Teoria Do Conhecimento - Filosofia

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UNIVERSIDADE PAULISTA INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS CURSO DE DIREITO

TEORIA DO CONHECIMENTO

MANAUS 2009

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RODRIGO BRITO SARUBBI

TEORIA DO CONHECIMENTO

Trabalho da disciplina Filosofia, ministrada pelo professor Lindomar Gean Turma AD2Q34, Sala 4201, do Curso de Direito, da Universidade Paulista.

MANAUS 2009

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..........................................................................................................04 PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO .........................................................................05 1. SENSO COMUM ...................................................................................................05 2. CONHECIMENTO CIENTÍFICO ............................................................................06 3. CONHECIMENTO MÍTICO ...................................................................................10 3.1 COMO O MITO FUNCIONA ................................................................................12 3.2 COMO OPERA O MITO? ....................................................................................13 4. CONHECIMENTO FILOSÓFICO ..........................................................................15 CONCLUSÃO ...........................................................................................................17 REFERÊNCIAS..........................................................................................................18

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INTRODUÇÃO

O conhecimento é o pensamento que resulta da relação que se estabelece entre o sujeito que conhece e o objeto a ser conhecido. A apropriação intelectual do objeto supõe que haja regularidade nos acontecimentos do mundo; caso contrário, a consciência cognoscente nunca poderia superar o caos, a desordem. O conhecimento pode ser o ato de conhecer, enquanto relação que se estabelece entre a consciência que conhece e o mundo conhecido. Mas o conhecimento também se refere ao produto, ao resultado do conteúdo desse ato, ou seja, o saber adquirido e acumulado pelo ser humano. Na verdade, ninguém inicia o ato de conhecer a partir do nada, pois esse ato é simultâneo à transmissão pela educação dos conhecimentos acumulados em uma determinada cultura. O foco relevante do trabalho cientifico foi buscar elementos teóricos que viessem justificar a importância da temática a ser aplicada em nosso dia-a-dia. Os argumentos estão sistematizados na pesquisa, que buscou, empreender uma visão precisa de como se dá a produção do conhecimento.

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A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO

Segundo as intervenções de Sócrates, relacionados ao conhecimento faz mister destacar a seguinte contribuição: O conhecimento de si próprio é pressuposto para se chegar à verdade. Isto supõe a superação da crença de que se sabe aquilo que, na realidade, não se sabe. É preciso ter consciência da própria ignorância e da própria fragmentação do conhecimento. A partir desta consciência se estabelece uma reflexão e aprendizado comum através do diálogo, como condição indispensável do desenvolvimento da reflexão pessoal. O conhecimento transforma-se numa tarefa inesgotável. (GHEDIN, 2003)

1. SENSO COMUM

Chamamos de conhecimento espontâneo ou senso comum o saber resultante das experiências levadas a efeito pelo homem ao enfrentar os problemas da existência. O senso comum, enquanto conhecimento espontâneo ou vulgar, é ametódico e assistemático e nasce diante da tentativa do homem de resolver os problemas da ávida diária. O homem do campo sabe plantar e colher segundo normas que aprendeu com seus pais, usando técnicas herdadas de seu grupo social e que se transformam lentamente em função dos acontecimentos casuais com os quais se depara. (ARANHA, 1993) O volume enorme de saberes herdados e construídos nem sempre são tematizados, ou seja, não se apresentam de forma sistemática nem têm caráter de conhecimento refletido. Dependendo da cultura, são encontradas, com maior ou

