Fonseca - 2009.pdf

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O PAIRIMONIO EM PROCESSO

Reitor Vice-Reitora

Aloisio Teixeira Sylvia Vargas

Coordenadora do iómm de Ciência e Cultura Beatriz Resende EDITORAUFRJ Diretor Carlos Nelson Coutinho Coordenadora de Edição de Texto Coordenadora de Produção Conselho Editorial

Lisa Stuart Janise Duarte Carlos Nelson Coutinho (presidente), Charles Pessanha, Diana Maul de Carvalho, José Luis Fiori, José Paulo Netto, Leandro Konder, Virginia Fontes

M A R I A C E C LIA ~ LONDRES FONSECA

AGRADECIMENTOS

Copyright O 1997 Maria Cecilia Londres Fonseca Ficha Catalográfica elaborada pela Divisão de Processamento Técnico - SIBIIUFRJ F676p

Fonseca, Maria Cecília Londres O Patrimônio em processo: trajetória da política federal de preservação no Brasil I Maria Cecília Londres Fonseca. 3. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2009. /

298 p.; 16 x 23 cm.

1 . Patrimônio cultural I. Título

-

Brasil. 2. Patrimônio Cultural - História. CDD

363.690981

ISBN 978-85-71 08-149-9 1' edição 2' edição

-

1997 2005

Edição de Texto Núbia Melhem dos Santos (Iphan) e Jose Antônio Nonato (Iphan) (1" edição) Alvaro Mendes (Iphan) (2" edição) Revisão Alvaro Mendes (Iphan) e Sylvio Clemente da Motta (2" ediçáo) João Sette Camara (3a edição) Capa UNIDESIGN Projeto Gráfico Janise Duarte Editoração Eletrônica Marisa Araujo Universidade Federal do Rio de Janeiro Forum de Ciência e Cultura Editora UFRJ Av. Pasteur, 2501sala 107 Praia Vermelha - Rio de Janeiro CEP: 22290-902 Tel.1Fax: (21) 2542-7646 e 2295-0346 (21) 2295-1595 r. 210, 224 e 225 http:llwww.editora.ufrj.br

Em geral, as pessoas se referem ao período de elaboração de tese como um tempo de isolamento, de renúncias, de trabalho árduo e tenso. Não foi essa, no entanto, a impressão que me ficou do período em que preparei meu trabalho para a obtenção do titulo de doutora em Sociologia pela UnB. Além do profundo envolvimento com o tema, pude sempre contar com a valiosa colaboração de colegas, parentes e amigos. Em Angélica Madeira encontrei a orientadora de todos os momentos e a disponibilidade para acompanhar, mesmo quando distante, todos os passos do meu trabalho. A Clara de Andrade Alvim devo, entre muitas outras coisas, a sugestão de estudar os processos de tombamento. Foi com ela que descobri os ricos pontos de contato entre o mundo das palavras e o mundo dos objetos. De dona Graciema, esposa de Rodrigo Melo Franco de Andrade, obtive informações que jamais encontraria em qualquer documento. Dos professores do Departamento de Sociologia da UnB sempre recebi estímulo e apoio. Devo a Vilma Figueiredo a sugestão para procurar na sociologia o caminho para elaborar as questões suscitadas por minha experiência profissional na área da cultura. Maria Stella G. Porto me orientou com sensibilidade no difícil

SUAARIO

momento de elaboração do prometo.De Christianne e Brasilmar F. Nunes recebi sugestões muito oportunas, que corrigiram rumos e apontaram trilhas ainda não

exploradas.Mariza Veloso, minha parceira no estudo do património,trouxe contribuições valiosas em função do conhecimentoque acumulou sobre o assunto. Contei sempre com a colaboração de meus colegas da então Fundação Nacio-

nal pró-Memória.Xavier Maureau é sempre um interlocutorestimulante.em busca de novasformas de abordar a questão do património.Antânio HerculanoLopes e Antõnio Luas Dias de Andrade também me ajudaram, de diferentes maneiras. Mana

Alice de Castro me deu acesso à sua pesquisasobre os Livros do Tombo. Dará e Pedro Alcântara me repassaram sua riquíssimaexperiência na área da pedra

Listade siglas

11

Prefácioà terceira edição

15

e ca/. dr. Lúcio Costa, dona Judith Martins e dona Lígia Martins Costa. heró/s de 21

Introdução

um Patrimónioque não conheci, me possibilitaramconhecere entender melhor o entusiasmo e mesmo a devoção despertados pelo Sphan naqueles que tiveram a opor-

Partel

tunidadede dele participar.José Silva Quintas, LuasFelipe P. Serpa. Ana Gatade Oliveira, Helena Mussi, Ann-Mal Meirelles, companheirosda referência, me forne-

A noção de património: características e história

Capítulol

O património: umaquestãode valor

ceram informaçõesque. de outro modo, não poderiaobter. Aos funcionários do Arquivo Central do lphan agradeço a atenção com que sempre atenderam a minhas solicitações. Ao então Instituto Brasileiro do PatrimónioCulturaldevo a dispensa de meus encargos funcionais durante o período de elaboração da tese. Da Capes e do CNPq

1.1

A noção de património como categoria jurídica

1.2

O património como forma de comunicação sacia

1.3

O património como objeto de uma política pública

Capítulo 2 - A construção do património: perspectiva histórica

recebi apoio financeiro em diferentes momentosde meu curso de doutorado. 2.1

Gelson participou desde o início, e suas sugestõesforam fundamentaispara

Os primórdios da preservação de monumentos e a autonomização

33

35 37 41

45 51

54

dasnoçõesde históriae de arte

que eu pudesseme distanciarde um pontode vista predominantemente funcional e alcançasseum nível de análise política. A Vladimir Murtinho, Paulo Sérgio Pinheiro, Celso Lafer, Joaquim Falcão, João

Geraldo Piquet Carneiro, Mansa Peirano e Luís Antõnio de Castro Santos agra-

2.2

A legitimação do património pelo valor de nacionalidade

2.3

A teoria dos valoresde Alo"s Riegl

2,4

A ampliação da noção de património e a legitimação via direitos

57

65 70

culturais

deço as contribuiçõese sugestõesfeitas. De Célia B. Nogueirae Eduardo Slerca

Parte2 - O património no Brasil

recebi uma assessoriajurídica de inestimávelvalor para a linha de. investigação

79

J

que desenvolvi.

E não poderia esquecer daqueles que. embora ausentes, deixaram sua marca na minha vida pessoal e profissional, e também neste trabalho. A Aloísio Magalhães.

com quem tive o privilégio e o prazer de conviver desde os primeirostempos do CNRC, e a Fausto Alvim Júnior. personalidadeinstigante e criativa, devo, entre mui-

tas outrascoisas,o exemploda busca constantee entusiasmada do novo, mesmo nos caminhos estreitos da burocracia.

Capítulo .9 - A fase heróica

81

3.1 0 contexto cultural 3.2 0 movimento modernista e o património

82

3.2.1 0 sentido de ruptura no modernismo brasileiro

87

3.2.2 0s modernistas e MinasGerais

92

87

A criaçãodo Sphan

94

3.3.1 As iniciativasprecursoras

94

3.3

3.3.2 A institucionalizaçãoda proteção do património

96

3.3.3 0 anteprojetode Mário de Andrade e o decreto-leiRe25

98

3.4

0 programa de trabalho do Sphan

5.2

Os principaisproblemas

5.2.1

As concepções de valor histórico e de valor artístico

5.2.2

As concepçõesde valor excepcionale de valor naciona

5.2.3

Os conceitos de centro histórico e de entorno

l 06

5.2.4 Sobre a legitimidade do processo de atribuição

3.4.1 As prioridades e os limites

l 06

3.4.2 A construção de um saber verdadeiro

l 10

5.3

A atuação do Conselho Consultiva

3.4.3 Umretratoempedrae cal

l 12

5.4

Observações finais

3.5 0s colaboradores e os adversários

l

16

3.5.1 0 papel da equipe e do Conselho Consultivo

l

16

3.5.2 As vozes discordantes

l

18

3.6

Uma autonomia fraca

188 188 195

198 200

de valor nos tombamentos 205 207

Conclusão

213

Referênciasbibliográficas

225

l 20

Anexos

237

Capítulo4 - A fase moderna

l 31

Anexo l

Cronologia da política de preservação no Brasil

4.1

0 contexto cultura

l 31

Anexo ll

Decreto-lein' 25, de 30 de novembro de 1937

4.2

0 Sphan pós-Estado Novo

l 39

Anexo 111 Parecerde Carlos Drummondde Andrade

4.3

As alternativas do je ao)lphan

l 41

Anexo IV

O compromisso cultural da Nova República

l 41

Anexo V

Processos de tombamento abertos de 1.1.1970

4.3.1 0s caminhos da descentralizaçãoe a busca de novos 0 Centro Nacional de Referência Cultural

143

Anexo VI

Processos de tombamento abertos de 1990 a 2008

4.5 A unificação da política federal de preservação:

154

Anexo Vll

Decreto n' 3.551, de 4 de agosto de 2000

Anexo Vlll

Bens registrados de 2002 a 2008

Anexo IX

Bens culturais e naturais do Brasil inscritos na

a fusão lphan/PCH/CNRC 4.6

Uma propa$ta de democratização da política cultural:

158

a criaçãoda Secretaria da Culturado MEC 4.7

0 alcance e os limites da política federal de preservação nos anos 70-80: um balanço

lista do património cultural mundial da Unesco 160

Capítulo 5 - A prática de tombamento: 1970-1990

179

5.1

180

A sistemática dos processos de tombamento

245 253 255 259

a 14.3.1990

sentidos para a preservação 4.4

239

5.1.1 A origem dos pedidos

183

5.1.2 Justificativas, pareceres e impugnações

186

279 291

295 297

LISTA DE

SIGLAS

ABA

AssociaçãoBrasileirade Antropologia

ABC

Santo André. São Bernarda do Campo e São Caetana

ABI

AssociaçãoBrasileirade Imprensa

ABL

Academia Brasileira de Letras

AIB

Ação IntegralistaBrasileira

ALN

AliançaLibertadoraNacional

cc

ConselhoConsultivodo Sphan

Cebrap

Centro Brasileiro de Análise e Planejamento

CNRC

Centro Nacional de Referência Cultural

Condephaat

Conselho da Património Histórico, Artístico, Arqueológico e Tecnológico

Corephaae

Comission Régionaledu Patrimoine Historique, Artistique. Archéologique et Ethnographique

CPC

Centro Popularde Cultura

DAC

Departamentode AssuntosCulturais

Dasp

Departamento Administrativo do Serviço Público

DC

Departamento de Culturada Prefeiturade São Paulo

DCR

Divisão de Conservação e Restauração

DET

Divisãode Estudos e Tombamento

DIP

Departamento de Imprensae Propaganda

b.

do Património Histórico e Artístico Naciona

PNDA

Dphan

Departamento

DR

Diretoria Regional

PP

DTC

Diretoria de Tombamento e Conservação

PSD

Partido Social Democrata

Embratur

Empresa Brasileira de Turismo

PSDB

Partido da Social Democracia Brasileira

Esaf

EscolaSuperior de Administração Fazendária

PT

Partido dos Trabalhadores

FNpM

Fundação Nacional pró-Memória

PTB

Partido Trabalhista Brasileiro

Funai

Fundação Nacional do Índio

Seac

Funarte

Fundação Nacional de Arte

Seac

Subsecretaria de Assuntos Culturaisdo MEC

IAB

Institutodos Arquitetos do Brasil

SEC

Secretaria de Culturado MEC

lbama

Instituto Brasileiro do Meio Ambiente

Senalba

IBPC

Instituto Brasileiro do Património Cultural

lcomos

International Councilof Monuments andSites

Programa Nacional de Desenvolvimento do Artesanato Partido Progressista

Secretaria de Ação Cultural

Sindicato dos Empregados em Entidades Culturais. Recreativas. de

Assistência Social. de Orientação e Formação Profissional,de Brasília

Seplan

Secretaria de Planejamento da Presidência da República

Span

Serviço do Património Artístico Naciona

Idesp

Instituto de Estudos Económicos, Sociais e Políticos de São Paulo

IHGB

Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro

Sphan

Secretaria do Património Histórico e Artístico Nacional

INF

Instituto Nacional do Folclore

Sphan

Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional

lphan

Instituto do Património Histórico e Artístico Naciona

Sphan

Subsecretariado Património Histórico e Artístico Nacional

lseb

Instituto Superior de Estudos Brasileiros

Sudene

Superintendência de Desenvolvimento

LAA

Livro de Artes Aplicadas

UDN

União DemocráticaNacional

Laep

Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico

UNE

União Nacional dos Estudantes

LBA

Livrode BelasArtes

LH

Livro Histórico

MDB

Movimento Democrático Brasileiro

MEC

Ministério da Educação e Cultura

MES

Ministério da Educação e Saúde

MinC

Ministério da Cultura

OAB

Ordem dos Advogados do Brasil

ONU

Organização das Nações Unidas

PC

Partido Comunista

PCH

Programa de Reconstrução das Cidades Históricas

PD

Partido Democrático

PMDB

Partido do Movimento Democrático Brasileiro

Unesco

do Nordeste

United Nations Educational. Scientific and Cultural Organization IOrganização das Nações Unidas para a Educação. Ciência e Cultura)

PREFÁCIO À T[RC€1RA EDIÇÃO ÓÂRIA CICÍHA

LONOR[S FONSeCÁ

E com grande satisfação que apresento uma nova edição de O Pafrlmónfo em prmesso, a terceira em pouco mais de dez anos. Interpretoesse fato como sinal de

que o livro continuasendo útil para os que se interessampelo tema do património cultural. Por esse motivo, procurei, mais uma vez, atualizar, na medida do possível, algumasdas informaçõesque constam nos anexos. Deste modo, o leitor pode acompanhar tanto os fatos mais recentes da política federal de preservação, registrados na cronologia, quanto os ates de aplicação dos instrumentos de proteção e salvaguarda,seja em nível nacional- por meio de tombamentose registros- seja em nível internacional - por meio das inscrições nas listas criadas pelas Convenções da Unesco das quais o Brasil é signatário. Entretanto,como já havia procurado enfatizar em toda a análise, as políticas de preservação do património cultural transcendem em muito os recursos viabilizados pela aplicação de leis, decretos ou portarias por parte dos órgãos estatais de património. Esse fato é reconhecido pela Constituição Federal de 1988 quando se refere

à imprescindívelparceria entre Poder Público e comunidade na tarefa de promover e proteger o património cultural brasileiro. Lembro que as leis de incentivo à cul-

tura têm como um de seus objetivos estimularessa parceria.

\

O movimontojá apontado na pesquisa inicial, no sentido de ampliação da

cas da ação humana, ao longo do tempo, naquele espaço ' A perspectiva histórica

noção de património cultural, vem adquirindo, nos últimos anos, contornos mais

reencontra, assim, o seu lugar na política de património, em que, como vimos no

específicos. Pois é necessário que essa ampliação conceitual venha acompa-

estudo da trajetória do lphan, prevalecia a percepção estética e a ênfase na arqui-

nhada pelo cuidado de "construir' novas figuras. discriminando e qualificando os

tetura. Outra inovação importante foram os geoparques, figura criada pela Unesco

recortes sobre os quais se vai atuar, de modo a viabilizar a adoção das medidas

com foco no desenvolvimentosustentável em áreas de intoresse geológico e paleon-

mais pertinentes para cada situação. Mas. como qualquer modelo que se queira

tológico, de modo a levar em conta também a qualidade de vida das populações

elaborar para mapear o mundo real, essas novas categorias - assim como as que

que neles habitam.:Finalmente,nos últimos anos, consolidou-seo Programa

as antocederam - não se excluem mutuamente, pelo contrário. apenas apontam

Monumenta,uma parceria do governo brasileiro com o Banco Interamericanode

para enfoques diversificados que, muitas vezes e de diversas maneiras, necessa-

Desenvolvimento(BIDÉ,que. em 2006, foi integrado ao lphan. De uma atuação ini-

riamente se superpõem.

cialmente centrada na recuperação de imóveis e espaços públicos de algumas

Essa constataçãofica evidente na própria distinção - recente - entre patri-

cidades históricas protegidas pela legislação federal, em parceria com estados e

mónio cultural material e imaterial, que, inclusive, norteou a última reestruturação

municípios, o programa passou a contar também com financiamento para imóveis

do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (lphanl. Sem dúvida, a

privados. criando um instrumento inovador que se pretende converter em prática

instituição do instrumento do Registro dos Bens Culturais de Natureza Imaterial,

permanentedo lphan. Além disso, foram desenvolvidas três linhas de trabalho

viabilizada pelo decreto n' 3.551/2000, foi um passo fundamental no sontido tanto

visando ampliar o alcance do programa e irradiar, para a sociedade, o envolvi-

de ajustar o património cultural reconhecido pelo Estado à diversidade da cultura

mento com a tarefa da preservação: capacitação de mão-de-obra, programas edu-

brasileira quanto de viabilizar uma atuação adequada à especificidadede múltiplos

cativos e promoção de atividades económicas.

processos e manifestações culturais, democratizando, inclusive, o alcance da

No âmbito do patrimóniocultural imaterial, a proposiçãode certos bens para

ação do poder público federal na preservaçãocultural. Mas a prática vem demons-

Registro tem levantado questões desafiadoras, que obrigam à busca de alterna-

trando que, igualmente fundamentais, embora menos visíveis, são os inventários

tivas adequadasa cada situação. Comprova-se,assim. o acerto inicial de limitar

e os planos de salvaguarda - que, juntamente com o registro, são os pilares da

o decreto3.551,de 4 de agostode 2000,à instituiçãodo Registro- comquatro

políticade património imaterialdo lphan-, que necessariamente envolvem, em sua

Livros iniciais - e à criação do Programa Nacional do Património Imaterial, dei-

realização. a dimensão material do património cultural, seja na referência a sítios.

xando aberto o espaço para que o acúmulo de experiência e a avaliação constante

centros históricos, edificações, seja a objetos, como as produções do chamado

dos resultadoscontribuampara a paulatinaestruturaçãodesse universo.Por exem-

"artesanato', os adereços, os instrumentos musicais, para não falar dos elementos

plo, optou-se. com prudência, por desenvolver inicialmente Inventários para mapear

da natureza. matérias-primas para a fabricação dos mais divorsos

e conhecer melhor a dinâmica de campos como as práticas alimentares e as lín-

produtos.

No âmbito do património cultural material, a criação de uma figura como a de

guas e falares do Brasil, com base no entendimento de que os inventários consti-

;paisagemcultural brasileira', inspirada em instrumento da Organizaçãodas

tuem uma forma preliminar e informal de salvaguarda. A criação da Câmara do

NaçõesUnidasparaa Educação, a Ciênciae a Cultura(Unesco)já em vigor,de-

Património Imaterial' no Conselho Consultivo do Património Cultural, e de grupos

corre da constatação de que é necessária uma perspectiva mais integrada e parti-

de trabalho como o Grupo de Trabalho da Diversidade Linguística IGTDL),' forma-

cipativa da proteção. A proposta é de que a atuação seja compartilhada por dife-

do a partir de solicitação feita em seminário coordenado pelo lphan em parceira com

rentes órgãos da administração pública e também pela sociedade, com base em

a Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados, e de cujos trabalhos

um pacto que tem como objetivo o uso e a gestão de uma determinada área, deli-

participaram representantesde vários órgãos da administração pública. como o

mitada em função das referências culturais que a caracterizam. O objeto não são

Ministério da Educação (MEC). o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

apenas as edificações ou paisagens excepcionais. como também quaisquer mar-

jIBGE), o Ministério da Justiça (MJ), a Fundação Nacional do índio (Funai), a

16

O PATRIAõNIO [A

PROCESSO

PR[FACIO A TERCEIRA tOiC'AO

17

Fundação Palmares (MinC) o Museu Goeldi(MCT) e a Universidadede Brasília IUnB), entre outros, tem possibilitado a formulação de políticas interinstitucionais e o

guarda do Património Cultural Imaterial da América Latina (Crespial), primeiro centro regionalvoltado para aplicaçãoda Convençãode 2003, e de que o Brasil é

encaminhamentode ações diversificadas, o que potencializa inegavelmente o alcance

membro fundadorae a proposta de instalação, na cidade do Rio de Janeiro, de um

das políticasde património.

Centro de Formação em Patrlmânio para a América Latina. Caribe e Países de Língua

Portuguesae Espanhola da Africa e Afia, conforme modelo elaborado pela Unesco

Também no sentido da ampliação e coordenação das ações voltadas para a pre-

e já realizadoem instituiçõesespalhadaspelo mundo.

servação e promoçãodo património cultural brasileiro, a atual presidência do lphan vem trabalhando na montagem de um sistema nacional de património que aproxime

Concluindo, é possível constatar, a partir da sumária apresentaçãode fatos

os níveis federal, estadual e municipal em tomo de objetivos comuns. É inegável que,

recentes que considero relevantes, que as políticas e ações voltadas para a pro-

no Brasil, o entendimento de que o apoio à cultura é uma questão de interesse pú-

teção e promoçãodo patrimóniocultural brasileirotêm sido objeto de reformu-

blico tem avançado consideravelmente nas últimas décadas, com todos os estados

lações e de sugestões inovadoras. no sentido da busca de soluções eficientes,

da federação e muitos municípios já dotados de órgãos específicos em sua admi-

criativas, e adaptadas às novas realidades, e que necessariamenteimplicam na parceria com outras instituições e também com a sociedade.

nistração. Embora, no caso da preservação do património cultural, as propostas do órgão federal ainda sejam o principal foco de inspiração para esse desejável movi-

Não possodeixar de registrar,mais uma vez, meus agradecimentos às pessoas

mentode descentralização, há casosinteressantes de propostaspioneirasem nível

que colaboraram para o desenvolvimento de minha trajetória profissional. Ao

local, como, por exemplo, a cooficialização, no município de São Gabriel da Cachoeira

presidente do lphan, Luiz Femando de Almeida, devo a possibilidade de participar da

(AM), em 2002, das línguas tukano, nheengatue baniwa, ao lado do português. Além

elaboração de algumas das propostas citadas acima. Como membro do Conselho

disso, estados e municípiostêm procuradoformular ou reformularseus planos de

Consultivo do Património Cultural, tenho a oportunidade de usufruir da rica troca de

cultura de forma participativa, e vários deles. sobretudo da região Nordeste, estão

conhecimentos, idéias e experiências que ocorre nas reuniões. Do mesmo modo,

buscando aperfeiçoar iniciativas de apoio à transmissão de conhecimentos e prá-

como representantedo Brasil no primeiro Comitê Intergovemamental do Património

ticas por parte dos detentoresde saberese fazerestradicionaisque, por não estarem

Imaterial, de 2006 a 2008, pude ampliar consideravelmente meu conhecimento

integrados nos sistemas consagrados de ensino e pesquisa, nem no mercado for-

sobre o património e as políticas culturais de vários países, e participar. com os cole..

mal de trabalho.não costumam receber atenção por parte dos órgãos estatais, a não

gas do comitê e do Secretariadodo PatrimónioCultural Imaterial da Unesco, da

ser por meio de ações com indesejável viés assistencialista.

estruturação das primeiras propostas para a aplicação da convenção de 2003. Por

Outra mudança recente no desenho da política federal de património é a criação

ser impossível nomear todos a que devo valiosas contribuições, destaco aqui apenas

do Instituto Brasileiro de Museus, como corolário de processo iniciado na gestão do

os que colaboraramcom informaçõese sugestões para a atualização desta edi-

ministroGilbertoGil. Emboraa pesquisade que trata este livra-não tenha se detido

ção: Márcia Sant'anna, direto.ra do Departamento do Património Imateriall Carlos

na análise das várias dimensões da preservação do património cultural brasileiro -

Fernando Delphim e Jurema Kopke Eis Arnaut, do Departamentodo Património

como a dos patrimónios arqueológico e paleontológico, do património natural, e tam-

Material e Fiscalizaçãol Lia Motta, coordenadora-geral de Pesquisa, Documen-

bém dos espaços museológicos-, aquela iniciativa finaliza para o carátor espe-

tação e ReferênciasSylvia Braga e Robson de Almeida, do ProgramaMonumental

cífico e diferenciado das atividades de guarda, conservação e promoção reali-

Anna Mana Serpa Barroco, secretária do Conselho Consultivo do Património

zadas pelos museus.

Culturall e, ainda, Jurema Machado, Coordenadora de Cultura da Unesco no Brasil. Agradeço também a Valéria Leite de Aquino por sua inestimável colaboração na

Em nível intemacional, o Brasil tem participado ativamente dos trabalhos desen-

preparação deste e de tantos outros trabalhos.

volvidos pela Unesco na área da cultura, seja no processo de formulação de con-

venções,seja como integrantedos comitês por elas criados. Dois fatos merecem

Rio de Janeiro,9 de fevereirode 2009.

destaque:a criação em Cuzco, Peru, em 2005, do Centro Regional para a Salva-

18

O PÂTRIAÕNIO EA PROCESSO

PREFÁCIOÀ íeRCEIR EDiÇÃo

L

19

MolAS

INTRODUÇÃO

Em 27 de agosto de 2007 foi lançado em Pomerode (SCI o prometoRoteiros Nacionais de Imigração, inaugurando o conceito de "paisagem cultural brasileira". As pesquisas foram iniciadas na gestão do superintendente jatual dlretor de PatrimónioMaterial e Fiscalizaçãol palmo Vieira Filho, em Santa Catarina, onde foram identificados espaços e tradições remanescentes da imigração italiana, alemã. polonesa e ucraniana. O tombamento do primeiro conjunto de bens. com a denominaçãode "Roteiros Nacionaisde Imigração: Santa Catarina", foi aprovado na LV reunião do Conselho Consultivo do Património Cultural, realizada em dezembro de 2007.

o Geoparquedo Vale do Cariri. no Ceará. e está conduzindoa criação do segundo,o

Se a zelador do Museu de Kolmar quiser mostrar ao visitante qual, entre os seus tesouros, mais preza. leva-o para longe do altar de Grünewald, para uma sala cheia de tricolores. pompler e outros

Geoparque da Serra da Bodoquena, em Mato Grosso do Sul.

elmos e lembranças de natureza aparentemente insignificantes são

O lphan participou da criação do primeiro Geoparque das Américas e do Hemisfério Sul,

de uma época que, para ele, é a idade heróica. Em 2005 foi criada, no âmbito do Conselho Consultivo do Património Cultural, a Câmara

Mm Weher, Ensaios de sociologia.

do PatrimónioImaterial, primeira no gênero desde a criação dessa entidade. com o objetivo de subsidiar a discussão e as decisões dos conselheiros sobre o tema. O processo teve origem na solicitação de registro do talian. língua do grupo vêneto ampla mente falada no sul do Brasil, encaminhado ao lphan em 2001

A constituição de patrimónios históricos e artísticos nacionais é uma prática

característicados Estados modernos que. através de determinadosagentes, recrutados entre os intelectuais, e com base em instrumentos jurídicos específicos. delimitam um conjunto de bens 00 espaço público. Pelo valor que lhes é atribuído, enquanto manifestaçõesculturais e enquanto símbolos da nação, esses bens passam a ser merecedores de proteção. visando à sua transmissão para as gerações

futuras. Nesse sentido. as políticas de presewação se propõem a atuaç basicamente. no nível simbólico, tendo como objetivo reforçar-uma identidade coletiva, a educação e a formação de cidadãos. Esse é, pelo menos, o discurso que costuma justificar a constituição desses patrimónios e o desenvolvimentode políticas públicas de preservação.

Aparentemente,essas políticas alcançam um alto grau de eficácia simbólica: é. muito raro ocorrerem contestações quanto ao valor dos monumentos que são

objeto de proteção. No Brasil, por exemplo, não ocorreria a ninguém atualmente

duvidarda pertinênciado tombamentodas grandesobrasdo Barroco- igrejas,

Í

palácios, chafarizes. conjuntos urbanos etc. - realizado. principalmente, nas décadas de 1930 e 1940. Nesse sentido, o trabalho feito pelo Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional teria sido muito bem sucedido. pelo reconhecimento

que alcançou no país e no exterior. 20

O PATR}AÕN FO EA PROCESSO

h

Na verdade,porém, esse "poder simbólico"' dos patrimóniosnacionais é relativo e tem um alcancelimitado. Pois se o objetivo dessa política estatal é amplo. na medidaem que não se dirige a setores, grupos ou ativídadesparticulares,mas díz respeito a toda a sociedade nacional. de fato o campo de sua produção é bas-

tante restrito: trata-se de uma política conduzidapor intelectuais,que requer um grau de especializaçãoem determinadasáreas do saber (arte, história, arquitetura. arqueologiae, mais recentemente,etnologiae antropologia)e, por parte dos usuários. algum domínio desses códigos. A legitimidadeda constituiçãode um património assenta. para seus mentores, não apenas no seu valor como símbolo da

mente, função que é legitimada por seu compromisso com a construção da nação e com a luta pela cidadania. Dado o caráter inescapavelmente ambíguo da posição desses intelectuais, sobretudo nos períodos autoritários, vou tentar apreender como lidaram com os diferentes compromissos, os impasses e os limites com que se defrontaram. Pois, devido ao grau extremamente rostrito, no Brasil, da participação da sociedade nas políticas culturais em geral, e particularmente nas políticas

de preservação,as decisões desses intelectuais foram fatores cruciais na orientação dessas políticas. Em geral, as políticas de preservação são conduzidas por intelectuais de perfil

nacionalidade,mas também em valores culturais atribuídos a partir de critérios

tradicional (historiadores,artistas, arquitetos, escritores etc.l que se propõem a

formuladospor aquelas disciplinas.

atuar no Estado em nome do interesse público, na defesa da cultura. identificada

A produçãode um universo simbólicoé, nesse caso, o objeto mesmo da ação política, daí a importância do papel que exercem os intelectuais na construção dos

com os valores das camadas cultas. Ao protegerem a cultura desses grupos, con-

vertida em valor universal, não teriam dificuldade em conciliar, sem maiores con-

patrimóniosculturais. Nesse sentido, são dois os desafios com que se defrontam:

flitos, sua identidadede intelectuaise de homenspúblicos.No caso do Brasil,

o primeiro é o de. através da seleção de bens "móveis e imóveis" (conforme o

essa foi a situação dos intelectuais modernistas que participaram do Serviço do

preceito legal vigente na maioria dos países), construir uma representação da

Património Histórico e Artístico Nacional(Sphan) desde 1937, e que instauraram uma

nação que, levando em conta a pluralidade cultural, funcione como propiciadora

política cultural cuja continuidade e prestígio se mantiveram durante mais de trinta

de um sentimentocomum de pertencimento.como reforço de uma identidade nacionall o segundo é o de fazer com que seja aceito como consensual.não-arbi-

anos. Entretanto,diferentementedo que ocorria então na Europa, esses intelec-

trário, o que é resultadode uma seleção- de determinadosbens - e de uma

de vanguarda,o que conferiua sua atuação na área do patrimóniouma autoridade

convenção- a atribuição.a esses bens, de determinadosvalores.Ou seja, de.

diferenciada

ao mesmo tempo, buscar o consenso e incorporar a diversidade.

tuais eram figuras que, nos seus respectivos campos de atuação, tinham posições

Mas, a partir da década de 1970, sobretudo quando o regime militar entrou em

Os intelectuais que estão direta ou indiretamente envolvidos em uma política

crise, essa política começou a ser criticada, e seu caráter nacional contestado.

de presewação nacional fazem o papel de mediadores simbólicos. já que atuam

por se referir apenas às produções das elites. Nesse momento, coube a intelec-

no sentido de fazer ver como un/verbais,em termos esléffcos,e nac/onafs,em

tuais com um novo perfil (especialistasem ciências físico-matemáticase sociais.

termos po/ecos. valores relativos, atribuídos a partir de uma perspectiva e de um

administradores.pessoas ligadas ao mundo industrial) definir novos valores e no-

lugar no espaço social. E são também os intelectuaisque, ao apontarem,no exer-

vos interesses.Duranteas duas décadas que se seguiram,essa mudançaevoluiu

cício de sua função crítica, o caráter arbitrário da representaçãovigente de patri-

de umamodernização da noçãode património- o que significouvinculara temá-

mónio. atuam no sentido de sua transformação.2

tica da preservação à questão do desenvolvimento - à po//fixação da prática de

Os processosde seleção e proteção do patrimóniocultural nacional são regu-

preservação, na medida em que os agentes institucionais se propuseram a atuar

lados por leis, procedimentos e rituais bastante específicos, e costumam ser con-

como mediadores dos grupos sociais marginalizados junto ao Estado. Esses inte-

duzidos por agentes com um perfil intelectual definido (Bourdieu, 1980, p. 69),; No contexto brasileiro, é preciso levar em conta o papel político que, desde o período colonial, têm aqui exercido os homens de cu/fura: o de atuarem como porta-vozes das massas desprovidas de recursos para se organizarempolitica-

22

O PATRIAÕNIOeA PROCESSO

lectuais viram na área da cultura, margina/ no conjunto das políticas estatais, um espaço possível de resistência ao regime autoritário. Seu objetivo último era justamente o de ampliar o alcance da política federal de património, no sentido de de:

mocratizá-la e coloca-la a serviço da construção da cidadania.

INTRODUCAO

23

O problema é que, como observa Bourdieu, qualquer luta no interior de um

governo autoritário, mantendojunto ao MEC e ao governo federal um invejável

campo 'pressupõe um acordo entre os antagonistas sobre o que merece ser objeto

grau de autonomia.Já nos anos 70 e 80, na fase de abertura do regime militar,

de luta' (1980, p. 115), ou seja, no caso, sobre o que seria o objetivo específico

de crise da modernidade e diante de uma comunidade científica mais independente.

da presewação. Esse, como veremos, foi um dos impasses que caracterizou a

estruturada e diversificada(cf. Pécaut, 1990, p. 257-308), os intelectuaisque se

política federal de património desenvolvida no Brasil nos anos 70-80. Nesse período. coexistiram duas linhas de atuação paralelas num mesmo campo, - a da pedra

propuserama reorientar a política federal de preservação- em um sentido que

e cal. continuidade do antigo Sphan, e a da referência. oriunda do Centro Nacional

Implicava, ao contrário do que havia ocorrido no Sphan, uma âRiculação com outras áreas do governo e com os movimentossociais, tendo em vista uma idéia

de ReferênciaCultural (CNRC),criado em 1975 - que não conseguiramconvir em

de democracia participativa - viram. muitas vezes. seu trabalho e sua atuação Jun-

um mínimo de definições comuns. A hegemonia do grupo de referéncfa, na verda-

to a um governo autoritárioserem postos sob suspeita por outros intelectuaisde

de. se limitou ao plano discursivos na prática, foi através dos tombamentos efetua-

renome. De um lado, porque se estariam deixando cooptar pela ditadura militar.

dos pela Sphan que continuoua ser construído o patrimóniohistórico e artístico

já em crise de legitimidadel de outro, por se arvorarem em porta-vozes dos inte-

nacional.

resses populares (cf. Miceli, 1985, p. 127) no momento em que a sociedadecivil

Outro problema das políticas de preservação em geral é o fato de que as eventuais demandas da sociedade em relação à cultura são extremamente difusas. Se

se reestruturava. tanto por meio dos mecanismos de representação política quanto por meio de novas formas de organização não-governamentais.

entre os produtores culturais - cineastas, atores, músicos, escritores etc. - essas

Essa trajetória que acabei de esboçar muito rapidamente, e que será apre-

demandas são mais definidas e, frequentemente, veiculadas por meio de organiza-

sentada nos capítulos3 e 4, indica. a meu ver. que o grande desafio, ainda hoje, de uma política federal de preservação no Brasil é desenvolver,numa sociedade

ções corporativas(associações,sindicatosetc.), falar de uma demandasocial em termos da constituição de um património cultural da nação é bastante problemático,

como a brasileira, uma política de património que seja, efetivamente. uma política

sobretudo em uma sociedade como a brasileira. na qual, ao lado da pluralidade.

pública. Em que medida essa política não tem funcionadoantes como uma ativi-

dos contextos culturais, existem profundas desigualdades económico-sociais, e a

dade implantada e conduzida pelo Estado. com a participação de determinados

autonomia de uma esfera cultural sequer faz sentido para alguns grupos da socie-

intelectuais,como mais um recurso ideológico para obter consenso,para legitimar um prometonacional do próprio Estado ou. simplesmente,para inserir o país no

dade nacional. Nesses casos, fica mais complexo o papel político dos intelectuais que atuam. dentro do Estado, como organizadores de uma demanda cultural ainda

concerto das nações civilizadas?

não explicitada. no sentido de defender os interesses de grupos carentes de orga-

No entanto, nas décadas de 1970 e 1980, a orientação da política cultural de-

nização própria. Foi com base nessa realidade que se formularam, nos anos 70-

senvolvidano nível federal foi no sentido de ampliar a noção de patrimónioe de

80, vários projetos do CNRC, posteriormente integrado à Fundação Nacional pró-

estimulara participaçãosocial, propondo uma relação de colaboraçãoentre Esta-

Memória.4

do e sociedade.Não teriam esse período e essa nova orientaçãodeixado marcas

Em resumo. em ambos os momentos decisivos - o momento fundador, no final

no sentidode propiciaruma democratização da políticafederalde património?Ou

da década de 1930. e o momento renovador, na segunda metade da década de

tratou-se apenas da afirmação de uma boa /r7fençãode agentes institucionais.

1970 e Início da de 1980 - a posição dos intelectuais que conduziram a política

carente, no entanto, de condições sociais e políticas para ser implementada? Pro-

federal de preservaçãofoi marcada por algum grau de ambiguidade, se bem que com resultados diferentes. Durante o Estado Novo, os modernistas gozavam de

a banho

curar elementos para responder a essas indagações é um dos objetivos deste tra-

franca hegemonia no meio intelectual e conseguiram resolver razoavelmente bem,

O panorama atual, relativamente às políticas culturais no Brasil, parece indicar

naquele momento, a dicotomia entre o que consideravamseu papel de homens de

que nada mudou nesse campo pedHdco das políticas estatais: a questão cultural

cultura a serviço do interesse púó/ico e sua inserção na administraçãode um

raramente aparece na agenda dos partidos políticos ou nos discursos de eventuais

24

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

INIR OOUCÃo

25

} espaço público. Podadoporque mudo, na medida em que, ao funcionar apenas

candidatoslos cargos públicos na área da cultura não despertammaior interesse

como símbolo abstratoe distante da nacionalidade,em que um grupo muito redu-

por parte da classe políticase, da parte da sociedade, raras são as ocasiões em

zido se reconhece, e referido a valores estranhos ao imaginário da grande maioria

que ocorrem mobilizaçõesem torno de demandasespecificamentevoltadas para

da populaçãobrasileira,o ânus de sua proteção e conservaçãoacaba sendo con-

a questãoda cultura.A facilidadee a profundidade comque foi realizadoo "des-

sideradocomo um fardo por mentes mais pragmáticas.Não foi outro o sentido das

mantelamentoda área da cultura" no início do governo Collor seriam um indício

emendas apresentadas,em 1994, ao texto constitucional de 1988, que ampliava

dessa situação.

consideravelmente a noção de património cultural. Essas emendas, apresentadas

No caso da políticafederal de preservação,os cerca de mil bens tombados

por ocasião da revisãoconstitucional,visavam a reduzir tanto o universodo patri-

jincluindo-se aí desde monumentos isolados a conjuntos da extensão do Centro

mónio como as atribuições da instituição responsável por sua proteção.'

Histórico de Salvador, com aproximadamentetrezentos imóveis, e cidades inteiras, como Ouro Preto, Tiradentes, Olinda, Antõnio Prado) funcionammais como sím-

Pesadoporque mudo.essa é, portanto, uma das idéias que movem este traba>'

bolos abstratose distantesda nação do que como marcos efetivosde uma identi.

lho. Prolegfdos,a maior parte do tempo, do acesso do público que, em geral, vê a preservação como uma atividade cu/fa, própria dos países civilizados, esses

dade nacional com que a maioria da população se identifique, e que integrem a ima-

bens parecem guardar a sete chaves, para a grande maioria da população,as

gem externado Brasil. Na verdade, a identidadebrasileiratem sido representada

informações,sentidos e valores que teriam justificado sua inclusão no património

basicamente pelo samba, pelo futebol, pelo carnaval e. mais recentemente, pelas

histórico e artístico nacional. A distância entre as tradições culturais, as diferentes

telenovelas e pela Fórmula 1 . No exterior, o Brasil continua sendo valorizado sobre-

Identidadoscoletivas, entre a pluralidadecultural da nação e a memória nacional

tudo por seus recursosnaturais. pela sua naturezatropical- salvo nos meios inte-

construídapelo Estado,fica, desse modo, mais aguda, assim como os limites

lectuais e nos organismos internacionais de cultura, como a Unesco, onde o Brasil

dessa política estatal enquanto política pública. Nesse sentido, tudo leva a crer

tem vários bens inscritoscomo PatrimónioCulturalda Humanidade(ver Anexo IX).

que as novas propostas dos anos 70-80 não chegaram a mudar significativamente

essa realidade.

Isso não significa,porém, que os bens culturais que se acham sob a proteção legal do Estado - em função do tombamento - não sejam reconhecidos como de

Além disso (ou, talvez, por isso). o tema do patrimónioe a questãodas polí-

valor, e que a sua presewação não seja consideradauma causa justa. Objeções frontais só costumamocorrer quando a ação do Estado vem contrariar interesses

ticas de preservaçãodespertam pouquíssimointeresse entre os cientistas sociais

particulares. como, por exemplo, de empresários da construção civil, proprietários

dam esse tema, na medida em que se interessampelos processosde construção

de imóveis antigos, prefeiturasde cidades históricascom proletos de urbanização modernizadoresetc. Para a populaçãoem geral. os bens tombadoscostumam ser

de identidades culturais diferenciadas.

no Brasil. Dentreesses, são sobretudoos antropólogosque, eventualmente,abor-

Seus trabalhos.' no entanto, têm-se concentradona análise dos discursos

valorizadospor sua anf u/dada, por sua riqueza,por sua Z)eleva,cobrando-se inclusiveda instituiçãofederal maiorzelo na tarefa de protegê-los.Já vão longe os tempos em que os agentes do Património corriam o risco de serem apedrejados por populações enraivecidas, que não hesitavam, inclusive, em ocupar um imóvel

em vias de ser tombadocom leprosos,para forçar sua demolição.5 As reações à ação do Estado, representadopela instituiçãofederal encarregadada proteção do património, hoje, quando ocorrem, se dão nos tribunais. na imprensa, na luta política e no tráfico de influências.e

oficiais. Mas, ao abordarem esse discurso desligado de uma prática social mais 7

ampla,e tambémda prática institucionalespecífica,deixam de fora o nível propriamente político da questão, a dimensão do conflito, na forma, mais velada que contundente,como se manifesta especificamente nesse campo. Este trabalho pretende se distinguir de outros estudos já produzidossobre o mesmo tema em três aspectos: em primeiro lugar, o objeto da pesquisaé o processo de construção do património histórico e artístico no Brasil. considerado en-

quanto uma prática social produtiva, criadora de valor em diferentes direções. Valioso, trata-se, porém, de um património pesado e mudo. Pesado, não só

como observa Antõnio Augusto Arantes:

por sua monumentalidade,pela solidez dos .materiais e pelo lugar que ocupa no INTRODUÇÃO

26

O PATRIÁõNIO eA PROCESSO

27

legitimam essa produção - e sim o próprio processo de construção desse patri1...)de valor económicoque pode ser aumentadoou diminuído,dependendodo tratamento que se dê aos bens preservadoslde valor simbólico.constitutivoda memória. da territorialidadee da identidade nacional, além de outras identidades mais específicas e locais; e de valor político, levando ao aspecto da hegemoniae ao dos direitos culturais. 11988, p. 16)

mónio, ou seja, as práticasinstitucionaisdesenvolvidaspor determinadosatores, que podem ser mais ou menos democráticas. A perspectivado trabalho é primordialmente histórica: procurei montar uma narrativaa partir da qual seja possível distinguir categorias universais como me-

Nesse sentido, é importante considerar não apenas a atuação dos agentes ins-

mória, tradição, monumento. de formulações particulares - como património e

titucionais, como também a participação - direta ou indireta - da sociedade nossa

preservação - e continuidades de diferenças.

construção,ou seja, a apropriação que é feita dessa prática política pelos diferentes grupos sociais.

jcf. MEC/Sphan/FNpM, 1980). pois reflete o modo como a própria instituiçãoconta

Em segundo lugar, considero os discursos oficiais produzidos sobre o patrimó-

sua história: o que distingue a fase he/pica, que vai desde a criação, ainda em

nio como um aspecto dessa prática, por meio da qual diferentes atores, em diferentes

caráter provisório, do Sphan. em 1936, a 1967. quando termina a longa gestão de

momentos, tentam raso/ver nesse campo específico algumas das grandes questões

Rodrigo Meio Franco de Andrade, da fase moderna, iniciada com a ascensão de

que têm ocupado tradicionalmentea reflexão sociológica:a tensão entre o universal

Aloísio Magalhães na política cultural, quando se elaboram novas propostas de

e o particular, entre o público e o privado, entre tradição e modernidade, entre cultura

atuação. A gestão de Renato Soeiro (1967-1979)constitui um período.Mermediá-

e política, entre Estado e sociedade. Nesse sentido, parto do pressuposto de que uma política de preservação é uma prática bem mais ampla que um conjunto de

Em termos de periodização(ver Anexo 1), recorri a um critério já consagrado

rlo, quando o Sphan tenta se adaptar a uma nova conjuntura buscando ajuda internacional e coexistindo com outras instituições federais atuantes na esfera da pre-

servação.

atividades visando à proteção material de determinados bens. Em terceiro lugar, procuro me situar criticamento em relação às análises sobre os dois períodos em questão. Considero que os fundamentos tanto de algumas

Um pressuposto fundamental de minha reflexão é a distinção entre política estatal - no sentido da atividade concentrada e conduzida no interior do aparelho

críticas feitas, nas duas últimas décadas, ao que seria o caráter excludente e eli-

do Estado- e política pública- no sentido de articulada,Inclusivepor mecanismos

tista da construção do património realizada pelos intelectuais modernistas nos

formais,com os interessesmúltiplosda sociedade."Consideroque falar de uma

anos 30 e 40, quanto de certas objeções feitas ao trabalho desenvolvidopelo CNRC, reduzindo-oa um recurso legitimador de um regime autoritário em crise, como fru-

tos de um anacronismo,9no sentido de que analisam problemasde uma época a partir de questões e critérios formulados em outra. Por esse motivo, um dos objetivos deste trabalho é tentar a maior aproximação possível do ponto de vista dos agentes que conduziram, naqueles dois momentos decisivos, a política federal de preservação no Brasil. Ao analisar a representação do património histórico e artístico nacional construída pelo Estado, não a considero como reflexo das classes dominantes ou da pluralidade cultural brasileira. Procuro, sim, adotar uma posição de crítica ao modo como esse objeto tem sido construído e ideologicamenteelaborado por determinados sujeitos sociais, que têm detido, no Brasil, o monopólio dessa construção. Em suma, o objeto desta análise não é um produto - o conjunto de bens culturais que compõem o património histórico e artístico nacional no Brasil, ou os discursos que

28

política pública de preservaçãosupõe não apenas levar em conta a representatividade do patrimóniooficial em termos da diversidadecultural brasileira e a abertura à paRicipaçãosocial na produçãoe na gestão do património,como tambémas condições de apropriação desse universo simbólico por parte da população. E falar

em democratizaçãoimplica, nesse caso, considerarum conjunto de ações, em vários níveis, visando a desprivatizar esse campo. Essa afirmação parte do pressuposto de que os patrimónios históricos e artís-

ticos nacionais devem ser entendidos não como universos fechados, representações de uma nação una e coesa, identificada a um Estado centralizador,e sim em sua relação com práticas sociais de construçãoe de objetificaçãode identidades coletivas, que, em termos políticos, representam,em muitas oportunidades. interessesconflitantesentre si e com um prometonacional, às vezes apresentado sob a égide do /nferessepúl)/lco. Ou seja, trata-se de, ao mesmo tempo, atualizar um ponto de vista analítico - no sentido de tentar adequar a perspectivada pes-

NTRODU(AO

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

29

se exerce se for reconhecido,quer dizer, ignorado como arbitrário. Isto significa que o poder simbólico não reside nos 'sistemas simbólicos' em forma de uma #/ocuflonaryforce mas que se define numa relação determinada - e por meio desta - entre os que exercem o

quisa às condições atuais do Estado e da sociedade brasileiros, sob um regime democrático - e tentar vislumbrar possibilidades de participação social ainda não

poder e os que Ihe estão sujeitos, quer dizer, na própria estrutura do campo em que se

exploradas.''

produz e se reproduz a crença

Qual a relação, no Brasil, entre as múltiplas memóriascoletivase uma memo-

O quefaz o poderdas palavrase das palavrasde ordem,poderde mantera ordemou

ria nacional? E como é conduzida a apropriação da pluralidade cultural, enraizada

de a subverter, é a crença na legitimidade das palavras e daquele que as pronuncia,crença

cuja produção não é da competênciadas palavras.' (Bourdieu,1989, p. 14-151 A complexa relação entre cultura e política, e a questão do papel dos intelectuais enquanto homens públicos, são temas recorrentes na reflexão sociológica. Max Weber(1 982), no texto 'A política como vocação", distingue a ética da responsabilidade - em que ações são avaliadas segundo seus resultados - da ética da convicção - em que ações são avaliadas segun-

enquan tn intÊlüctuais e enquanto homens públicos."

Neste trabalho. privilegiemum período da política federal de preservação no

do sua coerênciacom valores.Para Weber, não se pode exigir do político que se exima em nome de valores,nem do sábio que ponha seu saber a serviço do poder. Em texto recente. o cientista político Norberto Bobbio(1 9931 retoma a temática weberiana das duas éticas. e a reelabora. Para Bobbio, "o compromisso primeiro dos intelectuaisdeveria

ser o de impedirque o monopólioda força se tome tambémo monopólioda verdade'. Um texto clássico sobre essa questão, mas com base em outras premissas. é o do maMsta Antõnio Gramsci(s/d.). que distingue as intelectuais tradicionais - que se acreditam "autónomos

e independentesdo grupo social dominante', mas que, na verdade, estão a serviço de grupos sociais cujo poder está em declínio- dos intelectuais orgânicos - que atuam como organizadores da hegemonia social, identificados com os interesses dos grupos emergentes. 3

Ent=n'!=i'i=li;:i': =:=" ';:;.iii:;i:=;= .:=: luto do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional (lphan).'; Resumindoo roteiro deste trabalho, no cama--l'

Por esse motivo, é pertinente considerar que essa política estatal constitui um campo, conforme a definição de Pierre Bourdieu:'Compreender a gênese social de um campo. e apreender aquilo que faz a necessidade específica da crença que o sustenta, do jogo de linguagem que nele se joga, das coisas materiais e simbólicas em jogo que nele se geram. é explicar, tornar necessário. subtrair ao absurdo do arbitrário e do não-motivado os actos dos produ-

modo

procuro explicitar o

tores e as obras por eles produzidas e não, como geralmente se julga, reduzir ou destruir.'

(1989,P.69) 4

Por exemplo, projetos voltados para a relação da cultura indígena com a questão fundiária, a especificidade do trabalho do artesão relativamente à legislação trabalhista, a adequação dos

currículos e dos períodos lesivosàs peculiaridades dos diferentes contextos culturais etc. A teoria do controle cultural. desenvolvida pelo antropólogo mexicanoGuillermo Bonfil Batalla

j1988), trata dessa questão. 5

nando-a com o contexto cultural mais ampio-

6

NOTAS

Cf. EdgardJacintho,em Memóriao/a/ # 4(MinC/Sphan/FNpM.1988), sobre os trabalhos de inventário que realizouna cidade de São João del-Rei, na décadade 1940. Exemplos interessantes de mobilização da sociedade ocorreram no tombamento do Hotel Capacabana Palace e do Parque Lage (Rio de Janeiro, RJI. da Serra da Barriga IUnião dos Palmares,AL) e do Terreiro da Casa Branca ISalvador. BAI, e, mais recentemente,no asfaltamento de área tombada em São João del-Rei(MGI e na construção de um complexo imo-

biliário na encostatombada do Morro Dois Irmãos (Rio de Janeiro, RJ).

i'iiiÍiiãÜÕ eA PROC[SS0 30

INTRODUCÃO

31

Ver as emendas que foram encaminhadas pelos senadores Élcio Alvarez IPFL-ES), Jutahy Magalhães IPSDB-BA) e Pedra Teixeira IPP-DF) e pelo deputada Germano Righotto (PMDB-

RSI, que propõem a restrição da proteção, pelo poder público. aos bens de propriedade da

-r 1}

q

União e a prévia aquiescência a esses tombamentos pelo Serviço de Patrimónioda União. 8

Ver. a respeito. o trabalho já publicado de Milet (1988), e as teses, ainda inéditas. de Gonçalves (1990). Rubino j1991) e Santos (1992).

q

Sobre o conceitode anacronismo na pesquisa histórica, diz o historiadorLuís Felipe de Alencastro: 'Ao mover-se do presente para outras épocas. e vice-versa. ao lidar com as continuidades. as passagens, as rupturas, as derivações, o historiadordeve constantemente premunir-se contra a pecado capital de sua disciplina: o anacronismo. Vestir uma determinada sociedade com as roupas talhadas em outras épocas. eis em que consiste o anacronismo.'

NOCÃO Dt

11991,p. 63) ia Essa distinção (assim como a diferençaentre coisa e valor. feita no início do capítulo l) é utilizada neste trabalho como recurso analítico, para esclarecer certos aspectos da questão do património. Na bibliografia consultada, os termos po//fica estafa/ e po/ftlca púb/lca costumam ser tomados como equivalentes. Alguns textos recentes têm abordado a questão do património nesse sentido, como a série Les l./eux de mimo/re. do historiador francês Pierre Nora(1 984-1 992). No Brasil. os traba-

lhos do antropólogoAntõnio Augusto Arantes também exploramessa perspectiva. 12

Como parte da pesquisa, foram realizadas entrevistas com atores dessa política, vlsanda a colher informaçõesde óasfldores. que não constavam dos documentos oficiais, e também

no sentido de apreendera visão que esses atires tinham das instituiçõesem que trabalhavam e da atividade por elas desenvolvida. Essas entrevistas se revelaram especialmente valiosas para a análise do período 197G-1980, e. sobretudo, da atuação do Centro Nacional

de ReferênciaCultural (CNRC), dada a carência de material documentalarquivadosobre essa instituição e sobre as iniciativas e cantatas feitos por Aloísio Magalhães e seus colaboradores. Foram realizadas entrevistas com Lúcio Costa, Lígia Marfins Costa. Judith Martíns. Dará e Antõnio Pedra Alcântara, Embaixador Vladlmir Murtinho, Clara de Andrade Alvim. José

SirvaQuintas,Luís Felipe Perret Serpa. PautaSérgio Pinheiro. Contribuíramtambémcom informaçõesvaliosas Mana Allce Siaines de Castro. Ann-Mal BeckmanMeirelles,Ana Gita de Oliveira e Helena Mussi. 13

A instituição federal encarregada da proteção do património histórico e artístico nacional foi criada em 1936 jainda em caráter experimental) com o nome de Serviço do Património Históri-

co e Artístico Nacional (Sphanl. Em 1946 passou a se chamar Departamento IDphanl e, em 1970, se transformou em Instituto jlphan). Com a reforma institucionalocorrida no MEC em 1979, é criada a Secretaria do Património Histórico e Artístico Nacional (Sphan). que. com a criação da Secretaria da Cultura em 1981, se converteu em Subsecretaria. Com a criação do Ministério da Cultura em 1985 voltou a ser Secretaria. e foi extinta por decreto do governo Collor em 1990. Foi então criado o Instituto Brasileiro do Património Cultural

jIBPC) que, em 1994.voltou a se chamar lphan (ver Anexo l).

32

PARTI

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

PATRIAÕNIO

CARACTERÍSTICAS E HISTÓRIA

CAPITULO l O PATRIAONIO: UAA QU{ISTAO DE VALOR

Não imporá quais sejam os direitos de propriedade, a destruição

de urraprédio histórico e monumentalnão deve ser permitidaa esses ignóbeis especuladores, cujo interesse os cega para a honra. (-.) Há duas coisas num edifício: seu uso e sua beleza. Seu uso pertence ao proprietário,sua beleza a todo o mundos destruí-loé, portanto, extrapolar o que é direito.

VectorHugo

A questão dos patrimónios históricos e artísticos nacionais costuma ser abordada tendo como foco o conjunto de objetos que os constituem. ou. quando muito. os discursos que os legitimam. Neste trabalho, o centro da investigação serão os processos e as práticas de construção desses patrimónios, conduzidos por atores definidos e em circunstâncias específicas. São essas práticas e esses atores que

atribuem a determinados bens valor enquanto património, o que justificaria sua proteção. Nesse sentindo,é a noção de valor que servirá de base a toda a reflexão

aqui desenvolvida,pois consideroque são esses processosde atribuiçãode valor que possibilitam uma melhor compreensão do modo como são progressivamente construídos os patrimónios. Na medida em que um dos traços que diferencia as sociedades simples das sociedades complexas é a existência, nestas últimas, de um aparelho estatal, com regras próprias e maior ou menor autonomia em relação aos diferentes grupos so-

ciais e, conseq(lentemente,à distinção entre memórias coletivas diversificadase uma memória nacional, neste capítulo procuro analisar o modo específico de construção do universo simbólico dos patrimónios culturais nacionais: a sua constituição, a partir de um estatuto jurídico próprio, a sua proposição,como uma forma de

comunicaçãosocial, e a sua institucionalização,enquanto objeto de uma políti-

ca pública.

No artigo "A história da arte'. Gíulio CarãoArgan' parte de uma distinção entre coisa e valor - que servirá de base para a discussão, neste capítulo, da noção de património:

çalves (1990), esses bens viriam objetivar, conferir realidade e também legitimar

essa "comunidadeimaginada' Essa relação social, mediada por bens, de base mais afetiva que racional e

Uma vez que as obras de arte são coisas às quais está relacionado um valor, há

relacionada ao processo de construção de uma identidade coletiva - a identidade

duas maneiras de trata-las. Pode-se ter preocupação pelas coisas: procura-las. identificá-

nacional - pressupõe um certo grau de consenso quanto ao valor atribuído a esses

las, classifica-las, conserva-las, restaura-las. exibi-las, compra-las, vendê-lasl ou, então, pode-seter eh mente o valor: pesquisar em que ele consiste. como se gera e transmite,

se reconhecee se usufrui.j1992a, p. 13)

bens, que justifique, inclusive,o investimento na sua proteção. No caso dos patrimónios, essa capacidade de evocar a idéia de :nação decorreria da atribuição, a

esses bens.de valoresda ordem da cultura - basicamenteo históricoe o artístico.

Essas duas maneiras de abordar os fenõmonos artísticos ocorrem também no

A noção de património é, portanto, datada, produzida, assim como a idéia de na-

tratamento dos chamados bens pafrlmonlaé. É próprio das políticas de preserva-

ção, no final do século XVlll, durantea RevoluçãoFrancesa,e foi precedida,na

ção estarem voltadas para as coisas e mesmo serem absorvidas por elas. A ne-

civilização ocidental. pela autonomização das noções de arte e de história. O his-

cessidade de resistira pressõesno sentidoda destruição jtanto por fatoresnatu-

tórico e o artístico assumem, nesse caso, uma dimensão instrumental, e passam

rais como humanosl. aliada à responsabilidade. inclusive penal, do Estado e de

a ser utilizadosna construçãode uma representação de nação.Já dizia Guizot.

eventuais proprietários, em relação aos bens tombados, faz com que o objetivo

no século XIX, que o solo da França é simbolizado por seus monumentos.:

dessas políticas acabe se reduzindo à proteção de bens, convertendo-se assim

Enquanto prática social, a constituição e a proteção do património estão assentadasem um estatutojurídico próprio. que torna viável a gestão pelo Estado, em nome da sociedade.de determinadosbens, selecionadoscom base em certos

as coisas no objeto principal da preocupação dos atires envolvidos.

