Pedra Branca 02636-030 - São Paulo - SP Tel. (11) 6232-2383 - E-mail: [email protected]

Missionários da Consolata - Pe. César Avellaneda Rua da Igreja, 70-A - CXP 3253 69072-970 - Manaus - AM Tel. (92) 624-3044 - E-mail: [email protected]

- Setembro 2006

detentores do poder. O profeta Oséias teve muita influência sobre o pensamento de Jeremias. Oséias e Jeremias foram os dois profetas que mais entenderam as causas da opressão que o povo de Israel vivia naquele tempo. Ambos contestam práticas institucionais do aparelho estatal, a corrupção, a opressão e o despotismo generalizado. A palavra de Javé me foi dirigida nos seguintes termos: antes mesmo de te modelar no ventre materno, eu te conheci; antes que saísses do seio, eu te consagrei. Eu te constituí profeta para as nações. Mas eu disse: “Ah! Senhor Javé, eis que eu não sei falar, porque sou ainda criança!” Mas Javé me disse: Não digas: “Eu sou ainda criança!” Porque a quem eu te enviar, irás, e o que eu te ordenar falarás. Não temas diante deles, porque eu estou contigo para te salvar... Eis que ponho minhas palavras em tua boca. Vê! Eu te constituo, hoje, sobre as nações e sobre os reinos, para arrancar e para destruir, para exterminar e para demolir, para construir e para plantar (Jr 1, 4-10). De fato, durante a sua vida, Jeremias incomoda muita gente, que tenta, a qualquer custo, calar a sua boca. O profeta foi perseguido, recebendo ameaças de morte por seus conterrâneos (Jr 11, 21) e até por seus familiares (Jr 12, 6). Talvez por ter prejudicado os interesses de sua família ou pelo duro teor de sua crítica social e religiosa. Mas, escolhido desde o ventre materno, ele tem a garantia de falar “a mente de Deus”. Jeremias profetizou durante cerca de 50 anos, de 627 a 580 a.C., sob quatro governos. Foi durante o governo de Joaquim (609-598 a.C.), que o profeta mais sentiu o peso de sua missão. Obrigado a remar contra a corrente, ameaçado, rejeitado, caluniado, desprezado, ele se lamenta... Em sua angústia, Jeremias acredita que Javé o enganou: o seduziu para ser profeta e o dominou, para depois abandoná-lo. Agora todos querem sua queda, inclusive seus amigos. Por isso, ele quer parar de ser profeta, mas o problema é que não consegue, pois as palavras de Javé queimam-no como fogo. Fogo que atinge até os ossos. Então, Jeremias amaldiçoa o dia em que nasceu: “Maldito o dia em que eu nasci!” Mesmo contrariado, ele sabe que deve seguir o plano de Deus, “para arrancar e para destruir”. Esta foi sua principal missão. Mas também para “construir e para plantar” (1, 10). Esse é Jeremias, o profeta da Bíblia. A sociedade contemporânea carece de profetas: homens e mulheres disponíveis a enfrentar “o reino da mentira, violência e opressão”. Quem de nós tem a coragem de “ser Jeremais hoje” aceitando o convite de Deus para viver essa missão?  Obra de Michelangelo

O profeta Jeremias trava duas lutas: uma pessoal com Javé, e outra, como crítico do sistema vigente.

Jaime Carlos Patias é missionário, mestre em comunicação e mercado e diretor da revista Missões.

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pró-vocações

Ser Jeremias hoje!

prelados de língua inglesa. Serão analisadas com particular atenção as três tarefas próprias dos bispos de “ensinar, santificar e governar”, em referência às particulares situações dos territórios de missão. Espiritualidade, formação, evangelização, doutrina social, diálogo inter-religioso, liturgia, família e pastoral da saúde serão discutidos.

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Jaime C. Patias

VOLTA AO MUNDO

Moçambique Minas terrestres

Vaticano Papa quer visitar Terra Santa

Bento XVI anunciou a sua vontade de visitar a Terra Santa em tempos de paz, apesar de não se sentir suficientemente forte para grandes e longas viagens. Em entrevista, o papa repetiu os apelos para o fim da violência entre Israel e as milícias do Hezbollah no sul do Líbano. “A guerra é a pior solução para todos. Não traz nada de bom para ninguém, nem mesmo para os aparentes vencedores”, frisou. Bento XVI, às vésperas de realizar uma visita à sua Baviera natal, de 9 a 14 de setembro, fez já três viagens desde o início do seu pontificado, em abril do ano passado. Nesse sentido, reconheceu que ser papa é realmente cansativo. “Nunca me senti suficientemente forte para planejar muitas e longas viagens”, reconhece. O Papa disse ainda que pretende viajar até o Brasil para assistir ao encerramento da V Conferência Episcopal da América Latina, que se realiza de 13 a 31 de maio do próximo ano, esperando que a sua presença “seja um fator importante, considerando, de um lado, os eventos dramáticos que a América do Sul vive e, por outro lado, toda a força da esperança que, ao mesmo tempo, é atuante no continente”.

Seminário de estudos para bispos

Entre os dias 10 e 23 de setembro será realizado em Roma, o Seminário de estudos para 97 bispos que provêm de 44 países de missão da África, Ásia, América e Oceania. O Seminário é promovido pela Congregação para a Evangelização dos Povos (CEP) e mantém uma tradição já consolidada, dirigindo-se aos bispos nomeados nos últimos anos. O último Seminário se realizou em setembro de 2004 para 169

As minas terrestres continuam sendo uma ameaça às vidas de mais de 500 mil pessoas das áreas rurais de Moçambique 14 anos após o fim da guerra civil no país. A presença dos artefatos impede o acesso da população às fazendas, estradas e reservatórios de água. As minas, deixadas durante os 16 anos de enfrentamento entre os rebeldes e as tropas do governo, tornaram enormes áreas improdutivas e desabitadas. Segundo o Instituto Nacional de Desminagem (NDI), a identificação dos campos minados é difícil pois não existe nenhuma informação sobre a localização e a distribuição dos artefatos. A situação é mais grave nas províncias das regiões sul e central do país, sujeitas a freqüentes ciclones e enchentes que, além de destruir as demarcações, transportam as minas para outros locais. As minas continuam a matar indiscriminadamente no país. No ano passado, 23 pessoas morreram e 34 ficaram feridas por causa das explosões, um aumento significativo em relação ao ano anterior quando apenas três pessoas morreram. As minas foram responsáveis pela morte de mais de 800 pessoas entre 1997 e 2000. O governo de Moçambique especificou o ano de 2009 como limite para a desminagem de todos os campos conhecidos.

Japão Beatificação de 188 mártires

Com grande alegria da Igreja local, será celebrada em Nagasaki, em 2007, a beatificação de 188 mártires japoneses.Arecente decisão foi tomada pela Conferência Episcopal do Japão, que nomeou também a Comissão Preparatória para o evento, de grande importância para a comunidade católica do país. A beatificação de Pedro Kassui Kibe e de outros 187 mártires japoneses do século XVII será uma grande oportunidade de testemunho para a Igreja japonesa. Segundo o depoimento do padre Fuyuki Hirabaschi, Secretário da Conferência Episcopal do Japão, a Congregação Vaticana das Causa dos Santos deu a sua aprovação para a beatificação dos 188 membros da comunidade nipônica. Enquanto se espera a promulgação oficial do decreto de beatificação por parte da Santa Sé, a comunidade católica japonesa vive este tempo de intensa oração. Os católicos japoneses afirmam que os exemplos dos mártires cristãos servem de encorajamento para os missionários - que, hoje como outrora, dedicam a própria vida a evangelizar as nações da Ásia - e para todos os cristãos que professam a fé em Jesus Cristo no país, onde os católicos são uma minoria (450 mil fiéis locais e 550 mil imigrantes). Entre os mártires do Japão, já figuram Paulo Miki e seus companheiros Grazia Hosawaka, Ludivico Ibaragi, Michael Kozaki e Takayam Ukon. 

Fontes: Desarme, Fides, Rádio Vaticano. Setembro 2006 -

Tereza Silva

INTENÇÃO MISSIONÁRIA Para que nos territórios de missão o povo de Deus sinta como prioridade a formação permanente. de Vitor Hugo Gerhard

O

Concílio Ecumênico Vaticano II deu força ao termo Povo de Deus e atribuiu-lhe um conteúdo próprio. O Decreto Conciliar Ad Gentes, sobre a missão da Igreja, não deixou por menos e descreveu não só a importância de um laicato bem preparado, como também sua função subsidiária na tarefa missionária da Igreja. Vejamos algumas linhas escritas neste documento: “Os leigos colaboram na obra de evangelização da Igreja e participam da sua missão salvífica, ao mesmo tempo como testemunhas e como instrumentos vivos sobretudo se, depois de chamados por Deus, são incorporados pelos bispos nesta empresa. Nas terras já cristãs, os leigos concorrem para a obra de evangelização, fomentando em si e nos outros o conhecimento e o amor pelas missões, suscitando vocações na própria família, nas associações católicas e nas escolas, oferecendo auxílios de toda a espécie para que o dom da fé, que eles receberam de graça, possa ser também oferecido a outros. Os leigos pertencem, ao mesmo tempo, ao Povo de Deus e à sociedade civil: pertencem, por um lado, à nação em que nasceram, de cujos tesouros culturais participam pela educação, a cuja vida estão ligados por múltiplos laços sociais, para cujo progresso cooperam com o seu esforço nas suas profissões, cujos problemas sentem e procuram resolver como próprios; pertencem também a Cristo, porque foram regenerados na Igreja pela fé e pelo Batismo, a fim de serem de Cristo pela renovação da vida e ação, para que em Cristo tudo seja submetido a Deus, e, enfim, Deus seja tudo em todos. O principal dever deles, homens e mulheres, é o testemunho de Cristo, que eles

Escola Secundária na Missão de Mgongo, Tanzânia.

têm obrigação de dar, pela sua vida e palavras, na família, no grupo social, no meio profissional. É necessário que se manifeste neles o homem novo criado segundo Deus em justiça e santidade verdadeira. Devem exprimir esta novidade de vida no meio social e cultural da sua pátria, em conformidade com as tradições nacionais. Devem conhecer esta cultura, purificá-la, conservá-la, desenvolvê-la segundo as novas situações, enfim, dar-lhe a sua perfeição em Cristo, a fim que a fé em Cristo e a vida da Igreja deixem de ser estranhas à sociedade em que vivem mas comecem a penetrá-la e a transformá-la. Devem unir-se aos seus concidadãos com caridade sincera, a fim de que no seu comportamento apareça um novo laço de unidade e de solidariedade universal, haurida no mistério de Cristo. Devem transmitir a fé em Cristo também àqueles a quem estão ligados pela vida e profissão; esta obrigação impõe-se tanto mais quanto a maior parte dos homens não podem ouvir o Evangelho e conhecer a Cristo senão pelos seus vizinhos leigos”. É bom a gente reler de vez em quando o que o Concílio nos disse. Somente assim seremos capazes de uma atualização permanente da fé, da esperança e da caridade correspondente. 

Vitor Hugo Gerhard é sacerdote e coordenador de pastoral da Diocese de Novo Hamburgo, RS.

Bispo emérito realiza trabalho missionário

N

o dia 25 de julho, dom José Maria Maimone, SAC, bispo emérito de Umuarama, Paraná, embarcou para Humaitá, Amazonas, na companhia do diácono Leolino da Silva Santos e sua esposa, Maria das Graças Alves dos Santos. A viagem faz parte do intercâmbio que vem sendo firmado entre a diocese de Umuarama e a Igreja de Humaitá, e é uma das prioridades do atual Plano Diocesano da Ação Evangelizadora. Como parte dos preparativos para esta viagem missionária, no dia 19 de julho, houve uma missa de Envio, na Igreja Matriz de Ivaté, no Paraná, presidida por dom Vicente Costa, bispo diocesano de Umuarama. Esta viagem missionária terá a duração de um mês, e, neste período, dom José Maria - Setembro 2006

Maimone pretende visitar todas as paróquias da diocese-irmã (sete, ao todo), incluindo algumas comunidades ribeirinhas. Na programação sugerida pela diocese de Humaitá, além das visitas e celebrações, estão previstos vários encontros de formação com agentes de pastoral, sobretudo os do Dízimo, os ministros extraordinários da Comunhão Eucarística e as Comunidades Eclesiais de Base. Para dom José Maria Maimone, iniciativas como o Projeto Igrejas-Irmãs, que promovem o intercâmbio entre as dioceses do Sul e as do Norte do país, são muito importantes, pois despertam no católico brasileiro a responsabilidade pela Igreja no Brasil. Fonte: CNBB.

