SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
O C or p orativi s mo e a p ol ítica p ú b lica e m P ortugal. Portugal: do autoritarismo à democraci a
Philippe Schmitter, nascido em 1936 e tendo-se doutorado em Berkeley, é professor na área da História Política desde 1967 na Universidade de Chicago, no European University Institute e ainda em Stanford. Viajou e foi professor nesta área em várias Universidades e publicou vários livros e artigos sobre política comparada. Na opinião de Marina Costa Lobo, é um dos “mais conceituados teóricos da democratização” i, para além de que esteve em Portugal em 1971, precisamente para estudar o nosso caso específico. Schmitter
debruça-se
sobre
o
corporativismo
em
Portugal,
tentando perceber porque motivo se viveu debaixo de um estado com estas características durante tanto tempo; o seu artigo torna-se importante na medida em que Schmitter usa os dados que recolheu “no campo” enquanto ainda se vivia sob o Estado Novo ( “A investigação de
campo em que o ensaio se baseia foi realizada durante o Verão d e 1971”, pg. 105). Historiograficamente, portanto, parece-me que este texto é extremamente
importante,
uma
vez
que
o
autor
escreve
com
conhecimento de causa, apoiando-se não só em bibliografia sobre o tema mas também sobre aquilo que viu durante a sua estadia em Portugal. Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
Formalmente, o artigo está dividido em nove pontos (mais epílogo), ao longo dos quais o autor vai analisar não só o que é o corporativismo como também a prática do associativismo em Portugal antes do Estado Novo, de que maneira a representação corporativista se implantou e evoluiu no nosso País, qual o seu real peso e papel no processo político (não nos esqueçamos que, por exemplo a nível das eleições, é comum afirmar-se que não eram livres, ou melhor, que não eram reais uma vez que era sempre o mesmo partido que ganhava; o que o autor vai fazer é analisar a que ponto o corporativismo influenciou ou não esta asserção) e finalmente vai relacionar representação corporativista com as políticas públicas. Uma das primeiras questões levantadas – e a meu ver, uma das mais importantes – prende-se com a duração temporal do sistema corporativo. Porque motivo durou este sistema tanto tempo? Tal como nos diz o “Dicionário de História de Portugal”, Portugal foi um dos países (juntamente com Espanha) onde o sistema se manteve durante mais tempo, aguentando-se até à década de 70 do séc. XX. À medida que se lê este artigo, é possível perceber que as razões apresentadas estão de acordo não só com o Dicionário de História de Portugal mas também com o próprio Dicionário de História do Estado Novo. Cada uma destas obras de referência nos mostra que o corporativismo português seguiu um esquema de implantação gradual, tendo início na década de 30, com a ascensão de Salazar ao poder, e atingindo o seu cúmulo na década de 50, altura em que se instalam definitivamente as primeiras corporações de facto em Portugal. São estas corporações consideradas como a “abóbada nominal dos sistemas
Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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corporativos”. Parece-me ter sido este gradualismo uma das razões que permitiu ao sistema corporativo durar tanto tempo. Um dos cuidados do autor vai ser o da especificação do que é o corporativismo em Portugal, pois desde que nos inícios do séc. XIX esta ideologia
se
desenvolve
neste
país,
várias
vão
ser
as
suas
interpretações. Apenas como exemplo, podemos referir as cinco definições de base que o Dicionário de História de Portugal nos apresenta para os valores corporativistas: histórico, ideológico, regime políticoeconómico (no caso do tempo de Salazar) e neocorporativismo moderno “Corporativismo:
s. m. (de
corporativo): 1. sistema
político-económico baseado no agrupamento das classes produtoras em corporações, sob a fiscalização do Estado. 2. É a doutrina e o regime que preconizam a organização da economia moderna segundo formas análogas às corporações da Idade Média.”ii Esta definição introduz um dado muito importante: qualquer corporação que exista está obrigatoriamente sob o domínio e controlo do Estado. Daí que esta palavra e este conceito estejam de tal modo ligados à ideia de fascismo, o que só por si já justifica a aversão popular que o conceito “corporativismo” acarreta consigo. É também esta posição que encontramos nas duas outras obras já citadas. Segundo o autor do artigo, não há apenas uma mas sim quatro escolas de pensamento corporativista: uma social-cristã, de cariz marcadamente tradicionalista, uma escola “modernizante, burocrática,