Consequentemente, o valorculturalquese atribuia essesbenstendea ser naturalizado,sendo considerada sua propriedadeintrínseca, acessível apenas a um olhar qualificado. Essa costuma ser a visão do técnico, do restaurador,dos responsáveis, enfim, pela conservação da integridade material dos bens. mas termina por predominar também entre os formuladores daquelas políticas.

critérios. variáveis no tempo e no espaço. A norma jurídica, nesso caso, funciona

como linguagem performativade um modo bastante peculiar: não apenas define direitos e deveres para o Estado e para os cidadãos como também inscreve no espaço social determinadoscones, figurações concretas e visíveis de valores que se

quer transmitir e preservar.

Entretanto, considero que uma política de preservação do património abrange

A seguir, com base na idéia de património tal como é formulada em toxtos jurí-

necessariamenteum âmbito maior que o de um conjunto de atividades visando à

dicos brasileiros,' vou procurar especificaro modo como, no Brasil, se constituiu

proteção de bens. Ê imprescindível ir além e 'questionar o processo de produção

essa noção enquanto fato jurídico e enquanto fato social.

desse universo que constitui um património, os critérios que regem a seleção de

bens e justificam sua proteção; identificar os atires envolvidos nesse processo e os objetivos que alegam para legitimar o seu trabalhosdefinir a posição do Esta-

1.1 A NOÇÃO DE PATR]AÕNEO COPO CATEGORIA ]URÍDtCA Em termos jurídicos. a noção de património histórico e artístico nacional é re-

do relativamente a essa prática social e investigar o grau de envolvimento da socie-

ferida pela primeiravez no Brasil (embora não exatamentecom essa denomi-

dade. Trata-se de uma dimensão menos visível, mas nem por isso menos signi-.

nação), como sendo objeto de proteção obrigatória por parte do poder público, na

ficativa, das políticas de preservação.

Constituição de 1934. Diz o art. 10 das disposições preliminares:

No caso dos patrimónios históricos e artísticos nacionais, o valor que permeia

Art. 10 - Compete concorrentemente à União e aos Estados:

o conjunto de bens, independentemente de seu valor histórico, artístico, etnográfico etc., é o valor nacional. ou seja, aquele fundado em um sentimento de pertencimento a uma comunidade, no caso a nação. Como observa José Reginaldo Gon-

36

O PATRIAõN IO [A

111.proteger as belezas naturais e os monumentos de valor histórico ou artístico. po dendo impedir a evasão de obras de arte.

PROCESSO

O PATRIAÕNIO: UAA QUESTÃODE VALOR

37

E, no entanto,somentecomo decreto-lei RQ25, de 30 de novembro de 1937. que se regulamenta a proteção dos bens culturais no Brasil. Esse texto. além de explicitar os valores que justificam a proteção. pelo Estado, de "bens móveis e

imóveis', tem como objetivo resolver a questão da propriedade desses bens. Desde então, todas as Constituiçõesbrasileiras têm ratificado a noção de património em termos de direitos e deveres, a serem obsewados tanto pelo Estado como pelos cidadãos.4

turais, mencionadosno art. 215 da Constituiçãode 1988 e reconhecidospela Unesco, desde 1948, na Declaração Universal dos Direitos do Homem. O direito, portanto, além de ter por objeto interessesque se realizamdentro

do círculo da economia,volta-setambém para interessesoutros.tanto do Indivíduo, quanto da família e da sociedade. São os direitos meta-individuais,que têm

como titular não o indivíduo. mas uma coletividade mais ou menos abrangente. Entre esses interessesfigura o interesse público de que fala o art. le do decreto-

A primeira linha de reflexão que desenvolveremdiz respeito à questão do valor.

lei Re25. de 30.11.37.Pelascaracterísticas do sujeitodessetipo de interesse-

Em todos os textos jurídicos, é o valor cultural atribuído ao bem que justifica seu

indeterminado (a sociedade nacional. a humanidade etc.) - do seu objeto - fluido

reconhecimentocomo património e, conseqilentemente, sua proteção pelo Estado.

(a identidade nacional, a qualidade de vida, o meio ambiente etc.) e, também, pela

A segunda linha de reflexão - vinculada à primeira

-

remete especificamente

intensa litigiosidade de seus parâmetros e pelo caráter mutável de seu conteúdo

ã questão da propriedade, crucial nas implicações práticas do instituto do tomba-

jcf. Mancuso, 1991, p. 67-80), o interesse público se insere na categoria dos inte-

mento. sobretudo quando consideramos que a maior parte dos bens que compõem

resses difusos.

os patrimónios. e, certamente, os mais significativos, são bens arquitetõnicos. Na

O próprio direito à propriedade - enquanto direito do indivíduo, consagrado

medidaem que são consideradosde interesse público,os bens tombados se con-

pelo Direito romano. fonte para o Direito brasileiro - é. no Código Civil Brasileiro,

vertem, em certo sentido, em propriedade da nação, embora não percam seu caráter de mercadorias apropriáveis individualmente

limitado pelo que seria a função social da propriedade, regulamentada pela legisla-

O instituto do tombamento - dispositivo por meio do qual, no decreto-lei Rg25.

pode contrapor a outros valores, não-económicos, de interesse geral, e, por isso.

de 30.11.37,se efetiva a proteçãode bens culturais pelo Estadono Brasil - incide

o exercício desse direito é tutelado pela administração pública.

sobre o sistemade valores dos bens por ele atingidose sobre o estatuto da pro-

No caso específicodo bem tombado, a tutela do Estado recai sobre aqueles

priedade desses bens de forma peculiar, específica. Para entender essa especificidade, é preciso retomar a distinção referida por Argan entre coisa e valor.s

aspectos do bem considerados de interesse público - valores culturais, refe-

Do ponto de vista jurídico - e para fins de regulamentaçãodo direito de propriedade -, tanto o Código Civil como o Código Penal brasileiros distinguem bens

ri

ção. Nesse sentido, o exercício do direito de propriedade sobre as coisas não se

materiais,ou coisas,de bens imateriais.O Direito das Coisas,no CódigoCivil, "trata da coisa, enquantovalor económicoapropriávelindividualmente,e de suas relações privadas' (Castro, 1991, p. 25). Distingue a coisa, apropriável, dos bens ima-

teriais, não económicos,que, no dizer do jurista Clóvis Bevilacqua, "são irradiações da personalidadeque, por não serem suscetíveisde medida de valor. não fazem parte de nosso património' (apud Castro, 1991, p. 34) Esses bens imateriais, ou valores, são objeto específico, por exemplo, do Título 111do Código Penal de 1940. Do ponto de vista jurídico, são inapropriáveis indi-

vidualmente- à diferença dos bens materiais - e a relação dos indivíduos com

rências da nacionalidade.O valor patrimonial é qualificado no texto legal: "quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico. bibliográfico ou artístico" (art. le decreto-lei ne 25, de 30.11.371.De acordo com o mesmo texto, o agente encarregado

da atribuiçãodessevalor, para fins de tutela pública, é a autoridadeestatal competente - no caso, o Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional. através de seu Conselho Consultivo.

Cabe ao poder público, portanto, exercer tutela no sentido de proteger "os valores culturais ínsitos no bem material, público ou particular. a cujos predicamentos, particularidades ou peculiaridades é sensível a coletividade e importa defender e conservar em nome da educação, como elementos indicativos da origem.

da civilização e da cultura nacionais' (Rocha. 1967, p. 31).

esses bens se expressaJuridicamentesob a forma de direitos: o direito à liberda-

Esse é. /afo senso, o objetivo das políticas de presewação: garantir o direito

de, à vida, à instruçãoetc. Nessalinha se inscreveriam tambémos direitoscul-

à cultura dos cidadãos, entendida a cultura. nesse caso, como aqueles valores que indicam - e em que se reconhece - a identidade da nação.

38 O PATRIAõNIO eA PROCESSO O PATRIIIONIO: UAA QUESTÃODE VALOR

39

Entretanto, embora a proteção incida sobre as coisas, pois estas é que cons-

deraçãoo fato óbvio de que os significadosnela não estão contidos,nem Ihe são

tituem o objeto da proteção jurídica, o objetivo da proteção legal é assegurar a

inerentes: são valores atribuídos em função de determinadas relações entre atores

permanênciados valores culturais nelas identificados. Esses valores só são alcan-

sociais, sendo, portanto. indispensável levar em consideração o processo de pro-

çáveis através das coisas, mas nem sempre coincidem exatamente com unidades

dução, de reprodução, de apropriação e de reelaboração desses valores enquanto

materiais. Essa distinção se torna mais clara quando consideramos o tombamento

processo de produção simbólica e enquanto prática social.

de conjuntos, seja de bens móveis (por exemplo, coleções de museus) ou imóveis

aporexemplo. centros históricos). Nesses casos, o objeto do tombamentoé um

1.2 0

PAÍRIAÕN10 COPO rORW DE COAUNICACÃ0 SOCiAl

único valor - o bem coletivo (no sentido gramatical do termo, de conjunto de uni-

O universo dos patrimónios históricos e artísticos nacionais se caracteriza

dades), embora materializado em uma multiplicidade de coisas, geralmente hete-

pela heterogeneidade dos bens que o integram, maior ou menor conforme a con-

rogeneas.

cepção de patrimónioe de cultura que se adote: igrejas, palácios, fartos, chafa-

No caso do património,os valores não económicosa serem protegidos(valo-

rizes, pontes. esculturas, pinturas, vestígios arqueológicos, paisagens, produções

res culturais) estão inscritos na própria coisa, em função de seu agendamento

do chamado artesanato, coleções etnográficas, equipamentos industriais, para não

físico-material, e só podem ser captados através de seus atributos. Mas. com o

falar do que a Unesco denomina património não-físico ou imaterial - lendas, can-

tombamento,o bem não perde o valor económicoque Ihe é próprio, enquanto coisa,

tos, festas populares,e, mais recentemente,fazeres e saberes os mais diversos.

passível da apropriação individual. Por esse motivo, é preciso regular mais rigida-

mente ainda, nesse caso, o exercício do direito de propriedade.

Essa enumeração, propositalmentecaótica, visa a chamar a atenção para o fato de que os bens enumerados acima pertencem, enquanto signos, a sistemas

Sobre o mesmo bem, enquanto bem tombado. incidem, assim. duas modalida-

de linguagem distintos: à arquitetura, às artes plásticas, à música, à etnografia,

des de propriedade: a propriedade da coisa. alienável, determinada por seu valor

à arqueologia etc. Cada um desses sistemas tem, por sua vez, suas especifici-

económico. e a propriedade dos valores culturais nela identificados que. por meio

dades e seu modo próprio de funcionamento enquanto código. Além disso. esses

do tombamento, passa a ser alheia ao proprietário da coisa: é propriedade da nação, ou seja, da sociedade sob a tutela do Estado.

bens cumprem funções diferenciadas na vida económica e social.

Esse duplo exercício de propriedade sobre um mesmo bem gera, obviamente.

Do que foi dito acima, pode-se deduzir que o que denominamos património constituí um discurso

de segundo grau: às funções e significados de determinados

uma série de problemas, pois o exercício de um tipo de propriedade limita neces-

bens é acrescentadoum valor específico enquanto património,o que acarreta a res-

sariamente o exercício do outro. É evidente que os conflitos de interesses - sobre-

semantização do bem e leva a alterações no seu sistema de valores. O processo

tudo entre o interesse público e o privado - ficam, nesse caso, mais agudos,

de seleção desses bens é conduzido por agentes autorizados - representantes do

mesmo porque o chamado valor cultural de um bem não é regulado por um mer-

Estado, com atribuições definidas - e dentro de categorias fixas, a pdorf definidas.

cado específico, mas se define no nível da "economia das trocas simbólicas'.

relacionadasa determinadas disciplinas (arte, história, arqueologia. etnografia etc.l.

De tudo que foi dito, fica claro que o âmbito de uma política de preservação do património vai muito além da mera proteção de bens móveis e imóveis em sua feição material. pois. se as coisas funcionam como mediação imprescindível dessa atividade, não constituem, em princípio, a sua justificativa, que é o interesse pú-

No caso brasileiro, essas categorias são os valores especificados no decretolei Rg25, de 30.11.37.' A essas categorias se superpõe uma categoria unificadora.

a de valor nacional. Os signos referidos funcionam antes como símbolos, no sentido saussuriano

blico, nem seu objeto último,que são os valoresculturais.E, se os valoresque se

do termo. Para Saussure j1969, p. 101), o símbolo nunca é inteiramente arbitrário,

pretende preservar - conformeestá explícitona abordagem jurídicada questão-

ele não é vazio, pois é construídocom base em uma motivaçãocultural.O símbolo

são apreendidos na coisa e somente nela, não se pode deixar de levar em consi-

da justiça não poderia ser uma carruagem.

40

O PATRIAõNIO [A

PROCESSO

O PATRIAÕNIO: UIVA QUESTÃODE VALOR

41

«

b.

H No caso dos bens patrimoniais.os atributos da coisa são consideradosvalo-

dos códigos utilizados - no caso, as diferentes linguagens-. como também que

res culturalmente relevantes, excepcionais. No caso do Brasil, determinados bens

tenha acesso a um determinadouniverso cultural. No caso do patrimónionão bas-

como igrejas dos séculos XVll e XVlll, casas de câmara e cadeia, fortes. palácios.

ta, portanto, selecionar e proteger criteriosamente um conjunto de bens. E preciso

sedes de fazendas etc. foram erigidos pelos agentesdo Sphan em símbolos da

que haja sujeitos dispostose capazes de funcionarem como interlocutoresdessa

nação por sua vinculação a fatos memoráveis mas, sobretudo. por suas qualidades

forma de comunicaçãosocial, seja para aceita-la tal como é proposta, seja para

construtivas e estéticas. Cabe, portanto, recorrer à noção de símbolo, pois haveria

contesta-la, seja para transforma-la.

uma motivação, baseada na cultura, na constituição desses símbolos.

O que quero dizer é que a proteção da integridade física dos bens patrimoniais

Pode-se concluir que os patrimónios funcionam como repertórios nos termos

não é por si só suficientepara sustentaruma política pública de preservação.Isso

da definição de Umberto Eco: "um repertório prevê uma lista de símbolos, e even-

porque a leitura de bens enquanto bens patrimoniais pressupõe as condições de

tualmente fixa a equivalência entre eles e determinados significados' (1987, p. 40).

acesso a significações e valores que justifiquem sua preservação. Depende, portan-

Neste ponto, quero chamar a atenção para a distinção- até o momento não

to, de outros fatores além da mera presença, num espaço público,de bens a que

explicitada - entre bem cultural e bem patrimonial. A intermediação do Estado no

agentes estatais atribuíram valor histórico, artístico etc., devidamenteprotegidos

segundo caso, através de agentes autorizados e de práticas socialmente definidas

em sua feição material.

e juridicamente regulamentadas, contribui para fixar sentidos e valores, priorizando

Essa dimensão da questão do património - ou seja, a consideração dos bens

uma determinada leitura: seja a atribuição de valor histórico, enquanto testemunho

do ponto de vista de sua recepção- não costuma ser abordada,a não ser even-

de um determinado espaço/tempo vivido por determinados atoresl seja de valor

tualmente,pelos agentesinstitucionais.Normalmente,é do pontode vista da pro-

artístico, enquanto fonte de fruição estética, o que implica também uma modalidade

dução dos patrimóniosque a questão é tratada. seja na afirmaçãodo valor nacio-

específica de conhecimentosseja de valor etnográfico, enquanto documento de

nal dos bens tombados - tónica do discurso oficial -, seja na crítica ao modo como

processos e organizações sociais diferenciados.

são selecionadosesses bens. Entretanto,poucos se voltam para a análise do mo-

Ao se considerarum bem como bem cultural,ao lado de seu valor utilitário

do e das condições de recepção desse universo simbólico pelos diferentes seto-

e económico(valor de uso enquanto habitação, local de culto, ornamentoetcl e

res da sociedade nacional - questão que é particularmenteimportanteno Brasil,

valor de troca, determinado pela mercado), enfatiza-se seu valor simbólico, en-

onde a diversidadecultural é imensa. a escola cumpre muito precária e limitada-

quanto referência a significações da ordem da cultura. Na seleção e no uso dos

mente uma de suas funções principais, que é a de formar cidadãos com uma base

materiais, no seu agendamento, nas técnicas de construção e de elaboração, nos

cultural comum. e onde o hábito de consumo de bens culturais é incrivelmente

motivos, são apreendidasreferências ao modo e às condições de produção desses

restrito. Por esse motivo. qualquer proposta de democratização da política de

bens, a um tempo. a um espaço, a uma organização social, a sistemas simbó-

preservaçãoque não leve em conta essa realidadecorre o risco de cair no vazio,

licos. No caso dos bens patrimoniaisselecionadospor uma instituiçãoestatal,

na medida em que os valores culturais que se quer preservar- fundados,como

considera-se que esse valor simbólico refere-se fundamentalmente a uma iden-

já foi observado,nas noçõesde arte e de história- só fazem sentido para um pe-

tidade coletiva, cuja definição tem em vista unidades políticas (a nação, o estado,

queno grupo. Outro problema,na mesma linha mas em sentido inverso, é a leitura

o município).

que as classes cultas fazem da cultura popular, em geral a partir de uma pers-

Assim como ocorre na literatura. portanto, e nas artes em geral, para que determinados bens funcionem enquanto património é preciso que se aceite uma

pectiva folclorizanteque enfatiza o exotismo ou a discutível categoria da autenticidade.7

convenção: que esses bens constam determinadas significações - ou seja, que

Por esse motivo.vale a pena consideraresse aspectoda questão.ou seja.

se entre no jogo, aceitando suas regras. Isso significa que o interlocutor deve ter

o processo de apropriação dos bens patrimoniais. Para Roger Chartier (1988).

condições de participar do jogo não só na medida em que tenha algum domínio

todo receptoré. na verdade, um produtor de sentido, e toda leitura é um ato de

42

O PÂTRIAÕNIO

[A

PROCESSO

O PAIRIÁÕNIO: UAA QU[SIÀO DE VALOR

lm

apropriação.As significações produzidas pelas diferentes leituras podem, inclu-

A democratização da apropriação não deve, no entanto, ser entendida como

sive, estar bem distantesda intenção ou do interesse do autor da obra - ou, no

mera difusão das significações produzidas pelos agentes institucionais. Como

caso dos bens patrimoniais,das significaçõese valores que os agentes estatais autorizados lhes atribuíram enquanto património.

observa Roger Chartier. uma abordagem que leve em conta a comple'xidade do

De um lado, é evidente que esses bens serão tanto mais nacionais quanto maior for o númerode pessoasque os identifiquecomo património.Por outro lado,

feitos dos mesmos bens, o que possibilita, inclusive, sua apropriação diferenciada

esse consenso não significará necessariamenteque todos fazem a mesma leitura

Por outro lado, esse tipo de abordagem vai evidenciar os limites que se interpõem

do bem. SÓ para dar um exemplo bastante óbvio. a igreja do Senhor do Bonfim,

a essa apropriação. e que decorrem da dificuldade de acesso, para grupos sociais

em Salvador,será valorizadapor alguns por suas qualidadesestéticas,por ou-

culturalmente desfavorecidos (entendidaaqui culturacomo as informações, e ex-

tros, como local de culto católico, por outros ainda, como palco para rituais de

periências veiculadas primordialmente pela educação formal). ao consumo e aos

candomblé,e pelos turistas, muito provavelmentecomo um dos símbolosda capi-

códigos de leitura dos bens patrimoniais.

tal da Bahia.

processo de recepção vai chamar a atenção para os usos diferenciados que são

pelos grupos sociais, mesmo em situação de desigualdade económica e social.

Essa perspectiva não impede que as diferenças sejam identificadas (Inclusive

O que quero dizer é que, por mais regulamentadoe controladoque pretenda

as diferenças com raízes económicas e sociais), mas desloca a sua própria esfe-

ser o processode construçãodos patrimónios,e por mais fixos que possam pare-

ra de identificação, uma vez que não implica a qualificação social das obras como

cer os efeitos de um tombamento, tanto materiais como simbólicos, a recepção dos bens tombados tem uma dinâmica própria em dois sentidos:primeiro, no da

caracteriza as práticas que se apropriam. distintivamente, dos materiais que circu-

mutabilidadede significações e valores atribuídos a um mesmo bem em diferentes

lam numa determinadasociedade (Chartier, 1988, p. 233).

momentos históricos - mudança que diz respeito inclusive às próprias concepções

um todo("arquiteturaluso-brasileira',"artesanato',"arte popular etc.l. Em vez disso,

As análises centradas no processo de construção dos patrimónios são impor-

do que seja histórico, artístico etc.l segundo, no da multiplicidade de significações

tantes, na medida em que procuram desvendar o modo como determinados intelec-

e de valores atribuídos, em um mesmo momento e um mesmo contexto, a um mes-

tuais, em nome do Estado, concebem a "identidade nacional". Mas, uma vez que

mo bem, por grupos económica, social e culturalmente diferenciados.

o interesse na questão do património seja o de entender o processo específico

ou menos recente,e decorrede circunstânciasespecíficas.que serão abordadas

de circulaçãodos bens patrimoniaisnumasociedade.a consideração do vértice da recepçãoé Indispensável, tendoem vista o caráterdinâmicoe ativo de qual-

no próximo capítulo. O que interessa ressaltar aqui é que é imprescindívellevá-

quer apropriaçãosocial. Apenas quando esse aspecto é devidamenteincorporado

las em conta na formulação de uma política de preservação.

à políticaestatal é que se pode falar em uma políticapública.

A percepção dessas dinâmicas relativamente ao património é fenómeno mais

O fato é que as análisescríticas das políticasde preservaçãotêm dado ênfase ao processode construçãodos patrimónios.visando a chamar a atenção para sua

1.3 0

PATRiAÕN10COAM 0üJ[T0 DE

UU POLÍTICA PÚBLICA

utilização como instrumento ideológico de legitimação do poder estatal. Ao critica-

Para Oscar Ozlack e Guillermo O'Donnel. as políticas estatais seriam "alguns

rem o seu caráter elitista, atribuem-noapenas ao processo de seleção de bens,

acordesde um processosocialtecido em torno de um tema ou questão"(1976, p.

excludente, e que privilegia os monumentos identificados com a cultura dominante -

17). Para Jobert e Mulher,as políticas públicas constituem "tentativas de gerir uma

que, no caso do Brasil, é a cultura luso-brasileira.Conseqüentemente, as pro-

relaçãoentre um setor e a sociedade global" (1987, p. 521. Em ambas as definições,

postas visando a democratizaro patrimóniose centram no vértice de sua cons-

pressupõe-se um "Estado em ação', distinto da imagem de um Estado uno, que se

trução - ou seja. na ampliação do conceito de patrimónioe na participação da

apresenta como identificadoà nação. de que garantiria a coesão. Nessa imagem -

sociedadena constituiçãoe no gerenciamentodesse património.Fica de fora a

a do Estado como um organismo que regula os movimentos da sociedade - Estado.

questão da democratizaçãoda apropriação simbólica desses bens.

nação e sociedade praticamente se fundem no imaginário social.

44

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

O PÀTRIAONIO: UAA QU[SIÁO DE VALOR

45

A idéiade um "Estadoem ação' implica,no entanto,a heterogeneidade, a luta de poder e o conflito de interesses. mesmo dentro da burocracia estatal.

difusas e costumamse concentrar em grupos restritos. também os objetivos dessas políticas nunca são claramente apresentados, tanto nos discursos oficiais

Logo, analisar o "Estado em ação' significa levar em conta sua dinâmica inter-

quanto em definições formuladas em outras instâncias.' Nesse sentido, é mais

na, a partir das ações de diferentes sujeitos, tornando-se difícil recorrer, nesse

proveitoso verificar como diferentos linhas de pensamento político elaboram uma

nível, a modelos analíticos que o reduzam a um instrumento de classe, a gestor

prática política nesse campo

da ordem social, a promotor do desenvolvimento, ou a qualquer outra concepção

que neutralize os inevitáveis antagonismos, tanto do Estado com a

sociedade

quanto internamente, na máquina estatal.

Numa perspectivaliberal, cabe à sociedade produzir cultura. Ao Estado, cabe apenas garantir as condiçõespara que esse direito possa ser exercido por todos os cidadãos. Para Norberto Bobbio (1977), essas condições são, basicamente,o

A imagem que se tem da política federal de presewação no Brasil contradiz

reconhecimentoe o respeito a valores como a liberdade (enquanto ausência de

essa afirmação.A ídéia de uma ação política monolítica,conduzidapraticamente

impedimentosfísicos e morais), a verdade (enquantoespírito crítico, em oposição

sem contestações pelo Estado, em nome do interesse público, foi, inclusive, refor-

ao dogmatismo. à intolerância e às falsificações) e a confiança no diálogo.

çada pela aura que, até hoje. envolve a fase heróica do Sphan. Entretanto,como

Bobblo faz um distinção entre política cultural e política da cultura. A primeira

a trajetória dessa política estatal veio demonstrar, essa foi apenas uma entre dife-

é a planificaçãoda culturafeita pelos políticos, em que a cultura figura como ins-

rentes orientações possíveis - e que, na época, se impôs sem maiores dificul-

trumento para alcançar fins políticos. A segunda é a política dos homens de cultu-

dades. como a mais apropriada - para se elaborar a questão da identidade na-

ra, voltada para garantir as condições de desenvolvimentoda cultura e o exercício

cional na constituição de um património histórico e artístico.

dos direitos culturais.

Partindo do pressuposto de que essa imagem é formada com base em uma

Se, na perspectiva liberal, cabe ao Estado simplesmente assegurar o espaço

situação conjuntural - o modo como essa política vem sendo conduzida no Brasil.

para a produção e o consumo de bens culturais. numa perspectivasocialista o Estadoliberal constituiriaum instrumentode classe. Nesse sentido, o que Bobbio

o que uma análise comparativa com outras políticas pode comprovar -, propusme, neste trabalho, a abordar essa política estatal na sua relação com a sociedade.

denominou po//rica de cu/fura seria inviável numa sociedade de classes.

procurando apreender, ainda que nos limites de uma prática específica - os tom-

Consideroque a posturaliberal é irrefutáveldo pontode vista de seus prin-

bamentos- a presença de outros atores que não apenas os agentes institucionais.

cípios. mas, no caso brasileiro,seus pressupostoscolidemcom uma realidade

Pois é evidente que, se essa política foi instaurada e se mantém há mais de

em que a cidadaniaainda não é um bem coletivo. Nesse caso, a formulaçãode

cinqüenta anos, é porque atende a algum tipo de demanda social mais ampla.

uma política cultural democrática(atributo que tanto os liberais quanto os socia-

Na pesquisa, procurei seguir os passos discriminados tanto por Ozlack e O'Donnel

quanto por JobeR e Mulherpara a análise de políticas públicas: a definição da questão e do modo como ela se tornou politicamente relevante, passando a ser objeto de uma política públicas a discriminação dos atores envolvidos, estatais e não-estatais, de sua inserção social e das lideranças que assumem o setorl os recursos a que esses atores recorrem para legitimar essa política, ou seja, a rela-

ção de um prometo setorial com um prometoglobal para a naçãol os instrumentos utilizados na sua implementação.

listas defendem em suas propostas) implica uma atuação necessariamentemais ativa e abrangente do Estado. Trata-se não só de defender determinados valores,

como de criar condições para implementá-losnuma sociedade onde os direitos mínimos da cidadania, na prática, são exercidos por poucos- Ou seja, considerar

todos os cidadãoscomo homensde cultura, assimcomo propunhaGramsci,em condições de exercer os direitos culturais. e atuar no sentidode converter esse princípio- que no caso do Brasil é ainda um ideal - em realidade. Na verdade, a implementação de uma proposta como essa - desafio que vem

sendo enfrentadosobretudo no âmbito das secretarias municipais de cultura' No conjunto das políticas implementadas pelo Estado, as políticas culturais se

distinguempelo tema. Mas, assim como as demandasnessa.área são bem mais

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

requer um esforço prévio, uma atuação didática no sentido de sedimentar uma

nova cultura política.

O PATRIÁÕNIO: UIVA QUESTÃODt VALOR

47

N

b Se essa orientação tem se mostrado complexa no âmbito municipal, que dirá

NOTAS

uma proposta de democratização como a formulada pela política federal de cultura Historiador e crítico de arte italiano. catedrático de História da Arte da Universidade

no início dos anos 80, ainda em plena vigência do regime militar. Naquele momen-

de Romã. Trabalhou de 1933 a 1955 na Administração Estatal do Património Artístico. Foi eleito prefeito da cidade de Romã, em 1976, e senador pelo Partido Comunis-

to, além da fragilidade dos mecanismos institucionais do representação política. que só então começavam a ser reorganizados,e das formas de participaçãosocial,

ta Italiano.em 1983.

especificamentena área da cultura ja não ser entre alguns produtores culturais, como os cineastas), ínexistiam mecanismos de mediação entre Estado e socieda-

Sobre a relação entre a história e as ideologias políticas, disse, em entrevista,o his-

de, e era praticamenteimpossível identificar atores sociais constituídosem torno

toriador Eric Hobsbawm: "A história é a matéria-prima para ideologias nacionalistas, étnicas

de causas culturais. Ficava no ar a pergunta (e, para alguns, a suspeita) sobre

ou fundamentalistas,da mesma maneira como as papoulas são a matéria-primapara os viciados em heroína. O passado é um elemento essencial, talvez até mesmo o ele-

o sentido dessa proposta: idealismo de alguns agentes institucionais.instrumen-

mento essencial nestas ideologias. Quando não existe um passado adequado. ele

talização da cultura por um governo em crise de legitimidade ou estratégia política

sempre pode ser inventado.' 10 Estado de São Pau/o. 16 jan. 1994. Especial Do-

de resistência, possível num setor à margem dos grandes interesses do capital?

mingo,p. D61

Independentementeda resposta que se dê a essas indagações, o fato é que, como observa Chantal Mouffe (1988, p. 95), a mora enunciação, através de discursos, de determinados princípios e direitos - como o direito à igualdade - cons-

titui fator que viabiliza a constituição de novos sujeitos sociais (por exemplo, os

escravos como"homens',as mulherescomo"cidadãs" etc.) e a transformação de relações de subordinação em antagonismos. Nesse sentido, nos anos que se seguiram à formulação da proposta da Secretaria da Cultura do MEC, em 1981. ficou

3

Embora algumas das observações que se seguem tenham interesse geral - na medida em que se aplicam a outros contextos nacionais - elas dizem respeito apenas ao modo como, no Brasil, é construída juridicamente a noção de património histórico e artístico nacional.

Cf. Barbuy. 1989, sobre as menções, nas Constituiçõesbrasileiras,relativas à cultura Lembro que essa distinção- entre coisa e valor - é referida aqui apenas na medida

evidente que essa proposta veio atender a uma demanda social de valores demo-

em que é útil como recurso para a compreensãoda noção de património.Não se têm em mente dois termosindependentese sim duas faces de uma mesmamoeda,

cráticos, na medida em que seu discurso foi incorporado pelas mais diversas ins-

como o par significante/significado,

tâncias,

e foi absorvido pela Constituição de 1988.

em ling(mística.

Entretanto. se partiu da área federal uma primeira reivindicação pela democra-

Para fins de inscrição dos bens tombados, devem-se considerar os quatro Livros do Tombo: Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, Livro Histórico, Livro de Be-

tização da política cultural, na prática têm sido os órgãos municipais que vêm

las Artes e Livro de Artes Aplicadas.Esse último livro se acha em desuso.e dele

implementando com maior visibilidade propostas nesse sentido. E, passados vá-

constam apenas quatro inscrições.

rios anos da elaboraçãodo documento l)/refrües para operaclona/izaç;ão da po/Ê

fica cu/fura/do MEC(1981),fica no ar a pergunta: quala propostahoje- emface

Foi no sentido de reelaborar criticamente esses tipos de leitura que vários proletos do CNRC abordaram manifestações de cultura popular. A partir dessa mesma visão

de uma realidade politicamente outra, embora social e economicamente ainda for-

foram consideradas as manifestações das diferentes etnias.

temente marcada pela desigualdade - da área federal para a cultura, em geral, e para o património, em particular?

Sobre essa questão, sintetiza Eunice Durham: "de um lado, é necessário eliminar

Esse trabalho não pretende - nem seria de sua atribuição - oferecer resposta

as barreiras educacionais e materiais que impedem a maioria da população de ter acesso aos bens culturais. que são monopolizadospelas classes dominanteslde ou-

a essa pergunta, mas apenas contribuir com alguns subsídios para a formulação

tro lado, é importantepreservare difundir a produção cultural que é própria das clas-

de propostas que, afinadas com a realidade presente, não deixem de levar em

ses populares, garantindo seu acesso a instrumentos que facilitem essa produção e permitam sua conservaçãoe transmissão' japud Arantes, 1984, p. 34).

conta uma experiênciaacumulada,em mais de cinqüentaanos, por uma política

que se tem diferenciado- tanto de um pontode vista positivocomo negativo-

Tanto a definição de política cultural formulada pela Unesco quanto a de Néstor

no conjunto das políticas estatais brasileiras.

GarcíaCanclini são igualmentevagas e genéricas:

48

O PATRIAÕNIO

eA PROCESSO

O PÁIRIAÕNIO: UAA QUESTÃODE VALOR

49

B

1) Para a Unesco, política cultural constitui "um conjunto de práticas sociais conscien-

CAPITULO 2

tes e deliberadas,de intervençõese não-intervenções,tendo por objeto satisfazer certas necessidadesculturais pelo melhor emprego possível de todos os recursos materiais e

A CONSTRUÇÃO DO PATRIAÕNIO: PlIRSPllCTIVA HISTÓRICA

humanosde que dispõe uma sociedade num momentodado" j1969, p. 8). 2) Para Canclini. política cultural é 'um conjunto de intervençõesrealizadaspelo Estado. as instituições e os grupos comunitários organizados a fim de orientar o desenvolvimento

simbólico, satisfazer as necessidades culturais da população e obter consenso para um tipo

de ordem ou de transformaçãosocial" j1987, p. 26). Ver Faria, HamiltonJosé Barrete de; Souza,Valmir de jorg.). Experiênciasde gestãocultural democrática. Róis, São Paulo, n. 12. 1993. Em entrevista a Gabriel Cohn, Marilena Chauí, então secretária municipal de cultura de São Paulo, esclarece o sentido desse tipo de proposta: "Decidimos também considerar a cultura como direito do cidadão, o direito de

A modemidade de uma sociedade se mede por sua capacidade de se reapropriar das experiências humanas distantes da sua no

tempo e no espaço. Alain Touraine, Cdtfque de/a modem/lé.

ter acesso aos bens culturais, o direito de produzircultura, e o direito de participardas decisões na política cultural. E com isso o nosso prometoé um prometode cfdadan/acu/fura/."

11990, p. 32)

A questãodo património se situanumaencruzilhada que envolvetantoo papel da memória e da tradição na construção de identidades coletivas, quanto os recursos a que têm recorrido os Estados modernos na objetivação e legitimação da idéia de nação. Permeandoessas dimensões, está a consideração do uso simbólico que os diferentes grupos sociais fazem de seus bens - e aqui me refiro tanto à produção quanto à conservaçãoou destruição - na elaboração das categorias de espaço e tempo.' Ou seja, o valor que atribuem a esses bens enquanto meios para

referir o passado, proporcionar prazer aos sentidos. produzir e veicular conhecimento. Esses diferentes valores atribuídos são, na civilização ocidental, regulados por duas noções que se articulam sobre as categorias de tempo e espaço -

a noção de história e a de arte. A primeira, enquanto reelaboração do passado, a segunda, enquanto fruição in praesenfía. Nesse sentido. os bens que constituem

os patrimónios culturais se propõem como marcas do tempo no espaço. Mas foi apenas quando, no final do século XVlll, o Estado assumiu, em nome do Interesse público. a proteção legal de determinados bens a que foi atribuída a capacidade de simbolizarem a nação, que se definiu o conceito de património his-

tórico e artístico nacional.

50

O PATRIAON 10 eA PROCESSO

Os p-incipais valores culturais atribuídos aos bens patrimoniais são o valor

tância, sendo atualmente pouco frequente.' O próprio termo monumentofol mu-

artísticoe p valor histórico. Emboraa legislação possase referira outrosvalores-

dando de significaçãoe passoua ser entendidocomo monumentohistóricoe artís-

o decreto-leiRe 25, de 30.11.37, por exemplo. mencionatambém os valores ar-

tico, ou seja, toda obra tangível de valor histórico e artístico. Essa atribuição de

queológico, etnográfico, paisagístico etc. - esses, na realidade. são tributários das

valor, ao contráriodo que ocorre com os monumentosintencionais,é a posferloÜ

noçõesde históriae de arte.

e só passaa ocorrera partir do momento em que, na cultura ocidental,as noções de arte e de história adquiremalguma autonomia.No contexto da história,que Le

A percepção da especificidade da questão do valor na abordagem dos bens que são considerados monumentos históricos e/ou artísticos só se tornou possível a partir de uma postura inovadora, que. segundo Françoise Choay, se iniciou com

Goff considera "a forma científica da memória coletiva', a noção de monumento passaa ser pensadana sua relaçãocom a noção de documento(1990,p. 535-553).

o austríaco Alois Riegl, ligado, assim como Panofsky, Wõlfflin e Gombrich, à ico-

Também a noção de preservaçãodeve ser entendidanessa dupla dimen-

nologia anglo-saxã. Diz ela, na introdução à edição francesa de Le Cu/fe moderne

são, de invariante e de variante cultural. A propósito, diz o antropólogo norte-ame-

des monumenfs, publicado pela primeira vez em 1903, com o título de Der mo-

ricanoJames Clifford:

derne Denkmalkultus=

roleta, posse, classificação e valor não estão, certamente, restritos ao Ocidentel

Unico no seu gênero desde sua aparição, esse pequeno texto continua até hoje inigua-

lável.1-.) Bastaindicarque, pela primeiravez na históriada noção de monumento histórico e de suas aplicações,Rlegl toma distância. Sua posição de observadornão é nem a dos arquitetos,que desde Alberti integraram a questão do monumento histórico na teoria de sua disciplina, nem a dos homens de letras, que fizeram do património monumental o objeto de uma cruzada passional. Graças a essa distância. ele pede, antes de qualquer outro, realizar o inventário dos valores não ditos e das significações não explicitadas, subjacentes

ao conceito de monumento histórico. De imediato, este perde sua pseudotransparência de dado objetivo. To.na-se o suporte opaco de valores históricos transitivos e contraditóHos,

mas. em outras regiões essas atividades não precisam ser associadas à acumulação jem vez da redistribuição)ou à preservação (em vez da decadência históricaou natural). A prática ocidental de caleta da cultura tem sua própria genealogia local. imbricada em noções européias distintas de temporalidade e ordem. (1988. p. 2181

As noções modernasde monumentohbfódco, de pafrfmónfoe de presewação só começam a ser elaboradas a partir do momento em que surge a idéia de estu-

dar e conservarum edifício pela única razão de que é um testemunhoda história e/ou uma obra de arte. Sendo a proservaçãode monumentosuma atividade necessariamenteseletiva.

de procedimentosc(mplexos e conflitantes. IRiegl. 1984. p. 16-17)

E esse olhar distanciado que possibilita a desconstruçãodas noções de monu-

uma constanteopção entre o consewar e o destruir (ativo ou passivo. no sentido

mento, monumento histórico, preservação, e o mapeamento de sua história. Assim.

de não impedir a destruição),'ela será exercida por determinadosagentes, e se-

Riegl pôde distinguir traços que seriam considerados universais. de formas culturais

buição de valores - e, conseqtlentemente,a preservação. E exatamente nesse pro-

específicas da civilização cristã-ocidental.

Para Riegl. o ato de erigir monumentos:- entendidoscomo "uma obra criada pela mão do homem e edificada com o objetivo preciso de conservar sempre presente e viva na consciência de gerações futuras a lembrança de uma ação ou de um destino' (1984. p. 351 -. pode ser identificado nas épocas mais remotas da humanidade. Segundo Françoise Choay, "o monumento se assemelha bastante a um universal cultural" (1992. p. 15). Esse tipo de monumento. visando à rememoração celebratlva. é chamado por Riegl monumento "intencional'. Durante

cesso - que tem uma dimensãoexplícita, regulamentada.como, no caso do Brasil. a inscrição de bens nos Livros do Tombo, e outra implícita, e muitas vezes ãó deli-

beradamenteocultada, que remete às relações de poder entre os agentes envolvidos com a preservação- que se manifestamos conflitos de interesse em jogo na prática aparentementetranquila da preservaçãode bens culturais em nome do

interesse público. E no sentido de tentar apreenderesses focos de conflito, que se manifestam tanto entre os diferentesgrupos sociais envolvidoscom a questão quanto no inte-

a Antiguidade e a Idade Média, esse seria o único tipo de monu-

mento conhecido, mas a parir do Renascimento teria começado a perder impor-

52

gundo determinados critérios, que orientam e também legitimam o processo de atri-

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

rior da atividade institucional,que orientarei a análise da prática de preservação exercida no Brasil. em nível federal, nas décadas de 1970-1980.Neste capítulo.

 CONSTRUÇÃO DO PÂTRIAÕNIO: PERSPECTIVA HISTÓRICA

53

a partir dos trabalhos de Alois Rlegl5 (1984), de André Chastel,' Jean-Pierre

Se. no caso da tradição cristã, foi a Igreja a guardiã dos objetos de culto e

Babelon' (1980) e de Françoise Choayo (1992), procurarei elaborar um conjunto

a gestora de sua transmissão, o que chamamos pafrfmõnfo só vai constituir-se

de referências para pensar a história dos valores atribuídos a bens culturais para

efetivamente como corpus de bens a serem cultuados, presewados e legados para

fins de preservação.

uma coletividade.em função de valores leigos, como os valores histórico e artís-

Esses autores vão chamar a atenção não apenas para as condições de transformação das noções de monumento histórico, património e preservação, como também para as tensões presentes no processo de preservação. E importante observar que a maioria desses autores (assim como Giulio CarãoArgan, já citado no capítulo anterior) desenvolveu. além de uma atividade acadêmica, trabalhos em agências estatais voltadas para a preservação de monumentos. Possivelmente, foi essa experiência. mais que seus estudos e pesquisas universitárias, que lhes chamou

a atenção para a diversidade de valores atribuídos a um mesmo bem. enquanto monumento histórico e artístico, e para os problemas decorrentes dessa realidade.

tico, e enquanto referências a uma identidade nacional. Por outro lado, como mos-

tram Chastel e Babelon, a preservação, embora sentida como necessidade por certos indivíduos ou grupos, impressionados com o que consideravam a beleza. a antiguidade, ou o poder de evocação de certos monumentos, se manifestava, até o final do século XVlll, apenas em iniciativas isoladas, formadoras do que chamam

'o sentido do património' Se as categoriasque vão fundamentara constituiçãodos chamadospatrimónios históricos e artísticos começaram, portanto, a ser formuladas e aplicadas a bens, desde o Renascimento,fol a idéia de nação que veio garantir seu estatuto ideológico, e foi o Estado nacional que veio assegurar, através de práticas especí-

ficas, a sua preservação.Pois, como díz Verá Milet,

2.1 0S PRIAÓRD10S DÂ PRESERVAÇÃO DE AONUAENTOS E A AuíoUOAizACÃo DAS NOÇÕES DE HISTÓRIA

[

Dt ARTE

A efetlvação da preservação dos bens culturais só se encontra socialmente definida,

ou seja, só aparececomo fato social, quando o Estado assume a sua prateção e,

Tanto Riegl quanto Chastel e Babelon detectam no sentimento de piedade reli-

através da ordenação jurídica, os institui e delimita oficialmente enquanto bem cultural,

giosa e de devoção às relíquias, característicoda civilizaçãoeuropéia, a origem

regulamentandoo seu uso, a finalidadee o caráter desses bens dentro de leis espe-

do sentimento de apego a bens simbólicos que evocam a idéia de pertencimento

cíficas de propriedade,zoneamento,uso e ocupação do solo. j1988. p. 181

a uma comunidade, ainda que imaginária. São Chastel e Babelon que dizem:

Foi preciso. portanto, que a noção de monumento - no seu sentido moderno -

Em toda sociedade, desde a pré-história, (-.l o sentido do sagrado intervém con-

fosse formulada, enquanto monumento histórico e artístico, para que a noção de

vidando a tratar certos objetos. certos lugares, certos bens materiais, como escapando

pafrlmõnio se convertesse em categoria socialmente definida, regulamentadae

à lei da utilidade imediata. A existência dos lares familiares, a do pa//adfum da cidade,

delimitada, e adquirisse o sentido de herança coletiva especificamentecultural.

provavelmentedeve ser recolocadana origemou na base do problemado património.

Como diz Françoise Choay na introdução já citada ao livro de Riegl, "a invenção

É preciso aproximar seu destino do de certos objetos comuns. armas e jóias. e mesmo

do monumento histórico é solidária com a dos conceitos de arte e de história'

edifícios. que. por diversas razões. escaparam da obsolescência e da destruição fatal para se verem dotados de um prestígio particular, suscitar uma ligação apaixonada, até

Essa noção pressupõe a idéia de distância e a percepção da alteridade de

mesmoumverdadeiro culto.(1980,p. l) Esse estatutoatribuídoa certos bens materiaisimplica,como no caso dos bens religiosos, uma forma de propriedadecoletiva, visando a preserva-los e a garantir sua transmissão através das gerações. Na Idade Média. a aristocracia projetavanos seus castelos e em outras representaçõesde suas linhagens um sentido de símbolosde sua continuidade,e. por essa razão, esses bens se torna-

uma civilização em relação a outras, o que só vai ocorrer no Renascimento, quan-

do, pela primeiravez, uma cultura distante mais de um milênlo no tempo é considerada ancestral da presente. Françoise Choay considera que o advento desse olhar "distanciado e esteta, liberto das paixões medievais', que metamorfoseia as edificações antigas em "objetos de reflexão e de contemplação', se situa por volta da primeira metade do século XV. Até então, só era possível se aproximar da cul-

vam também objeto de preservação.

54

IRiegl, 1984, p. ll).

tura antiga, pagã, ressemantizando-a, retraduzindo-a em termos cristãos. Os pré-

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

Á CONSTRUÇÃODO PATRIAÕNIO: PERSPECTIVAHISTÓRICA

55

ditesantigos que não haviam sido destruídos eram reutilizados,ou tinham seus como de valor artístico. A trajetória das pesquisas dos antiquários pode ser exem-

elemontos aproveitados em outras construções (1992, p. 37).o

plificada na seqüência dos trabalhos de Montfaucon, que, tendo pesquisado as an-

Não foi por acaso que Romã se tornou o berço da sensibilidademoderna.Ali

tiguidades grego-romanas,veio a estudar posteriormente os testemunhos das mo-

se tinha acessoà presençasimultâneade dois tipos de monumentos- os antigos.

narquias francesas.

pagãos, e os cristãos - que remetiam a duas tradições distantes. Sintomaticamente,foi no século XV que ocorreramas primeirasmedidasde presewação,em-

O saber produzido pelos antiquários tinha um caráter eminentementeuniver-

preendidas por papas através de bulas, visando à proteção de edificações antigas

salista, caracterizadopelas viagens e trocas de informações.Na Inglaterra, esse

e cristãs. Também nesse momento ocorreu, no tratamento dos vestígios da Anti-

tipo de atividade, Intensificado como reação ao vandalismo religioso da Reforma.

guidade greco-romana, o cruzamento de três discursos: o da perspectiva histórica.

perdurouaté o início do século XX: eram as sociedadesde antiquáriosque protegiam as antiguidades nacionais. Já na França, essas sociedades entraram em de-

o da perspectiva artística e o da conservação. {

O interessepelas antiguidades,que começouentão a surgir, era objeto de dois tipos de abordagem:a letrada, pelos humanistas,que as consideravamenquanto ilustrações dos textos antigos - estes, os testemunhos confiáveis da Antiguidade -

clínio quando, a partir da Revolução, no final do século XVlll, o Estado assumiu

e passou a centralizar a preservação. Como observa Françoise Choay (ibid.), o amor à arte e ao saber histórico não

e a artística, por parte dos artífices (arquitetos,escultoresetc.l, interessadosnas

foi suficiente para implantar. de forma sistemática e definitiva, a prática da preser-

formas - por eles consideradas testemunhos involuntários e, por esse motivo.

vação. Foi preciso que surgissemameaças concretas de perda dos monumentos.

mais reveladores.A noção de monumentohlsfódco surgiu, pois, com as antigui-

já então valorizados como expressões históricas e artísticas - o vandalismo da

dades, e, segundo Françoise Choay. "a descoberta das antiguidades é também a

da arte como atividade autónoma, desvinculada de sua tradicional vinculação à

o da Revolução Francesa - e uma mística meiga vinculada a um interesse político definido - o culto à nação - para que a preservação dos monumentos

religião cristã" (1992, p. 63).'' A mesma autora assim caracteriza a ativídade dos

se tornasse um tema de interesse público.

Reforma e

antiquários:

2.2 A LEGIÍTAACÃO DO PATRIHÕNIOPELO VALOR DE NACIONALIDADE O primeiro objetivo dos antiquários é, portanto, tornar visível o passado. especialmente o passado silencioso ou não-dito. Mas eles não se limitam a uma soma. A

imagem é posta a sewiço de um método comparativoque lhes permite estabelecer séries tipológicas. às vezes até sequências cronológicas. e realizar assim uma espécie de história natural das produções humanas. jlbid.)

Até o século XVlll, as ações deliberadas,voltadas para a preservaçãode monumentos. eram ocasionais, e, quando ocorriam, eram realizadas pelos segmentos sociais dominantes, basicamente a Igreja e a aristocracia, visando a conservar

seus bens. Para os antiquários, os objetos antigos interessavamprimordialmente A atividade dos antiquários se desenvolveu por toda a Europa, produzindo far-

ta iconografiae inúmeras coleções. O objeto de interesse,porém, era só um: a Antiguidade. A Idade Média era considerada um período intermediário. A partir do

final do século XVI, os antiquáriospassarama se interessartambém por antiguidades de outras civilizações que não apenas a da greco-romana. Foram documen-

tados e recolhidos os vestígios do que se passou a consideraras antiguidades nacionais. O estilo gótico se tornou o símbolo das antiguidades nacionais, sendo-

Ihe atribuído, no entanto, apenas um valor histórico. Já na Grã-Bretanha,devido ao triunfo da Reformae à penetraçãotardia do estilo italiano na arquitetura.esse estilo continuava vivo, mesmo durante o classicismo, e foi reconhecidotambém

como documentos, dotados também de valor artístico. e o interesse na cometae

na guarda era partilhado apenas pelos membros dessas sociedades. Chastel e Babelon j1980, p. 15), que fizeram um estudo da prato-históriada presewação na França. detectaram na segunda metade do século XVlll algumas iniciativas, em Paris. visando a evitar a destruição de edificações pelo motivo de

estarem identificadas à fisionomia da cidade.'' Nesse caso, a defesa de edificações civis públicas - como uma fonte, um arco do triunfo e uma coluna de observações astrológicas

- sugere a formação de um 'pafdmón/o do c/(hdão.

Mas foram ameaças de destruição e perda de monumentosjá considerados de valor histórico e/ou artístico que mobilizaram as sociedades nacionais para o

56

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

A CONSTRUÇÃO DO PAÍRIAÕNIO: P{RSPECrlVAHISTÓRICA

57

investimento na presewação. Na Inglaterra, o vandalismo reformista. que destruiu

cias, que passam a ser objeto de medidas administrativas e jurídicas: formulação

igrejas e sobretudo imagens, levou as sociedades de antiquários a assumirem essa

de leis, decretos e prescrições, criação de comissões específicas, instituição de práticas de conservação (inventário, classificação, proteção) e, principalmente, definição de um campo de atuação política. Paralelamente.criou-se uma ordem

função.

Na França, no final do Antigo Regime, a monarquia, influenciada pelas idéias

discursiva própria, um corpo de conceitos. Aos critérios tipológicos dos anti-

iluministas.tomou iniciativas no sentido de dar acesso a seus acervos através

quários foi acrescentado um novo: a distinção entre bens móveis e imóveis, em

da criaçãode museus.Com a instauraçãode um novo Estado,em 1789.e a der-

função de exigências distintas de conservação. Para os primeiros foram criados

rubada do poder da aristocracia e da Igreja, a questão assumiu dimensões mais

museus, para os segundos se apresentava o problema complexo de sua reuti-

complexas:em primeiro lugar, havia o problema económicode gerir os bens con-

lização.

fiscados aos nobres e ao clerol em segundo lugar, simbolicamente. essa proteção

era, em princípio, contraditória com os ideais revolucionáriosde instauração de um poder populare de uma nova era, livre da opressãodos antigos dominadores. O prometode inaugurarum novo tempo (inclusive com um calendário e símbolos próprios)justificava, aos olhos da população,a destruiçãodos bens identificados

4

Chastel e Babelon observam: O sentido do património, ou seja, dos bens fundamentais, inalienáveis, se estende pela primeira vez na França às obras de arte, ora em função dos valores tradicionais que se vinculam a esses bens e que os explicam. ora em nome desse sentimento novo de um elo comum, de uma riqueza moral de toda a nação. Provavelmente essa dupla

com aqueles dois grupos sociais.

raiz nunca deixou de existir. jlbid.l

Os atou de vandalismo, que se intensificaramapós a prisão do rel em Varennes, repugnavam aos eruditos e contrariavam os ideais iluministas de acumulação e difusão do saber. Por esse motivo. desde 1789. o governo revolucionário

tentou regulamentara proteção dos bens confiscados,justificando essa preocu-

A noção de património se inseriu, portanto, no prometomais amplo de construção de uma identidade nacional, e passou a servir ao processo de consolidação dos Estados-nações modernos. Nesse sentido, vinha cumprir inúmeras funções simbólicas:

pação pelo interesse desses bens para a instrução pública. Esses bens, que, para a Comissãode Artes, criada em 1793,': "a história consulta. as artes estudam,o filósofo observa, nossos olhos se comprazemem fixar' japud Chastel e Babelon, 1980, p. 18), passaram a ter também um valor como docu-

1. reforçara noção de cidadania,na medida em que são identificados,no espaço público, bens que não são de exclusiva posse privada, mas propriedadede todos os cidadãos, a serem utilizados em nome do interesse público. Nesse caso.

o Estado atua como guardião e gestor desses bensl

mentos da nação, e se converteram em objeto de interesse não apenas cultural como também político. Chastel e Babelon (1980. p. 18) observam que 'não se defi-

2. ao partir da identificação,nos limites do Estado nacional,de bons represen-

ne apenas um domínio original. identifica-se um poder de cultural a noção moderna

tativos da nação - demarcando-aassim no tempo e no espaço- a noção de pafd-

de patrimóniocomeça a aparecer através da preocupaçãomoral e pedagógica'.

mõnio contribui para objetivar, tornar visível e real, essa entidade ideal que é a

A idéia de possecoletiva como parte do exercícioda cidadania inspiroua utilização do termo pafdmõn/o para designar o conjunto de bens de valor cultural que

passarama ser propriedadeda nação, ou seja, do conjuntode todos os cidadãos.

nação, simbolizadatambém por obras criadas expressamentecom essa finalidade (bandeiras,hinos, calendário,alegorias e mesmo obras de artistas plásticos, como David).'' A necessidade de proteger esse património comum reforça a coesão

nacionall

A construção do que chamamos património histórico e artístico nacional partiu, por-

tanto, de uma motivação prática - o novo estatuto de propriedade dos bens confis-

3. os bens patrimoniais,caracterizados desde o início por sua heterogenei-

cados - e de uma motivação ideológica - a necessidade de ressemantizar esses

dade," funcionam como documentos, como provas maferla/s das versões oficiais

bens. A idéia de um patrimónioda nação, ou "de todos'. conforme o texto legal,

da história nacional,'5que constrói o mito de origem da nação e uma versão da

homogeneiza simbolicamente esses bens heterogêneos e de diferentes procedên-

ocupação do território, visando a legitimar o poder atual;

58

O PATRIÁÕNIO

[A

PROCESSO

& CGNSTRUCÂO DO PATRIAÕNIO: P[RSP[CTIVA HISTÓRICA

59

como princípio a idéia mestra de Mérimée, de "descobrir o país através de sua

4. a conservação desses bens - onerosa, complexa e freqüentemente contrária

paisagem histórica" (Chastel e Babelon, 1980, p. 21).

a outros interesses, públicos e privados - é justificada por seu alcance peda-

Os conceitos estabelecidos pela Revolução Francesa continuaram vigentes no

gógico, a serviço da instrução dos cidadãos.

século XIX, mas adquiriram novas significações em função de novos fatores: a

Durante o período revolucionário, o valor nacional dos bens se sobrepunha a

RevoluçãoIndustrial,que gerou uma ruptura no modo de produzir e de viver arte-

todos os outros valores, sendo seguido pelo seu valor de conhecimentohistórico.

sanal, e o romantismo,que, inclusive em decorrência dessa ruptura, privilegiava

pelo seu valor económicoe finalmentepelo seu valor artístico.

os valores da sensibilidade e o lugar do sujeito na percepção do mundo.

A preservação como atividade sistemática só se tornou possível, portanto. No período romântico. o distanciamento em relação às obras do passado, que

porque ao interesse cultural se acrescentaramum interessepolítico e uma justifi-

se manifestoupela primeira vez no Renascimento.assumiu, dovido à Revolução

cativa ideológica.Aparentementeessa foi uma fórmula bem sucedida, e que será \

repetida em outros momentosrevolucionários(como na Rússia, em 1917, e tam-

#

bém. mais recentemente.em Cuba, após a revolução liderada por Fidel Castro)

Industrial, uma segunda mediação. mais drástica: o passado longínquo não era mais recuperadoenquantocânone, fonte de conhecimentoe de modelos,como no Renascimentosera um passado irremediavelmente perdido, e só através da memó-

como meio de conciliar os interesses da cultura - a preservaçãode bens por seu

ria afetiva, da sensibilidade estética, era possível, de algum modo, revivê-lo. Pode-

valor históricoe artístico- com os interessespolíticosvoltadospara uma mudança

se dizer que o sentimentopredominantonão era mais o de reverência.e sim o

social.

de nostalgia. Considerava-se que os monumentos legados por esse passado esta-

Entretanto, como a história desde então tem demonstrado,a administração dos

vam fadados à deterioração, ao desaparecimento e à morte. Esse era o ciclo irre-

conflitos entre interesses imediatos e os interesses específicos da preservação

mediável da natureza e também das coisas e dos homens. As ruínas, assim como

não é fácil: prova disso são, ainda no século XVlll, as denúnciasde Quatréme

outros sinais do tempo jas pátinas, o musgo, a vegetação selvagem que toma

de Quincy em suas Leffres à M/randn (1989), que condenavama pilhagem feita

conta das edificaçõesabandonadas),seriam um documentodessa realidade,

pelas tropas napoleónicasna ltália em nome de um interessepedagógico- a for-

prova de sua autenticidade,daí sua importância no imaginário romântico.

mação dos artistas francesesl no século XIX, a polêmica entre John Ruskin e Viollet-

Por outro lado, o interesse dos historiadorespelas antiguidadesentrou em ex-

le-Duc quanto à forma e ao sentido da preservação dos monumentosl e. no século

tinção. Ocupados com a história política e das instituições, visando a construir

XX, a discussãoem torno da transformaçãodo patrimónioem objeto de consumo

a história nacional, os historiadores se voltaram para os textos. para os docu-

cultural.

mentos escritos. As obras antigas passaram a ser objeto de uma apreciaçãoemi-

A institucionalização definitiva da atividade de preservação pelo Estado, na

nentementeestética, embora não desprovida de interesse cognitivo. A viagem con-

França, só veio a ocorrer efetivamente a partir de 1830, quando o historiador Gui-

tinuavaa ser o meio privilegiadopara o acesso a esses bens, mas agora tratava-

zot propôs a criação do cargo de Inspetor dos Monumentos Históricos. O escritor

se de "viagens pitorescas' e não propriamentecientíficas.'o Nesse momento. as no-

Prosper Mérimée, ao assumir o posto em 1832, percorreu toda a França, reali-

ções de históriae de arte ficaram mais distantes uma da outra, assim como ficou

zando um notável trabalho de Inventário não só de bens, como de atitudes da po-

mais evidente a diferença entre valores do conhecimentoe valores da sensibili-

pulação em relação ao património. E percebeu que, apesar dos bons propósitos dos convencionaisrevolucionários,apenas uns poucos intelectuais se sensibili-

dade. Consolidou-sea noção do monumento histórico e a relação entre os valores

zavam com o valor cultural dos monumentos. A população, ou lhes era indiferente,

O monumento históricofoi integradoao cultoà arte que se desenvolveu no

que Ihe são atribuídos foi redimensionada em decorrência das novas circunstâncias.

ou se apegava a alguns bens por outros motivos, por exemplo, seu valor religioso.

período romântico, sem perder, no entanto, sua conotação de testemunho do tempo

enquanto local de culto ou de peregrinação. Essa situação era particularmente

passado. Enquantodocumento histórico. passou a ser primordialmentevinculado

grave nas províncias, devido à atividade centralizadora do Estado. A estrutura ins-

e utilizado pelo Estado - com o reforço dos historiadoros, que, então, se voltavam

titucional montada nesse período vai perdurar até meados do século XX, tendo

para a história política - na afirmação da nacionalidade.

