O PENSAMENTO E A LINGUAGEM SEGUNDO VYGOTSKY
Vygotsky trabalha com o desenvolvimento da espécie humana e com o desenvolvimento do indivíduo humano, onde busca compreender a origem e a trajetória de dois fenômenos: O pensamento e a Linguagem. Os dois tem origens diferentes e desenvolvem-se segundo trajetórias diferentes e independentes. Buscando compreender a história da espécie humana, Vygotsky encontrou, nos estudos feitos com primatas superiores, principalmente com chipamzés formas de funcionamento intelectual e formas de utilização de linguagem que poderiam ser tomadas como precursoras do pensamento e linguagem no ser humano. Considerou esses processos como sendo a "fase pré-verbal" do desenvolvimento do pensamento e a "fase pré-intelectual" do desenvolvimento da linguagem. A relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas fundamentalmente, uma relação mediada. A criança no primeiro ano de vida desenvolve os movimentos sistemáticos, a percepção, o cérebro, as mãos, e também o uso de instrumentos mediadores, ou seja, seu organismo inteiro . À medida em que a criança torna-se mais experiente , adquire um maior número de modelos . Esses modelos representam um esquema cumulativo refinado de todas as ações similares . E para atingir esse objetivo , a criança utiliza instrumentos auxiliares na solução de tarefas . Os signos e as palavras constituem para as crianças , primeiro e acima de tudo , um meio de contato social com outras pessoas . A relação entre o uso de instrumentos e a fala afeta várias funções psicológicas , em particular a percepção ( para construir o mundo em nossas cabeças , devemos detectar a energia física do ambiente e codificá-la como sinais neuronais; ao longo de desenvolvimento , entretanto , principalmente através da internalização da linguagem e dos conceitos e significados culturalmente desenvolvidos ; a percepção deixa de ser uma relação direta entre o indivíduo e o meio , passando a ser mediada por conteúdos culturais ) , as operações sensório-motoras ( aquisição da idéia da permanência do objeto , a noção de que os objetos continuam a existir quando não são percebidos ) e a atenção ( o bebê nasce com mecanismos de atenção involuntária : estímulos muito intensos , mudanças bruscas no ambiente , objetos em movimento ; ao longo do desenvolvimento , o indivíduo passa a ser capaz de dirigir voluntariamente , sua atenção para elementos do ambiente que ele tenha definido como relevantes . Quando a criança transfere sua atenção para outro lugar cria dessa forma um novo foco na estrutura dinâmica de percepção . Os 1
movimentos das crianças são repletos de atos motores hesitantes e difusos que se interrompem e recomeçam sucessivamente . A criança vai passar por um processo de aquisição de linguagem que já existe no seu ambiente . Nas fases iniciais da aquisição da linguagem a criança utiliza , então , da linguagem externa disponível no seu meio , com a função de comunicar . A linguagem é a ferramenta mais importante , agindo decisivamente na estrutura do pensamento , e é fundamentalmente básica para a construção do conhecimento . A linguagem é considerada como um instrumento , pois ela atuaria para modificar o desenvolvimento e a estrutura das funções psicológicas . O sujeito do conhecimento não é apenas ativo , mas interativo , porque constitui conhecimento e se constitui a partir de relações intra e interpessoais . A "fala" e o uso de signos são incorporados a qualquer ação . Com o decorrer do tempo , a fala vai desenvolvendo a parte cognitiva e essencial na organização das funções psicológicas . A criança que tem a fala , dirige sua atenção de maneira mais dinâmica . A linguagem então é o sistema simbólico básico de todos os grupos humanos , sendo a principal mediadora entre o sujeito e o objeto do conhecimento . Em cada situação de interação , o sujeito está em um momento de sua trajetória particular , trazendo consigo determinadas possibilidades de interpretação do material que obtém do mundo externo . O curso do desenvolvimento da criança caracteriza-se por uma alteração radical na própria estrutura do comportamento : a cada novo estágio , a criança não só muda suas respostas , como também as realiza de maneiras novas , gerando novos instrumentos de comportamento e substituindo sua função psicológica por outra . A complexidade crescente do comportamento das crianças reflete-se na mudança dos meios que elas usam para realizar novas tarefas e na correspondente reconstrução de seus processos psicológicos . O conceito que se tem é que desenvolvimento implica a rejeição do ponto de vista comumente aceito de que o desenvolvimento cognitivo é o resultado de uma acumulação gradual de mudanças isoladas. Acredita-se que o desenvolvimento da criança é um processo dialético complexo caracterizado pela periodicidade , desigualdade , no desenvolvimento de diferentes funções , metamorfose ou transformação qualitativa de uma forma ou outra . Para a mente ingênua , evolução e revolução parecem incompatíveis e o desenvolvimento histórico s[o está ocorrendo enquanto segue uma linha reta . Onde ocorrem distúrbios , a trama histórica é rompida , a mente ingênua vê somente catástrofe , interrupção e descontinuidade . Parece que a história pára de repente , até que retome , uma vez mais , a via direta e linear de desenvolvimento. O pensamento científico , ao contrário , vê revolução e 2