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espiritualidade

A Palavra de nos gritos de hoje A nossa espiritualidade se torna mais intensa quando percebemos, através da Bíblia, a importância dos “gritos” em nossa sociedade pós-moderna. de Ramón Cazallas Serrano

A

Palavra de Deus que encontra­ mos na Bíblia é a História da Salvação cujos protagonistas são Deus e seu povo. Às ve­ zes é Deus que fala e outras vezes o seu povo como um todo ou algumas pessoas escolhidas para uma missão determinada a serviço do mesmo povo.

A Palavra como grito

Na Bíblia não encontramos somente palavras, mas muitas vezes gestos, si­ tuações humanas que as pessoas vivem, situações do povo: alegrias, tristezas, vitórias, derrotas, fome, seca, exílio, es­ terilidade, fertilidade etc. Nestas situações pessoais ou co­ munitárias vemos como Deus e a hu­ manidade se expressam de diferentes modos: com agradecimento ou pedido, com alegria ou tristeza, com louvor ou lágrimas, com humildade ou soberba, com raiva e com amor. Deus está presente na história da humanidade e dos povos. Desde o livro do Gênesis até o Apocalipse, se fala com autoridade, se dialoga fraternalmente e, às vezes, se grita usando palavras e situações. Na Bíblia, e ainda hoje, en­ contramos situações que gritam ao céu. Poderíamos dizer que a Bíblia é do começo ao fim, um grito. Assim com Caim e Abel

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“... a voz do sangue do teu irmão grita da terra até mim” (cfr Gn 4, 10) e o grito da comunidade perseguida que no final da Bíblia brada: “Maranatha, Vinde Senhor Jesus” (Cfr Ap 22, 20). É interessante observar como a Bí­ blia, direta ou indiretamente, usa muito o gênero literário do grito. Expressão forte para que todos escutem. A lógica de Deus é que a sua voz seja escutada por todos, porque para todos é a Salvação. Deus não combina com segredos, não faz as coisas às ocultas. Deus não esconde nada do seu projeto de salvação para todos os povos porque é um projeto de paz e de fraternidade universal. É o contrário do que às vezes fazem os poderes políticos, econômicos e até religiosos que se ser­ vem de estratégias ocultas para dominar, alcançar os seus objetivos e continuar escravizando. É atual a expressão de Jesus “o que vos digo no ouvido gritai-o sobre os telhados”.

O grito do sangue derramado

É o grito do sangue de Abel que chega aos “ouvidos de Deus” (Gn 4, 10). É o grito de tanto sangue derramado hoje: pense­ mos no sangue derramado nestes dias no Líbano, em Israel e na Palestina, bombas poderosas que caem sobre inocentes desarmados. Estamos nos acostumando com os rostos mutilados de crianças e tantas casas destruídas por bombas infa­ mes ou mísseis fabricados nos países da abundância. Herodes foi uma caricatura perante a violência que estamos vivendo. É o sangue derramado em outras guerras já esquecidas, mas ainda atuais na África, Ásia ou as guerras que temos nas nossas próprias cidades e ruas.

O grito dos oprimidos

“Vi a opressão do meu povo no Egito, ouvi o clamor que sai dessa opressão e conheço as suas angústias” (Es 3, 7.9). E Setembro 2006 -

Divulgação

Deus

O grito dos desconsolados

“Um grito se escutou em Ramá, uma lamen­ tação, choro amargo; é Raquel,que chora seus filhos e não quer ser consolada porque já não existem” (Jer 31, 15). É o choro de Raquel por seus filhos deportados para a Babilônia. Como não ver aqui o choro de tantas famílias que vêem seus filhos “deportados”, exilados por causa do desemprego, da fome, à procura de uma vida mais humana que tenha futuro? Como não ver aqui o choro de tantas mães porque os filhos são vítimas da droga, do álcool?

O grito dos ‘ais’

É interessante notar como a Bíblia usa o gênero literário do grito. os oprimidos no século XXI: quem oprime nos nossos dias? Quem são os novos faraós? Conhecemos poucos rostos para poder identificá-los. Eles se escondem nas sociedades anônimas ou empresas multinacionais, cujo poder se estende pelos cinco continentes através do consumismo, da tecnologia e as imposições ideológi­ cas. Sob um véu de pluralismo existe a tirania do consumo passando por cima das necessidades básicas de milhões de pessoas para impor o próprio modelo de vida. Encontramos o “beba Coca-Cola” no coração de um deserto africano onde se morre de sede por falta de água. - Setembro 2006

São os gritos de Je­ sus que os evangelis­ tas nos transmitem em contraposição às bemaventuranças. Foram verdadeiros gritos que os presentes entende­ ram muito bem. “Ai de vocês hipócritas, fari­ seus”. Quantos destes pequenos ou grandes gritos temos cada dia. Hoje podemos lançar alguns: “Ai de vocês fa­ bricantes de armas que se enriquecem com as mortes dos outros, especialmente dos pequenos e dos indefesos”. “Ai de vocês pastores que engordam com a lã das suas ovelhas” (Ezequiel). Ai de vocês governantes e cientistas que fazem das doenças dos outros fonte de riqueza para poucos.

O grito dos abandonados

“Às três da tarde Jesus gritou com forte voz: meu Deus, meu Deus porque me abandonaste?” (Mt 27, 46). É o grito de Jesus perante a situação que estava vivendo. O desespero perante um apa­ rente abandono. O abandono que grande parte dos pobres padece. Pensemos nos agricultores das nossas caatingas nordestinas, dos favelados das nossas cidades. São abandonados à própria sorte. Não interessam, é inútil investir nos seus produtos e nas suas terras. Só no tempo das eleições é que têm valor, por causa do voto. Depois, são abandonados. Digamos

a mesma coisa dos índios e do povo afro. O interesse pelos problemas do povo pobre está sempre subordinado aos interesses dos grandes deste mundo.

O grito do além-fronteiras

“Cruzaram Misia e desceram a Tróade. Durante a noite Paulo teve uma visão: um macedônio, em pé, lhe suplicou: “Vem a Macedônia e ajuda-nos. Imediatamen­ te depois da visão tentamos passar a Macedônia, convencidos que Deus nos tinha chamado para evangelizá-los” (Atos 16, 8-10). É o grito daqueles que ainda não conhecem Jesus. É a Missão alémfronteiras que interpela a Igreja, muitas vezes instalada comodamente nas suas problemáticas internas. Existem muitos macedônios hoje, que são as três quartas partes do mundo, que não conhecem a paternidade de Deus nem a fraternidade universal. Como em Pentecostes e como a Paulo a ação do Espírito suscita em nós o desejo de ir ao encontro do outro, de diferente cultura e religião.

O grito dos que esperam

“Sim, eu vou chegar logo”. Vinde, Senhor Jesus! (Ap 22, 20). É o grito de muitos cristãos que acreditam na pre­ sença de Deus na história. E por isso se comprometem. Para eles, a existência cristã se faz profecia. Por isso, não têm medo de gritar sobre os telhados o que escutam no silêncio de uma vida que se converte em Palavra. Seguem a Bíblia quando afirma que a luz deve ser colocada em cima de uma mesa para que possa iluminar a todos. Existem muitos outros gritos e a leitura da Bíblia tem que nos acompanhar para que possamos encontrar outros no con­ texto onde nos encontramos. Se Deus se faz carne O encontraremos nos diversos momentos da história dos povos. Por fim, deixo um convite para que indiquem outros gritos e os enviem para a a revista Missões. Ao partilharmos esses gritos, sem dúvida vamos ter horizontes novos, pensamentos novos, gostos e juízos novos. 

Ramón Cazallas Serrano é missionário e diretor do Centro de Animação Missionária (CAM) José Allamano, em São Paulo.

Para reflexão 1. Que gritos você percebe hoje nos ambientes que freqüenta: escola, trabalho, igreja, sociedade? 2. O que podemos fazer para amenizar os gritos que ofendem e castigam? 3. O Grito dos Excluídos é vivenciado em sua comunidade eclesial?

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Com 28 anos de Vida Consagrada e 18 de missão na Etiópia, Irmã Eudóxa garante que aprendeu muito mais do que ensinou.

Fotos: Arquivo MC

testemunho

Quando Deus bate o olh de Eudóxa Alves Sicupira

E

m janeiro de 1985, na paróquia de Itanhén, minha cidade natal, no extremo sul da Bahia, realizouse a celebração do meu “envio missionário”. O destino era a Etiópia, país localizado na área conhecida por Chifre da África, no leste do continente.

O envio

Ao término da celebração, o pároco, frei Simão, missionário holandês, pediu a palavra e disse que não poderia deixar passar aquele acontecimento, sem dizer duas coisas referentes à minha vocação: “Tudo começou com uma cartinha. A missionária, que hoje está sendo enviada em missão, um dia, na sua juventude, resolveu pôr por escrito o que estava alimentando em seu coração. Ela já havia falado comigo a respeito do seu desejo de se consagrar a Deus. Entregou-me a carta, pedindo-me para ajudá-la a encontrar um lugar onde aquilo pudesse ser concretizado. As minhas várias tentativas de procura não deram resultados; também porque na época, as distâncias e a comunicação dificultavam. Aquela carta ficou em minha mesa de trabalho por quase dois anos, até que foi parar, com outros papéis, no cesto do lixo. Alguns dias depois, - e aqui está o interessante - eu estava procurando um livro na estante do meu escritório, e de repente, bati os olhos numa revista missionária, que imediatamente comecei a folhear. Nela encontrei o endereço das missionárias da Consolata, que estavam celebrando os 25 anos da chegada das primeiras irmãs no Brasil. Escrevi uma

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Ir. Eudóxa visita comunidade em Konchi, Etiópia.

carta às irmãs, falando desta jovem e do seu desejo. Antes de despachar a carta, pensei que seria interessante anexar também a carta da jovem. Confiante, fui procurá-la no cesto do lixo. Juntei os pedaços com fita adesiva e a carta, com a minha, viajou para São Paulo... Mas, não é só este detalhe. Tenho outro fato, não menos curioso. Depois de algum tempo da minha ordenação sacerdotal, na Holanda, fui destinado às missões da Etiópia. Devido à Guerra Mundial, não foi possível partir. Ao término da Guerra, ao invés da Etiópia, meus superiores me enviaram ao Brasil. E vejam vocês: depois de tantos anos, hoje estou presenciando, emocionado, o envio de uma religiosa, fruto do meu ministério sacertotal-missionário, justamente para o país sonhado na minha juventude. Eu só posso concluir: o Senhor tem os seus desígnios sobre as pessoas e ele mesmo vai abrindo os caminhos para a execução da sua Vontade”. Estas foram as palavras de frei Simão. E eu acrescento: o que mais me motivou a seguir a vida religiosa de missionária foi o zelo incansável e a dedicação deste santo frei. Ele vinha em nosso sítio três ou quatro

vezes ao ano e rezava a missa em nossa casa, pois não havia capela. Quando o frei começou a vir, eu tinha seis anos de idade e isto continuou por mais de 30 anos. Lembro-me que com ele vinha também uma missionária leiga holandesa.