60

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

Í

A CONSTRUÇÃODO PATRIAÕNIO: PlIRSPllCTIVA HISTÓRICA

61

]

Eivada de um matiz puritano, a teoria do crítico de arte inglês John Ruskin

Lúcia Lippi de Oliveira observa que, no século XIX, "a ligação do nacionalismo com o romantismofez a nação ser concebida como uma entidade emotiva, símbolo

via na arquitetura um meio de conservar o passado. não só em suas produções

da singularidade,à qual todos os homensdeveriam se integrar"(1986, p. 44). O nacionalismocultural devia sobretudo a Herder sua fundamentação.Foram predo-

materiaise modos de vida, como também em suas virtudes morais ('a maior glória de uma edificaçãonão está em suas pedras, ou no ouro que possa conter. Sua

minantementeos artistas, poetas e pensadores que, nos países germânicos e

l

glória está em sua idade.' [1956, p. 1901).Ético, mais que estético,o valor do mo-

também na Inglaterra,exploraram essa imagem emotiva da nação. O sentimento

numento histórico para Ruskin é o valor de piedade. Tudo que é manifestação do

nacional se desenvolveu com ênfase nos aspectos culturais típicos, diferencia-

esforço humano deve ser objeto de reverência, daí seu intuito de presewar não

dores de cada nação. Já na França, predominava o nacionalismo político. desen-

apenas os monumentos excepcionais, como também o mundo doméstico e o do

volvido em torno da idéia de civilização, sobretudo por historiadores e homens

trabalho.Na Inglaterra,pode-sedizer que o valor de nacionalidadefoi eclipsado

de letras.

l

J

pelo valor de humanidade.e, nesse sentido, a preservaçãotambém foi pensada

No século XIX se consolidaram dois modelos de política de preservação:o

em escala mais ampla:Já em 1854, Ruskin propunhaa criação de uma organiza-

modeloanglo-saxõnico, com o apoio de associaçõescivis, voltado para o culto

ção européiade proteçãodos monumentoshistóricos.'' Para Ruskin (1956, p. 201).

ao passado e paraa valoração ético-estética dosmonumentos, e o modelofran-

os vestígios do passado tinham valor de relíquiasl valiam, portanto. em si mesmos,

cês, estatal e centralizador,que se desenvolveuem torno da noção de património,

enquanto objetos "sagrados", insubstituíveis, e, nesse sentido, eram intocáveis:

de forma planificada e regulamentada, visando ao atendimento de interesses polí-

"Não temos direito algum de toca-los. Eles não são nossos. Eles pertencem em

ticos do Estado. Esse último modelo predominouentre os países europeus,e foi

parte aos que os construíram,e em parte a todas as geraçõesda humanidadeque virão depois de nós" -, foram-noslegados por nossos antepassadose, do mesmo

exportado.na primeira metadedo século XX, para países da AméricaLatina, como o Brasil e a Argentina,e, após a Segunda Guerra Mundial, para as ex-colónias

modo, são um patrimóniotambém das gerações futuras. Logo, qualquer restau-

francesas.

ração seria uma violação e uma impostura,pois faria o monumentoparecer diferente do que na realidadeé, ou seja, uma criação humana sujeita ao fluxo do tem-

A conservaçãodos monumentos, na França, assumiu um caráter eminentemente museológico:irremediavelmenteligados ao passado,esses bens não teriam mais lugar no fluxo da vida presente. O ideal de modernização e de progresso

difundido pela ideologia estatal conferia à preservação um compromissocom o saber, um sentido de atividade racionalmentedirigida para interesses presentes.

po ("tão impossívelquanto ressuscitarum morto é restauraro que quer que tenha sido grandiosoou belo em arquitetura.' [Ruskin, 1956, p. 1991).A arquitetura.nos textos de Ruskin, é associada à vida da natureza e dos homens. Já Viollet-le-Duc,engenheirode formação e mais voltado para uma concepção

O prometourbanístico de Haussmann ilustra bem essa situação. Já nos países anglo-

formal da arquitetura, partia da noção de monumento ideal, que não é necessa-

saxões predominou,entre os principaisagentes da preservação,o culto ao passa-

riamente a do prometooriginal, mas a mais adequada para cada caso, a ser

do e a valorização de seus vestígios enquanto relíquias, em decorrência do senti-

buscada pelo restaurador em função de critérios técnicos, estilísticos e pragmáticos. Segundo suas próprias palavras, "restaurar um edifício é restabelecê-lo

do mais agudo da ruptura que, na Inglaterra.decorriado confrontocom a dura realidade da Revolução Industrial. Para os ingleses. o presente era representado pela

num estadocompletoque talvez nunca tenha existido" (apud Choay, 1992, p. 1201.

civilização que começava a se desenvolver na América do Norte e que, na obser-

A restauração torna-se assim uma recriação legitimada, ou "restauração inter-

vação crítica de Ruskin, era "um mundo sem uma lembrança nem uma ruína'

pretativa', como o próprio Viollet-le-Duca qualificava, e, sob sua orientação, se

(apud Choay, 1992, p. 107).

voltou para os monumentosgóticos. Ele consideravaque a verdadeiraarquitetura

Duas teorias distintas e conflitantes sobre a conservação de monumentos his-

nacionalfrancesaera a do século XIII. Seus trabalhosforam mais tarde duramente

tóricos foram elaboradas,no século XIX, respectivamente,na França e na Ingla-

criticados.sobretudoa partir dos conceitos expressos na Carta de Veneza, e só

terra: a de John Ruskin e a de Viollet-le-Duc.

muito recentemente têm sido objeto de reavaliação.

62

O PÂTRIAõNIO eA PROCESSO

A CONSTRUÇÃO DO PATRIAõNIO: PER5PlCTIVA

HISTÓRICA

63

No final do século XIX, com Camillo Boito," a teoria de Viollet-le-Ducfoi con-

logia, nas últimas décadas.A criação, após a Segunda Guerra Mundial.de orga-

acrescentado, adventício, ortopédico do trabalho refeito deve ser ostensivamente

nismos internacionaisespecificamentevoltados para a cultura e a incorporação. pela ONU, da figura de direitos culturais, e, pela Unesco,da figura de Património

marcado, e não deve, de maneira alguma, passar por original' (Choay. 1992. p.

Cultural da Humanidadejunta, nas mesmas expressões, as noções difusas de

testada no campo específico da restauração. Boatoconsiderava que 'o caráter

127). Desse modo. Boatoresolveu, pelo menos de um ponto de vista contemporâneo,

humanidadee de uma cultura universal, e a noção cada vez mais precisade uma cidadania fundada em direitos diversificados, para legitimar a atividade de pre-

a contradição entre restaurar e conservar.

Para Françoise Choay, a doutrina de Viollet-le-Duc visava a restituir ao monu-

servação.

mento o seu valor de documento íntegro, objeto de conhecimento, em detrimento

2.3 A TEORIA DOS VALORES Dt ALO"S R]EGL

de seu valor enquanto monumento, sujeito às marcas do tempo. Diz, a propósito.

essa autora: "reconstituindo um tipo. ele (o restaurador) fornece um instrumento

Para Riegl j1984, p. 38), todo monumento tem, necessariamente,uma dimensão

didático. que restitui ao objeto restaurado um valor histórico, mas não sua histo-

históricae uma dimensãoestética, pois ele parte do pressupostode que todo mo-

ricidade' jibid., p. 121-122).Essa intervençãorompiacom a correntedo tempo.

numentoda arte é. simultaneamente.um monumentohistórico, na medida em que

Os monumentos-documentoseram selecionados entre as obras notáveis e trata-

representa um estágio determinado na evolução das artes plásticas, de que não

dos como modelos que era preciso ressaltar, daí a teoria da pise-en-va/eur: para

é possível, sfrlcfo senso, encontrar um equivalente. Por outro lado. todo monu-

valorizar o essencial - o monumento excepcional - tudo que fosse perturbador ou

mento histórico é também um monumento artístico, pois mesmo um manuscrito tão

acessório à sua percepção (entendida aqui como visibilidadel devia ser eliminado.

mínimo como uma folha rasgada trazendo uma nota breve e sem importância, com-

O tecido urbano era rompido em nome da funcionalidade, da higiene e da segu-

porta. além do seu valor histórico, que concerne à evolução da fabricação do pa-

rança pelos urbanistas, e em nome de uma estética pelos arquitetos. Esses últi-

pel, da escritura, dos meios materiais utilizados para escrever etc., toda uma série

mos, ao buscarem uma suposta autenticidade estética. atingiam em cheio a auten-

de elementos estéticos: a configuração do folheto, a forma dos caracteres e a

ticidade histórica.

maneira

de arruma-los.19

A dissociaçãoentre valores do conhecimentoe valores da sensibilidade foi

A noção de valor histórico é. porém, mais extensa, na medida em que "chama-

percebida e explicitada por Alois Riegl. no início do século XX. Riegl procurou ana-

mos de históricotudo que foi, e hoje não é mais" (Riegl, 1984, p. 37). Nesse sen-

lisar a questão dos monumentos históricos não do ponto de vista do Estado, ou

tido, tudo que ficou do passadocomo testemunhopode pretenderum valor histó-

enquanto representações da nacionalidade, mas a partir das diferentes percepções

rico. O monumento artístico deve ser compreendido como um monumento da his-

que o contato com os monumentos suscita nos indivíduos. A análise de sua teoria

tória da arte, e seu valor, considerado desse ponto de vista, é menos artístico que

dos valores atribuídos aos monumentos históricos, que é apresentada no pequeno

histórico.Por esse motivo, Riegl considera que, a rigor, não cabe mais falar em

mas denso livro O cu/fo moderno dos monumentos, publicado na Austria, em 1903,

monumentoshistóricos e artísticos, mas apenas em monumentos históricos.

comece indicações ricas e surpreendentemente atuais para se refletir sobre a ques-

No Renascimento,as noções de histórico e de artístico estavam imbricadas

tão da presewação em suas múltiplas versões. sobretudo se se tem em vista não

e se fundamentavam em um modo de conhecer e de avaliar a Antiguidade. Pela

a produçãodo património - até hojesob o controlehomogeneizador do Estado-

primeira vez se estabeleceu um sentido de relação entre temporalidades distantes,

mas a complexa e diversificada recepção dos bens culturais pelos diferentes es-

adquirindo o passado um valor de contemporaneidade. Entretanto. diz Riegl, "esse

tratos sociais.

ponto de vista permanece normativo, diretivo (logo antigo-medievall, mas não his-

Esse ângulo do problema se apresenta. atualmente, inclusive, sem escapa-

tórico no sentido moderno,pois não reconheceainda nenhumaevolução'(idem,

tória, aos agentes da preservação, à medida que a legitimação da proteção de

p. 531." O homemdo Renascimento identificavanos grandesvultosda Antigui-

bens culturais pelo Estado via nacionalismo vem declinando, junto com essa ideo-

dade clássica os seus legítimos ascendentes.

64

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

A CONSTRUÇÃO DO PÀTRIAõNIO:

PERSPECTIVA HISTÓRICA

65

O mesmo sentido normativo era conferido. no Renascimento, ao valor artístico.

hislódcos no sentido tradicional, pois remetem simplesmente "à representação do

seava no princípio de que existiria um cânone artístico ideal. objetivo e universal-

tempo transcorridadesdo sua criação, que se trai a nossos olhos pelas marcas de sua idade' (ibid., p. 45). Em suma, referem-se ao tempo, ao ciclo de criação

mente válido, identificado nas produções da Antiguidade. Essa idéia. que vai cicli-

e morte, como experiência intuitiva porém difusa, comum a todos os homens. Essa

que. nesse período, era predominante. A noção da arte, no Renascimento, se ba-

camente retornar na história dos estilos artísticos, só vai ser definitivamente supe-

percepção dos monumentos. que já se manifestava na obra de Ruskin, seria.

rada. segundo Riegl, no início do século XX.

segundo Riegl. um desdobramentoda perspectiva histórica. Diz Riegl: "0 valor

Na concepção moderna de história, a idéia de desenvolvimento, de evolução.

histórico, indissociavelmente ligado ao fato individual, devia se transformar progres-

leva à superação da noção de cânone e à afirmação do valor específico de cada

sivamente em valor de desenvolvimento' (ibid., p. 56). Embora calcado na sensibi-

período,em função do ponto de vista contemporâneoa cada momento histórico.:'

lidade romântica,o valor de ancianidade só vai se difundir no século XX. Riegl

O lugar. o tempo e o sujeito da avaliação são, assim. relativizados.Esse fenó-

consideraque, em relaçãoao culto dos monumentos,"se o séculoXIX foi o do valor

meno vai culminar. no século XX, com a emergência da consciência historio-

histórica,o XX parece ser o do valor de ancianidado,' pois "é sobretudoa clara

gráfica. Novos campos do saber, como a antropologia, já nascem sob o signo do relativismo.

percepção.em toda sua pureza. do ciclo necessário da criação e da destruição,

As implicações desse relativismo. ou seja. da percepção de que a atribuição

que agrada ao homem do século XX' (ibid., p. 56). Essa profecia foi plenamente concretizada tanto na evolução das ciências

de valor varia conforme o ponto de vista que se adote, vão se refletir de forma

históricas, com a crítica à história factual, o surgimento da história das mentali-

decisiva nas políticas de preservação, impasse que Riegl conseguiu antever em

dades e do conceito de longa duração, a ampliaçãoda noção de documentoe o

1903. Há uma progressiva ampliação do que é considerado de valor histórico,22

desenvolvimento da historiografia, quantonas políticasde preservação, com a

até que se chegue ao Interesse atual por "todas as realizações, por menores que

ampliaçãodo conceito de património.

sejam, de todos os povos, quaisquer que sejam as diferenças que as separem de

A difusão do valor de ancianidadeteve também conseqüênclasimportantesno

nósl um interessepela história da humanidadeem geral, aparecendocada um de

trato dos monumentosrelativamenteà sua feição material, ou seja, sobre as ativi-

seus membros como parte integrante de nós mesmos' (ibid., p. 51).

dades diretamentevoltadas para sua consewação e restauração.Se, para o valor

A reflexão de Riegl é surpreendentemente inovadora por chamar a atenção

histórico, o monumento importa enquanto documento de reforências externas a ele.

para a importânciade se levar em conta, na formulaçãoe, sobretudo, na prática

sendo fundamentalpara sua leitura que seja mantido íntegro - o que justifica a

de uma política de preservação, aqueles valores não explicitados, do nível da

restauração e mesmo eventuais recriações -, para o valor de ancianidade, qual-

percepção mais imediata, intuitiva. menos culta, que são atribuídos aos bens culturais: o va/or de ancianfdade e o va/or de novidade.

quer intewenção estranha ao desgaste natural é inaceitável. Essa concepção, que

O valor de ancianidadederiva do valor histórico mas se distingue dele: "Por oposição ao valor de ancianidade, que aprecia o passado em si, o valor histórico tendia a isolar um momento do desenvolvimentohistórico e a no-lo apresentar de

um modotão precisoque ele parecepertencerao presente'(ibid.,p. 85).

inspirou a Carta de Veneza. elaborada em 1964, se contrapõe aos princípios da

Carta de Atenas, de 1933, fruto das idéias funcionalistas dos Ciam (Congressos

Internacionaisde ArquiteturaModerna). Se o conflito entre valor histórico e valor de ancianidadefoi agudo no século XIX - o que ficou patente na polêmica entre Viollet-le-Duce Ruskin-, Riegl acre-

Riegl se dá conta de que. para nós. modernos, o interesse suscitado por

ditava (e antevia)que, no século XX, essa tensão seria atenuada por uma resul-

determinadasobras advém menos de seu poder de rememoração de fatos ou

tante da evoluçãotecnológica:o advento das técnicas audiovisuaisde reprodução,

personagens notáveis, e mais por indicarem, sobretudo através de seu estado

especialmente da fotografia. Numa antecipação do potencial dessas técnicas, que

material. o caráter de antigas. evocadoras de um tempo passado. Nesse sentido.

Walter Benjamin,décadas mais tarde, explorou em outro sentido, Riegl percebeu

constituiriam monumentos, pois têm valor de rememoração. mas não monumentos

que, ao possibilitaremalcançar um equivalentequase perfeito qos documentosori-

66

O PATRIAõNIO EA PROCESSO

A CONSTRUÇÃO DO PÀTRIAÕNIO:

PERSPECTIVA HISTÓRICA

67

finais, viabilizando assim o atendimento do interesse do historiador, essas téc-

exploração turística. A utilização dos monumentos não é só um Imperativo eco-

nicas permitem um tratamento dos monumentosconformeas exigências do valor

nómico, como também é essencial à sua percepção, mesmo quando prevalece o

de ancianidade.

valor de ancianidade. Riegl considera que "uma parte essencial desse jogo anima-

Entretanto,na segunda metade do século XX, um novo imperativo passou a

do das forças da natureza,cuja percepçãodeterminao valor de ancianidade,seria

se apresentar para as políticas de património, com repercussões sobre os critérios

Irremediavelmenteperdida se os homens cessassem de utilizar o monumento' (ibid.,

de conservação e de restauração: a adequação a um consumo cultural de massa.

p. 91). Apenas ruínas ou sítios arqueológicos se prestam à apreciação unicamente

Essa ampliaçãodo consumo de bens culturais tornou mais evidentes as expec-

por seu valor de ancianidade.Por esse motivo Riegl considerava,em 1903, que os conflitos entre esses valores seriam facilmente contornados.

tativas estéticas, por parte desse público, quanto ao que Riegl denominou "valor de novidade', que ele considerava o valor por excelência das massas. pois "aos

Entretanto,consideroque Riegl não viu - ou ainda não podia ver - os proble-

olhos da multidão, apenas o que é novo e intacto é belo' (ibid., p. 1 ). Propostas como a de Viollet-le-Duc seriam expressões do apelo ao valor de novidade como

mas que a mercantilizaçãodos bens culturais acrescentariaa esse quadro. A conversão de obras de arte em mercadorias,o desenvolvimentodo mercadode anti-

apoio ao valor histórico do bem. Do mesmo modo, o interesse de párocos em res-

guidades e a valorizaçãodo solo. edificado e aed/#candl sobretudo nas grandes

taurar ou reformar suas paróquias, assim como o de prefeitos em modernizar as cidades antigas, evidencia uma conjugação do valor de novidade com o valor de uso. Na mesma linha, a preocupação hoje, dos agentes culturais com a mediação-

cidades, tornaram evidente a importância, hoje, de se considerar o valor de troca

na dinâmica dos valores atribuídos aos bens culturais.

Além disso, se considerarmosas exigênciasatuais do turismo de massa

animação cultural, recursos audiovisuais etc. - se insere no objetivo de adequar

jquestão que, obviamente,não se apresentava para Riegl), veremos que os con-

a apresentação dos monumentos ao acesso de um maior número de receptores.

flitos entre valor do uso aparaexploração económica), valor de novidade (para

Por outro lado, não é apenas a mercantilizaçãoda vida cultural nem a difusão de valores da modernização que vai influir, neste século, nas políticas de preservação. O surgimento de novos Estados-nações, sobretudo a partir da Segunda Guerra Mundial, no Terceiro Mundo, e, postoriormente. a luta de grupos étnicos

atender a uma sensibilidade menos culta na apreciação dos monumentos) e valor

de ancianidadese tornaram mais agudos. O próprio uso turístico, assim como a poluição, constituem hoje fatores destrutivos não naturais, portanto, não decorrentes da ação normal do tempo, e, nesse sentido, contrariamtambém os imperativos do valor de ancianidade.23

discriminadosnos Estados nacionais por seus direitos como cidadãos. levaram a mudanças na composição dos patrimónios históricos e artísticos nacionais.

Por outro lado, hoje é ainda mais atual que no início do século a preocupação de Riegl com a mobilização social como fator necessário para a preservação.

O conflito entre valor histórico e valor de ancianidade se dá basicamente em um meio restrito - o das camadas cultas, e, sobretudo, entre agentes diretamente ligados às práticas preservacionístas: arquitetos, historiadores, restauradores, mu-

seólogos etc., em função do trato do bem em sua feição material. Já o conflito entre o valor de ancianidade- que implica uma quase intocabilidadedo bem e a sacralização de tudo que é antigo - e o valor de novidade, envolve setores mais amplos da sociedade e termina por atingir de modo mais extenso outras esferas

das políticas públicas e

a própria noção de desenvolvimento.

mentos segundo a perspectiva da presewação. São poucos os monumentos que estariam totalmente fora de uso atualmente, entendendo-se também como uso a

O PATRIAÕNIO[A

acaso que ele não aborda a questão do valor nacional, nem utiliza, em momento algum,o tormo pafrfmónfo - mas sim pela via do saber. Diz ele: "Será necessárioganhar para a causa do valor histórico camadas sociais bem mais extensas, antes que a grandemassaestejamadurapara o culto do valor de ancianidade"(ibid., p. 99). Uma postura humanista, inspirada nos ideais iluministas, é também a de Giulio

Carlo Argan, que reflete sobre a finalidade social da preservaçãodos monumentos de um ponto de vista psicopedagógico:

Em seu texto, Riegl considera também a questão do valor de uso dos monu-

68

Essa mobilização. para Riegl, não passa pela persuasão ideológica - e não é por

PROCESSO

A presença de obras de arte é sempre caracterizadorade um contexto cuja historicidade manifesta. Uma vez que é o contexto que determina as idéias de espaço e tempo, estabelecendouma relação positiva entre indivíduo e ambiente, descaracterizar

A CONSTRUÇÃODO PATRIAÕNIO: PERSPECTIVAHISTÓRICA

69

o ambiente destituindo-o de suas presenças artísticas tradicionais é uma maneira de favorecer as neuroses coletivas, que se exprimem, mais tarde, em ates de rejeição à civilização histórica, que vão desde o pequeno vandalismo e o banditismo organizado até os fenómenos macroscópicos de violência e de terrorismo - e todos sabem que este é o preço a ser pago pelo não desejado triunfo da sociedade de consumo. jem

Unesco, 1970,p. 87)

só serviria para atender aos interesses mercantis dos antiquários. na medida em que transformaesses objetos em antfguldades.Para Chastel e Babelon(1980. p. 27).

o valor etnográficonão é compatívelcom a noção de património: O objeto visual despojado assume um valor de signo comovente, indicador de uma existência laboriosa, revelador humanos a fazenda, a oficina e a loja de antigamente

Essetipo de reflexão, assim como a de Riegl,prescindedo nacionalismopara

tornam-se agora o que haviam sido. para as gerações anteriores a igreja. o sítio arqueo-

legitimar a presewação dos bens culturais. Retomando a dimensão formadora dos

lógico, o castelo. Todo o equipamento antigo das residências passa assim, para a feli-

valores culturaisno contexto de uma cultura humanística,Riegl e Argan de algum modo se identificamcom a noção rusklnianade humanidade,e de uma demanda

cidadedos antiquários.para o setor da curiosidade.Em que medida,no entanto,esse equipamento entra no património? Pela tipicidade. que se opõe à unicidade da obra de

social fundada em valores éticos e estéticos para Justificar a preservação de bens

arte. respondem os especialistas. Definição que demanda uma nova abordagem, ainda não suficientemente definida. O objeto e o meio formam um conjunto ligado do ponta

culturais. Também transcendendo a idéia de nacionalidade, mas numa perspectiva

de vista etnológico. Retiradosdo uso e da função, eles se dissociam.Reconhecere

política, essa demanda tem sido traduzida, nas últimas décadas, na noção de di-

presewar não têm mais o mesmo sentido nem as mesmas consequênciasde antes.

reitos culturais. Partidáriosconfessos da sacralização do património. Chastel e Babelon são

2.4 A MPUA[ÃO DA NOÇÃO DE PATRIAÕNIO

profundamentecéticos em relação aos novos pafrímõn/os, e também quanto à extensãodessa noção aos países do Terceiro Mundo de tradição cultural distinta

E A L[GITIMCÂO VIA DIREITOS CULTURAIS

No século XX. ficou evidente o avanço do valor de ancianidade, que Riegl já preconizara

em 1903, e que se manifesta pela ampliação da noção de património.

Começam a ser introduzidas nos patrimónios as produções dos esquec/dos pela história factual, mas que passaram a ser o objeto principal de interesse da história das mentalidades: os operários, os camponeses, os imigrantes, as minorias étni-

cas etc. Aos bens referentesa esses grupos se acrescentamos produtos da era industrial e os remanescentes do mundo rural. A partir de 1945, os nacionalismos que emergem nas ex-colónias, sobretudo as francesas, nos continentes africano e asiático, começam também a se apropriar da noção européia de património. Se é difícil compatibilizar a valoração desses tipos de bens com as exigências tradicionais do património, em termos de valor histórico e de valor artístico. foram a etnografia e a antropologia que, inicialmento, legitimaram sua inclusão nesse

universo semântico, reforçando disciplinarmente seu valor cultural. Entretanto. essa ampliação da noção de património, que leva à suporposição das noções de bem pafdmonh/ e bem cu/fura/, e que tem. como já foi observado. uma importante conotação política, é objeto de crítica contundente por parte de alguns ideólogos do património, como Chastel e Babelon. Para esses autores. o "sentido do patri-

mónio' é indissociávelda idéia de culto, de sagrado,que só os grandesmonumentos podem provocar. A conversão de objetos comuns em .bens patrimoniais

da cristã-ocidental. Valores como monumentalidade, singularidade e excepciona-

lidade são consideradospor eles como fundamentaispara despertaro senado do pafrfmõnio.Mas, ao criticarema aplicação de critérios etnográficos2'para a seleção de bens patrimoniais,e ao defenderemo sentido do sagrado como "o único possívelem uma época de agnosticismo',esses autores deixam de levar em conta a inevitável dimensão política da questão, reforçando, por outro lado. sua di-

mensãoideológica. A crítica de Chastel e Babelon está fundada em certos princípios da prática de preservação superados pelas transformações sociais recentes. Em primeiro lugar, a idéia de que presemação é sinónimo de guarda de bens excepcionais,

para seremobjetos de contemplaçãoe fonte de conhecimento,é. hoje, considerada uma posturamuseológicaanacrónica.elitista, tanto de um ponto de vista puramente mercadológico quanto de um ponto de vista político. A idéia de democratização

do patrimónioimplica,qualquerque seja a perspectiva.o fato de que o Estado não deve ser o único atar social a se envolver na preservaçãodo patrimóniocultural de uma sociedade. Do mesmo modo, a ideologia do nacionalismoque, durante dois séculos, sustentou as políticas estatais de património. vem sendo subs-

tituída pela noção de direitosculturaiscomo nova forma de legitimaressas políticas. Os direitos humanosfuncionam atualmente.em vários países de democracia não-consolidada, caso do Brasil. como vetores de uma luta política pela democra-

70

O PÁÍRIAÕNIO

[A

PROCESSO

i consíKucÃo

DO PATRiAõNIO: PERSPECTIVAHISTÓRICA

71

tização que se desenvolveà margem e acima dos Estados nacionais. Essa luta

sal dos Direitos do Homem,da ONU, em 1948 (art. 22). A formulaçãodessa de-

se expressa não apenas pela ação da sociedade sobre os organismos estatais,

manda como direito só se tornou possível depois que a instrução e a educação

por uma descentralização administrativae pela consolidaçãode mecanismosde

lesta entendidacomo Bf/duna,como formação) passaram a ser consideradasbens

representaçãopolítica, como também pela organizaçãode associaçõescivis independentes, voltadas para questões específicas (meio ambiente, liberdades civis

etc.) (cf. Campilongo.1988).

necessáriosa todos e não apenas interessede alguns.:5 Na verdade, foram certas condições específicas do segundo pós-guerra que levaram à formulação dos direitos culturais enquanto direitos humanos. Por exemplo,

A noção de cidadania envolve, atualmente, uma gama diversificada de direitos:

direitos políticos (de primeira geração, fundados no valor da liberdade)l direitos económicos,sociais e culturais (de segunda geração,fundados no valor da igualdade)l e direitosde solidariedade(de terceira geração,fundadosno valor da fraternidade).

1.

a extinção do colonialismo e o surgimento de Estados independentesem

áreas de colonização européia, que precisavam reconstruir uma cultura próprias 2.

o aumento do consumo de bens culturais, em decorrência do maior

acesso à educação formal e do desenvolvimento dos meios de reprodução técnicas

A diversificaçãodos direitos humanos correspondeuma crescente particulari-

3.

a antropologizaçãodo conceito de cultura, que passou a abranger a

zação dos sujeitos a que se referem esses direitos. O homem, ou o cidadão, en-

atividade humana em geral. e as manifestações de qualquer grupo humano, o que

quanto identidadepolítica. não é mais especificadoapenas por sua nacionalidade

levou à consciência da necessidade de defender as culturas prfmiffvas, ou de

ou classe social. Define-se também a partir de categorias como sexo. etnia, religião, cultura etc. De um certo ponto de vista, os componentesdo meio ambiente

mfnorlas,ameaçadaspor culturas mais poderosas.

(fauna,flora, biosfera etc.) assumemtambém o sfafus de sujeitos, na medida em

gire/fos cu/furalsem termos de demandas definidas. A percepçãoda cultura - e

que passam a ser objeto de proteção específica. Esse fato confirma a evidência

seria o caso de perguntar, que cultura? - como bem indispensável a todos os

de que os direitos humanos são históricos e demonstra que sua formulação acom-

homens não se exprime. nas sociedades modernas, estratificadas e com campos

panha as transformaçõessociais.

O fato, porém. é que, até hoje, poucos têm conseguidotraduzir a expressão

Diz NorbertoBobbio (1992, p. 25) que o problemaatual dos direitos humanos

autónomos, com a mesma contundência que a luta pelos meios materiais de sobrevivência. Por esse motivo, talvez, as tentativas de formulaçõesno sentido

não é o de seu fundamentoe sim o de suas garantias.No caso dos direitos eco-

de explicitar esses direitos provocam o efeito de utopias válidas mas inexeqilíveis,

nómicos,sociais e culturais, esse aspecto é mais complexo,pois não basta seu

o que ocorre sobretudoem sociedadescomo a brasileira,marcadapor tremendas

reconhecimento jurídico nem o estabelecimento de um regime democrático, que

desigualdadeseconómicase sociais. Além disso, é preciso lembrar que o con-

respeite as liberdades individuais: é preciso que a estrutura da sociedade possi-

ceito de cidadania no Brasil está historicamentoatrelado a uma concessãodo

bilite a todos os cidadãos o acesso a esses direitos. Portanto, a real conquista

Estado, formalizado no que o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos

desses direitos depende de um empenho do Estado e de uma mobilização da opi-

j1987, p. 68) denominou"cidadaniaregulada', "cujas raízes encontram-se,não em

nião pública - o que, na maior parte dos países, sobretudo os menos desen-

um código de valores políticos,mas em um sistema de estratificaçãoocupacional.

volvidos,está longe de ser alcançado.

definido por norma legal' (1987, p. 68). Faltaria, portanto, na cultura política bra-

Por outro lado, é inegável que a menção a esses direitos em diferentes discur-

sileira, um solo fértil para que se possa concretizar uma prática política na base

sos - declaraçõesinternacionais.constituiçõesnacionais,leis, imprensaetc. - con-

de uma noção que pressupõea crença em um conceito de cidadania universal.

tribui para lhes conferir visibilidadee para convertê-losem objeto de interesse político

Para Alain Touralne,uma das dificuldadespara a implantaçãoda democracia

A expressão dre/fos cu/furafs surgiu pela primeira vez na Constituição soviéti-

na AméricaLatina é que ela tem como pressuposto"uma consciênciapropriamente

ca de 1918, mas só foi reconhecida,em nível internacional,na DeclaraçãoUniver-

72

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

política de cidadania, de pertencimento a uma coletividade política' (1988, p. 442).

 coNsTRUÇÃo DO PATRIAÕNIO: PERSPECTIVA HISTÓRICA

73

A luta pelos direitos humanos na América Latina só pode ser compreendida se vinculada à resistência ao autoritarismo que, nos anos 70, predominava no continente. Tratava-se de uma conjuntura diferente da européia, onde ocorria um esgotamento dos modelos de Estado: o do socialismo soviético e o do bem-estar

social. Dizem, a respeito, Calderón e Janlin:

sociedade brasileira há necessidades muito mais prementes a serem atendidas (e também, muito provavelmente.que esse tipo de discurso 'não dá voto"). Aos olhos da maior parte dos políticos brasileiros, esse não é um campo propício ao exercício e à afirmação do poderáe essa postura fica evidente na ausência do tema em programasde partidose plataformasde eleição. Por outro lado, vem se

Os direitos humanas surgem junto a uma revalorização da democracia como construção,e não como algo dado e preexistente.Todos aqueles valores que eram óbvios,e que confirmavam algo assim como um conjuntomínimo de normas éticas que se davam por aceitas e além das quais se dirigiam as lutas políticas e sociais, tiveram que tornar a ser reconstruídos,recolocadose revalorizadosa partir da experiência de sua violação sistemática pelos governos dffaforíais.j1987, p. 80)

No caso dos direitos culturais a questão é mais complexa, sobretudo nos países que se originaram das colónias européias o foram marcados pela escravidão. Esses países herdaram uma noção de cultura duplamente restrita: nãa apenas em termos de classes sociais - na medida em que não se reconhecia. do mesmo modo que nas metrópoles, o caráter de cultura às produções e práticas dos estratos populares - como também em termos geográficos, pois, mesmo após a independência, a verdade/ra cultura era aquela importada das metrópoles européias.

A noção de direitos culturais é, portanto, nesses países, carente de sentido para a maior parte da população, do mesmo modo que a noção de cultura. E se. como observa Eunice R. Durham, nos países sem uma tradição democrática consolidada "são os movimentos sociais que operam a transformação de necessi-

o que pode ser visto "como um amplo processo de revisãoe redefinição do espaçoda cidadania'(1984,p. 29), no caso dos dades e carências em direitos',

direitos culturais, pelo menos no Brasil, essas necessidadese carências em grande parte ainda dependem, para serem formuladas enquanto direitos culturais, da

observando recentementeum crescente Interesse de governos de estados e muni-

cípios em marcar sua atuação com iniciativas na área da cultura. A questão se torna mais complexa quando consideramos que, também no meio intelectual, a difusão da ideologia do relativismo cultural torna problemática qual-

quer concepção universalistade cultura ou de direitos culturais, o que significaria legitimaruma cultura em detrimentode outras. Essa problemáticadefine também as relações entre países nos organismos internacionais.A propósito, o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro observou, sobre a Conferência Mundial dos Direitos

do Homem,realizadaem Viena, em julho de 1993, que "foi o embateentre os países que reconhecema universalidadedos direitos humanos e aqueles que pretendem afirmar a especificidade cultural de cada sociedade' IJorna/ do Brasa/,

15.7.93.p. lll. Resumindo, se a emergência da noção de património histórico e artístico nacional se deu no âmbito da formação das Estados-naçõese da ideologia do nacionalismo,sua versão atual, enquanto património cultural, indica sua inserção em um contextomais amplo - o dos organismos Internacionais- e em contextos mais restritos- o das comunidadeslocais. Nesse sentido. nas duas últimas décadas essa noção foi ressemantizada,extrapolou o seu domínio tradicional, o dos Estados nacionais,e passoua envolver outros atores que não apenas burocratas e intelectuais. As modificações na conceituação e no gerenciamento do património

enquanto objeto de políticas públicas indicam sua progressiva apropriaçãocomo

mediação dos agentes estatais.

tema político por parte da sociedade.o que trouxe conflitos a uma práticatradicioA expressão d/re/fos cu/fura/s foi incluída na Constituição brasileira de 1988

kart. 215), mas, até hoje. a não ser em casos excepcionais,essa temática não

foi incorporada às políticas públicas na forma de propostas de trabalho. Nesse sentido, os direitos culturais no Brasil não passam de dre/fos cacos, meras declarações de boas intenções. Tema cada vez mais presente nas agendas políticas nacionais e internacionais, a questão da cultura encontra, no Brasil, fortes resistências por parte da classe política, que costuma considerar (nem sempre de forma explícita) que na

74

O PÁTRIÁONIO[A

PROCESSO

nalmente exercidapelo Estado, com o concurso de intelectuaisde perfil definida

e à margemdas pressõessociais. Nos próximos capítulos, vou analisar a prática de preservaçãodo património cultural desenvolvidano Brasil, procurando, primeiro, situa-la numa trajetóriâ que tem início no final dos anos 30. para, em seguida,me deter nas mudançasinstitucionais que ocorrem a partir dos anos 70, com a entrada em cena de novos atores,

a adoção de uma concepçãoampla e abrangente de cultura, á ensaio de novas formas de proteçãoe, sobretudo,uma proposta de democratizaçãoda política de

A CONSTRUÇÃO DO PATRIAÕNIO: PERSPECTIVA HISTÓRICA

75

patrimónioem nível federal. O objetivo dessa análise é esboçar as questões e

10

'0 artista deixou de ser um artífice entre os artífices, pronto para executar encomendas

os conflitos que emergem dessa nova orientação,no sentido de apreender refe-

de sapatos, armários ou pinturas, conforme o caso. Era agora um mestre dotado de auto-

rências para uma reflexão tanto crítica quanto prospectiva.

nomia, não podendo alcançar fama e glória sem explorar as mistérios da natureza e sondar

as leis secretasdo universo."IGombrlch, 1993. p. 218) 11

NOTAS

Esses autores citam um documento de 1750, onde se diz que "/a desfrucf/onfofa/e de /'hófe/

de Solssons va nous dépayserdana nutre propre ville' \p. l q. A própria separação entre espaço e tempo é uma característica da modernidade. Diz. a

12

A Comissão de Monumentos havia sido criada em 1790

respeito, Anthony Giddens: "Nas sociedades pré-modemas, espaço e tempo coincidem amplamente,na medida em que as dimensões espaciais da vida social são, para a maioria

13

da população,e para quase todos os efeitos, dominadaspela 'presença'- por atividades localizadas.O advento da modernidade arranca crescentementeo espaço do tempo

No Brasil, pintores como Pedra Américo e Vítor Meireles se voltaram, em sua atividade artística, para a exaltação da nacionalidade.

14

fomentando relações entre outros 'ausentes'. localmente distantesde qualquer situação dada

As instruções do inventário de 15 de dezembro de 1790 recomendavam 'a conservação dos

manuscritos, mapas. selos, livros, impressos. monumentosda Antiguidade e da Idade

ou interação facea face.'(1991,p. 27)

Média, estátuas, quadros e outros objetos relativos às belas-artes, às artes mecânicas e

2

Etimologicamente.a palavra monumento vem do latim monumenfum,o que traz à memória.

à história natural, aos costumese usos dos povos tanto antigos como modernos,

A palavra alemã Denkma/ é composta pelo verbo denken jpensarl e pelo substantivo Ma/

provenientes do mobiliário das casas eclesiásticas e que integram os bens nacionais'

(coisa). 15

Eric Hobsbawmobsewa: 'não nos devemos deixar enganar por um paradoxo curioso,

Nos últimos anos, vem se assistindo a um novo interesse por monumentos intencionais. Na última década, foram construídos. nos Estados Unidos, o Muro do Víetnã e o Museu

embora compreensível:as nações modernas. com toda essa parafernália, geralmente afir-

do Holocausto. Na França do governo Mitterand. esse foi um dos objetivos dos Gramas 7}auaux.No Brasil,foram idealizados monumentos em memóriade Tancredo Neves. Ulisses

do construído, ou seja, serem comunidades humanas 'naturais' o bastante para não neces-

mam o oposto do novo, ou seja, estarem enraizadas na mais remota Antiguidade, e o oposto

sitarem de definiçõesque não a defesa dos própriosinteresses' j1984. p. 22-231.

Guímarãese Luís Carlos Prestes, entre outros.

Embora qualificassemmuitas vezes como 'pitorescas' essas viagens, certos viajantes como Debret, produziramdocumentaçãode inconteste valor científico.

Tanto a cultura quanto a economia produzidas pela prática preservacíonista são resultado

de uma dialética entre o conservar e o destruir.' garantes.1989. p. 16)

17

anos no Museu Austríaco de Artes Decorativas.Foí nomeado, em 1902. presidenteda Comissão Austríaca de Monumentos Históricos, e encarregado de elaborar uma nova legis-

lação para a conservaçãode monumentos.

Essa idéia será concretizada por William Morris. que. em 1877.'fundou a Society for the Protection of Ancient Buildings.

Historiador da arte austríaco com formação em direita e filosofia. Trabalhou durante vários 18

Segundo Françoise Choay (1992, p. 126-128), o Italiano Camillo Boião(1 853-19141foi, assim como Alois Riegl. um precursor. Sua ampla formação (engenheira, arquiteto, historiador da

Professor honorário do Collége de Francel francês, autor de várias obras sobre história da

arte) Ihe permitiu aliar o conhecimento de dois mundos que eram então considerados inconciliáveis: o da aRe e o da modernidade tecnológica

arte, dirigiu o Inventário Geral dos Monumentos Históricos. iniciado em 1964.

Das doutrinas de Ruskin e de Viollet-le Duc. Boatoaproveitou o melhor para elaborar uma

Inspetor Geral dos Arquivos de França; francês, antigo conservador do Museu de História da França e antigo consewador-chefe da Seção Antiga dos Arquivos Nacionais. Autor de

síntese, tenda sido o inspirador das orientações para restauração de monumentos na ltália. De Ruskin e Morris reteve a noção de autenticidade, enquanto respeito pelas marcas da

temposde Viollet-le-Ducreteve o senso prático de que a restauraçãose justifica porque

várias obras sobre história e monumentos da França.

o interesse atual da conservação deve prevalecer sobre o respeito absoluto pelo passado.

Historiadoradas teorias e das formas urbanas e arquitetõnícaslfrancesa,professorada

Universidade de ParasVlll

Ao defender a explicitação das partes restauradas(através de materiais ou cores diferentes. legendas indicadoras etc.). Boito pode ser considerado o responsável pela instauração da

9

Na atividade de colonização empreendida pelos europeus em outros continentes no início

restauração como disciplina.

da Idade Moderna. esses procedimentos foram frequentemente utilizados também com a

Para essa visão abrangente de monumento deve ter contribuído sua experiência, durante

finalidade específica de afirmar sua dominação sobre os povos nativos, como ocorreu na

dez anos. como diretor do departamentode têxteis do Museu Austríacode Artes Deco-

atual cidade do México e em Cuzco, no Peru.

rativas.

76

O PATRIAÕNIOeA PROCESSO

A CONSTOU(ÂO DO PATRIAÕNIO: PERSPECTIVAHISTÓRICA

77

a Essa problemática já vinha sendo abordada na Fiança, desde o final do século XVI, por ocasião da Querelle des Anciens et des Modemes. ' 21

O eurocentrismo começou a ser questionado pelos europeus no contacto com os testemunhos das antigas civilizações ameríndias, asiáticas e africanas a O romantismo incorporou a Idade Média. como tema e como motivo, a seu repertório estético.

"

Cf. l.:Express,ed. esp. Pafrimoüe -/e désasfre(1988).

24

A noção de bem cultural não se confunde,ou não deveria confundir-se,com a de bem

PARTE

patrimonial: os objetas de coleção, os testemunhos etnológicos são ou podem ser bens culturais dignos de atençãol não são por isso. no entanto. senão metaforicamente, elementos

do património. na medida em que este é sempre definido por um valor diferente do conhecimento científico. Do que resulta o fato curioso de que inúmeros países do Terceiro Mundo foram levadosa designar monumentos. conjuntos e sítios que pudessem constituir um 'património'. O conjunto das tradições e dos costumes, verdadeira espinha dorsal dessas sociedades. não implicava uma ordem de símbolos monumentais comparável à das reg ões ocidenta!is:fot preciso. portanto, improvisar uma ordem. E uma questão de dignidade Mas o artifício salta aos olhos.' (Chastel, Babelon, 1980, p. 29)

z

Partindode uma distinçãofeita pelo padre dominicanoLebresentre bens 'compressíveis

(de quese podeprescindira e 'íncompressíveis'(indispensáveis à sobrevivências, Antonio Cândida observa que falar em direitos culturais significa considerar 'bens incompressiveis nao apenas os que asseguram a sobrevivência física em níveis decentes, mas os que garantem a integridade espiritual' (1989, p. lll).

78 O PAÍRIAÕNIO eA PROCESSO

PATRIAONIO NO BRASIL

CAPITULO 3

h \hS\ HEROICÁ

Nem me falta na vida honesto estudo,

comlongaexperiência misturado (-.). Luís de Camões, Os /usiâdas Desde quando é de boa ética matar gente velha porque estorva

o caminho? LúcioCosta, Parecer anexado ao processo de fombamenfo da igreja Bom Jesus dos Martírios, em Recite, Pernambuco.

No Brasil, a temática do património - expressa como preocupação com a sal-

vação dos i/estígiosdo passadoda Nação, e, mais especificamente,com a proteção de monumentos e objetos de valor histórico e artístico - começa a ser considerada politicamente relevante, implicando o envolvimento do Estado, a partir da década de 1920. Já estavam então em funcionamento os grandes museus nacio-

nais, mas não se dispunha de meios para proteger os bens que não integravam essas coleções, sobretudo os bens imóveis. A partir de denúncias de intelectuais sobre o abandono das cidades históricas e sobre a dilapidação do que seria um "tesouro' da Nação, perda irreparável para as gerações futuras, pela qual as elites e o Estado seriam chamados a responder, inclusive perante as nações civilizadas,

o tema passou a ser objeto de debates nas Instituições culturais. no Congresso Nacional, nos governos estaduais e na imprensa. Segundo Rodrigo Meio Franco de Andrade, essa "foi uma idéia longamente ama-

durecida em nosso meio' (Andrade, 1987, p. 50). Mas foram alguns intelectuais

modernistasque elaboraram,a partir de suas concepçõessobre arte. história. tradição e nação, essa idéia na forma do conceito de património que se tornou hegemónico no Brasil e que foi aditado pelo Estado, através do Sphan. Pois foram esses intelectuais que assumiram, a partir de 1936, a implantação de um serviço destinado a proteger obras de arte e de história no país.

r Nessa tarefa, exerceram, ao mesmo tempo, a função de intelectuais e de ho-

Na verdade, mesmo em suas primeiras manifestações, não se tratava de um

mens públicos. e marcaram sua presença no serviço iniciado em 1936 - mais.

movimento homogêneo. Em termos gerais, o modernismo, nas segunda e terceira

talvez, que em qualquer outra instituição ostatal de que tenham participado naquele

décadas do século XX, se propunha como uma revolução artísticas mas, sob o

lema da crítica ao passadismoe à linguagem acadêmica,esse movimentoteve

período - de forma tão profunda e duradoura que, até homo,para alguns, o Sphan dos anos 30-40, o Sphan "de doutor Rodrigo', é o verdadeiro Sphan, tendo se tor-

diversas orientações estéticas e também ideológicas.

+

nado praticamente sinónimo de pafrlmõnio.

Nos anos 20. era baixa a incidência de envolvimento direto dos modernistas

Neste capítulo, tenho dois objetivos em mente: primeiro, fazer uma releitura

na atividade política. Era o Partido Democrático (PDI, de orientação liberal, que

desse Sphan, mítico para alguns, ultrapassadopara outros, visando a situar essa

reunia, nessa década e na seguinte, o número mais expressivo de artistas e inte-

instituição e a problemática que a justificou, no momento histórico de sua criação

lectuais simpatizantes do movimento modornista: Paulo Prado (autor de Refrafo

e consolidação.Procurarei rastrear a emergência da questão do património no Brasil, os diferentes pontos de vista sob os quais foi considerada, antes e depois

k

de sua criação.e. sobretudo,apreenderos meiosa que recorreramos agentes

do Brasi0, Paulo Duarte, Prudente de Morais Neto, Rubem Borba de Morais, Sér-

gio Milliet. Sérgio Buarque de Holanda e Mário de Andrade.

Os conservadores se concentravam no grupo católico liderado por Jackson

envolvidos para tornar socialmentevisível essa questão, através de uma política

de Figueiredo que editava a revista .4 Ordem. A ele se juntou Alceu Amoroso

pública - embora os funcionários do Sphan preferissem designar sua atividade

Lima, que se converteu,após a morte de Jacksonde Figueiredo,em líder do grupo. Outro grupos conservadores,que surgiram a partir do modernismo mas

como simplesmente "o serviço', ou 'a repartição'. O segundo objetivo se articula

com o primeiro:reunir elementospara, no capítuloseguinte,situar e analisar a

cujos membros se voltaram posteriormentepara uma militância política. foram o

'+

crítica a esse modelo - que se mantove praticamente inalterado durante quarenta

Verde-amarelo (Menotti del Picchla. Cassiano Ricardo, Cândido Mota Filho e

anos - produzidanos anos 70 e 80, situandoesse segundomomentotanto na

Plínio Salgados e

trajetória específica dessa atividade quanto no contexto mais amplo da complexa

Esses grupos eram anta-revolucionários,temiam a anarquia e as ideologias de

relação entre atividade intelectual e ação política no Brasil.

esquerda,defendiam a ordem e a restauração dos valores espirituais,como as

o Anta, liderado por Plínio Salgado, futuro chefe integralista.

virtudes cristãs e o culto à pátria. Embora independentes, tinham várias afinidades, {

3.1 0

e foi frequente que as mesmas personagenstransitassem entre eles.

CONTEXTO CUUUPAI

Na Semana de 22. o modernismo se apresentou como antiburguês. mas

A criação do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, em 1936.

recebeu, desde o início. o apoio de vultos expressivos da aristocracia do café,

deve ser analisada à luz de dois fatos que marcaram a vida cultural e política do

como Paulo Prado.: A antropofagia, de Oswald de Andrade e de Raul Bopp - que

Brasil na primeira metade do século XX: o movimento modernista e a instauração

teve na pintura de Tarsila do Amaral sua expressão crítica mais radical -, defen-

do Estado Novo, em 1937, corolário da Revolução de 30. A análise do modo como

deu a valorização do primitivo e recorreu à paródia e à sátira.

os agentes do Sphan - recrutados, como já mencionei,entre os adeptos do moder-

Em 1926, um grupo de escritores nordestinos liderados por Gllberto Freire

nismo - lidaram com esse duplo compromisso - com um movimento cultural reno-

produziu o Manifesto Regionalista,que chamava a atenção para os valores da

vador e com um governo autoritário - é fundamental para se compreender a feição

cultura popular local e para os problemas da região. Em Minas Gerais, gmpos locais

específica que o Sphan assumiu enquanto órgão do Estado na área da cultura.

reunidos em torno de revistas (4 Revista, Verde) não assumiram o mesmo tom A compreensão do contexto cultural' em que, pela primeira vez no Brasil, se

localista do grupo nordestino.

formula explicitamente a temática de um património histórico e artístico nacional.

implica

a sua relação com o surgimento e o

desenvolvimento

O maior nome do modernismo foi, sem dúvida, Mário de Andrade que, a rigor,

do movimento

não se enquadrava em nenhum desses grupos, embora tenha, em algum momento,

cultural mais importante na primeira metade do século XX - o modernismo.

82

O PÂTRIAON IO [A

PROCESSO

se declarado "antropofagista'. Inicialmente ligado ao grupo paulista, Mário de

\

83

Andradeserviu de elo entre vários intelectuaismodernistasde todo o país através

no Brasil, conhecida como Casa Modernista, na Vila Mariana. em São Paulo. em

de seus contatos pessoais, viagens e correspondência.De formação católica,

1928. teve que recorrer a um subterfúgio para ter seu prometoaprovado: após apre-

professor do Conservatório de Música de São Paulo, poeta, romancista, contista,

sentar um desenho de acordo com o código de fachadas da prefeitura, alegou pos-

cronista, etnógrafo, Mário de Andrade assumiu, em meados da década de 1930, no governo de Armando Sales de Oliveira, do Partido Democrático, a direção do

Departamento de Cultura da Prefeiturade São Paulo.

t

teriormente falta de recursos para concluir a obra, deixando. como fora sua inten-

ção, a fachada retilíneae nua. Posteriormente,o apoio de representantesproeminentes da aristocraciacafeeira criou um ambiente favorável a que se formasse

Em termos de expressão estética. nos anos 20 predominaram,na literatura e

uma clientela para esse tipo de arquitetura. Mas, nessa década, a reação ao ecle-

nas artes. uma linguagem não-realista e a incorporação de recursos expressivos

tismo vinha do movimento neocolonial. de Ricardo Severo e José Marçano(filho).

das vanguardas européias. A questão da identidade nacional era também um tema

Esses movimentosda década de 1920 - tanto na esfera política quanto na

comum a praticamente todos os grupos modernistas, que se expressavam, em

intelectual - tinham em comum a crítica aos modelos políticos e culturais da Velha

suas manifestações mais elaboradas - a antropofagia e a prosa e a poesia de Mário

de Andrade- através de uma visão crítica do Brasil europeizadoe da valorização dos traços primitivosde nossa cultura, até então tidos como sinais de atraso. Mas nem Macunaiha nem Cobra /Vorafo podem ser entendidos propriamente coma símbolos da nacionalidade.A respeito, diz Mário de Andrade em um dos prefácios

inéditos a A4acuna/ha:"só não quero é que tomem Macunaímae outros personagens como símbolos. E certo que não tive a intenção de sintetizaro brasileiro em Macunaímanem o estrangeirono gigante Piamã" (Andrade[org.]. 1978, p. 23). Ao caracterizarcomo "rapsódia"sua narrativa, e ao dizer no mesmo prefácio que 'ainda não é tempo de afirmar coisa alguma', Mário de Andrade fugia das sínteses simplistas c conclusivas. Para ele. o conhecimentodo Brasil se fazia na literatura. via criação, e na ciência, via observação e pesquisa. A elaboração

de uma versão sintética da /denf/jade nac/ona/era algo a ser realizado no futuro, e devia ser precedidapor um trabalhode análise e de conhecimentodas raízes cul-

turais brasileiras. Do mesmo modo que a literatura e as artes plásticas,a arquiteturamoderna foi introduzidano Brasil a partir do contato com a vanguardaeuropéia- no caso,

República. Apesar da heterogeneidade de tendências. provocaram a progressiva erosão da legitimidade do regime e mobilizaram a opinião pública para a idéia de mudança. No campo da cultura sua sedimentação foi mais lenta e apenas a partir

do final dos anos 30. e nos anos 40. alcançouum reconhecimento maisamplo. também em função de apoio oficial. A participação dos intelectuais modernistas na administração pública federal só teve início efetivamente após a Revolução de 30. Já no início do governo. Var-

gas começou a estruturar o aparelho do Estado, criando o Ministério da Educação e Saúde (19301,o Ministériodo Trabalho (1930). o DepartamentoNacional

de Propaganda j1934)e o Departamento Administrativo do ServiçoPúblico- Dasp 11938)

Com a instauração do Estado Novo, a reforma administrativa foi ampliada, e o Estado passou a ser apresentado como o representante legítimo dos interesses

da nação.por sua vez entendidacomo "indivíduocoletivo',e não mais como coleçãode indivíduos,conformea ideologialiberal (Reis,1988,p. 187-2031. Se, por um lado, o Estado Novo suprimiu a representação política e instaurou a cen-

o racionalismo de Le Corbusier - e se insurgia contra o gosto burguês vigente.

sura. por outro. ao assumir a função de organizador da vida social e política. abriu

que procuravaacompanharos padrões estéticosdo ecletismoda École des Beaux-

espaçospara os intelectuais,tanto para os que assumiramclaramentea função

Arts francesa. Esse era o estilo que predominavanas construçõesque invadiam

de ideólogos do regime (Francisco Campos. Azevedo Amaram,Oliveira Viana.

os espaços urbanos.sendo a mais evidente expressão desse período a Avenida

Almir de Andrade etc.), quanto para aqueles que, sem aderirem,e até demons-

Paulista, onde os barões do café construíam suas mansões. Esse era também a

trando reservas quanto ao novo governo, viram no processo de reorganizaçãodo

gosto o#cfa/,presente na Avenida Central (hoje Rio Branco), aberta por Pereira

Estado uma possibilidade de participarem da construção da nação.

Passos,no Rlo de Janeiro, e nos códigosmunicipaisde construção.Por esse motivo, o arquitetorusso Gregori Warchavchik,autor da primeira construçãomoderna

84

O PATRIAÕNIOeA PROCESSO

A relação entre cultura e política era o principal tema da revista do mesmo nome (Cu/fura Po/#fca), veículo da ideologia do Estado Novo no meio Intelectual.

85

A revista era dirigida por Almir de Andrade, em cuja obra as tradições culturais brasileiras eram invocadas para legitimar o regime. Para a mobilização das massas, as instituições oficiais recorreram sobretudo a símbolos expressamente

(Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho) e dos católicos (Alceu Amoroso Lima). Na verdade, foi o líder católico que teve maior influênciajunto ao ministro.

criados para invocar a pátria (a bandeira, os hinos, a efígie de Vargas etc.) e aa

Outro fato importante na área da educação foi a criação dos cursos superiores

incentivo às atividades cívicas. A preocupação de nacionalizar o ensino funda-

de ciências sociais. Em 1933 foi criada em São Paulo a Escola de Sociologia

mental - visando sobretudo à integração, em certos casos à força, das comu-

e Políticasem 1934, a Faculdadede Filosofia, Ciências e Letras da Universidade

nidades de imigrantes europeus no Sul - reduzia os conteúdos culturais a uma

de São Paulol e, em 1935, a Universidade do Distrito Federal.

função instrumental. O objetivo era criar uma cultura nacional homogênea,que

Na literatura e nas artes plásticas ocorreu, na década de 1930, o que João

propiciasse a identificação dos cidadãos com a nação. Pois "o que preponderou

Luis Lafetá (1974)caracterizoucomo a mudançada ênfase de um prometo estético

no autoritarismo brasileiro. no entanto, não foi a busca de raízes mais populares

Idécada de 1920) para um prometoideológico. A produção de uma literatura

e vitais do povo. que caracterizava a preocupaçãode Mário de Andrade, e sim a tentativa de fazer do catolicismo tradicional e do culto aos símbolos e líderes

roalista, de uma arte que voltava ao figurativo e de uma ensaísticaque procurava

da pátria a base mítica do Estado forte que se tratava de construir'(Schwartzman

et al., 1984, p. 801. tério da Justiça (Agência Nacional, Departamentode Imprensa e Propaganda)e do Ministério da Educação e Saúde. Logo após o golpe, esse último ministério foi oferecido, a título estritamente pessoal. a Plínlo Salgado. que, no entanto. o recusou, manifestando-se inclusive publicamente contra a extinção da Ação Inte-

gralista do Brasil. Confirmado Capanema no cargo, foi empreendidauma ampla reforma, sendo criados no MES o Instituto Nacional do Livro, dirigido por Augusto Meyer, o Serviço Nacional de Teatro, dirigido por Thiers Marfins Moreira, o Instituto Nacional de Cinema Educativo e o Serviço de Radiodifusão Educativa, diri-

gidos por Edgar Roquete Pinto, e o Serviço do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional. já sob a direção de Rodrigo Meio Franco de AndrHde desde o ano anterior. Funcionavam também no MES o Conselho Nacional de Cultura e o Conselho

música de Heitor Villa-Lobos. Nos anos 30. a arquiteturamoderna. recém-introduzidano Brasil e praticada por arquitetos que tinham ligações pessoais com os modernistas (Lúcio Costa, Oscar Niemeyer,Carlos Leão, Afonso Reidy, os irmãos Marmeloe Milton Roberto, Atílio Correia Lima etc.), recebeu apoio oficial através de Capanema,primeiro com a nomeaçãode Lúcio Costa para a direção da Escola Nacional de Belas Artes, em 1930, graças à influênciade Rodrigo Meio Franco de Andradejunto ao ministro, e, postoriormente,com o episódio da construçãodo novo prédio do MES, que se converteu no monumentoaos novos tempos. Em 1936, num gesto ousado, o ministro preteriu o prometoneomarajoarado arquiteto Arquimedes Memória, vencedor em concurso público, chamando para executar o novo prometouma equipe de jovens arquitetoslideradapor Lúcio Costa, todos adeptosdas idéias de Le Cor-

do Sphan.

