ÉTICA E EDUCAÇÃO: a formação cidadã no Ensino Médio1 Merynilza Santos de Oliveira*
[email protected] Maria Neusa Monteiro*
1 INTRODUÇÃO A educação brasileira prevê em seus Parâmetros Curriculares Nacionais em Temas Transversais o ensino de ética e cidadania aos alunos, valores humanos e sociais que norteiem os relacionamentos, pois percebe o educando como indivíduo participante de sociedade com direitos e deveres a exercer. Dessa maneira, precisa estar cônscio do seu contexto, questioná-lo
e
reconstruí-lo
na
medida
do
fazer
possível
de
um
emancipado, uma vez que as aparências devem dar lugar à essência das coisas para a busca dos valores morais. A ética e a cidadania precisam ser conhecidas para realmente serem exercidas sem servidão do que se vê e não se questiona. Sendo assim, a busca leva ao conhecimento, e o que se aplica, torna-se hábito e emancipa aos demais. Logo, as contribuições desse trabalho visam não apenas o âmbito educacional, mas também a sociedade de maneira geral. Sabemos que as idéias de ética e cidadania são conhecidas por quase todos dentro da sociedade, porém poucos possuem uma compreensão satisfatória para que verdadeiramente exerçam-nas. Mas, enfim, qual a O presente trabalho está integrado ao projeto de extensão “A Metodologia do Ensino de Filosofia no Ensino Médio em Belém: Educação Continuada como extensão”, coordenado pela professora Maria Neusa Monteiro. 1
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Aluna do curso de Filosofia da Universidade do Estado do Pará. Participante do Grupo de Estudos e Pesquisas em Ensino de Filosofia, Ética e Educação. Bolsista PIBEX/UFPA End: Rua Kátia Reis n° 07 - Centro, Ananindeua, Pará. Fone: 30314451/9944-4081. Orientadora. Pós- graduada em Filosofia. Professora de Filosofia da Educação, Metodologia do Ensino de Filosofia. Coordenadora e pesquisadora do GEPEFEE da UFPA. E-mail:
[email protected]. *
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co-relação entre as duas para um conhecimento útil de um indivíduo da pólis? 2 O ENSINO DA ÉTICA A conduta ética foi pensada desde a Grécia Antiga. O conhecimento acerca da sociedade e do bem estar de seus indivíduos, continuamente fizeram parte das pautas de discussão dos pensadores de diferentes épocas. Primeiramente, Epicuro, conhecido pela busca da Felicidade por meio da razão incutida em atos de equilíbrio e bem-viver e era na filosofia que encontrava o ponto seguro para seguir na busca desse bem. Posteriormente, Sócrates, grande mestre, faz com que seus discípulos aprendam a partir de seus próprios caminhos, por meio do “conhece-te a ti mesmo”. É o “parteiro da idéias”, que na doutrignorância e na maiêutica encontra o viés para um conhecimento próprio e da natureza. Platão, por sua vez, desenvolve a idéia do Bem Supremo e acredita que é na busca da razão que a pólis pode ser governada justamente. Em seguida, Aristóteles escreve em Ética A Nicômaco sobre como as virtudes conduzem o indivíduo da cidade eticamente na busca de um Bem que é a Felicidade experimentada por todos os cidadãos. Discute sobre temas
comuns
da
vida
cotidiana
como:
Coragem,
Temperança,
Generosidade, Amizade, Justiça, Felicidade, entre outras. Expõe
sua
teoria
sobre
a
sabedoria
prática,
discute
acerca
das
moderações das atitudes voltadas para uma moral humana. No livro primeiro, afirma que o Bem é “aquilo a que todas coisas tendem”, é desejado, é um Fim buscado em si mesmo, e, se um fim é desejado os meios conseqüentemente o são, logo a conduta virtuosa é o meio para se alcançar o Bem. Porquanto, as virtudes são o meio para uma vida ética. Sendo que, as virtudes não são dádivas divinas, pois se fosse de tal forma, não existiria mérito para as práticas virtuosas humanas. Deste modo, o homem precisa esforçar-se para atualizar o hábito de praticá-las. O exercício das virtudes implicava em buscar a moderação de acordo com 2
o contexto da situação, pois tudo que excede ou falta não tem o equilíbrio necessário para levar-se uma vida feliz, “a virtude é uma espécie de mediania, já que, como vimos, ela põe a sua mira no meio-termo”, e mais, não é só buscar a moderação, [...] mas senti-los na ocasião apropriada, com referência aos objetos apropriados, para com as pessoas apropriadas, pelo motivo e da maneira conveniente, nisso consiste o meiotermo e a excelência característicos da virtude (Aristóteles, 1973, p. 243).