A busca

Em 1973, com 22 anos, enfrentei o grande desafio: ir para São Paulo e trabalhar num orfanato que as missionárias da Consolata mantinham no Bairro da Cachoeirinha. O objetivo não era o trabalho em si, mas, a chance de conhecer mais de perto as irmãs e assim, ver se era mesmo aquilo que eu estava buscando. A experiência foi muito boa, apesar das dificuldades de adaptação. Na medida em que eu ia tendo as informações necessárias sobre a Congregação e o trabalho missionário, sentia que estava no lugar certo. Então, em 1975, iniciei minha formação religiosa de missionária. Nesse tempo pude concluir, no Colégio Consolata, o Ensino Médio, e nos finais de semana, estudava Teologia no Colégio São Luiz. Em vista da missão, ainda em São Paulo, cursei o técnico em Economia Doméstica na Escola Carlos Setembro 2006 -

ho em alguém de Campos, no Brás. Fiz minha Primeira Profissão Religiosa em 1978. Após prestar serviços apostólicos missionários em vários lugares no Brasil, com 34 anos, parti para a missão na Etiópia. Antes fiz uma parada na Inglaterra para estudar o inglês. Chegando em Konchi, minha primeira missão naquele país, tive que aprender a língua local – o oromo. Deus me ajudou muito e em pouco tempo comecei a me comunicar com o povo; aliás, um povo muito acolhedor e amigo. Com eles trabalhei quinze anos, na evangelização e na promoção da mulher. Hoje, passados mais de 30 anos desde que iniciei minha escolha pelo Senhor na missão, penso que chegou o tempo de deixar meu lugar para outra e ir além... Essa é uma característica dos missionários e missionárias. Quando uma missão já se encontra bem organizada com as lideranças formadas, deixamos para que outros a acompanhem e nós vamos a outros lugares para começar tudo do zero. Assim aconteceu em Shambu, onde me encontro hoje. Há três anos as missionárias e missionários chegaram e iniciaram a missão.

É um lugar de muita pobreza, onde a presença de cristãos católicos é pequena. A maioria da população pertence às Igrejas Ortodoxa e Protestante, ou é muçulmana. Muitos outros seguem a religião tradicional herdada dos antepassados.

A força na Missão

Os contratempos e as dificuldades, às vezes, metem medo, mas acreditamos firmemente que Jesus está no nosso barco, mesmo se parece estar dormindo. Vivemos numa casa alugada, pequena, no meio do povo, na simplicidade e pobreza. Isto me ajuda muito a viver o momento presente no despojamento, crescendo na fé e na comunhão. Em nosso dia-a-dia, somos continuamente desafiadas pelos irmãos muçulmanos, os quais já às cinco horas, começam a elevar suas orações a Alá; os protestantes, com suas orações ao Senhor em um tom que ensurdece; os ortodoxos, com suas celebrações até meia-noite. Muitas vezes eu já me perguntei: por que, ao invés de cada grupo ficar gritando para o seu Deus, não começamos a viver

Etiópia

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Etiópia é uma das duas únicas nações africanas (a outra é a Libéria) que não foram colonizadas por europeus, cuja presença na região se restringiu ao curto período da ocupação italiana de 1936 a 1941. Resistiu também ao domínio do Império Árabe, conservando até hoje forte tradição cristã. Sua população – a terceira maior da África – vive em condições precárias e detém uma das menores rendas per capita do mundo. Com a independência da província da Eritréia, em 1993, a Etiópia perde o estratégico acesso ao Mar Vermelho. Adis-Abeba, localizada à 2.408 m do nível do mar, é a mais elevada capital africana. Secas periódicas assolam a nação, onde se registra a mais alta temperatura média do mundo: 34º C, na região de Dabol. Campos e pastagens cobrem cerca de três quartos das terras etíopes e sustentam um significativo rebanho bovino. A exportação de couro e pele é uma importante fonte de receita para o país. Superfície: 1.130.139 km2 População: 62.600.000 Idioma: amárico (oficial), inglês, línguas originais Governo: República Parlamentarista Capital: Adis-Abeba Moeda: birr Religião: cristianismo 57%, (ortodoxos etíopes 52,5%, outros cristãos 4,5%), islamismo 31,4%, religiões tradicionais 11,4%, outras 0,2%

em comunhão, aclamando e louvando o nosso único Deus? A unidade é muito difícil, mas, penso que só com ela poderemos dizer que estamos dando continuidade ao projeto de Jesus, que veio nos convidar a entrar naquela comunhão onde se vive com Ele, com o Pai e com o Espírito Santo. Na minha oração diária, muito cedo, não tanto como os meus irmãos muçulmanos, eu procuro me deixar iluminar, guiar e transformar pelo Espírito do Senhor. Na esperança de poder testemunhar o amor das religiões e entrar em sintonia com a realidade da vida na missão. É nessa busca que eu encontro forças para a continuar a Missão.  Ir. Eudóxa, em Konchi, com colegas de Missão.

- Setembro 2006

Eudóxa Alves Sicupira é missionária na Etiópia.

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Jaime C. Patias

fé e política

Votar na fé ou no direito? É importante que os eleitores escolham conscientemente seus deputados, já que são eles os responsáveis pela formulação das leis e elaboração do orçamento, além da fiscalização do Executivo. de Humberto Dantas

O

que motiva seu voto? Esse é o mistério da Ciência Política. Enquanto você tem facilidade para definir seu candidato à Presidência da República e ao governo do Estado, não utiliza critérios rigorosos para escolher seu deputado. Mas mesmo diante de escolhas “fáceis”, o que leva o eleitor a decidir? A religião é uma variável fundamental? Em nosso país é normal vermos, por exemplo, que o eleitor desconsidera a mais importante das escolhas: a do legislador. É o Legislativo quem faz as leis e aprova o orçamento, mas, mais importante que isso: ele fiscaliza o Executivo, delimita o apoio dos partidos e sustenta a oposição. Os parlamentares são o termômetro da política, o símbolo maior da democracia. Um Legislativo transparente, fiscalizador, próximo e compromissado com a sociedade é sinal de país forte. Mas parecemos distantes de tal ideal. A sociedade cobra pouco, não fiscaliza e o que vemos são muitos dos 513 deputados federais se envolvendo em escândalos que mancham os cidadãos de vergonha. Assim, refaçamos a pergunta inicial: o que motiva você a escolher um deputado? Que fatores influenciam na sua escolha? A religião é um fator importante para a escolha do seu deputado? A indicação da sua Igreja pesa? Você sabe o que um deputado pode fazer pela sua Igreja? E pelo bem-estar da sociedade de maneira geral?

Fórum Social Mundial, Porto Alegre, 2003.

em nome da Igreja? Essa liberdade permite que apoios pontuais sejam dados por padres, bispos, grupos de leigos etc. O livre posicionamento divide o grupo, e tal separação é entendida por alguns como democrática. Alguns segmentos, porém, tem criticado essa liberdade nos últimos anos. Católicos fervorosos defendem que enquanto a Igreja não apóia institucionalmente um candidato, os evangélicos têm bancadas parlamentares unidas. E é exatamente esse o ponto que deve ser destacado. O voto é um direito do cidadão, a despeito de sua religião. Ele deve ser um exercício questionável. Escolher requer debate, conversa, comparação e, sobretudo, cobrança. A fé não tem essa característica. Assim, o voto sob orientação religiosa tende a se tornar cego. E o cidadão que libera seu escolhido para agir na política está sendo permissivo demais. Não é à toa que em agosto o jornal O Estado de S. Paulo mostrou que muitos dos “mensaleiros” e “sanguessugas” faziam parte da bancada evangélica. O fiel fiscaliza seu deputado? E não foi diferente com relação aos candidatos apoiados por segmentos católicos. Em São Paulo, por exemplo, a Renovação Carismática tem Salvador Zimbaldi na Câmara. Além de mudar de partido duas vezes - eleito pelo PSDB, migrou para o PTB e está no PSB - o deputado consta na lista dos suspeitos de superfaturamento de ambulâncias. A despeito do envolvimento católico e da religiosidade do parlamentar, não permita que a fé cegue seu lado cidadão. Vote consciente! O candidato não legisla pela Igreja, e sim pela sociedade - o que atende nossos princípios cristãos. 

A religião é um fator importante para a escolha do seu deputado? A indicação da sua Igreja pesa? Você sabe o que um deputado pode fazer por sua Igreja?

Voto religioso

Tais questões nos colocam diante de um desafio para outubro de 2006. Muitos católicos têm sido convencidos a votar em religiosos ou em candidatos apoiados por grupos fortes de leigos. A Igreja, em diversos documentos, libera seus fiéis para que escolham aqueles que promovem a justiça social. Ela convida seus filhos a refletirem sobre a conduta, a história, os compromissos e as realizações dos candidatos. E desafia o cidadão a cobrar seus eleitos. E por que tantos candidatos falam

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Humberto Dantas é cientista político, professor do Centro Universitário São Camilo e coordenador de cursos de Formação Política na Região Episcopal Lapa e na Diocese de Osasco, SP. Setembro 2006 -

Pelos caminhos da América

Jaime C. Patias

Formação Missionária

V Conferência do CELAM

Tendo em vista a preparação para a V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribe, a realizar-se em Aparecida em 2007, a revista Missões inicia a publicação de uma série de artigos neste espaço, fazendo memória de todas as outras Conferências. de Giovanni Crippa

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próxima Conferência do Episcopado da América Latina e do Caribe se inscreve na grande tradição da Igreja deste continente que, em sintonia com o Concílio Vaticano II, confirma a importância da colegialidade episcopal e da solicitude dos bispos para com todas as Igrejas. Partindo de uma perspectiva histórica, podemos evidenciar três etapas fundamentais do exercício colegial do episcopado em relação à evangelização: os Concílios Provinciais de Lima (1582) e México (1585) que encarnaram o Concílio de Trento no mundo da América; o Concílio Plenário Latino-Americano de

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Roma (1899) que aplicou o Concílio Vaticano I à América Latina; a II Conferência Episcopal de Medellín (1968) que traduziu na Igreja da América Latina as intuições e as decisões do Vaticano II.

Antecedentes

Durante o Concílio Plenário de Roma, celebrado em 1899 no Colégio Pio Latino-Americano, o papa Leão XIII pediu aos bispos latino-americanos que se reunissem periodicamente em Conferências Episcopais nacionais para refletirem sobre as necessidades mais urgentes da Igreja, abrindo-a ao diálogo com a sociedade. Já no começo do século XX alguns episcopados, como o colombiano, começaram a se encontrar. Na metade do mesmo século, um grupo de bispos clarividentes começou a refletir sobre temas pastorais de interesse

comum para a América Latina. Estas reuniões de caráter continental criaram, aos poucos, um clima favorável para um possível encontro continental de bispos. Acolhendo os anseios para que se promovesse uma maior comunicação e ajuda recíproca entre os países latino-americanos, a Secretaria de Estado Vaticana, em 1945, realizou uma consulta entre os bispos sobre a oportunidade de realizar uma reunião de tipo conciliar ou uma conferência mais ágil e operativa. Foi assim que, aproveitando da presença numerosa de bispos que se encontravam na cidade do Rio de Janeiro para participar do 36° Congresso Eucarístico Internacional, através da carta Ad Ecclesiam Christi, de 29 de junho de 1955, o papa Pio XII convocou uma Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano.