Para o prometo ideológico do Estado.

afirmativo que não encontramos na década anterior. Foi a época do romance regionalista, das pinturas de Cândido Portinari e de Emiliano Di Cavalcanti, da

No âmbito do Estado, essa função foi exercida por órgãos da esfera do Minis-

Consultivo

ser científica conferiam à noção de identidade nacional uma positividadee um tom

o rádio e o cinema eram, sem dúvida.

as áreas de atuação mais importantes. tanto que os dois órgãos criados no MES foram disputados pelo Ministério da Justiça. evidenciando-secom isso uma tensão

busier. Desse prometo participaramtambém o pintor Cândido Portinari,o paisagista

Burle Marx e o escultor Bruno Giorgi. Esses gestos, assim como a nomeaçãode Carlos Drummondde Andrade co-

entre sua caracterização,ora com o instrumentode propaganda,ora como recurso

mo chefe de gabinete,e a admissão,nos quadros do MES, de vários intelectuais

pedagógico (cf. Schwartzman et al., 1985, p. 86-891.

vinculados ao modernismo foram, nos anos 30, sinais concretos da relação que

Entretanto,no MES, a área da cultura foi bem menos marcada por conflitos

ideológicosque a área da educação.Foi nesta última que se concentraramas atenções do ministro, tarefa complexa devido ao alto grau de politização da questão educacional no período, com o confronto dos interesses dos escolanovistas

86

O PATRIAONIO[A

PROCESSO

então se estabeleceuentre o governo e aqueles intolectuais. Para a análise da relação entre o modernismo e o património, considero importante destacar dois aspectos: o sentido do ruptura específico desse movimento no Brasil e a presença

de Minas Gerais como tema e dos mineiros como personagens.

b \bS\ yeROICÁ

87

3.2 0

AOVIA[Ní0 AOD[RNiSTA E O

malmente rebuscada. mas acomodada. produtora de imagens distorcidas, de que

PATRIAÕN10

o ufanismode um Afonso Celso seria a caricatura. Ideologicamente. era a temática do nacionalismo- que nos séculos XVlll e XIX se expressousobretudo através

3.2.1 0 sentidode ruptura no modernismo brasileiro A significação do modernismo na vida cultural e também, secundariamente, na vida política do Brasil só pode ser corretamente avaliada na relação desse movi-

mento com o contextocultural a que veio se opor. Caracterizadode início como um movimento exclusivamente artístico, na verdade desde suas primeiras mani-

Estado que Ihe garantia a estabilidade para o exercício de sua produção intelectual. Antonio Candido considera que essa literatura, de tal modo subordinada

festações demonstrouter um alcance bem mais amplo.

a determinações ou interesses externos a seu campo específico, teria perdido seu

Daniel Pécaut observa que "de maneiras diversas sucessivas gerações de

potencialcrítico e, nessesentido, teria sido incapaz de exercer o que, na moderni-

intelectuais brasileiros invocavam a realidade nacional" (1990, p. 6).; Era o envolvimento na questão da identidade nacional que marcava o compromisso social do

dade, seria a sua função social própria: construir, no nível da elaboraçãoestética, uma representaçãocríticado real. No Império, pode-sedizer que Machadode Assim

intelectual, inclusive de escritores e artistas. Nesse sentido, assumiam também

foi a importante exceção que confirma a regra, e, na República, aqueles escritores

a função de atores políticos, e era comum que essa dupla missão unisse na mes-

que, como Euclidesda Cunha e LamaBarrete, elaboraramuma crítica social mais

ma pessoa o poeta o o abolicionista (Castro Alves), o escritor e o jornalista (Euclides da Cunha), o contista sertanejo e o ardente defensor de causas nacionalis-

tas, como na questão do petróleo (Monteiro

Lobato).

contundente, acabaram condenados ao isolamento. O modernismo. para Antonio Candido, surge como movimento de ruptura com

essa tradição que a proclamaçãoda República não alterou. No início do século.

No Brasil, essa dupla inserção social dos intelectuais assumiu características

a literatura brasileira se caracterizava por ser "uma literatura satisfeita, sem an-

específicas, fenómeno que foi analisado por Antonlo Cândida em suas conse-

gústia formal, sem rebelião nem abismos. Sua única mágoa é não parecer de todo

quências tanto para a produção literária quanto para o papel político do intelectual.

européia" ICandido, 1967, p. 133). De um lado, um nacionalismo diluído numa

Ao concentrar sua reflexão sobre a literatura, Antonio Candido se refere. po-

literatura de expressão acadêmical de outro, o esteticismo dos parnasianos e dos

rém, a um universobem mais vasto, pois consideraque, "diferentementedo que

simbolistas.

sucede em outros países, a literatura tem sido aqui, mais do que a filosofia e as

Nesse contexto, não é difícil entender o caráter fundador que os próprios

ciências humanas, o fenómeno central da vida do espírito"(1967. p. 152). Esse fato.

modernistas atribuíam a seu movimento: fundador não apenas de uma nova ex-

aliado ao método de análise que emprega, possibilita que, ao falar de literatura.

pressão artística, afinada com as vanguardas européias e com a modernidade,

Antonio Candido na verdade tenha por objeto o universo da cultura. Resumirei aqui.

como tambémfundador enquantorecusa de um tipo de literaturaque. por se con-

nos traços mais gerais, sua análise da vida cultural brasileira nos séculos XVIII.

fundir com o jornalismo. o discurso político. ou por se submeter às exigências de

XIX e início do XX porque ela é extremamente elucidativa para a compreensão

um formalismo acadêmico. não era, no que consideravam seu verdadeiro sentido,

do significado do modernismo como movimento cultural. e das posições assumidas

literatura. Na verdade. a missão dos modernistas extrapolava o campo restrito da

por seus integrantes enquanto homens públicos.'

literatura e das artes. Tratava-sede, ao buscar definir os limites entre a criação literária e a militância política, repensar a função social da arte.s

Antonio Candido observa que, durante o Período Colonial e o Império, a socie11

do nativismo e do indianismo românticos - que conferia ao escritor sua legitimidade social. Além disso, dada a ausência de um público que, através do consumo de livros, possibilitasseao escritor o sustento material, era o mecenato do

dade que se formou no Brasil era quase totalmentede ilotrados, e que, mesmo

Ao se alinharemà modernidadea partir de sua concepçãoda arte como um

entre as elites, eram muito reduzidos os grupos que tinham acesso a uma cultura

campo autónomo, os modernistas brasileiros não romperam apenas com uma tra-

erudita. Nesse ambiente, o escritor não encontrava condiçõesfavoráveis para assu-

dição estéticasromperamcom toda uma tradição cultural profundamenteenraizada não só entre produtorese consumidoresde literatura e de arte. como em toda a

mir um papel social definido enquanto escritor. Da dinâmica do escritor com esse público resultou uma literatura feita mais para ser ouvida que lida, enfática e for-

88

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

sociedade.

89

r' A dialética da particularidade e da universalidade da criação artística é assim Como se explica, porém, a retomada e mesmo o profundo envolvimento dos modernistas com a temática do nacionalismo, e seu engajamento na vida política e em instituições estatais? Não significaria essa atitude, após um primeiro momento de entusiasta adesão ao futurismo, ao dadaísmo e ao surrealismo europeus a retomada do mesmo padrão que a princípio haviam repudiado? Eduardo Jardim de Moraes considera que não. que esse movimento é resultante da reflexão crítica

elaborada pelos modernistas no campo estrito da arte, indicando-lhes o que será um aspecto de sua missão social: a construção de uma tradição brasileira autêntica.

O movimento que os escritores modernistas fizeram na direção da tradição e que é analisadopor EduardoJardimde Moraes- foi feitotambémno campo da arquitetura individualmentepor Lúcio Costa, a partir de 1928, ao passar da ade-

são ao estilo neocolonial para a arquitetura moderna

do modernismo sobre si mesmo e de sua inserção enquanto movimento artístico

tanto no contextobrasileiro quanto no 'concerto das nações'. Vale a pena acom-

O estilo neocolonial representou a primeira roação, a partir da segunda década

do século, à incorporaçãoacrítica dos estilos históricos europeus pelo ecletismo

panhar seu raciocínio.'

Para Eduardo Jardim de Moraes, o interesse dos modernistaspela questão da Z)ras//idadedecorreu de uma elaboração no próprio campo da criação artística, que teria ocorrido por volta de 1924, e que implicou a introdução do conceito de tradição como elemento estruturante de uma produção artística que se queria ao mesmo tempo universal e particular - no caso, nacional. Ou seja, que se queria

singular. artística no sentido moderno.

no Brasil. e ao desconhecimento e mesmo desvalorização da tradição construtiva vinda da colónia. Seus seguidores procuraram produzir uma arquitetura que, inspirada nessas raízes, terminou por se converter em uma cópia Guioefeito era evocar

o passado. Embora tenha aderido. de volta de longo período na Europa, ao estilo neocolonial, Lúcio Costa procurou, porém, fazer uma análise mais profunda dos prin-

cípios da arquitetura colonial brasileira. Diz, a respeito, Yves Bruand:

Esse autor considera que foi no contato com as vanguardas européias que os

modernistasperceberam que a modernizaçãoda expressão artística, entendida como rompimento radical com o passado. só tinha sentido em países onde havia

Desde o início suas pesquisas divergiram de seus colegas. preocupados pHncipalmente em copiar as formas e os motivos decorativos do passado. A preocupação com as soluções funcionais e com os volumes claramente definidos, característicosde suas

uma tradição nacional internalizada. Em países de formação mais recente, como o

primeiras obras, era um retomo consciente aas valores permanentes que havia descoberto

Brasil, cuja tradição ainda estava por construir. a adesão imediata ao novo desca-

na arquiteturaluso-brasileirados séculos XVll e XVlll, da qual, em contrapartida,rejeitava

racterizada a produção artística no que ela teria de particular - o seu caráter na-

o que era pura decoração. Suas preocupações profundas, longe de se oporem ao espírito

cional -. perdendo assim também o seu valor universal,enquanto arte. Diz Eduardo

racionalista. aproximavam-no dele. O que o chocava instintivamente no movimento moder-

Jardim de Moraes:

no era o seu caráter absolutista.intransigentee o aparente desprezode seus teóricos por tudo que dizia respeito ao passado. Preocupavam-no o radicalismo desses e o poder

E Gamose o ingressona ordem mundial,portantona vida moderna,ao exigir da

demolidor que confusamente neles sentia existir, a ponto de impedir seu aprofundamento

produção cultural feita no Brasil uma contribuição própria. nacional, exigisse ao mesmo

no problema- problema.que, acima de tudo, parecia-lheestar muito distanciadoda

tempo que esta explicitasse na sua visão do passado relações de cumplicidade que

realidadebrasileira.(1 991, p. 72)

viessem definir para a caso brasileiro uma forma específica de modernidade.' j1988.

Lúcio Costa fez, portanto, um movimento inverso ao dos modernistas do início

P. 231)

Além disso, havia um fato que caracterizavaa tradição brasileira em relação

às descot)ermas que os vanguardistaseuropeusfaziam entãodas culturasprimitivas e da cultura africana: se para esses artistas se tratava de realidadesdistantes no tempo e/ou no espaço, no Brasil essas manifestaçõesestavam vivas no presente. embora fossem negadas ou mitificadas pela cultura europeizada do-

minante. O indianismo romântico exemplifica bem essa situação.

dos anos 1920. para chegar ao mesmo ponto: integrar modernidade e tradição, a partir de uma reflexão sobre a especificidade de seu campo profissional (no caso,

a arquitetura) e de sua relação com a realidade brasileira Vimos, portanto, que tanto de um ponto de vista diacrónico (Antonio Cândida)

quanto sincrõnico IEduardo Jardim do Moraes), tanto em decorrênciada relação dos modernistas com uma tradição cultural a que se queriam opor, quanto de seu

91

90

O PÂTRIAõNIO [A PROCESSO

r desejo de se integraromao "concerto das nações" civilizadas,a necessidade de

nacional. Ao analisar a valorização do barroco - até então considerado um estilo

reelaborar o passado e de construir uma tradição brasileira a partir de uma postura

rebuscadoe rudo - pelos modernistas, diz Mansa Veloso Motta Santos:

autónoma, crítica e liberta de uma "visão patriótico-sentimental"(Cândida, 1967, p. 94) se impunha como parte integrante do prometomaior do modernismo.

Nesse sentido, não é difícil entender o que vários autores apontam como uma

peculiaridadedo modernismo brasileiro: o fato de serem os mesmos intelectuais que se voltaram,simultaneamente, para a criaçãode uma nova linguagemestéticano sentido de ruptura com o passado - e para a construção de uma tradição - no sen-

Nesse momento, no que se refere à construção da nação, o barroco é emblemático, é percebido como a primeira manifestação cultural tipicamente brasileira, possuidor, portanto, da aura da origemda cultura brasileira, ou seja, da nação. Daí o valor totêmico que se constrói, sendo identificado. sistematicamente, como representaçãode 'autên-

tico", de "estilo puro'. (1992, p. 261

E possível que a convivência com os remanescentes da arte barroca tenha

contribuídopara gerar em Minas um regionalismoque Lúcia Lippi de Oliveira ca-

tido de buscar a continuidade.

A temáticado patrimóniosurge, portanto, no Brasil, assentadaem dois pressu-

racterizoucomo"um regionalismo que não se revestiude um provincianismo es-

postos do modernismo, enquanto expressão da modernidade: o caráter ao mesmo

treito ou de um localismopitoresco"(1980, p. 15). Havia entre os mineirosum sen-

tempo universal e particular das autênticas expressõesartísticas e a autonomia

tido de constituírem uma elite intelectual e com a vocação do espírito público. Pre-

relativada esfera cultural em relação às outras esferas da vida social. A atuação

dominavam nolos valores como o rigor, a sobriedade, a honestidade intelectual

dos modernistas no Sphan vai mostrar como eles puseram em prática, num campo

e moral, e sobretudo o senso do dever. Tudo isso matizado pelo humour. em Car-

cultural e político específico, e sob um regime autoritário, esses pressupostos.

los Drummond de Andrade, e pela habilidade política, em Capanema. Nesse senti-

do, Rodrigo Meio Franco de Andradetalvoz fosse o mais mineiro entre os minei-

3.2.2 0s modernistas e #linas Gerais

ros, e era considerado por todos o líder natural do grupo. Em todos eles, um senti-

Dada a importância de Minas Gerais e dos mineiros na criação do Sphan, interessa caracterizara posição desse grupo e o papel de Minas tanto no movi-

l

mento modernistaquanto na vida política brasileiranas décadasde 1920 e 1930.

em pólo catalisador e irradiador de idéias. Foi numa viagem a Minas, em 1916. que Alceu AmorosoLamae o então jovem RodrigoMeio Francode Andrade descobriram o barroco e perceberam a necessidade de proteger os monumentos histó-

ricos. Foi numa viagem a Diamantina,nos anos 20, que o arquiteto Lúcio Costa, então adepto do estilo neocolonial,teve despertadasua admiraçãopela arquitetura colonial brasiloira.Foi também em viagens a Minas, uma delas em 1924, acomlf

mente a líderes como Getúlio, ou à política partidária. Na vida pública, em várias ocasiões. deram demonstração dessa independência - como no pedido de demis-

são de Carlos Drummondde Andradeda chefia de gabinetede Capanema,por não Para os modernistas Minas se constituiu. desde a segunda década do século,

11

do de independência que se expressava em sua resistência a aderir incondicional-

desejar comparecer a uma conferência de Alceu Amoroso Lima no MES, de cujas idéias então discordava, ou ao não hesitar em publicar poemas de cunho socialista enquanto ocupava cargo de confiança em um governo que perseguia os "comunistas'l e nas inúmeros manifestações - inclusive pedidos de demissão nunca acei-

tos - de RodrlgoM. F. de Andradeem protestocontraatitudes,mesmode presidentes da Ropública' que, no seu entender, desautorizavamo Sphan ou seu diretor.

panhandoo poeta Blaise Cendrars,que Mário de Andradeentrou em contato com

Essapostura,ao que tudo indica, não era vista com reservas- e talvezaté

a arte colonial brasileira e com os jovens inquietosda Rua Bahia (Carlos Drum-

o fosse com admiração r pelo mineiro Gustavo Capanema. Tendo aderido à Revo-

mond de Andrade, Pedro Nava, Emíllo Moura etc.), com os quais manteve contato

lução de 30 movido por interesses da política regional, Capanema,ao conhecer

pessoale correspondênciaa partir de então. O fato é que não só mineiros,como

Getúlio, logo após a Revolução, se mostrou reticente quanto à figura do líder gaú-

cariocas, paulistas e outros passaram a identificar em Minas o berço de uma civili-

cho e duvidoso quanto à sua capacidade de conduzir as mudanças que julgava

zação brasileira,tornando-se a proteção dos monumentoshistóricos e artísticos mi-

fundamentais. Sua lealdade política a Vargas não o impediria, portanto. de ter uma

neiros - e, por conseqilência, do resto do país - parte da construção da tradição

postura independentee mesmo crítica em relação a certos aspectosda ideologia

92

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

93

r do Estado Novo, no que, como voremos adiante, não encontrou obstáculo por parte

tituição do cargo de diretor da Escola Nacional de Belas Artes, publicou em O

de Getúlio. A posiçãode Capanemagarantiu ao MES uma funçãomuito além de mero ins-

Jorna/ o artigo intitulado"Uma escola viva de Belas Artes', em que fundamentava suas posiçõesfazendo uma análise inovadora da arquiteturacolonial brasileira.

trumento de consolidação do regime. Possibilitou. inclusive, a manutenção no MES

de um espaçode atuaçãopara os modernistas(comquem se identificavaem vários

Os modernistas não eram. no entanto, os únicos intelectuais a se interessarem

aspectos)a salvo de pressões políticas.Sobre essa relação,dizem os autores

pelo destinoe pela proteçãoda arte colonial brasileira como manifestaçãode uma autêntica tradição nacional. Já em 1914, Ricardo Severo, engenheiro português

de Tempos de Capanemal Era sem dúvida no envolvimento dos modernistas com o folclore, as artes. e particularmentecom a poesia e as artes plásticas, que residia o ponto de cantata entre

filiado ao movimento neocolonial, proferia a conferência 'A arte tradicional no Bra-

sil'. Lideradospor Ricardo Severo, em São Paulo, e por José Mariano (filho), no

eles e o ministério. Para o ministro, importavam os valores estéticos e a proximidade

Rio de Janeiro, esses intelectuais visitavam as cidades históricas e produziam

com a cultural para os intelectuais, o Ministério da Educação abria a possibilidade de

documentaçãoa respeito

um espaço para o desenvolvimento de seu trabalho. a partir do qual supunham que poderiaser contrabandeado, por assim dizer, o conteúdo revolucionáriomais amplo que

acreditavamque suas obras poderiam trazer. (Schwartzmanet al., 1984, p. 81)

Seu primeirogesto de clara adesão ao ideáriomodernistano MES foi em relação à arquitetura, ao apoia-la e, ao mesmo tempo, utiliza-la para a criação de sím-

As primeirasrespostasdo poder público a essas demandasdo meio intelectual partiram dos governos de estados com significativos acervos de monumentos históricose artísticos. Na década de 1920 foram criadas InspetoriasEstaduais de MonumentosHistóricos em Minas Gerais (1926), na Bahia (1927) e em Pernam-

buco (1928).

bolos de uma n(va era. Além de serem os construtoresdesses símbolos- de que o novo prédio do MES era o melhor exemplo- foi no Sphan que os arquitetos modernistas atuaram enquanto integrantes da estrutura institucional montada pelo Estado Novo, sob a direção do advogado, jornalista e contestaRodrigo Meio Franco de Andrade, de quem Capanema disse em entrevista: 'ora um dos homens mais

ligados a mim' (Xavier & Fisherg, 1968, p. 32).

No nívelfederal. foi no âmbito dos museus nacionaisque surgiramas primeiras iniciativas nesse sentido. No início dos anos 20, o professor Alberto Childe. conservador de Antiguidades Clássicas do Museu Nacional, foi encarregado pelo en

tão presidenteda SociedadeBrasileira de Belas Artes e Diretor do Museu Nacional, professor Bruno Lobo. de elaborar um anteproleto de lei para a defesa do patri-

mónio histórico e artístico nacional. que foi considerado inviável porque atrelava a proteção à desapropriação.

3.3 A CRIAÇÃO DO SPHAN

O primeiro órgão federal de proteção ao património surgiu no Museu Histórico 3.3.1 Ás ini(ia+ivaí

Nacional, por iniciativa de seu diretor, Gustavo Barroso. que. nos anos 30, parti-

precursoras

Desde a segunda década do século XX,s intelectuais que depois vieram a se integrar ao modernismo publicavam artigos alertando para a ameaça de perda irreparável dos monumentos de arte colonial. Em 1916, Alceu Amoroso Lama pu-

blicou na Revlsla do Bus// o artigo "Pelo passado nacional', em que relata a profunda impressão que Ihe deixara a viagem que fizera a Minas com Rodrigo M.

cipou do movimento integralista, quando se destacou por suas posições anta-semitas. Barroso era o principal concorrente na disputa com os modernistas da gestão federal do património. Em 1934, foi criada a Inspetoria dos Monumentos Nacionais. norteada por uma perspectiva tradicionalista e patriótica. Essa instituiçãoteve atuação restrita. e foi desativada em 1937, em conseqüência

da criação do Sphan.

F. de Andrade. Em 1920, na mesma revista, Mário de Andrade, que estivera em

A primeira iniciativa do governo federal relativamente à proteção do património

Minas em 1919, publicou textos sobre o mesmo assunto. Posteríomente. ,4 Re-

foi a elevação de Ouro Preto à categoria de monumento nacional, pelo decreto

vela, periódico mineiro dirigido por Cardos Drummond de Andrade e Marfins de

Re22.928,de 12 de julhode 1933

Almelda, também abriu espaço para a questão. O arquiteto Lúcio Costa, ao res-

ponder aos ataques que José Marçano(filho) Ihe dirigiu para justificar sua des-

94

O PATRIAÕNIO[A PROCESSO

Também no Congresso Nacional, desde o início dos anos 20 vinham sendo apresentados projetos com o objetivo de criar mecanismos para a proteção legal

b.\bS\

HERÓICA

95

do património.Em 1923, o deputado pernambucanoLuís Cedro,em 1924, o poeta mineiro Augusto de Lama,e, em 1930, o deputado baiano José Vanderlei de Araújo

intelectual de frezenfas facetas, apoiado em sua experiência no Departamento de

Pinho apresentaramao Congresso propostas nesse sentido, mas nenhuma foi apro-

Cultura da Prefeiturade São Paulo, elaborasse um anteprojetosobre o assunto.

vada. Esses projetos.assim como o anteprojetodo jurista mineiro Jair Lins, elabo-

t.

território nacional, o ministro resolveu recorrer a Mário de Andrade, para que o

O prometode criação de um órgão especificamente voltado para a preservação

radoem 1925,e em que RodrigoM. F. de Andradese baseoupara elaboraro

do patrimóniohistórico e artístico nacional, apresentadoem uma primeira versão

decreto-lei Ra25, de 30.11.1937, esbarravam nas prerrogativas do direito de pro-

no anteprojetode Máriode Andrade" e formuladode forma definitivano decreto-

priedade, asseguradas pela Constituição e pela legislação em vigor.

lei Re25, de autoria basicamente de Rodrigo M. F. de Andrade, apresentava algu-

Em 1934, quando Gustavo Capanema substituiu Francisco Campos no MES, já havia, por parte de setores da elite intelectual e política, não só interesse pela temática da tradição e da proteção de monumentos históricos e artísticos, como uma demanda pela participação do Estado na questão. A partir do Estado Novo. com a instalação, mais que de um novo governo. de uma nova ordem política, eco-

nómica e social, o ideário do património passou a ser integrado ao prometode

mas peculiaridadesem relação às experiências européias já em curso. Em primeiro lugar, à diferença de outros países, onde as iniciativas voltadas para a preservação de bens culturais contemplavam apenas tipos de bens isoladamente(monumentos, museus, arte popular etc.), no Brasil os dois textos citados se caracterizavam por tratarem o tema de forma abrangente e articulada e por proporem uma

única instituição para proteger todo o universo dos bens culturais. Em segundo lugar, se em outros países os agentes da preservação costumavam ser recrutados

construção da nação pelo Estado.

entre intelectuais identificados com uma concepção passadista e consewadora de

Várias foram as circunstâncias. portanto. que levaram à escolha dos modernis-

cultura,no Brasilos intelectuais que se enganaram no prometo do património eram

tas para assumirem esse projeto no governo de Vargas. Decisiva, como já men-

exatamenteaqueles que. como Mário de Andrade e Lúcio Costa. assumiam em

cionei. foi a ascensão ao MES de Gustavo Capanema, personagem politicamente

suas respectivas áreas profissionais posturas claramente inovadoras.''

forte no governo getulista e identificado intelectual e afetivamente com vários escritores e artistas modernistas. Em segundo lugar, conforme observa Lauro Cavalcanti(1993, p. 18), teria con-

tribuído para legitimar essa escolha, em detrimento de outras correntes mais obviamente identificadas com a defesa da tradição (o neocolonial), ou de uma

instituição já em funcionamento no Museu Histórico Nacional, a nítida superioridade qualitativa, em termos de produção intelectual e de prestígio, dos modernistas. Essa escolha já fora definida no episódio da construção do novo prédio

O Sphan começou a funcionar experimentalmente em 1936. já sob a direção

de RodrigoM. F. de Andrade.Coma lei Ra378,de 13 dejaneirode 1937,o Sphan passou a integrar oficialmente a estrutura do MES e foi criado o conselho consultivo.

O Sphan se estruturou em duas divisões técnicas: a Divisão de Estudos e Tombamento (DET), a que estavam vinculadas a Seção de Arte. a Seção de His-

tória e também o Arquivo Central e a Divisão de Conservação

e Restauração

IDCR). A instituição era representada regionalmente em distritos e tinha sob sua

do MES, em 1936.

responsabilidadeos museus regionais, que foram sendo criados a partir de 1938. Além dos formuladores Mário de Andrade e Rodrigo M. F. de Andrade (o se-

3.3.2 A insti+ucianalizaçõo da pro+eção do património A entrada do Estado na questão se efetivou em 1936, quando o ministro Capa-

nema se mobilizou para as iniciativas, já em curso desde os anos 20. visando à proteçãodos monumentose obras de arte nacionais.Sua idéia inicial era fazer "o levantamentodas obras de pintura. antigas e modernas.de valor excepcional, existentesem poder de particulares,na cidade do Rio de Janeiro" (Dphan, 1969, p. 41). Percebendoque o assunto requeria uma atuação abrangente.que compreendesse também as edificações e outras obras de arte, e alcançasse todo o

96

O PATRIAõNIO [A

PROCESSO

gundo. também, dirigente do órgão de 1936 a 1967), participaram do Sphan nesse período, entre outros: Lúcio Costa, a principal autoridade técnica. chefe da Divisão de Estudos e Tombamentos IDET) entre 1937 e 1972, e membro do Conselho Consultivo por um curto períodos Carlos Drummond de Andrade, organizador do arquivo e chefe da Seção de Histórias Afonso Arinos de Meio Franco e Prudente de Morais Neto. consultores jurídicost e Manuel Bandeira, colaborador em várias publicações. os três membros do Conselho Consultivosos arquitetos Paulo Tedim

b \hS\ HERÓICA

97

Barreto. José de Sousa Reis, Alcides da Rocha Miranda, Edgard Jacinto, Renato

afastamento do governo getulista, mas também como distância dos interesses da

Soeirol o artista plástico Luís Jardim. Nos distritos regionais,Aírton Carvalho (l: DR - N/NE), Godofredo Filho (2' DR - Bahia e Sergipe), Sílvio de Vasconcelos

sociedade, sobretudo das classes populares. Nas análises da política do Sphan feitas a partir dos anos 70, tornou-se mesmo lugar comum': atribuir-seo que se

(3a DR - Minas), LuasSaia (4a DR - Sul), que sucedeua Mário de Andrade nessa

passou a considerar o caráter elitista do trabalho desenvolvido pela instituição ao

função. Os restauradores eram Édson Mota. João José Rescala e Jair Afonso

fato (pelo menosem parte) de o anteprojetode Mário de Andradeter sido preterido

Ináciol e a autoridade em arte sacra, dom Clemente da Salva Negra. Foi colabo-

em favor do decreto-leiRe25, de 30.11.37, mais restritivo na concepçãode patri-

radora. desde os primeiros momentos,dona Judith Mastins,também pesquisadora

mónio, mais adequado, porém, às circunstâncias do momento. Embora considere

e chefe do arquivo, após a aposentadoria de Carlos Drummond de Andrade. Inte-

que o modo como essa discussão tem sido conduzida remete antes a um ponto

lectuais do Rio de Janeiro, como Alceu Amoroso Lamae Afonso Arinos de Meio

de vista contemporâneosobre política cultural do que aos reais conflitos da década

Franco, e de outros estados, como Gilberto Freire. Sérgio Buarque de Holanda, Joa-

de 1930, ela Interessa aqui. na medida em que ajuda a explicitar concepções dis-

quim Cardoso, Artur César Ferreira Reis e Augusto Meyer, mesmo sem serem

tintas quanto aos objetivos de uma atuação voltada para o património cultural na-

funcionários regulares da repartição, mantinham cantatas com Rodrigo M. F. de

quele período e a posição dos diferentes atores envolvidos. Considero que, efetiva-

Andrade e participavamde algum modo das atividadedo Sphan. Nos estudos e

mente. as diferenças entre os dois textos indicam interpretações diversas - mas que

pesquisas, o Sphan contava com a colaboração de especialistas estrangeiros, como Germain Bazin, Hannah Levy e Robert Smith. e divulgava em suas publi-

os fatos demonstram como não conflitantes naquele momento - do que esses ati-

cações trabalhos de autores nacionais e estrangeiros, muitos feitos sob encomen-

tido, a atitude de Mário de Andrade no episódio indica que ele mesmo reconhecia

da para atenderàs necessidadesdo serviço.Raramentemencionada,mas igual-

o acertopolítico,naquelemomento,do apoio ao prometo em andamento no Con-

mente fundamental,foi a colaboração de agentes locais, mobilizados nas várias

gresso Nacional - ainda que pudesse não corresponder plenamente ao seu ideal

regiões do Brasil, para auxiliar nos trabalhos de levantamentoe identificaçãode bens e documentos.Formados pelos funcionáriosdo Sphan e pela prática do tra-

de serviço de património.

balho, muitos desses agentes vieram a tornar-se mestresem obras. restaurações,

volveu uma concepção de património extremamente avançada para seu tempo,

documentaçãoetc.

que em alguns pontos antecipa, inclusive, os preceitos da Carta de Veneza. de

A atividade desenvolvida por esse grupo de intelectuaisno Sphan gozou de

res consideravamas necessidades de uma política da preservação. E, nesse sen-

Sem dúvida, no seu anteprojeto Mário de Andrade j1981, p. 39-54) desen-

1964. Ao reunir num mesmo conceito - arte - manifestações eruditas e populares.

surpreendenteautonomia dentro do MES. Desde o início, a área do património

Mário de Andrade afirma o caráter ao mesmo tempo particular/nacionale universal

ficou à margemdo propósito de exortaçãocívica que caracterizavaa atuação do ministériona área educacional.A cultura produzida pelo Sphan sequer era articu-

da arte autêntica, ou seja, a que merece proteção.

lada com os conteúdosdos projetos educacionaisou com os instrumentosde per-

anteprojeto do "património artístico nacional" (PAN). Ao apresentar, com detalhes

suasão ideológicado Estado Novosesses conteúdoseram mais compatíveiscom a vertente ufanista do modernismo.Durante o Estado Novo, o Sphan funcionou

e exemplos,o que entende por arte em geral e nas oito categoriasque discrimina,

efetivamentecomo um espaço privilegiado,dentro do Estado, para a concretização

valores que Ihe são atribuídos.

de um prometomodernista.

E a noção de arte. portanto, o conceito unificador da idéia de património no

Mário de Andrade se detém no aspecto conceitual da questão do património e dos

A definição de arte no anteprojeto ("arte é uma palavra geral, que neste seu sentido geral significa a habilidade com que o engenho humano se utiliza da ciên-

3.3.3 0 an+epraUe+o de bário de Andradee Q decreto-leirt 25

cia, das coisas e dos fatos') se aproxima da concepção antropológica de cultura.':

A autonomia de que gozava o Sphan dentro do MES e do governo. e que.

E uma análise do texto do anteprojetoem seu conjunto deixa claro que a ênfase

durante muito tempo. foi considerada sinal do poder de seu diretor e do respeito

na noção de arte não significa uma posição esteticista. A preocupação em expli-

que inspirava, a partir da década de 1970 passou a ser interpretada não só coma

citar o que entende por cada uma das oito categorias de arte (arte arqueológica;

98

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

b. \bS\

HeRófC,â

99

arte ameríndia; arte popular; arte histórica; arte erudita nacional; arte erudita estrangeira; artes aplicadas nacionais; artes aplicadas estrangeiras), e como elas se agrupariam nos quatro Livros do Tombo e nos museus correspondentes, indica em Mário uma visão abrangente e avançada para sua época em relação as noções de arte e de história vigentes, inclusive nos serviços de proteção já existentes na Europa. Ao falar especificamente de "arte histórica", Mário de Andrade não se distancia da noção de história predominante no início do século, a história factual, centrada nos eventos políticos referentes aos grupos que detinham o poder. Interessa preservar como obras de arte histórica aquelas que, independentemente de seu valor artístico, constituem documentos para a história política ("criadas para um determinado fim que se tornou histórico"; "se passaram nelas fatos significativos da nossa histórian; 'kiveram nelas figuras ilustres da nacionalidaden [.. I "que devem ser conservadas tais como estão ou recompostas na sua imagem 'histórica'"). Também se enquadram nessa categoria obras relevantes para a história da arte ("exemplares típicos das diversas escolas e estilos arquitetônicos que se refletiram no Brasil") e documentos nacionais ou estrangeiros referentes ao Brasil. O recuo cronológico mínimo para que obras de arte pudessem ser incluídas no patrimônio seria de até a data de 1900, ou de cinqüenta anos para trás. Se é possível, portanto, perceber no anteprojeto um propósito explícito de reelaborar a noção de arte, o mesmo, aparentemente, não ocorre em relação a de história. Entretanto, ao mencionar o caso de objetos que aliam a seu valor histórico um real valor artístico, Mário considera que o valor histórico deverá prevalecer, e que o objeto "será tombado pelo valor históricon (1981, p. 96). Em várias ocasiões, porém, Mário de Andrade demonstra acreditar que, como dizia Riegl, é pelo valor histórico dos bens, por seu valor enquanto testemunho da existência dos antepassados, que se atrairão as massas para os monumentos dimensão que teria que ser levada em conta nas atividades de divulgação cultural. Essa posição fica clara quando se analisa a concepção de Mário de Andrade sobre os museus, por ele definidos como agências educativas. Mário Chagas, que estudou a óptica museológica de Mário de Andrade, observa que, para Mário, os museus deveriam "beneficiar o estético, mas sobretudo o históricow(1991, p. 111). E, entre os quatro museus nacionais preconizados por Mário, correspondentes ao quatro Livros do Tombo, o destaque, no anteprojeto, é dado aos modernos museus técnicos, na época ainda pouco conhecidos no Brasil. Seriam museus eminentemente pedagógicos, em que a técnica é apresentada a serviço do conhecimento

dos ciclos econômicos do Brasil, portanto com base em uma visão histórica. Constituiriam um contraponto aos museus históricos tradicionais, na medida em que fugiriam a apresentação celebrativa de grandes vultos e feitos, e seus temas seriam: "café, algodão, açúcar, laranja, extração do ouro, do ferro, da carnaúba, da borracha, o boi e suas indústrias, a lã, o avião, a locomotiva, a imprensa e t ~ . ~ (ibid.). Esse projeto foi, em parte, realizado pelo Sphan através da criação dos museus regionais, ainda em sua primeira década de funcionamento, a partir de uma proposta de Lúcio Costa visando a preservar os bens móveis colhidos na região das Missões.14 Mais avançada para a época era, no entanto, a concepção de Mário sobre os museus municipais. Se os museus nacionais deveriam ser organizados a partir de ordenamentos disciplinares, como apoio e ilustração dos Livros do Tombo, Mário preconizava e incentivava a criação de museus locais, em nível municipal, com base em critérios distintos. Enquanto os museus nacionais e os das grandes cidades tenderiam a especialização, os museus municipais seriam ecléticos, seus acervos heterogêneos, e os critérios de seleção das peças ditados pelo valor que apresentam para a comunidade local, que participaria ativamente da coleta de bens. O referente seria a identidade local tal como os habitantes a concebem. Como observa Mário Chagas, "a narrativa museológica, nesse caso, deveria surgir do diálogo com a população interessada na constituição do museun (1991, p. 109). Essas observações vêm confirmar o fato já bastante comentado de que a preocupação em valorizar o popular é, sem dúvida, um traço marcante na obra de Mário, tanto cultural quanto institucional. Ou seja, o popular enquanto objeto e o povo enquanto alvo. No texto do anteprojeto nota-se, inclusive, um cuidado em não privilegiar, do ponto de vista da atribuição de valor, as formas de expressão cultas. Em princípio, todas as obras de arte, tanto as eruditas, das Belas-Artes, quanto as populares, arqueológicas, ameríndias e aplicadas, poderiam ser inscritas nos Livros do Tombo. No entanto, se as obras de arte eruditas são referidas a partir dos instrumentos que as consagram como de "mérito nacional" (prêmios em concursos, menção em livros de história da arte, inclusão em acervo museológico, avaliação pelo Conselho Consultivo do Span), as obras de arte arqueológica, ameríndia e popular são fartamente exemplificadas no texto - provavelmente porque não ocorreria, na época, considerá-las com a mesma naturalidade como bens patrimoniais. Nesse caso, são disciplinas como a arqueologia e a etnografia que vão legitimar sua inclusão nos Livros do Tombo.

São, portanto, os Instrumentosdisciplinares,ao lado de outras instâncias re-

património. Mas, já em carta a Rodrigo Meio Franco de Andrade, datada de

conhecidas de atribuição de valor (concursos, publicações, avaliação por especia-

29.7.36, em resposta às objeções da professora Heloísa Alberto Torres, então

listas etc.), todas restritas aos círculos intelectuais,que constituem os canais referidos por Mário para a constituição do património.A participação popular seria

diretora do Museu Nacional. que discordava da configuraçãoque Mário dera aos

limitadaà organizaçãodos museus municipais,cuja leitura só faria pleno sentido

que fiz foi teoria e acho bom como teoria; sustentarei minha tese a qualquer

para os habitanteslocais. Deste modo, o anteprojetode Mário define com clareza jembora essa não fosse uma questão relevantena época) o alcance e os limites

tempo.' E diz sobre o anteprojeto: Dado o anteprojeto ao Capanema, eu bem sabia que tudo não passava de ante-

da participação social na construção dos patrimónios históricos e artísticos. apon-

projeto. Vocês ajudemcom todas as luzes possíveisa organizaçãodefinitüa, façam e

tando as diferenças e as peculiaridadesdos níveis nacional e local e caracteri-

desfaçam à vontade, modifiquem e principalmente acomodem às circunstâncias o que fiz

zando a função social do intelectual como mediadorentre os interessespopulares

e não tomou em conta muitascircunstânciasporque não as conhecia.Não sou turrão nem vaidosode me ver criadorde coisas perfeitas.Assimnão temajamais me magoar

e o Estado. Chama a atenção, mesmo atualmente, sua sensibilidade para a função

e a importânciados museus municipais,que são até hoje, com frequência,objeto de crítica por não se adequaremaos padrões rigorosose modernosde uma "ciên-

por mudanças ou acomodações feitas no meu anteprojeto. IAndrade, 1981. p. 60l

Na verdade, ao atender à solicitação de Capanema, Mário passara a servir a dois senhores. De um lado, se envolvera, com Rodrigo M. F. de Andrade, na cria-

cia" museológica.'s

A preocupaçãomaior de Mário de Andrade não se restringia à conceituação de património, mas também dizia respeito à caracterizaçãoda função social do órgão, o que implicava detalhar atividades que facilitassem a comunicaçãocom o público. Na verdade, para Mário, a atuação do Estado na área da cultura devia ter como finalidade principal a coletivização do saber, daí sua preocupação e mes11

museus nacionais no anteprojeto, ele reconhecia os limites de sua proposta: "0

ção de um serviço federal de património para o governo getulistal de outro, com Paulo Duarte, estava também comprometido com o prometodo Departamento do Património Histórico e Artístico de São Paulo, que, com o Departamento de Cul-

tura, seria o início do Instituto de Cultura de São Paulo. O instituto,se eleito Armando Sales de Oliveira presidente. se estenderia a todo o Brasil.

mo seu envolvimentona questão educacional.Em carta a Paulo Duarte (1977, p.

Por esse motivo, em setembro de 1937, Mário de Andrade solicitou a Paulo

151), Mário disse certa vez que defender o nosso patrimóniohistórico e artístico

Duarte que demorasse "um pouco a coisa'. porque, dizia ele. "de forma nenhuma

'é alfabetização.' Essa era a concepção que norteava a atuação do Departamento

eu desejo sequer íro/sser o Capanema, que admiro no seu esforço e cuja luta feroz

de Cultura, iniciativa considerada então pioneira na área cultural. Mário acreditava

conheço bem' (Duarte. 1977, p. 1541. E agora Paulo Duarte que esclarece a se-

que, divulgando as produções artísticas, tanto as eruditas como as populares.

quência dos acontecimentos:

criando condições de acesso a essas produções, se estaria contribuindo para

De fato, espereiaté outubro para lançaro meu com um discursona Assembléia

despertara populaçãopara o que costumavaficar reservadopara o gozo das eli-

Legislativa. Quando se deu o golpe de Estado, o meu achava-se já em terceira dis-

tes - a fruição estética. Desse modo. se estaria. ao mesmo tempo, democratizando

cussão e o da Câmara permaneciamais ou menos congelado. Tanto que, impossibilitado

a cultura e despertandona população o sentimentode apego às coisas nossas.

de dar andamento no meu pela dissolução da Assembléia Legislativa, e pelo receio do govemador interno Cardoso de Meio Neto em baixar decreto fazendo lei um prometomeu,

Em suma, o texto do anteprojetoé amplo e aborda com detalhes a questão 11

quandojá execradoda ditadura,achamos Mário e eu que era preciso tudo fazer para que

conceitual- que obras, e a partir de que critérios,poderiamser consideradaspatrimónio - detendo-setambém na estrutura e no funcionamentodo órgão, tendo

Getúlio. já ditador, assinasse o decreto-lei correspondente ao prometoparado na Câmara.

sempre em mente os meios de divulgar e coletivizaro património.Tem-se a im-

não se achava em condições de exigir isso do novo regime pois, ao que parece, a sua

pressãode que. com base em sua experiênciano Departamentode Cultura, Mário de Andrade procurou imaginar o que considerava, em 1936, (portanto, quando ain-

da estava entusiasmadocom seu trabalho no DC) o serviço Ideal de proteção do

102

O PÁTRIAõNIO [A

PROCESSO

O Rodrigo Meio Franco estava desesperado no Rio, pois Capanema. apesar de ministro,

posição peHclitava. Lembrei-me então do Alcântara Machado que conservava a sua amizade com Getúlio e a quem eu dava a minha colaboraçãono prometodo novo Código Penal do Brasll. Solicitei-lhe então obtivesse a assinatura daquele referido Decreto-lei. Pou-

cos dias depois, me escrevia Alcântara Machado comunicando que a "nossa lei" saída

]03

sem falta, em princípio de dezembro de 1937, o que realmente aconteceu, não no princípio.

mas mais para o fim daquele mês. (Duarte, 1977, p. 154-1551

para viabilizar a proteção legal era necessário referir-se a coisas ("bens móveis

e imóveis'), o quemarcava a inadequação do instrumento proposto - o tombamento -

Esse longo depoimento evidencia a fragilidade, naquele momento de mudança,

do prometo de políticaculturalmodernistaem face da Instabilidade do quadro político. A posição de Capanema dependia de acertos políticos. Mas o fato é que as

idéias Inspiradaspelo Modernismosobre patrimónioe atuaçãodo Estado em relação à proteçãoeram amplas (e/ou ideologicamenteambíguas)o bastante para inspirar dois projetosvoltados para objetivos políticosdistintos e, naquele momento, até mesmo concorrentes. Esclarecedora nesse sentido foi a posição de Mário de

Andrade e de Paulo Duarte, comprometidos com ambos os projetos. Pode-se supor que o que lhes interessavaera, acima de qualquer interesse político imediato, assegurar a criação de instituições culturais, objetivo que a queda de Armando fales de Oliveira, após a instauração do Estado Novo. inviabilizou em nível estadual.A decisão, tanto de Mário de Andradequanto de Paulo Duarte naquele momento, foi eminentemente pragmática, apesar da situação de Paulo

para proteger manifestaçõesfolclóricas, como lendas, superstições, danças dramá-

ticas etc. O tombamento surgia, assim. como uma fórmula realista de compromisso entre o direito individual à propriedade e a defesa do interesse público pela preservação de valores culturais. Essa solução se tornou possível na medida em que a Constituição de 1934 estabeleceu limites ao direito de propriedade, definindo-lhe o conceito de função social. Por outro lado, em tormos económicos, ao garantir ao proprietário não só o uso como a posse do bem material, o instituto do tombamento dispensava, para a finalidade de preservação, a onerosa e praticamente inviável

figura da desapropriação(cf. Castra, 1991, p. 581 Andrade, 1987, p. 51). Não resta dúvida, porém, de que, apesar de solução considerada bem sucedida do ponto de vista legal, sua legitimação social era uma conquista a ser feita. Essa

legitimação foi alcançada, sobretudo, através da fixação de um padrão ético de

Duarte junto ao governo getullsta."

trabalho o, para isso, Rodrigo M. F. de Andrado lançou mão de vários recursos:

Destituídodo Departamentode Cultura, Mário de Andrade passou a participar ativamente da implantação do Sphan, conforme se pode constatar na correspon-

dência trocada com Rodrigo M. F. de Andrade, tornando-seo assistente técnico da instituiçãoem São Paulo. A aceitaçãodo posto, o entusiasmocom que sempre colaborou com Rodrigo, sem nenhum atrito (o que não ocorreu na sua relação com

Capanema), são indicadoresde que não via contradiçãomaior entreseu anteprojeto e o trabalho desenvolvido pelo Sphan.

o desenvolvimentode um trabalho dentro dos mais rigorosos e modernos critérios científicosl o cuidado na escolha de seus colaboradoresl a Imagem de uma instituição coesa. desvinculada de interesses político-partidários e totalmente voltada

para o "interesse público'l e. sobretudo, a defesa encarniçadado decreto-lei ne 25, de 30.11.37, em batalhas judiciais memoráveis, sendo um marco, nesse sentido, o parecer do Supremo Tribunal Federal, em sessão de 17.6.42, ratificando

o referidodecretoe a autoridade do Sphan,no julgamentoda impugnação ao tom-

Já o decreto-lei Re25, de 30 de novembro de 1937, elaborado por alguém com

bamento do Arco do Teles, no Rio de Janeiro. Esse era, sem dúvida, um jogo que

larga experiência jurídica, como Rodrigo M. F. de Andrade, estava voltado, basica-

exigia habilidade política num sentido amplo. e que se pode dizer que foi bem su-

mente, para garantir ao órgão que surgia os meios legais para sua atuação num

cedido se considerarmosa aura do Sphan e de seu diretor no final dos anos 60.

campo extremamentecomplexo: a questão da propriedade. Era esse. então, o prin-

jcf. Dphan, 1969) e a continuidadedesse prometo durantemais de trinta anos.

cipal entrave à institucionalização da proteção do património histórico e artístico

nacional.Pois. como observa Joaquim Falcão, "antes de 37 os diversos proletos

Na realidade,a análise do trabalho desenvolvidopelo órgão desde sua criação Indica que a oposição entre o anteprojeto de Mário de Andrade e o decreto-lei RP

de proteção ao património artístico são recusados no Congresso Nacional em no-

25, de 30.11.37,é, na verdade,um falso problema,se considerado do pontode

me do direito de propriedade" (1982a, p. 25). A preocupação, nesse caso. não era

vista dos objetlvos mais imediatos do Sphan, quando de sua criação, e do quadro

com o aspecto conceitual ou com o organizacional,que já teriam sido equacionados no anteprojeto, mas com recursos operacionais que fossem não só legais como também reconhecidos como legítimos. A conceituação de património, propo-

sitalmentedeixada em aberto, tinha. porém, um limite em relação ao anteprojeto:

104

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

político e ideológico naquele momento. Não interessa aqui, inclusive, entrar na discussão quanto à marca classisfa do órgão (cf. Miceli. 1987), até porque, como

já ficou evidente, a orientaçãodo Sphan no processo do atribuiçãode valores se inseria!na tradição européia de constituição dos patrimónios nacionais a partir das

105

r 4.3 AS ALTERNAnVASDO ([

sinais de restrição das atividades de pesquisa e de divulgação, que, sob a ale-

AO) IPHAN

gação de falta de recursos. foram praticamenteabandonadas(ver Anexo 111). Por outro lado, os adversário do Sphan não eram mais apenas vigários obtusos ou

4.3.10s caminhosda descentralização eü

prefeitos modernosos,mas. principalmente,a poderosa especulação imobiliária.

busca de novos sentidos-para a preservação

Esses fatos, agravados pela crónica falta de recursos financeiros e humanos,s le-

varam o órgão a se concentrarna questão mais premente- porém parcial em termos de preservação- dos tombamentose das obras.

€ l l

embora fosse considerado o legítimo sucessor do fundador do Sphan, não gozou,

Profundamente vinculado, quando de sua criação, ao movimento cultural mais

como ele, do mesmo prestígio, não teve o mesmo trânsito junto a autoridades e

importanteno Brasil na primeira metade do século XX, o Sphan dos anos 60 era

personalidades nem foi ungido com a mesma aura. Quando o Sphan ficou privado

uma ilha à parte das grandes questões culturais e políticas. Pode-se dizer que

da figura carismática de Rodrigo M. F. de Andrade, evidenciou-se o caráter fraco

a maior força da instituiçãonos anos 60 residia no caráter mítico do trabalho que

da autonomia do órgão, na medida em que dependia de líderes para conduzi-lo

realizarae na figura de seu diretor.

e torna-lo visível. tanto no interior da burocracia quanto junto à sociedade. Não

Esse desgaste ficou evidente na contundente campanha movida pelo jorna-

foi por acaso. aliás. que o ressurgimento da questão do património como tema de

lista Franklinde Oliveira. de novembrode 1966 ao final de 1967, no jornal O

interesse político nos anos 70 esteve associado a outra figura carismática: Aloísio

G/obo. denunciando a degradação do património, com o título de "Morte da me-

Magalhães.

mória nacional' (Oliveira. 1991). Seus artigos receberamo apoio de parlamentares, governadores, prefeitos, intelectuais, e de inúmeras instituições da socie-

dade civil. O jornalista apontava como responsáveispelo abandono de mo-

11

Coma aposentadoria, em 1967,de RodrigoM. F. de Andrade,assumiua direção do órgão, por indicação do próprio Rodrigo, o arquiteto Renato Soeiro. que.

numentos,peças e documentos,já sujeitos ao inevitável desgaste do tempo, a especulaçãoimobiliária. a ganância dos antiquários. a indiferença e a ignorância generalizadas. tudo isso agravado pela carência de recursos financeiros nas

instituições culturais encarregadas de preservar o património histórico e artístico nacional. Poupava, no entanto. o Sphan e a figura de Rodrigo M. F. de

Nas décadasde 1950 e 1960 Ocorreramgrandes mudançasno modelode desenvolvimentobrasileiro, responsáveis pelos impasses com que a política de presewaçãodo Sphan foi confrontada, levando a instituição, e outros setores da administração pública que passaram a se interessar pela questão. a recorrer a novas alternativas de atuação. Nesse período, a ideologia do desenvolvimentisrtk) atrelou o nacionalismo aos valores da modernização. Foi a época áurea da indus-

trialização, da urbanizaçãoe da interiorização, estimuladas pela construção de Brasília. As conseqüências para a preservação desse modelo de desenvolvi-

Andrade.

mento repercutiramnão apenas no nível simbólico - na medida em que essa O que estava implícito nessa e em outras manifestaçõesde crítica e de denúncia era que, se os trinta anos de atuação do Sphan, além do fato concreto de preservar e restaurar um número respeitável de bens de valor histórico e artístico. haviam logrado fixar um rigor ético no trato do bem cultural. a instituição estaria falhando no objetivo mais amplo de mobilizar governo e sociedade para a causa da presewação. mobilização essa considerada, no final dos anos 60, indispensável inclusive para o sucesso na conservação material dos monumentos. Pois. como já fol observado. a partir dos anos 70, a relação entre cul-

tura e política passou a ser equacionadade forma diferente da que fora formulada desde os anos 20 e 30.

140

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

ideologia se contrapunha à continuidade e à tradição - como nos níveis económico e social - devido ao intenso processo de migração para as capitais e a valorização do solo urbano, desarticulando processos espontâneos de preservação do património, tanto o edificado como o paisagístico. Na prática do Sphan. surgiram ten-

sões agudas, especialmentena preservaçãodas cidades históricase dos centros históricos das grandes cidades. A proteção dos conjuntos e do entorno dos monumentos tombados passou a exigir um novo dimensionamento. Como observa Verá Milet (19881,o caráter marcadamente cultural da atuação do Sphan nas suas três primeiras décadas revelava-se inadequado ao novo modelo de desenvolvimento.

b \&S\ AODeRNÀ

141

Y' Foi à Unescoque o Sphan recorreu,a partir de 1965, para reformulare reforçar sua atuação, visando a compatibilizar os interesses da preservação ao modelo

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dos bens culturais de valor nacional, e assumissem.sob a orientaçãotécnica do

de desenvolvimentoentão vigente no Brasil. Nesse sentido. a imagem do Sphan

então Dphan,a proteçãodos bens de valor regional. Para atender a esse objetivo, estados e municípios deveriam criar, quando fosse o caso, instituições e

como protagonistade batalhas memoráveisem defesa do interesse público rela-

legislaçãopróprias.

tivamente ao património, contra proprietários e setores insensíveis da Igreja e do

A participaçãode outros setores do governo federal e estadual na política de

poder público, foi substituída, em consonância com as diretrizes da Unesco, pela

preservação foi concretizada com a criação, em 1973, por solicitação do ministro

figura do negociador, que procura sensibilizar e persuadir os interlocutores, e con-

da Educação e Cultura, e com a participação dos Ministérios do Planejamento.

ciliar interessesl ou melhor, que procura demonstrar que os interesses da preser-

do Interior (através da Sudene), e da Indústria e Comércio jatravés da Embratur).

vação e os do desenvolvimento não são conflitantes mas, pelo contrário, são com-

do Programa Integrado de Reconstrução das Cidades Históricas, que passou a

patíveis.

funcionar com recursos da Seplan. Voltado inicialmente para o atendimento de

O objetivo era demonstrar a relação entre valor cultural e valor económico.

nove estadosdo Norte e Nordeste,em 1977 o programafoi estondidoao Sudeste.

e não apenas procurar convencer autoridadese sociedadedo interesse público

O PCH, como ficou conhecido, tinha como objetivo criar infra-estruturaadequada

de preservar valores culturais, como ocorrera nas décadas anteriores. Essa arti-

ao desenvolvimentoe suporte de atividades turísticas e ao uso de bens culturais

culaçãofoi feita em duas direções: seja considerandoos bens culturais enquanto

como fonte de renda para regiões carentes do Nordeste, revitalizando monumentos

mercadorias de potencial turístico, seja buscando nesses bens os indicadores

em degradação.A criação do PCH veio suprir basicamente a falta de recursos

culturais para um desenvolvimento apropriado.

financeiros e administrativosdo lphan. continuando a cargo dessa instituição a

A primeira alternativa. explicitada nas Normas de Quite (1967) e, no Brasil.

reforência conceitual e técnica. Propiciou, por outro lado, a criação, durante as

nas reuniões de governadores que produziram o Compromisso de Brasi7fa(1970)

décadasde 1970 e 1980,de órgãoslocais de patrimónioe elaboraçãode legisla-

e o Comprou/sso de Sa/fiador (1971), levou à criação, junto à Seplan, do Pro-

ções estaduais de proteção, abrindo os caminhos efetivos para a descentralização.

grama Integrado de Reconstruçãodas Cidades Históricas.em 1973. A segunda

No entanto, as críticas dirigidas ao lphan não se limitavama suas carências +

11

alternativa foi explorada pelo Centro Nacional de Referência Cultural, criado em

operacionais. Também em termos conceituais, a ênfase dada aos monumentos da

1975. Essas iniciativaspartiam do pressupostode que a estrutura e a experiência

cultura do colonizadortornava problemática,nos anos 70, uma identificaçãosocial

de trabalho do lphan. mesmo com a colaboração da Unesco, era insuficiente para

mais abrangente com o património. Para setores modernos e nacionalistas do gover-

atender às novas necessidades da preservação.

no, era necessário não só modernizar a administração dos bens tombados, como

Os encontros de governadores realizados em 1970 e 1971 foram sugestão do

também atualizar a própria composição do património, considerada limitada a uma

ministro da Educaçãoe Cultura, Jarbas Passarinho,a quem Renato Soeiro, que

vertente formadora da nacionalidade, a luso-brasileira, a determinados períodos

com ele tinha relações pessoais (ambos eram paraensesl, fora solicitar apoio às

históricos,e elitista na seleçãoe no trato dos bens culturais,praticamenteexcluindo

atividades do Sphan. O ministro considerava que a responsabilidade pela preser-

as manifestaçõesculturais mais recentes, a partir da segunda metade do século

vação do património nacional devia ser partilhada com os governos estaduais, que

XIX, e também a cultura popular. Essa atualização era a proposta do CNRC.

poderiam, inclusive, se beneficiar dessa atividade.