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menor intensidades, proposições racionais ao lado de crenças e mitos de toda espécie. (COTRIM, 2002) É um tipo de conhecimento empírico, porque se baseia na experiência cotidiana e comum das pessoas, distinguindo-se por isso da experiência científica, que exige planejamento rigoroso. É também conhecimento ingênuo: atitude nãocrítica, típica do saber que não se coloca como problema e não se questiona enquanto saber. Em comparação com a ciência, o conhecimento espontâneo é fragmentário, pois não estabelece conexões onde estas poderiam ser verificadas. É ainda um conhecimento particular, restrito a pequena amostra da realidade, a partir da qual são feitas generalizações. O homem comum critério de rigor, de forma ametódica e fortuita. Em outras palavras, conclui para todos os objetos o que vale para um ou para um grupo de objetos observados. O senso comum é freqüentemente um conhecimento subjetivo, o que ocorre, por exemplo, quando avaliamos a temperatura do ambiente com a nossa pele, já que só o termômetro dá objetividade a essa avaliação. O senso comum depende de juízos pessoais a respeito das coisas, com envolvimento das emoções e dos valores de quem observa. (ARANHA, 1992) O senso comum é uma visão de mundo precária, distorcida e até perversa. Em decorrência, poderíamos pensar que só superamos a pobreza mental recorrendo a formas mais sofisticadas do saber, tais como filosofia e a ciência. No entanto, pensar assim é pressupor que o homem comum deve ser tutelado por outros que lhe digam qual a melhor forma de pensar e quais as melhores ações a serem realizadas, o que é contrário a tudo que se pensa sobre o valor da autonomia humana. (GHEDIN, 2003)

2. CONHECIMENTO CIENTÍFICO Ao se falar em conhecimento científico, o primeiro passo consiste em diferenciá-lo de outros tipos de conhecimento existentes. Para tal, analisaremos uma situação histórica que pode servir de exemplo.

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Desde a antiguidade, até os dias de hoje, um camponês, mesmo iletrado ou desprovido de outros conhecimentos, sabe o momento exato da semeadura, a época da colheita, a necessidade da utilização de adubos, o tipo de solo adequado para as diferentes culturas e etc. Tem também conhecimento de que o cultivo do mesmo tipo de plantação, todos os anos, no mesmo local, exaure o solo. Já no período feudal, o sistema de cultivo era em faixas: duas faixas eram cultivadas e uma terceira ficava "em repouso", alternando-as de ano para ano, nunca cultivando a mesma planta, dois anos seguidos numa única faixa. O início da Revolução Agrícola não se prende ao aparecimento, no século XVIII, de melhores arados, enxadas e outros tipos de maquinaria, mas sim à introdução da cultura do nabo e do trevo, pois seu plantio evitava o desperdício de se deixar a terra "em repouso": o seu cultivo "revitalizava" o solo permitindo o uso constante de todas as faixas usadas anteriormente. Hoje, a agricultura utiliza-se de sementes selecionadas, de adubos químicos, de defensivos contra as pragas e tenta-se, até, o controle biológico dos insetos daninhos. (ARANHA, 1992) Mesclam-se, neste exemplo, dois tipos de conhecimento: o primeiro é o conhecimento popular ou senso comum, geralmente típico do camponês, transmitido de geração em geração por meio da educação informal e baseado em imitação e experiência pessoal; portanto, empírico e desprovido de conhecimento sobre a composição do solo, das causas do desenvolvimento das plantas, das naturezas das pragas, do ciclo reprodutivo dos insetos etc.; o segundo, científico, é transmitido por intermédio de treinamento apropriado, sendo um conhecimento obtido de modo racional, conduzido por meio de procedimentos científicos. Visa explicar "por que" e "como" os fenômenos ocorrem, na tentativa de evidenciar os fatos que estão correlacionados, numa visão mais abrangente do que a relacionada com um simples fato. (ARANHA, 1993) O conhecimento popular ou senso comum não difere do conhecimento científico nem pela veracidade nem pela natureza do objeto conhecido: o que o diferencia é a forma, o modo ou o método e os instrumentos para se obter o "saber". Saber que determinada planta necessita de uma certa quantidade de água e que, se não a receber de forma "natural", deve ser irrigada este pode ser um conhecimento verdadeiro e comprovável, mas, nem por isso, científico. (OP.CIT, 1993) Para que este conhecimento seja científico, é necessário ir mais além: conhecer a natureza dos vegetais, sua composição, seu ciclo de desenvolvimento e