nacionalista e secular”, uma escola de tradição radical, parlamentar, burguesa e solidária e finalmente uma escola marcada por um acorrente de pensamento de esquerda. Não devemos estranhar este facto de haver tantas maneiras de ver o corporativismo, até porque Portugal, a nível Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
político, era na altura um ambiente “caótico” que, a meu ver, ainda não se recompusera totalmente da multiplicidade de partidos políticos existentes
(e
mesmo
dentro
dos
vários
partidos,
ainda
não
se
recompusera dos vários dissidentesiii). Logo, se havia tantas maneiras de ver e pensar a política nacional, é coerente que também haja diferentes maneiras de encarar o corporativismo. É curioso vermos que segundo o Dicionário de História do Estado Novo, é precisamente esta escola social-cristã que nos é apresentada como tipicamente portuguesa; esta obra defende o corporativismo português como “catedrático”, imposto segundo uma fórmula, de cima para baixo e, muito importante, apoiado pela doutrina social da Igreja Católica, como se fosse um “fascismo baptizado”. Nitidamente o autor do texto parece ter sido influenciado por estas duas obras de referência sobre o tema, pois no terceiro ponto do seu artigo (“A prática do corporativismo em Portugal”) várias são as referências a um corporativismo português autoritário, controlador do associativismo livre e espontâneo, “recheado” de “arquitectos políticos”; refere também o facto de ser imposto de cima para baixo, isto é, segundo uma fórmula. No entanto, torna-se fundamental não nos esquecermos do que isto significa: que o corporativismo português, ao contrário dos seus congéneres europeus, não teve um movimento verdadeiramente fascistas nem
uma
cultura
verdadeiramente
corporativista
como
bases;
o
corporativismo português nasceu de uma série de decretos e leis (que Schmitter refere no seu trabalho). Um aspecto fundamental sobre o corporativismo português é o seu anacronismo, questão esta apontada mas não explicada por Schmitter, que não especifica as razões que levam a que as corporações apenas Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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surjam no final da década de 50, sendo necessário recorrer a bibliografia diferente para o perceber. Estas razões, dizem-nos o Dicionário de História de Portugal o Dicionário de História do Estado Novo, prendemse a condicionalismos internos e externos, como a depressão mundial da década de 30, a II Guerra Mundial, descrédito dos regimes corporativos em geral... a revolução corporativa de 1933 (Constituição de 1933, Câmara Corporativa, Conselho de Estado, Conselho corporativo, ETN, Sub-Secretariado de Estado das Corporações e Previdência Social, decretos que estabelecem em Setembro de 1933 grémios para patrões, sindicatos para trabalhadores, ordens para associações profissionais, casas do povo para agricultores e trabalhadores rurais e casas de pescadores
para
pescadores)
estava
paralisada,
e
isto
também
contribuiu para que o corporativismo apenas tenha adquirido as suas estruturas de cúpula tanto tempo depois de ter sido instaurado em Portugal. Daí que se perceba o que o autor refere a página 111: “Embora
Salazar tivesse decididamente uma visão arquitectónica de uma ordem corporativista «integral», procurou (...) avançar com toda a prudência, passo a passo, na edificação desse sistema de representação: peça por peça, sector por sector, nível por nível.”. Foi precisamente esta precisão mecânica com que se implantou o corporativismo em Portugal que levou a que, na teoria, ele existisse, enquanto que na prática, e tal como o autor nos diz, as primeiras corporações só surgiram na segunda metade da década de 50iv... o que revela de facto o grande intervalo de tempo entre a aplicação teórica e a aplicação prática deste regime! Aliás, este mesmo anacronismo leva muitas vezes à tentação (errada, segundo o autor, e com cuja qualificação eu concordo) de se ignorar ou de se