4.4 0

CENTRO NACIONAL

Ot REFERÊNCIA CULTURAL

Um dos princípiosdessa nova orientaçãoda política de preservaçãoera a descentralização. Já no artigo 23 do decreto-lei Re 25. de 30.11.37, havia menção

A diferença do PCH, a idéia da criação do CNRC não surgiu no interior da

à colaboração dos estados na proteção do património neles localizados. Nos do-

burocracia estatal, nem se propôs, no primeiro momento, como alternativa crítica

cumentos Compromisso de Brasília e Compromisso de Salvador se ncomendaua

ao lphan. Segundo depoimento de Aloísio Magalhães, foi fruto das conversas de

que estados e municípios exercessem uma atuação supletiva à federal na proteção

um pequeno grupo que se reunia em Brasília, de que participavam o empresário

]42

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

143

R

e então ministro da Indústria e Comércio Severo Gomes, o embaixador Vladlmir

Ministério das Relações Exteriores, a Caixa Económica Federal e a Fundação

Murtinho, ontão Secretário de Educação e Cultura do DF. além do próprio Aloísio. designer e artista plástico de renome. Ao grupo inicial se juntaram posteriormente

Universidadede Brasília. A esses órgãos juntaram-se, em 1978, por ocasião da assinaturado termo aditivo ao convênioanterior, o Banco do Brasil e o Conselho

o matemático Fausto Alvim Junior, a documentarlstae então diretora do Prodasen,

Nacional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico. Representantesdos con-

Cordélia Robalinho Cavalcanti e a socióloga Bárbara Freitag, todos professores

venentes compunham o grupo de trabalho. que se reunia periodicamente para

da Universidade de Brasília.' A formulação da indagação que conduzia as discus-

acompanharas atividadesdesenvolvidaspelo centro. Desde sua criação, o CNRC

sões trazia a marca de seu tempo. "Por que não se reconhece o produto brasi-

foi dirigido por Aloísio Magalhãos.

leira? Por que ele não tem fisionomia própria?' Tratava-se de uma nova maneira

O perfil dos agentes recrutados por Aloísio distinguia-os dos tradicionais fun-

de equacionar a velha questão da identidade nacional, vinculando a questão cul-

cionáriosdo lphan, arquitetosem sua maioria. Integrarama equipe do CNRC pes-

tural à questão do desenvolvimento.

soas com formação na área de ciências físico-matemáticas, com especialização

O interesse que movia esse grupo era, em princípio,bastantepróximodas

em informática e em educaçãol técnicos om biblioteconomia e documentaçãol cien-

preocupações dos modernistas de 22 - atualizar a reflexão sobre a realidade

tistas sociais, críticos literários etc. A diversidade na formação acadêmica e o inte-

brasileira e buscar formulações adequadas para a compreensão da cultura no contexto brasileiro contemporâneo.

resse pessoal por mais de uma área de saber eram requisitosconsideradosfavoráveis a uma compatibilidadecom a proposta do CNRC. Na realidade,a especiali-

Inicialmente, o objetivo era criar um banco de dados sobre a cultura brasileira.

zação era considerada um risco para a produção do conhecimento que se dese-

um centro de documentaçãoque utilizasse as formas modernas de referenciamento

java alcançar. Os projetos desenvolvidosno CNRC punham entre parêntesesmodelos de interpretaçãojá prontos, inclusive os quadros conceituaisdas diferentes

e possibilitasse a identificação e o acesso aos produtos culturais brasileiros. Na concepção de Vladimir Murtinho e de Severo Gomes. tratava-se de um trabalho

disciplinas, e procuravam, através de uma perspectiva interdisciplinar, apreender

etnográfico, de dimensão estritamente cultural. No Relatório Técnico Ra 1, de

a dinâmica específica de cada processo cultural estudado, formulando, a pos-

2.7.1975, o objetivo do CNRC era definido como o 'traçado de um sistema refe-

ferforl,tipologiase modelos.

rencial básico para a descrição e análise da dinâmica cultural brasileira'.

Como o Sphan de Rodrigo,o CNRC gozava de autonomia de atuação, com

Essa concepção foi sendo reelaborada e ampliada, na medida em que se pro-

uma vantagem: não estando subordinado a nenhum órgão da administração públi-

punha atribuir ao CNRC uma finalidade mais ambiciosa. Tratava-se não de eleger

ca - pois era fruto de um convênio entre entidades diversas - gozava de uma

símbolos da nação nem de conhecer e divulgar as tradições brasileiras, e sim de

agilidade administrativa que possibilitou se tornasse um espaço de experimen-

buscar indicadores para a elaboração de um modelo de desenvolvimento apro-

tação. E se, por um lado, essa autonomia, e até certo ponto, descompromisso.

priado às necessidades nacionais. Desse modo, deslocava-se o centro de interes-

levou a uma dispersãonos trabalhos, que na maior parte foram interrompidos,ou

se para a questão atual do desenvolvimento e articulava-se a cultura às áreas

ficaram inconclusos,por outro, foi nesse espaço que se elaboraram os conceitos

politicamentemais fortes do governo. Para isso, era necessáriorecorrer a instrumentos alternativos de política patrimonial, tanto conceitual quanto administrativamente.

O CNRC começou a funcionar em junho de 1975, nas dependênciasda antiga

Reitoriada UnB, devido a um convêniofirmado entre o Governo do Distrito Federal, através da Secretaria de Educação e Cultura, e o Ministério do Indústria e Comércio, através da Secretaria de Tecnologia Industrial. No ano seguinte foi firmado novo convênio, a que aderiram a Secretaria de Planejamento da Presidência da República, o Ministério da Educação e Cultura, o Ministério do Interior, o

144

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

que, no Início da década de 1980, fundamentaram a política da Secretaria da Cul-

tura do MEC e que foram incorporadosà Constituição Federal de 1988.

As diferentesorientaçõesde trabalhoeram orquestradaspor Aloísio,que optou pelo desenvolvimentode projetos mais ou menos complexos,em áreas temáticas e em locais diversos, de modo a alcançar um nível de amostragemda realidade cultural brasileira.Em termos operacionais,era norma buscar parceria com outras instituições e investigar formas diversificadas de devo/raçãodos resultados dos trabalhos. O processo de elaboração de projetos era informal, pois tanto po-

145

l

Y' de experiências. seja em termos de elaboração de uma problemática. Além dos doam ser formulados no próprio CNRC como encaminhados por agentes externos.

dois projetos já mencionados- sobre a cerâmica de Amara de Tracunhaém e

culturais

l lj

O guichê do CNRC atraía pesquisadores independentes e com proletos

sobre a tecelagemno Triângulo Mineiro - foram desenvolvidostrabalhosvoltados

pouco ortodoxos. Foi o caso dos projetos do Museu ao Ar Livre, de Orleans, SCi

para o artesanato indígena no Centro-Oeste e- para a utilização de pneus na fabri-

da produção de banana-passa, na região fluminensel do uso da marca estampada

cação de lixeiras no Nordeste. entre outros.

em folha-de-flandres, em Juiz de Foral da fabricação de lixeiras com pneus usados. no Nordestel da construção de modelos matemáticos para a classificação

A abordagemdo artesanatopode ser tomadacomo um exemplotípico do modo de trabalhar do CNRC, no sentido de tentar lançar um olhar novo sobre os pro-

de técnicas do trançado indígena; da impressão em computador dos padrões-

cessos culturais. Fol a parir da comparação entre as diversas manifestações

repassos.utilizados na tecelagem em teares de quatro pedais, no Triângulo Mi-

culturais pesquisadasque se elaborou uma tipologia, distinguindo fazeres codi-

neiro etc. A seleção também não obedecia a critérios rígidos. pois o que interessa-

ficados (como a tecelageml dos que dão margem à criatividade Individual(como

va era o seu potencial - nem sempre percebido pelos autores do prometo,como

a cerâmicajt fazeres tradicionais (como a cerâmica e a tecelagem) do artesanato

ocorreu,por exemplo,como do Museude Orleans- parao conhecimento de as-

de transformaçãoe reciclagem(como as lixeiras. que são um subprodutoda ativi-

pectos pouco estudados da realidade brasileira, e em termos de perspectiva de

dade industrial, e como. freqtlentementenos dias de hoje, o brinquedo popular).

ações inovadoras.

Em todos os casos se procurava entender os processos de transformação e/ou

Em um primeiro momento, o trabalho do CNRC deu ênfase a experiências de

de resistênciadessas atividades.sempre tentando se aproximaro máximo possí-

referenciamento. recorrendo com freqilência à colaboração de especialistas nacio-

vel do ponto de vista dos produtorese dos consumidores,de modo a apreender.

nais e estrangeiros. divulgadas em relatórios técnicos. Nessa fase inicial, o CNRC

sem preconceitos,essas trajetórias, e a fundamentar uma visão prospectiva.

era dividido em quatro áreas, de inspiração nitidamente acadêmica: Ciências

A abordagem do CNRCse propunhacomocríticaà visão romântica. que pre-

Humanas. Ciências Exatas, Documentação, Artes e Literatura. Ao lado de projetos

dominava entre os folcloristas, ou aos objetivos pragmáticos e assistencialistas

de âmbito restrito - a exposição de carrancas do rio São Franciscol a documen-

dos programasde incentivo ao artesanato. Considerandoas manifestaçõespesquisadas como "um momento da trajetória, e não uma coisa estática', Aloísio

tação do processo de trabalho do ceramista Amaro de Tracunhaém, PEI a exposi-

ção volante sobre dom Pedro ll e seu temposa documentaçãoe análise da atividade de tecelagem no Triângulo Mineiro; a análise e classificação experimental dos acervos dos museus brasileiros - foram desenvolvidos outros, mais com-

l

Magalhães afirmava que "a política paternalista de dizer que o artesanato deve

permanecercomo tal é uma política errada' e "culturalmenteimpositiva', pois "o caminho,a meu ver, não é esseso caminho é identificar isso, ver o nível de complexidadeem que está. qual é o desenho do próximopasso e dar o estímulopara que ele dê esse passo' (1985, p. 172). Qualquer intewenção deveria ser prece-

plexos -, o fhesaurus e os levantamentos socioculturais no pólo cloro-químico de Maceió e no complexo industrial-portuário de Suape. no Recife. Em um segundo momento, e já com base na elaboração de uma experiência

dida, portanto. do conhecimento da especificidade daquele saber-fazer, em sua (

de trabalho, o CNRC se estruturou em quatro programas: mapeamentodo arte-

trajetória e em sua inserção no contexto atual. Consequentemente.as formas de

sanato brasileiro, levantamentos socioculturais. história da ciência e da tecnologia

ação deveriamser necessariamentediferenciadas.adequadasa cada caso e momento, e envolvendo a participação da comunidade que produz e consome aqueles

no Brasil. e levantamento de documentação sobre o Brasil (ver Anexo IV). Nesse

bens, o que descartava,por princípio. o recurso a face/fas para lidar com a ques-

momento, a questão dos resultados do trabalho realizado não se resumia apenas

tão do artesanato.

à busca de novas formas de referenciamento e de divulgação, mas envolvia também a responsabilidade social da pesquisa e a consideração dos interesses dos

grupos pesquisados. Foi no âmbito do primeiro programa - Mapeamenfo do adesanafo brasa/eira-

que se obtiveramos resultadosmais significativos.seja em termos de diversidade

146

O PATRIAÕNIO[A

'{

A noção de aurenf/c/Jade,tão frequente nas discussões sobre artesanato. passoua ser questionada,pois considerava-seque decorria de uma visão dogmática e externa ao processo.A rigor. nessa perspectivaa própria noção de a/tesanafo. e a distinção entre aNesanalo e fecho/agia pafrfmonla/. ou entre aNesanafo

147 PROCESSO

l

Y' V

e requeria/ndúsfrfaficava,assim,relativizada e. do pontode vista de uma com-

projetos,que na época foram consideradosos hborafórfos por excelênciade com-

preensão do processo cultural, não era o aspecto mais importante. O objetivo.

provaçãodas "teses' do CNRC, ficaram parados ou foram (em um caso, dramati-

nesse caso. passava a ser o de conhecer, referenciar e compreender essas maná

camente) interrompidos e não chegaram a contribuir efetivamente para credenciar

festações. visando a presemar sua memória e a fornecer elementos para o apoio

o CNRC (e, posteriormente,a Fundação Nacional pró-Memória)para reivindicar

a seu desenvolvimento.

espaço e lugar na elaboração e implementação de projetos de desenvolvimento-

Essa orientação de trabalho, de inspiração nitidamente antropológica (o que não era, no entanto, explicitado na condução das pesquisas, que buscavam ins-

documentaçãosobre os contextos culturais pesquisados.'

pirar-se, esponfanefsficamenfe, apenas no contato com a rea//dada), foi exposta

No programaHlsfóda da c/énc/a e da fecho/ogfano Brasa/,o prometoque ficou

no documento Bases para um fraga/ho sol)re o adesanafo t)rabi/e/ro hde, produ-

mais conhecidofoi o do Museu ao Ar Livre, em Orleans,Santa Catarina, em zona

zido em 1979 em resposta a uma solicitação do Programa Nacional de Desenvolvi-

de imigração italiana. Idealizado na linha dos ecomuseus. além da exposição das

mento do Artesanato (PNDAI. do Ministério do Trabalho. Não é de surpreender

peças em um extenso parque. foi feita uma detalhada documentação, por meio de

que essa colaboração tenha se revelado, na prática, inviável.

fotografias.textos e desenhos, além do relato do artesão encarregadoda tarefa,

Os Levanfamenfos sociocu/forais foram os proletosmaisousadosdo CNRC.

H

o que não significa ausência de ganhos, pois foi produzidaextensa e importante

de sua desmontageme remontagem,de modo a presewar não apenas os produtos

em que havia um envolvimentoimediato com empreendimentosem curso e com

mas também a memória do processo de fabricação. Mais caro a Aloísio, no entan-

poderosos interesses, em geral conflitantes com a visão do CNRC. sobre a rela-

to. era, sem dúvida, o Estudo Multidisciplinardo Caju, identificadocomo importante

ção entre cultura e desenvolvimento.

raiz cultural brasileira.de incontáveisusos e marcante presençana vida nacional.

Parao CNRC.o objetivoera a buscade um modelode desenvolvimento apropriado às condições locais e compatível com os diferentes contextos culturais brasileiros. Essa visão, embora tivesse pontos de contato com as concepções então elaboradas na Unesco sobre desenvolvimento, entrava em confronto com a ideo-

logia desenvolvimento;ta que predominavanos anos 70. Por esse motivo. a participação do CNRC nesses projetos exigia, devido a sua complexidadee seu im-

pactonão só sobreas culturas,comotambémsobreas economiase as organizações sociais locais, um forte respaldo político, tanto por parte da direção da CNRC quanto externamente. Ora, não só essa propostaera ainda bastanteimprecisa,como não encontrava

Chegaram a colaborar nesse prometoespecialistas das mais diversas áreas de co-

nhecimento,inclusive Gilberto Freire, mas, em termos de ações, resultou apenas no tombamentoda fábrica de vinho de caju Tito Sirva, em João Pessoa.

Os Z.evanfamenfos de documentaçãosopre o Brasa/produziraminúmerosresultados a curto prazo, e foram precedidos da Análise e Classificação Experimental dos Acervos dos Museus Brasileiros, trabalho executado em 1977 para subsidiar a missão de um perito da Unesco chamado ao Brasil pelo lphan para prestar consultoriatécnica a museólogos.A intenção do CNRC era evitar que se impusessem aos museus brasileiros modelos externos, adequados a outras reali-

dades, e possibilitar que o trabalho do perito partisse do conhecimentoproposto

eco junto a setores da sociedade que. naquele momento, pudessem se fazer ouvir.

pelos museus no Brasil. segundo o ponto de vista de seus organizadores.Nesse

Além disso, a verdade é que outros proletos do CNRC. menos polêmicos, de alcance mais limitado e de cunho mais marcadamentecultural - como o estudo mul-

programa foram ainda realizadas experiências em indexação de documentos.

tidisciplinar do caju e a reutilização de pneus para a fabricação de lixeiras receberam maior apoio e atenção por parte de Aloísio Magalhães. que, prova-

velmente, via neles maior potencial para ilustrar suas idéias sobre a cultura brasileira.

como a elaboração de catálogos relativos à cinegrafia sobre a construção de Brasília e aos filmes produzidos pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP).

durante o Estado Novo. Já a indexação e microfilmagemda documentaçãoem depósito no Museu do índio tinha um objetivo que transcendia o mero registro: subsidiar o processo de demarcação das terras indígenas. A divulgação de obras

Esse, certamente, foi um dos principais motivos por que foi justamente nessa linha de pesquisa que se alcançaram resultados mais limitados, tanto em termos

sobre o Brasil existentes no exterior, ou não accessíveis ao público, foi outra preocupação desse programa, como a análise e publicação do Alara ermo-h/stórfco

dos objetivos a que se visava quanto da elaboração de uma experiência. Esses

148

O PATRIAÕNIOeA PROCESSO

149

l

Y' de Curt Nimuendaju e do \AntaA expedição científica de G. 1. LangsdorK ao Brasil

íí02í-íazpu. A esses proletos se acrescentaraminiciativas rápidas e oportunas de Aloísio, como a compra, em um leilão em Londres,de cinco lotes de documentos originariamente integrantes dos Autos da Devassa e a devolução a Congonhas

do Campo de um conjunto de ex-votos dos séculos XVlll, XIX e XX.

l

A análise dos 27 projetos discriminadosno quadro sinótico produzido pelo

E (:.

CNRC em 1979 (Anexo IV) evidencia a diversidade de interesses e o potencial de trabalhoque aquelapequenainstituiçãoalcançouem quatro anos de atividadeinteresses que se ampliaram na década seguinte com a introdução das questões

das etnias e da interação da educação com a cultura. '(

a modernizara noção de cultura brasileira,sem abrir mão, no entanto.de uma visão calcada no nacional-popular.Esse intuito de modernização- que não cheestava evidente na formulação dos objetivos do centro e nos métodos a que recor-

ria para alcança-los.

testemunho de épocas pretéritas ou como expressões artísticas individuais IMagaIhães, 1985, p. 63). Progressivamente,foi sendo formulada a idéia de bem cu/fura/.

que surgiu como alternativa atualizadae mais abrangenteà noção de património histórico. Joaquím Falcão sintotizou. com felicidade, a relação que, na visão de Aloísio Magalhães, existia entre as duas noções: "património histórico passou a

Dentre os bens culturais, o CNRC se voltou prioritariamentepara aqueles até então excluídosdas representaçõesda cultura brasileira construídaspelos órgãos

oficiais, ou seja. Vasta gama de bens - procedentes sobretudo do fazer popular - que, por estarem inseridos na dinâmica viva do quotidiano. não são considerados como bens culturais nem utilizados na formulação das políticas económica e tecnológica. No entanto, é a

À diferença das instituições já existentes voltadas para o conhecimentoe a

1!

Para Aloísio e os pesquisadores do CNRC, a imagem de cultura brasileira pro-

duzida pelas instituiçõesoficiais era, além de restrita, morta, e tratada como mero

gava a ser uma revisãoradicaldas concepçoesJá formuladasde culturabrasileira-

1.

H

residia seu potencial criativo.

ser a espécie, e bens culturais o gênero' (Magalhães, 1985, p. 18).

Pode-sedizer que. em um primeiro momento,o ideáriodo CNRC se propunha

l EÉ

dinâmica e em sua pluralidade. Acreditava-se que era nessas características que

partir deles que se afere o potencial, se reconhece a vocação e se descobremos valores

proteçãoda cultura brasileira, o CNRC não se propunhaa coletar bens, e sim a

mais autênticos de uma nacionalidade. (Magalhães, 1985, p. 52-53)

produzir referências - com o recurso às ciências sociais, à documentaçãoe à

A valorização das raízes populares na construção da identidade nacional não

informática - que pudessem ser utilizadas no planejamento económico e social.

constituía o dado novo da abordagem do CNRC. Como já foi observado no capítulo

A intenção clara era de revitalizar a cultura brasileira, inserindo-a no circuito do

anterior, em 30, os modernistas, inclusive os do Sphan, já procuravam chamar

tema que. no discurso governamental,tomava o lugar da "segurança nacional",

a atenção para o valor histórico e artístico das manifestaçõespopulares,inclusive

embora estivesse articulado com essa preocupação: o desenvolvimento. Não se

dos lazeres e saberes, como propunha Mário de Andrade em seu anteprojeto.O

tratava mais. entretanto.de uma visão otimista do desenvolvimento,como a for-

novo na proposta do CNRC era a perspectiva a partir da qual se valorizavam essas

muladana era JK e no períododo Brasil Grande.centradana industrialização e

manifestaçõos, que não eram apreciadas via folclore ou etnografia. Tratava-se de

nos grandesprojetos; essa visão começaraa ficar desacreditadacom a crise pós-

revelar um interesse até então não percebido:sua capacidadede gerar valor eco-

mf/abre.Havia, portanto, espaço para um novo discurso,que desse um novo sen-

nómico e de apresentar alternativas apropriadas ao desenvolvimentobrasileiro.

tido ao desenvolvimentoeconómico.

Era introduzida.assim, uma mediaçãopoliticamenterelevante entre a cultura po-

O problema que serviu de ponto de partida à criação do CNRC - a falta de um

pular e o interessonacional.

caMfer nacfona/no produto brasileiro- remetia, como ocorrera nos anos 20 com

Foram objeto preferencialdo trabalho do CNRC "o trato da matéria-prima,as

os modernistasem relação à produção cultural brasileira,à questão da tradição.

formas de tecnologiapré-industrial,as formas do fazer popular,a invençãode ob-

Em 1975, o grupo inicial do CNRC consideravaque o que faltava para conferir

jetos utilitários"(Magalhães,1985, p. 113). As análises desses objetos eram orien-

caüfer ao produto e à nação brasileirosera uma tradição que estivesse não ape-

tadas no sentido de demonstrar a adequação das soluções tradicionais ou das

nas cristalizada, internalizada, mas, sobretudo, viva. que fosse apreendida em sua

adaptações criativas do povo às condições do contexto brasileiro.

150

O PATRIAÕNIO

[A PROCESSO T51

l

Yj A noção de cultura popular foi ampliada de modo a abranger tanto as manifes-

do Brasil - país novo e pobre -, ele consideravaque a maior riqueza de que se

tações populares tradicionais quanto suas intersecçõescom o mundo industrial

dispõe não é material,é cultural. Essa cultura autêntica, viva. é que seria o nosso

e urbano. Ficava de fora, apenas, a cultura de massa.

legado para a civilização ocidental, nosso "artigo de exportação'.

A valorização da cultura brasileira, e em particular da cultura popular, atuaria

No artigo "Bens culturais: instrumento libra um desenvolvimentoharmonioso'.

B R

como vac/na contra as poderosas influências externas que descaracterizavam a

Aloísio Magalhães sintetizou sua visão sobre o papel da cultura no planejamento

nação. Como em 30, considerava-seque pairava no ar uma ameaça à sobrevivência da cultura brasileira, agora não tanto sobre os monumentos históricos

económico.tendo como eixo a questão da identidade nacional: "Resultam ainda

que, tombados, estariam, em princípio. protegidos, e sim sobre a cultura viva das

deixam de ser importantes como instrumentos para a formulação de nossa política

1;

k

frágeis os indicadores de nossa identidade cultural. Mas, apesar de frágeis, não

camadas populares, pouco conhecida e passível de ser esmagada pelo progresso

de desenvolvimento."(1985, p. 40). Essa política, para Aloísio, atuaria em dois

e pelas Influências exógenas.

níveis:

Ao CNRC não interessava, portanto, atuar sobre bens que fossem meros sig-

Considerandoo desenvolvimentocomo a busca de uma síntese harmoniosa

nos do passador para proteger esses bens já existiam instituições e museus sufi-

produzida pelos componentes diversificados e mesmo paradoxais de nossa cultura, é

cientes. Seu interesse se voltava para as manifestações culturais vivas, inseridas

de supor que a ação político-económica se processe em dois planos: em nível macro,

em práticassociais contemporâneas.Não era por acaso que Imagensvitalistas

das infra-estruturasde apoio. chamaríamosde metadesenvolvimento; em nível micro.

povoavam os discursos de Aloísio Magalhães.

de identificação de necessidadesligadas a comportamentos e hábitos, usos e costumes

Não só o conceito de cultura, mas também o modo como o CNRC a abordou 1.

da comunidade,chamaríamosde paradesenvolvimento.(Magalhães.1985. p. 421

já foram identificados com uma perspectiva antropológica. Considerava-se que as

Se. no nível macro, se importavam modelos e estruturas, muitas vezes inade-

manifestaçõesculturais deviam ser compreendidas em sua trajetória própria e em

quados aos contextos locais, era no nível micro, com o recurso aos indicadores

sua relação com o contexto cultural onde são produzidas e por onde circulam. Desse modo, o CNRC queria marcar sua diferença relativamenteàs apreciações

culturais. que se poderiam co/ng/r as desigualdades e descaracterizações. Ficava

tradicionais, via folclore. Posteriormente,vai-se cunhar a expressão "património

Implícitoque o equilíbrioentre esses dois níveis não é espontâneo,mas depende de decisão política.

cultural não-consagrado' para explicitar que se tratava de manifestações até então

Esse texto foi elaborado, em sua primeira versão, para ser encaminhado ao

não reconhecidas pelo património oficial e nem compreendidas. em sua especifi-

então todo-poderosochefe da Casa Civil, general Golberi do Couto e Silva, e.

cidade,pelascamadascultas.

não por acaso.discutiatambémas duas alternativaspossíveispara a conti-

Para o CNRC, o objetivo de sua proposta era instrumentalizar a área da cul-

nuidade do CNRC, que buscava uma forma estável de institucionalização: ou

tura para participar na elaboração dos projetos de desenvolvimento. Nos anos 70.

sua incorporação ao lphan, ou sua transformação em uma secretaria especial,

essa participação significava alcançar um assento junto aos organismos estatais

que atuaria junto à presidência da República, com alcance sobre todas as áreas

de planejamento,na medida em que o Estadoera, então,o protagonistados gran-

da administração pública federal. A segunda alternativa. mais adequada aos

des investimentos e o principal financiador dos empreendimentos privados. Nesse

objetivos do CNRC, era, porém, a mais complexa e politicamentemais instável.

sentido, os primeiros interlocutores do CNRC eram as autoridades dos órgãos estatais, embora houvesse a preocupação de buscar legitimação para seus trabalhos junto ao meio intelectual e, sobretudo, junto à área acadêmica, tanto nacional como internacional.

Após um período de indecisão, Aloísio preferiu a primeira, mais segura, e que oferecia maiores garantias de continuidade - o que de fato se confirmou. pois

foi o primeiropassoparaa criaçãoda Secretariada Culturado MEC,em 1981, quando. pela primeira vez, se reuniu em um só órgão, no Brasil, a gestão da

Um dos pontos de partida para a reflexão de Aloísio Magalhães era a distinção

política cultural federal.

entre países velhos e novos, e ricos e pobres (Magalhães. 1985, p. 85). No caso

152

O PATRIAON 10 EA PROCESSO

& \&S\ AOO[RNÁ

153

l

r 4.5 A UNIFICAÇÃODA POLÍTICA FEDERAL DE

bens, segundo Aloísio. se apresentavamcomo "mortos', em oposição à relação

plEstpvÂ[Ão: Â Fusão lpuAU/PCH/CNRC

dinâmica das manifestações populares com seus produtores e usuários. Por outro

Em 1979, com o apoio do ministro Eduardo Portela e do general Golberi do

l lj

k C

Couto e Silva, Aloísio Magalhães foi nomeado diretor do lphan, e ocorreu a fusão

camadas cultas explicitar o valor propriamente cultural das produções populares.

lpharúPCH/CNRC.Reuniam-se assim. numa só instituição. os recursos e o know-

tradicionalmentevaloradas a partir de uma percepção olitista, via folcloro. O pro-

how gerencial do PCH, o prestígio e

a competência técnica do lphan e a visão

metodo CNRC se propunhaa criar uma via de mão dupla entre dois universosque

modernae renovadora do CNRC. Foi criada uma nova estrutura: um órgão nor-

se achavam apartados tanto no domínio do conhecimento acadêmico quanto no da

mativo - a Secretaria do Património Histórico e Artístico Nacional (Sphan) e um

administraçãopública.

órgão executivo - a Fundação Nacional pró-Memória (FNpM).

11

l

Para Aloísio. a fusão vinha revitalizar o lphan e operacionalizaro CNRC, solução que se justificava na linha da continuidadepregada por ele. Esse era o conteúdo da exposição de motivos encaminhada ao MEC, em setembro de 1979, propondo a criação da Fundação Nacional pró-Memória como órgão executivo da

1 1$ 1.

lado, estava implícitono texto acima que cabia aos setores mais esclarecidosdas

O texto citado de Aloísio é bastante elucidativo quanto à elaboraçãofeita polo CNRC da dicotomiacultura erudita/culturapopular. Essa dicotomia,como veremos adiante, havia sido ratificada também no nível institucional, e aí rosidia uma diferença significativa entre a proposta de Mário de Andrade - exposta no sou

anteprojeto e realizadano Departamento de Culturada Municipalidade de São

Secretaria do Património Histórico e Artístico Nacional, que viria substituir o lphan.

Paulo, nos anos 30 - e a prática desenvolvidapelo Sphan com base no decreto-

E foi com esse discurso que Aloísio Magalhãesconseguiuamplo apoio no Con-

lei Rg25, de 30.11.37. Não foi por acaso, aliás. que o CNRC buscou no anteprojeto

gresso Nacional para aprovar. em regime de urgência e em um momento bastante desfavorável à criação de novas fundações, a Fundação Nacional pró-Memória, em novembro de 1979.

de Mário de Andrade um apoio a sua proposta. Entretanto, Mário de Andrade, embora se voltasso para criar vias de acesso entre a cultura erudita e a cultura popu-

lar, mantinhaclara distinção entre as duas - o que não ocorreu no CNRC. Como já foi dito no capítulo anterior. se os técnicos do Sphan eram sensíveis

Em termos conceituais, a idéia era de que o CNRC desenvolvia uma atuação complementare crítica em relação ao lphan, que privilegiava os bens de pedra e ca/. Tratava-se, nas palavras de Aloísio Magalhães.de suprir uma /acuda do lphan:

ao valor cultural das manifestaçõespopulares, na seleção de bens para tombamento havia dificuldadeem valorar esses bens com base nos critérios adotados

para as expressões da culturaerudita,sobretudose esses bens los da cultura A aproximação que o CNRC deu ao conceito de bem cultural atinge uma área de

que o Patrimónionão estavacuidando.Ou seja:o bem culturalmóvel,as atividades do povo. as atividades artesanais. os hábitos culturais da humanidade. O Património

popular) se achavam inseridos na dinâmica de uso das comunidades locais. É significativo. a respeito. o parecer de Luís de Castro Farias, membro do Conselho

atuava de cima para baixo, e. de certo modo, com uma concepçãoelitista. A igreja

Consultivo, e então diretor do Museu Nacional, que, em 1958, assim justificava

e o prédio monumental são bens culturais, mas de um nível muito alto. São o resultado

sua opinião contrária ao tombamento do Santuário do Bom Jesus da Lapa, na

mais apurado da cultura. O CNRC procurava trabalhar de baixo para cima. Pela própria

Bahia,solicitadopelo párocolocal:

razão de ser uma atividade popular não tem consciência de seu valor. Quem faz uma

No Santuário de Bom Jesus da Lapa pratica-se um culto de cunho popular. A religiosidadeda massa humana que ali acorre em época de romaria se exprime de

igrejasabe o valor do que faz. Mas quemtrabalhacom couro, por exemplo nem sempre. Desse contraponto, pode surgir uma hipótese - a de que o CNRC começava

acordo com padrõeséticos próprios;a sua sensibilidadepossui também um sistema

a tocar nas coisas vivas, enquanto o lphan se preocupava principalmentecom as coisas

de valores algo diferente do nosso. Para que esse santuário possa continuarfiel a essa

mortas. Pelo contrário. é através das coisas vivas que se deve verificar que as do

tradição. é preciso que Ihe não restrinjam a liberdade de ampliação. renovaçãoe mesmo

passadonão devem ser tombadascomo mortas. (1985, p. 217)

inovaçãoem consonânciacom as exigências daquelas formas peculiares de com-

Como a vinculação - utilitária e simbólica - dos bens tombados pelo lphan

portamento.Comprovado o desfiguramento paisagístico do local e o desaparecimento

com a vida social e económica das comunidades não era levada em conta. esses

de todos os bens de valor histórico e artístico (segundo os critérios da Dphan) que ali existiram, não vemos como se poderia conciliar futuramente os interesses do Dphan

154

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

h \&\\

AOB[RNÁ

T55

t

T e os das autoridades eclesiásticas responsáveis pela grave tarefa de manter e ampliar o culto na forma peculiar de que se reveste naquela área. l26a reunião CC

21.8.581

Ou seja, considerava-se, no final da décadade 1950,que as expressõesda

l lj

IK

cultura popular deviam ser apreciadasdentro de uma outra ordem de valores que

A partir dos anos 80, a preservação das manifestaçõesculturais dos diferentes

contextos culturais brasileiros assumiu uma nítida conotação política, na medida em que, à idéia de diversidade, se sobrepunha a de desigualdade.Ao propor a introdução de bens do "património cultural não-consagrado' no património histórico

e artístico nacional (basicamente, bens das etnias afro-brasileiras e vinculados

não a que presidia à prática de preservaçãoexercida pelo Sphan, adequadaaos bens móveis e imóveis de excepcional valor histórico e artístico.

à cultura popular). e a participação da sociedade na construção e gestão desse

Manifestaçõescomo o artesanato, ritos e folguedos, os saberes e fazeres do

lizava então a sociedade brasileira pela reconquista da cidadania. Na gestão de

povo eram, até os anos 70, objeto de interesse primordialmentede folcloristas e

Aloísio Magalhães no lphan. uma primeira expressão dessa participação foi a in-

etnógrafos,sendo os mais conhecidos Luís da Câmara Cascudo, no Rio Grande do Norte. RossiniTavares de Lima. em São Pauta,e Renatode Almeida e Edison

trodução da prática de consultar as populações dos centros históricos, o que ocor-

Carneiro,no Rio de Janeiro. Em 1958, foi criada, no MEC. a Campanhade Defesa

Em termos teóricos, o CNRC não lidava com os conceitos de arte e de histó-

do Folclore Brasileiro,integrada, nos anos 70, ao Departamentode AssuntosCul-

ria, sobre que se fundamentava a ação do lphan, mas com categorias apresentadas

turais (DAC), e, posteriormente,à Funarte. Em 1977, foi criado, no Ministério do

como novas, no sentido de reelaboradas,como a de bem cultural, de memória.

Trabalho o Programa Nacional de Desenvolvimentodo Artesanato (PNDA), visan-

de continuidade etc.

do a explorar o artesanato como possível fonte de renda para mão-de-obranão qualificada. A Artíndia, por exemplo, vinculada à Funai. tem por objetivo comercia-

lizar objetos produzidospelos índios. Institucionalmente,portanto, o trato de bens produzidos em contextos culturais de origem afro-brasileira, indígena e popular ficava a cargo de outros setores dentro do MEC, e de outros órgãos da administração pública federal. Integravam,porém, o patrimóniohistórico e artístico nacional nas coleções etnográficas dos museus nacionais.

património, a política da FNpM visava a se inserir na luta mais ampla que mobi-

reu nos semináriosde Ouro Preto, Diamantina,Cachoeira,São Luís etc.

Em contrapontoà idéia de coletar para guardar, para preservar, Aloísio Ma galhães propunha a noção de "dinamização da memória nacional': Quando se fala em memória num sentido figurado, quando se empresta a idéia de memória a um fato qualquer, em geral há uma tendência a se tomar isso como 'juntar ou "guardar alguma coisa, "reter'. E isso me parece insatisfatóríoleu prefiro o conceito biológico de memória: guardar. reter, para em seguida mobilizar e devolver. (1 985, p. 67)

O CNRC se propunha, entre outros objetivos, a reelaborar essa dicotomia

Para Aloísio, a atividade de proteção não podia esgotar-se nela mesma. Era

jerudito/popular) e a conferir um status de património histórico e artístico nacional

necessário pâ-la a serviço da sociedade, o que considerava ser também respon-

à produção dos contextos populares e das etnias indígena e abro-brasileira.Na

sabilidade dos organismos culturais.

mesma linha. o prometodo CNRC (que foi assumido pela FNpM) queria dar um novo sentido à política de presewação.Não se tratava mais de apenas presewar

imutabilidade. como os procedimentos de proteção levam a entender - Aloísio

materialmente monumentos e sítios em que se reconheciam valores históricos e

Magalhães articulava passado, presente e futuro, tendo sempre em vista elaborar

artísticos que justificavam o investimento em sua conservação pela sua mera

a ação projetiva.o"Porque uma cultura é feita de elementos compostos do passado

presençae visibilidade. Essa era consideradauma postura elitista, para benefício

que são vistos pelos homens transitórios do presente e que desenham o caminhar

apenas das camadas cultas. Nos anos 70, a tarefa de preservação passou a assu-

Na noção de tempo cultural, entendido como continuidade' - mas não como

projetivo.'(1985,p. 71).

mir novas funções para além da escora estritamente cultural. Como já vimos, pro-

curava-se revelar nos bens culturais sua dimensão de produtoresde valor eco-

A concepção ampla de cultura, a visão totalizadora e articulada da ação cul-

nómico, seja diretamente,como matéria-primapara a atividadeturística, seja indi-

tural conforme o modelo das duas vertentes,'' idéias expressas em imagens como

retamente, como referências para a busca de soluções adequadas ao processo

de desenvolvimentobrasileiro.

156

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

a do disco e a da bateia, habilitavam Aloísio a abarcar todo o universo cultural do MEC.

157

l

T autor, esse lema "sugere uma estratégia política que requer uma capacidadede

4.6 UM PROPOSTADE D[AOCRATIZACÃO DA POLÍTICA

auto-organização da sociedade'(1990,p. 290).Era nesseespaço- entreo lema CULTURAL: Â CRIAÇÃO DA SECRETARIA DA CULTURA DO A[C

e seu pressuposto- que pretendiam atuar os agentes do CNRC e. a partir de 1979,

Na gestão do processo de reordenamentoinstitucional da área cultural do

os da FNpM. Em que medida as estratégias adotadas levaram efetivamente à de-

MEC, Aloísio Magalhães, visando a administrar inevitáveis conflitos entre inte-

mocratização da política de presewação é uma das indagações que motivam este

resses de áreas até então autónomas, recorreu a um processo pouco usual no

trabalho.

serviço público: a realização de seminários reunindo técnicos de todas as instituições envolvidas. Em 1979, esse foi o objetivo do seminário realizado na Escola

Superior de Administração Fazendária (Esaf), em Brasília, com funcionários do lphan, do PCH e do CNRC. O mesmo procedimentofoi utilizado em 1981. quando

da criação da Secretaria da Cultura do MEC (SECA, com o objetivo de elaborar o documento que foi denominado D/refrlzes para operam/ona//zação da po//rica

i

cultural do MEC.

O fato é que esse novo discurso se revelou compatívelnão só com o momento de abertura democrática dos últimos governos militares, como foi também encampado pela Nova República. Os artigos 215 e 216 da Constituição de 1988 trazem nitidamente sua marca. Após a morte súbita de Aloísio Magalhães, em junho de 1982. na Europa, onde fora participar de reunião da Unesco, em Veneza, assumiu a SEC seu conterrâneo,

Marcos Vinícios Vilaça, que se propôs dar continuidade à orientação de seu A proposta de democratização da política cultural contida nesse documento foi

antecessor.

introduzida pelos agentes institucionais que elaboravam e conduziam os proletos [

l

no CNRC e, posteriormente. na FNpM. Esses agentes - em geral atraídos pela possibilidade de desenvolverem trabalhos voltados para os interesses de grupos

até então não atendidos pelas políticasculturais - se propunhamatuar como

Em 1985, o presidenteeleito Tancredo Neves criou o Ministério da Cultura. que substituiua SEC, e foi assumido por José Aparecido de Oliveira durante apenas dois meses, antes de passar a responder pelo Governo do Distrito Federal.

mediadores entre o Estado e as comunidades ainda não organizadas, na cena da

Para substituí-lo foi nomeado o mineiro Aluísio Pimenta, a quem sucedeu, em

política cultural estatal.

1986, o economista Celso Furtados em setembro de 1988, José Aparecido ocupou novamente o ministério.

t

A diferença da fase heróica do Sphan, nesse documento não se propunha atingir a sociedade através de uma campanha de educação popular, no sentido

No MinC, procurou-se estimular a participação da sociedade mediante três

de esclareceras massas sobre os valores histórico e artístico dos bens culturais.

procedimentos: a criação de assessorias especiais - do negro, do indígena, da

Para aqueles novos agentes institucionais,no final dos anos 70 e início dos 80.

mulher, dos deficientes físicos, da terceira idade etc. -, a realização de seminários.

as ações da política cultural do governo federal deviam se voltar prioritariamente

que reuniram intelectuais e artistas, visando à elaboração de uma proposta de po-

não só para o atendimento das necessidades culturais, como também levar em

lítica cultural, e a implantação da Lei Sarney, de incentivos fiscais.

consideração as necessidades económicas e políticas dos grupos sociais até então excluídos - simbólica e materialmente - dos benefícios dessa política. Mais que isso: era preciso que essas comunidades passassem a participar do processo de construção e de gerenciamento da produção cultural brasileira, inclusive do património cultural. É pela via da participação social

- e não mais pela da seleção

rigorosa de bens de valor excepcional - que se vai buscar legitimar a política de

preservação dos anos80. Esse recurso não caracterizava uma mudança apenas no âmbito da política cultural. Como observa Pécaut, o lema, no quadro da abertura política iniciada no

As propostas dos seminários praticamente ratificaram o texto das l)/ref/{zes. As assessorias foram. enfim, extintas, permanecendoapenas a do negro que.

apósa Constituição de 1988,se transformou na Fundação Palmares. A Lei Sarney foi revogada no início do governo Collor e, posteriormente, substituída pela Lei Rouanet. Extinto em março de 1990, após cinco anos apenas de funcionamento, o Ministério da Cultura da Nova República, primeira tentativa no Brasil de criação de um

ministério independente para cuidar exclusivamente da cultura. está a requerer uma análise específica.

governo Geisel, era "reativar a sociedade civil'. Entretanto, segundo o mesmo

158

O PATRIÁõNIO



PROCESSO

159

T 4.7 0 ALCANCE E OS llAITES DA POLÍTICA FEDERAL Dt

PRES[RVA[ÃO NOS ANOS 70-80:

lembrar que a chamada fase de aóenura, iniciada em 1974, com o governo Geisel,

UA BA]AN[0

teve implicaçõesperceptíveisno âmbito desse ministério. Duranteas gestões dos

A mera exposição da trajetória da política de preservação federal, nas décadas de 1970 e 1980. evidencia uma nítida mudança em relação ao modelo vigente até

11

então. O esforço de reformulação feito pelo lphan no final dos anos 60 e início

dos 70. através do recurso à consultoria internacional e ao envolvimento dos governos estaduais. não foi suficiente para recuperar o prestígio e o relativo poder de que a instituição gozara durante a gestão de Rodrigo M. F. de Andrade. O

ministros Ney Braga. Euro Brandão (governo Geisel), mas sobretudo durante a gestão Portela, o MEC se converteu em um espaço privilegiado para a criação

de uma imagemde abertura.Após a fase de reestruturação institucionale de elaboração da primeira política global para a área da cultura depois do golpe de 1964,

na gestão Portela o MEC se propôs explicitamente privilegiar as demandasdos grupos populares. Comparando os textos e documentos produzidos nesse período

surgimento de alternativas à margem do MEC veio mesmo confirmar o desgaste

com o lá mencionado Po/#/ca nac/ona/ de cu/fura, Sérgio Miceli observa que estes

da proposta do lphan e a necessidade de uma reorganização institucional.

últimos 'lidam com pares conceituais idênticos, mas com sinais trocados' (1984,

Conceitualmente, essa reelaboração já vinha sendo tentada, desde a gestão

p- 1071.E nesse período que Aloísio Magalhães inicia sua ascensão na política

cultural do MEC.

de Jarbas Passarinho no MEC, quando, segundo informação de Gabriel Cohn (1984, p. 88), foi elaborada,em 1973, a primeirapropostaglobal de política cultural do governo militar, com o pouco conhecido documento Direfrizes para uma po/ilfca nacional de cultura. Mas o documento que foi efetivamente divulgado e adotado como orientação

O tom novo e modernoque é atribuídoao discursode Aloísio Magalhãesdecorre não exatamentedos temas propostos.mas do modo como os elabora e do significadoque lhes confere,tendo em vista um prometo para a nação. Pela primeira vez, desde 1964, a expressão"segurançanacional" está totalmenteausente de

oficial foi o Po//fica naciona/ de cu/fura, elaborado em 1975, durante a gestão do

um discurso oficial cujo tema é a cultura. Por outro lado. a relação entre cultura

ministro Ney Braga, por membros do MEC e do Conselho Federal de Cultura, sob a orientação de Afonso Arinos de Meio Franco. Nesse texto, já estavam presentes

e desenvolvimento assume,em seus pronunciamentos.contornosmais específicos, exemplificadacom situaçõesconcretas,como o caso de Triunfo (cf. Maga-

temas que foram posteriormente desenvolvidospor Aloísio Magalhães.

Ihães, 1985, p. 42-441,e traduzidaem uma propostade atuação nova. ainda que genenca.

+

A expressão "segurança nacional" está praticamente ausente do texto, a não

ser por uma rápida menção (MEC, 1975, p. 30). É a temática da relação entre

Além disso. Aloísio evita habilmentequalquer menção. ou mesmo alusão, à

cultura e desenvolvimentoque recebe maior destaque, na afirmação da impor-

idéia de sincretismo.A reflexão que desenvolve sobre o processo cultural brasi-

tânciada culturana vida económica e social('0 desenvolvimento não é um fato

leiro, sempre a partir de pares de opostos (países novos/velhose pobres/ricosl

de natureza puramente económica. Ao contrário, possui uma dimensão cultural

bens vivos e bens mortos etc.), é mais sofisticada,na medida em que não se re-

que. não respeitada, compromete o conjunto' [ibid.]). A noção de identidade cultu-

solve numa mera síntese ou superação das oposições, mas mantém sempre a

ral é referida a partir de uma perspectivapluralista. pluralismo esse que se ex-

relaçãoe a tensão entre os dois pólos. Como articulaçõesdesses elementos,Aloí-

pressa na diversidade regional. Essas diferenças, amalgamadas entre si e às

sio recorre às noções de processo ou dinâmica cu/fura/e de tempo cu/fura/,no-

influênciasexternas,se fundiriamno 'sincretismo'característico da "marca"bra-

ções que vai definir. como era seu costume,e até por vezo profissional,recor-

sileira (idem, p. 161. O património cultural brasileiro é caracterizadoa partir da

rendo às imagens extremamente expressivas a que já nos roferimos: a do cristal.

tradicional distinção entre cultura erudita (património histórico, artístico e cientí-

a do estilingue, a do disco e a da bateia.

ficos e cultura popular (artesanato e folclore) (idem, p. 24), propondo-se inclusive

ações distintas para cada uma das duas esferas. Para se entender melhor o surgimento da proposta do CNRC, e sua incorporação à política cultural do MEC no contexto de um governo autoritário, cabe

160

Foi com base nas idéias de óem cu/fura/. de dfvers/dadocu/fura/, de conlf-

nu/dado, e na afirmação do potencialproletivodo trabalhona áreaculturalque

O PATRIAÕNIO

ÉA PROCESSO

Aloísio Magalhães e o grupo do CNRC formularam uma proposta de política cultural que tinha como ambiçãofornecer subsídiospara a solução dos problemas

}61

do desenvolvimento no Brasil. Sua elaboração,no entanto,passavaao largo de

Nesse sentido, o discurso de Aloísio se distinguia do discurso então produzido

tensões e conflitos concretos que se manifestavam no âmbito do processo cultural

pela Seac, sob a direção de Márcio Tavares d'Amaral - que, em 1981, foi inte-

e, certamentede forma mais aguda e evidente,nos campos económicoe social

grada à Secretariada Cultura, e passou, portanto, à direção de Aloísio. Em sua

tensões essas que se impunhamna execuçãode projetoscomo os de Maceió e

fala, a distinçãoentre dominantese dominados- que predominavanos textos da

de Suape.

Seac - é apenas mais uma entre as oposições mencionadas - e certamente não

No seu discurso,Aloísio Magalhãescriticava os sinais da modernizaçãocapi-

a mais enfatizada-, o que terá contribuídopara que seu discursotransitasselivre-

talista que consideravainadequadosem um país subdesenvolvido- transferência acrítica de tecnologias próprias para os países desenvolvidos,acumulaçãode ri-

mente entre grupos sociais das mais diversas orientações políticas e servisse.

quezas sem a correspondentedistribuição,investimentosem proletos faraónicos-

área cultural no governo federal. Por outro lado, é inegável que essas oposições

para defenderum modelode desenvolvimentoendógeno.a busca de soluções

foram construídasde modo a induzir a uma valoração, recebendo sinal positivo

autóctones. Essa postura se alinhava à orientação terceiromundistada Unesco.

o que era qualificado como vivo, o que, por contraste, qualificava negativamente-

então sob a direção do africano Amadou Matar M'Bow.

no sentido de morta, estática e afastada da vida das comunidades - a política de

Segundo essa visão, o que, na perspectiva do desenvolvimentismo.eram sinais de carência - o atraso tecnológico, os bolsões de cultura pré-capitalista,

preservação praticada pelo lphan. E, embora alguns projetos visassem a uma

o apego à tradição - converte-se, pode-se dizer que quase magicamente. em fato-

CNRC, no conjunto prevaleciam aqueles bens a que a atuação do lphan não vinha

res propiciadoresde um desenvolvimentoapropriado.Essa inversãode expec-

atendendo.

tativas é exposta por Aloísio Magalhães em um tom que beira o messianismo:

com sucesso, para alcançar o objetivo a que se propunha: a reestruturação da

reinterpretação dos bens consagrados. conforme os pressupostos de trabalho do

Foi, portanto, o potencial criativo dos bens culturais - primordialmente os da

Restam os países pobres e novos. A esses. e para esses, devemos voltar nossos

culturapopular- e seu valor como "instrumentopara um desenvolvimento har-

olhos e nossa reflexão porque aí talvez se encontre, excelências, uma série de parâ-

monioso' que constituiu o foco de interesse dos trabalhos desenvolvidos pelo

metros e de paradigmas que, nesta altura da vida do Ocidente - pois estamos falando

CNRC.

da Ocidente- adquiremum significadotodo especial.E que talvezesteja unicamente nos segmentos de autenticidade dessas nações, nos frágeis e pequenoselementos que constituem o seu património, como cultura, justamente a probabilidadeda sua salvação diante do mundo, criado pelo homem ocidental, em que tudo são impasses, em que

No entanto, as indefinições do discurso de Aloísio, que em meados dos anos

70, podiam ser encaradascomo estratégia política, foram tornando problemática sua aceitaçãopor parte de setores sociais mais radicais. Em primeiro lugar, esse

nada foi resolvido. em que o dinheiro não compra harmonia, não compra a identificação

discurso revalorizavaa cultura popular a partir de uma visão idealizada, sem iden-

do homem com o meio ambiente, diante de um mundo em que tudo está em xeque,

tificar os sujeitos reais que a produzem e consomem, e seu lugar subalterno na

em que nenhuma das formas de valorização económica, tecnológica e mesmo científica

sociedade brasileira. Em segundo lugar, sua posição, junto ao governo federal,

está verdadeiramente à disposição de todos. (1985, p. 82-83)

de poda-voz dos produtores dessa cultura, tornava-se progressivamente mais pro-

Na verdade, a crítica de Aloísio se dirige antes ao imperialismo que ao modelo

blemática, tanto em função das ações desse governo, que contradiziam a intenção

capitalista implantado no Brasil. Imperialismo económico. do capital internacional.

de abertura, quanto da própria rearticulação da sociedade civil. Esses aspectos

imperialismo cultural, dos padrões europeus e, mais recentemente. dos mass

do discurso de Aloísio e da prática do CNRC provocaram críticas de setores da

media americanos. O verdadeiro Brasil, qual um gigante adormecido. estaria co-

intelectualidadee desconfiança por parte de lideranças dos movimentos populares

berto por um manto estrangeiro:

ainda incipientes.

E como se o Brasil fosse um espaço imenso, muito rico. e um tapete velho, roçado.

um tapete europeucheio de bolor e poeira tentassecobrir e abafar esse espaço. E preciso levantar esse tapete. tentar entender o que se passa por baixo. IMagalhães.

1985,p. 421

162

O PATR IAON 10 EA PROCESSO

Apesar da grande aceitação desse discurso e da receptividade à pessoa de Aloísio, a proposta do CNRC transmitia, sobretudo aos setores acadêmicos - que Aloísio procurava, principalmente em São Paulo, para trocar idéias - uma impres-

h \hS\ AODeRNÁ

163

+

são de imprecisão teórica e de ambigüidade ideológica, o que era agravado por

na cena da política cultural brasileira,no período que vai de 1976 a 1982. Apoiado

$eu lugar de fala, de dentro do Estado. Essa situação ficou mais delicada após

em sua relação pessoal com personalidades influentes no governo federal, e,

1977, quando o presidente Geisel fechou o Congresso e lançou o "pacote de abril".

sobretudo, em seu carisma pessoal e sua habilidade política, Aloísio conseguiu conquistaraliados importantesjunto ao Executivo - como o então todo-poderoso

o que motivou a saída do ministro Severo Gomes do governo. Se as críticas de um intelectual de perfil mais tradicional, como o historiador José Honório Rodri-

gues, não criavam maiores embaraços a Aloísio (Magalhães, 1985, p. 122-127).

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ministro Golberi do Couto e Salva- e junto ao Congresso Nacional. Entretanto, fatores como sua identidadede criador je não de intelectual,vinculado à acade-

ficava mais difícil reagir às reservasde intelectuaiscomo CardosGuilhermeMota.

mia), sua desvinculaçãoda política paRidária,sua carreira tardia no serviço públi-

Marilena Chauí, Sérgio Miceli e outros, que se fundamentavam numa reivindicação

co e restritaà área cultural, seu interesse mais afetivo que crítico pela cultura

de maior rigor científico e maior clareza ideológica.''

popular o, sobretudo,o caráter original de seu discurso.que Ihe garantia inegável

Essa ambigilidade se tornou particularmenteIncómoda a partir dos anos 80.

poder de penetraçãojunto aos mais diversos componentosda sociedade- políti-

quando a sociedadese mobilizavapara a reconquistados direitos políticos, e foi

cos, intelectuaise artistas, conservadores. liberais e mesmo pessoas reconheci-

reforçadajunto ao moio acadêmico.como observa Sérgio Miceli, devido "à ausên-

damente de esquerda dalgunsdos quais figuravam entre seus colaboradoresl-

cia de um quadro conceptual de reforência nos documentos veiculados pelo Cen-

certamentecontribuírampara suscitar muitas dúvidas quanto ao uso que estaria

tro" j1984, p. 80). Por outro lado, pode-se argumentarem favor de Aloísio e de

sendo feito de seu prometopelo governo militar. Para Verá Milet (1988), por exem-

seu prometoque. se o mundo acadêmicoé o universo da análise e da crítica - cuja

plo. a atuação modernizadora de Aloísio, na verdade, vinha ao encontro do interes-

independência é, inclusive, garantida pelo princípio da autonomia universitária - Aloí-

se do Estado, então na era pós-mf/abre económico e passando por uma crise de

sio Magalhães, assim como Mário de Andrade e Rodrigo M. F. de Andrade, transi-

legitimidade,no sentido de fornecer um idoário nacionalistanovo e adequadopara

tava no mundo da política,regido pelos princípiosda ação. da estratégia,da nego-

diluir, no nível da ideologia, as contradiçõese os conflitosque, naquele momento, marcavama sociedade brasileira. Verá Milet considera que 'ao nível do ideário

ciação e dos resultados. Esse efeito negativo era contrabalançado- e alguns preferirão dizer: mas-

e da ação na instância cultural, aquele prometorespondeàs necessidadesdo siste-

carado - pela originalidadee extrema eficácia persuasivado discurso de Aloísio.

ma atual no que diz respeito à promoçãode uma cultura nacional em que todos

Seu estilo fugia à impessoalidade e à insipidez da linguagem burocrática, mas não

os cidadãos, independentementede sua posição de classe, se sintam partícipes'

se identificava tampouco com o rigor do texto acadêmico. Como observou José

11988, p. 176).

Laurênio de Meio na introdução a E 7}funfo?. plasticidade e oralidade eram os tra-

O documen\o Diretrizes para operacionalização da política cultural do MEC

ços característicos de sua expressão verbal (assim como a curiosidade, o otimis-

j1981) procurava avançar na resolução da ambigüidade mencionadarecorrendo

mo e a afabilidade eram as características mais marcantes de sua personalidade).

a um outro conceitotambém genérico e não menos ambíguo - o da participação

E apesar da impressão de simplicidade e de espontaneidade que suas falas pro-

comunitária. Nesse texto, reivindica-se a ampliação da imagem de cultura forjada

vocavam, certamente, como artista plástico, Aloísio sabia, melhor que ninguém,

pelos órgãos oficiais, não só pelo reconhecimentodo que se denominava"patri-

como é difícil ficar indiferente à beleza da forma, seja da imagem, seja da palavra.

mónio cultural não-consagrado',como também, e sobretudo, pela participaçãode

E em mais um gesto surpreendente em sua carreira de burocrata. não hesitou em

outros atores no processo de "gerenciamentoda produção e da preservaçãodos

recorrera seus dotes de gravador para argumentar.na última reuniãode que parti-

bens culturais'. Formulou-se,assim, uma proposta de democratizaçãoda política

cipou. na ltália, sobre a pertinência de se inscrever Olinda como Património Cul-

cultural que, durante a década que se seguiu, foi um mote sempre reiterado nós

tural da Humanidade.': Simbolicamente,nesse momento unia as duas faces de

discursos produzidos pelos órgãos culturais públicos e privados, federais, esta-

sua vida de trabalho, a do criador de imagens e a do formulador de projetos.

duais e municipais

Por outro lado, é preciso não esquecer que o discurso foi apenas um dos recursos de que se valeu Aloísio no exercício de seu papel como protagonista

164

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

Na vertente da preservação, tradicional e juridicamente de responsabilidade do poder público, e regulamentadaa partir de campos disciplinares específicos

& \&\\ AOBeRNÁ

T65

+

como a história da arte, a estética,

a história, a arqueologia etc., essa proposta

revelaram-seinsuficientes para operacionalizar a relação entre cultura e desen-

de democratização,calcada em um argumento político e em uma concepção antro-

volvimento e assegurar às populações dessas áreas meios para defender seus

pológica de cultura, encontrou. na prática, dificuldades e limites que, obviamente.

interessese sua cultura.

não se apresentavampara a vertente da produção cultural (cinema, teatro, artes plásticas etc.) - para a qual interessava que a atuação do Estado se limitasse a assegurar a liberdade de expressão e a fornecer formas de estímulo à criação, sobretudo através de apoio financeiro.

l

f

riências pontuais que levaram a resultados concretos - como a realização, em 1985, do Encontro Nacional de Serlngueiros da Amazõnia, no campus da Univer-

sidade de Brasília, desdobramento do PrometoSeringueiro, desenvolvido desde

Por outro lado, as diferenças de perspectiva na área da preservação (entre

1982, em Xapuri, Acre, dentro do PrometoInteração da Educação Básica e Con-

os agentes da Sphan e os do CNRC) não eram incontornáveis.A prática dos agen-

textos Culturais Específicos - conduziu a Área de Referência da Dinâmica Cultu-

tes do CNRC e, posteriormente. da FNpM, como, certamente, também a prática

ral da FNpM a assumir explicitamenteuma posição política comprometidacom os

dos agentes da Sphan junto às comunidadesvinha demonstrandoque os valores

grupos sociais marginalizados.Essa posição foi claramente expressa no docu-

culturais atribuídos pelas elites cultas - não só, mas também através dos órgãos

mento Compram;ssocu/fura/ da /Vovó RepúZ)/icajver Anexo V), produzido por

estatais de preservação - aos bens que integravam o património eram freqüente-

iniciativa de funcionários da FNpM - mais especificamente. do grupo oriundo do

mente estranhos, ou mesmo indiferentes, para as populações que conviviam com

CNRC - mas que foi assinado por várias entidades da sociedade civil.

esses bens - pelo menos para grande parte dos habitantesdas cidades históricasC

A consciênciadesses limites. fruto também da reflexão sobre algumas expe-

Esse documentofoi motivado pela vacância, em maio de 1985, do cargo de

seja porqueessas populaçõeslhes atribuíamvalores de outra ordem, seja porque

ministro da Cultura. com a saída de José Aparecido de Oliveira. O objetivo era

consideravam que havia necessidades mais prementes a serem atendidas pelo

garantir a continuidadeda proposta de política cultural exposta nas l)/refrkes,

podor público, por exemplo, na área de infra-estruturaurbana, saúde, educação

para o que se buscou o apoio de parlamentares. de intelectuais e de associações

etc. Na verdade, portanto, as diferenças de perspectiva entre os dois grupos relati-

civis. O texto, tal como o documento de 1981, parte de uma concepção abrangente

vamente à orientação das atividades de preservação decorriam antes de resistên-

de cultura, mas reivindicaa atenção do MinC para aspectos não específicosdo

cias de ambas as partes que de questões de princípio, pois no próprio campo

processo cultural. como "saúde, educação, acesso e uso do solo, trabalho, habi-

tradicionalde atuação da Sphan as teses do CNRC poderiam ser comprovadas.

tação etc.'. e aos "grupos diversificadosem situação de subalternidade'tais como

Mas, para que isso ocorresse, era necessário que os dois grupos desenvolvessem

"indígenas. ciganos, migrantes, mulheres, favelados. garimpeiros. seringueiros.

uma atuação conjunta, o que só aconteceu muito raramente.

bóias-frias etc.' Segundo o documento. esses compromissoseram "considerados

Também a necessidade de articulação do trabalho de preservação com outras

como imprescindíveis ao processo de sua Ido MinC) legitimação junto aos seg-

esferas da administração pública. sobretudo com a de planejamento urbano. já

mentos sociais que deve ouvir e apoiar." Além disso. diz o documento,já numa

vinha sendo constatada desde a gestão de Rodrigo M. F. de Andrade no Sphan.

avaliaçãocrítica das l)Irefdzes, é preciso "que a pluralidade e a diversidadecul-

Mas a ampliação da esfera de atuação de uma política de património se apresen-

tural sejam respeitadas,mas que a diferença não implique em justificativa para

tava como um imperativomais forte para os agentes do CNRC, e depois para os

a desigualdadesocial'.

da FNpM, em função do sentido social que queriam imprimir a seu trabalho - para

No discurso de Aloísio. o objetivo era afirmar a pluralidade e a diversidade

não falar, em alguns casos, de seus compromissospessoais, em decorrênciade

culturais no Brasil, e instrumentalizar a cultura visando a fornecer indicadores

suas vinculaçõespolíticas e/ou profissionais.A esses fatos veio se juntar, no final

para um "desenvolvimentoharmonioso'l já na segunda metade da década de 1980.

dos anos 70 e início dos anos 80, a pressão da mobilização social pela reconuista

o importante era põr o MinC a sewiço da comoção das desigualdades económicas

dos direitos políticos. Era forçoso reconhecerque, na prática de projetos mais

e sociais que caracterizavama sociedade brasileira, numa clara politização da

complexos IMaceió, Suape e, posteriormente, Ouro Preto), as propostas do CNRC

questãocultural.