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Formação Missionária

As Conferências do CELAM As Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano constituem uma tradição própria da Igreja do continente: fortalecem a comunhão eclesial, determinam significativamente a ação evangelizadora e ajudam a Igreja a se aproximar da realidade. Rio de Janeiro – 1955 Tema: “Vocações e instrução religiosa”. O grande mérito da Conferência do Rio de Janeiro foi proporcionar a fundação do CELAM: o Conselho Episcopal Latino-Americano, que, a partir de então serviu de órgão articulador de comunhão eclesial e de ação pastoral da Igreja. No documento final quase não se fala da situação social, mas predomina uma atitude apologética da Igreja preocupada quase exclusivamente com assuntos intra-eclesiásticos. Medellín – 1968 Tema: “A Igreja na atual transformação da América Latina, à luz do Concílio Vaticano II”. Medellín procurou aplicar o Concílio Ecumênico Vaticano II na América Latina através de uma análise da realidade concreta do continente, servindo-se do método ver-julgar-agir. Para superar a injustiça social - que é a causa principal da pobreza - e transformar a sociedade, Puebla faz a profética ou evangélica opção pelos pobres, valoriza a ação política dos cristãos e a atuação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Com Medellín a identidade da Igreja da América Latina saiu reforçada no que diz respeito à responsabilidade conjunta da sua missão evangelizadora em todo o continente. Puebla – 1979 Tema: “A evangelização no presente e no futuro da América Latina”. A Conferência de Puebla, inspirando-se na exortação apostólica Evangelii Nuntiandi de Paulo VI (1975), procurou dar uma resposta aos novos desafios da evangelização, sobretudo em relação à família, à juventude, aos pobres e à cultura. Puebla confirma a “opção pelos pobres”, propõe um modelo de Igreja “comunhão e participação” convidando-a para a missão universal: “Finalmente, chegou para a América Latina a hora de intensificar os serviços recíprocos entre as Igrejas particulares e de se projetarem para além de suas próprias fronteiras, o Ad Gentes. É certo que nós próprios precisamos de missionários, mas devemos dar de nossa pobreza” (Puebla 36). Santo Domingo – 1992 Tema: “Nova Evangelização, Promoção Humana e Cultura Cristã”. A Igreja Latino-Americana chegou à Conferência de Santo Domingo numa data controvertida em que se celebravam os 500 anos da “presença do Evangelho” no continente. Partindo da necessidade de uma “nova evangelização”, em ardor, em método e em sua expressão, o documento final apresenta a promoção humana como parte integrante da evangelização; o respeito pelas culturas e a inculturação da fé para evitar a desintegração da identidade latino-americana ameaçada pela cultura urbano-industrial, pelo espírito secularista e pelo avanço das seitas. Aparecida – 2007 Tema: “Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que nele todos os povos tenham vida - ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’ – (Jo 14,6)”. Mesmo depois da proposta de “uma só Igreja e uma só América”, apresentada pelo papa João Paulo II no Sínodo Continental da América, em 1997, a Conferência de Aparecida quer retomar a caminhada pastoral da Igreja Latino-Americana e recuperar sua identidade diante dos novos desafios da sociedade pós-moderna.

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A I Conferência

A primeira Conferência teve lugar no Rio de Janeiro, de 25 de julho a 4 de agosto de 1955. Participaram, além do Legado Papal, o cardeal Adeodato Giovanni Piazza, Secretário da Sagrada Congregação Consistorial, e dom Antônio Samoré, Secretário da Sagrada Congregaçao deAssuntos Eclesiásticos, seis cardeais latino-americanos e 96 ordinários, representando as diversas províncias eclesiásticas e das circunscrições missionárias do continente. Estiveram presentes, como observadores, alguns prelados dos Estados Unidos, Canadá, Portugal e Espanha. O ponto central da Conferência do Rio de Janeiro foi a evangelização considerada a partir de uma visão apologética. O documento final, denominado Conclusiones, tratava temas como: a escassez do clero e a sua formação, o problema das vocações, os desafios da formação do povo de Deus e dos agentes de pastoral, a evangelização no campo social e a responsabilidade cívico-política, as missões, a situação das populações indígenas, os fluxos migratórios no interior dos próprios países, a necessidade urgente de integração entre os países e as Igrejas locais. Lembrando que a fé católica continuava sendo patrimônio comum de todos os países do continente, os bispos manifestaram a necessidade de uma

Setembro 2006 -

Arquivo

evangelização mais ampla e profunda que pudesse permear o pensamento, os costumes e as instituições. Somente um clero virtuoso e apostólico conseguiria enfrentar este desafio. A Conferência, consciente que o problema fundamental do continente era a escassez do clero e das vocações sacerdotais, convidou sacerdotes, religiosos e ­fiéis, para uma campanha vocacional. A falta de uma adequada instrução e educação religiosa, que formasse

para a vida espiritual e moral do ser humano, poderia levar à indiferença, à descrença e até à apostasia. Era necessário, portanto, oferecer uma ampla e sólida preparação àqueles que, por vocação, deverão ser mestres dos demais: presbíteros, religiosos, religiosas, professores, educadores e catequistas. As rápidas transformações das estruturas sociais da América Latina devidas ao intenso processo de industrialização pediam à Igreja uma presença ativa que pudesse iluminar e orientar o mundo econômico-social: a) difundindo a doutrina social da Igreja através da catequese e do ensinamento sistemático nos Seminários, Colégios, Universidades, Centros de Ação Católica e de formação cristã; b) educando e formando os católicos a uma consciência social, c) transformando a realidade econômica e social, elevando as classes mais necessitadas. Seguindo a terminologia eclesiológica pré-conciliar que considerava-os “auxiliares do clero”, a Conferência do Rio de Janeiro destacou a importância dos leigos na evangelização a partir da falta de sacerdotes, do elevado número de fiéis, da grande extensão dos territórios e da dificuldade de entrar em alguns ambientes. O apostolado, “apesar de ser uma missão própria do sacerdote, não é exclusiva dele, mas é competência também dos leigos, pelo mesmo fato de serem cristãos ...” Era necessário formar ao apostolado os adolescentes e, sobretudo, os jovens, mostrando-lhes a grandeza e o ideal de viver, trabalhar e

Ordenação sacerdotal de João Righi, Cinqüentenário RS, 1 dezembro de 1956.

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Jaime C. Patias

Jaime C. Patias

Formação Missionária

Mulher guatemalteca.

lutar por Jesus Cristo. O apostolado não deveria ser reduzido à conservação e à defesa da fé, mas ter uma característica missionária para chegar em todos os ambientes e setores da sociedade. Em relação à importância dos meios de comunicação, a Conferência teve uma visão profética e fez votos que: a) em cada país se organizasse um jornal católico nacional, que em cada diocese se promovessem publicações e, onde fosse possível, se aproveitasse dos espaços oferecidos por outros diários; b) se celebrasse anualmente a “Jornada da Imprensa Católica” e se assegurasse a presença de revistas católicas nos seminários, nos colégios e nas paróquias; c) se criasse uma Confederação Interamericana de diários católicos que redigiria, pelo menos semanalmente, boletins de notícias de atualidade, enviando-os a todas as entidades associadas, facilitando o intercâmbio de notícias; d) em cada nação se estabelecesse uma Central difusora ou um Secretariado de Imprensa, que estivesse em contato com as correspondentes organizações de outros países, para se conseguir uma maior difusão das publicações; e) se desse particular apoio e impulso às revistas católicas existentes.

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Considerando a grande ajuda que a rádio podia oferecer na América Latina por causa da vastidão do seu território e da escassez do clero, os bispos pediram que fosse valorizado este meio no campo religioso e educativo, fosse incentivada a instalação de novas emissoras e se procurasse vigiar para que fossem salvaguardados os valores morais e religiosos. Enfrentando o tema das Missões, a Conferência do Rio sugeriu aos prelados dos territórios missionários que promovessem reuniões para estudar os problemas comuns; instituíssem Seminários em cada cincuscrição ou criassem um Seminário Internacional para a formação do clero autóctone; formassem catequistas para suprir a falta do clero; fundassem escolas profisionalizantes; fomentassem as obras de assistência social como hospitais, asilos, sanatórios, dispensários. Às autoridades religiosas, envolvendo também as autoridades civis, foi solicitado que se dedicassem à defesa dos índios, criando uma instituição de caráter etnológico e indigenista de inspiração católica. Os professores de colégios e institutos procurassem eliminar usos ou costumes que pudessem aparecer como discriminação racial. Os prelados diocesanos promovessem em suas respectiva jurisdições a União Missionária do Clero e as outras Obras Missionárias Pontifícias. As Congregações e os Institutos Missionários procurassem enviar pessoal capacitado e especializado.

A criação do CELAM

Depois de ter estudado os grandes problemas pastorais comuns às Igrejas da América Latina os bispos pediram unanimemente ao papa a instituição de um Conselho Episcopal Latino-Americano que representasse os bispos do continente e concretizasse o programa pastoral formulado pela Conferência.

As Conferências do CELAM As Conferências Gerais do Episcopado Latino-Americano constituem uma tradição própria da Igreja do continente: fortalecem a comunhão eclesial, determinam significativamente a ação evangelizadora e ajudam a Igreja a se aproximar da realidade.

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Jaime C. Patias

Formação Missionária

Bispos da CNBB em celebração.

Acolhendo o desejo, Pio XII instituía o Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) com o objetivo de apoiar o trabalho pastoral dos bispos e ao mesmo tempo dar respostas a alguns dos graves problemas da Igreja na América Latina. Como sede do Secretariado Geral foi escolhida a cidade de Bogotá, na Colômbia. O CELAM não foi concebido como um órgão superior às Conferências episcopais de cada país, mas como um meio de comunhão e de colaboração entre as mesmas, um instrumento a serviço da integração da Igreja Latino-Americana. Para dinamizar a vida eclesial no continente, o CELAM foi criado com a tarefa de estudar os assuntos comuns às Igrejas, coordenar as diversas atividades, promover e ajudar as obras católicas e preparar novas Conferências Gerais dos Bispos.

Conclusão

A Primeira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano aconteceu numa época cujo modelo pastoral predominante era conhecido como “Pastoral Coletiva”. Este modelo priorizava os movimentos (Ação Católica) e as associações (Legião de Maria, Sociedade São Vicente de Paulo e o Apostolado da Oração) que atuavam autonomamente em relação aos demais e que tinham

como ponto em comum a profissão e a defesa da fé. Hierarquicamente bem estruturadas e dependentes da autoridade eclesiástica não tinham como ponto de referência metodológico e operativo o âmbito da Igreja local, mas o contexto universal. De outro lado, a Igreja local não tinha ainda uma pastoral de conjunto que integrasse as forças vivas da Igreja. A Primeira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano representou para a Igreja do continente um passo fundamental na criaçao de uma identidade e de uma praxe pastoral latino-americana continuamente interpelada por uma realidade sempre mais desafiadora. A criação do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM), marcou o ponto de partida de uma ação pastoral adulta, integrada e integradora.

Giovanni Crippa é missionário, doutor e professor em História da Igreja.

Para reflexão 1. Como você analisa a camninhada da Igreja latino-americana à luz dos encontros do CELAM? 2. Sua comunidade está participando de alguma discussão importante que será encaminhada ao V CELAM?

Setembro 2006 -

Inclusão das pessoas com deficiência. Quem ainda se lembra da Campanha da Fraternidade deste ano de 2006? Texto e foto de Joaquim Gonçalves

O

história Missão daHoje missão

Missão e inclusão galhos próximos e diferentes exibindo seu canto com alegria e criando harmonia e ritmos que nenhum compositor seria capaz de pensar a partir do nada. É evidente que não podemos ignorar a dimensão missionária da globalização para valorizar o que ela traz de bom, mas devemos desmistificar o que ela apregoa de engano. Talvez nos falte um nível de espírito profético capaz de contribuir para promover a justiça, a paz, a inclusão, a vida para todos. No contexto da “cultura globalizante”, parece que a missão a partir dos pequenos se torna cada vez mais difícil e menos atraente. Talvez porque ela não traz resultados imediatos e visibilidade. Quem ainda se lembra da nossa Campanha da Fraternidade de 2006 sobre as pessoas com deficiência? A paróquia Santa Paulina de Heliópolis, na maior favela de São Paulo, não esqueceu. Depois de um levantamento realizado durante a Quaresma, os encontros entre as pessoas com deficiência começaram e continuam. Não se trata de um projeto assistencialista. É apenas uma tarde de convivência entre pessoas com deficiência e seus acompanhantes, crianças, jovens e adultos. A interação é a palavra-chave. Pequenas oficinas são montadas, brincadeiras são realizadas, há troca de informações e a partilha de um lanche. Cada participante está se sentindo