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as particularidades que distinguem uma espécie de outra etc. Sendo assim podemos afirmar que a ciência não é o único caminho de acesso à verdade estabelecida pela natureza de nosso universo. A descontinuidade radical existente entre a Ciência e o conhecimento popular, em numerosos aspectos (principalmente no que se refere ao método de obtenção de conhecimento), não nos deve fazer ignorar certa continuidade em outros aspectos, principalmente quando limitamos o conceito de conhecimento vulgar ao “bom-senso”. Se excluirmos o conhecimento mítico (raios e trovões como manifestações de desagrado de Deus pelos comportamentos individuais ou sociais), verificamos que tanto o bom-senso quanto a Ciência almejam ser racionais e objetivos: “são críticos e aspiram à coerência (racionalidade) e procuram adaptar-se aos fatos em vez de permitir-se especulações sem objetividade”. (COTRIM, 2002) Entretanto,

o

ideal

de

racionalidade,

compreendido

como

uma

sistematização coerente de enunciados fundamentados e passíveis de verificação, é obtido muito mais por intermédio de teorias, que constituem o núcleo da Ciência, do que pelo conhecimento comum, entendido como acumulação de partes ou ‘peças’ de informação frouxamente vinculadas. Por sua vez, o ideal de objetividade, isto é, a construção de imagens da realidade, verdadeiras e impessoais, não pode ser alcançada se não se ultrapassarem os estreitos limites da vida cotidiana, assim como da experiência particular é necessário abandonar o ponto de vista antropocêntrico, para formular hipóteses sobre a existência de objetos e fenômenos além da própria percepção de nossos sentidos, submetê-los à verificação planejada e interpretada com o auxilio das teorias. Por esse motivo é que o senso comum, ou o “bom-senso”, não pode conseguir mais do que uma objetividade limitada, assim como é limitada sua racionalidade, pois está estreitamente vinculado à percepção e à ação. (GHEDIN, 2003) Pode-se dizer que o conhecimento popular é o modo comum, corrente e espontâneo de conhecer, que se adquire no trato direto com as coisas e os seres humanos: “é o saber que prevalece em nossas vidas diárias aquele que é sem comprovação ou estudo, sem a aplicação de um estudo (método) mais cuidadoso e sem se haver refletido sobre algo que é afirmado como verdade”. (OP.CIT, 2003) O conhecimento científico é real (factual) porque lida com fatos, isto é, com toda “forma de existência que se manifesta de algum modo”. Constitui um

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conhecimento contingente, pois suas afirmações ou hipóteses têm a sua veracidade ou falsidade conhecida através da experimentação e não apenas pela razão, como ocorre no conhecimento filosófico. É sistemático, já que se trata de um saber ordenado logicamente, formando um sistema de idéias (teoria) e não conhecimentos dispersos e desconexos. Possui a característica da verificabilidade, a tal ponto que as afirmações (hipóteses) que não podem ser comprovadas não pertencem ao âmbito da ciência. Constitui-se em conhecimento falível, em virtude de não ser definitivo, absoluto ou final e, por este motivo, é aproximadamente exato: novas preposições e o desenvolvimento de técnicas podem reformular o acervo de teoria existente. Apesar da separação metodológica entre os tipos de conhecimento popular filosófico, religioso e científico, no processo de compreensão da realidade do objeto, o sujeito pode penetrar nas diversas áreas: ao estudar o homem, por exemplo, pode-se tirar uma série de conclusões sobre sua atuação na sociedade, baseada no senso comum ou na experiência cotidiana: pode-se analisá-lo como um ser biológico, verificando, através de investigação experimental, as relações existentes entre determinados órgãos e suas funções: pode-se questioná-los quanto á sua origem e destino, assim como quanto à sua liberdade. Por sua vez, estas formas de conhecimento podem coexistir na mesma pessoa: um cientista, voltado, por exemplo, ao estudo da física, pode ser crente praticante de determinada religião, estar filiado a um sistema filosófico e, em muitos aspectos de sua vida cotidiana, agir segundo conhecimentos provenientes do senso comum. O conhecimento científico é uma reconquista recente da humanidade: tem apenas trezentos anos e surgiu no século XVII com a revolução galileana. A utilização de métodos rigorosos permite que a ciência atinja um tipo de conhecimento sistemático, preciso e objetivo segundo o qual são descobertas relações universais e necessárias entre os fenômenos, o que permite prever acontecimentos e também agir sobre a natureza de forma mais segura. (COTRIM, 2002) Cada ciência se torna então uma ciência particular, no sentido de ter um campo delimitado de pesquisa e um método próprio. As ciências são particulares na medida em que cada um privilegia setores distintos da realidade: a física trata do movimento dos corpos; a química, da sua transformação; a biologia, do ser vivo, etc.