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
estudar a fundo o corporativismo português, pois parece não haver uma sequência lógico-formal, por assim dizer, nesta prática. Por isso mesmo reitero a minha opinião acerca da importância historiográfica deste artigo, uma vez que representa o primeiro estudo sistemático (chegando mesmo a incluir uma proposta de um modelo quase experimental para analisar a sociedade portuguesa em comparação com a sociedades irlandesa e grega) . Uma das razões para a implantação do corporativismo em Portugal, tal como nos mostra Schmitter, parece ter sido a defendida por Salazar: “Devido à falta de equilíbrio do espírito humano, a ordem não é
espontânea; alguém tem de comandar para benefício de todos”. A partir do topo, tentou-se transmitir uma imagem dos benefícios da aplicação do corporativismo: no seu segundo momento (ou seja, a partir da segunda metade da década de 50), Salazar esforça-se por tornar o Estado Corporativo numa estrutura central de previdência social ao estilo europeu, e a tónica do corporativismo passou a estar focalizada no bemestar social. Durante os aos 60 o sistema corporativo converte-se num aparelho de previdência social, e foram feitos alguns esforços (embora fracos) para que as organizações corporativas de base (instituídas em 1933) levassem a cabo esses programas. Esta afirmação de Salazar não nos deve de modo algum chocar, até porque vai de encontro à visão “contemporânea” e de autojustificação de implantação do Estado Novo. Uma vez que o País se encontrava neste estado lastimoso de anarquia e desordem política e social, um regime autoritário seria visto como salvador da Pátria, como regenerador. corporativismo
Estes
são
também
português:
os
objectivos
anti-socialismo,
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da
economia
auto-dirigida 6
do e
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intervencionista. Creio que ao longo do trabalho de Schmitter se vêem bastante bem exemplos de cada uma destas características. A verdadeira questão, parece-me, será a de analisar quais as reais consequências que desta implantação corporativista derivaram. Terão elas sido benéficas ou, por outro lado, terão atrasado ainda mais o País? O autor analisa extensivamente estes aspectos, faz uma análise comparativa
da
sociedade
corporativizada
portuguesa
e
outras
sociedades semelhantes, como sejam a espanhola, a grega e a irlandesa (embora, por motivos que mais tarde vai explicar no seu artigo, se refira sobretudo à sociedade grega), a vários níveis – alfabetização, economia, transportes,
grau
transdisciplinariedade
de que
sindicalização, caracteriza
entre esta
outros.
análise
à
É
uma
sociedade
portuguesa, e é isso que faz dela, a meu ver, uma análise tão completa e um trabalho tão importante. Outro ponto fundamental inerente ao corporativismo e que o autor vai igualmente explorar é a questão da importância política do corporativismo, qual o impacte real que o País sentiu através das políticas públicas que foram adoptadas. Em relação à implantação da prática corporativista em Portugal, o autor aponta-nos a grande importância da promulgação não só do ETN mas também de toda uma série de decretos, publicados curiosamente no mesmo dia (23 de Setembro de 1933; decretos lei n.º 23 049, 23 050, 23 051, entre outros), que regulamentam desde logo a aplicação de uma prática corporativista em Portugal (até porque, tal como o autor nos diz, para Salazar a corporação era um dos princípios fundamentais para o regime que desejava implementar). É através destes decretos e deste ETN que se vão estabelecer em Portugal instituições de controlo da Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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população, como por exemplo sindicatos, grémios, Casas do Povo
v
,
Casas de Pescadores. O autor vai falar bastante de cada uma destas instituições, analisando-as, construindo com os dados obtidos tabelas, de modo a organizar e transmitir mais facilmente a informação. Apresenta ainda conclusões bastante pertinentes. Refiro-me por exemplo à questão da obrigatoriedade (ou falta dela) das quotizações dos sindicatos: “(...)