sistema neoliberal, embalado pela globalização, insiste em se apresentar como caminho de felicidade, de progresso e de inclusão. Mas já estamos percebendo há muito tempo que é um caminho de mão única, para o lado dos ricos e poderosos. Os pequenos das periferias não encontram brechas para derrubar o cerco montado. De fato, os “pequenos”, tanto pessoas como povos e nações, ficam cada vez mais distantes dos “grandes” ou se conformam com a situação, comendo as migalhas que caem da mesa deles. O poder econômico, cada vez mais endeusado e sofisticado, tornou-se uma espécie de fortaleza vigiada dia e noite, concentrando riqueza e colocando o capital para viajar à velocidade instantânea. A mídia ocupa os cenários internacionais, fabricando e, às vezes, deturpando informações para servir interesses bem organizados de seus donos. As pesquisas científicas e seus avanços estão cada vez mais dependentes de grupos econômicos. E finalmente o unilateralismo de decisões com peso internacional é cada vez mais tolerado nos conflitos, no comércio desleal, na apropriação de recursos naturais... A partir deste quadro parece que tudo vai se afunilando para uma situação de saída imprevisível. Só Deus conhece as saídas boas, mas não as impõe. A história também nos ensina que os grandes impérios, por mais seguros que se achem, caem aos pedaços. Se queremos continuar a levar o Evangelho a todos os recantos da terra, não podemos pegar o trem da globalização Pessoas com deficiência participam de oficina em Heliópolis, SP. acreditando no poder dos novos púlpitos para influenciar os como um passarinho no galho da pequena planta, cantando seu centros de poder. As vielas, os becos, as casas sem janela, canto, sentindo-se importante na pequena orquestra da vida, o esgoto na frente da porta continuam existindo aos montes. seja ela limitada pelo que for. Não é difícil encontrar dois metros de distância entre um esgoto As comunidades, por mais projetos que façam, não têm poder de superfície e um televisor de última geração. É paradoxal. para resistir à globalização excludente. Mas têm a possibilidade Também o mercado e a propaganda escravizam e embebedam, de valorizar seus pequenos recursos, suas lideranças generosas talvez mais do que cachaça. e guerreiras, virtudes próprias de quem sabe resistir e semear em terra boa aquela semente que pássaro ousado não consegue A esperança não morre beliscar antes que brote. Estamos no primeiro passo: reconhecer Apesar de tudo isso não podemos deixar morrer a esperança que as pessoas com deficiência não são um peso para si nem dos pequenos que continuam acreditando que Deus “derruba para os outros. Estamos tentando transformar a idéia de “peso” os poderosos de seus tronos e exalta os humildes”. Sabemos em idéia de “oportunidade”. Oportunidade para ambos os lados, que o grão de mostarda vira aquela planta que se transforma porque quem se julga perfeito descobre o seu limite.  em palco onde os passarinhos apresentam seus cantos sem precisar competir uns com os outros. Eles sabem colocar-se em Joaquim Gonçalves é missionário e pároco na Paróquia Santa Paulina, Heliópolis, SP. - Setembro 2006

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de Luiz Bassegio

A

1ª Semana Social Brasileira, ­realizada em 1991, suscitou uma ampla articulação das pastorais e dos movimentos sociais, em especial com o Movimento dos Sem-Terra (MST), Central dos Movimentos Populares, Central Única dos Trabalhadores (CUT), Movimento de Pequenos Agricultores, Movimento dos Atingidos por Barragens, entre outros. A Igreja Católica, na Campanha da Fraternidade de 1995 tratou do tema: “Fraternidade e os Excluídos” com o lema: “Eras Tu, Senhor?” A temática da exclusão social havia sido amplamente debatida durante a 1ª Semana Social Brasileira (SSB). De 1993 a 1994, foi realizada em todo o Brasil, a 2ª SSB com o tema: “Brasil, Alternativas e Protagonistas”, mas que ficou mais conhecida com o nome de “O Brasil que Queremos”. O processo desta Semana fez emergir quatro grandes idéiaschave: Radicalização da Democracia, Construção Coletiva, Cidadania Ativa e Inversão das Prioridades. Neste processo de discussão do Brasil que Queremos, houve um grande avanço das parcerias entre as próprias pastorais sociais e com os movimentos populares. Ao avaliar a 2ª SSB, na reunião das pastorais sociais em outubro de 1994, em Brasília, DF, perguntávamos como continuaríamos articulados. Alguém presente na reunião disse: “por que não fazemos um Grito?” Mas nos perguntávamos: como seria este Grito? Finalmente alguém lembrou que, há muitos anos, os bispos do Nordeste haviam escrito um documento “O Grito do Nordeste”. Talvez aí poderia estar um pouco da inspiração. Em abril de 1995, foi realizado o encontro das pastorais sociais do Sudeste, na Casa de Encontros Santa Fé, em Cajamar, SP. Voltou-se então a discutir e tentar detalhar o que seria esta manifestação. Um primeiro tablóide foi feito para orientar, dar os rumos, apontar alguns eixos em torno dos quais se articularia o primeiro Grito dos Excluídos, que aconteceria no dia 7

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de setembro de 1995. Foram três itens principais: objetivos, o que não aceitamos e o que propomos. O primeiro Grito foi realizado praticamente em todas as capitais e muitos municípios, num total de 180 cidades do Brasil. Foram celebrações, caminhadas, participação nos desfiles oficiais de forma crítica, teatros, encenações, coreografias e entrega de inúmeros abaixo-assinados às autoridades, contendo as reivindicações dos excluídos. Foi muito acertado o slogan “A vida em primeiro lugar”. Desde o primeiro Grito, os meios de comunicação deram cobertura ampla em âmbito nacional e regional. De forma simbólica, a manifestação mostra que a Igreja continua firme no seu compromisso e opção preferencial pelos pobres e excluídos. Um avanço importante foi o fato de alertar sobre a política econômica que exclui boa parte da população, principalmente os que não tem acesso ao mercado. Mostra que é preciso mudar os rumos da economia, destacando a necessidade da

reforma agrária, a geração de postos de trabalho e a distribuição de renda.

Aprovação da CNBB

Embora o Grito tivesse sido uma iniciativa das pastorais sociais em parceria com o MST, CUT e Central dos Movimentos Populares, a mídia insistia em divulgar que se tratava de uma ação da CNBB. Na 34ª Assembléia Geral da Conferência dos Bispos, em abril de 1996, o debate girava em torno da discussão sobre a conveniência ou não da CNBB envolverse tanto em projetos tão concretos e com certa conotação política. O Grito é das pastorais, diziam uns. Mas as pastorais são de quem, perguntavam outros? Mas como dizer que o Grito não é da CNBB, se nasceu das pastorais sociais da CNBB e da 3ª Semana Social Brasileira promovida pela Conferência? Esse era o debate na Assembléia dos bispos em 1996. E o assunto chegou ao plenário. Em meio às ponderações, a maioria favorável ao Grito, subiu ao palco o bispo de Jundiaí – SP, dom Amauri Castanho, e tomou o microfone Corrado Dalmonego

Destaque do mês

A Igreja e o Grito dos

Grito 2005, Ipiranga, São Paulo.

Setembro 2006 -

s Excluídos 7 de Setembro Brasil: na força da indignação, sementes de transformação. dizendo: “Meus irmãos, não é bom que mantenhamos o nome Grito dos Excluídos. Tem uma conotação muito classista, muito política e muito provocativa. Mudemos o nome para “clamor dos excluídos”. Foi um silêncio geral na sala de conferência dos bispos. Em seguida foi a vez de dom Eduardo Kuaik, bispo de Piracicaba, SP. Dirigindo-se a dom Amauri, disse com muita fraternidade: “meu irmão, Jesus Cristo, na cruz, não deu um grande clamor, mas sim, um grande grito. Portanto vamos manter Grito dos Excluídos”. O aplauso foi geral. Estava aprovado o Grito dos Excluídos como projeto da CNNB, como consta no número 120 do Projeto Rumo ao Novo Milênio: “O Grito dos Excluídos será celebrado anualmente, em nível nacional, no dia 7 de setembro, retomando preferencialmente o tema da Campanha da Fraternidade” (PRNM, CNBB, pág. 44).

Movimento que deu certo

O Grito esteve sempre atuando conjuntamente com os projetos do Setor Pastoral Social. A partir do Tribunal da Dívida Externa, a Campanha Jubileu 2000 começou a organizar o Plebiscito da Dívida Externa. Realizado na Semana da Pátria de 2000, logrou a participação de mais de seis milhões de pessoas, sendo que, mais de 95%, disseram não ao pagamento da dívida, ao FMI e sim à auditoria da dívida. No Plebiscito da Alca foram mais de 10 milhões de votantes, envolvendo mais de 150 mil voluntários. Foram 46 mil urnas, espalhadas em mais de 3900 municípios. 98% dos votantes disseram não à Alca; 96% rejeitaram as negociações e 98% não aceitaram a entrega da Base de Alcântara, no Maranhão, para o controle militar dos Estados Unidos. Através da - Setembro 2006

organização do Grito, as urnas fizeram-se presentes nas comunidades, paróquias, escolas, universidades, sindicatos, praças, ônibus e metrôs, enfim, em todo o território nacional. A grande lição do Plebiscito é que a população tem o dever e o direito de debater os temas que afetam sua vida. Os números relativos ao crescimento do Grito indicam que esta nova forma de manifestação está dando certo e continua crescendo. No primeiro ano havia 60 articuladores espalhados pelo Brasil, hoje são mais de 1300. O primeiro Grito foi realizado em 180 locais, agora em mais de 1500, segundo os dados que chegam à secretaria. E, a partir de 1999 espalhou-se para as Américas. Com o tema “Por Trabajo, Justicia Y Vida”, o Grito acontece no dia 12 de outubro, em mais de 20 países das Américas Latina, Central e Caribe, data que marca a invasão de nosso território pelos europeus e resistência dos povos latino-americanos. O Grito tem uma força convocatória de todos aqueles que se opõem à aparente inevitabilidade da globalização excludente; mostra que outra globalização, marcada pela solidariedade e guiada por valores éticos onde se postula que a economia esteja a serviço da vida, é possível. Embora tenha uma coordenação nacional, organiza-se de forma descentralizada, favorecendo o protagonismo dos excluídos e principalmente sua criatividade e ousadia. Daí que ele se realiza de variadas formas, dependendo da realidade de cada estado, povo ou país: pode ser uma manifestação, a participação nos desfiles oficiais, uma vigília, um teatro, uma celebração. Enfim, seja qual for o jeito de se manifestar, o protagonismo deve ser dos excluídos. Privilegia-se não tanto as palavras, mas os gestos, a coreografia e a simbologia. Para dizer que o povo está com

fome, não há necessidade de palavras, basta mostrar uma panela vazia, como foi feito no primeiro Grito. Tem que ter também uma boa dose de ousadia. Quando em alguns lugares a polícia não permitiu a participação no desfile oficial de 7 de setembro, o Grito não se calou. Tomou a contramão da avenida e realizou seu desfile sob os aplausos do público presente. Enfim, no Grito, não vale a força dos discursos, mas sim o exemplo, a mística e o compromisso diário de luta. Estão muito enganados os que pensam que a Teologia da Libertação acabou. Ela está mais viva que nunca nos frutos das sementes disseminadas no passado. Prova disto é a presença pública da Igreja: senão por pronunciamentos oficias, mas, principalmente pela ação coletiva de seus membros, seja através do Grito, das pastorais sociais, das Semanas Sociais, dos plebiscitos populares etc. É por isso que temos muito a agradecer ao nosso Deus Libertador: temos uma Igreja que denuncia as injustiças e que anuncia um outro mundo possível e necessário, o nosso Reino de justiça, fraternidade e cidadania plena. 

Luiz Bassegio é secretário do Grito dos Excluídos Continental e do Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM.

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Votar consciente, lembrando que estamos contratando funcionários públicos que estarão a nosso serviço, é um dever de cidadão e cidadã! de Humberto Dantas

P

ense em tudo o que lhe incomoda. Olhe para fora de sua casa e avalie cuidadosamente a sociedade. Perceba tudo o que existe de maravilhoso ao seu redor. Guarde isso em seu coração e reflita sobre as coisas que desagradam, apavoram ou revoltam. Em que você pensou? Na falta de segurança que torna mais nítida a violência? Na instabilidade do mercado que torna o desemprego mais assombroso? Nas condições precárias dos serviços de saúde e educação, direitos indispensáveis ao nosso bem-estar social? Nas aposentadorias ou nas condições de nossos jovens? No transporte, na cultura, no trânsito, nas contas, nos juros? Deixe de lado a sensação ruim causada por todas essas lembranças. Você que é absolutamente capaz de reclamar e se aborrecer com todos os problemas

de nossa sociedade precisa saber que existe um remédio para esses problemas. Ele parece simples, mas não pode ser interpretado como uma dose única. Para que ele funcione, não basta colocá-lo em prática de maneira pontual. Você precisa fazer um longo tratamento que exigirá tempo e dedicação. O resultado é mágico: ele resolve parte significativa dos problemas apresentados no início deste artigo. Mas lembre-se: seu envolvimento e dedicação são indispensáveis – como em todo processo de cura. Esse remédio se chama voto. Se sua expectativa de solucionar todas essas patologias sociais se esgotou porque você não acredita no poder das eleições, lembre-se que essa dose, que de quatro em quatro anos renova parte do poder público, exige o tal tratamento citado. Portanto, mãos à obra. Primeiro você precisa saber que a urna eletrônica tem um erro grave. Ao término da votação você lê a palavra “Fim”. E o que deveria estar escrito? Começo.

