Sobre O Curso Noturno

  • July 2020
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Sobre a discussão do curso noturno e algumas coisas que ouvi hoje de passagem pelo pátio central da FL Não me sinto obrigado ou sequer bem vindo a expor minha opinião em uma reunião administrativa. Aliás, pensar diferente parece ser mal visto, pelo que ouvi hoje. Sinto necessário, ainda assim, apontar alguns argumentos um tanto mal pensados que estão sendo repetidos a torto e a direito por aí, bem como algumas concepções até ofensivas que se têm dos alunos. Se alguém quiser levar minha fala à congregação, pendurar na parede ou aonde for, fique à vontade. Não sou “coagido pelos professores de português” nem por professor algum a discordar radicalmente do modo brutal e precipitado como está sendo implantado o curso noturno na Faculdade de Letras. Sinto-me inclusive subestimado — e talvez devessem se sentir assim também os outros alunos — quando me consideram coagível. Se alguém — no caso, parece, integrantes do Centro Acadêmico, que elegi para me representar — pensa de mim ou quem quer que seja que possa ser coagido, só posso esperar que esse mesmo alguém muito em breve venha tentar me coagir de sua perspectiva oposta. É para se ter, no mínimo, medo. Talvez, porém, não seja assim tão grave. Quero crer que seja ou a ingenuidade, ou a empolgação, ou a paixão pelo projeto, que levem uma pessoa que conheço e sei que é sensata a se expressar assim. Quero crer que não fui coagido, inclusive, a votar neles, e que não sou mero coagível esperando que um messias me salve de minha incapacidade de decidir pelo meu próprio destino e pensar sozinho o que espero da nossa faculdade. Só porque a Prof. Cinda foi aplaudida ao comunicar a aprovação do curso noturno em alguma reunião — peço perdão por não ter entendido bem qual —, conclui-se que “todo mundo é a favor do curso noturno”. Essa conclusão mostra uma cegueira espantosa. Em primeiro lugar, ser a favor da existência de um curso noturno é diferente de ser a favor do modo como este está sendo concebido e implantado. Além disso, fossem todos a favor do curso noturno, ele já estaria implantado e funcionando. É um perigo — e não quero nem costumo dar uma de Regina Duarte e ter medo —, mas é assustador ver um representante meu concluindo que sua opinião é unânime sem sequer me consultar. É má-vontade de ouvir qualquer coisa de que discorde? Espero que não. Porém, ouvi hoje também — e tudo isso em menos de cinco minutos —, que “é bom (engraçado?) ouvir os professores falando na assembléia que são contra o curso noturno, ou que são a favor, mas têm objeções tais e tais”. Quem diz isso com ironia só o diz porque já considera absurdo que os professores — ou quem quer que seja — assim

pensem. Não soa como alguém que quer pensar junto um projeto, mas como alguém que não quer sequer dar ouvidos ao que está sendo dito pelo outro. Mas a Faculdade de Letras não pertence a um indivíduo ou um partido ou um setor! Não estamos falando de um bloco do eu-sozinho! Muitas vezes, quando refutamos sem argumentar, é justamente porque o que queremos negar nos é incômodo. Ninguém refuta latido de cachorro nem sirene de ambulância; uma fala sem sentido se ignora. Só o que faz sentido e se tem dificuldade de se negar, de pensar, de argumentar, é que se etiqueta, rotula, ridiculariza. Não digo que sequer alguém esteja absolutamente certo ou errado, mas é preciso questionar afinal por que se implanta um curso noturno, como fazê-lo. Não se trata simplesmente de uma competição para que um lado ganhe com o seu projeto melhor. Não se trata de uma licitação de loteamento da Faculdade de Letras pela empresa de direita ou de esquerda! O que motiva a discussão — e nisso, espero, os “dois lados” concordam — é a preocupação com o curso e os alunos. No entanto, parece, a questão toda virou mera questão de slogan, de poder gritar vitória, de sair fazendo ou não fazendo, porque não se admite mais que se pergunte como será esse curso, se temos condições de iniciá-lo no próximo ano, mas tornou-se simplesmente defender ir fazendo como der. “Do céu, só cai mesmo é chuva.” Entre fazer por fazer e não fazer, melhor não fazer. Fazer sem pensar, objetivando apenas o resultado imediato, a curto prazo, com pressa, isso já se faz há 500 anos nesse país e a gente já sabe no que deu.

Jun Shimada

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