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Por outro lado às ciências também gerais, no sentido de que as conclusões não valem apenas para os casos observados, e sim para todos os que a eles se assemelham. Ao afirmamos que “o peso de qualquer objeto depende do campo de gravitação” ou que “a cor de um objeto depende do campo de gravitação”, fazemos afirmações que são válidas para todos os corpos, todos os objetos coloridos ou qualquer porção de água, e não apenas para aqueles que foram objeto da experiência. (OP.CIT, 2002) O fato cientifico é um fato abstrato, isolado do conjunto em que se encontra normalmente inserido e elevado a um grau de generalidade: quando nos referimos à “dilatação” ou a “aquecimento” como fatos científicos, estamos muito distantes dos dados sensíveis de um certo corpo em um determinado momento. Alem disso, estabelecemos entre tais fatos uma revelação de variação do tipo “função”. Isso supõe a capacidade de racionalização dos dados recolhidos, que nunca aparecem como dados brutos, mas sempre passiveis de interpretação. (GHEDIN, 2003) O mundo construído pela ciência aspira à objetividade: as conclusões podem ser verificadas por qualquer outro membro competente da comunidade cientifica, pois a racionalidade desse conhecimento procura despojar-se do emotivo, tornando-se impessoal na medida do possível. A esse respeito diz o filosofo francês Merleau-Ponty: “A ciência explica o mundo, mas se recusa a habita-lo”. Em outras palavras, por mais que a ciência amplie o conhecimento que temos do mundo, de certo ponto de vista ela reduz esse conhecimento, pois o cientista remove toda a experiência individual que caracteriza o “estar-no-mundo”. Para ser precisa e objetiva, a ciência dispõe de uma linguagem rigorosa cujos conceitos são definidos de modo a evitar ambigüidades. (OP.CIT, 2003)

3. CONHECIMENTO MÍTICO A tradição filosófica, sobretudo a partir do século XVIII (com a filosofia da Ilustração) e do século XIX (com a filosofia da história de Hegel e o positivismo de Comte), afirmava que do mito à lógica havia uma evolução do espírito humano, isto é, o mito era uma fase ou etapa do espírito humano e da civilização que antecedia o advento da lógica ou do pensamento lógico, considerado a etapa posterior e

