literatura portuguesa breve indículo de autores
Sociedade Harmonia Eborense
2009
LUÍS VAZ DE CAMÕES Amor é fogo que arde sem se ver Amor é fogo que arde sem se ver; É ferida que dói e não se sente; É um contentamento descontente; É dor que desatina sem doer; É um não querer mais que bem querer; É solitário andar por entre a gente; É nunca contentar-se de contente; É cuidar que se ganha em se perder; É querer estar preso por vontade; É servir a quem vence, o vencedor; É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor Nos corações humanos amizade, Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
OS LUSÍADAS poema épico : exaltação dos feitos dos portugueses e história de Portugal motivo: expedição Vasco da Gama às Índias
Eça de Queiroz •
Intérprete do realismo e do naturalismo.
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Obra foca aspectos fundamentais da vida pública portuguesa, na segunda metade do século XIX.
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No seu conjunto, a obra queirosiana exibe formas e temas muito distintos, pode dizer-se até que em constante (ainda que lenta) mutação. Essa mutação traduz não apenas um sentido agudo de insatisfação estética (patente também no facto de o escritor ter submetido muitos dos seus textos a profundos trabalhos de reescrita), mas também uma grande capacidade para intuir e até antecipar o sentido da evolução literária que no seu tempo Eça testemunhou e viveu.
Conhecedor dos novos ventos que pairavam na Europa, informado das novas teorias filosóficas, como o Idealismo de Hegel, o socialismo de Proudhon, o positivismo de Comte e o evolucionismo de Darwin e Lamarck, Eça determinado, destemido e irrequieto, fazendo parte da “Geração de 70”, abraça a causa da renovação da mentalidade literária, contrastante com o sentimentalismo doentio romântico, e tem participação activa na luta cultural, denominada por “Questão Coimbrã”, na tentativa de implementar os valores realistas na arte literária portuguesa.
Fernando Pessoa Heterónimos Alberto Caeiro, o camponês sensacionista - naturalista Ricardo Reis, o médico neo-clássico – classicizante e estóico Álvaro de Campos, espectacular e futurista
o
engenheiro
extrovertido
–
Bernardo Soares, intimista e fragmentário (Livro do Desassossego)
temáticas: indefinição e insatisfação das coisas e dos seres; evanescência (dissipação); inovação no discurso poético POETA DO SIMBOLISMO E MODERNISMO
Não sei quantas almas tenho Não sei quantas almas tenho. Cada momento mudei. Continuamente me estranho. Nunca me vi nem acabei. De tanto ser, só tenho alma. Quem tem alma não tem calma. Quem vê é só o que vê, Quem sente não é quem é, Atento ao que sou e vejo, Torno-me eles e não eu. Cada meu sonho ou desejo É do que nasce e não meu. Sou minha própria paisagem; Como páginas, meu ser. O que soque não prevendo, O que passou a esquecer. Noto à margem do que li O que julguei que senti. Releio e digo : "Fui eu ?" Deus sabe, porque o escreveu. Fernando Pessoa
Miguel Torga • Rebeldia e desafio aos poderes instalados • Diálogo obsessivo com transcendência • “Artista possesso”, animado por um furor vindo do além • Convoca a ideia do sagrado – celebração da Natureza, motivo de êxtase, milagre • Agnóstico • Grupo de pensadores de melancolia e resistência
Sophia de Mello Breyner Andresen Fundo do Mar No fundo do mar há brancos pavores, Onde as plantas são animais E os animais são flores. Mundo silencioso que não atinge A agitação das ondas. Abrem-se rindo conchas redondas, Baloiça o cavalo-marinho. Um polvo avança No desalinho Dos seus mil braços, Uma flor dança, Sem ruído vibram os espaços. Sobre a areia o tempo poisa Leve como um lenço. Mas por mais bela que seja cada coisa Tem um monstro em si suspenso.
Agustina Bessa-Luís
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• É em 1954, com o romance A Sibila, que Agustina Bessa-Luís se impõe como uma das vozes mais importantes da ficção portuguesa contemporânea. • Escrita aforística (sentenciosa, doutrinária) • Estruturação espácio-temporal da obra com referências a Proust e Bergson
• Estilo único, paradoxal, enigmático • Prosa próxima da poesia, pelo excesso, pela fuga, pela ritualidade e harmonia terrível das palavras que se dizem e das coisas que acontecem
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Os textos desta autora são habitados por uma diferença antiga e inabsorvível entre as figuras do feminino e a figuras do masculino.
• As mulheres movem-se a partir do instinto, da proximidade com as coisas insignificantes num espaço-tempo que antecede o simbólico. São forças ancestrais de permanência e conservação. Os homens são seres de projecto que impulsionam as transformações do mundo e aceleram o tempo.
José Saramago
O Nobel português
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Autor autodidacta
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Primeiro grande romance:Levantado do Chão, 1980, história da vida de uma família camponesa do Alentejo desde o início do século até à revolução de Abril e ao advento da reforma agrária.