esse direito era exercido discricionariamente, de modo a recompensar os sindicatos submissos e a punir os recalcitrantes.” (pg. 120). Outro ponto importante, ainda em relação à implementação da prática corporativista em Portugal, tem a ver com a questão do estatuo social da população abrangida pelo corporativismo. Assim, se se analisar a prática corporativista pelo ponto de vista do patronato, a conclusão a que chegamos é que este estrato da população não sentiu os efeitos do corporativismo como o sentiram as classes trabalhadoras (agrupadas em grémios obrigatóriosvi). Por quê? Porque não há memória ou registo da extinção de
nenhuma das 285 associações patronais que existiam, ao
passo que associações de trabalhadores, uma vez que logicamente representavam um perigo para a “ordem pública”, foram na sua maioria extintas. Não deixa no entanto de ser curioso ressaltar o facto de que, não obstante o facto de o Estado Novo ter considerado mais prudente trabalhar com estas instituições patronais, e não obstante o facto de estas associações não terem sido obrigadas a dissolver-se, elas apenas eram o que de mais “livre” existia sob a égide do Estado Novo, não detendo no entanto a “(...) autonomia que o sistema pluralista de
representação de interesses pressupunha” (pg. 125). Na verdade, estavam obrigadas a submeter os seus interesses aos interesses do Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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Estado; além disso, se é verdade que podiam criar grémios voluntários (embora não tenham sido muito comuns), também é verdade que os seus panfletos só podiam ser publicados após aprovação do Conselho Corporativo; o autor mostra-nos portanto mais uma vez o carácter relativo da “autonomia” de tais instituições, bem como o controlo exercido por parte do Estado. Por aqui se vê, creio, que os próprios dirigentes do Estado Novo não se sentiam completamente seguros, uma vez que eliminavam qualquer ameaça que pudesse existir à ordem que eles advogavam. Para além disso, através do corporativismo, algumas das secções mais importantes da economia política foram “apropriados” pelo Estado Novo (mais uma vez, o carácter autoritário e totalizante do corporativismo português). Ao
longo
do
tempo,
a
representação
corporativista
foi-se
alterando, e como eu também já referi, só na segunda metade da década de 50 é que aparecem as corporações. Até lá, o que se passava? Mostra-nos o autor que todas as instituições corporativas que tinham vindo a ser criadas desde a ascensão de Salazar foram largamente utilizadas durante
período da II Guerra Mundial. Nesta
altura, “foram fixados preços, atribuídas quotas, impostas multas,
reduzidos os salários, em grande medida sob os
auspícios do
«corporativismo» (...)” (pg. 129). É igualmente nesta altura que as eleições perdem o seu sentidovii, sendo inclusivamente suspensas, e as instituições corporativas são convertidas em meramente agentes do Estado, perdendo qualquer autonomia de acção que pudessem ter tido no passado. O que quer tudo isto dizer? Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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Que, se havia objectivos propugnados pelos portugueses, estes foram completamente ridicularizados (no dizer do autor). Ou seja, nem se criou uma “harmonia orgânica natural” nem se descentralizou “poder
de decisão para corporações autónomas com funções específicas”. Cada vez o Estado se apropriava de mais e mais funções que em teria deveriam pertencer às instituições corporativas/associativas Poderá isto querer dizer que, se não tivesses existido uma II Guerra Mundial, a prática e os efeitos do Corporativismo português poderiam ter sido diferentes?... Na minha opinião, o que o autor dá a entender com esta sua conclusão é que a resposta à questão enunciada seria “sim”, e nesse caso estou inclinada a concordar com ele. No entanto, creio que ainda existem poucos (ou mesmo nenhuns) dados que nos permitam afirmar categoricamente esta opinião. Mas o que é certo é que o que é dito e escrito por Philippe Schmitter parece-me ser que, decorrente da II Guerra Mundial, por razões quiçá políticas ou económicas, o Estado Português viu-se obrigado a deixar de lado os seus objectivos iniciais da política corporativista, tornando-se ao invés um Estado altamente autoritário e controlador. Na minha opinião, está aqui a razão do tardio aparecimento das corporações num estado que já era corporativo pelo menos há 2 décadas. Em relação ao papel do corporativismo no processo político, o primeiro dado que o autor nos dá é que este papel seria muito pouco. O que de mais importante há a realçar são três pontos que regem a sua acção no âmbito da política: o sistema de “corte”, de “pessoas de situação” que rodeiam Salazar a partir da década de 60 (pessoas estas que podiam inclusivamente ser nomeadas para cargos ministeriais). É importante notar-se o facto de que estas pessoas não eram quaisquer
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pessoas, uma vez que se tratavam muitas das vezes (se não todas...) de amigos de Salazar, e eram os representantes de cada instituição diferente (ou seja, representavam a Igreja, as Forças Armadas, as finanças, et caetera. Outro ponto do papel do corporativismo prende-se aos níveis de decisão política. De facto, o autor mostra-nos que o corporativismo está ligado por quatro níveis: •
Participação dos grémios, sindicatos e casas locais na eleição dos vereadores;
•
Comissões e conselhos consultivos, que “inundavam” a administração pública portuguesa, e nos quais tinham sempre lugar representantes das instituições corporativas;
•
Modo de eleição do Presidente da República, que é alterado pada sufrágio directo;
•
Representação do sistema oficial de grupos de interesses na Câmara Corporativa (facto que o autor considera como um caso único e específico de Portugal).