Início de um compromisso entre você e aqueles que o representam.

Começo

Interprete seu voto como uma procuração. Ao invés de se ocupar das tarefas ligadas à administração pública, os cidadãos têm ao seu dispor um imenso corpo de servidores contratados por concursos ou indicados. Além disso, escolhem por meio das eleições (procuração) os ocupantes dos poderes Executivo e Legislativo nas esferas municipal, estadual e federal. Na primeira, indicam o prefeito e os vereadores. Na segunda, o governador do Estado e os deputados estaduais. Na última, o presidente da república, os deputados federais e os senadores. Assim, políticos e servidores são cidadãos comuns que servem a comunidade. Fazem na esfera pública o que não conseguimos, não temos tempo ou não nos sentimos vocacionados. Têm funções específicas, limitações, regras para respeitar e devem satisfação de Divulgação

atualidade

A hora da verdade

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Setembro 2006 -

Antonio Cruz/ABr

suas ações para a sociedade de maneira geral. Podem ser julgados por crimes e responder por uma série de transgressões. Mas quem julga? Quem condena? Quem denuncia? É claro que existem organismos próprios para o cumprimento desse tipo de ação. Mas precisamos entender que o patrimônio público é nosso. E dessa maneira também cabe aos cidadãos o cuidado com as questões de interesse coletivo. Se o seu representante é sua voz nas esferas públicas, e deve defender seus interesses, é de se supor que você o cobre, fiscalize, critique e mantenha-se sempre por perto. Para tanto, algumas dicas são fundamentais.

A fiscalização

Você como cidadão, deve se manter informado sobre a política local e nacional. Precisa assistir o noticiário pela televisão, escutar rádio, ler jornais e utilizar todas as formas possíveis para se manter ­atualizado. Diante de uma indignação maior com algumas questões, você deve procurar grupos de interesse que discutam, debatam e ajam de acordo com aquilo que defende. A internet pode ajudar muito nessa busca. Por exemplo: se você é um consumidor indignado, filie-se ao IDEC. Se o problema é a educação política, procure o Movimento Voto Consciente. Se as questões ambientais chamam sua atenção, existem organizações como a SOS Mata Atlântica e tantas outras. São muitas as organizações que esperam seu contato para fortalecer os temas que afligem a todos. Além de informarse e organizar-se, pois o ditado diz que - Setembro 2006

a união faz a força, é necessário manter viva a sua memória política. E para tanto duas dicas são fundamentais. Ao escolher seus candidatos guarde consigo panfletos, livretos, impressões da internet e notícias que contenham as propostas e promessas para a melhoria daquilo que lhe inspirou a conceder seu voto. Uma vez eleito, consulte semestralmente esse material e entre em contato com seus representantes cobrando-lhes posições acerca dos temas selecionados. Se você fizer esse exercício de maneira organizada (em grupo), os resultados tendem a aparecer. Não deixe para cobrar apenas os membros do Poder Executivo. Por sinal, em se tratando de cobrança, o Legislativo é mais fácil de ser acessado. Outra dica importante diz respeito ao nome dos seus candidatos: atrás do comprovante de votação que você recebe ao votar, anote a lápis o nome e o partido dos seus escolhidos. Recorra periodicamente a esse documento. Pesquise se o seu representante continua no mesmo partido que você selecionou. Cobre-o em caso de infidelidade. Por que a mudança? Quais interesses estavam por trás dessa migração? De preferência, organize-se em grandes grupos de amigos e familiares e tente escolher em conjunto seus candidatos. Enganar um cidadão é mais fácil do que muitos. E cobrar em conjunto tem consistência maior.

Desafios

Diante de todos esses desafios, seu próximo compromisso será com a realidade. Será possível notar, no médio prazo, que uma vez fiscalizados e cobrados, os

representantes passam a trabalhar em benefício da sociedade. Numa democracia, a política, que tantos entendem como espaço para a realização de ações deploráveis, é um dos únicos espaços capazes de promover melhorias em nossas vidas comunitárias. Esse envolvimento vai lhe mostrar que muito do que ocorre hoje é reflexo de nosso descaso. Se por um lado a sociedade acredita que a maioria dos políticos são corruptos, ela se esquece que quando não cumpre seu papel ativo permite que tal cenário se fortaleça. A culpa pelo estado atual de nosso país passa, necessariamente, pelo nosso baixo envolvimento e crença na democracia. Tal questão exige reflexão e, sobretudo, educação. A reflexão nós promovemos periodicamente em publicações democráticas como essa. A educação é papel do Estado promover. Mas como dizia o filósofo Stuart Mill, numa nação existem dois tipos de cidadãos: os passivos e os ativos. O primeiro grupo é interessante para os governantes, pois os deixa em paz para trabalhar. O segundo é interessante para a sociedade, pois cobra ações consistentes. Percebeu? Se depender dos governantes podemos continuar sem essa educação. Portanto, aproveitemos as eleições para refletir, exigir, cobrar e vencer. Em nome de valores indispensáveis à nossa qualidade de vida e bem-estar social, vote consciente! E exija educação para melhorarmos como cidadãos. 

Humberto Dantas é cientista político, professor do Centro Universitário São Camilo e coordenador de cursos de Formação Política na Região Episcopal Lapa e na Diocese de Osasco, SP.

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É tempo “Aprendendo e ensinando uma nova lição” (Geraldo Vandré).

Divulgação

Infância Missionária

de aprender educação da criança e adolescente. A escola que sonhamos é a escola que traduz os sonhos e a realidade das nossas crianças, aberta a construir com elas o “novo”. Em sua vivência familiar e comunitária, Jesus foi educado e surpreendeu seus pais ao ser encontrado em meio aos doutores na sinagoga em Jerusalém: “Todos os que ouviam o menino estavam maravilhados com a inteligência de suas respostas” (Lc 2, 46-52). É na relação entre as pessoas que o conhecimento se faz. Segundo o educador Paulo Freire, as pessoas se educam em comunhão. É preciso assegurar a todos os meninos e meninas uma educação de qualidade, uma educação cidadã que valorize a sua realidade e o seu conhecimento, ajudando-os a crescer com autonomia e responsabilidade. É a favor de um mundo mais bonito, inteiro para toda essa gente, criança, jovem, adulta ou idosa que o nosso trabalho de educadores deve estar voltado. Das crianças do mundo – sempre amigas! 

Roseane de Araújo Silva é missionária leiga e pedagoga da Rede Pública do Paraná.

de Roseane de Araújo Silva

N

o mês em que comemoramos o Dia Internacional da Alfabetização ainda temos em todo o planeta um bilhão de adultos que não sabem ler e nem escrever, além de 100 milhões de crianças em idade escolar que não têm escola. Esses números causam um certo espanto, o que talvez faça muitos de nós questionar o porquê de tudo isso, mesmo com um número elevado de pessoas atendidas a cada ano que passa. A Constituição Federal de 1988 em seus artigos 205 e 208 assegura a educação como direito e dever do Estado e da família, estendendo este direito a todos, independente da faixa etária. Já é possível perceber alguns indicadores mais significativos no que diz respeito à universalização do Ensino Fundamental, na faixa etária dos 7 aos 14 anos, porém o agravante é o número de crianças que mesmo matriculadas em escolas não conseguem aprender a ler e a escrever. Dados recentes do PNAD/IBGE nos mostram que 3,8% das crianças brasileiras com idade entre 10 e 14 anos não sabem ler ou escrever um bilhete simples. Nos últimos anos o conceito de analfabetismo mudou muito. Em 1958, a UNESCO definia como analfabeto um indivíduo que não conseguia ler ou escrever algo simples. Em nossos dias, adotou-se o conceito de analfabeto funcional para uma pessoa que, mesmo sabendo ler e escrever frases simples, não possui as habilidades necessárias para satisfazer as demandas do seu dia-a-dia e se desenvolver pessoal e profissionalmente. O que significa dizer que a torneira do analfabetismo continua aberta e que concomitante ao combater o analfabetismo adulto, faz-se necessário estar associado à

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Sugestão para Grupo

Acolhida Motivação (objetivo): refletir com as crianças a temática da educação no seu dia-a-dia (lembrar também as demais crianças, os jovens e os adultos). Oração: rezemos pelas crianças de todos os continentes que estão fora da escola. Partilha dos compromissos semanais. Leitura da Palavra de Deus: Marcos 9, 35-37 “Quem é o maior?” Compromissos missionários: No Evangelho de Marcos, Jesus nos fala que a verdadeira missão aos irmãos consiste em servi-los sem interesse. Em nossa comunidade existem muitas crianças que mesmo freqüentando a escola, não conseguiram ser alfabetizadas? O que tem sido feito para enfrentar este desafio? Em nossas escolas existe reforço para as crianças com dificuldade de aprendizagem? Vamos conhecer esta realidade de perto? Gesto concreto: Em nossa comunidade existem turmas de educação de jovens e adultos? Nestas turmas algumas pessoas freqüentaram a sala de aula, mas aprenderam no passado apenas a assinar o seu nome e a necessidade os trouxe de volta à escola. Marquem uma visita para conversar com a turma sobre os motivos que os trouxeram à escola. Momento de agradecimento a Deus Pai. Canto e despedida. “Quero estudar, participar, ter um futuro e ser feliz!” Setembro 2006 -

conexão jovem

MITO

uma verdade simbólica Jaime C. Patias

Por que nós, jovens, imitamos certos comportamentos sem nos questionarmos? Um estudo sobre os mitos modernos pode nos ajudar a compreender nosso modo de vida. de Marinei Ferrari

M

ito quer significar uma narrativa, lenda, fábula. As comunidades humanas onde o mito se faz presente com maior força são as sociedades que utilizam a expressão oral. Os grandes problemas vivenciados pelo homem, tais como sua origem, o sentido do universo, a vida, a morte, e outros, são vivenciados no princípio como relatos. O mito como relato narra acontecimentos fundadores da vida. O mito pode ser entendido como uma narrativa lendária pertencente à tradição cultural de um povo e tem a pretensão de explicar a origem de todas as coisas. A memória, a oralidade e a tradição constituem as condições de sua existência e ao mesmo tempo de sua sobrevivência; os grupos humanos passam a contar através das gerações estes feitos que parecem ter origem no começo dos tempos. A vida cotidiana torna-se, de tal modo, um lugar de vivência dessas experiências e tudo gira em torno delas. O mito não é prático, já que está imerso no fantástico; por isso está sempre querendo resgatar aquilo que os heróis e os deuses primitivos fizeram. Embora estes relatos tenham uma identidade sobrenatural, eles querem nos trazer alguma verdade. É uma verdade que se faz presente pela representação simbólica.