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Memorial do Convento (1982) constitui o caso de celebridade, nacional e internacional (traduzido em 20 línguas).
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Estilo: supressão de alguns sinais de pontuação, nomeadamente pontos finais e travessões para introduzir o diálogo entre as personagens, o que vai resultar num ritmo fluido, marcadamente oral e muito próprio, tanto da escrita como da narrativa.
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Estas características irão, aliás, contribuir para transformar os seus livros em objecto de interesse para encenadores, músicos e realizadores de cinema.
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Se o romance de José Saramago é histórico, pela dimensão histórica, e fantástico, pela dimensão fantástica, ele é principalmente dos homens e das mulheres na história e da sua capacidade de ver e agir sobre o real para além do plausível e do evidente
Mário Cesariny Pastelaria Afinal o que importa não é a literatura nem a crítica de arte nem a câmara escura Afinal o que importa não é bem o negócio nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio Afinal o que importa não é ser novo e galante - ele há tanta maneira de compor uma estante Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício e cair verticalmente no vício Não é verdade rapaz? E amanhã há bola antes de haver cinema madame blanche e parola Que afinal o que importa não é haver gente com fome porque assim como assim ainda há muita gente que come Que afinal o que importa é não ter medo de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente: Gerente! Este leite está azedo! Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo No riso admirável de quem sabe e gosta ter lavados e muitos dentes brancos à mostra
Nobilíssima Visão (1945-1946), in burlescas, teóricas e sentimentais (1972)
Poeta e Pintor Expoente do surrealismo Estilo irónico, sarcástico Subversão das normas
cesariny
Eugénio de Andrade
Passamos pelas coisas sem as ver, gastos, como animais envelhecidos: se alguém chama por nós não respondemos, se alguém nos pede amor não estremecemos, como frutos de sombra sem sabor, vamos caindo ao chão, apodrecidos.
: importância da palavra : musicalidade da poética : tema central da sua poesia: a figuração do Homem, não apenas do eu individual, integrado num colectivo, com o qual se harmoniza (terra, campo, natureza - lugar de encontro) ou luta (cidade - lugar de opressão, de conflito, de morte, contra os quais se levanta a escrita combativa).
: ligação à adolescência e à idade madura : presença dos temas do erotismo e da natureza, assumindo-se o autor como o «poeta do corpo». : poemas geralmente curtos, de grande densidade, e aparentemente simples, privilegiam a evocação da energia física, material, a plenitude da vida e dos sentidos.
António Ramos Rosa
Tradutor, crítico literário, ensaísta e poeta. São fundamentais na sua obra poética os temas da terra, da água, do fogo e do ar. Em 1988, foi-lhe atribuído o Prémio Fernando Pessoa. Recebeu o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores em 1989. A obra de António Ramos Rosa conta com mais de 50 títulos.
antónio lobo antunes “ Quando se começa um livro, é isso que se quer fazer, um livro, um livro total que tenha tudo, poesia, prosa, tudo: a vida.”
“ A leitura é uma coisa que se educa. Que se ensina e que se aprende. O problema é que qualquer grande escritor tem de ensinar os seus leitores a lê-lo. O grande juiz acaba sempre por ser o tempo.”
• António Lobo Antunes tornou-se um dos escritores portugueses mais lidos, vendidos e traduzidos em todo o mundo. Pouco a pouco, a sua escrita concentrou-se, adensou-se, ganhou espessura e eficácia narrativa. De um modo impiedoso e obstinado, esta obra traça um dos quadros mais exaustivos e sociologicamente pertinentes do Portugal do século XX.
• Em 2007 foi distinguido com o Prémio Camões, o mais importante prémio literário de língua portuguesa
novas escritas
herberto helder • É o poeta mítico da modernidade portuguesa contemporânea, não só pela intensidade particular da sua obra (quer considerada em conjunto, quer na simples leitura de um único dos seus versos) mas também pelo seu estilo de vida discreto e avesso a todas as manifestações da instituição literária. • O «sol, o fruto, a criança, a água, o deus, o leite, a mãe». A sua poesia representa uma doação às coisas mínimas, humildade e plenitude, excesso e inocência, alegria e terror, desejo e angústia, esplendor e obscuridade e, paralelamente, a celebração e glorificação do «mundo aberto», do «fogo essencial».
Maria do Rosário Pedreira Diz-me o teu nome - agora, que perdi quase tudo, um nome pode ser o princípio de alguma coisa. Escreve-o na minha mão Maria do Rosário Pedreira nasceu em Lisboa em 1959. Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas na Universidade Clássica de Lisboa. Foi professora de Português e Francês durante cinco anos, actividade que a influenciou a escrever para jovens. Ingressou posteriormente na carreira editorial, desempenhando actualmente as funções de editora. Publicou poesia, ficção e literatura juvenil. Um livro: O CANTO DO VENTO NOS CIPRESTES, Lisboa, Gótica, 2001
com os teus dedos - como as poeiras se escrevem, irrequietas, nos caminhos e os lobos mancham o lençol da neve com os sinais da sua fome. Sopra-mo no ouvido, como a levares as palavras de um livro para dentro de outro - assim conquista o vento o tímpano das grutas e entra o bafo do verão na casa fria. E, antes de partires, pousa-o nos meus lábios devagar: é um poema açucarado que se derrete na boca e arde como a primeira menta da infância. Ninguém esquece um corpo que teve nos braços um segundo - um nome sim.