A Câmara Corporativa é a característica mais marcante da influência política do corporativismo português, chegando inclusivamente a ter mais influência que a própria Assembleia; no entanto, é necessário não nos esquecermos que os seus pareceres são meramente consultivos. Para além disso, é necessário vermos o que o autor nos diz: ela representa os interesses colectivos e individuais alvo de recompensa por parte de Salazar (ou mesmo de “compra”, na medida em que pertencerse à Câmara Corporativa poderia ser uma política de Salazar para garantir a fidelidade dos seus membros ao regime no futuro viii). Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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No último ponto antes da conclusão,
autor vai falar sobre o
impacte das políticas públicas (facto que eu referi um pouco mais atrás neste pequeno relatório sobre o texto). Um dos primeiros factos para o qual o autor chama a nossa atenção tem a ver com o seguinte: em qualquer política que fosse seguida pelo Regime, a representação dos interesse rurais e fundiários era muito baixa, chegando no máximo aos 10%. A maior parte dos representantes/deputados na Câmara Corporativa eram funcionários públicos tal como o autor nos mostra no quadro n.º 6, presente na pg. 141. Ainda sobre esta análise que o autor faz sobre a Câmara Corporativa, é importante realçar que este organismo não tinha como objectivo a consulta para articulação dos interesses coloniais. Ao longo deste ponto, o que o autor vai defender é uma análise contrafactual do caso português, sendo muito categórico quando afirma que a análise deve ser feita tendo como ponto de partida o que não aconteceu em Portugal, em vez de se analisar com base no que aconteceu. É neste ponto que o autor vai introduzir as comparações com outras sociedades, principalmente com a Grécia, pois é a que mais pontos em comum tem com Portugal. Ao introduzir o seu “modelo quase experimental”, o autor vai produzir três gráficos e algumas tabelas, para melhor explicar os seus pontos de vista. No entanto, para tais gráficos “funcionarem”, será necessário que as condições nas sociedades alvo de comparação fosse exactamente iguais. Tal situação é, logicamente, impensável, pelo que creio que não estou muito de acordo com este modelo que o autor apresenta.
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Ao longo deste ponto, o autor vai analisar vários factores económicos da sociedade portuguesa, e vai comparar a sua evolução em relação aos das outras sociedades. Chega rapidamente a uma importante conclusão: é certo que Portugal apresenta uma evolução mais acentuada num período de tempo igual. No entanto, isto prende-se não com uma real melhoria económica do País mas sim com o facto de os valores iniciais serem mais baixos em Portugal do que nas outras sociedades. No entanto, apesar disto, não podemos negar a importância que o governo de Salazar teve, uma vez que a economia melhorou de facto. Qual o papel que o corporativismo terá tido na economia? Não podemos deixar de referir a opinião de Pedro Teotónio Pereira: “o estado vai
promover
a
formulação
da
economia
corporativa,
fixando
metodicamente as grandes linhas a que se deve subordinar a acção dos novos agrupamentos de cooperação económica e social desde os mais elementares aos mais perfeitos”. Segundo Salazar, que olhava para o estado com um misto de bonomia e desconfiança, “o Estado deve manter-se superior ao mundo da produção, igualmente longe da absorção monopolista e da intervenção pela concorrência”, de modo a ser imparcial na arbitragem de todos os interesses. Constituição de organismos corporativos superiores, uniões, federações e por último as corporações são da exclusiva responsabilidade e iniciativa do Governo. No entanto, se virmos o que Pires Cardoso defende, apercebemo-nos de que na Revista do Gabinete de Estudos Corporativos do Centro Universitário de Lisboa (de que Pires Cardoso é director) é dito que o Estado não se deve esquecer que é um mero árbitro, e que a melhor forma de limitar o intervencionismo daquele é desenvolver fortemente as