Um homem delibera para obter o objeto desejado, investiga, prepondera um meio para o fim, o fim é incluído na investigação como algo desejado, assim, no processo deliberativo é necessário o conhecimento de sabedoria prática, pois é determinante dentro da busca ou não por uma vida virtuosa. É dentro das escolhas que se decide entre os três tipos principais de vida: a vida dos gozos, a vida política e a contemplativa. Por isso o procedimento deliberativo está ligado às virtudes, pois como essas são os meios para uma vida virtuosa, inscreve o homem no rol das causas para chegar-se a um fim, junto à natureza, a necessidade e o acaso. Sendo pois, o fim aquilo que desejamos, e o meio aquilo acerca do qual deliberamos e que escolhemos, as ações relativas ao meio devem concordar com a escolha e ser voluntárias. Ora, o exercício da virtude diz respeito aos meios. Por conseguinte, a virtude está também em nosso poder, do mesmo modo que o vício, pois quando depende de nós o agir, também depende o não agir, e vice-versa (Aristóteles, 1973, p. 265). Portanto, o procedimento deliberado e voluntário da virtude torna um homem virtuoso. Logo, a vida virtuosa está diretamente ligada à ética social. Ser cidadão é proceder de acordo com os valores estabelecidos pela sociedade em que estamos inseridos, pensar no outro como um outro eu, nisto se estabelece o direito e o dever, respeitar a todos que rodeiam
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como gostaríamos de ser respeitados e fazer pelo outro o que gostaria que fizessem por nós, esse é o princípio geral da Ética. Segundo Immanuel Kant, em sua obra Crítica da Razão Pura, a Moral Humana é conhecida por princípios a priori e é pensada pela Razão, pois apesar do homem ser finito a sua disposição para pensar é infinita, logo a moral parte das idéias, está acima dos cálculos, está na autodeterminação da vontade regida por uma Lei Moral. A Razão, ponto central em seus textos, é o caminho a ser seguido para o cumprimento dessa lei. As ações devem obedecer à Moral pura, ou seja, não empírica, porque visam ser regidas por uma lei, não apenas se deixando levar pela experiência. Sendo assim, o sujeito moral não deve ter interesses diretos nas conseqüências de seus atos, mas na realização do cumprimento da lei do dever. A Razão moral tem que ultrapassar os motivos do mundo sensível, por isso é que ela tem um caráter de desinteresse, uma vez que a conduta ética de conservar a própria vida e a do outrem é um dever. Contudo, para introduzir a moralidade nas práticas da população racional é preciso uma educação voltada para tal objetivo, que esclareça os cidadãos, que além de exercer sua moralidade, reivindiquem a execução destas leis ao próximo, principalmente às autoridades políticas. Então, a Felicidade, em equivalência com Aristóteles, é o Bem Supremo em si o qual as pessoas almejam, e a Lei Moral é o caminho a ser trilhado e a felicidade ganha o caráter de motivação, visto que é o merecimento de ser feliz que impulsiona os atos para uma vida digna da felicidade, ou seja, uma vida regida pelos valores morais: A felicidade consiste na satisfação de todas as nossas inclinações (tanto extensivo, no que se refere à multiplicidade, quanto intensivo, no que tange o seu grau, e também protensivo, com respeito à sua duração). Denomino pragmática (regra de prudência) a lei prática motivação da felicidade; por outro lado, intuito moral (lei da moralidade) aquela lei, se é que existe, que nada mais possui como motivação do que o merecimento de ser feliz. (Kant, 1983, p. 393).