166

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

167

+

Y l

Se no final dos anos 70. entretanto,AloísioMagalhãesconseguira, com seu

bém ao atendimentodo que hoje se define como os "direitos culturais'. objetivo

discurso e suas articulações políticas, aglutinar os setores culturais recém reu-

que transcende os projetos particulares de construção e de legitimação de uma

nidos na SEC em torno de uma proposta e mobilizar o Executivo e o Congresso

nação. E a defesa desses valores universais que, em princípio,situa os interesses

Nacional para aprovar uma ampla reforma institucional, a iniciativa tomada em meados dos anos 80, em princípio mais legítima, porque apoiada por represen-

da preservaçãoacima e além dos governos e mesmo dos Estados. Essa concep-

tantes da sociedade civil, não encontrou a mesma receptividade. A ampliação da

ção estava presente para os "homens de cultura" que. na Revolução Francesa, criaram as Comissõesde Arte e dos Monumentos,pois consideravamque o valor

esfera de atuação do MinC proposta no documento, a tal ponto que levava a uma

dos bens produzidos pela nobreza e pelo clero transcendia sua identificação com

indiferenciação da área da cultura e

o Antigo Regime. Essa é também, guardadasas devidas diferenças,a inspiração

a uma "intromissão' no domínio de outros

ministérios, causou perplexidade entre os congressistas e mesmo junto a intelec-

tuais comprometidoscom a luta pela redemocratização.Esses temas foram consiX

l

l

». {:

A preservaçãode bens culturais pelo Estado é, portanto, uma prática política

derados estranhos, se não ao universo da cultura, pelo menos ao de uma política

eminentemente seletiva e, nesse sentido, cabe distingui-la da vertente da criação,

cultural. Resolvia-se,assim, uma ambigüidade - no sentido da definição política -

cujo pressupostoé a liberdade. No caso da preservação,é preciso lembrar que

mas produzia-se outra - na medida em que a prática cultural era nivelada a outras

o exercícioda liberdadena seloção dos bens a serem preservadose na produção

práticas sociais.

da justificativapara o seu tombamentodeve assentar em critérios explícitose que

O fato é que, desde o advento da Nova República, e mesmo durante a gestão

encontrem um razoável grau de consenso junto à sociedade. Na fase heróica do

de um intelectual unanimemente respeitado como Celso Furtado, a política cultural

Sphan eram principalmenteo valor artístico do bem, e, secundariamente, seu valor

do MinC sem dúvida passou a perder o que chegara a conquistar nos anos anterio-

de testemunho, que justificavam os tombamentos. A interpretação desses valores

res em termos de espaço no âmbito do governo federal e de visibilidadejunto à

se dava dentro dos limites conceituais e das condições políticas vigentos, e era

sociedade.

legitimada pela autoridade de quem os atribuía. Embora, como procurei apontar

Creio que uma das chaves para se compreenderessa situação, e para se

IH

da noção de Patrlmânio Cultural da Humanidade, implementadapela Unesco.

no capítulo 3, essas interpretações não tonham ficado imutáveis durante trinta

refletir sobre a especificidade da política de preservação nesse período, pode ser

anos, esses valores se mantiveramcomo os pilares da atividade de preservação.

encontradano trecho abaixo, de Gabriel Cohn, comentandoa década de 1970:

E, procurando fugir a uma identificação com o nacionalismo vigente, os intelec-

tuais do Sphan se definiam como defensores de uma "consciência nacional"." Assim, mudanças reais podem ser detectadas ao longo da década. Da subordinação do processo cultural a outros(o autor refere-se à 'segurança nacional', MCLF) passa-

A partir dos anos 70. vários fatores contribuíram,no Brasil e no exterior, para

se para a consideração da sua dimensão social, e chega-se à idéia de que. para fazer

uma mudançasensível nas políticas de preservação.Em primeiro lugar, as disci-

frente à sua dimensão propriamente cultural. cumpre considerar a política cultural naquilo

plinas - sobretudo a história e, consequentemente, a história da arte - que funda-

que na maior parte da década de 70 era inexeqüível:precisamentea sua dimensão

mentavam a seleção dos bens excepcionais que mereciam ser preservados, pas-

política.(1984,p. 96)

saram por uma mudançade orientação,não só em termos de objeto como também

As políticas de preservação do património histórico e artístico têm sido, histó-

de perspectiva. Em segundo lugar, a essa mudança no campo do saber corres-

rica e tradicionalmente, implementadas pelos estados nacionais, visando explicita-

pondeua difusãoda democraciacomo valor em outros campos- sexo, etnia etc. -

mente à construção de uma "identidade nacional". Mobilizam, porém, outros atoros

que não apenas o do exercício da cidadania política. Afirmavam-se os direitos das

que não exclusivamente os agentes do Estado, e outros valores que não apenas

identidades coletivas particulares, sobrepondo-se à idéia, dominante no século

o de nacionalidade. A dimensão universal dos valores culturais que se pretende

XIX e primeira metade do século XX. de uma identidade nacional. Em certos

preservar é uma das justificativas sobre as quais assenta a noção de /nferesse

casos, propunha-senão só a construçãodos patrimóniosdas minorias até então

púl)//co.Invocada para legitimar o ónus da preservaçãode bens, para o Estado

excluídas da representação da nação, como também se reivindicava a participação

e para os interesses particulares dos cidadãos. Esses bens se destinariam tam-

dos múltiplos segmentosda sodedade na gestão do patrimónionacional.Em ter-

168

O PÂTRIÁON

IO [A

PROCESSO

169

Y o processo de descolonização e a criação de novos Estados-nações. sobretudo no continente africano, como também a luta dos negros pelos direitos

danças foram motivadas pela necessidade de modernizar sua gestão, seja pelo

civis nos Estados Unidos, levou a novas equações de poder, que não se resumiam

recurso à consultoria internacional e a instrumentos mais sofisticados de trabalho.

aos parâmetros do modelo marxista, considerado eurocêntrico. A dominação eco-

como a informática,seja pela descentralizaçãoe criação de órgãos locais.

ceira lugar,

nómica se acrescentou a consciência da dominação cultural sobre os povos colonizados. O conceito de civilização - construído sobre a experiência histórica do Ocidente - perdeu o seu caráter universal e foi reinterpretado como Instrumento de dominação da etnia européia branca. O marxismo foi considerado insuficiente para a denúncia dessa realidade, e passou a ser objeto de releituras críticas que se propunham como atualizações, inclusive no sentido de rediscutir o lugar da cul-

tura no jogo po]ítico(cf. Ne]son& Grossbergjed.], 1988). K

l l

No campo político, a questão dos direitos humanos, formulada inicialmente pelos iluministas, foi reelaborada, e o grande desafio nesse sentido passou a ser o de articular o universal e o particular. A própria noção de estado nacional, que predominará no cenário político mundial até meados doste século (cf. Hobsbawm.

Como vimos, no campo específico da política de património, as primeiras mu-

A criação do CNRC partiu de agentes modernos, mas que. ideologicamente, se situavam à margem do modelo de desenvolvimento que predominava na primeira metade dos anos 70, dependente do capital internacional. Eram um repre-

sentante da burguesia industrial nacional (Severo Games), um bacharel pernambucano que reorientara sua trajetória para as artes plásticas e o design (Aloísio

Magalhães),e um diplomata de larga vivência no exterior mas voltado também para os problemas da educação e da cultura nacionais (Vladimir Murtinho). A esse grupo se Juntaramprofessores, a maioria deles recrutada na Universidade de Bra-

sília e nem semprena área de ciências humanas. O que quero dizer é que o trabalho desenvolvidopelo CNRC, em seus primór-

1990), ficou comprimida entre o poder dos conglomerados multinacionais e o das

dios, se caracterizava por considerável independência, tanto da administração

organizaçõespolíticas locais. A via da cultura passou a constituir, nos anos 70

pública quanto dos meios universitários hegemónicas. Essa distância não deixava

e 80, um caminho privilegiado para a elaboração de novas idontidadescolotivas

de ser proposltal: por querer elaborar uma visão nova da cultura brasileira, o grupo

e um instrumento fundamental para os grupos sociais que as constroem, e que,

do CNRC recusava, por princípio, os modelos explicativos já prontos, as teorias

muito freqtlentemente, contestam a legitimidade dos patrimónios históricos e artís-

científicas consagradas. Uma das premissas da metodologia do CNRC era que os

ticos nacionais. Essa nova orientaçãofoi buscar apoio em uma ciência até então

componentes da cultura brasileira que se buscava apreender "se explicitarão de

voltada sobretudo para o estudo das sociedades primitivas: a antropologia. No Brasil, as mudanças no campo da política de preservaçãoadquiriram um

modo espontâneo' (Relatório Técnico Re 1), o que era altamente problemático do

ponto de vista dos parâmetros universitários de um trabalho científico.

sentido político particular, em função do momento histórico que o país atravessava

Apresentado ao prometodo CNRC, o professor David G. Hays, da Universidade

e da trajetória específica dessa política. Aqui não houve propriamente um es-

Estadual de Nova York, em Buffalo, EUA, afirmava, em 1975, que "o Centro Nacio-

gotamento dos valores da modernidade e da civilização industrial. como nos países

nal de Referência Cultural, proposto para Brasília, é único no mundo" (Relatório

desenvolvidosdo Norte, e sim uma profunda crise política. económica e social que.

Técnico Ra2, p. 1). 0 que significa que o CNRC não foi criado apenas à margem

como observa Carlos Alberto Messeder Pereira (1981), resultou na crítica ao poder

da tecnologia, aos projetosde desenvolvimento faraónicos, e às metanarrativas que se propunham de amplo poder explicativo. Segundo esse autor. os anos 70 são marcados pelo "antitecnicismo', poça "politização

do quotidiano" e pelo "antilnte-

lectualismo'. As distinções entre arcaico e moderno, criatividade e técnica. popular e erudito, são redimensionadas e, em alguns casos, diluídas. Manifestações como o tropicalismo, a poesia de mimeógrafo, as associaçõescomunitárias e as organi-

zações não-governamentais,voltadas sobretudo para a questão ecológica, são manifestações, no Brasil, do questionamento geral dos valores da modernidade.

170

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

da burocracia estatal e da universidades significa, mais ainda, que conceptual e

metodologicamente.o CNRC partia como que de um marco zero, como um ato inauguralsobre terreno virgem, tal como ocorreu. na visão de Lúcio Costa, com a criação de Brasília. Tudo se propunha como novo: o objeto (as referências),a metodologia (partir de projetos-piloto sem um quadro teórico pré-definido), e a instituição(convênio

multiinstitucional).

No prometo do CNRC, pode-sedizer que a tecnologiaera domada,posta a ser-

viço da revitalizaçãoda cultura brasileirae do conhecimentode seus aspectos

h \&S\ AOD[RNÁ

171

r menos estudados e consagrados. Em um momento de crise do modelo económico

exclusivamente às classes política e economicamente mais poderosas. Esse acer-

implantado pelo regime autoritário e de desgaste da ideologia da "segurança

vo. que referia predominantementea cultura luso-brasileira e o colonizador. foi

nacional', não foi difícil, portanto, para Aloísio Magalhãesencontrar no governo

vinculado,no final dos anos 70, ao poder das classesdominantes,não só no

apoio para a continuidadede seu prometo. Esse prometo, contudo, em 1979, já se

passado. como também no presente. Por esse motivo. a atuação do lphan foi criti-

modificará.Novos temas haviam sido incluídos ao lado do interesse inicial pelas

cada pelos agentesdo CNRC e por pesquisado(esexternos,sobretudopor cientistas sociais. como elitista e desvinculadados interessesatuaís da sociedade bra-

técnicas de informação, pelas tecnologias patrimoniais e pelo papel da cultura nos proletos de desenvolvimento: a esses assuntos, técnicos que ingressaram no CNRC

sileira

a partir de 1977 e que haviam desenvolvidotrabalhosjunto a comunidadesca-

O problema é que essa crítica, até bastante procedente, pecava ao não distin-

rentes e/ou à margem da sociedade nacional'' acrescentaram os problemas da

guir os bens que haviam sido tombados - e que, enquanto património, não referiam

adequação da educação básica aos contextos culturais específicos e o do lugar

apenas os grupos dominantes - da leitura e do tratamento que o lphan havia dado

F

das etnias indígena e afro-brasileira na sociedade nacional. Temas que vão levar,

a esses bens, esses sim, frequentementedesvinculados dos valores de outros

K

no final dos anos 70 e início dos 80, a equipe do CNRC a lidar com os grupos

grupos sociais que não as elites intelectualizadas. Nesse sentido, o interesse da

sociais que participavam dos projetos não mais como meros produtores de cultura

preservaçãoaparecia como distante e até mesmo como contrário aos interesses

e objeto de pesquisa, ou apenas como informantes,e sim como atores cuja parti-

das classes populares. O fato é que o compromisso com a coletivização de uma

cipação era fundamental em termos da legitimidade política de sua atuação. Esse

cultura culta, objetivo tão caro a Mário de Andrade. não fora assumido pelo Sphan.

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l f'

era o modelo que justificava um prometoque, oriundo do CNRC, reunia diferentes instituições da SEC: o PrometoInteração da Educação Básica e dos Diferentes ContextosCulturais do País. Em meadosdos anos 80. como já vimos, a questão central não era mais a da relação entre cultura e desenvolvimento.e sim a relação

Além disso, é inegável que essa crítica era também expressão de uma luta

de poderdentroda instituiçãorecém-criada. E. em vez de se resolverno contato e no debate. esse conflito se radicalizou. provocando nos funcionários do lphan, receosos e refratários a mudanças, ressentimentos e, consequentemente. um enri-

entre cultura e cidadania. O início dessa mudança de orientação dos trabalhos do CNRC coincidiu com um momento de intensa reestruturação institucional na área cultural do MEC, em

que Aloísio Magalhãesfoi conquistandocada vez mais espaçoaté se tornar

jecimentoem suas posiçõese em seus mitos. A falta de Aloísio Magalhães, primeiro por estar absorvido pelos seus novos encargos como secretário da Cultura e, depois, devida ao seu falecimento, em

secretário da Cultura, em abril de 1981. Nesse sentido, a fusão com o lphan, que

junho de 1982. só fez intensificaressa situação, a que se acrescentaramoutros

- o princípio

fatores como a duplicação de funções, na Sphan e na FNpM, agravada com a

da autoridade nas decisões, um trabalho fundamentado em critérios rigorosos de

indicação, na segunda metade dos anos 80, de dirigentes distintos para cada insti-

autenticação, uma visão predominantemente estética do património - era tarefa

tuição (Aloísio Magalhães e Marcos Vilaça haviam acumulado a direção da Sphan

complexa.e não chegou a se concretizarpor vários motivos.

e a presidência da FNpM)l a sucessão de dirigentes na Sphan e na FNpM, muitas

mantivera até então os mesmos modelos de atuação dos anos 40

Em primeiro lugar, as duas instituições. apresentadas no discurso de Aloísio Magalhães como complementares, ía/avara a partir de experiências e de objetivos bastante diferentes, conforme já foi obsewado. Apesar disso. a impressão deixada

vezes com mandatos de curta duraçãol a manutenção de uma dupla administração.

no Rio de Janeiroe em Brasília,ficandoo grupo do CNRCafastadodos outros setores da FNpM, sediados no Rios a falta de recursos e. sobretudo, a falta de

pelo Seminário da Escola Superior de AdministraçãoFazendária, de 1979, nos

um programa de trabalho da instituição como um todo e do CNRC em particular,

funcionários das três instituições ali reunidas (lphan, PCH e CNRC) foi de entu-

que não conseguiu articular suas diferentes coordenações em torno de um prometo

siasmo ante a perspectiva de um trabalho conjunto.

comuml o desinteresse das direções da FNpM em divulgar os trabalhos da área

O problema é que a leitura que o CNRC fazia do que denominava património de pedra e ca/ tendia a ser negativa, associando o património tombado pelo lphan

172

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

de Referência da Dinâmica Cultural, que se mantiveram em um nível quase vege-

tativo, o que só aumentou

o isolamento da área, dentro e fora da instituição.

173

Y O papel de Aloísio Magalhães havia sido fundamental no período final do regi-

me militar- assimcomoo de RodrigoM. F. de Andrade, duranteo EstadoNovo-

Em seminário promovido pelo Idesp (Instituto de Estudos Económicos, Sociais

efeitos e influência transcenderam a fase do regime autoritário. Não creio que a

e Políticos de São Paulo) em setembro de 'r982, Mário Brockmann Machado fez

análise do prometoimplementado sob sua dlreção dê margem a reduzi-lo a um

o seguinte comentário:

maneira, ter servido também para esse fim. h

Já a politização desse prometo, tal como foi conduzida, sobretudo no âmbito

da Cultura do MEC. Foi o período de Aloísío Magalhães. e é de justiça que se destaque

da FNpM (tendência que não ocorreu no grupo de pedra e ca4, desvinculada de

o esforço então realizado de recuperação do conceito mais amplo de patrimónionacional

política de presewação. e sem ser articulada a um prometopolítico da instituição, permaneceu isolada dentro da instituição e do MinC. Essa situação se mantinha

l

em 1988, por ocasião da Assembléia Nacional Constituinte, quando a área de

IH

preservação da Sphan/FNpM encaminhou uma proposta da instituição e funcio-

nários vinculados ao CNRC atuaram vía Senalba.

originalmenteformulado por Mário de Andrade. No entanto. essa experiência inovadora teve curta duração, não sendo possível saber-se se tais tentativas deixarão o nível do discurso e passarão efetivamente a informar, de maneira permanente, a prática do tombamento de bens históricos e artísticos. (1984, p. 13)

Ao se observarretrospectivamente o período que acabei de analisar,fica claro que, emboratenha sido consideradoaté aqui como uma fase de uma trajetória,na reali-

dade a situaçãono final dos anos 80 era bem diferenteda do início dos anos 70.

Este balanço pode ser comprovadocom a leitura de um documentoproduzido (

pela administraçãoda FNpM. no final dos anos 80, conhecido como mf parlamentar. Nesse documento, dirigido aos congressistas com o objetivo de sensibiliza-lospara as necessidades orçamentárias dos órgãos federais de preservação, são arroladas as principais ações desenvolvidas pela FNpM na proteção do património cultural brasileiro e apresentadas as propostas para o exercício seguinte. A análise dessas ações e dessas propostas - essencialmente de preservação e de restauração de monumentos - vem demonstrar que a própria instituição, no final dos anos 80 não

11

E bem verdade que algumas medidas de renovação e areamento desse prometode política cultural foram ensaiadas, neste início da década de 80, no âmbito da Secretaria

uma reflexão crítica quanto aos objetivos e instrumentos específicos de uma

K

blemas específicos, como eram entendidos e operacionalizados.

no sentido de conferir à política cultural desse período uma marca própria. cujos

mero instrumento de legitimação da fase de abertura - ainda que possa, de alguma

P

e divulgação de trabalhose açõesque demonstrassem, na abordagem de pro-

se autocaracterizavade forma muito diferentedo Sphan dos anos 60. O fato é que. na prática, a síntese pretendida por Aloísio Magalhães não che-

gou a se concretizarrealmente. e as inevitáveis diferenças de orientaçãodos técnicos das três instituições fundidas, sobretudo entre os da referéncfa e os de pedra e ca/, não foram superadas em uma proposta de trabalho comum. A proposta do CNRC, apropriada e desenvolvida pela FNpM, encampada pela SEC e. em certa medida. inclusive pela Constituição Federal de 1988, ficou conhecida pratica-

mente apenas enquanto discurso. Conceitos como referência. dfnám/ca cu/fura/. Ind/dadores cu/rurais. confexfos cu/rurais especücos etc., embora tenham se tor-

Na década de 1970, as novas propostas de trabalho na área de preservação e, posteriormente,as reestruturaçõesinstitucionaisem âmbito federal, vieram atender a um interessede atualizaçãono sentido de ampliar o objeto, os instrumentos e as finalidadesde uma política de patrimónioconduzida pelo Estado. Esse movimento resultoude uma mobilizaçãode setores do governo federal em que tiveram parte ativa atores que não estavam plenamenteidentificadoscom a Ideologia do regime militar, mas que tinham um prometopara modernizaro Brasil. Como os intelectuais modernistasmencionados em Tempos de Capanema (1984). esses agentes tentaram contrabandear,através das instituições culturais do MEC, suas próprias concepções de modernidade.

A análise retrospectiva desse momento, em face da realidade do final dos anos 80, leva à conclusão de que, à diferençado Sphan dos anos 60-70, o que ocorreu na segunda metade dos anos 80 relativamenteao prometodo CNRC não foi o desgaste de uma propostaque se rotinizou:foram os efeitos de sua não implementaçãoefetiva. Propostaque, no entanto, não deixou de influenciara prática

de preservaçãojá sedimentadapelo lphan. E, como a linha de trabalhoda área

nado moeda corrente nos programas e projetos culturais produzidos durante a dé-

de Referência da Dinâmica Cultural ficou praticamente estagnada a partir de

cada de 1980, continuavam obscuros, mesmo dentro da FNpM. Faltou elabora-los.

meados da década de 1980, na realidade é através da análise das mudanças que

em termos de seu potencial cognitivo e de sua utilização, através da discussão

ocorreramna prática da Sphan que se poderãoaferir as transformaçõeseventual-

174

O PATRIAÕNIOÉA PROCESSO

175

9

mente provocadasna política federal de preservaçãopelas propostas elaboradas

Como era de seu feitio, Aloísio recorreua duas imagens- a do bodoquee a do cristal-

entre 1975 e 1981. Esse é o objetivo do próximocapítulo, onde será analisado

para ilustrar essa idéia: 'Pode-se mesmo dizer que a previsão ou a antevisão da trajetória de uma cultura é diretamente proporcional à amplitude e profundidade de recuo no tempo.

o aspecto mais central dessa prática: os tombamentos.

do conhecimentoe da consciência do passado histórico. Da mesma maneira como, analogicamente, uma pedra vai mais longe na medida em que a borracha do bodoque é

NOTAS

suficientementeforte e flexível para suportar uma grande tensão. diametralmente oposta ao

objetivo de sua direção. Pode-semesmo afirmar que, no processo de evolução de uma

Sobre a nova dinâmica Estado e sociedade diz Sérglo Costa: "No 'prometo'contemporâneo

cultura, nada existe propriamente de 'novo'. O 'novo' é apenas uma forma transformada do

de sociedade civil é básica a idéia de que esta (como em Gramscil se distingue das esferas

passado enriquecida na continuidade do processo ou novamente revelada,de um repertório

do Estadoe da economia,buscando-seevitar, a um só tempo, o liberalismo,no qual a

latente. Na verdade. os elementos são sempre os mesmosl apenas a visão pode ser

Integração social se concentra no mercado, e o estatismo, onde a sociedade civil aparece

enriquecida por novas incidências de luz nas diversas faces do mesmo cristal.' (Magalhães, 1985, P. 44-45)

subsumida ao Estado (como nos países socialistas).'(1994, p. 40-41) 2

Toda nação fraca e pobre só pode existir, só pode gerar algum movimento cultural, a partir

10

da descoberta de uma identidade nacional. O nacionalismo é o germe, é o fundamento do fortalecimento, do desabrochar de qualquer sociedade.' (em Pereira e Hollanda. 1980. p. 341

l

'Na imagem que me ocorre a vertente patrimoniallembra uma rotação ou um círculo de diâmetro muito amplo e rotação lenta. enquanto a ação cultural, na criação do bem cultural, é um círculo de diâmetro curto e de rotação muito rápida. Ambas essas rotações, ambos

IH

Por exemplo, no caso dos movimentos feministas, ficava difícil, no Brasil, utilizar a categoria

esses círculos trabalham interagindo um com o outro, mas têm os seus tempos e a sua

mu/her para se fazer referência. por exemplo, a problemas comuns a patroas e empregadas

l

domésticas, de tal maneira a construção da identidade de cada um desses lugares socfafs

dinâmica própria e específica.' IMagalhães, 1985, p. 33-1341 11

era afetada por diferenças económicas e culturais. (

Refiro-me aqui não propriamente a textos, mas a debates através da imprensa e a informações, que me foram transmitidas por Paulo Sérvio Pinheiro e Luís Felipe Perret Serpa.

!.

A análise dos debates sobre a questão da cultura na Assembléia Nacional Constituinte foi baseada em documentos obtidos junto ao Prodasen: as atas das reuniões das Subcomissões

sobre reuniões informais de Aloísio com intelectuaispaulistas. 12

e das Comissões Temáticas, as emendas populares e a relação de entidades convocadas

para serem apresentadas durante sua exposição na reunião da Unesco.

para as audiências públicas. 13

Em seu depoimento, Lígia Mastins Costa observou que, em 1952, ano de seu ingresso no

Em 1945, em parecer sobre a cidade histórica de São Jogo del-Rei, Afonso Arinos de Meio Franco, ardente opositor do Estado Novo e colaborador de primeira hora do Sphan, assim

Sphan, a instituição contava com apenas 104 funcionários em todo o Brasil, incluindo-se nesse

Nessa ocasião,Aloísio Magalhães produziu onze litografias retratando a paisagem de Olinda

se referia a esse serviço: "Não acredito que um brasileiro consciente ponha sequer em dúvi-

total agentes administrativos e mestres-de-obras.

da a singular contribuição que o Sphan, em poucos anos de existência. graças aos seus

Em 1976, Bárbara Freitag foi substituída pelo antropólogo Georges Zarur. também da UnB.

Ininterruptos trabalhos especializados, Inclusive suas publicações, vem prestando à nossa

e ingressou no CNRC a professora Clara de Andrade Alvim. vinda da PUC-Rio.

consciência nacional. Inteiramente insuspeito para falar, pois, desde 1937, nunca pactuei

É curiosoque a retomadadessa problemática- a discussãoda relação entre cultura e

com a ditadura e sempre a combati frontalmente, entendo que a criação do Sphan representa

grandeserviço prestado pelo infeliz Estado Novo ao nosso país.

modelos de desenvolvimento adequados às condições locais -, na segunda metade dos anos

80, pelos grupos ecológicose pelas políticas voltadaspara a questão do meio ambiente, tenha tido como um de seus principaiseventos propulsoreso EncontroNacionalde Serin-

14

Refiro-mea Luís Felipe Perret Serpa e José Silva Quintas. com formação em ciências exatas, mas com experiência em educação, e ao antropólogo Olímpio Serra.

gueiros. promovido com base em prometoque já vinha sendo desenvolvido na Área de Refe-

rência da Dinâmica Cultural da FNpM. 'Essa relação de tempo é curiosa porque é preciso entender o bem cultural num tempo multidimensional.A relação entre a interioridade do passado, a vivência do momento e a projeção que se deve introduzir é uma coisa só. É necessário transitar o tempo todo nessas

três faixas, porqueo bem cultural não se mede pelo tempo cronológico.' (Magalhães.

1985,p. 661

176

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

& \b\\

AaD[RNÁ

177

CAPITULO 5

A PRÁTICA Dll TOA\BAAlINTO:

1970-1990

As expressões 'Livros do Tombo" e "tombamento"provêm do Direito Português, onde a palavra "tombar" significa "inventariar. 'arrolar ou 'inscrever" nos arquivos do Reino, guardados na Torre

do Tombo' Hely Lopes Meirelles, D/re/fo admh/sfraffvo brasa/e/ro.

l E

r (

Se, nos anos 70-80. houve uma evidente ampliaçãoda conceituaçãode património, em termos dos instrumentos de presewação, no entanto, praticamente não.se recorreu,no Brasil. em nível federal, a formas alternativasàs do tradicional instituto do tombamento. Foram realizadas algumas experiências, como o trabalho

de preservaçãodo Morro da Concepção,pela Sphan jcf. Arnaut, 1984), e os inventários tecnológicos, pelo CNRC (cf. Maureau, 1984). Acham-se em curso trabalhos de inventário de bens móveis e de bens imóveis. A preservação dos monumentos arqueológicos e pré-históricos é, hoje. regulada por lei específica. Re3.924, de 26 de julho de 1961. A proteção dos bens culturais móveis, defasada em relação à proteção do património Imobiliário, cabe tradicionalmente aos museus (cf. Costa.

1987). Por iniciativa da museóloga Lígia Martins Costa, especialista em história da arte e crítica, foi elaborado o conceito de bens móveis integrados. particularmente importante para a consewação dos bens de arquitetura religiosa. Os acervos arquivísticos e bibliográficos, assim como o património natural. têm sido obje-

to de estudos visando a levar em conta a especificidade de sua proteção. O fato, porém. é que mesmo os projetos do CNRC acabaram, em vários casos, levando a propostas de tombamento. E embora os técnicos do CNRC, e posteriormente os da Sphan/FNpM, tenham elaborado textos e promovido debates sobre

o assunto,e o artigo216 da Constituição de 1988indiqueexplicitamente a busca

anteriores, agravou-se, a partir dos anãs 70, em consequência da tendência ao

de "outras formas de preservação e acautelamento'. a prática da Sphan em termos

tombamento de conjuntos e a uma preocupação maior com o entorno dos bens

de preservação continuou concentrada nos tombamentos. Por esse motivo. é basi-

tombados. Problemas graves, nesse sentido. ocorreram no tombamento da cidade

camente nos processos de tombamento abertos nesse período que se explicitam

de Antõnio Prado, Rio Grande do Sul. dos conjuntos das avenidas Nazareth e Go-

os critérios que orientaram a proteção a bens imóveis, núcleo do património cultural brasileiro.

vernador José Malcher. em Belém, Para, e do prédio da Light, do Hotel Copacabana Palace. do Parque Lage, e da Praça XV, no Rio de Janeiro, entre outros, todos envolvendo interesses contrariados de proprietários ou de empreiteiros.

5.1

l

IH f b

c. c.

A SIST[AÁTICA DOS PROCESSOS DE TOABM[NTO

No caso dos bens móveis, a situação é diferente. O reconhecimento de seu

Na atividade desenvolvida pelo Sphan desde 1937, o tombamento tem se cons-

valor cultural certamentevaloriza toda essa gama de bens no mercado de anti-

tituído no instrumento de preservação por excelência, a ponto de, conforme ob-

guidades. Nesse sentido, é particularmente frágil a situação dos acenos de bens

serva Sõnia Rabelo de Castro (1991, p. 5), confundir-setombamentocom preser-

sacros das igrejas tombadas, objeto de furtos freqüentes. e que, devido à dificul-

vação. Atualmente, além de instrumentojurídico com implicações económicase

dade de controle do comércio de objetos antigos, dificilmente são recuperados.

sociais, o tombamento tem sido considerado e utilizado, tanto por agentes oficiais

Em função, portanto. da natureza conflitante dos interesses em jogo no caso

quanto por grupos sociais, como o rito, por excelência. de consagração do valor

da proteção aos bens imóveis, e do peso dos monumentos no património histórico

culturalde um bem.

e artístico nacional, os processos de tombamento constituem espaços de expres-

O tombamento tem sido apropriado pela sociedade brasileira de forma dife-

renciada e. nesse sentido. pode ser consideradode forma positiva ou negativa.

são desses confrontos, onde se podem captar as várias vozes envolvidas na questão da preservação e sua influência na condução dos processos.

Ter um bem de sua cultura tombado pode significar, para grupos económica e so-

Nesse sentido. consideraremo instituto do tombamento não tanto no seu as-

cialmente desfavorecidos, benefícios de ordem material e simbólica. além de de-

pecto jurídico ou técnico, mas enquanto a prática mais significativa da política de

monstração de poder político. Os tombamentos de bens representativos da pre-

preservaçãofederal no Brasil. Significativa, não só pelo poder de delimitar um uni-

sença negra no Brasil - o Terreiro da Casa Branca, em Salvador. e a Serra da

verso simbólico específico. como também por intervir no estatuto da propriedade

Barriga. em Alagoas - foram conduzidos por grupos vinculados aos movimentos

e no uso do espaço físico. E significativa,sobretudo. porque constitui um campo

negros como verdadeiraslutas políticas. No caso da Casa Branca, inclusive,tra-

em que se explicitam- e onde se podem apreender- os sentidos da preservação

tava-se de evitar o despejo do terreiro de candomblé do local onde funcionava

para os diferentes atores sociais envolvidos. Interessa-me. portanto, analisar essa

desde meados do século passado. Quanto às cidades históricas, o tombamento,

prática em suas implicaçõesna vida social, ou seja: o uso que dela fazem os

ao assegurar a manutençãode sua feição tradicional, pode significar uma alter-

agentes oficiaisl o modo como dela se apropriam os que a solicitaml as reações

nativa economicamente lucrativa para a população, através do turismo, como vem

daqueles que são afetados por sua aplicação ou pelo não atendimento desse tipo

ocorrendo com Tiradentes. em Minas Gerais. Já em centros históricos degrada-

de solicitação. Nesse último caso, me limitaremàs Jnanifestações incorporadas aos

dos, como era o caso do Pelourinho, sua restauração implicou um remanejamento e eventual saída dos moradores de menor renda.

processos, embora tenha consciência de que são apenas as que ocorreram no período entre o pedido de tombamento

e sua resolução.

Por outro lado, dadas as restrições que o tombamentoimpõe ao bem con-

A escolha dos processos de tombamento em depósito no Arquivo Central do

siderado enquanto mercadoria, e os limites que acarreta ao uso do imóvel, esse

atual Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional. no Rio de Janeiro.

instrumento costuma ter consequências consideradas indesejáveis para extratos

como material de pesquisa,foi feita em função dessas razões. Bastante rápidos

das classes média e alta, como proprietários de imóveis em setores urbanos anti-

e sucintosnos primórdiosdo Sphan- até por razõesestratégicas -, a partirda

gos e empresários da construção civil.' Essa situação, já comum nas décadas

década de 1960 esses processos passaram a ser formados segundo uma certa

180

O PATRIAON10 EA PROCESSO

A PRATICA Dt TOABÂ#llINTO: 1970.1990

181

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!. h

11 l

11

t C

C

Sistemática,constituindo-se em verdadeiros dossiês, a que são anexados não

muitas vezes com implicaçõesjurídicas, económicas e políticas: os critérios de

apenas os documentos oficiais (pedido de tombamento, notificação ao proprietário.

atribuição de valor artístico e de valor histórico, de valor excepcional e de valor

pareceres, atam do Conselho Consultivo, eventuais impugnações e contra-razões

nacionall a questão dos Programas Novos e dos bens identificados com a cultura

etc.l como todo material que diga respeito ao processo (recortes de jornais e revistas, cartas. abaixo-assinados,informaçõesextraídas de livros e folhetos, fotos.

popular e os diferentes grupos étnicosl as noções de conjunto urbano e de cidade

plantas, desenhos etc.). Dado o seu formato - todos os documentos são organizados em ordem cronológica- esses dossiês nos permitem acompanhara his-

maior da especificidade e dos limites do instituto do tombamento, assim como da

tória desse processo de ressemantizaçãode um bem que constitui um processo de tombamento,e entender não só o seu desfechocomo, considerandoo universo dos processos. os critérios que nortearam a prática de preservação no período 70-80.2

históricasa questão do entorno dos bens tombados, além, é claro, da questão legitimidadeda Sphan para decidir, sozinha, sobre a questão. 5.1.1 A origem dos pedidos

Se, nas décadasanteriores à de 1970, a grande maioria das solicitaçõesde tombamentotinha origem na própria instituiçãofederal, a partir desse momentohá

Desse ponto de vista, os processos arquivados são tão importantes para a

um aumento significativo de solicitações externas à Sphan. Entre os 95 processos

pesquisa quanto os processos que resultaram em tombamento. Ficaram excluídos.

arquivados,até 1969, a maior parte foi aberta por iniciativa de representanteda

enquantoobjeto de análise, os processosainda em estudo, uma vez que não se

Sphan. Já entre os 89 processos arquivados, entre 1970 e março de 1990,' apenas

tem uma resolução.em termos de atribuiçãode valor, por parte da instituição,no

onze solicitaçõespartiram da instituiçãofoderal (13%). De acordo com o levanta-

que diz respeito àqueles bens. Mas. graças a um estudo realizado pelo Departa-

mentofeito pelo Departamentode Proteção(Deprot), entre os processosem estu-

mento de Proteção, em 1992, sobre um conjunto de processosem estudo,' e a

do também aumentou consideravelmente, nas duas últimas décadas, o número do

um levantamentoque fiz no arquivo, foi possível extrair também desse conjunto

processosabertos por solicitação externa à instituição. Entre os processos que

alguns dados significativos.

resultaramem tombamento.as solicitações partindo da instituição correspondem

De la de janeiro de 1970 a 14 de março de 1990 foram abertos 481 processos

de tombamento(ver Anexo VI). Desse total. 135 resultaram em tombamento,74

a pouco mais da metade.' Esses dados levam a supor que, sem dúvida, houve um aumento na partici-

foram arquivados,e 272 achavam-seem fase de estudos.' Uma primeiraconclusão

pação da sociedadecivil na política de preservaçãofederal no períodoem questão.

evidente a partir da análise desses dados é quanto à dificuldade da instituição em

Entretanto, quando comparamos o conjunto dos processos que resultaram em tom-

dar andamentoaos processos, que permanecem,às vezes, décadas sem reso-

bamento aos outros dois conjuntos (processosarquivados e processos em estu-

lução. Essa situação foi agravadaa partir de março de 1990, quando ocorreu, no

do), verificamosque o fato de o pedido parir de agente institucionalconstituifator

início do governo Collor, a paralisaçãodas atividades da Sphan em decorrência da reforma administrativa e da dissolução do Conselho Consultivo, reconduzido

favorávelao tombamento,o que pode ser atribuído a duas causas: seja que esse

em maio de 1992.s Não é difícil imaginar as conseqilências dessa morosidade.

dos bens passíveisde tombamento,seja que, por estar ciente e envolvidono pro-

sobretudoquando se trata de pedido de agente externo à instituição.e num mo-

cesso - que, em princípio, é do interesse da instituição - contribui para seu andamento.

mento em que a Sphan/FNpM propunha a participação da comunidade como pedra de toque de sua política de preservação.

agente ostá mais familiarizado com os critérios técnicos que orientam a seleção

Mas é evidenteque o interesse na presewação de bens culturais deixou de ser quase que exclusivo dos funcionários da Sphan, conforme ocorria nas décadas

Na análise dos processos foram levantados os seguintes dados: solicitante,

anteriores. Assembléias legislativas e prefeituras, por iniciativa pessoal de con-

data do pedido, justificativa da solicitação.avaliação técnica e jurídica, resolução

gressistas e prefeitos ou enquanto intermediárias de grupos locais, encaminharam

do pedido. A partir da análise desses dados, foram detectadosos principaispon-

vários pedidos,do mesmo modo que instituiçõesculturais. São. inclusive, inúme-

tos que, nesse período, constituíram objeto de discussão e/ou de reconceltuação,

ros os pedidos de tombamentode prédios históricos por parte dos diretorese/ou

182

O PATRIAONIO

[A PROCESSO

A PRÁTICA Dll TOABÁAeNTO: 1970-1990

183

Y

E /

funcionários das instituições que neles funcionam (Escola de EnfermagemAna

do ideário da preservação,como meio para conseguir, junto ao governo federal.

Neri, no Rio de Janeirol Faculdadede Direito do RecifesHospital São Francisco

recursos para a solução de problemas urbanos locais. sobretudo em função da

de Assim,ObservatórioNacional, Colégio Pedra 11,Fundação Osvaldo Cruz, ABI.

carga simbólica da idéia de património. no sentido do reforço às identidadeslo-

todos na cidade do Rio de Janeirol antiga sede do DepartamentoNacionalde

cais.o Essa apropriação possivelmente foi um-dos efeitos do novo discurso sobre

Obras contra a Seca (Dnocs) em Fortaleza etc.). Entre os particulares,os pedi-

o património, produzido e difundido pela FNpM. .Entretanto, em que medida esses

dos costumam partir ou de proprietários ou de pessoas de algum modo familiari-

pedidos implicavam o envolvimento das comunidades locais, conforme se pro-

zadas com a questão da preservação- arquitetos,artistas, historiadores,intelec-

punha nas D/refrizes,só estudos de caso. com dados fornecidos pelas agências

tuais em geral. São ainda raros, nesse período, os casos de grupos que se mo-

locais, que têm condições de acompanhar as reações dos diferentes setores das

bilizam especificamente para essa finalidade, ou de associações formadas em

populaçõeslocais a esses pedidos de tombamento, poderiam elucidar.

\

b

função de uma demanda patrimonial. O zoom de associações que ocorreu no

Do mesmo modo, apenas esses estudos permitiriam avaliar os resultados da

Brasil a partir da segunda metade da década de 1970 ainda não chegou ao patri-

propostafeita pela FNpM, nesse período,no sentido da democratizaçãoda política de preservação.Na verdade, a estratégia da instituição se concentrou na elabo-

monio.8

l

Entretanto,casos como os das igrejas de Santana, no Ceará, e a de Pau do

11

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P

t c.,f

Alferes, no Rio de Janeiro, e do conjunto de casas na Praça Coronel Pedro Osório, em Pelotas, Rio Grande do Sul, em que a populaçãolocal se mobiliza para pedir o tombamento,sensibilizaramos técnicos da Sphan, que levaram esse fato em consideração na indicação para tombamento. Pedidos como o da Serra da Barriga, em Alagoas,com mais do mil asslnaturaslo do Terreiro da Casa Branca. em Salvador, apoiado por representantes de instituições culturais e acadêmicas. por representantes do movimento negro e por grupos locaisl o da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, em Rondânia, encaminhado ao então lphan por ex-ferroviários

como forma de sustar a venda das peças da ferrovlal e o do Hotel Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, apoiado por várias associações de moradores da cida-

de, demonstramuma possibilidadede organizaçãoda sociedadepara esse tipo

ração de um discurso, amplamentedifundido,em que a comunidadeera incluída não apenas como objeto ou população-alvo,mas também como sujeito chamado a participar junto com os agentes institucionais. O lema desse discurso era "a comunidadeé a melhor guardiã de seu património'.'' Na prática dos trabalhos de preservação, porém, tanto nos mecanismos de se-

leção de bens para tombamentoquanto, com mais motivos, nas obras, os procedimentos adotadoscontinuaram os mesmos das décadas anteriores: a avaliação técnica dos pedidos de tombamentosendo feita pelos setores técnicos da Administração Central da Sphan, que. inclusive. até 1988, indicavam os processos para

arquivamentoe o julgamento final feito pelo Conselho Consultivo, que, na quase totalidadedos casos. acompanhavao parecer dos técnicos da Sphan. Pelo que foi possível verificar nos processos, a participação das Delegadas Regionaisda

Sphan/FNpMera restrita aos pareceres.

de moção, mas constituem exceções no conjunto de processos abertos no período.

Da mesma forma, mas em sentido contrário, o pedido de tombamentoda cidade de Antõnio Prado, no Rio Grandedo Sul, pela 10: DR da Sphan, encontrouresistência tenaz da populaçãolocal. que se organizou para impugnaro tombamento. Nesse caso, foi o trabalho de esclarecimento quanto às vantagens do tombamento.

feito pela Sphanjunto aos habitantesda cidade, que conseguiurevertera situação. E preciso, porém, qualificar a natureza da mudança indicada por esses dados.

Na verdade,o interesse que move os pedidos varia. caso a caso. A grande incidência de solicitações encaminhadas por assembléias e prefeituras faz supor que, dadas as características da representação política no Brasil. até meados da déca-

da de 1980,o que ocorreufoi uma apropriaçãopor parte dessesatires políticos

184

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

E possível, portanto, qualificar a participação da sociedade nos tombamentos. a partir da análise dos processos: se. por um lado, os pedidos de tombamento

deixaram de ser iniciativa quase que exclusiva da instituição, os mecanismosde decisão continuaramrestritos aos órgãos técnicos da administraçãocentral e, salvo casos excepcionais,não foi possível detectar muitos casos de mobilizaçãode setores da sociedade no sentido de pressionar a Sphan na prática da preservação. Pode-se argumentar que. em se tratando de tombamentos em nível federal, ou

seja, de definir valores nacionais e não locais, a participação popular nos processos decisórios é bem mais complexa: criar mecanismosinstitucionaisem que a sociedadeesteja representadapoderia converter a seleção de bens para integrarem o patrimónionuma decisão mais política que técnica. Entretanto,essa tem

A PRÁTICA DE TOÁBAIK[NTO: 1970-1990

185

Y sido a alternativaconsideradamais eficiente, mesmo por países de tradição cen-

e do Hospital São Francisco de Assim, também no Rio de Janeiro, que foram tom-

tralizadora,como a França, onde, desde 1984, funcionamas ComissõesRegionais

bados. Cabe lembrar o polêmico caso do tombamento da Casa Modernista. em

do Património Histórico, Artístico, Arqueológico e Etnológico (Corephaae) IMesnard.

São Paulo, que abriu um perigoso precedente com a vitória dos proprietários, na

1990,p. 430)l em Portugal,onde, a partir da lei n' 2.032, de ll de junho de 1946.

justiça estadual, quanto ao pagamento de indenização por perdas de danos. Nesse

as câmaras municipais podem promover, junto às entidades competentes, a classifi-

cação de bens existentes em seus concelhos como "valores concelhios' (IPPAR, 1993, p. xx)l na Espanha, em decorrênciada situação das comunidadesautóno-

!.

mas, que gozam de muito mais independênciaem relação ao poder central que os estados brasileiros. o poder local tem participação decisiva na construção do

11 l

património nacional etc.l para não falar em países como a Grã-Bretanha e os Esta-

dos Unidos. onde entidades não-governamentais,como os National Trusts. têm significativa participação nas atividades de preservação, ou do Canadá onde, desde 1951. integram a Comissão dos Lugares e Monumentos Históricos do Canadá

IH P

caso, o tombamentopelo Conselho de Defesa do Património Histórico, Artístico,

Arqueológicoe Turísticodo Estado de São Paulo (Condephaat)foi feito quando os herdeiros de Warchavchick já haviam acertado a venda do imóvel com uma

construtora e, inclusive, recebido um sinal do pagamento. Como o negócio fai desfeito em conseqtlência do tombamento, os herdeiros tiveram que devolver. corrigida e com multa, a quantia recebida. Esse fato provocou discussão e críticas na imprensa às políticas de tombamento, não só nos estados, como também em nível federal - embora. no caso, a população do bairro de Vila Mariana tenha se

mobilizadoe mesmo se organizado para impedir a destruição do imóvel.'l

representantesde todas as provínciase territórios.No Brasil, essa questão conti-

As justificativas produzidas por agentes externos à instituição costumam en-

nua em aberto, e pouco se avançou na sua discussão(d. Falcão, 19841Bosi. 1987).

fatizar o valor histórico do bem, apoiando-se, muitas vezes, em pesquisas de documentos e bibliografia. A aferição do valor artístico do bem - pelo menos dentro

5.1.2]us+ifica+ivas,

de critérios mais rigorosos - não só é menos accessível a esses requerentes

pareceres e impugnações

Nesse período, os pedidos de tombamento vêm, necessariamente,acompanhados pelos argumentos que os fundamentam. Muitas vezes. é possível distinguir o

como não é o valor que predomina nas solicitações de tombamento. As justificativas dos pedidos de tombamento costumam se apoiar na letra do

interesse mais imediato do pedido (impedir uma demolição, desejo de dar deter-

decreto-leiRo25, de 30.11.37,a que nas décadasde 1970 e 1980se incorporaram

minado uso ao Imóvel, como museu, casa de cultura etc.l meio de conseguirverba

outros argumentos,como o potencial turístico do bem, seu valor afetivo para a

para restauraçãol mero desejo de garantir a preservação do bem por seu valor afe-

comunidade, a falta de órgão- local de preservação etc. Os pareceres técnicos

tivo para a comunidade local etc.) da justificativa, que seria a afirmação do valor

avaliam essas justificativas em termos do interesse, do ponto de vista da insti-

cultural do bem enquanto património nacional. Essa justificativa, que consiste basi-

tuição, em preservar aquele bem o, quando é o caso, discutem os termos das

camentena afirmaçãode valor artístico.de valor histórico. da excepcionalidade do

impugnações aos tombamentos.

bem ou de sua importânciaem termos nacionais. costuma ser formulada de um mo-

Nesse período, vinte dos 135 bens tombados o foram compulsoriamento, con-

do que revela, por parte dos requerentes- no caso, refiro-me aos externos à institui-

tra 53 entre os 803 tombamentos efetuados no período anterior.': Praticamente

ção - algum conhecimento do cód©o da Sphan, pois em geral se pode reconhecer

todas as impugnações foram derrotadas no Conselho Consultivo, mantendo-se.

na justificativa dos pedidos a linguagem do discurso oficial.

assim, a mesma conduta da fase hera/ca. O aumento proporcional do número de

Como frequentemente é a ameaça de perda que motiva os pedidos de tom-

bamento- e não uma seleçãofeita na base de um inventárioprévio-, muitas vezes o pedido é feito em um momento quando outros interesses, contrários à preservação do bem, já estão em jogo. Foi o caso, por exemplo. das residências das

tombamentos compulsórios no período após 1970, que, aparentemente, indica

maior resistênciaem relaçãoao tombamentoe a suas conseqüênciassobre a posse e o uso de um bem Imãs que. suponho, decorro, sobretudo. do modo como são conduzidos, nas últimas décadas. os processos de tombamento, dentro de

embaixadas da ltália e da Argentina, e da Casa do Duque de Caxias. ex-Palácio

uma sistemática mais definida), levou à discussão e à elaboração, por parte de

Ducal. no Rio de Janeiro, que foram destruídas, e do Hotel Copacabana Palace

técnicos e assessores jurídicos da Sphan, das questões suscitadas pelas impug-

186

O PATRIÁÕNIO

EA

PROCESSO

A PRATICA DE TOABAAlINTO: 1970-1990

18 7

nações, gerando assim uma jurisprudência sobre as novos problemas que se

modernistas,a semelhança de sua arquitetura com a colonial não era de aparência

apresentaramà atividadeda instituição.

ou de efeito, como ocorria com as construções neocoloniais, e sim de estrutura.

Esses problemas remetem à redefinição de valores - valor histórico, valor artístico,valor excepcional,valor nacional - e de conceitos - como o de centro

derna desenvolvidana Europa, na primeira metade do século, como já foi dito no

histórico e de entorno. A própria competência exclusiva da Sphan de atribuir valor

capítulo 3, não se reproduziu no Brasil da mesma maneira. Aqui, os arquitetos

a bens enquanto patrimóniohistóricoe artístico nacional se tornou também objeto

modernistas,douó/és de funcionários públicos, procuraram estabelecor um sen-

ll

de discussão e de reflexão. Esses temas foram levados às reuniões do Conselho

h'

Consultivo,órgão que foi assumindo,progressivamente, mais atribuições.

b.

[.}

F[.)

que, no estilo eclético. o funcional e o decorativo estavam dissociados,o que fez 5.2.1 As concepções de valor histórico e

11 11:

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c.

de valor artístico

com que considerassemesse estilo, assim como o neocolonial,"não-arquitetura'.

Em relação ao va/or adéfico dos bens patrimoniais,as principais mudanças

Do ponto de vista ideológico,as construçõesem estilo eclético eram consideradas

se deram em dois sentidos: primeiro,através da inclusão no patrimóniode estilos recentes, considerados, até então, pelos critérios da casa, como não-artísticosl

transposições acríticas de influências européias, modlsmo das elites que aqui

segundo,atravésda ampliaçãodo que é consideradoobra de valor artístico.

Brasil, embora fortemente influenciadapelo suíço Le Corbusier. procurara,desde

A atribuição de valor artístico a estilos estéticos e arquitetânicos recentes é um fato característico do processo de constituição dos patrimónios históricos e

o início, afirmar seu caráter de arquitetura nacional,explicitando,de um lado, sua

artísticosnacionais.a partir da década de 1960. Até então, considerava-senecessário observarum recuo históricomínimo para a inclusãode bens nos patrimónios-

monstrando sua vinculação com a tradição construtiva luso-brasileira.'3 Por esses

recuo esse que, em geral, se situava em meados do século XIX.

Ideário, que se prestava à afirmação da nacionalidade tanto na construção de

No caso brasileiro,porém,essa não era a principalrestrição.Já em 1947, o Sphantombara a Igreja de São Francisco,na Pampulha,e em 1948, o prédio do MEC, ambos recém-construídose ambos por seu valor artístico. Por outro lado. a seleção de bens imóveis para tombamento estava subordinada a uma concepção

bastante restritivade valor artístico, em função de uma visão normativa da arqui-

l

nados preceitos estéticos, os da l)oa arqu/fefura. A arquitetura moderna no Brasil

ideológico. Do ponto de vista estético, os arquitetos modernistas consideravam

l #.

tido de continuidadee construir uma tradição brasileira com base em determirompia com a das belas-artes,de origem francesa, em dois sentidos, estético e

5.2 0S PRINCIPAISPROüleAAS

qk-'H

A ruptura com o passado. com a tradição, que caracterizou a arquitetura mo-

tentavam reproduzir o Velho Mundo. Já a arquitetura modernista desenvolvida no

adequação ao clima e às condições económicas e sociais locais. e, de outro, de-

motivos, o Estado pede, nos anos 30, encampar sem maiores dificuldades esse

símbolosdo presente(o prédio do MEC) quanto na preservaçãodos marcos do passado (o trabalho do Sphan). Não foi difícil para os arquitetos do Sphan a inclusãoentre os bens tombados

de construçõesem estilo a/f-nouveau,por seu valor artístico.Nesseestilo, conforme palavrasde Giulio CarãoArgan, "a decoraçãotambém se torna tensão, elas-

tetura, que Lúcio Costa assim sintetizou:

ticidade. expressãosimbólica de uma funcionalidade cujo dinamismoé uma

A boa arquiteturade um determinadoperíodovai sempre bem com a arquitetura

característicado mundo moderno' (1992b, p. 90).

de qualquer período anterior - o que não combina com coisa alguma é a falta de

Ainda na década de 1960, Lúcio Costa propusera o tombamento do prédio onde

arquitetura. (IBPC - Boletim Ra 22, 27.2.921

funcionava.no Centro do Rio de Janeiro, a tradicional loja de artigos masculinos Esse princípio levou a uma leitura da arquitoturabrasileiraque via afinidades estruturaisentre as construçõescoloniais e as modernistas,numa linha de continuidade que remontava à Antiguidade greco-romana. Recursos construtivos colo-

niais, como as construções sobre estacas, as treliças, e o pau-a-pique, eram associadosaos pllotis, aos brlse-solel/se ao concreto armado. Para os arquitetos

188

O PATRIAONIOeA

PROCESSO

A Torre Eiffel, em estilo arf-nouveau.O imóvel ia ser demolidoem função de sua venda pelos proprietários:os comercianteseram locatários,e teriam que deixar o local. O tombamento não foi efetivado devido à argumentação dos advogados dos

proprietários,de que a motivação do pedido era proteger o uso do imóvel, en-

A PRATICA Dt TOABAAENTO: 1970-1990

189

T quanto estabelecimento comercial, e não sua arquitetura. O processo foi arqui-

De um lado, Lígia Martins Costa, então chefe da Seção de Artes da DET, em cujo

vado, o prédio demolido, mas várias peças da edificação foram cedidas ao Sphan."

apoio veio posteriormente Lúcio Costa, já aposentado, considerava que faltava

Em 1970, Lúcio Costa pediu o tombamento de uma casa em estilo a/t-nouveau, do arquiteto Virzi, na Praia do Russel. Rio de Janeiro (Proa. 825-T-70). Esse foi

l q'

b.«

l

Santos, membro do Conselho Consultivo e relator do processo, que defendia o

Paulo Santos. existem pouquíssimos exemplares autênticos no Brasil.

tombamentodo conjunto por seu valor em termos da história da arte brasileira.

Mais complexa, e bem mais difícil, foi a valorização artística do ecletismo.'; Já nos anos 1960, haviam sido tombadas algumasedificações,mas por seu valor

junto, o que se achava em jogo eram perspectivas distintas de valoração, ponto

o valor artístico desse estilo começoua ser aceito pelo Sphan. No processo do conjunto da Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro (Proc. 860-T-72), ficou evidente o confronto entre critérios distintos de valoração dentro

JI.ü çi.,.

e pelas

adulterações sofridas por alguns prédios. De -outro. o arquiteto e professor Paulo

o primeiro exemplar em estilo arf-nouveau tombado pelo Sphan, de que, segundo

histórico." Foi apenas com o tombamento dos prédios da Avenida Rio Branco que

:.)

unidade ao conjunto, quebrada por construções como o edifício Apoio ll

Na verdade, mais que uma discussão sobre estilos ou sobre a noção de con-

a que alude Paulo Santosem sua longa e detalhada resposta ao parecerde Lígia Martins Costa: Compreendo o enfoque de dona Lígia, seja em relação ao conjunto de edifícios. seja em relação aos do Dérbi e Jóquei. Ela apreciou uns e outros a partir dos princípios

dos quadros técnicos do Sphan. O pedido. feito pelo Instituto dos Arqultetos da

que norteiam a Arquitetura e o Urbanismo modernos, em que a unidade de estilo, volume

Brasil (IAB) e pelo Clube de Engenharia. "as duas entidades de classe mais pres-

e forma é consideraçãobásicapara a qualidade da obra. Mas o enfoque, igualmente

tigiosas e mais habilitadasa fazê-lo' lo que dava a esse pedido um peso espe-

moderno, para a apreciação de obras do passado é diferente, repudiando sejam elas

cial), solicitava o tombamentode nove edificações: Palácio Monroe, Tribunal de

julgadaspela consciênciaestética dos nossos dias e sim a partir do pressupostode que cada períododa História da arte tem direito a ter seu próprioestilo e deva ser

Justiça, Biblioteca Nacional, Escola de Belas Artes, Dérbi Clube, Jóquei Clube. Clube Naval, Teatro Municipal e Assembléia Legislativa. Tinha como justificativa

o fato de esseconjuntorepresentar o testemunho da remodelação feita na cidade pelo prefeito Perelra Passos. no início do século. Em termos de valor histórico,

apreciado,em todos os seus aspectos,em função da cultura de que se nutre e das idéias estéticas por que se expressa. (p. 141

Paulo Santos se alinhava. poRanto. aos que reconheciam a relatividade dos

a antiga Avenida Central seria para a Primeira República o que a Praça XV fora

juízos de valor, contra qualquer princípio canónico no ato de valoração que discri-

para o Império. A motivação do pedido surgiu da ameaça de demolição dos pré-

minasse estilos na história da arquitetura

dios do Jóquei e do Dérbi, que dariam lugar a um arranha-céu.

tas. Desse ponto de vista, o valor histórico do conjunto enquanto único testemunho

- como faziam os arquitetos modernis-

Avenida Central tinha, conforme observação de J. Needel1 (1993), função "meta-

de alto porte da Be//e Evoque na capital da Repúblicaadquiria maior importância em termos da indicaçãopara tombamento.Paulo Santos consideravao ecletismo

fórica'. Sua concepção não visava apenas a resolver um problema urbanístico.

como estilo estética e arquitetonicamente válido, na medida em que se propunha

mas também a marcar a presença do progresso e da civilização, banindo os vestí-

a analisa-loà luz do momento histórico em que emergiu. Via nesse estilo um do-

gios do período colonial, "símbolos de uma cultura que os cariocas europeizados

cumento da evolução da arquitetura e a expressão de seu tempo, final do século

queriam esquecer' (Needel1,1993, p. 71). As fachadas dos prédios haviam sido

XIX e início do XX - tempo de confronto entre a sociedade pré-industrial.carre-

submetidas a um júri, que as avaliou dentro dos critérios do ecletismo francês.

gada de tradições. e a sociedade industrial nascente, que buscava novas formas

Para o autor já citado. "a Avenida Central tornou palpável a fantasia de Civilização

de expressão estética. formas essas que só surgiram. no Brasil. a partir dos anos

compartilhada pelos cariocas de elite da Belle-Époque' (idem, p. 68).