evolução como duas formas de desenvolvimento mutuamente relacionadas , sendo uma pressuposto da outra e vice-versa . Normalmente , quando nos referimos ao desenvolvimento de uma criança , o que buscamos compreender é "até onde a criança já chegou" . Para ser considerada como possuidora de certa capacidade , a criança tem que demonstrar que pode cumprir a tarefa sem nenhum tipo de ajuda . Vygotsky denomina o nível das funções mentais da criança que se estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimento completados , ou seja capacidade de realizar tarefas de forma independente , de nível de desenvolvimento real . A capacidade de desempenhar tarefas com a ajuda de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes , define como nível de desenvolvimento potencial . Ou seja , é a partir da postulação da existência desses dois níveis de desenvolvimento - real e potencial - que Vigotsky define a zona de desenvolvimento proximal , como a distância entre o nível de desenvolvimento real , que se costuma determinar através da solução , independente , de problemas ; e o nível de desenvolvimento potencial , determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto . O nível de desenvolvimento real de uma criança define funções que ainda não amadureceram , mas que estão em processo de maturação . Caracteriza o desenvolvimento mental retrospectivamente , enquanto a zona de desenvolvimento proximal caracteriza o desenvolvimento mental prospectivamente . O estado de desenvolvimento mental de uma criança só pode ser determinado se forem revelados os seus dois níveis : o nível de desenvolvimento real e a zona de desenvolvimento proximal ( a zona de desenvolvimento proximal hoje , será o nível de desenvolvimento real amanhã ) . Existem relações dinâmicas altamente complexas entre os processos de desenvolvimento e de aprendizado , as quais não podem ser englobadas por uma formulação hipotética . Todas as concepções correntes da relação entre aprendizado e desenvolvimento em crianças podem ser reduzidas a três grandes posições teóricas: 1ª Concepção: Centra-se no pressuposto de que os processos de desenvolvimento da criança são independentes do aprendizado . O aprendizado é considerado um processo puramente externo que não está envolvido ativamente no desenvolvimento (ele simplesmente se utilizaria dos avanços do desenvolvimento ao invés de fornecer um impulso para modificar seu curso). O desenvolvimento ou a maturação são vistos como uma pré-condição do aprendizado , mas nunca como resultado dele. 2ª Concepção: Aprendizado é desenvolvimento : O desenvolvimento é visto como o domínio dos reflexos condicionados , não importando se o que se considera é o ler , o escrever ou a aritmética , isto é , o processo de aprendizado está completa e inseparavelmente misturado com o processo de desenvolvimento . Diferenças 3
são verificadas nessas duas concepções , quanto às relações temporais entre os processos de aprendizado e desenvolvimento: 1) Os ciclos de desenvolvimento precedem os ciclos de aprendizado , a maturação precede o aprendizado e a instrução deve seguir o crescimento mental. 2) Os processos ocorrem simultaneamente : aprendizado e desenvolvimento coincidem em todos os pontos , da mesma maneira que duas figuras geométricas idênticas coincidem quando sobrepostas . 3ª Concepção: Tenta superar os extremos das outras duas , simplesmente combinando-as ( ou seja , um processo influencia o outro ) , portanto , eles tem algo em comum . Através dessa última concepção pode-se concluir que : - Os dois processos anteriores tem algo em comum ; - Os dois processos anteriores que constituem o desenvolvimento são interagentes e dependentes ; - O amplo papel que a teoria atribui ao aprendizado no desenvolvimento da criança ( o que leva um velho problema pedagógico : o da disciplina formal e o problema da transferência - o aprendizado numa área em particular influencia muito pouco o desenvolvimento como um todo . Vygotsky trabalha também com um outro domínio da atividade infantil que tem claras relações com o desenvolvimento: o brinquedo. Quando Vigotsky discute o papel do brinquedo , refere-se especificamente à brincadeira de "fazde-conta" , como brincar de casinha , brincar de escolinha , brincar com um cabo de vassoura como se fosse um cavalo . Faz referência a outros tipos de brinquedo , mas a brincadeira "faz-de-conta" é privilegiada em sua discussão sobre o papel do brinquedo no desenvolvimento . A questão do brinquedo e seu papel no desenvolvimento é marcante , considera-se que o brinquedo não é uma atividade que dá prazer a uma criança de modo puro e simples , porque outras atividades podem proporcionar a criança muito mais prazer , como o hábito de chupar chupeta ; com relação aos , existem os que a própria atividade , não é agradável para a criança , como os de ganhar e perder que com muita freqüência é acompanhado pelo desprazer da perda . A criança em idade pré-escolar envolve-se num mundo ilusório para resolver suas questões, onde os seus desejos são ou não realizados conforme seu dispor, isto é que também pode-se chamar de brinquedo. Numa situação imaginária como a da brincadeira de "faz-de-conta", a criança é levada a agir num mundo imaginário. Mas além de ser uma situação imaginária, o brinquedo é também uma atividade regida por regras. Mesmo no universo do "faz-de-conta" há regras que devem ser seguidas. Ao brincar de ônibus, por exemplo, exerce o papel de motorista. Para isso tem que tomar como modelo os motoristas reais que conhece e extrair deles um significado mais geral e abstrato para a categoria "motorista". Para brincar conforme as regras, tem que se esforçar para exibir um comportamento semelhante ao motorista, o que impulsiona para além de seu comportamento como criança. 4
Tanto pela criação da situação imaginária, como pela definição de regras específicas, o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal na criança. No brinquedo a criança se comporta de forma mais avançada do que nas atividades da vida real e também aprende a separar objeto significado. Para Vygotsky, o brinquedo preenche necessidades da criança. Estas necessidades estão ligadas a tudo aquilo que é motivo de ação. Através do brinquedo, o que na vida real passa despercebido para a criança, torna-se agora uma regra de comportamento, que estão presente em todas as situações imaginadas, mesmo que de forma oculta. Com o brinquedo, a criança consegue grandes aquisições, relacionando seus desejos ao seu papel nas brincadeiras e suas regras, aquisições que no futuro formarão seu nível básico de ação real e moral. Sendo assim, a promoção de atividades que favoreçam o envolvimento em brincadeiras, principalmente aquelas que promovem a criação de situações imaginárias, têm nítida função pedagógica. A escola e, particularmente, a préescola poderiam se utilizar desse tipo de situação para atuar no processo de desenvolvimento da criança.
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