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evoluída do pensamento e da civilização. Essa tradição filosófica fez crer que o mito pertenceria a culturas “inferiores”, “primitivas” ou “atrasadas”, enquanto o pensamento lógico ou racional pertenceria a culturas “superiores”, “civilizadas” e “adiantadas”. (ARANHA, 1992) Essa separação temporal e evolutiva de duas modalidades de pensamento fazia com que se julgasse a presença, em nossas sociedades, de explicações míticas (isto é, as religiões, a literatura, as artes) como uma espécie de “resíduo” ou “resto” de uma fase passada da evolução da humanidade, destinada a desaparecer com a plena evolução da racionalidade científica e filosófica. ((ARANHA, 1993) Hoje, porém, sabe-se que a concepção evolutiva está equivocada. O pensamento mítico pertence ao campo do pensamento simbólico e da linguagem simbólica, que coexistem com o campo do pensamento e da linguagem conceituais. Duas linhas de estudos mostraram essa coexistência, embora essas duas modalidades de pensamento e de linguagem sejam não só diferentes, mas também, freqüentemente, contrárias e opostas. A primeira linha vem da antropologia social, que estuda os mitos das sociedades ditas selvagens e também as mitologias de nossas sociedades, ditas civilizadas. Os antropólogos mostraram que, no caso de nossas sociedades, a presença simultânea do conceitual e do mítico decorre do modo como a imaginação social transforma em mito aquilo que o pensamento conceitual elabora nas ciências e na Filosofia. Basta ver o caráter mágico-maravilhoso dado aos satélites e computadores para vermos a passagem da ciência ao mito. (SOUZA, 1995) A segunda linha vem da neurologia e da análise da anatomia e da fisiologia do cérebro humano, mostrando que esse órgão possui duas partes ou dois hemisférios, num deles localizando-se a linguagem e o pensamento simbólicos e noutro, a linguagem e o pensamento conceitual. Certas pessoas, como os artistas, desenvolvem mais o hemisfério simbólico, enquanto outras, como os cientistas, desenvolvem mais o hemisfério conceitual e lógico. Assim, a predominância de uma ou outra forma do pensamento depende, por um lado, das tendências pessoais e da história da vida dos indivíduos e, de outro lado, do modo como uma sociedade ou uma cultura recorre mais a uma do que à outra forma para interpretar a realidade, intervir no mundo e explicar-se a si mesma.

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Numa passagem célebre de uma de suas obras, Marx dizia que o mito de Zeus (portador de raios, trovões e tempestades) não mais poderia funcionar numa sociedade que inventou o pára-raios, isto é, descobriu cientificamente a eletricidade. Mas o próprio Marx mostrou como tal sociedade cria novos mitos, adaptados à era da máquina e da tecnologia. (CONTRIM 2002)

3.1 COMO O MITO FUNCIONA O antropólogo Claude Lévi-Strauss estudou o “pensamento selvagem” para mostrar que os chamados selvagens não são atrasados nem primitivos, mas operam com o pensamento mítico. (ARANHA, 1992) O mito e o rito, escreve Lévi-Strauss, não são lendas nem fabulações, mas uma organização da realidade a partir da experiência sensível enquanto tal. Para explicar a composição de um mito, Lévi-Strauss se refere a uma atividade que existe em nossa sociedade e que, em francês, se chama bricolage. (ARANHA, 1993) Que faz um bricoleur, ou seja, quem pratica bricolage? Produz um objeto novo a partir de pedaços e fragmentos de outros objetos. Vai reunindo, sem um plano muito rígido, tudo o que encontra e que serve para o objeto que está compondo. O pensamento mítico faz exatamente a mesma coisa, isto é, vai reunindo as experiências, as narrativas, os relatos, até compor um mito geral. Com esses materiais heterogêneos produz a explicação sobre a origem e a forma das coisas, suas funções e suas finalidades, os poderes divinos sobre a Natureza e sobre os humanos. O mito possui, assim, três características principais: (SOUZA, 1995) 1. função explicativa: o presente é explicado por alguma ação passada cujos efeitos permaneceram no tempo. Por exemplo, uma constelação existe porque, no passado, crianças fugitivas e famintas morreram na floresta e foram levadas ao céu por uma deusa que as transformou em estrelas; as chuvas existem porque, nos tempos passados, uma deusa apaixonou-se por um humano e, não podendo unir-se a ele diretamente, uniu-se pela tristeza, fazendo suas lágrimas caírem sobre o mundo, etc.; 2. função organizativa: o mito organiza as relações sociais (de parentesco, de alianças, de trocas, de sexo, de idade, de poder, etc.) de modo a legitimar e