José Luís Peixoto Nasceu em Setembro de 1974. Licenciou-se em Línguas e Literaturas Modernas, na variante de Inglês e Alemão. Em 2000, estreou-se com a pequena ficção Morreste-me (Prémio Jovens Criadores 97), publicada em edição de autor. Nesse mesmo ano, publicou o romance Nenhum Olhar (Prémio José Saramago 2001). Publicou ainda A Criança em Ruínas (poesia, 2001), Uma Casa na Escuridão (romance, 2002), A Casa, a Escuridão (poesia, 2002), Antídoto (prosa, 2003) e Cemitério de Pianos (prosa, 2006). Tem textos publicados em inúmeras revistas portuguesas e estrangeiras. Assina colunas permanentes em várias publicações portuguesas e estrangeiras. Os seus romances estão publicados em 12 idiomas.
http://bravonline.abril.com.br/blog/joseluispeixoto/
Pai. A tarde dissolve-se sobre a terra, sobre a nossa casa. O céu desfia um sopro quieto nos rostos. Acende-se a lua. Translúcida, adormece um sono cálido nos olhares. Anoitece devagar. Dizia nunca esquecerei, e lembrome. Anoitecia devagar e, a esta hora, nesta altura do ano, desenrolavas a mangueira com todos os preceitos e, seguindo regras certas, regavas as árvores e as flores do quintal; e tudo isso me ensinavas, tudo isso me explicavas. Anda cá ver, rapaz. E mostravas-me. Pai. Deixaste-te ficar em tudo. Sobrepostos na mágoa indiferente deste mundo que finge continuar, os teus movimentos, o eclipse dos teus gestos. E tudo isto é agora pouco para te conter. Agora, és o rio e as margens e a nascente; és o dia, e a tarde dentro do dia, e o sol dentro da tarde; és o mundo todo por seres a sua pele. Pai. Nunca envelheceste, e eu queria ver-te velho, velhinho aqui no nosso quintal, a regar as árvores, a regar as flores. Sinto tanta falta das tuas palavras. Orienta-te, rapaz. Sim. Eu oriento-me, pai. E fico. Estou. O entardecer, em vagas de luz, espraia-se na terra que te acolheu e conserva. Chora chove brilho alvura sobre mim. E oiço o eco da tua voz, da tua voz que nunca mais poderei ouvir. A tua voz calada para sempre. E, como se adormecesses, vejo-te fechar as pálpebras sobre os olhos que nunca mais abrirás. Os teus olhos fechados para sempre. E, de uma vez, deixas de respirar. Para sempre. Para nunca mais. Pai. Tudo o que te sobreviveu me agride. Pai. Nunca esquecerei. José Luís Peixoto In Morreste-me, Lisboa, Temas e Debates, 2001
Gonçalo “... um dos mais prolíficos e elogiados escritores (poeta, dramaturgo, ficcionista) da novíssima geração da literatura portuguesa”
M. Tavares
“As mãos nos bolsos de Klaus. Como era estranho aquele seu gesto de esconder as mãos nos bolsos. As mãos e os olhos eram o fundamento da guerra: sem mãos é impossível odiar, odeias pela ponta dos dedos, como se estes fossem o canal habitual e único de uma certa substância química má. As mãos nos bolsos são um processo de educar o ódio, processo lento quando comparado com aquele bem mais forte que é a amputação dos braços. Mas só com as mãos nos bolsos os homens já acalmam. Com as mãos nos bolsos um homem percebe que não é Deus. Não se chega às coisas. Se tocares no mundo com a cabeça obterás desse toque sentimentos secundários; afastados de uma intensidade mínima a que a existência das mãos te habituou. As mãos tornam-te intenso. O obsceno – isso mesmo -, o obsceno que é o homem que na guerra, mesmo que numa pausa, põe provocadoramente as mãos nos bolsos. Assumir que não se é Deus em momento de guerra acto corajoso e, por estranho que pareça, o único divino. Só os cobardes fingem que são Deus.” in Um Homem: Klaus Klump
bocage moura
antónio aleixo vasco graça camilo castelo branco david
mourão-ferreira
al berto
luiz pacheco
natália correia vitorino nemésio urbano tavares rodrigues inês pedrosa florbela espanca jorge de sena josé cardoso pires lídia jorge luísa costa gomes
vergílio ferreira mafalda ivo
cruz
nuno júdice
raúl brandão
rui
belo sebastião alba soror mariana alcoforado teixeira de pascoaes teolinda gersão vieira de castro