Resgate mitológico

Na Antiguidade, o mito produzia um tipo de herói que servia como modelo, paradigma a ser imitado. Era necessário que as crianças, os jovens almejassem sua coragem. Era preciso imitá-lo. O mito hoje parece não ter mais sua função primeira, qual seja, aquela de conferir identidade a um grupo. O mito atual é criado em função do mercado: como modelo para compra e venda de produtos e estilos de vida. É um discurso que procura justificar as atitudes em nome desta ou daquela crença. “Nossa sociedade adotou certos mitos fundadores em torno dos quais se organiza a vida comum e que comandam as reações individuais e coletivas. Estes mitos são mágicos: não buscam compreender a realidade do mundo. Têm por finalidade anestesiar as inquietações e as ansiedades (...) Aspirando a uma liberdade maior, o cidadão cai numa dependência. Mas é uma dependência doce, familiar, repousante: é uma droga” (Darmon). A recuperação dos elementos míticos feita pela propaganda ideológica destitui o - Setembro 2006

Representação do diábo na Guatemala. Nem sempre imitamos quem queremos ser.

mito dos seus significados no contexto primitivo, moldando-o para servir aos interesses de grupos que pretendem vender seus estereótipos de valor. Hoje é possível ver que o comportamento das pessoas passa a ser semelhante, resgatando a moral coletiva das comunidades marcadas pelo mito. Exemplos podem ser vistos quando determinado cantor ou cantora passa a ditar o comportamento que os demais seguem quase sem questionar, quer no modo de usar as roupas, de falar, de manifestar-se. Isso acontece igualmente na política com o aparecimento de mitos salvadores da Pátria. O mito passa então a ser seguido. Ao imitar seu comportamento, acreditamos poder partilhar daquela vida de sucesso, de glória, de soluções e diferenças. O mito contemporâneo vende comportamentos e estilos de vida que são seguidos cegamente. 

Marinei Ferrari é seminarista cursando Filosofia em Curitiba, PR.

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no meu coração “O nosso não é um tempo de simples conservação do que existe, mas de missão”.

Ana Jacira dos Santos, leiga consagrada do Instituto MILMAC, Irmã Elenice Buoro e Irmã Eliane Costa Santana (dir.), Congregação São José de Chambéry.

(João Paulo II)

Fotos: Arquivo Pessoal

entrevista

Timor Leste de Jaime Carlos Patias

L

ocalizada ao sul da Ásia, próxima da Austrália e Indonésia, a jovem nação de Timor Leste tem cerca de 19.000 km2 e uma população de 924 mil habitantes, sendo que 49% tem idades entre 0 e 14 anos (Censo 2004). Colônia de Portugal até 1974, em novembro de 1975 o país foi ocupado pela Indonésia, sofrendo muita repressão, perseguição e morte. As imagens do massacre no cemitério de Santa Cruz, em 1991, fizeram o mundo tomar conhecimento das atrocidades praticadas contra o povo. No plebiscito de 1999 ampla maioria da população votou pela independência, alcançada em 2002. Quanto à religião, 86% são cristãos (muitos foram batizados por imposição durante ocupação da Indonésia) e 14% são muçulmanos ou de religião tradicional. Recentemente, o Timor Leste voltou a ocupar os noticiários internacionais. O país viveu uma nova situação de crise, quando o então primeiro-ministro Mari Alkatiri, no mês de março, demitiu 600 membros do Exército, em greve por sentirem-se discriminados. Uma onda de violência iniciada pelas manifestações de ex-militares se espalhou, assumindo grandes proporções, com saques no comércio e casas queimadas. Gangues de civis armados iniciaram confrontos que inicialmente foram atribuídos às disputas entre as etnias “lorosae” (oriundos do leste do país) e “loromono” (ocidentais).

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Igreja Nossa Senhora das Graças em Laclubar, ­construída pelo governo durante ocupação indonésia.

Aldeia de Adulas, região de Laclubar.

Na capital Dili, mais de 100 mil pessoas procuraram refúgio nas montanhas, em escolas, igrejas ou em casas religiosas. Forças de Segurança da Austrália, Malásia, Portugal e Nova Zelândia auxiliam o governo do país no controle da situação. No mês de julho, Mari Alkatiri renunciou, sendo nomeado em seu lugar, o Prêmio Nobel da Paz de 1996, José Ramos Horta. Mesmo assim a situação do país segue instável. Entrevistamos Irmã Eliane Costa Santana, formada em Ciências da Computação e mestre em Sistemas de Informação, que regressou do Timor, onde trabalhou por três anos integrando uma Equipe Inter-Congregacional no Projeto de Solidariedade entre a Igreja do Brasil e Timor Leste. Irmã Eliane é natural de Tremembé, São Paulo, e pertence à Congregação das Irmãs de São José de Chambéry.

Quais as motivações que a levaram para a Missão? Minha maior motivação foi ser presença de vida onde ela está ameaçada. Apesar disso ser comum em muitos lugares, inclusive no Brasil, conhecer a história do Timor e acompanhar o sofrimento daquele povo, me fez sentir convocada para reconstruir a vida naquele país. Lá morei e trabalhei em Laclubar, uma região de montanha, lugar lindo, com belas paisagens e habitado por um povo muito querido. É preciso percorrer grandes distâncias a pé, pois não há estradas para se chegar em muitas aldeias. A energia elétrica funciona só à noite, à base de geradores a diesel em apenas algumas residências nas vilas mais centrais. Ficamos mais de um ano sem combustível e conseqüentemente, sem energia elétrica. Apesar de amar o Timor, e de me identificar muito com o povo de lá, eu voltei ao Brasil para continuar a minha Missão por aqui. Outra missionária ocupou o meu lugar. Nós somos enviadas por três anos, como uma partilha das Congregações. Setembro 2006 -

Em que consiste o Projeto de Solidariedade entre a Igreja do Brasil e Timor? Esse Projeto missionário conta com a participação de várias Congregações. Ele é coordenado e mantido pela Conferência dos Religiosos do Brasil - CRB e a CNBB. O objetivo é somar forçar entre as diversas instituições religiosas para dar resposta às necessidades missionárias de hoje. Cada Congregação disponibiliza uma pessoa que, na diversidade de carismas cria comunidade de testemunhas. Atualmente as comunidades são duas atuando em três frentes com realidades e trabalhos bem distintos: Laléia, a primeira comunidade missionária constituída no ano 2000, e Laclubar iniciada em 2003, ambas na diocese de Baucau. A terceira frente está ligada à Pastoral DST/Aids em parceria com os Ministérios da Saúde do Brasil e do Timor Leste, num trabalho integrado entre as duas dioceses, Dili e Baucau. Atuamos na educação formal, na formação de professores, na formação dos seminaristas diocesanos, nas pastorais da Criança, Saúde, Liturgia, Catequese e Apostolado da Oração, além da economia solidária e geração de renda. Qual a importância da Missão Ad Gentes para a Igreja do Brasil? A missão Ad Gentes permite que a Igreja saia de si mesma, que comece a viver a universalidade que lhe é própria, partilhe da própria pobreza como resposta aos grandes desafios, e inclua os excluídos. Permite ainda implementar o sonho da unidade na diversidade. A Igreja se fortalece com a Missão e se torna mais profética. Toda vez que a Igreja do Brasil envia um missionário ou uma missionária, ela se envia. Neles, toda a Igreja do Brasil está presente.

coração do povo. Fizemos uma interessante experiência nas montanhas onde se encontram os mais esquecidos, que muitas vezes, nem constam das estatísticas de nascimentos e óbitos. Todas as nossas atividades têm como pano de fundo e razão conviver com essas pessoas. O que nos fortalece na Missão é ser para o povo uma presença do amor de Deus. Por isso, mesmo durante os conflitos os missionários não deixaram o país. Quais as atitudes que devem assumir os que partem para a Missão além-fronteiras? Para mim, quem parte deve ser humilde, disposto a ouvir e a caminhar. Não é preciso falar muito, mas respeitar a cultura local procurando inculturar-se. Ter uma atitude de peregrino. Andar com o povo seguindo o seu ritmo é diferente de andar sozinho. Algumas vezes é preciso acelerar, mas na maioria das vezes é prudente diminuir o passo, respeitando o tempo necessário. Viver o acolhimento cordial e fraterno e ter atenção compreensiva de suas diferenças e sensibilidades. Claro que nem sempre vivi tudo isso com meu grupo. Por isso é preciso estar sempre disposto a recomeçar, a acolher e a pedir perdão. Qual o papel da Igreja no acompanhamento e busca de soluções para a crise atual? A Igreja tem um forte papel institucional junto com o povo, existe uma relação de confiança e força política. Ela pode ajudar a construir a democracia. Continuar a pensar ações sociais que diminuam a pobreza e criem condições de vida mais justas, e também ações de educação para

Diante dos desafios, onde a senhora encontra força para viver a Missão?

Nós, como grupo, vivemos na Missão em Timor momentos de desafio e sofrimento. Mas também vivemos momentos ricos de partilha e ajuda mútua. Conseguimos, através das visitas às famílias, chegar ao - Setembro 2006

Confecção de “tais” (adereço típico dos timorenses).

a paz e reconstrução da dignidade das pessoas. Há muitos traumas e sofrimentos causados pelos conflitos. Como líder durante a guerrilha, Xanana Gusmão tem se mostrado competente. Como presidente, ele goza do mesmo prestígio? Enquanto estive no Timor, vi e ouvi do povo muita admiração por Xanana Gusmão. Além de ser um líder, o povo se identifica com ele. Existe uma relação de respeito e de admiração por ele ser uma referência da luta e conquista da independência, principalmente por parte do povo mais simples. Acontece que esse prestígio não é o mesmo com relação à equipe de governo. O Timor é uma República parlamentarista onde o responsável executivo é o primeiro-ministro. Havia muitas manifestações contra Mari Alcatiri e outros membros do governo da época. Agora com a volta das forças de paz da ONU e o novo primeiroministro, José Ramos Horta, que sempre foi querido e respeitado pelo povo, espero que a paz volte a reinar. Todo processo de democratização é difícil, principalmente em se tratando de um país com apenas cinco anos de existência. Nós, brasileiros, sabemos como isso é difícil. Tem mais algum aspecto que gostaria de abordar? Gostaria de destacar a experiência positiva de viver a Missão na partilha com missionárias de outras Congregações. A diversidade das pessoas é um fator positivo para a construção de uma comunidade equilibrada. Longe de ser perfeita, a busca de um relacionamento sincero foi essencial para que a comunidade se firmasse. Como grupo, vivemos uma proposta de comunidade que procura ser presença do amor de Deus, segundo a dinâmica da evangelização: ser instrumento nas mãos de Deus na escuta, no diálogo, nos desafios da vida e da morte, sempre abertos à novidade. Projetos como esse são exemplos da partilha e do compromisso das Congregações e da Igreja. Assim, temos a certeza de que o trabalho e a Missão começados por um grupo, continuam nas mãos das novas forças que chegam. O carisma de cada Congregação fica marcado no coração do povo, e aquela comunidade, mesmo sem nenhuma Irmã de São José, agora faz parte das comunidades das Irmãs de São José. O projeto continua sendo meu projeto, como continua sendo o projeto de cada uma das pessoas que já passaram por lá. E aquela Missão continua sendo a nossa. 

Jaime Carlos Patias é missionário, mestre em comunicação e mercado e diretor da revista Missões.

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Professores no Amazonas denunciam falta de respeito e desinteresse dos poderes públicos com escolas de comunidades indígenas.

de José Rosha

C

erca de mil alunos do Ensino Fundamental das comunidades indígenas Sateré Mawé do rio Andirá, no município de Barreirinha, Amazonas, poderão ficar sem aula ainda neste semestre por falta de material escolar e merenda. A denúncia é feita por José de Oliveira, coordenador da Organização dos Professores Indígenas Sateré Mawé dos rios Andirá e Waykurapá - OPISMA, que pretende denunciar estas e outras irregularidades ao Ministério Público Federal. No rio Andirá existem 36 escolas indígenas reconhecidas pela Secretaria Municipal de Educação de Barreirinha, além de outras cinco aguardando por reconhecimento. Destas, 15 estão funcionando em prédios com uma única sala de aula, algumas com buracos no forro,

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com teto danificado, sem ventilação e acabamento. Um exemplo disso é a escola Nova Jerusalém na comunidade São José Novo. O prédio foi construído em 2001, segundo os moradores, mas até agora não foram colocadas as louças dos sanitários e cupins avançam sobre a estrutura de madeira. A Secretaria de Educação de Barreirinha também não mandou para o local os utensílios para a produção da merenda para os 15 alunos que freqüentam o Ensino Fundamental. Na comunidade de Vista Alegre a sala de aula funciona na parte de baixo da casa do professor. Para atender os 18 alunos, ele teve de improvisar. A mesma situação se verifica em outras 18 comunidades onde as aulas são dadas em barracões, igrejas, casas dos tuxauas ou dos moradores. É grande o número de alunos do Ensino Fundamental e Educação de Jovens e Adultos para uma única sala construída pela prefeitura de Barreirinha.