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Assim, pensamos numa educação ética voltada para o aluno do Ensino Médio, para um questionamento e conscientização de sua vida social como cidadão. No entanto, o ensino atualmente sofre críticas severas acerca da sua utilidade, pois muitos alunos não percebem, além do vestibular, a proficuidade do conhecimento apreendido em sala de aula. E para suprir essa necessidade, buscamos o conhecimento da sabedoria prática do emancipado a quem Rancière (2002) se refere em seu livro O Mestre Ignorante. A aprendizagem sempre foi concebida pela pedagogia através da explicação, que auxilia os gênio que podem repetir o que o mestre lhes ensinou, por esse motivo Jacotot, professor emancipador protagonista da análise de Rancière, passou a conceber o método explicativo como princípio do embrutecimento. O embrutecedor não é o professor que não consegue repassar o conhecimento aos alunos, que os deixa cheios de dúvidas, mas aquele que faz um ótimo trabalho, que explica com eficiência, que busca dar cada vez melhores explicações para uma boa “compreensão”. O aluno desde a infância concebe o método da incapacidade da compreensão por si mesmo, fica atrelado à necessidade da explicação, torna-se inteligente pelas explicações do professor, compreende que jamais compreenderá algo sozinho. O embrutecimento se instaura no espírito, o pensamento sente a necessidade do professor-explicador, a incapacidade do aprender por si só está instaurada. “Eis a virtude dos explicadores: o ser que inferiorizaram, eles o amarram pelos mais sólidos dos laços ao país do embrutecimento: a consciência de sua superioridade (p. 42)”. Após a apreensão do conhecimento por meio das explicações do mestre, o aluno, por sua vez, se formará também em um ótimo explicador para o repasse desse conhecimento a outros. Entretanto, a vontade de ensinar do professor e a vontade de aprender do aluno juntaram-se para que Jacotot concebesse que os alunos eram capazes de aprender sem um mestre explicador, mas com um mestre emancipador, então a que estava relegado o papel do mestre? O método 5
não era mais o do professor e sim o do aluno, porque se acreditava na capacidade intelectual de cada
ser humano, então a questão se
intercalava entre o mestre embrutecedor e o mestre emancipador, que respectivamente supunha um mestre sábio e um mestre ignorante. A idéia de um mestre ignorante soava-lhe um pouco rústica, mas se propôs a repetir a experiência por qual passara, se propôs a ministrar cursos aos quais era visivelmente ignorante, pintura e piano, entre outros mais. Entendeu então, que poderia ensinar o que ignorava, desde que estimulasse o aluno a sua própria inteligência. Assim, a resposta da questão acima feita estava exposta: Mestre é aquele que encerra uma inteligência em um círculo arbitrário do qual não poderá sair se não se tornar útil a si mesma. Para emancipar um ignorante, é preciso e suficiente que sejamos, nós mesmos, emancipados; isso é, conscientes do verdadeiro poder do espírito humano (Rancière, 2002, p.34).
O mestre ignorante estimula o aluno a buscar o que ignora, pois acredita que ele é capaz de aprender o que deseja. Por outro lado, o então denominado Método Velho se centra na incapacidade do aluno, como já foi explicado, visto que este precisa sempre da explicação do mestre. Muitos aprendem algo sem necessitar de que alguém o explique alguma coisa e como não exista pessoa que não tenha experimentado esse procedimento, denominamos então o Método Emancipador de Método Universal. A potência intelectual já foi exposta, um ignorante tem o que ensinar ao outro, sem fazê-lo dependente de explicações como no outro método. O rumo que cada aluno emancipado irá tomar daí por diante será o que ele escolher, talvez não aprenda nada, mas saberá que pode aprender o que queira desde que tenha vontade para fazê-lo, pois todo mundo tem inteligência igual. Porquanto, o Ensino Universal consiste em “aprender qualquer coisa e a isso relacionar todo o resto, segundo o princípio de que todos os homens têm igual inteligência2”. 2
Destaque feito pelo autor.
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Enquanto,
o
Velho
atrofia,
inibe,
embrutece,
trabalha
apenas
a
memorização, a técnica mnemônica, fazendo o aluno apenas repetir o que lhe é explicado, o Universal liberta, trabalha a inteligência, a criatividade, a imaginação e a autonomia. O que alicerça o Velho método é a desigualdade, está fundado na crença de inferiores e superiores, em rituais de aprendizado e em gênios escolhidos, enquanto o Universal se centra na igualdade da busca do conhecimento, acreditando no potencial de todos os seres humanos. Todos podem tudo que pode o ser humano, a atenção no que está se aprendendo e a vontade determinam a aquisição do conhecimento, pois está
em
todos
os
lugares
a
nossa
volta
e
em
todo
o
nosso
desenvolvimento aprendemos coisas sem a presença do explicador. As palavras implicam uma nas outras, facilitam na correlação, o contexto de cada um e o saber já obtido servem como comparação, para aprender a ler, ou qualquer outra coisa. O papel do mestre emancipador é revelar a inteligência a ela mesma. O novo método também utiliza a opinião, observa-se o fato e opina-se sobre ele, e caso seja da vontade do aprendiz, o aprofundamento para conhecer melhor o objeto pode ser buscado. Enquanto o Velho veria se o aluno progrediu na sua busca, o Universal se preocuparia em ver se o aluno buscou, qual foi o esforço e a atenção que dispôs na aprendizagem, isso avaliaria o trabalho que teve para chegar nos resultados obtidos e é nisso que se instaura a igualdade. Poder de igualdade que é, ao mesmo tempo, de dualidade e de comunidade. Não há inteligência onde há uma agregação, uma ligadura de um espírito a outro espírito. Há inteligência ali onde cada um age, narra o que fez fornece os meios de verificação da realidade de sua ação a coisa comum, situada entre as duas inteligências é a caução dessa igualdade, e isso em duplo sentido (Rancière, 2002, p.55).