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instituições corporativas, de modo a dar àqueles limites que se pretendem impor um carácter fixo e natural. Mas quais são as principais conclusões do autor em relação à política pública de Portugal? Em primeiro lugar, podemos referir a questão do eleitorado, que apesar de ser mais reduzido do que por exemplo na Irlanda, é um eleitorado estável. No entanto, parece-me importante referir que o autor não faz referência neste ponto do seu artigo para o facto de a eleições em Portugal (tal como já referi atrás) terem perdido o seu sentido, justificando-se assim o facto de o eleitorado em Portugal ser, tal como refere Schmitter, reduzido. Em relação aos sindicatos, o autor é um pouco mais crítico, uma vez que considera serem menos combativos que os gregos, para além do facto de serem mais controlados, inclusivamente nos sectores patronais: é a cobertura “integral”, característica do corporativismo português. Para além disso, Schmitter refere uma característica muito própria do caso português: uma centralização sistemática dos recursos governamentais que não tende a diminuir, creio que em parte por causa dos aspectos já anteriormente referidos. Em relação à questão do investimento público e/ou privado, o autor conclui que Portugal apresenta uma pequena capacidade de extracção de recursos, e que o seu maior investimento é nível de defesa (ou seja, despesas militares; na minha opinião, isto pode ter a ver com o facto de os alicerces do Estado Novo estarem fundados na anterior ditadura militar). No entanto, é extremamente importante lembrarmo-nos que tudo isto se passava a um nível meramente interno, uma vez que nada destas políticas, nem as posteriores crises governamentais e remodelações ministeriais, atraíram Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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grande
atenção
aparentava
por
parte
permanecer
internacionais
(embora
das
potências
à
margem
não
tenha
dos sido
estrangeiras. grandes
sempre
Portugal
acontecimentos assim;
não
nos
esqueçamos que Portugal foi receptor de investimento americano proveniente do Plano Marshall, aderiu à OTAN... ou seja, apenas no âmbito político interno é que Portugal se encontrava à margem dos assuntos internacionais). O autor vai ainda referir o papel importante das contribuições pagas pelos trabalhadores para a segurança social (cerca de um quinto), a questão da habitação pública (onde os poderes políticos e mostraram fracos, apesar das promessas iniciais) e os vários factores que influenciam o desempenho da economia e da sociedade: contextos culturais, sociais e económicos. O que se pode concluir de tudo isto? Creio que uma avaliação maioritariamente negativa dos impactos que o regime autoritário e corporativo tiveram em Portugal, resultados estes que se agravam ainda mais se o único termo de comparação for a Grécia. No entanto, será que apenas existiram aspectos negativos? Por certo que não, e o autor faz uma chamada de atenção para a importância de, ao analisarmos este regime, não nos esquecermos de referir estes aspectos positivos (como sejam por exemplo os referidos na pg. 165: “(...) os seus cidadãos foram
poupados da ansiedade psíquica de fazer opções políticas e dos custos pessoais que pode representar a agitação social”ix ). Outro aspecto positivo terá sido, parece-me, o franco desenvolvimento da economia que se verificou em Portugal nesta altura, facto mostrado não só neste artigo de Schmitter mas nos dados apresentados por Fernando Rosas nos
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seus artigos publicados no VII volume da História de Portugal da direcção de Mattoso. O último passo do autor vai ser a conclusão do seu artigo, e o mais importante a notar é facto Schmitter afirmar que ainda não se sabe qual vai ser o destino do corporativismo em Portugal. No entanto, não devemos menosprezar o que realmente significou esta queda do corporativismo. É certo que ruiu de um dia para o outro. Mas será que desapareceu completamente? É certo que desde a subida de Caetano ao poder, o corporativismo se tornara mais brando; no entanto, aquando da revolução de 1974 (originalmente apenas com o objectivo de derrubar Marcello Caetano), todas as instituições corporativas foram associadas ao fascismo e assim era necessário repudiá-las e destruí-las; no entanto, foram destruídas antes de se criarem outras melhores, e a situação de Portugal não melhorou, antes pelo contrário. “O sistema corporativo foi abolido no calor e na paixão ideológica de um contexto revolucionário, e não como resultado de uma avaliação cuidadosa dos seus limites e das suas realizações. Em 1974-5, Portugal repudiou a ideologia corporativista do regime de
Salazar,
as suas
instituições
corporativas políticas e
económicas e muita da cultura política corporativista-organicista que era historicamente a cultura do país.x” (pg. 424). Apesar de nesta altura o