Fotos: CIMI

amazônia

Descaso na educaçã

Falta material

“Crueira” é um subproduto da mandioca usado na fabricação de mingau. Na sala de aula de Vista Alegre serve para escrever no quadro, substituindo o giz que só chega até lá quando o próprio professor leva da sede do município de Barreirinha até sua comunidade. A Secretaria Municipal de Educação não faz esse serviço, dizem os professores de Sateré Mawé. Em Araticum, há três salas de aula, duas das quais são Setembro 2006 -

ção indígena improvisadas. Em uma delas, por falta de quadro, os alunos aprendem a ler e a escrever no chão, onde são rabiscadas as lições. Próximo dali, na comunidade de Simão, existem seis turmas divididas entre salas de aula da escola, do salão da igreja e de um barracão, onde os professores só dispõem de um quadro com menos de um metro quadrado. “A maioria das escolas funciona precariamente. Isso desanima tanto o professor como os alunos”, diz José de Oliveira. Em Torrado, alunos apresentaram livros didáticos, fornecidos pela Secretaria de Estado da Educação, de Física e Química, para a oitava série do Ensino Fundamental. No entanto, nas escolas indígenas do rio Andirá só há turmas de primeira a quarta série e Educação de Jovens e Adultos – EJA. Livros, cadernos, lápis, borrachas e outros materiais de uso corrente nas escolas estão em falta. Na maioria das comunidades a quantidade fornecida pela Secretaria Municipal de Educação de Barreirinha foi insuficiente para atender aos alunos. O coordenador da OPISMA relata que foram realizadas várias reuniões de professores para discutir

a situação e, ao final, produzidos documentos posteriormente encaminhados à Secretaria de Educação de Barreirinha, mas a titular da Secretaria em nenhum momento deu atenção à reclamação dos professores. A falta de merenda escolar é outro transtorno vivido nas comunidades Sateré Mawé. A quantidade e qualidade não atende à demanda das aldeias. A maioria dos professores relata casos de evasão escolar por falta de alimento. Essa situação tem pelo menos dois complicadores. O primeiro diz respeito à escassez de caça, pesca e outros meios de subsistência. Os indígenas dizem que as plantações das roças nem chegam a ser suficientes para as famílias. Outro complicador é a qualidade dos produtos fornecidos pela Secretaria Municipal de Educação de Barreirinha. Não são raros os casos de alimentos estragados, diz o coordenador da OPISMA. A comunidade de Torrado guarda ainda as latas de conserva e pacotes de macarrão recebidos em maio de um lote que deveria ser entregue no final do ano letivo de 2005.

Cerca de mil alunos das comunidades indígenas poderão ficar sem aula por falta de material escolar e merenda. O professor informou o fato à Secretaria de Educação que o orientou a levar os alimentos até Barreirinha, para serem trocados no galpão onde fica estocada a merenda escolar do município. “Felizmente até agora não foram registrados casos de intoxicação”, diz José de Oliveira.

Monitores

As 36 escolas indígenas do rio Andirá contam com 84 professores. A maioria vem exercendo a função há vários anos. O contrato deles, porém, é firmado com a prefeitura de Barreirinha em regime temporário e para a função de monitor ou auxiliar de serviços gerais. Segundo os professores, a Secretaria de Educação de Barreirinha tem dito a eles que essa condição se deve ao fato de não terem curso de formação específica. “Aqui no Andirá é onde sofremos mais com as contratações. Nenhum professor é contratado como professor, apesar de muitos já terem concluído o Magistério Indígena”. Além disso, muitos têm em média 20 anos atuando como professor nas comunidades, diz o coordenador da OPISMA. Para reparar essa injustiça, a organização está orientando os professores a entrar com ação reclamatória na Justiça do Trabalho. “Queremos que a Secretaria de Educação de Barreirinha reconheça e respeite os direitos dos professores e pague um salário condizente com a função”, destaca José de Oliveira. Outra iniciativa da OPISMA será acionar o Ministério Público Federal. A organização quer saber se os recursos para as escolas indígenas do rio Andirá estão sendo aplicados corretamente. Os professores vêm tentando acompanhar a aplicação desses recursos, mas dizem que falta transparência por parte da prefeitura de Barreirinha. “Já tentamos relatar pes­ soalmente essa situação à Secretária de Educação, mas ela não nos atende nem responde aos documentos. Nós queremos pelo menos que a Secretaria forneça cópia dos contratos aos professores”, denuncia José de Oliveira. 

José Rosha é assessor de comunicação do CIMI Norte 2. - Setembro 2006

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Assessoria de Comunicação da OSID

Irmã Dulce com seus “filhos”.

VOLTA AO BRASIL

Bahia Balanço das obras de Irmã Dulce

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A diretoria das Obras Sociais Irmã Dulce (OSID) anunciou a 5ª edição de seu Balanço Social, ano 2005. Editado desde 1999, é um retrato da atuação institucional e considerado uma ferramenta de comunicação indispensável para a política de transparência e diálogo com a sociedade, servindo como prestação de contas das atividades da Instituição ao longo de um ano. A OSID foi pioneira entre as ONGs do país na edição do relatório. Segundo reportagem publicada no dia 9 de fevereiro deste ano pelo Jornal da Tarde, de São Paulo, intitulada “Balanço Social deve refletir ações concretas” apenas dez ONGs brasileiras publicam regularmente Balanços Sociais. A OSID fechou 2005 com a realização de 2,7 milhões de atendimentos - 600 mil a mais que em 2004 - , a usuários do SUS, idosos, portadores de deficiências e de deformidades craniofaciais, pacientes sociais e crianças e adolescentes em situação de risco social. Ao longo do ano, foram realizadas 12.631 cirurgias, 967.421 exames laboratoriais e 821.589 consultas, entre outros procedimentos. Na área educacional, a instituição proporcionou ensino fundamental e profissionalizante a 718 crianças e jovens. A receita totalizou R$ 63.883 milhões e a despesa total, incluindo capital imobilizado e depreciação de patrimônio, foi da ordem de R$ 62.692 milhões. Os recursos do SUS se mantêm como os mais significativos para a manutenção das atividades. Segundo a superintendente Maria Rita Pontes, o resultado positivo dos dois últimos exercícios se deve a um modelo próprio de administração, praticado de maneira intuitiva por Irmã Dulce e aprimorado nos últimos anos, que alia a defesa intransigente da missão das Obras de atender a todos os que necessitam de amparo a uma busca contínua da melhoria de processos e serviços e da qualificação das parcerias, que têm sempre como foco a visão de futuro.

Brasília Evangelização da juventude

Acaba de ser lançado o texto do tema central da Assembléia Geral da CNBB deste ano: Evangelização da Juventude, publicado na série Estudos da CNBB, nº 93 (cor verde). O objetivo é que o tema seja novamente estudado e refletido pelas comunidades da Igreja, especialmente pelos jovens e suas organizações, para receber mais sugestões e aperfeiçoamento. O

texto pode ser encontrado facilmente nas livrarias católicas e também está disponível para download no formato Word no endereço eletrônico da CNBB www.cnbb.org.br

Violência contra as mulheres

Foi sancionada no dia 7 de agosto, pelo presidente da República, a Lei de combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres no Brasil. A lei dá cumprimento a convenções ratificadas pelo Estado há 11 anos. O Brasil é o 18º país da América Latina a ter uma lei dessa natureza. Pesquisa realizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2005, revela que, no Brasil, 27% das mulheres foram agredidas fisicamente por seus parceiros ou ex-parceiros. Na zona rural o número sobe para 34%. A lei define como crime a violência física ou psicológica contra a mulher, independentemente da orientação sexual; proíbe a aplicação de penas pecuniárias, em que o réu era condenado a pagar com multas ou cestas básicas; estabelece prazo mínimo de três meses de reclusão e máxima de três anos; e permite as prisões preventiva e em flagrante. A partir de agora, a mulher que quer desistir da denúncia só poderá fazê-lo perante um juiz. Com as novas regras, ela terá o direito de reaver bens, cancelar procurações feitas em nome do agressor e poderá ficar até seis meses afastada do trabalho se sofrer risco à sua integridade física.

Pernambuco Crime contra índios Xukuru

Há 35 lideranças do povo indígena Xukuru respondendo a processos por terem reagido ao assassinato de dois jovens indígenas e à tentativa de assassinato do seu cacique. Os depoimentos das lideranças à Justiça Federal começaram em agosto, na cidade de Caruaru. Segundo informações do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), no dia 7 de fevereiro de 2003, um atentado contra a vida do cacique Marcos Xukuru causou a morte de dois jovens que o acompanhavam e tentaram defendê-lo. Foram mortos os indígenas Josenílson José dos Santos e José Ademilson Barbosa da Silva. José Lourival Frazão foi processado e condenado pelo crime. Na data do atentado, a comunidade Xukuru, indignada, deslocou-se para a Vila de Cimbres, para cobrar satisfação dos autores dos crimes. Foram recebidos a tiros e quatro indígenas ficaram feridos. Ninguém está sendo processado por isto. A Polícia Federal e o Ministério Público Federal, ao apurarem os fatos e denunciarem os culpados, teriam transformado a vítima do atentado em réu: o cacique Marcos Xukuru também está sendo processado como agente provocador do conflito. Desde os anos 1980, os Xukuru lutam contra um projeto que visava criar estrutura para que o Santuário de Nossa Senhora das Graças, localizado dentro da terra indígena, se tornasse um ponto de turismo religioso. Por causa disso, a Funai (Fundação Nacional do Índio), membros da Igreja Católica local e políticos da região teriam atuado para dividir o povo, passando a promover ações violentas contra os Xukuru. 

Fontes: Adital, CNBB, CNBB Sul1, OSID. Setembro 2006 -

Jornal Missão Jovem: 20 anos a serviço da juventude Fundado em Florianópolis, no dia 14 de agosto de 1986 pelo padre Paulo De Coppi – missionário do PIME, o jornal Missão Jovem apresentou-se como uma forma ampla e eficaz de atuar, voltado à educação da juventude, à formação de lideranças nas comunidades e à animação missionária, através da utilização dos meios de comunicação social. Nos sete meses iniciais, a equipe que acompanhava o padre Paulo era composta por voluntários e as primeiras impressões eram feitas junto à gráfica do jornal O Estado, onde era impresso o jornal A Voz do Estreito. No ano seguinte, Missão Jovem começou a crescer, houve as primeiras contratações de funcionários e a impressão começou a ser feita fora de Florianópolis. Como fruto deste crescimento, iniciou-se em 1993 a publicação de livros, que totalizam atualmente mais de 50, impressos pelo Jornal Missão Jovem e a Editora Mundo e Missão. Hoje, a equipe de MJ é composta por sete funcionários, uma estagiária e dois padres do PIME, dentre os quais o padre Paulo De Coppi. As matérias são produzidas totalmente pela equipe, sendo terceirizada somente a impressão. Embora sua existência seja ainda breve, Missão Jovem está presente no Brasil inteiro, com 35.267 assinantes e em dezenas de outros países dos cinco continentes. Informações: www.missaojovem.com.br - tel. (48) 3222.9572

Campanha: “MUTIRÃO PARA A AMAZÔNIA” 1. Objetivos: INFORMAR SOBRE A SITUAÇÃO DA AMAZÔNIA • Sensibilizar a opinião pública quanto ao futuro da Amazônia • Articular as entidades a fim de tomar as providências devidas 2. Participantes: • CIMI – Conselho Indigenista Missionário • CPT – Comissão Pastoral da Terra • MST – Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra • Outras entidades e instituições interessadas Você também pode participar 3. Material disponível para divulgação: ADQUIRA PARA USO EM GRUPOS OU ESCOLA • Publicação especial na revista Mensageiro (jan/fev/mar/abr - 2006) • CD interativo com dados mais completos (capa ao lado) • Programas de rádio e televisão



MAIORES INFORMAÇÕES Comissão Episcopal para a Amazônia - Tel.: (61) 313-8300 Fax (61) 313-83-03 - e-mail: [email protected] O Mensageiro - Tel.: (91) 3226-5408 - Fax: (91) 3249-6942 e-mail: [email protected]

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