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Contudo, o emancipado precisa ter objetividade no que deseja aprender, e para emancipar a outrem precisa conhecer a si mesmo e conceber-se igual a todos no caminho da busca do conhecimento. Todas as inteligências são diferentes, mas não no sentido de desigualdade entre diferentes pessoas, não há inteligências superiores ou inferiores, como os detentores do conhecimento do Método Velho fizeram acreditar, apesar das variadas tentativas de convencimento. Ora, quando se trata de inteligências iguais de um sistema que diz que a desigualdade é imposta pelo nível de conhecimento de cada um, abre-se um novo pensamento de igualdade pelo conhecimento que pode ser adquirido por todos. Todavia, uma instituição, uma comunidade não pode emancipar, somente um homem emancipará outro homem. A divisão social
em classes
sempre
foi amparada
pela
idéia da
desigualdade das inteligências, os artesãos na Grécia Antiga faziam o trabalho manual porque só tinha inteligência suficiente para isto, enquanto que a elite tinha inteligência para mandar seus filhos estudarem para permanecerem no governo da sociedade. A
desigualdade
é
uma
paixão
instalada
no
espírito
humano,
a
subserviência do outro em prol da minha razão obstinada de ser superior faz com que os ditos inferiores sejam expurgados ao mundo da sobrevivência de um espírito medíocre pela imposição da vontade pervertida do dominador. Platão defendia a idéia de que havia uma predestinação para quem deveria ter conhecimento e o poder em conseqüência dessa sabedoria, como se a aristocracia fosse predestinada a governar e o povo ignorante fosse predestinado a ser dirigido. Esta concepção prevalece, e em nossos tempos os papéis só trocam de título, pois o proletário é tal porque não consegue aprender além de seu próprio trabalho manual e a burguesia governa pelo seu poder intelectual e continua na instrução de seus filhos para a manutenção desse legado. As leis começam a serem concebidas dentro desse paradigma da desrazão em benefício de poucos, a sociedade nascida dessa desigualdade de 8
“inteligências superiores” é incompreensível por trata-se de um conjunto desarmônico de verdades falsas. Ao marginalizado da intelectualidade, o método progressista o convencia através do positivismo de que não eram para serem educados, nem seriam educadores, já que exerciam um trabalho manual porque não tinham conhecimento suficiente para algo mais elevado, conformando-os a sua vida “sem conhecimento”. Essa idéia é contraposta pelo motivo de que até uma pessoa que leva uma vida vegetativa, desenvolve noções de física e cálculo. A concepção emancipadora foi tão disseminada dentro de uma visão positivista às pessoas subjugadas, que elas acreditaram no seu malfadado destino. Todavia, sobrevém ao professor Jacotot aquela experiência para mostrar que todos são capazes de aprender da mesma forma. O que o pobre nunca teve foi oportunidade de experimentar o aprendizado concebido como aprendizado, pois a vida toda as pessoas aprendem por si só sobre as coisas que as cercam, independendo de sua posição na escala social. A elite através de suas verdades monopolizava o conhecimento, no que o Método Universal se opôs discernindo o conhecimento não só como elitista, mas como elemento do dia-a-dia, o homem só precisa se conscientizar de que pensa e tem capacidade de aprender fazendo correlações com os conhecimentos já adquiridos. Por esse motivo, o Método Universal não é da elite e sim do pobre marginalizado, porque o “o homem não nasceu para tal ou tal posição particular, mas para ser feliz em si mesmo, independente da sorte (p. 105)”. A ignorância pode ser instruída e se estende até ao que não sabe ler. Por exemplo, a leitura do Telêmaco poderia parecer impossível, mas ao se começar com Calipso, Calipso não..., relacionando isto a outros fatos, começar-se-ia
um
aprendizado,
semelhantemente
como
o
pobre
marginalizado fez a vida toda com que aprendeu. O mestre se faria presente quando precisasse, mas o caminho, o ponto de partida seria de escolha livre do aprendiz. Com vontade e exercício, o aluno pode estabelecer sua própria marcha, transpondo a barreira já dantes imposta 9