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garantir a permanência de um sistema complexo de proibições e permissões. Por exemplo, um mito como o de Édipo existe (com narrativas diferentes) em quase todas as sociedades selvagens e tem a função de garantir a proibição do incesto, sem a qual o sistema sócio-político, baseado nas leis de parentesco e de alianças, não pode ser mantido; 3. função compensatória: o mito narra uma situação passada, que é a negação do presente e que serve tanto para compensar os humanos de alguma perda como para garantir-lhes que um erro passado foi corrigido no presente, de modo a oferecer uma visão estabilizada e regularizada da Natureza e da vida comunitária. Por exemplo, entre os mitos gregos, encontra-se o da origem do fogo, que Prometeu roubou do Olimpo para entregar aos mortais e permitir-lhes o desenvolvimento das técnicas. Numa das versões desse mito, narra-se que Prometeu disse aos homens que se protegessem da cólera de Zeus realizando o sacrifício de um boi, mas que se mostrassem mais astutos do que esse deus, comendo as carnes e enviando-lhe as tripas e gorduras. Zeus descobriu a artimanha e os homens seriam punidos com a perda do fogo se Prometeu não lhes ensinasse uma nova artimanha: colocar perfumes e incenso nas partes dedicadas ao deus. Com esse mito, narra-se o modo como os humanos se apropriaram de algo divino (o fogo) e criaram um ritual (o sacrifício de um animal com perfumes e incenso) para conservar o que haviam roubado dos deuses. (GHEDIN, 2003)

3.2 COMO OPERA O PENSAMENTO MÍTICO? Antes de tudo, pela reunião de heterogêneos. O mito reúne, junta, relaciona e faz elementos diferentes e heterogêneos agirem uns sobre os outros. Por exemplo, corpos de crianças são estrelas, lágrimas de uma deusa são chuva, o dia é o carro do deus Apolo, a noite é o manto de uma deusa, o tempo é um deus (na mitologia grega, Cronos), etc. (MARCONDES FILHO, 1988) Em segundo lugar, o mito organiza a realidade, dando às coisas, aos fatos, às instituições um sentido analógico e metafórico, isto é, uma coisa vale por outra, substitui outra, representa outra. No mito de Édipo, por exemplo, os pés e o modo de andar têm um significado analógico, metafórico e simbólico muito preciso.

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Labdáco, avô de Édipo, quer dizer coxo; Laio, pai de Édipo, quer dizer pé torto; Édipo quer dizer pé inchado. (ARANHA, 1992) Essa referência aos pés e ao modo de andar é uma referência da relação dos humanos com o solo e, portanto, com a terra, e simboliza ou metaforiza uma questão muito grave: os humanos nasceram da terra ou da união de um homem e de uma mulher? Se da terra, deveriam ser imortais. No entanto, morrem. Para exprimir a angústia de serem mortais e que os humanos, portanto, nasceram de um homem e de uma mulher e não da terra, o mito simboliza a mortalidade através da dificuldade para se relacionar com a terra, isto é, para andar (coxo, torto, inchado). Para exprimir a dificuldade de aceitar uma origem humana mortal, o mito simboliza a fragilidade das leis humanas fazendo Laio mandar matar seu filho Édipo, Édipo assassinar seu pai Laio e casar-se com sua mãe, Jocasta. (ARANHA, 1993) Em terceiro lugar, o mito estabelece relações entre os seres naturais e humanos, seja fazendo humanos nascerem, por exemplo, de animais, seja fazendo os astros decidirem a sorte e o destino dos humanos (como na astrologia), seja fazendo cores, metais e pedras definirem a natureza de um humano (como a magia, por exemplo). Coisas e humanos se relacionam por participação, simpatia, antipatia, por formas secretas de ação à distância. O mundo é um tecido de laços e vínculos secretos que precisam ser decifrados e sobre os quais os homens podem adquirir algum poder por meio da imitação (vestir peles de animais, fabricar talismãs, ficar em certas posições, plantar fazendo certos gestos, pronunciar determinadas palavras). O mito decifra o secreto. O rito imita o poder. (OP.CIT.,1993) Analogias e metáforas formam símbolos, isto é, imagens carregadas e saturadas de sentidos múltiplos e simultâneos, servindo para explicar coisas diferentes ou para substituir uma coisa por outra. Assim, por exemplo, o fogo pode simbolizar um deus, uma paixão, como o amor e a cólera (porque são ardentes), o conhecimento (porque este é uma iluminação), a purificação de alguma coisa (como na alquimia), o poder sobre a Natureza (porque permite o desenvolvimento das técnicas), a diferença entre os animais e os homens (porque estes cozem os alimentos enquanto aqueles os comem crus), etc. (CONTRIM, 2002) A peculiaridade do símbolo mítico está no fato de ele encarnar aquilo que ele simboliza. Ou seja, o fogo não representa alguma coisa, mas é a própria coisa