neocorporativismo estar a ser redescoberto pela Europa, e aceite,
Portugal não estava ainda pronto para o implantar. Isto resulta numa disfunção: por um lado rejeita-se o corporativismo, mas por outro, subrepticiamente, continua-se a praticá-lo, continuava a suspeitar-se de qualquer relação entre capital e trabalho. “ A rejeição do corporativismo em Portugal, provocada pela revolução e pelo desacreditado regime de Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
Salazar, foi tão forte que foi anatemizado por longo tempo (ainda hoje, nalguns meios) qualquer tipo de corporativismo.xi” (pg. 425). Também no Dicionário de História do Estado Novo, dirigido por Rosas e Brandão de Brito, encontramos uma avaliação negativa do impacto do corporativismo em Portugal, avaliação negativa esta que não me parece existir no artigo de Schmitter. Em que se pauta então esta avaliação negativa? No final da 1ª década de corporativismo em Portugal (que coincide com o aproximar do final da II Guerra Mundial) chega-se a uma conclusão simples: corporativismo a menos e intervencionismo a mais. Porque a iniciativa privada é vista como não detendo espírito de risco e empresarial, ela é posta em segundo plano e não é tratada ao mesmo nível que o intervencionismo estatal. A nível oficial, é mal vista, e insinua-se que a organização corporativa (no sentido de autodirecção) pode falhar por causa da fuga às responsabilidades por parte dos seus dirigentes. Já foi anteriormente referido que em Portugal o sistema corporativo foi imposto, e esta situação origina que a identificação de princípios que apregoava junto dos grupos e classes a que se destinava não foi possível de se atingirxii. Há cada vez mais críticas ao corporativismo, e nem no campo
económico,
segundo
este
dicionário,
os
resultados
foram
favoráveis. Esta obra apresenta ainda uma tripla apreciação negativa: •
Primeira apreciação negativa: no campo do pragmatismo, que leva a um papel muito exagerado do Estado na vida económica.
Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
•
Segunda apreciação negativa: lentidão com que se implanta.
•
Terceira: influência nos comportamentos e mentalidades da maior parte dos agentes económico-sociais.
No centro do balanço e da crise encontra-se a questão do intervencionismo, “(...) verdadeira pedra de toque da economia do corporativismo português.” (pg. 221 do Dicionário de História do Estado Novo) Foi imposto porque
num primeiro momento não podia ser
espontâneo numa sociedade inorgânica e acorporativa. É fruto da vontade de uma elite, para tentar preencher o vazio ideológico procedente da Ditadura Militar. A paragem de anos a fio é reconhecida por Salazar como tendo sido um erro, mas foi necessária por causa da adaptação a que o sistema se viu forçado pelas guerras que existiram nesta época: a II guerra Mundial e a guerra civil espanhola. Todos desejam o desmantelamento das vias burocráticas que foram sendo implantadas. Sobre a organização corporativa portuguesa parece ter caído uma “maldição”: o conformismo que se injecta na Nação para
esconder
as
suas
próprias
incapacidades.
A
organização
corporativa adapta-se a uma sociedade à qual não restaram se não o conformismo, o pragmatismo e o senso comum, e isto afasta-se dos princípios e práticas defendidas. Da economia do corporativismo não sobra se não o retrato cruel que dela faz Caetano, retrato que constitui uma confissão de fracasso. Afastou-se da economia auto-dirigida e como alienou as vantagens da iniciativa privada, a recuperação torna-se difícil.
Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
Depois de tudo o que foi dito, creio poder afirmar que sem dúvida este artigo de Schmitter é sobremaneira importante para compreender alguns aspectos do corporativismo em Portugal. No entanto, para compreender
bem
esta
questão
(implantação,
desenvolvimento,
consequências práticas para a vida quotidiana, queda...), não nos podemos ficar por uma leitura ou análise deste mesmo artigo, sendo necessário recorrer a mais bibliografia que vem complementar o que Schmitter diz (sendo no entanto ressaltar que nenhuma da bibliografia adicional que eu consultei contradiz as teses do autor). Não o considero portanto um artigo actualizado, e isso percebe-se bem: apesar da sua grande importância, ao ter sido escrito antes da revolução de 1974 e da queda
do
corporativismo,
seria
impossível
enumerar
ou
as
consequências desta queda... daí a necessidade de se lerem artigos de referência, mais actualizados, como os que foram referidos ao longo deste breve artigo.