20. com a arquitetura modernista de Warchavchicke do próprio Lúcio Costa.

A importância desse conjunto não era somente histórica. A arquitetura da

A análise feita pela Divisão de Estudos e Tombamentos (DET) do pedido em questão - que, considerando que as edificações não constituíam um conjunto, as avaliou individualmente, propondo o tombamento apenas do Teatro Municipal e da

Escola de Belas Artes - abriu uma divergênciainusitada na história do Sphan.

190

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

Foi em nome da "boa arquitetura" que Lúcio Costa se insurgiu veementemente

em seu parecer. Não consideravao ecletismo um período da história da arte e sim "um hiato nessa história". Ao defender sua posição. que coincidia com a de Lígia Marfins Costa, Lúcio Costa fez as seguintes ponderações:

A PRÁTICADE TOABAA[NTO: 1970-1990

}91

Se o lphan tomou a iniciativa de tombar as três 'casinhas' referidas - ruas da

Sem dúvida, a linguagem da arquitetura eclética soa-nos quase sempre estranha.

Glória, da Quitanda e Mayrink Veiga,'' foi simplesmente porque tais 'casinhas'. Inclusive

num primeiro momento. Um exame mais detido conduz-nos, no entanto, à identificação

a do Virzi, corresponderam, na sua época. à linha de evolução - ou revolução - arqui-

de traços de outras culturas que são comuns à nossa. As propostas clássicas desse

tetõnica verdadeira, ao passo que as imponentes construções a que o Relator alude

período. por exemplo. têm, com maior razão, elementos que nos são familiares. IProc.

são produtos marginais a essa linha evolutiva autêntica, e manifestações da falsa arqui-

970-T-78. Faculdade de Direito do Recife, PEI

tetura pejorativamentetachada. pela crítica intemacional autoHzada,como "beaux-ans".

Trata-se,pois, de uma distinção fundamental.

No final da década de 1970, a percepção qlie as instâncias técnicas do lphan tinham do valor artístico dos monumentosjá era conduzida com base em uma con-

Essa seria, segundo Lúcio Costa, a justificativa de a antiga administraçãodo

cepção não-canónicada história da arte, disciplina que Giulio Carlo Argan con-

Sphanter excluído de sua alçada o ecletismo:o fato de considera-lofora da "linha

sidera "a única ciência possível da arte" (1992a, p. 16). Para Argan, a crítica de

legítima da evolução arquitetõnica'. Essa postura justificava inclusive a proposta

arte se realiza na medida em que contextualiza e historiciza os fenómenos. É esse

de demolições.como a formulada pelo próprio Lúcio Costa em relação à "alman-

procedimento que,a seu ver, qualificaos juízosde valor.

jarra de concreto,coroada por uma cúpula, situada entre o cais e a esplanadado

Se, nas décadas anteriores, a consideração do valor artístico de um bem era

Castelo, pertencenteao Ministério da Agriculturae que já nasceu bastarda para

o critério prioritário, recorrendo-se ao valor histórico como única justificativa. ba-

a Exposição de 1922' (Proc. 982-T-781.Lúcio Costa classificou esse prédio de

sicamente, para o tombamento daqueles bens que se enquadravam na letra do

"vilão arquitetõnico' e ele foi efetlvamente destruído. O mesmo destino teve o Pa-

decreto-lei na 25, de 30.11.37, mas que eram desprovidos de qualidade estética,

lácio Monroe, incluído no processo da Avenida Rio Branco, e cuja demolição foi ob-

ou haviam sofrido adulterações. a partir dos anos 70 a perspectiva histórica, am-

jeto de protestos na Imprensa.Ao final desse processo foram tombados quatro

pliada. levou, inclusive, a uma reconceltuação dos valores artísticos. Os chafa-

prédios - Teatro Municipal, Escola Nacional de Belas Artes, Biblioteca Nacional

rizes do período colonial, por exemplo, foram tombados. nos anos 30-40, por seu

e Caixa de Amortização - todos, curiosamente. inscritos apenas no Livro de Belas

valor artístico. enquanto peças excepcionais em termos do trabalho artesanal exe-

Artes

cutado em pedra. Nos anos 80, chafarizes do século XIX, tombados também por

Na análise dessa polêmica, é preciso deixar claro o que está implícito, ou seja, que o problema não era uma mera oposição história x cânone, pois assim não se estaria elucidando a posição dos dois arquitetos envolvidos.Ambos partiam de uma leitura da história da arquitetura.O que os distinguia,como procurei demonstrar.era uma postura diferente na consideração da tradição e na construção da continuidade histórica dos estilos arquitetõnicos. Anos mais tarde. e com maior distanciamento.a arquiteta Dará Alcântara,da

DET, sintetizoua questão:

sou valor artístico. são considerados, juntamente com aquedutos e caixas-d'água.

parte do "mobiliário urbano que testemunha o processo evolutivo das cidades' (Dou Alcântara. Proa. 1.132-T-84. Chafariz da Praça Mahatma Gandhi, Rio de Janeiro). e se inserem na série histórica referente ao abastecimento de água nos centros urbanos. No século XIX, esse tipo de bem, produzido em série. era mais ornamental que utilitário, e reproduzia símbolos do passado. Já as fábricas cons-

truídas nesse período muitas vezes eram concebidas plasticamentede forma a disfarçar sua finalidade - como é o caso da Fábrica Santa Amélia, em São Luís. Maranhão (Proc. 1.144-T-88), cuja fachada em alvenaria, à feição de uma resi-

Nossa sensibilidade, hoje em dia, inclina-se com mais facilidade para as construções

dência, escondia sua estrutura em ferro. A mesma característica,o fnchadlsmo.

do período colonial e da primeirametade do século XIX. não só pelo fato de serem

foi apontada no prédio da Light, Rio de Janeiro. A dissociação entre forma e fun-

o que de mais antigo possuímos, cama património arquitetõnico.como também porque

ção, contrária aos cânones modernistas. era. no entanto, uma característica da-

a adequação da plástica à técnica construtiva com que eram concebidas encontra eco

quele período histórico, e refletia as contradições sociais e culturais da época.

na maneira de considerarmos a arquitetura contemporaneamente. (Prac. 976-T-78.

Prédioda Cia.Docasde Santos.RJI

Dentro de uma visão histórica mais ampla, portanto. certos traços estilísticos como o ornamento autónomo, a dissimulação de materiais. e a alusão a estilos

E, em outro parecer, a mesma arquiteta considerou a importância do ecletismo

pretéritos, que caracterizam o ecletismo, deixaram de ser interpretados como

especificamente no contexto brasileiro:

192

negativos.

O PATRIAONIO [Á PROCESSO

A PRATICA Dt TOABAAlINTO: 1970-1990

193

No caso específico de bens que referem classes de objetos antes excluídas

série de acontecimentossempre dramáticos e breves' (Proa. 1.146-T-85. Prédio

do universo da estética, como as obras da tecnologia industrial - pontes, merca-

da Light, RJ).

dos, fábricas, caixas-d'água, faróis. estações ferroviárias etc. -, essa nova leitura possibilita inclusive a atribuição de valor estético a esses tipos de bem, que. de

Nos anos 80, as concepçõesmais recentes da nova historiografiacomeçaram a ser incorporadasà prática de tombamentosda Sphan, mas eram reiteradamente

acordo com o recorte romântico, eram excluídos do fazer artístico, eminentemente

contestadas nas impugnações. Foi dentro desça perspectiva que passaram a ser

artesanal. Em meados da década de 1980, Dera Alcântara, referindo-se ao tomba-

mento do chafariz da Praça Mahatma Gandhi, no Rio de Janeiro, usa o termo

lidos e valorizados alguns testemunhos da ocupação do território brasileiro, da evoluçãodas cidades, dos diferentes grupos étnicos, da história da ciência e da

:estética industrial".

tecnologiano Brasil. Tratava-se,como diz o arquitetoLuís FernandoN. Franco,

A atribuição de valor histórico, que reproduzia, na seleção de bens, os crité-

da Sphan, de ler os "desertos' deixados pela história factual. Entretanto,se essa

rios excludentesda história factual, centrada no evento político e nos feitos das

mudança de perspectiva veio possibilitar a Inclusãode novostiposde bensno

classes dirigentes, é também ampliada de modo a abranger bens que, mesmo não

patrimóniocultural brasileiro,falta ainda muito para cobrir as lacunas, mesmo em

podendo ser identificados com "fatos memoráveis da história do Brasil' e não se

relação à história dos "grandes eventos', deixadas pela orientação anterior.

destacando por seu valor artístico excepcional, tornam-se passíveis de tomba-

Além disso, fatores como a modéstiadas edificações,a falta de documentação

mento federal. Lembro que só recentementehistoriadores começaram a fazer parte

escrita e a dificuldade de fiscalização constituem entraves para o tombamento de

dos quadros da área de proteção, produzindo paraceres especificamente sobre o

certos bens historicamentesignificativosdentro dessa nova perspectiva.Foi o que

valor histórico dos bens propostos para tombamento.

ocorreu com a Casa de Plácido de Castro, em Xapuri, Acre, com as ruínas da

Exemplo típico dessa mudança é a evolução do processo 953-T-77, da Escola

Vila Porto Acre, em Rio Branco,Acre, com os marcos da ocupaçãoda Amazõnia.

de Enfermagem Ana Neri, no Rio de Janeiro. Instituição pioneira da enfermagem

e com a casa da Sudeco Velha, em Nova Xavantina, Mato Grosso, marco da ocu-

no Brasil - justificativa apresentada no pedido - teve o tombamento federal recu-

pação do Centro-Oeste, todos pedidos de tombamento encaminhados por entidades

sado em 1978por falta.de valor arquitetõnico (trata-sede construçãoem estilo

locais e todos arquivados.

neocolonial), recomendando-seo tombamento estadual. Ante a insistência dos

O dilema entre a ênfase na visibilidade do bem, consideradoenquanto edi-

solicitantes, em 1984 o Diretor da 6a DR recomendouque os historiadores da

ficação excepcional, propiciadora de uma experiência estética e de uma leitura

Divisão de Tombamento e Conservação (DTCF' fizessem estudos visando a uma

de estilos arquitetõnicos, ou palco de eventos notáveis, e a consideração do valor

possível inscrição do bem no Livro Histórico. tendo sido a escola tombada em fun-

do monumento enquanto documento, enquanto referência a significações históricas

ção de seu papel na história da ciência no Brasil. Também no caso do tombamento

às vezes fluidas, sem precisão cronológica(como a noção de ambiente) ou em

do Forte de Santa Bárbara, Santa Catarina, o arquiteto Antõnio Pedra Alcântara

função da carga afetiva que pressupõemas noções de identidadeou de qualidade

chamou a atenção para uma mudança nos critérios de avaliação que ocorreu entre

de vida, constitui um problema levantado nesse período - problema que, como

1975 (quando se considerouque o bem não tinha valor artísticoou históricosufi-

vem sendo apontado, assumiu uma dimensão não apenas conceptualcomo também

cientes)

e 1982, data de sua inscrição no Livro Histórico.

política.

Nessa linha. e discutindo a concepção de valor histórico que predominará até então na Sphan, Doía Alcântara observou que "nem sempre são os fatos fora do

5.2.2 Â$ toncepÇaes de valor excepcional e de valor nacional

comum ou as contribuições de caráter erudito que imprimem o cunho histórico ou

A noção de excepcionalidade é tributária das idéias de genialidade e de

o valor arquitetõnico necessários ao tombamento de um local ou de um edifício'

originalidade atribuídas pelo movimento romântico ao ato de criação, que põem em

IProc. 1.113-T-84. Casa Presser, Nova Hamburgo, Rio Grande do Sul). A mesma

destaque o sujeito da criação ou o herói. ator de fato memorável.Como o de-

arquiteta considerava também que "fatos memoráveis não podem ser apenas a

creto-leinQ25, de 30.11.37,mencionaexplicitamente a expressão"valor excep-

194

O PATRIAONIOeA PROCESSO

A PRÁTICA Dil TOÁBA#leNTO: 1970-1990

195

cional', e como se trata de avaliaçãoeminentementesubjetiva, não é difícil com-

de naciona/Idade,vem sendo reelaboradanas últimas décadas.Lúcia Líppi de Oli-

preenderpor que essa noçãose tornou, duranteas últimasdécadas,foco de dis-

veira resume essas dúvidas quanto à pertinência.hoje, de se invocar a idéia de

cussão nas impugnações aos tombamentos.E, na medida em que a tendência é de

nação para legitimar ações de qualquer natureza:

preservarconjuntos, garantir a ambiência pela definição do entorno e proteger bens

que são representativos de determi.ladoestilo ou época, torna-sedifícil para o proprietáriode um imóvelaceitaro tombamentode um bem que, a seus olhos,se asse-

Se todos os meios, princípios e objetivos da cultura moderna - que tanto almejamos e queremos redistribuir para todos - são internaçíonalístas,cosmopolitas, não estarão

melha a tantos outros. Num esforço de esclarecerousa nova visão, diz Dou Alcân-

os defensoresda nação fora do tempo? Se a nação religou os homens na modernidade. o que os religará agora? Qual é o sentido da construção de uma ideologia nacional nos

tara, falando do conjunto arquitetõnicoda Avenida Nazaré, em Belém. Para:

tempos atuais? Em nome de que valores, princípios, interesses os intelectuaisse lançariam em um esforço de construção simbólica de âmbito nacional?

O fato de que numa primeira etapa do património,apenas os monumentosenfáticas no seu valor individual tenham sido atendidos, não deve levar à conclusão de que outros, por si só menos significativos, se considerados em conjunto, não passem a ser de excepcional valor. (-.) Esse valor relaciona-secom a leitura que nos proporcionam, através da qual podemos situar os estilos europeus entre nós. em nossa versão brasileira. pelos

Por outro lado, poderão as "comunidades"de base, de vizinhos, os usuárlosdo metro, os leitores de um jornal, os telespectadores se sentirem unidos, agregados? Pode

o indivíduo moderno hoje, solto das amarras do pertencimento à nação, viver uma totalidade que dê sentido ao esforço cotidiano de viver? A aquisição de bens materiais por si só será capaz de garantir um sentido de identidade pessoal e coletiva? O retorno

reflexos encontrados numa arquitetura menor.(Proc. 1 .027-T-80)

da religiosidade,da espiritualidade, do misticismo parece ser um indício de que os seres

São, pois. as noções de representatividade, de exemplaridade,e não a noção mais corrente de fora do comum, que são invocadas pela instituição para justificar

vários tombamentos nas duas últimas décadas.

humanosnão permanecemmuito tempo presos numa jaula de ferro. 11990,p. 661

Essas perplexidades reporcutiram, sem dúvida, numa política pública fundada sobre o valor simbólico da nacionalidade e conduzida por uma instituição estatal

Para o arquiteto Luís Fernando N. Franco, o caráter de permanência e de vitalidado de um bem, no sentido de provocar continuadamentenovas leituras, é traço de sua excepcionalidade:

que gozava de alto grau de autonomiaem relação aos movimentosda sociedade. Na medida em que os próprios atores dessa política passam a põr em dúvida não

só a força política e simbólica da idéia de nação como também seu papel de úni-

Excepcional é todo material cuja forma revela um grau de elaboração e complexidade que o torna intrinsecamente portador dos dados da cultura que o produziu. A possibilidade

de novas leituras e de transcrição dessa forma segundo uma expressão diversa de sua materialidadeé já um gesto virtual de preservação: é o gesto com que a cultura, nossa e atual, incorpora o material e o apropria a um uso culturalmente contemporâneo. O

cos porta-vozes dos grupos sociais na construção do património nacional, torna-

se imperioso buscar novos caminhos. Em termos práticos, ocorrem também novas dificuldades na atribuição de valor nacional a bens, na medida em que passam a se tornar viáveis tombamentos

tombamento,ao tornar real esse gesto, garante,com a preservaçãofísica do objeto,

estaduais e municipais. Embora essas esforas de tombamonto possam se sobre-

a possibilidade de leituras futuras, inclusive as que contradigam a excepcionalidade

por, o tombamentofederal, até há não muito tempo o único possível, continua

atualmente afirmada: é o risco com que. ao corrê-lo, a objeto denota sua própria vita-

sendo considerado o de maior prestígio, e o que assogura efetivamente a proteção

lidade. IProc. 1.116-T-84. Museu Paranaense. Curitiba. PRI

do bem. Foi o que ocorreu em Cananéia, São Paulo, onde os habitantes da cidade,

Dessa perspectiva, a excepcionalidadede um bem decorre menos de seus

liderados por um jornalista local, não queriam aceitar o tombamento exclusiva-

atributos estéticos que de sua capacidade de mobilizar reações - ainda que nega-

mente estadual que fora recomendado pelo Sphan, que arquivou o processo. Tom-

tivas - o que justificaria sua proteção. Porém, com a tendência atual de considerar

bada em 1969 pelo Condephaat, a cidade teve imóveis restaurados por esse ór-

que qualquer objeto pode, em princípio, ser Integrado ao património, essa noção

gão, trabalho que, embora executado sob critérios de restauro rigorosos, não foi

perdeu muito de sua fôrça para legitimar um tombamento.

bem aceito pela população.Nessecaso ficou claro, inclusive,o conflito entre os

Assim como a noção de excepcionalidade,a noção de valor nacional, fundada

na idéia de nação, assim como as práticas voltadas para suscitar um senflmenfo

196

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

critérios técnicos do órgão de preservação e a percepção que a população tinha

da anf©uldade de seusmonumentos. Do mesmomodo,o valor nacionalda casa-

A PRÁTICA DE TOABÁAENTO: 1970$#90

197

Y grande da Fazenda Ladeira de Taepe em Surubim, Pernambuco, foi enfaticamente

esses bens realmente enquanto conjuntos, a partir da relação entre o meio geo-

defendido pelo solicitante, apesar do parecer contrário de Aírton Carvalho, diretor

gráfico, natural, e os grupos humanos que ocuparam aquele solo e nele deixaram

da delegadalocal da Sphan.

vestígios. E uma idéia que já estava implícita no decreto-lei Re25, de 30.11.37.

O fato é que, com a criação de órgãos estaduais e municipais de preservação,

que previa a reunião dos três valores em um só livro (arqueológico, etnográfico

extingue-se o papel supletivo que a Sphan antes exercia, tornando-se, por outro

e paisagístico), e também no anteprojeto de Mário de Andrade, quando se referia

lado, a cada dia mais importante discutir o que a instituiçãoentende atualmente

às "artes arqueológicase ameríndias'. Nessa perspectiva, a história das cidades não se resume mais à história de sua arquitetura, mas abrange todas as adap-

como bem de valor nacional.

tações feitas pelo trabalho humano sobre o ambiente. de modo a adequa-lo a seu

5.2.3 0s con«idos de centro história e de entorna

prometo. Do mesmo modo, os bens naturais não seriam mais consideradosapenas por seu valor paisagístico, também em consonância com o que já propunha o pará-

Os tombamentos de núcleos históricos nos primeiros tempos do Sphan foram

realizadostendo em vista antes o número expressivode bens excepcionaisque neles se concentravamque propriamenteo conjunto enquanto objeto de interesse

llb.E

da proteção. Mas. em texto publicado em 1970. Rodrigo M. F. de Andrade dizia que "justifica-sea conservaçãode um sítio urbano quando este constitui criação

Ç.]

notável e representativada vida e da organização social de um povo, em determinada fase de sua evolução" (1987, p. 81). Foi dentro desse espírito que foram tom-

bados os centros históricosde Laguna, Natividade,São Franciscodo Sul, Pirenópolis e Antânio Prado, entre outros. Pirenópolis,por exemplo, foi tombada por

constituir"cidade representativa de certa forma urbana,certo modode ser nacional' (Francisco lglésias, relator do processo no Conselho Consultivo).

grafo 2a do artigo la do decreto-lei Ra25, de 30.11.37 ("que importe conservar e

protegerpela feição notável com que tenham sido dotados pela naturezaou agenciados pela indústria humana'). Na verdade, essa linha de interpretação é muito recente na instituição. e suas conseqtlêncías práticas. em termos de mudanças na valoração de bens e nas condutas visando à proteção - que deixam assim de ser tarefa exclusiva de arquitetos -

ainda não podem ser avaliadas. Quanto ao entorno dos monumentos tombados, na legislação brasileira a definição é feita caso a caso. ao contrário da França, onde o perímetro é fixado por lei em 500 metros. Como a própria noção de entorno evoluiu da idéia inicial de preservar a visibilidade do bem para a de garantir a manutenção de uma ambiên-

Em parecer sobre o Centro Histórico de Laguna, Luas Fernando Franco chama

cia, a definição desse entorno tornou-se uma questão bem mais complexa. Tam-

a atenção para o fato de que esse tombamento não é indicado pela excepcio-

bém nesse caso, a abordagem exclusivamente arquitetõnica é hoje insuficiente,

nalidadedos monumentose sim por

sendo imprescindível o recurso a outros especialistas.

1...)tratar-se de documento precioso da história urbana do país, menos como sede de

A compreensão do que seja o entorno de um bem tombado tem se constituído

acontecimentos notáveis - embora estes também tenham sido ali assinalados - do que

em mais um ponto de atrito nos processos de tombamento. Protestos ocorreram

pela escolha criteriosa do sítio, pelo papel que o povoado pôde desempenhar,em virtude

em Belém. Para, onde a Sphan admitiu, em resposta à impugnação do tombamento

de sua localização, no processo de expansão das fronteiras meridionais e. sobretudo.

do prédio Re482 da Avenida Nazareth, que "o prédio em questão. tal corno ocorreu

pela forma urbana assumida com precipitação espacial dos dois processos precedentes.

Foi essa nova visão da história que motivou a proposta desse mesmo arquiteto

com sete outros nas proximidadesdo conjunto preservadoà Avenida Governador José Malcher, foi tombado a fim de que se colabore na manutenção da ambiência

para transcrição dos centros históricos inscritos nos livros Histórico e de Belas

do conjuntoda Av. Nazareth'(Dou Alcântara.Proc.1 .027-T-80).Mesmonão sen-

Artes para o Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Essa proposta, apre-

do o caso - pois o pedido se justificou pela importânciada própria edificação - na

sentada na Informação nQ 135/86, implicava uma leitura mais abrangente desses

impugnaçãoapresentadapela Braslightao tombamentodo prédio da Light, na Rua

bens, em consonância com as idéias da Ecole des Annales. que analisa os fatos

Marechal Floriano, RJ. alegava-se que "o tombamento de um prédio para proteção

históricos a partir de uma postura multidisciplinar, para que concorrem a história.

visual de outro, esse sim com as qualidades necessárias à sua integração no

a geografia, a

património histórico e artístico nacional, é Ilegítimo'

198

arqueologia,

a geologia, a antropologia etc. Essa leitura entende O PATR IAON IO [A PROCESSO

A PRÁTICADe TOABAA[NTO:1970-1990

199

FI

O fato é que é evidente que essa nova orientação, centrada no conceito de

através de seus órgãos especializados e de seus técnicos, ajuizar da significação

ambiência, implica, mais ainda que a anterior, a colaboração dos moradores para

e do valor da coisa tombadas tal Juízo é da sua exclusiva alçada e competência'

ser implementada.

IProc. 853-T-72. Casa R. Mayrink Veiga, 9. Rio de Janeiro, RJ). A qualificaçãodo poder de julgamento da Sphan como discricionárioimplica,

5.2.4Sobrea legitimidade do processo de atribuição de valor nas +ombamen+os

portanto, certa dose de arbítrio. Essa realidade.é muitas vezes interpretadacomo "falta de critérios' ou como subjetividadedos juízos de valor emitidos pelo órgão.

A condução do processo de avaliação de bens para tombamento que, nas dé-

Portanto, um dos cuidados da instituição - presente nas contra-razões às impug-

cadas anteriores, era fechado, e com base em uma autoridade reconhecida dentro

nações de tombamento - é de, ao mesmo tempo, apresentar as justificativas técni-

e fora da instituição.passou,a partirdos anos 70, a encontraralgumasdificul-

cas que levam (ou não) a cada tombamento, interpretandoas disposiçõesgené-

dades, e a ser objeto de discussão tanto internamente, entre grupos de opiniões

ricas do texto legal, e defender a autoridade de sua decisão quanto à avaliação

distintas,'9 quanto nas impugnações, que questionam inclusive a autoridade exclu-

de bens para tombamento.

siva do Sphan para emitir juízos sobre o valor cultural dos bens.

Até os anos 70, essa responsabilidadeera exercida pelos agentes do Sphan

Embora explícita na lei 378. de 13.1.37, a competência do Sphan nesse sen-

sem maiorescontestaçõosou discordâncias,dentro e fora da instituição.

tido só foi realmente legitimada juridicamente com o memorável julgado sobre o

Como já foi obsewado, era sobre o valor artístico que, nas primeiras décadas

Arco do Teres. em 1943, quando o STF ratificou a constitucionalidadedo decreto-

do Sphan, incidiam prioritariamente as inscrições e a noção de excepcionalidade.

lei Ra 25, de 30.11.37. Entretanto, no período que estou analisando, algumas im-

A atribuiçãode valor artístico requer um julgamento especializado,que considera

pugnações contestaram essa competência, discutindo inclusive o caráter do tom-

o bem sobretudo em seus aspectos formais - no sentido do uso dos materiais,

bamento enquanto ato administrativo.

do apuro da execução e de seu optado de consewação. Reformas ou restaurações

Para os juristas do Sphan, o tombamento constitui um tipo de ato adminis-

que descaracterizassem o programa original eram impedimentos para a atribuição

trativo discricionário e não vinculado,:' pois a legislação brasileira determina que

de valor artístico. Nesse sentido, a ênfase na atribuição de valor artístico res-

cabe ao Estado, através da instituição competente, avaliar os bens a serem tom-

guardava as prerrogativas dos agentes do Sphan.

bados pela instância federal. O exercício dessa competênciafoi regulamentado

O valor histórico era, naquele período, claramenteconsideradocomo um valor

pelo decreto-lei RQ25, de 30.11.37. A legislação brasileira, à diferença de vários

"de segunda classe', e atribuído com base na interpretaçãoliteral do decreto-lei

países, não estabelece critérios objetivos - como datação ou classes de bens -

Rg 25, de 30.11.37 (ver Anexo 11). Foi possivelmente

e sim competências,que devem ser exercidas levando-seem conta determinados

desse valor que não houve no Sphan preocupação em recrutar historiadores nem

valores. Sõnia Rabelo de Castra (1991, p. 90) considera. inclusive. que mesmo

em desenvolver critérios próprios e mais elaborados de avaliação do valor histó-

os valoresdiscriminados no decreto-lelRa25, de 30.11.37- histórico,artístico,

rico dos bens que se propunham para tombamento.

arqueológico, etnográfico, paisagístico e bibliográfico - devem ser entendidos como menções de caráter meramente exemplificativo, pois a própria noção de va-

lor cultural varia de uma época para outra. Cabe à instituição competentedeterminar o preciso conteúdo dos preceitos genéricos do decreto-lei Ra25, de 30.11.37, desde que seja obsewada coerência no julgamento de casos similares conside-

rados na mesma ocasião.

Esses critérios de atribuição de valor adotados pela instituição, apoiados na autoridade de quem os formulava, começaram a ser questionados na década de 1970, sendo um marco nesse sentido o processo da Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro (Proc. 860-T-72). Ao defender o tombamento de monumentos em estilo

eclético, ao roconhecero valor próprio de cada estilo de época, e ao afirmar o inconteste valor histórico dos monumentos, o arquiteto Paulo Santos, relator do

Fol, pois, apoiadoem argumentaçãojurídica. que Lúcio Costa afirmoucategoricamente que "cabe por lei ao Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional,

200

devido ao caráter sup/effvo

O PATRIAÕNIO

[A PROCESSO

processo no Conselho Consultivo, entrou em confronto com a autoridade de Lúcio

Costae coma tradiçãoda casa.

A PRÁTICA Dll TOABAAeNTO: 1970-1990

201

A crítica à hierarquia de valores até então adorada terminou por provocar vá-

interaçãocom a cultura das classes cultas (e também com a cultura de massa).

rias consequênciasna prática de tombamentos.Em primeiro lugar, a adição de

Nesse caso. para o agente institucional. o problema.como obsewa Dina Lerner.

um ponto de vista que relativiza os juízos de valor propicia o deslocamento da

"é a ignorância da nossa ideologia branca' (Sphan, Revfsfa do Pafrfmõn/o 22.

questão de uma instância exclusivamente técnica para uma instância política.

1987, p. 75). Fica evidente que o processo de atribuição de valor não pode ser

Nesso caso, o recurso à autoridade de quem julga torna-se insuficiente, e outros

reduzido a uma questão técnica. As discussões levantadas por esses (ainda pou-

pontos de vista. de outros atores, passam a ser levados em conta. Além dos argu-

cos) processos explicitam o caráter ideológico da construção dos patrimónios.

mentos técnicos, é preciso recorrer também à capacidade de argumentação e à

Exemplarnesse sentido foi o processo de tombamento do Terreiro da Casa

habilidade política. Foi o que ocorreu em alguns processos de tombamento, como

Branca,em Salvador, Bahia, o mais antigo terreiro de candomblédo Brasil, Guio

o do Terreiro da Casa Branca, o da Serra da Barriga, o da cidade de Antõnio Pra-

pedidode tombamentoteve origem na FNpM, através do ProgramaEtnias e Socie-

do, o do Hotel Copacabana Palace, entro outros.

lb.h

dade Nacional.Nas discussõesque constam do processo.fica claro o conflito

Mas foram sobretudo imperativos de ordem prática que levaram, nesse perío-

entre os técnicos da Sphan- que se apoiavamnos critérios de valoraçãojá con-

do. os técnicos da Sphan a refletir e a discutir em seus pareceres a legitimidade

solidados e, sobretudo, na defesa da especificidadedo instituto do tombamento

do processo de atribuição de valor adotado pela instituição. Essa questão foi le-

a bens que interessamanter imutáveis- e os antropólogosda Área de Referência

IH l dlk

vantada tanto nas impugnações como em decorrência da apresentação de pro-

da DinâmicaCulturalda FNpM,e do ConselhoConsultivo,que enfatizavama im-

lq::i

postas de tombamento de "programas inteiramente novos, cujo universo (em ter-

portância simbólica e política desse tombamento.2' Por esse motivo, o que impor-

mos nacionais) nos é inteiramente desconhecido' (Proc. 1.064-T-82), conforme

tava não era apenas o reconhecimento,por parte da cultura oficial, de um bem

observou a arquitota Dou Alcântara, então responsável pela Seção de Tomba-

significativo para a cultura afro-brasilolra enquanto manifestação etnográfica, e

mentos da DTC. Foi a própria Dou que esclaroceu, em outro parecer, a natureza

sim sua inclusão,com a inscrição no Livro do Tombo Histórico,entre os bens

do problema:

referidos à história .nacional.::

c'n

Sempre que nos é proposta a presewação de um bem tradicional em nossa prática

A apreciação e a inscrição de bens do que se veio a denominar "patrlmânio

institucional de tombamento - igreja, teatro etc. - não há dificuldade maior, porque já

cultural não-consagrado'eram, até os anos 70, nos raríssimoscasos que se apre-

possuímoso necessário quadro de exemplos para referencia-lo. Se. ao contrário. a pro-

sentavam para tombamento, tradicionalmente feitas por seu valor etnográfico.

posta refere-se a um objeto não tradicional - caixa-d'água. vila operária etc. - temos necessidade de organizar um mínimo quadro de referência para opinar com menor margem de erro. (Proc. 1.072-T-82j

Entretanto,na medida em que a perspectivaetnográficae a noção de folclore passaram por um processode revisão crítica (d. Cavalcantie Vilhena, 1990 e Carvalho, 1991), esse valor passoua ser identificadocom a ótica das classes dominan-

Tratava-se de bens que não se prestavam a uma leitura estritamente estética. A inclusão de novos programas na prática de tombamentos da Sphan teve, portanto, algumas consequências não só no quadro de referências conceituais até então utilizado, como também na sistemática de valoração. Tornou-se indispensável a participação de outros especialistas que não apenas os arquitetos. Afinal. o sal)er que a Sphan deve agora produzir para fundamentar suas decisões em termos de tombamentos é diferenciado, e exige o equacionamento de inúmeros problemas. A questão demonstrou ser bem mais complexa quando se trata de avaliar bens produzidos e voltados para os grupos sociais populares. vinculados a outras tradi-

ções culturais que não a luso-brasileira,mas que atualmente estão em constante

202

O PárRFAÕNIO eA PROCESSO

tes, e sua utilização como justificativa para tombamento tornou-se ideologicamente

problemática.Por outro lado, o tratamento que essas produçõesrecebiam,consideradas manifestaçõesexóticas ou típicas de contextos culturais "atrasados', dificultava sua avaliação a partir de outras escalas de valores. A complexidadeda questãoque se apresentava,agora de modo diferente,para os técnicos da Sphan, pode ser avaliada na discussão do processo de tombamento

do Presépio do Pipiripau, Minas Gerais. proposto para o Livro de Belas Artes. Nesse processo,o arquiteto da Sphan Luís FernandoFranco questionanão só os novos critérios de valoração propostos. supostamente mais democráticos.como o próprio /usar de ía/a dos agentes institucionais.

A PRÁTICA Dll TOABAA[NTO:1970-1990

203

No seu parecer, Luís Fernando Franco tece considerações sobre o processo

de avaliaçãodas produçõesculturaismarginalizadas por parte da culturadominante. O arquitetofaz uma crítica à situação em que, em nome de uma postura democrática e "politicamente carreta', a defesa, por parte de agentes institucionais. de um relativismo absoluto na atribuição de juízos de valor leva a equívocos con-

O arquitetoobsewaque. ao se partirdo pressuposto ingênuode que a objetivldade nos juízos de valor "pressupõe a possibilidade de uma perfeita aderência

do sujeitoao objetoobservado',se propõeuma concepçãode imparcialidade há muito criticada pela epistemologia.Essa pseudo-objetividadeencontra reforço numa "aspiração democrática do gosto, fundamentalmentehostil à noção de obraprima e de monumento.' Ora. a abolição de qualquer escala de valores. em nome

llH Clü

É difícil entender,por exemplo, por que a Caixa-d'Águade Pelotas, RS, cujo caráter pioneiroé referido por documentos,está inscrita apenas no LBA, enquanto o Resewatório de Mocó, Amazonas, mais recente, tem dupla incrição(LH/LBA)l por

ceituais e também ideológicos.

llü.u IÜh

do je da) Sphan.O tipo de inscriçãocondicionanão só a leitura do bem como também o modo como será consewado.

do repúdio a uma leitura dominantee da inserçãoda obra em seu contexto, na verdade significa a abolição dos conflitos inerentes à produção cultural. Esse processo de nivelamento- que desconhece o fato de que a cultura é justamente uma escala de valores permanentemente retificada - seria próprio da indústria cultural. portanto contrário aos interesses da preservação. Ao se querer, dessa maneira, corrigir desigualdades na constituição do património nacional, termina-se por mas-

que o Açude do Cedro,CE. que, além de obra notávelde arquitetura.foi a 'primeira rede de canais de irrigaçãolevada a efeito no Brasll', não está inscritotambém no LHI por que o Porto de Manaus. testemunho inconteste do ciclo da borracha, foi inscrito apenas no LBA e no Laep, enquanto o Teatro Amazonas, de inegável valor artístico, havia sido'inscrito apenas no LH. Já no caso do Plano Piloto de Brasília, obra contemporâneaque. ao contrário de outras menos recentes, como o prédio do

MEC e o ParqueGuinle, ambos no Rio de Janeiro, foi inscrito unicamenteno LH, essa inscrição fez parte de uma estratégia a que recorreu Lúcio Costa para proteger sua obra, já tombada pela Unesco, das descaracterizaçõesque a ameaçavam. Foi

a forma encontradapara contornar objeções que eram feitas por arquitetos locais do ponto de vista estético e urbanístico, movidas possivelmente também pelo interesse em liberar a área para investimentos

imobiliários.24

carar os conflitos inevitáveis nessa prática quando exercida numa sociedade de 5.3

classes.

A

ATUACÃO DO CONSELHOCONSULnVO

O arquiteto conclui que a falta de um estudo abrangente sobre o universo dos

A análise das atas do Conselho Consultivo. no período que vai de 1970 a mar-

presépios não permitia estabelecer, com segurança, nesse caso. um juízo de valor

ço de 1990. indica os efeitos das mudanças institucionais sobre esse conselho

artístico. Por esse motivo, o arquiteto propõe a inscrição do Presépio do Pipiripau

e sobre a Sphan. A primeira

exclusivamente por seu valor etnográfico.23

a saída de Rodrigo Meio Franco de Andrade como conselheiro - função que assu-

Nos dois casos mencionados,fica claro como motivaçõesde ordem política

e ideológicase cruzam.nesseperíodo,comas exigências e os limitesda esfera estritamente valorativa, que se estrutura no âmbito das definições disciplinares correspondentes aos Livros do Tombo.

reunião

de 1970, realizada a 21 de janeiro, marca

mira ao se aposentar, em 1968, em substituição a Miran Latif

- em decorrência

de seu falecimento. É substituído por Prudente de Morais Neto, que já prestava assessoria jurídica ao Sphan. No início da década, foram levados ao Conselho casos que evidenciavam as

Nesses processos. os técnicos da Sphan se viram confrontados com a questão

dificuldades da instituição em face da especulação imobiliária, principalmente na

que constituíao principalinteressedo 'grupoda referência" - a proteçãodo "patri-

cidade do Rio de Janeiro. Foi o caso do prometoda construtora Veplan para a Gá-

mónio não-consagrado' - tendo, porém, que a equacionar no campo específico da

vea, denominado Chácara da Gáveal do pedido de tombamento das residências

prática preservacionista: o da seleção de bens com base na atribuição de deter-

das embaixadas da ltália e da Argentinas do ParqueLage (reiteraçãode tomba-

minados valores culturais, visando à sua proteção legal.

mento) etc. Foram tombados nesse período os morros do Rio de Janeiro (sete

Outro problema - aparentemente formal. mas com as implicações conceituais

e práticas que já foram apontadas no capítulo 3 - é o do critério nas inscrições nos Livros do Tombo, que sempre foi deixado em segundo plano pelos técnicos

204

O PATRIAONIO [A PROCESSO

morros individualmente),:5o Horto Florestal e o Parque do Flamengo, visando a proteger o património natural como moldura da cidade e a qualidade de vida de seus habitantes. Foram assuntos reiteradamente discutidos nas reuniões do Con-

A PRATICA Dt TOABA#lENTO: 1970-1990

205

velho a questão do entorno dos bens tombados, dos centros históricos, e da saída

gem de votos(três votos a favor, um voto contra. duas abstençõese um pedido

de obras de arte para o exterior.

de adiamento).

selho e definiu sua missão corno a de "dirigir e revitalizar o lphan'. E, embora

O problemada definiçãoda funçãodos dois órgãosrecém-criados - Sphan e FNpM - também foi levado ao Conselho a 'propósito da elaboração do regimento

afirmasseque "quantoao pensamentooriginal do lphan nada há a inovarou in-

da Sphan. A apresentaçãode duas propostas separadas, segundo o secretário

ventar', observou que "a expressão concreta dos bens culturais brasileiros são

Ãngelo Osvaldo, expressava "as indagações e os conflitos conceituais que já es-

de pequena dimensão. Seu concerto, não claramente explicitado, encontrou na

tavam latentes desde a criação da FNpM', mantendo-se a divisão entre o "patri-

Em 1979, na 86a reunião, Aloísio Magalhãesassumiu a presidênciado Con-

Inteligênciade Rodrigo Meio Franco de Andradea ênfase no domínio da pedra e

mónio arquitetõnico' (Sphan)

e o "património

antropológico" (FNpM), apresentan-

cal e na luta da conscientizaçãodas elites culturais brasileiras'.Afirmou seu obje-

do-se a Sphan como herdeira de Rodrigo e a FNpM como herdeira de Aloísio. A

tivo de atuar de forma planejada, equacionandoos problemaspara captar recur-

questão foi retomada na 128a reunião em termos de uma crise institucional, em

sos, e anunciouo prometo de reestruturaçãodo órgão.

consequência da duplicidade de comando. Como solução, o Ministro da Cultura

Em 1983 0 antropólogo Gilberto Velho passou a integrar o Conselho Consultivo.

Fora precedido pelo especialistaem desenvolvimentoregional Roberto Cavalcanti de Albuquerque (em 1982) e pelo empresário José Mindlin (em 19791. A configuração

do colegiada começava a se modificar.:' Por sugestão do presidente Marcos Vilaça,

terminou por optar pela unificação do comando das duas Instituições. A partir de 1988, também os processos indicados para arquivamento começaram a ser encaminhados ao Conselho Consultivo que, a partir de então. passou a participar de todas as decisões relativas aos tombamentos.

o Conselho começou a se reunir também fora do Rio de Janeiro, visando a propiciar

5.4 0BSÉPVACÕtS FINAIS

maior envolvimentocom a comunidade,de desejável efeito didático. Na década de 1980, começaram a chegar ao Conselho pedidos de tombamento

Como espero tenha ficado evidente, os problemas que, nas décadas de 1970

dentro da idéia dos 'novos programas': bens representativosda etnia afro-brasi-

e 1980. se apresentavamàs áreas técnicas e às instânciasdecisórias da Sphan

leira (Terreiroda Casa Branca, BA e Serra da Barriga, ALjl das diferentes corren-

estavam bastante distantes das questões que então ocupavam os funcionários

tes de imigração(Casa Presser,RSI Casa do Professore Escola Rural,e Cemi-

ligados ao CNRC, inclusive na medida em que esse grupo contestavaos critérios

tério Protestante,SC, testemunhosda imigraçãoalemãoCasarãodo Chá. SP, tes-

de valoração da Sphan. Mas, ao simplesmente repudiarem os critérios estabele-

temunho da imigração Japonesascidade de Antõnio Prado. RS, testemunho da imi-

cidos lo que lhes era facilitado pelo tipo de trabalho que desenvolviam)e ao se

gração italiana)l marcos da história da ciência e da tecnologia no Brasil (Casa

limitarem ao que seria uma atuação correffva, os técnicos do CNRC terminaram

de Saúde Carlos Chagas e Estação Ferroviáriade Lassance,MGI Escola de En-

por se furtar a enfrentaruma dimensãosem escapatóriada atividadede preser-

fermagem Ana Neri, Fundação Osvaldo Cruz e Hospital São Franciscode Assim.

vação: a definição de critérios para a seleção de bens a integrar o património his-

RJI inúmeros exemplares da arquitetura em ferro. como pontes, mercados. caixas-

tórico e artístico nacional - critérios tanto técnicos como políticos.:'

d'água, açudes etc.l novos exemplares de arquitetura civil, como curtume. fábricas

J

No entanto, o fato é que vários projetos do CNRC foram parar nas instâncias

e conjuntos habitacionaispopularesl e até fazeres, objeto da propostade tomba-

técnicasda Sphan, em muitos casos a contragostodos técnicos mais antigos da

mento da Fábricade Vinho de Caju Tito Salva,Paraíba).

casa, que consideravam os bens propostos para tombamento desprovidos de ex-

Esses pedidos de tombamento provocaram discussões sobre o instituto do

cepcional valor histórico ou artístico, ou incompatíveis com as exigências do insti-

tombamento. suas finalidades e seus limites. Na 108a reunião, realizada em Salva-

tuto do tombamento.Mas hoje é inegável que esse movimentopropiciou,em nível

dor em 31 de maio de 1984, o pedidode tombamentodo Terreiro da Casa Branca

conceptual,pelo menos, algum grau de Integração entre as duas orientações.O

foi objeto de acaloradodebate e foi inusitadamenteaprovadopor uma estreita mar-

afluxo de novos programas,entre eles várias propostas oriundas da Área de

206

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

A PRÁTICA Dll TOABAA[NTO:1970-1990

207

Referênciada Dinâmica Cultural da FNpM. contribuiu,sem dúvida. para provocar

desses grupos estivesse voltado para outras frentes de atuação política. como

uma reflexãoteórica, metodológicae operacionalextremamentesalutar, mas que,

ocorreu na Constituinte.

na medida em que ficou restrita aos processos de tombamento, não contribuiu para

Em suma, se, nesse período, o patrimóniose abriu para novos tipos de bens.

informara prática institucional.

a Sphan ainda não sabia exatamentecomo fazer para protegeresses bens.

Fazondo um balanço dos tombamentosfeitos nas décadas de 1970 e 1980, observa-se que. sobrotudo nos anos 80, aumentaram consideravelmente as inscrições no Livro Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico (46 inscrições, a partir

A análise dos processos de tombamento abertos nas décadas de 1970 e 1980

nos leva a caracterizar esse poríodocomo um momentode coexistência e, em certos momentos. de confronto, entre orientações distintas, o que se expressou

de 1970). As inscriçõesno Livro Históricol94, entre 1970 e 1990)foram um pouco

muito mais no nível das práticas que do discurso. Por outro lado, se considerar-

mais numerosas que as Inscrições no Livro de Belas Artes (86, no mesmo perío-

mos essa situação em termos de longo prazo, podemos supor que, na verdade,

do), mas a diferença não é expressiva.

se trate de um período de transição. Na medida em que se reconstruamséries

Quanto aos tipos de bens que foram objeto de tombamento, decresceu signifi-

históricas,se proponhamleituras mais abrangentes,que não se limitem aos con-

cativamente o número de bens de arquitetura religiosa e militar, aumentando o nú-

ceitos tradicionais de história e de arte, e sobretudo se abram espaços para a par-

mero de conjuntos. Mas o fato mais característico desse período é a diversificação

ticipação de outros atores, que poderão propor outras leituras e dar suporte às

dos bens de arquitetura civil, e o tombamento de bens /nusflados,como o da Fábri-

atividades de proteção, os efeitos dessa fase poderão redundar numa efetiva am-

ca de Vinho de Caju Tito Silva, já mencionado,propostopelo programa de Tec-

pliação da eficácia simbólica do património e numa maior representatividadedos

nologias Patrimoniais da Área de Referência da Dinâmica Cultural da FNpM, cuja

bens tombados relativamente à pluralidade cultural brasileira.

finalidade não era propriamente a proteção do imóvel e do equipamento, mas dessos enquanto suporte de um "fazer intimamenterelacionadocom as caracte-

NOTAS

rísticas regionais do processo cultural brasileiro'.:' O tombamentode bens natu-

O arquitetoCarlosLemos,do Condephaat. de São Pauta,observouque, no casodas

rais é ainda esporádico. mesmo porque, no período. foi intensificada a atuação de

fazendas paulistas antigas há, pelo contrário, interesse dos proprietários no tombamento. o que as valoriza no mercado imobiliário.

outros órgãos públicos voltados especificamentepara a proteção do meio ambiente, que passou a contar também com inúmerasONGs. Entretanto,a análise

Sobre a sistemática dos processos de tombamento, ver Castra, 1991, p. 55-67 e, de forma mais resumida,Meirelles.1991, p. 481-483.

dos processos de tombamentoabertos nesse período (ver Anexo VI) revela um dado curioso: se a difusão da ecologia sem dúvida mobilizou a sociedade brasileira para a necessidade da presewação, por outro lado o encaminhamentoà Sphan de cerca de trinta pedidos de tombamentode bens naturais indica que a figura do tombamentoainda é vista por nossa sociedadecomo o instrumentode

preservaçãopor excelência. l

A proteçãopelo tombamentode bens de outros contextosque não o da cultura luso-brasileira continua raras e a de bens que estão inseridos numa dinâmica de uso popa/ar - como foi o caso do Terreiro da Casa Branca, da Casa Presser, RS

e do Conjunto Habitacional Avenida Modelo, RJ - é considerada problemática pelos critérios em vigor. Outro fato a se observar é que não ocorreram tombamentosde bens referentesàs etnias indígenas,o que leva a supor que o interesse

208

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

3

Deprol/IBPC. Processos de tombamento: uma proposta de ação. Dezembro 1992 jmimeol.

Os dados mencionadosforam colhidos no Arquivo Central do IBPC, em pesquisa

concluída emjulhode 1993. De maio de 1992 - quando ocorreu a reconduçãodo Conselho Consultivo - a maio de 1995 ocorreram mais sete tombamentos: Sobrado do Padre Taborda e casario fronteiro e ao redor dele e da Igreja Matriz de Santo Antõnio jltaverava, MG); Conjunto arquitetõnico,urbanístico e paisagístico da cidade de Cuiabá IMT)l Palácio Tiradentes Iria de Janeiro, RJ); Conjunto arquítetõnicoe paisagístico de Corumbá IMS)l Parque Nacional da Serra da Capivara (São Raimundo Nonato, PI), Parque Zoológico

do Museu Emílio Goeldi IBelém, PAj. Cine-Teatro Central e as pinturas a ele integra-

das(Juizde Fora.MG).

A PRÁTICA Dt TOABAA[NTO: 1970-1990

209

'Y 6

Nesse total, além dos 74 processosarquivadosque foram abertos a partir de

Em entrevista. Lúcio Costa definiu o 'ecletismo arquitetõnico':'Cada obra seguia um estilo característico do seu gênero, um estilo histórico, digamos assim. Uma casa não obedecia

1.1.1970, incluem-se mais quinze processos abertos antes dessa data, mas que foram arquivados durante as décadas de 1970 e 1980 desses números não são exatos,

às mesmas linhas de um prédio comercial. Havia um receituário a ser seguido. As igrejas eram românicas. góticas ou barrocasl os bancas se pareciam com palácios italianosl os

pois em alguns processos não foi possível definir a data do arquivamento).

edifícios públicos imitavam o estilo Luís XV ou LuasXVI e por aí ía. passando. naturalmente.

Em 12 dos 135 pedidosque resultaramem tombamento,não foi possível identificar

pelo estilo colonial português,pelo normando etc.'(Fo/ha de São Pau/o,Caderno Mais,

a origemda solicitação.seja porqueos processosnão se encontravamno Arquivo

15.8.93, P. 6).

Central do IBPC, seja porque neles não foi possível localizar essa informação.

Cf. capítulo 3, nota 28 Já na França, em 1980 - o Ano do Patrimõnia - foram identificadas cerca de seis

17

Lúcio Costa refere-se aos processos 855-T-70 (Rua da Glória), 853-T-72 (Rua

mil associaçõesem todos os domíniosdo patrimónioILéniaud, 1992, p. 104).

Mayrink Verga) e 854-T-72 crua da Quitanda). todos pedidos encaminhados por ele.

Cabe observar que, entre os pedidos de tombamento encaminhados por prefeituras

10

e assembléias legislativas, dezoito foram arquivados, e apenas nove resultaram em

A partir de 1979, a Divisão de Estudos e Tombamentos (DET) e a Divisão de

tombamento.

Conservação e Restauração IDCR) foram fundidas na Divisão de Tombamento e

Conservação(DTC). A antropóloga Eunice Durham considera que 'a idéia de 'comunidade' é um mito da nossa transformação política. Todo conceito de comunidade está preso à noção de igualdade, de convivência etc. Pensar na comunidade urbana é muito complicado, se não totalmente falso. E não há nada de que se fale mais no país ultimamente

'9

P. 69-79)

a '0 ato discrlcianário é a proleção, na prática, da faculdade discricionária ou poder

do que em comunidade.E a coisa que menos existe e sobre a qual mais se fala' 11

jem Arantes[org.],1984,p. 55).

discricionário,possibilidadede agir ou não, de operar ou não dentro de uma área perfeitamente circunscritapelo direita.

A Casa Modernistafoi tombadaem 14 de agosto de 1986 pela Sphan,juntamente

Opondo-se ao ato vinculado, que é a manifestação obrigatória da administração

com duas outras casas de Warchavchik,a partir de propostaencaminhadapela 9:

desde que o beneficiário do ato tenha preenchido os requisitos fixados pela lei, o

DR

ato discricionáriomovimenta-senum campo muito mais livre, visto ser a manifesta-

Devo esses números à pesquisadora do IBPC, Mana Alice Siaines de Castra. Aas

ção unilateral da vontade da administração que, fundamentada em regra objetiva de direito. que a legitima e Ihe assinala o fim livremente. se concretize desvinculada

vinte tombamentos compulsórios relativos a processos abertos a partir de 1970 acrescen-

de qualquer lei que Ihe date previamente a oportunidade ou conveniênciade conduta. sendo por esse motivo mesmo insuscetívelde revisão judiciária nesse campo' (França.

tam-se mais três, relativos a processos abertos no período anterior. 13

Sobre o lugar dos arquitetos modernistas no seu campo profissional específico, diz Louro Cavalcanti: 'A vitória dos 'modernos' no prédio do MES. na conquista da primazia de criação de um órgão de Património e na afirmação de um discurso ético elegendo

a habitação popular como objeto privilegiadode atuação jver Cavalcanti,1987), torna-os 'dominantes' no campo arquitetõnico, havendo logradotecer argumentos em todos os planos

de um debate colocado,ao qual passama recolocarem outros termos e constituirnovos enunciadospara esse mesmo campo-' (1991, p. 75) 14

Cf. mesa-redonda sobre tombamento ISphan. Revfsfa do Pafdmõnfo, na 22, 1987

O mesmo argumento foi utilizado na França em 1988. a propósito da proteção ao imóvel onde funciona o tradicional restauranteFauquet's, na medida em que o objetivo era preservar

1978,P.465-466) 21

Os técnicosda Sphanponderavamque o uso da área do terreiro impediao cumprimento das exigências do tombamento, na medida em que o ritual religioso podia

determinaralteraçõesno espaçofísico do local, como corte de árvoresetc. Se permitidoesse uso de um bem tombadopela Sphan,ficaria difícil impediroutros tipos de alterações.como modificaçõesem fachadas. em volumetriaetc., enfraquecendose assim o instituto do tombamento. O mesmo tipo de problema foi objeto de discussão no caso do tombamento do conjunto habitacional Avenida Modelo, Rio de Janeiro, tombado em 1985. Nos dois casos, como no do Santuário do Bom Jesus da Lapa. Bahia. em 1958

justiça considerou essa inscrição incompatível com a lei de 1913, que se refere a "bens

jver capítulo 41alegava-seque o tipo de uso desses bens pelas classes populares era incompatívelcom o tombamento,e que não seria correto impor a essas classes valores

móveis e imóveis' japud Léniaud, 1992, p. 119-120).

culturais que lhes eram estranhos.

não o imóvel, sem maior valor arquitetõnico, e sim a marca. Em 1990, uma decisão da

210

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

A PRATICA DE TOABAAlINTO: 1970-1990

211

T Já os antropólogos,favoráveisa esse tipo de tombamento,consideravamque o

CONCLUSÃO

mais importante.no caso, era a significaçãosimbólicae política desse ato, que por si só justificava o risco de eventuais irregularidades"técnicas'. Para esses antropólogos, a posição dos técnicos do grupo de pedra e ca/ apenas confirmava o caráter elitista da compreensão que tinham do tombamento e da própria atividade de preservação exercida

lt

pelo Estado. a

Arqueológico. Etnográfico e Paisagístico (ng 931. a

il-.

Embora concorde com a crítica do arquiteto aos pressupostos que fundamentaram o pedido

Tombam templos. Tombam prédios. Não falta tombar mais nada

de tombamentodo presépio,considero que, nessecaso, não seria difícil recorrera outros

q+'-,.

1:

O Terreiro da Casa Branca foi inscrito em 14.8.86 no Livro Histórico(na 504) e no Livro

Fujamos,fujamos Antes que a noite seja tombada.

argumentospara inscrevê-lo no Livro de Belas Artes. 24

8

IHh

Devo estes esclarecimentos aos arquitetos Antânio Pedro Alcântara e Ferrando Madeira.

QuadHnhacomposta por Manuel Bandeirano final de uma Em 1938, os 'morros do Rio de Janeiro' já haviam sido inscritos, genericamenteusem

longa reunião do Conselho Consultivo. citada de memória

especificações),nos Livros Histórico e de Belas Artes. Como se verificou ao longo dos anos,

por Afonso Arinos na 12# reunião, em 13.1.1987.

esse tipo de Inscrição não provocouos efeitos de proteção desejados.

8

A partir de maio de 1992. quando o Conselho Consultivofoi reconduzido,passaram a integrálo representantes do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente jlbamal e do lcomos. O número de membros nomeados, enquanto personalidades,

aumentou de dez para treze. 27

O objetivo deste trabalho foi acompanhar a trajetória da política federal de

Uma das raras ocasiões em que ocorreu esse debate foi a propósito do tombamento do Terreiro da Cata Branca.

presewação do património histórico e artístico nacional, com vistas a apreender

de que modo essa política pública foi implementada no Brasil. O principal inte-

ZB Disse a respeito o relator do processo no Conselho Consultivo. José Mindlin: 'Trata-se de

inovaçãoem matéria de tombamento,pais visa à preservaçãode um processo industrial, e não de um monumento histórico ou artístico.

resse da pesquisafoi investigarcomo se deu, na conduçãodessa política no país. a relação entre o Estado e a sociedade civil, tomando como referência três aspectos: a representação de património construída através da seleção e da valoração

de bens culturaisl os instrumentosutilizados para sua proteçãol os agentes que

se envolveram com essa prática. Procurei inicialmente analisar, de um ponto de vista sociológico, as noções de património

e de preservação, partindo do pressuposto de que a prática de proteção

aos bens culturais constitui, nas sociedades modernas do Ocidente, um fato social (capítulo 1)1 em seguida, procurei acompanhar o modo como essas noções foram historicamente construídas no contexto da modernidade ocidental (capítulo 2).

Na consideraçãoda prática de preservação como fato social (capítulo 1), tomei como base três pontos: a construção de uma ordem jurídica próprias a utiliza-

ção do patrimóniocomo forma de comunicação sociall a instituição da proteção como objeto de uma política pública. Embora esses três pontos sejam comuns à

práticade preservaçãoem qualquerpaís onde ela tenha sido incorporadaàs obri212

O PATRIAÕNIO[A PROCESSO

gações do Estado, os subsídios para a análise foram buscados na legislaçãoe nos procedimentos que foram adotados no contexto brasileiro. A perspectiva com-

parativa. aliás, percorreu todo o trabalho e revelou-se recurso extremamenteútil

para a apreensãoda especificidadedo caso brasileiro.

tico como questão politicamenterelevante, merecedorade intervenção por parte do Estado.

No Brasil, essa questão emergiu no bojo do movimento modernista(capítulo 3). e foram intelectuais vinculados a esse movimento cultural que implementaram,

A reconstituição das condições de emergência de um "sentido do património"

na administraçãofederal, uma política pública que tinha como objetivoa proteção

jcapítulo 2) remeteu ao contexto da modernidade,ou seja, a práticas orientadas

do patrimóniohistórico e artístico nacional. Com o advento de um governo auto-

por valores leigos. à autonomização das diferentes esferas da vida social, e à

ritário (EstadoNovo). esses atoros se viram confrontadoscom o problemade con-

constituição dos Estados-nações. legitimada sobre noções como cidadania e inte-

ciliar sua posição de intelectuais comprometidos com valores da cultura e com

resse público. Além de atuar como mediador entre os interessesindividuais- de

uma ética do saber, com a de políticos, cujo imperativo é agir visando a alcançar

que a propriedade privada é a expressão mais evidente - e o interesse da coletivi-

resultados.A análise do programa e da prática política desenvolvidapor esses

dade, o Estado simboliza a nação e trata de promoverseus valores e objetivos.

intelectuaisno Sphan levou à conclusão de que sua atuação na burocraciado go-

bb..l

A instituição da idéia de património está, portanto, na confluência desses dois pro-

verno getulista foi bem sucedida,sobretudo se lovarmos em conta o prestígio de

l&E

cessos: o de demandas da sociedade e o da iniciativa do Estado.

que a instituição (Sphan) e seu diretor (Rodrigo Meio Franco de Andrade) gozavam

'+'h.. [

1} w-l.