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simbolizada: é deus, é amor, é guerra, é conhecimento, é pureza, é fabricação e purificação, é o humano. O fato de o símbolo mítico não representar, mas encarnar aquilo que é significado por ele, leva a dizer (como faz Lévi-Strauss) que o pensamento mítico é um pensamento sensível e concreto, um pensamento onde imagens são coisas e onde coisas são idéias, onde as palavras dão existência ou morte às coisas (como vimos ao estudar a palavra mágica e a palavra-tabu). (GHEDIN, 2003)

4. O CONHECIMENTO FILOSÓFICO Pode-se observar até agora que o homem utiliza o senso comum para guiá-lo no seu dia-a-dia e auxiliá-lo na resolução de problemas e dificuldades. Além disso, o senso comum muitas vezes serve de ponto de partida para as observações realizadas pelo cientista. O conhecimento filosófico, por sua vez, substituiu os mitos e as crenças religiosas na tentativa de conhecer e compreender o mundo e os seres que nele habitam e, ao lado do senso comum e da ciência, se apresenta como uma das formas possíveis de entendimento da realidade desconhecida e enigmática. (ARANHA, 1992) O ser humano, motivado pela necessidade de conhecer melhor o mundo em que habita e movido pelo espanto, pela perplexidade e pela admiração que esse mesmo mundo lhe causava, fez nascer o conhecimento filosófico. (ARANHA, 1993) Movido pelo espanto e pela admiração, o homem abandona o senso comum e faz despertar uma consciência crítica que se afasta da ignorância e busca na filosofia uma nova forma de conhecimento, que tem no saber pelo saber seu fundamento primordial. Dessa forma, a exemplo de Platão em sua obra Eutidemo, é possível afirmar que a filosofia é o uso do saber em benefício do próprio homem. (SOUZA, 1995) O saber filosófico designava, desde a Grécia Antiga, a totalidade do conhecimento racional desenvolvido pelo homem. Abrangia, portanto, os mais diversos tipos de conhecimento, que hoje entendemos como pertencentes à matemática, astronomia, física, biologia, lógica, ética etc. Enfim, todo o conjunto dos conhecimentos racionais integrava o universo do saber filosófico. À filosofia