a ele como verdade, pode dizer agora que é capaz por seu próprio esforço. A crença, chamada de verdade cai perante a sociedade e críticas a essa nova concepção vão ser freqüentes, a elite não quer que o pobre se conceba enquanto ser pensante, que questione a desigualdade imposta pelos detentores da tal inteligência e conhecimento dominador. Imaginemos, então, uma sociedade igualitária em que se repudiaria de que uns sabem e outros não sabem, todos seriam proprietários da inteligência, todos saberiam da igualdade do espírito e que aplicação à perfeição teria o conhecer a si próprio e ao outro, conhecendo assim a sociedade que os cerca. Esses indivíduos não precisariam de governo centrado em poderes, pois se conheceriam a si mesmos e a razão da igualdade humana seria respeitada e regiria o convívio social. Todos compreenderiam e seriam compreendidos pelos outros, visto que a inteligência
não
pode
ser
propriedade
de
um
conjunto
sem
ser
propriedade das partes desse conjunto. “A inteligência não é potência de compreensão, que se encarregaria ela própria de comparar seu saber a seu objeto. Ela é potência de se saber compreender, que passa pela verificação do outro (p. 107)”. Rancière ressalta a importância de emancipar a população quanto a conhecimentos sociais, pois a maioria das pessoas é ciente apenas dos direitos, sem saber dos seus deveres, porém um indivíduo emancipado e consciente de seu papel é capaz de cumprir os seus deveres e reinvidicar os seus direitos. O posicionamento político dentro da pólis já direciona em boa parte o sujeito para a busca do seu bem estar e dos outros em sua comunidade. Emancipar... Emancipação... a ação da igualdade na verdade do poder do ser humano. Essa proposta chega a ser quase inconcebível dentro de mentes acostumadas a uma educação de subjugação comum entre professores x professores, professores x alunos, alunos x alunos, por isso sofreu tantas críticas dos gênios tradicionais pela visão de igualdade intelectual e chegou até a soar como loucura. 10
Na França da época de Joseph Jacotot a idéia de um anti-método não foi bem aceita pela simplicidade com que tratava a igualdade e ainda hoje não suscita revolução. No entanto, nós como professores podemos nos emancipar e emancipar os nossos alunos, nossa liberdade incute em saber da nossa potência e capacidade enquanto seres humanos. Nossos alunos necessitam que essa concepção nos ecoe verdadeira, para um comprometimento com o ensino de qualidade e de respeito a eles. Tudo está em tudo, é preciso ver o que nos está exposto correlacioná-lo e chegaremos à conclusão do conhecimento que ainda precisamos adquirir, que é ver o aluno em construção como seres iguais e capazes. É decepcionante saber que ainda fazemos parte de um sistema explicador, e sim, de um processo delimitado pelas ideologias subjacentes repassadas na escola que julga quem deve ou não aprender. A desigualdade é tão visível que chega a cegar-nos, como Rancière expõe: é mais fácil fingir que não viu do que analisar o que foi visto. Nesse sentido, pensamos na formação social do educando através da emancipação deles efetuada na escola, na qual cada um será responsável pela construção do conhecimento. Também, intencionaremos não somente a construção do conhecimento ético do aluno cidadão em diversos âmbitos da sua vida, mas também a incessante busca do conhecimento para o desejo de conquista da amizade da sabedoria, da filosofia. 3 O MÉTODO A metodologia empregada para o desenvolvimento desse trabalho3 tem seu início com uma conversação com os professores de Filosofia da escola definida para a realização do projeto. Perguntamos sobre o conteúdo e método que eles utilizam para o ensino da disciplina e em seguida
O trabalho aqui referido trata-se de um curso elaborado no Plano de Trabalho intitulado como “O Ensino da Ética na Formação Cidadã do Educando no Ensino Médio”, vinculado ao Projeto de Extensão desenvolvido pela professora Ms. Maria Neusa Monteiro (UFPA). 3