Bi b li o grafia
Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
•
“Corporativismo”, in BARRETO, A., e MÓNICA, M.ª F. , “Dicionário de História de Portugal, Vol. VII, Suplemento A/E”, Figueirinhas, , 1999;
•
“Corporativismo”,
in ROSAS, F., e BRANDÃO DE BRITO, J. M.,
“Dicionário de História do Estado Novo – volume I, A-L”, Círculo de Leitores, 1996; •
LOBO, M. C., “Análise Social”, Número 154-155, Volume XXXV, 2000;
•
ROSAS, F., “História de Portugal, vol. VII”, dir. José Mattoso, Círculo de Leitores, 1ª edição, 1994
•
SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175;
i In «Análise Social», número 154-155, Volume XXXV, 2000. ii In Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, Círculo de Leitores, 1985. Para além disso, é o facto de o corporativismo ter semelhanças com o sistema seguido na idade média que vai permitir ao autor fazer um cronologia das associações existentes em Portugal , começando precisamente no séc. XIV, no reinado de D. João Mestre de Avis. iii Lembremos por exemplo o Partido Legitimista, o partido Progressista, o Partido Regenerador, o Partido Nacionalista... com este cenário de fundo, parece-me bastante óbvio o porquê da minha afirmação. Aliás, é este clima que a meu ver vai justificar a ascensão de golpes militares autoritários, tal como foi o caso do Sidonismo em 1917 ou, mais tarde, o golpe de 26 de Maio que vai instaurar uma Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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SCHMITTER, Philippe C., Portugal: Do autoritarismo à democracia, cap. III, Instituto das Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Lisboa, 1999, pp. 103 a 175
Ditadura Militar. Correndo o risco de parecer demasiado opiniosa, arriscar-me-ia a dizer que houve uma justificação plausível para estes golpes militares autoritários, pois parecem-me ter sido a única maneira de arrancar o País do anarquismo político e confusão mental em que se encontrava. iv Não esquecer no entanto que o facto deste novo ênfase se situar nesta data está igualmente ligado à recuperação económica que se fazia sentir por então. v Que deveriam existir em cada freguesia; assim se vê que praticamente toda a população se encontrava vigiada... vi A organização corporativa sobrevive apesar da reacção espontânea contra a burocracia e a rotina porque se adaptou aos novos tempos e à co-habitação com a burocracia e admitiu que alguns princípios do corporativismo fossem sendo transformados num crescente intervencionismo; é aqui que se introduz a questão dos grémios obrigatórios, considerados por Caetano como o que mais se aproxima da concepção de corporativismo do Estado. vii Torna-se no entanto referir que, apesar de as eleições terem perdido o seu sentido, sabe-se que estas nunca deixaram de se realizar durante o período da ditadura; aliás, embora saia do âmbito deste relatório, não é demais referir que Schmitter tem um artigo precisamente sobre a problemática das eleições em Portugal durante este período. No entanto, apesar de nunca terem sido suspensas, parece certo a conclusão de que perderam o seu sentido. Na obra dirigida por Mattoso, “História de Portugal”, apercebemo-nos dos grandes índices de abstenção eleitoral, o que prova o sentimento da população da inutilidade de votar. viii No entanto, como o mesmo autor diz noutro artigo, quando o regime caiu, não tinha praticamente defensores nenhuns; isto tem a ver com as outras características do regime instituído, que se pautavam por uma grande repressão, vigilância, censura, etc. ix Se bem que, em termos democráticos, isto possa ser discutível... x “Corporativismo”, in BARRETO, A., e MÓNICA, M.ª F., “Dicionário de História de Portugal, Vol. VII, Suplemento A/E”, Figueirinhas, 1999, pg. 424. xi “Corporativismo”, in BARRETO, A., e MÓNICA, M.ª F., “Dicionário de História de Portugal, Vol. VII, Suplemento A/E”, Figueirinhas, 1999, pg. 425. xii “Corporativismo”, in ROSAS, F., e BRANDÃO DE BRITO, J. M., “Dicionário de História do Estado Novo – volume I, A-L”, Círculo de Leitores, 1996
Cadeira: H.P.C. Docente: Dr. Paulo Guimarães Discente: Ana Rita Faleiro, n.º 18889 Universidade de Évora, Janeiro de 2006
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