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interessava conhecer toda a realidade sem dividi-la em objetos específicos de estudo. (COTRIM, 2002) Na história do pensamento ocidental, esse significado amplo e universalista do saber filosófico manteve-se, de modo geral, até a Idade Média. Poucas áreas separaram-se da filosofia, como o fez a teologia, por exemplo, que se desenvolveu em estudo específico a respeito de Deus. (OP.CIT.,2002) Durante a Idade Moderna, entretanto, o vasto campo filosófico entrou num processo de redução. A realidade a ser conhecida passou a ser dividida, recortada, despertando estudos especializados. Era a separação entre ciência e filosofia. (GHEDIN, 2003) Gradativamente,

foram

conquistando

autonomia

muitas

ciências

particulares, que se desprenderam do tronco comum da árvore do saber filosófico. Ao se constituírem por um processo de especialização, essas ciências passaram a direcionar suas investigações a certos campos delimitados da realidade, e o fazem ainda hoje de forma cada vez mais “localizada”. Exemplos dessas ciências são a matemática, a física, a química, a biologia, a antropologia, a psicologia, a sociologia etc. Os dias atuais caracterizam-se como a “era dos especialistas”. O problema da especialização do mundo científico é que ela conduz a uma pulverização do saber, à perda de uma visão mais ampla do conhecimento, a uma restrição mental sistemática. (OP.CIT., 2003) Nesse contexto, a filosofia passou a ter o papel, entre outros, de recuperar a unidade do saber, de questionar a validade dos métodos e critérios adotados pelas ciências. Isto é, passou a desenvolver o trabalho de reflexão sobre os conhecimentos alcançados por todas as ciências, além da procura de respostas à finalidade, ao sentido e ao valor da vida e do mundo. (CONTRIM, 2002) Pode-se dizer que pertence à filosofia o estudo geral dos seres, do nosso conhecimento e do valor das coisas. Em termos mais específicos, costuma-se situar dentro do campo filosófico aqueles estudos que se referem a temas como teoria do conhecimento, fundamentos do saber científico, lógica, política, ética, estética etc.

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CONCLUSÃO

O conhecimento certo e adequado é um direito e um poder de todos. Basta exercitá-los criticamente, utilizando-se de recursos metodológicos. Isto não implica numa desvalorização da prática escolarizada do conhecimento, mas sim na sua desmistificação. Em nossa sociedade, só se torna importante e significativo aquilo que é feito sob a égide de um diploma universitário, de graduado ou pósgraduado. Certamente que um escolarizado tem por obrigação moral proceder metodológica e criticamente no entendimento da realidade, desde que a sociedade fez dispêndios econômicos para que assim se desse. Todavia, nem sempre isto ocorre. Ou, na maior parte das vezes, isto não ocorre, desde que os compromissos sociais "interesseiros" impedem uma visão de totalidade metodologicamente desenvolvida. Porém, essa "obrigação moral", nem sempre cumprida, não implica que só o escolarizado produza conhecimentos significativos. Todos podem fazê-lo, pois que este é o caminho da libertação. No contexto da universidade, contudo, definida como centro de consciência crítica, é preciso agir de tal forma que estes tipos de conhecimento atinjam os seus objetivos epistemológicos. Não basta ficar na repetição de conhecimentos já existentes. É preciso colocarmo-nos a produzir o nosso entendimento da realidade, utilizando-nos de instrumentos metodológicos que nos são disponíveis. Não basta sabermos o que é a filosofia ou a ciência. Não basta sabermos repetir boas definições. Importa, sim, saber operar com os recursos lógicos e metodológicos, tendo em vista, conseguir o melhor e o mais adequado entendimento da realidade.

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REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Moderna. 1993. ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Temas de Filosofia. São Paulo: Moderna, 1992. COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 15. ed. reform. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2002. GHEDIN, Evandro. A Filosofia e o Filosofar. São Paulo: Uniletras, 2003. LAKATOS, Eva M.; MARCONI, Marina A. Metodologia Científica. São Paulo: Atlas. 1991. MARCONDES FILHO, Ciro. O que todos cidadãos precisam saber sobre ideologia. Global editora. 1988. SOUZA, Sonia Maria Ribeiro de. Um Outro Olhar: filosofia. São Paulo: FTD, 1995.

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