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conversamos com os alunos para saber o que acham da disciplina e qual a concepção acerca de sua utilidade. Apresentamos o curso, que é desenvolvido em cinco mini-cursos de 2h cada, totalizando 10h de aula, sendo realizado um por mês. Nas reuniões, centramos nos alunos o debate das discussões acerca de questões atuais que envolvem os temas trabalhados por Aristóteles em Ética A Nicômaco, Freire em Pedagogia da Autonomia, Olgária Matos em Polifonia da Razão, entre outros autores. O curso é desenvolvido dentro das seguintes etapas, a saber: discussão com os professores da escola o projeto em questão; organização das programações a serem desenvolvidas de acordo com a disponibilidade dos alunos e da escola; execução da programação planejada e avaliação permanente dos educandos. Os temas abordados giram em torno dos discutidos na Ética aristotélica. Primeiramente, a abordagem se centra na recepcitividade do que se compreende sobre a Ética, para posteriormente fazer uma abrangência sobre Coragem, Generosidade, Justiça, Amor, Amizade, Política, entre outros. A meta dos mini-cursos será fazer com que os alunos desenvolvam sua capacidade de questionamento crítico e percebam as melhorias de vida trazidas pelo conhecimento apreendido tanto na escola como em outros ambientes freqüentados por eles. Para isso, utilizaremos textos literáriofilosóficos, dinâmicas de grupo e recursos didáticos. Os textos literários são a ponte, a interpretação de atos virtuosos dentro da ação moral, são exemplificações da conduta humana. A presença da constante leitura interpretativa será um dos pontos de alcance do curso, pois dentro desse propósito existe a constituição da leitura interpretativa de vida, porque do mesmo modo que os personagens se apresentam dentro de um contexto com suas particularidades e universalidades, o educando também exerce sua vivência. Assim, a mistura entre a ficção e realidade será um ponto de apoio para a visão crítica por parte dos alunos de sua história na sociedade. 12
É interessante que em cada sessão os alunos escrevam acerca do que apreenderam e na conclusão do programa esses textos serão socializados e analisados conjuntamente entre alunos e professores. Ao final, elaboraremos um artigo para a publicação, relatando a experiência fazendo uso dos textos elaborados pelos próprios educandos, expressando as principais conclusões obtidas, ressaltando os avanços e recomendações, considerando os pontos de dificuldade e contribuições para a vida social e para o ensino da Filosofia no Ensino Médio. 4 CONCLUSÃO O ensino da ética tem sido discutido sempre atrelado a uma visão de conduta moral na pólis para o melhoramento social, e ainda, debates são feitos atualmente para a realização desse aperfeiçoamento. Contudo, para isso ocorrer é necessário que haja um comprometimento da prática dos emancipadores com essa questão. Os educadores, filósofos, precisam estar atentos às condições de aprendizado e construção de saber de seus alunos quanto ao interesse social e político do apreendido com vista nas contribuições trazidas para a vivência do educando dentro e fora de sala de aula, visto que a construção de um conhecimento próprio facilita a revisão dos valores impregnados nesses saberes. O emancipado tem a capacidade de refletir melhor sobre seus deveres e direitos, o posicionamento crítico suscitado no aluno, eleva a apuração dessa reflexão quanto ao papel individual que cada um deve desenvolver para o seu bem estar e o bem estar do outro. Então, o compromisso social tão discutido em Kant ganha um sentido de verdadeira responsabilidade social. Assim, a objetividade desse trabalho evidencia-se na preocupação da formação cidadã dos alunos nas nossas escolas, que de maneira direta, é responsável pela educação geral dos indivíduos, incumbido-nos a função de
sociabilizar
nosso
ponto
de
vista
na
busca
de
empatias
e 13
comprometimentos com a questão aqui exposta: o ensino da cidadania por meio da ética. 5 REFERÊNCIAS ARISTÓTELES, Ética A Nicômaco. São Paulo: Abril s/a Cultural e Industrial,1973. FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e Ousadia -o cotidiano do professor. 2ed. Rio de janeiro. Editora Paz e Terra: educação, 2003. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. KANT, Immanuel. Crítica da Razão Pura. Tradução de Valério Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Abril Cultural, 1983. MATOS, Olgária. A polifonia da razão: filosofia e educação. São Paulo: Scipione, 1997. MONTEIRO, Maria Neusa. Filosofia da Educação no Ensino Médio em Belém. Belém: E.F.S, 2000. RANCIÈRE, Jacques. O Mestre Ignorante – cinco lições sobre a emancipação intelectual. Tradução Lílian do Valle. Belo Horizonte. Editora Autêntica, 2002.
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