]

n

Como ocorre com outras políticas públicas, também nesse caso a ação do Es-

tado, no sentido de proteger bens culturais.é tanto mais centralizadorae autónoma quanto mais limitados sejam os mecanismosde que a sociedadedispõe para se fazer representarpoliticamente,e tanto mais seletiva quanto mais identificadoeste-

tanto entre os governantesquanto no meio intolectual,junto à opiniãopúblicae até no exterior. Outro indicador de seu sucesso foi a inusitada continuidadedo modelode atuaçãoimplantadono Sphan nos anos 30 e 40, que perduroupor mais

de três décadas.

ja o Estado com interesses (económicos.políticos,simbólicosetc.) de grupos es-

Por outro lado, era natural que esses intelectuais participassem de um governo

pecíficos. Ou seja, as políticas públicas de preservação e as representações do

autoritário com alguma dose de ambigtlidade, em vista do inevitável compromisso

patrimóniocultural nacional construídas pelos agentes dessas políticas reprodu-

com o regime político vigente. E o que denominei "autonomia para a instituição'

zem as contradiçõese os conflitos que se manifestamno contextomaior das relaçõesentre Estado e sociedade.

Indicavasou relativoisolamentono aparelho estatal e na sua relação com a sociedade. Essa situação, no entanto, só foi ser objeto de crítica nos anos 70 (capítulo

Mas, em decorrênciade vários fatores - o lugar que essa política estatal ocu-

4), quando o modelo consolidado no então lphan se revelou inadequado para en-

pa na administração pública, as estratégias desenvolvidas pelos atores que a con-

frentar os novos impasses que surgiam para a preservação. Nesse momento de

duzem e o grau de participaçãoda sociedadena sua implementação- o campo dessa política adquire. em cada país e a cada momento,contornos específicos.

crise de legitimidadedo regime militar, abriu-se espaço no governo foderal para

Em termos gerais, essas políticas se desenvolveramconforme dois grandes mo-

sobre o património. Na burocracia estatal. o surgimento de atores com um novo

delos: o modelo francês, em que o poder de iniciativa se concentra no Estado,

perfil, liderados por uma figura também carismática que foi Aloísio Magalhães.

e o modelo anglo-saxão. em que a sociedade civil se organiza para participar

levou a uma ressemantizaçãodas noções de património e de proteção, à intro-

dessa tarefa.

dução de conceitos novos. como referência e bem cu/fura/, e à busca de métodos

Na segunda parte. abordei a trajetória da política federal de preservaçãodo património no Brasil. E, embora a pesquisa tenha se concentrado nas décadas de

1970 e 1980, quando foi formulada uma proposta de democratizaçãoda política cultural do MEC, foi necessário remontar ao início do século XX. momento em que se começou a considerar, no Brasil, a proteção a bens de valor histórico e artís-

214

O PATRIAõNIO [A PROCESSO

uma reformulaçãoda política cultural e para a elaboração de um novo ideário

modernosde atuação. Aos recortes clássicos da história e da arte preferiu-sea noção mais abrangente de memó/fa. Um dos principais objetivos desses novos atores era vincular a questão da cultura às áreas politicamentefortes do governo. como a do planejamentoeconómico. Enfatizava-seo potencial dos bens culturais -

noção considerada mais abrangente que a de património, identificada à cultura

CO NCLUSÃO

215

T luso-brasileirae aos valores da classe dominante- como geradoresde valor eco-

A prática efetiva de proteção a bens de valor histórico e artístico nacional con-

nómico e como indicadores para a elaboração de modelos de desenvolvimento

tinuou, porém, a ser exercida no âmbito da Secretaria do Património Histórico e

adequadosà realidade brasileira. Retomava-se,também, no contexto da política

Artístico Nacional (Sphan), primordialmente por meio de tombamentos, e ainda com

cultural, a temática do Imperialismoe da dominaçãocultural dos países desenvol-

predominância dos critérios formulados pelos intelectuais modernistas, sobretudo

vidos: mais que nos anos 30 e 40, o apelo a idéias nacionalistasfoi explorado

os arquitetos. nos anos anteriores. A análise dessa dupla orientação da política

no discurso de Aloísio Magalhães.

federal de presewação durante as décadas de 1970 e 1980 - a linha da pedra e

A reação a essas propostas foi, naquele momento, diferenciada. Junto aos go-

ca/ e a linha da referéncü - demonstrou que, embora as relações entre os dois

vernos militares da fase de abertura, elas oncontraram amplo apoio e recepti-

grupos fosse freqtlentemente marcada pelo antagonismo, as idéias desenvolvidas

vidade, levando a uma reestruturação da área cultural dentro do MEC. Junto à opi-

no CNRC, e as propostas encaminhadas por esse setor para tombamento de bens.

nião pública, foram, em geral, identificadas a uma nova visão, mais atualizada,

contribuíram para provocar um proveitoso processo de discussão dos critérios de

dos problemas culturais no Brasil. Entretanto, junto ao meio intelectual e, sobre-

valoraçãoaté então acentossem maiores discussões,porque pautadospela auto-

tudo, junto à comunidadeacadêmica,então bem mais organizadae independente

ridade de Rodrigo Meio Franco de Andrade e, sobretudo, de Lúcio Costa.

que na primeira metade do século, a posição ambígua dos agentes institucionais,

A pesquisa nos processos de tombamento (capítulo 5) veio demonstrar que.

que se apresentavamcomo mediadoresentre os grupos identificadoscom a cul-

na realidade, essa revisão de critérios e de normas de atuação Já vinha ocorrendo

tura popular e o Estado, era vista com desconfiança, embora raramente tenha sido

dentro do próprio lphan, desde o início da década de 1970 (conforme ficou evi-

objetode críticasmais contundentes.O que se censuravana atuaçãodo Centro

dente na polêmica sobre o tombamento de prédios da Avenida Rio Branco), em

Nacionalde ReferênciaCultural (CNRC),criado em 1975 e, posteriormente,incor-

decorrência de mudanças nos campos disciplinares relacionados com a preser-

porado à FundaçãoNacional pró-Memória,era, além de uma imprecisão concei-

vação. Os novos problemas que se apresentavam' à proteção de monumentos.

tual. uma indefinição ideológica, na medida em que se postulava o reconhecimento

sobretudo nos centros urbanos, em franco processo de remodelação, também

da diversidade cultural brasileira mas não se explicitavam as desigualdades e as

exerciam pressão sobre os funcionários do lphan, apontando para a necessidade

relações de dominação.

de mudanças.

A proposta de democratização da política cultural do MEC, formulada no docu-

Sintetizando os resultados da pesquisa, ficou claro que, durante essas duas

men\o Diretrizes para operacionalizaçãoda política cultural da MEC, de q98q,

décadas. ocorreram mudanças significativas na representação de nação cons-

visava a. de algum modo, incorporar uma revisão crítica do modelo de atuação

truída via património histórico e artístico nacional no Brasil. Foram incluídas pro-

inicial do CNRC, que entendia a mudança como modernizaçãodo conceito de

duções referentes às diferentes etnias, aos grupos de imigrantes e às zonas de

património e dos instrumentos de preservação. Nesse documento, elaborou-se

ocupação recente do território nacionall exemplares da cultura popular e do mundo

uma visão mais politizadada questãodo patrimõniolna verdade,desde o final dos

industriall passaram a ser considerados estilos artísticos que, antes, eram excluí-

anos 70, membrosdo grupo da "referência"procuravamrelacionar a questão do

dos em função de uma visão canónica de arquitetura. Entretanto, essa imagem oó-

patrimónioà luta pela cidadania.

/effva da nacionalidade ainda está longe de ser representativa da pluralidade

Entretanto,em conseqtlênciade inúmeros fatores, sobretudo de dificuldades internas à área da política foderal de património, essas idéias se disseminaram

cultural brasileira. Os instrumentos de proteção continuaram praticamente os mesmos: o tomba-

apenas no nível do discurso oficial. não chegando a transformar substancialmente

mento para bens imóveis e os museus para a guarda dos acervos de bens móveis.

a prática de preservação. Mas foram incorporadas à Constituição Federal de 1988,

A pesquisade outrasformasde proteção,apesarde ser reconhecida como im-

nos artigos 215 e 216.

prescindível,ainda está por ser feita.

216

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

CONCLUSÃO

217

T Também a relação entre a instituição estatal e a sociedade pouco mudou. Se

houve um aumento significativo na participaçãode agentes externos nos pedidos

um reforço ideológicode um nacionalismodo Estado, ou que seu objetivo tenha

de tombamento, as instâncias decisórias continuaram restritas ao Conselho Con-

sido apenas o de legitimarprojetos de governos autoritários,o fato é que a idéia

sultivo - cuja composiçãosomente em 1992 passou por uma mudança visando

de fomentar um sentimento de nacionalidade está na base da noção de património.

a aumentarsua representatividade- e ao corpo técnico da administraçãocentral

Retomemos, agora, à questão proposta no início deste trabalho: teria a política

da Sphan, que produz os pareceres técnicos com as indicações para tombamento

de preservaçãodesenvolvidapelo Estadobrasileirodesdeos anos 30 se limitado.

(ou não). Como na grande maioria dos casos, o ConselhoConsultivo se limitou a ratificar essas indicações,e como as delegadas regionaisdo órgão tinham uma

na sua trajetória.a funcionarcomo um recurso para legitimaçãodas ações seletivas desenvolvidas pelos diferentes governos tendo em vista os interesses dos

participação limitada à produção de pareceres, pode-se caracterizaro processo

grupos dominantes?Ou teria essa política conseguidoalcançar, em suas realiza-

de seleção e valoração de bens para integrarem o património cultural brasileiro,

aditado durante as décadas de 1970 e 1980, como altamente especializado e cen-

ções. um sentido social mais abrangente. indo ao encontro de demandas (ainda que nem sempre explicitadas)da sociedade?E, independentementedas duas al-

tralizador.Entretanto,as circunstânciasque. nos anos 30 e 40, justificavamessas

ternativas, a que se deve o baixo nível de participação da sociedade brasileira

característicasenquanto estratégiasnão mais existiam nos anos 70, e. sobretudo,

em face da questão da preservação? Refiro-me à participação social, em três sen-

a partir de meados dos anos 80.

tidos: no de incorporação,à imagem de nação construídaatravés do património.

O desmantelamento da área da cultura,no início do governoCollor,produziu

da pluralidade cultural brasileirasno de mobilização da sociedade - através da

tabilidade.Reorganizada a partir da reestruturação institucional(extinção da Sphad

imprensa, de sindicatos e outros órgãos de classe, da organizaçãode grupos e associações,ou mesmo por meio de manifestaçõesmais restritas, como cartas.

FNpM e criação do IBPC), da recondução do Conselho Consultivo em maio de 1992.

abaixo-assinadosetc. - relativamente a questões da preseívaçãol no de alteração

e da retomadada prática de tombamentos.essa políticaestatal se vê, atualmente.

nos mecanismos decisórios institucionais, de modo a possibilitar a reprosentação

frente a uma nova realidade e a novos problemas.

de diferentes grupos sociais (seja em termos de categorias profissionais,temas

uma quebra na continuidadede uma política estatal que se caracterizavapela es-

11

política de preservação,iniciada no Estado Novo, tenha se reduzido a ser mais

Nesse meio tempo, a descentralizaçãoiniciada nos anos 70 consolidou-se,

ou causas, contextos culturais etc.) na construção do património histórico e artís-

com a disseminação das secretarias de cultura e de órgãos estaduais e municipais

tico nacional. Essas questões se tornam tanto mais procedentesquando compa-

de preservação. No nível estadual. tem predominado nos órgãos que trabalham

ramos a receptividade da sociedade à questão do património à reação que essa

com património a tendência para a exploração turística do património local, como é patente nos estados do Nordestel no nível municipal, vêm sendo desenvolvidas

mesma sociedadevem tendo, nos últimos anos, à questão do meio ambiente. A análise dos dois momentosmarcantes dessa política pública - o momento

experiências inovadoras. a partir do conceito de cidadania cultural, tendo sido pio-

fundador, nos anos 30-40, e o momento renovador, nos anos 70-80 - indicou que,

neira, nesse sentido. a SecretariaMunicipal de Cultura de São Paulo. durante a

mesmo em períodosautoritários.a política estatal de patrimónionunca se reduziu

gestão da prefeita Luísa Erundina.

a um recurso ideológico do Estado. Em ambos os períodos analisados, o esforço

A instituição federal de preservação do património deixou, portanto, de consti-

dos intelectuais que atuaram como mentores da política federal de preservação

tuir a única alternativapara a proteçãode bens de valor histórico e artístico. No

foi no sentidode criar um campo próprio, com relativa autonomiadentro do gover-

exercíciode sua função, vê-se, inclusive.frente à necessidadede definir com cla-

no, para a implementaçãode um prometopara a cultura brasileira. Nos anos 30.

reza o que entendepor valor nacionalde um bem, na medida em que, hoje, já existem alternativas de proteção em nível estadual e municipal.

esse prometose voltou para a construçãode uma tradição cultural que fosse, ao

Além disso, o declínio dos nacionalismospriva a prática de preservação de seu principal recurso de legitimação. pois, embora não se possa dizer que a

218

O PÂTRIAõNIO EA PROCESSO

mesmo tempo, universal e autenticamentenacionall nos anos 70, o objetivo era ampliar e atualizar a representação da cultura brasileira construída pelas instituições estatais relacionando-acom interesseseconómicose sociais, prometoque

CONCLUSÃO

219

T

'tl

]

g.

se encaminhou,posteriormente,para a vinculaçãoda questãocultural aos direitos

tuição desenvolveuestratégias para resistir a pressões externas e manter as

da cidadania. Essa função que alguns intelectuais brasileiros exerceram, como

decisõesem um nível estritamentetécnico. Instaurou-se,assim. uma forma fe-

únicos mediadoros possíveis entre o Estado e a sociedade - referida como "as

chada e altamente centralizadora na tomada de decisões, que continua a mes-

massas'na fase heróicae como"os diferentescontextosculturais'na fase mo-

ma até hoje, mais de cinqüentaanos depois e em um país bastante diferente.

derna - se justificada em períodos autoritários, ou quando ainda predominava uma

Esperar que os agentes institucionais alcancem, exclusivamenteatravés de

cultura política que identificava Estado, nação e sociedade, não encontra mais

suas decisões, representatividadeem termos nacionais é incompatível com

argumentos nos tempos atuais. Trata-se, hoje, de procurar politizar a política

uma proposta que se queira democrática.

federal de preservação no Brasil, o que não significa reduzi-la a uma prática ideo-

2.

lógica, seja a serviço do Estado ou das classes que o ocupam, seja dos excluídos

mente o único recurso realmente eficaz para a proteção de bens culturais,

até hoje dos benefícios dessa política. Politizar no sentido de ter como objetivo

apesar dos debatesdesenvolvidosnas duas últimas décadassobre sua espe-

que esses bens sejam apropriados simbolicamente pelos diferentes grupos sociais

cificidade e seus limites. A pesquisa de "outras formas de acautelamentoe

que compõem a sociedade brasileira. Ou seja, tira-los da situação de "pesados

preservação', provista na Constituição de 1988, ainda está por ser feita.

e mudos' referida na introdução, e fazê-los circular no espaço público, enquanto referências de identidades coletivas e enquanto conteúdos do imaginário social.

3.

Em segundo lugar, o instituto do tombamento continua sendo pratica-

Em terceiro lugar, a persistirem os critérios tradicionais de valoração,

que dão ênfase aos aspectosformais e à dimensão estética dos bens, dificil-

A elaboração de uma versão crítica da trajetória da política federal de preser-

mente o patrimóniocultural brasileiro poderá adquirir uma significação social

vação no Brasil, que sina como base para projetos futuros, é uma tarefa a ser

mais ampla e referir a diversidade e a dinâmica culturais característicasdo

realizada. A imagem que as instituições envolvidas têm construído de sua própria

contexto brasileiro. Trata-se, portanto, de assumir uma posição crítica não

história se confunde com os mitos cultivados por seus funcionários. Para os mais

apenas em relação ao conjunto dos bens tombados,como também quanto às

antigos, a fase hera/ca (que não por acaso recebeu essa denominação) é a Idade

leituras que têm presidido os tombamentos. A Inclusão de museólogos, histo-

de Ouro do PafrlmõrTfo,cristalizada no culto à figura de Rodrigo M. F. de Andrade.

riadores e cientistas sociais nos quadros técnicos da instituiçãolá constituiu

Já para os funcionários mais recentes, que participaram da experiência do CNRN

um primeiro passo para que se elaborem leituras mais abrangentese social-

e/ou conviveramcom Aloísio Magalhães,vivia-se nos anos 70 uma invejável si-

mente mais significativas. Entretanto, é preciso incorporar efetivamente a par-

tuação de exceção no emperrado universo do serviço público brasileiro, em que

ticipação da sociedadenesse processo, o que significa criar mecanismosque

o trabalho tinha o sabor de um ato inaugural, orientado com habilidade e alegria

assegurem algum nívol de representatividade a essa participação.

pela personalidado ímpar de Aloísio.

Atualmente, já não se espera de uma personagem carismática o prometoque

Essas versões mltificadoras encontram reforço na falta de diálogo, seja inter-

virá sa/var essa política da situação subaltorna em que se acha, tanto dentro do

namente entre os agentes institucionais, seja entre eles e a sociedade. E neces-

Estado como diante de sociedade. Pelo contrário, a análise da experiênciaante-

sário, portanto, elaborar uma reflexão desmitificadora, mas não desiludida, dessa

rior, se considerada à luz do momento atual, indica que o caminho é explorar os

trajetória, que procure avaliar, com um mínimo de objetividade, resultados e carên-

canais de comunicaçãoentre as instituições estatais e a sociedade.

cias, com a finalidade de vislumbrar perspectivas.

Se esse objetivonão diferemuito do que se dizia no discursooficial, desde

A partir da análise realizada, foi possível extrair algumas orientações tendo em vista a elaboração 1.

de novas diretrizes.

1937, e, sobretudo,a partir das D/refrizes,os termos dessa relação se modificaram bastante. O Estado não se apresenta mais como protagonista do desenvolvimento

Em primeiro lugar, dificilmente o universo do património se tornará real-

nacional nem como porta-voz exclusivo dos anseios da nação. Na mesma linha,

mente representativo da diversidade cultural brasileira enquanto persistirem

a noção de cidadaniadeixou de ser entendidacomo uma concessãodo Estado-

os atuais procedimentospara seleção de bens. Desde seus primórdios,a insti-

como ocorreu no período estadonovista- e passou a ser consideradacomo um

220

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

CO NCLUSÃO

221

T conjunto de direitos a serem conquistados e estendidos a toda a sociedade. Nesse

contexto,a idéiade naçãose tornaindependente da tule/ado Estado,e a socie-

primeira de construir e proteger o património cultural nacional. Ainda que o traba-

dade civil emerge como ator político.

lho já realizado seja significativo, esse processo é contínuo e dinâmico. tanto no

Essa nova conjuntura tem impacto sobre as políticas culturais, que passam

sentido da inclusão de novos bens quanto da leitura dos bens já sob proteção

a buscar legitimação,sobretudo na idéia de direitos culturais. Nessa nova perspectiva, não tem mais sentido que os agentes institucionais se considerem os úni-

legal. O que quero dizer é que, no momento atual, a ênfase deve se voltar para ações, pontuaisou não, que contribuam para introduzir a questão do património

cos porta-vozesdos interessesda sociedadesesta. por sua vez, vê na sua capaci-

no universo das questões de interesse para a sociedade brasileira.

dade de organizar-se e de encaminhar suas demandas - sejam elas na área eco-

nómica, social ou cultural - o caminho para o exercício da cidadania.

}

Não estou propondo que a instituição federal abandone sua responsabilidade

Mais uma vez parece correto buscar em Mário de Andrade inspiração, retomando criticamenteseu ideal de coletivizaçãoda cultura e sua concepçãoampla

sobretudo na área da cultura, como conseqtlência natural do processo de demo-

e dessacralizadade património. Digo criticamente porque a função dos agentes institucionaisque hoje trabalhamnesse campo se propõe como bem diferente do

cratização política, como ocorreu om países de tradição cultural enraizada, como

papel que se atribuíram os intelectuais que atuaram na área federal da política de

a França, ou historicamente construídos sobre valores democráticos, como os

preservação,tanto nos anos 3040, quanto nos anos 70-80. Funcionáriospúblicos

B

Estados Unidos. Aqui, dada a extrema carência de bens materiais e simbólicos

de um Estado democrático mas cuja estrutura se acha em fase de questionamento

entre numerosos setores da população, e dados os processos de marginalização

por parte da sociedade, atualmente a função mais importante desses agentes é

c.

e mesmo exclusão de parcela significativa da sociedade nacional, desenvolver

contribuirpara que o maior número possívelde pessoas possa efetivamenteexer-

uma política cultural democrática é um Imenso desafio para seus mentores. tanto

cer seus direitos culturais. No caso do património, o simples ato de garantir a per-

maior quanto mais distantes estejam das comunidadeslocais. E inevitável. por-

manência,no espaço público - por exemplo, em uma cidade - de bens que cha-

tanto. que esses agentes assumam um papel mais ativo junto à sociedade, caso

mam a atenção por sua beleza. por sua riqueza ou apenas por seu poder de evo-

contrário correm o risco de não alcançarem mais que aqueles poucos setores já

cação.e que foram subtraídosao uso e/ou posse exclusivamente privadospara

tradicionalmente sensibilizados para questões culturais. ou, especificamente, para

poderem se comum/carcom quem queira deles se aproximar. servindo como refe-

o interesse na presewação.

rências de identidadescoletivas e como fonte de prazer estético, contribui para

)

Seria ingênuo. no entanto, supor que, no Brasil, essas transformações surjam,

l

a

No estágio anualda questão do património no Brasil, a atuação do órgão federal de preservação deveria ter um caráter eminentemente didático e exemplar. Didático não apenas quanto a desenvolver ações voltadas para a difusão de um sen-

dar visibilidadeà abstratanoçãode res puó/fca.Mas é evidenteque essa ação fará tanto mais sentido quanto mais amplamente esses bens possam ser /Idos e apreciados,numa apropriaçãoativa, que contribua para o enriquecimentode cada

cidadãoe da coletividadecom um todo.

ffdo do património e do interesse social na preservação jinteresse que, em se tratando do meio ambiente, já se tornou praticamente um consenso), como também

Por outro lado, seria uma imperdoávelingenuidadesupor que a ação volunta-

quanto a se instrumentalizar para recorrer aos canais já existentes - mas muito

rista de agentes estatais possa corrigir desigualdades produzidas em outras es-

pouco utilizados com essa finalidade - para se comunicar com a sociedade (educação formal e informal, instrumentos de referenciamento e informação, meios de comunicação, interface com outras políticas públicas. incentivos etc.). E exemplar no sentido de que as ações específicas de proteção - tombamentos. inventários. registros etc. - não precisam mais ser necessariamente extensivas e abrangentes,

na medida em que já existem órgãos locais para esse fim. mas devem sewir para

O PATRIAÕNIO[A

Além disso, é preciso não esquecerque as políticas culturais, em geral, e as políticas de preservação,em particular.têm um alcance restrito. se comparadascom

outras políticas públicas. Os efeitos mais evidentes das políticas de preservação se manifestam nos ambientesurbanos, na configuraçãodo espaço das cidades, sobretudodas cida-

explorar novas possibilidades na linha da idéia de cidadania cultural.

222

feras da vida social, ou que o exercício dos direitos culturais possa ser assegurado por sua enunciaçãoem textos oficiais ou pelo tombamentode bens materiais.

PROCESSO

CO NCLUSAO

223

T R[FERÉNCIAS BIBHOGRÁl:OCAS

des antigas. é claro. Mas, se considerarmos o espaço físico e o que o homem

nele produz como uma riqueza social, fruto do trabalho coletivo de gerações, parte, portanto, da história da nação, o interesse na preservaçãodeixa de se limitar apenas à proteção de valores culturais restritos, nos limites das concepções tradicionaisde história e de arte. Abre-se,assim, no patrimóniolugar para as produções visualmentemenos imponentes,para os objetos modestos, para saberes e fazeres. E. no nível simbólico, tornam-se possíveis leituras menos limitadoras. Mas, para que essa ampliação (material e simbólica) do património seja possível, não se deve vincular a produção dos bens culturais - que é fruto do trabalho coletivo - à sua posse (em termos de apropriação,seja quanto a pro-

)

11.

) J

priedade e/ou uso, seja quanto a referência a uma Identidadecoletiva) por indivíduos, grupos ou classes sociais. Pois o sentido mais profundo do tombamento federal é justamente o de recuperar essa dimensão social de determinadosbens que, exemplar e concretamente.referem a coletividade nacional. Não uma cole-

)

a

c.

tividade harmónica e artificialmente representada, mas o lugar onde se manifestam

identidades múltiplas, diferenças, desigualdades e conflitos. Dentro dessa visão, a presewação passa do estatuto de exceção para o de norma,e o interesseem destruir passa a ser avaliado a partir de uma perspectiva

ALENCASTRO, Luís Felipe de. Não sabem dizer coisa certa. Rev/sfa Bías#eira de Cféncüs

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Considero, porém, que as transformaçõesocorridas nas décadas de 1970 e 1980, se devidamenteincorporadasa propostasatuais para uma políticafederal de

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ção do patrimóniocultural no Brasil. E, quem sabe, contribuirãotambém para que

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O PATRIAÕNIO

[A PROCESSO

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.A 'FcÀ

236

O PAIRIÁÕNIO EA PROCESSO

l

ÂN[XO l CRONOLOGIA

19n

DA POLITICA DE PR[S[RVACÁO NO BRASIL

Mário de Andrade elabora, por encomenda do ministro Gustavo Capanema, anteprojeta

para criação de um serviço federal de proteção ao património. O Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional ISphan) começa a funcionar

em caráter provisório.sob a direção de Rodrigo Meio Francode Andrade. IW7

l b

regulamenta o Instituto do tombamento.

IHI

E promulgado o decreto-lei Re3.866, de 29 de novembro de 1941, que dispõe sobre o cancelamento do tombamento pelo presidente da República.

B

196

l

Em 30 de novembro de 1937 é promulgado o decreto-lei Re 25, que cria o Sphan e

O Sphan passa a denominar-se Departamento do Património Histórico e Artístico Nacional (Dphan).

IHI

E promulgada a lei Re3.924, de 26 de setembro de 1961, que dispõe sobre a proteção aos monumentos arqueológicos e pré-históricos.

19m

RodrigoMeio Franco de Andrade se aposenta, entregandoa direção do Sphan a Renato Soeiro.

1970

Realizaçãode reunião de govemadores para tratar da questão do património histórico e artístico nacional e elaboração do documento Compram/sso de Brasilh.

O Dphan se transforma em Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional jlphan). 1971

Realização de reunião com govemadores recém-empossados sobre o mesmo tema e elaboração do documento Compromisso de Sa/fiador.

1973

Criação,junto à Seplan, do Programa de Reconstruçãodas Cidades Históricas (PCH)

1974

Início da gestão de Ney Braga no MEC

1975

Elaboração,no MEC, do documento Po/#lca r7aciona/de cu/fura Criação do Centro Nacionalde Referência Cultural (CNRC). Promulgação da lei RQ6.292. de 15 de dezembro de 1975, que torna obrigatória a

homologaçãopelo Ministro da Educação e Cultura de tombamentos e de cancelamentos realizados no âmbito do lphan.

1976

Aprovação do regimento interno do lphan.

As ruínas de São Miguel das Missões são inscritas na lista do PatrimónioCultura da Humanidadeda Unesco.

Renovaçãodo convêniodo CNRC.

Incorporação da CinematecaBrasileiraà FNpM.

O PCH é estendido aos Estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro.

Incorporaçãodo Museu Lacar Segall à FNpM.

Início da gestão de Euro Brandão no MEC.

Incorporaçãodo Sítio SantoAntõnio da Bica Ide propriedadede Burle Marx) à FNpM.

Assinaturado termo aditivo ao convênio do CNRC.

Extinção da SEC e criação do Ministério da Cultura IMinC), que é assumido por José

Início da gestão de Eduardo Portella no MEC.

Aparecidode Oliveira.

Aloísio Magalhãesassume a díreção do lphan.

Criação.no âmbito do MinC, da Secretaria do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional

O PCHé integradoao lphan.

ISphan)e da Secretariade Ação Cultural (Seac).

Realizaçãodo Semináriode Ouro Preto, que inauguraa práticade diálogo com as

AngeloOsvaldode Araújo Santosassume a direção da Sphan.

populações dos Centros Históricos tombados.

José Aparecido de Oliveira deixa o MinC para assumir o governo do Distrito Federal

Realizaçãode Seminário na Escola Superior de Administração Fazendária IEsaf), em

Elaboração do documento Comproméso cu/fura/ da A/ova Repúb/lca.

Brasília,reunindofuncionáriosdo lphan, do PCH e do CNRC.

AluísioPimentaassumeo MinC. Criação, no âmbito do MEC, da Secretaria do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional Rícardo Claglia assume a presidência da FNpM.

ISphan) e da FundaçãoNacional pró-MemóriaIFNpM).

Realização,em Brasília.de dois seminários no MinC, um com representantesda

Aloísio Magalhães é nomeado secretário da Sphan e Presidente da FNpM.

sociedadecivil e outro interno, de que resulta o documento Po/arcacu/fura/.

Aprovaçãodo estatutoda FNpM. A cidade de Ouro Preto é inscritana lista do PatrimónioCultural da Humanidadeda

O Centro Histórico de Salvador e o Santuário de Bom Jesus de Matosinhos,em Congonhasdo CampoIMG), são inscritos na lista do PatrimónioCultural da Huma-

Unesco.

nidadeda Unesco.

Início da gestão de Rubem Ludwig no MEC.

Início da gestão de Celso Furtado no MinC.

Criação da Secretaria da Cultura (SECAdo MEC. A Sphan e a Secretaria de Assuntos

JoaquimFalcãoassumea presidênciada FNpM

Culturais (Seac) transformam-se em Subsecretarias.

Aprovaçãoda Lei Samey. Elaboração, em seminário da SEC, do documento D/refrlzes para operam/ona/lzação

da política cultural do MEC.

Aprovaçãodos estatutosda Sphane da FNpM.

Aloísio Magalhãesmorre em Veneza.

O Parque Nacionalde lguaçu é inscrito na lista do Património Cultural da Humanidade da Unesco

MarcosVinícios Vílaça assume a SEC. 1987

Início da gestão de Esther de FigueiredoFerraz no MEC.

FNpM

niaa da A cidade de Olínda é Inscrita na lista do PatrimónioCul ural da Humanidade Unesco.

O Plano Piloto de Brasília é Inscritona lista do PatrimónioCultural da Humanidade

da Unesco

Incorporaçãodos museus da Fundação RaymundoOttoni de Castra Maia e do Museu

de Biologia Meio Leitão à FNpM.

240

Osvaldo José de Campos Meio é nomeado secretário da Sphan e presidente da

Promulgaçãoda Constituiçãodo Brasil. em que os artigos 215 e 216 se referem

especificamente à cultura.

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

ANEXO 1: CRONOLOG]ADA POLí]]CA Dt PRESERVAÇÃONO BRASIL

241

V

IW7

Criaçãoda FundaçãoCulturalPalmares.

Realização.em Fortaleza, do SemináHo Pafdmõnio fmafeHa/:esbaféghs e fo/mas de

profeção,de que resultoua Ca/la cb Foda/eza.

José Aparecidode Oliveira assume o MinC.

O Programa Monumenta é transferido para o Ministério da Cultura.

Augusto Cáries da Silva Teles é nomeadoPresidenteda FNpM.

19W

Portariado Ministro da Cultura cria Comissão e Grupo de Trabalho para elaborar propostade acautelamentodo patrimónioçultural imaterialbrasileiro.

19W

Augusto Cartas da Silva Teres é nomeado Secretário da Sphan.

Criação,no âmbitodo Ministérioda Cultura,da Secretariade Património,Museuse Artes Plásticas,assumida por Octávio Elísio Alves de Brito.

halo Campofioritoé nomeado secretárioda Sphan e presidenteda FNpM.

Carlos Henrique Heck assume a presidência do lphan.

Extinção do MinC e criação da Secretaria da Cultura, diretamente vinculada à

Ediçãodo decreto presidencial ne3.551 , de 4 de agosto de 2000, que institui o registro dos bens culturais de natureza imaterial e cria o Programa Nacional do Património

O Conselho Consultivo da Sphan passa a opinar também quanto ao arquivamento de processos de tombamento.

19©

19W

presidênciada República.

Imaterial.

Extinção da Sphan e da FNpM e criação do Instituto Brasileiro do Património Cultural jIBPC).

O Conselho Consultivodo Património Cultural aprova os registros do Ofício das paneleirasde Goiabeiras (ESI e da arte gráfica Kusiwa,dos índios wajãpi(AM).

Extinçãodo Conselho Consultivoda Sphan. lpojuca Pontes assume a Secretaria da Cultura, vinculada à presidência da República.

GilbertoGil assume Q Ministério da Cultura. Márcio Meira assume a Secretaria de Património, Museus e Artes Plásticas do

Lélia Coelho Frota assume a presidênciado IBPC

Ministérioda Cultura.

l®l

Sérgio Paulo Rouanet assumea Secretariada Cultura.

Mana Elisa Costa assume a presidênciado lphan.

JaymeZettel assumea presidênciado IBPC.

Reestruturaçãodo Ministério da Cultura e extinção da Secretaria de Património.

Sanção da Lei Federal de Incentivo à Cultura (lei RQ8.313, de 23.12.1991).

19U

Museuse Artes Plásticas. Reestruturaçãodo lphan e criação do Departamento de PatrimónioMaterial, do

Recondução do Conselho Consultivo do Património Cultural.

Departamento de Património Imaterial, e do Departamento de Museus e Centros Extinção da Secretaria da Cultura e recriação do Ministério da Cultura, assumido por Antõnio Houaiss.

Culturais.

E aprovada na Unesco a Convenção para a Salvaguardado PatrimónioCultural 19W

Jerõnimo Moscardo assume o Ministério da Cultura.

Imaterial, que o Brasll ratifica em 2006.

Francisco de Meio Franco assume a presidência da IBPC.

AntõnioAugusto Arantes assume a presidênciado lphan.

LuasRoberto Nascimento Salva assume o Ministério da Cultura.

O Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular saí da Funarte e passa a integrar

o lphan.

Glauco Campello assume a presidência do IBPC.

IW4

O IBPCvoltaa se chamarlphan.

A arte kusiwa dos wajãpi(AP) é proclamada pela Unesco obra-prima do Património Oral e Imaterial da Humanidade.

19H

Francisco WeffoR assume o Ministério da Cultura.

E criada, no âmbitodo lphan, a Coordenação-Geralde Pesquisa,Documentaçãoe

19n

Início da estruturação do Programa de revitalização de sítios urbanos através da

242

Referência (Copedoc).

recuperação do patrimóniohistórico Ifuturo Programa Monumental, uma parceriaentre

O samba de roda do Recôncavo Baiana é proclamado obra-prima do Património Oral

o lphane o BancoInteramericano de Desenvolvimento - BID.

e Imaterialda Humanidadepela Unesco.

O PATRIAõNIO [A

PROCESSO

ANEXO 1: CRONOLOGIADA POLÍTICA DE PREsERvAÇÃo NO BRASIL

243

E aprovada na Unesco a Convenção para a Proteção e Promoção da Diversidade das

Expressões Culturais, que o Brasil ratifica em 2007.

ANEXO ll DECRETO-Le\ N- 25, Dt 30 Dt NOV[ABRO DE 1937

Luiz Fernando de Almeida assume a presidência do lphan. cumulativamente com a direção do Programa Monumenta

É criado o Centro Regional para a Salvaguardado PatrimónioCultural Imaterial

ICrespial),com sede em Cuzco, no Peru, do qual o Brasil é um dos membros

Organiza a proteção do património histórico e artístico

fundadores.

nacional.

É criada a Câmara do Património Imaterial, vinculada ao Conselho Consultivo do Património Cultural. 2(XB

O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, usando da atribui

O Brasil é um dos países eleitos para compor o primeiro Comitê Intergovemamental

ção que Ihe confere o art. 180 da Constituição,decreta:

do Património Imaterial, órgão criado pela Convenção para a Salvaguarda do Património

Cultural Imaterial, de 2003.

2®7

CAPÍTULO I

O Brasil vara a integrar o Conselho do Património Mundial.

Do património hi!dórico e ar+ís+imnacional

O Brasil passa a integrar o primeiro Comitê Intergovernamental criado pela Convenção

para a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, de 2005. 20W

O lphan inicia processo de criação do Centro de Formação em Património para a América Latina, Caribe, e Países de Língua Portuguesa e Espanhola da Africa e da Ásia, a ser sediado no Rio de Janeiro.

Art. I'. Constitui o património histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público.

quer por sua vinculaçãoa fatos memoráveisda história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.

Criação do instituto Brasileiro de Museus (lbram).

$ 1'. Os bens a que se refere o presente artigo só serão considerados parte integrante do património histórico o artístico nacional, depois de inscritos separada ou agrupadamente num dos quatro Livros do Tombo. de que trata

o art. 4' destalei $ 2'. Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também

sujeitos a tombamento os monumentos naturais. bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pelo natureza ou agenciados pelo indústria humana Art. 2o. A presente lei se aplica às coisas pertencentes às pessoas naturais,

bem como às pessoas jurídicas de direito privado e de direito público interno. Art. 3'. Excluem-sedo património histórico e artístico nacional as obras de origem estrangeira:

1) que pertençam às representações diplomáticas ou consulares acreditadas

no palsl

244

O PATRIAõNIO eA PROCESSO

2) que adornem quaisquer veículos pertencentes a empresas estrangeiras. que

Art. 5'. O tombamento dos bens pertencentesà União,aos Estadose aos Municípiosse fará de ofício, por ordem do diretor do Serviço do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional, mas deverá ser notificado à entidade a quem pertencer.

façamcarreirano paísl 3) que se incluamentreos bens referidosno art. 10 da Introdução do Código Civil, e que continuam sujeitas à lei pessoal do proprietários

ou sob cuja guarda estiver a coisa tombada, a fim de produzir os necessários efeitos.

4) que pertençam a casas de comércio de objetos históricos ou artísticos; 5) que sejam trazidas para exposições comemorativas, educativas ou comer-

Art. 6'. O tombamento de coisa pertencente à pessoa natural ou à pessoa jurí-

dica de direito privado se fará voluntária ou compulsoriamente

çiaib. Art. 7'. Proceder-se-á ao tombamento voluntário sempre que o proprietário o 61 que sejam importadas por empresas estrangeiras expressamente para adorno dos respectivos estabelecimentos.

pedir e a coisa se revestir dos requisitosnecessáriospara constituirparte integrante do património histórico e artístico nacional, a juízo do Conselho Consultivo

Parágrafo único. As obras mencionadas nas alíneas 4 e 5 terão guia de licen-

do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, ou sempre que o mesmo

ça para livre trânsito, fornecida pelo Serviço do Património Histórico e Ar-

proprietárioanuir, por escrito, à notificação, que se Ihe fizer, para a inscrição da

tístico Nacional.

coisa em qualquer dos Livros do Tombo. Art. 8'. Proceder-se-áao tombamento compulsório quando o proprietário se CAPÍTULO II

recusar a anuir à inscrição da coisa. Art. 9'. O tombamento compulsório se fará de acordo com o seguinte processo:

Do +ombamen+a

1) o Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, por seu órgão comArt. 4o. O Sewiço do Património Histórico e Artístico Nacional possuirá quatro

petente. notificará o proprietário para anuir ao tombamento, dentro do prazo

Livrosdo Tombo, nos quais serão inscritasas obras a que se refere o art. I' desta

de quinze dias, a contar do recebimento da notificação, ou para, se o quiser

lei, a saber:

impugnar, oferocer dentro do mesmo prazo as razões de sua impugnação.

1) no Livro do Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, as coisas per-

o diretor do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional mandará

popular.e bem assimas mencionadas no $ 2' do citado art. I';

por simples despacho que se proceda à inscrição da coisa no competente

21 no Livro do Tombo Histórico, as coisas de interesse histórico e as obras

de arte histórica;

mesma,dentro de outros quinze dias fatais, ao órgão de que houver emanado a iniciativa do tombamento, a fim de sustenta-la. Em seguida.

estrangeiras

4) no Livro do Tombo das Artes Aplicadas, as obras que se incluírem na cate-

independentemente de custas. será o processo remetido ao Conselho

Consultivo do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, que

goria das artes aplicadas, nacionais ou estrangeiras.

proferirá decisão a respeito, dentro do prazo de sessenta dias, a contar do

$ 1'. Cada um dos Livros do Tombo poderá ter vários volumes.

seu recebimento.Dessa decisão não caberá recurso.

$ 2'. Os bens que se incluemnas categorias enumeradas nas alíneas1, 2. 3 e 4 do presente artigo serão definidos e especificados no regulamento

Art. 10'. O tombamentodos bens a que se refere o art. 6' desta lei será considerado provisório ou definitivo, conforme esteja o respectivo processo iniciado pe-

que for expedidoparaexecução da presentelei.

246

Livro do Tombo. 3) se a impugnação for oferecida dentro do prazo assinado, far-se-á vista da

3) no Livro do Tombo das Belas Artes. as coisas de arte erudita, nacional ou

l

2) no caso de não haver impugnaçãodentro do prazo assinado. que é fatal.

tencentes às categorias de arte arqueológica, etnográfica, ameríndia e

O PATRIÁÕNIO

[A

PROCESSO

ANEXO11: D[CR[TO-Lt] N' 25, Dt 30 Dt NOVÉABRODt 1937

247

l la notificação ou concluído pela inscrição dos referidos bens no competente Livro

Art. 15. Tentada, a não ser no caso previsto no artigo anterior, a exportação,

para fora do país, da coisa tombada. será esta seqt)estradapela União ou pelo Estado em que se encontrar.

do Tombo. Parágrafo único. Para todos os efeitos, salvo a disposição do art. 13 desta lei,

o tombamento provisório se equiparará ao definitivo.

$ 1'. Apuradaa responsabilidade do proprietário, ser-lhe-áimpostaa multade cinqüenta por cento do valor da coisa, que permanecerá sequestrada em

garantiado pagamento, e até que estese faça.

CAPITULO III

$ 2'. No caso de reincidência,a multa será elevadaao dobro. Dos efeitos

do +ombamen+o

$ 3'. A pessoa que tentar a exportação de coisa tombada, além de incidir na

multa a que se referem os parágrafos anteriores. incorrera nas penas Art. 11. As coisas tombadas, que pertençam à União, aos Estados ou aos Municípios, inalienáveis por natureza, só poderão ser transferidas de uma a outra das

referidas entidades.

cominadas no Código Penal para o crime de contrabando. Art. 16. No caso de extravio ou furto de qualquer objeto tombado. o respectivo proprietário deverá dar conhecimento do fato ao Serviço do Património Histórico

Parágrafo único. Feita a transferência, dela deve o adquirente dar imediato co-

nhecimento ao Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional.

cento sobre o valor da coisa.

Art. 12. A alienabilidade das obrashistóricasou artísticastombadas,de propriedade de pessoas naturais ou jurídicas de direito privado, sofrerá as restrições

constantes da presentelei.

Art. 17. As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum. ser destruídas, demolidas ou mutiladas. nem, sem prévia autorização especial do Serviço da Património Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas. pintadas ou restauradas,

Art. 13. O tombamento definitivo dos bens de propriedade particular será, por iniciativa do órgão competente do Serviço do Património Histórico e Artístico Na cional, transcrito para os devidos efeitos em livro a cargo dos oficiais do registro

de imóveis e averbado ao lado da transcrição do domínio.

sob pena de multa de cinqüenta por cento do dano causado Parágrafo único. Tratando-se de bens pertencentes à União, aos Estados ou aos municípios, a autoridade responsável pela infração do presente artigo

incorrerapessoalmente na multa.

$ 1'. No caso de transferênciade propriedadedos bens de que trata este artigo. deverá o adquirente, dentro do prazo de trinta dias, sob pena de multa

de dez por cento sobre o respectivovalor, fazê-la constar do registro, ainda que se trate de transmissão judicial ou causa mortas. $ 2'. Na hipótese de deslocação de tais bens, deverá o proprietário. dentro do

mesmo prazo e sob pena da mesma multa, inscrevê-los no registro do

lugar para que tiverem sido deslocados.

l

e Artístico Nacional, dentro do prazo de cinco dias, sob pena de multa de dez por

Art. 18. Sem prévia autorização do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que Ihe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob

pena de ser mandadadestruir a obra ou retirar o objeto, impondo-seneste caso

a multade cinqüentapor cento do valor do mesmoobjeto. Art. 19. O proprietáriode coisa tombada.que não dispuserde recursospara

$ 3o. A transferência deve ser comunicada pelo adquirente, e a deslocação

proceder às obras de conservação e reparação que a mesma requerer. levará ao conhecimento do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional a necessi-

pelo proprietário, ao Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional,

dade das mencionadas obras. sob pena de multa correspondente ao dobro da im-

dentro do mesmo prazo e sob a mesma pena.

portância em que for avaliado o dano sofrido pela mesma coisa.

Art. 14. A coisa tombada não poderá sair do país, senão por curto prazo, sem transferência de domínio e para fim de intercâmbio cultural, a Juízo do Conselho

Consultivo do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional.

248

O PATRIAõNIO [A

$ 1'. Recebida a comunicação, e consideradas necessárias as obras,o diretor do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional mandará executálas, a expensas da/União, devendo as mesmas serem iniciadas dentro do

PROCESSO

ANEXO 11: DECRETO-L€1N' 25, De 30 DE NOVEIKBRODÉ 1937

249

prazo de seis meses, ou providenciará para que seja feita a desapropriação

da coisa. $ 2'. A falta de qualquer das providências previstas no parágrafo anterior, poderá o proprietário requerer que seja cancelado o tombamento da coisa.

ri dos titulares do direito de preferência não tiver adquirido a coisa no prazo

de trintadias. $ 3'. O direito de preferência não inibe o proprietário de gravar livremente a

coisa tombada. de penhor, anticrese oú hipoteca.

$ 3'. Uma vez que verifique haver urgência na realização de obras e conser-

$ 4'. Nenhuma venda judicial de bens tombados se poderá realizar sem que,

vação ou reparação em qualquer coisa tombada, poderá o Serviço do

previamente, os titulares do direito de preferência sejam disso notificados

PatrimónioHistórico e Artístico Nacional tomar a iniciativa de projetá-las

judicialmonte, não podendo os editais de praça ser oxpedidos. sob pena

e executa-las. a expensas da União, independentementeda comunicação a que alude este artigo, por parte do proprietário.

de nulidade, antes de feita a notificação. $ 5'. Aos titulares do direito de preferência assistirá o direito de remissão, se

Art. 20. As coisas tombadas ficam sujeitas à vigilância permanente do Serviço

dela não lançarem mão, até a assinatura do auto de arrematação ou até

do Património Histórico e Artístico Nacional, que poderá inspecioná-lassempre

a sentençade adjudicação, as pessoasque, na forma da lei, tiverema

que for julgado conveniente, não podendo os respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção, sob pena de multa de cem mil réis. elevada

ao dobro em caso de reincidência.

faculdado de remir $ 6'. O direito de remissãopor parte da União. bem como do Estado e do município em que os bens se encontrarem, poderá ser exercido, dentro de cin-

Art. 21. Os atentadoscometidoscontraos bens de que tratao art. I' desta lei são equiparados aos cometidos contra o património nacional.

co dias a partirda assinaturado auto de arrematação ou da sentençade adjudicação, não se podendo extrair a carta, enquanto não se esgotar este

prazo, salvo se o arrematanteou o adjudicanto for qualquer dos titulares do direito de preferência.

CAPÍTULO IV

CAPÍTULO V

Da direito de preferência Art. 22. Em face da alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a

Disposições gerais

pessoas naturais ou a pessoas jurídicas de direito privado, a União, os Estados

e os municípios terão, nesta ordem. o direito de preferência. $ 1'. Tal alienaçãonão será permitida.sem que previamente sejamos bens oferecidos. pelo mesmo preço, à União, bem como ao Estado e ao município em que se encontrarem. O proprietário deverá notificar os titulares do direito de preferência a usá-lo, dentro de trinta dias, sob pena de perdê-lo.

$ 2. É nula alienação realizada com violação do disposto no parágrafo anterior. ficando qualquer dos titulares do direito de preferência habilitado a seqüestrar a coisa e a impor a multa de vinte por cento do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis. A

250

Art. 23. O Poder Executivo providenciará a realização de acordos entre a União e os Estados, para melhor coordenação e desenvolvimento das atividades

relativas à proteção do património histórico e artístico nacional e para a uniformização da legislação estadual complementarsobre o mesmo assunto. Art. 24. A União manterá, para a consewação e a exposição do obras históricas e artísticas de sua propriedade, além do Museu Histórico Nacional e do Museu Nacionalde Belas Artes, tantos outros museus nacionaisquantos se tornarem necessários, devendo outrossim providenciar no sentido de favorecer a ins-

tituição de museus estaduais e municipais, com finalidades similares.

nulidadeserá pronunciada.na forma da lei, pelo juiz que conceder o se-

Art. 25. O Serviço do PatrimónioHistórico e Artístico Nacional procurará en-

questro, o qual só será levantadodepois de paga a multa e se qualquer

tendimentoscom as autoridades eclesiásticas, Instituições científicas, históricas

O PATRIAÕNIO EÁ PROCESSO

ANEXO 11: D[CR[TO-L]]

N' 25, Dt 30 De NOVÉ#IBRODe 1937

251

ANEXO l\l

ou artísticas e pessoas naturais e jurídicas. com o objetivo de obter a cooperação PARECER Dt

das mesmas em benefício do património histórico e artístico nacional.

CARLOS DRUAAOND Dt

ANDRADt

Art. 26. Os negociantesde antiguidades,de obras de arte de qualquer natureza, de manuscritos e livros antigos ou raros são obrigados a um registro especial no Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional, cumprindo-lhes outrossim apresentar semestralmente ao mesmo relações completas das coisas históricas

e artísticas que possuírem Art. 27. Sempre que os agentes de leilões tiverem de vender objetos de natu-

ünóBI'caio OA ÜoueaGZO

reza idêntica à dos mencionados no artigo anterior, devorão apresentar a respecD.P.B.l.X.

tiva relação ao órgão competente do Serviço do Património Histórico e Artístico

D. 1. e.

80Çlo d.o XIBtÓrlü

Nacional.sob pena de incidirem na multa de cinqtlenta por cento sobre o valor

dos objetos vendidos. Art. 28. Nenhum objeto de natureza idêntica à dos referidos no art. 26 desta lei poderá ser posto à venda pelos comerciantes ou agentes de leilões, sem que

tenha sido previamenteautonticado pelo Serviço do Património Histórico e Artís-

Ao qtn oonBba. nXo ao acha a l8re.ja nabrlz d.e R.8A a4 coDcolçãop an laeboelrq'dg

tico Nacional,ou por peritoem que o mesmose louvar,sob penade multade

;ini;ii.à.a'a

cinqüentapor cento sobre o valor atribuído ao objeto.

oanstltull'

Parágrafo único. A autenticação do mencionado objeto será feita mediante o

pagamentode uma taxa de peritagemde cinco por cento sobre o valor da coisa. se este for inferior ou equivalente a um conto de réis. e de mais

Art. 29. O titular do direito de preferência.goza de privilégioespecialsobre o valor produzido em praça por bens tombados, quanto ao pagamento de multas

aaaorávo3.

ao Idvx'o

3t IP Bata.o a.ó Blo Granel.oâ.o.8ul,

d.e ÚoBaa .blat6='1a

ao Tombo Xlató!'loo.

.Juiablflquó

aaa'oabai'BO

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Opte.3a118M.aa m.ü'iz ü.a pal'6qula. Deva x'õO.süw.sa o a aüi BÍDlãi. voi'lH.oU.o ao qou lbtoríox' en 8 d.o aateãU'oâo 18601d.o IJaar'rarraupllba.4nbãnlg .Vlaanto üa Fontoxa'1l que all no ao faia batlsadÕ.Fato eazd.ávidaíqpol"tanto, aãÓae reveste oon ttd.ol a aoasovor. do [email protected]ção .ba.stantopara ao abrlbbulr ao lóoa]. oM.eoe .üosaai'filou9 a' catogol'ía do .laoaucxanbo blsto-

r'ico nacional.

Ba 27.111.19S2

Parágrafo único. SÓ terão prioridade sobre o privilégio a que se refere este

r;.-Í&--'--.Í4..4K.l....L Cardos DI'uaxaaad d.o .hd='aàé

artigo os créditos inscritos no registro competente,antes do tombamento

Chefe da 6.B.

da coisa pelo Serviço do PatrimónioHistóricoe Artístico Nacional. Art. 30. Revogam-se as disposições em contrário.

a

à.f. 7- , Rio de Janeiro, 30 de novembro de 1937. 116' da Independênciae 49' da

República.

4 s:},-

GetúlioVargas Gustavo Capanema

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

a

â.o

l vlo'ba do a©08tos Jt:18a a 8.R. aXo BB.Juati.flua!' o tanbaaonto.

impostas em virtude de infrações da presente lei.

252

, que

lato

o i'ofa'lÂo tamlplo um &oa'üaatziboda pollpação.do tor

ÜãÍimwã":.Eti:mU::H:W&kg.::"8 B:ig:,'e*a;3aã;-'a8=B:; :.,;?;::;;'.="R'=i;;.=t.'i;

dbooll'a

cinco mil réis por conto de réis ou fração, que exceder.

fato

iii;'iiàiuaão

'C /. «u c'-- -. 4' A /jb--...a''e'+c.'e - ü A c'u,'. ca c.-.l

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,Ê- :a. J. 4'.r Z

b -.

ANEXO IV

O COAPROAISSO

CULTURAL

DA NOVA REPUBLICA

Em razão de sua experiência de trabalho institucional e de ação política junto à sociedade nos âmbitos nacional e local. e sentindo-se legitimados por sua anterior luta - contra todas as dificuldades - em defesa dos segmentos sociais cuja história e produção cultural têm sido sistematicamente obscurecidas ou tomadas objeto de apropriação indébita - trabalhadores em entidades culturais e represen-

tantes de entidades e associações civis consideram oportuno declarar publicamente a sua aspiração de que o recém-instituídoMinistério da Cultura venha a se constituircomo capaz de estar efetivamentea serviço da sociedadebrasileira

e, assim,tomar-seum dos principaisimpulsionadores da mudançaa que se propõe a Nova República. Espera-se, nesse sentido, que em todas as suas áreas de competência o Mi-

nistério da Cultura venha a assumir, entre outras preocupações,determinados compromissos considerados como imprescindíveis ao processo de sua contínua

legitimaçãojunto aos segmentossociais que deve ouvir e apoiar. Somente a adoção desses compromissos e o seu cumprimento serão capazes de tornar esse Ministério exemplar no atendimento ao interesse público que, in-

cluindo os interesses de específicos setores sociais, assim como determinadas reivindicações político-partidárias e, também, os argumentos de personalidades importantes no processo cultural e político do país, não pode restringir-se a seu atendimento exclusivo, sob pena de comprometer sua eficácia para uma atuação

voltada para a totalidade

e a particularidade dos interesses da nação.

São os seguintes os compromissos julgados fundamentais, e aqui explicitados em nível de amplitude a ser particularizada na determinação da política cultural, em diálogo com os segmentos sociais representativos da pluralidade cultural brasileira Que a cultura seja amplamente concebida como um processo decorrente dos diversos modos de agir e de pensar da sociedade brasileira. Assim.

a política cultural não deverá restringir sua atenção somente a determinadas expressões da cultura, mas estender suas preocupaçoes a as-

l pectos fundamentais desse processo, como, por exemplo: saúde, educa-

Brasíiia-Mulher/DF

ção,acessoe uso do solo,trabalho,habitação etc.

Associação Cultural Zumbe/AL

Quea pluralidade e a diversidade culturalsejamrespeitadas, masque

AssociaçãoNacionaldo Índio/BA

a diferença não implique justificativa para a desigualdade social. Nesse sentido os grupos diversificados em situação de subalternidade por vá-

Sociedade Beneficente São Jorre de Engenho Velho da Federação/Salvador-BA

rios fatores culturais - tais como indígenas, negros. ciganos, migrantes.

Associaçãodos Ex-Alunosda UnB/DF

mulheres. favelados. garimpeiros. seringueiros, bóias-frias etc. - devem

Cresça/DF

merecer atenção e apoio especiais para superação desse estado.

Ordemdos Músicos/DF

Que se integre à política cultural o compromisso de se discutirem amplamente os projetos ditos de desenvolvimento.que implicam alterações

Grupo de Teatro- Abibiman/PE Centro Latino-Americanode Altos Estudos/DF

consideráveis nos contextos culturais, de modo a avaliar seus possíveis

benefícios em relação aos custos socioculturais por eles exigidos.

Bloco Carnavalescollê Aiyê - Salvador/BA Grupo Niger-OKAN - Salvador/BA

Que o Ministério da Cultura envide todos os seus esforços para que Brasília, cidade politicamente cassada e culturalmente discriminada, venha

ACAAN - AssociaçãoCultural de Apoio às Artes Negras/RJ

a desenvolver as suas potencialidades e desempenhar os papéis para

Cine-ClubeOlhod'Água/DF

os quais foi concebida. no sentido não só de sediar o poder, mas de res-

Cine-ClubePodaAbertado Gama/DF

ponder pelo crescimento do espírito federativo, que decorre do reconhecimento

de uma sociedade pluricultural e multiétnica.

Cabeças- Centro Brasiliense de Arte e Cultura/DF Cine-Clube Gláuber Rocha/DF

Quea responsabilidade do Ministério da Culturaem contribuir,fundamentalmente, para o processo de democratização do país se concretize

ComissãoOrganizadorado Festival de Música Popular do Gama/DF

em todos os níveis de sua atuação, assim como nas constantes preocu-

Grupo de Teatro do Gama/DF

pações de servir aos interesses e à identidade de nossa sociedade plu-

Biaco CarnavalescoApaches do Tororó- Salvador/BA

ral, e de prestar contas a essa sociedade da política adotada e do traba-

Associação Profissional dos Sociólogos do DF

lho realizado. reorlentando-os segundo as indicações originadas no de-

Administração Regional de Planaitina/DF

ver do diálogo.

Grêmio CamavalescoCacique de Ramos/RJ

Brasília (DFj, 7 de maio de 1985.

TEN- TeatroExperimental do Negro/RJ ComissãoBrasília/DF lpeafra - Instituto de Pesquisas e Estudos Abro-Brasileiros/RJ Centro de Estudos Abro-Brasileiros/DF Funafro - Fundação Abro-Brasileira de Arte, Educação e Cultura Memoda+ Zumbe

União das Nações Unidas Associação Brasileira de Antropologia/DF

Fetadif - Federação de Teatro Amador do Distrito Federal

Comissão Píó-Índio

ABTB-DF- AssociaçãoBrasileira de Teatro de Bonecos

FundaçãoPedrosoHorta/DF

CompanhiaNosso Grupo de Teatro/DF

Frente Nacional Abro-Brasileira

Candango Produções ARísticas/DF

256

O PATRIAONIO [A

PROCESSO

ANEXO IV: O COAPROAISSO CULTURAL DA NOVA RllpÚBLICA

257

ANEXO V PROCESSOS DE TOABAAENTO

ABERTOS

DE 1.1.1970 A 14.3.1990*

Ng Processo

Nomedo Bem

UF

Localidade

Rio de Janeiro

1970

825-T70

Casa à Praia do Russel, 734

RJ

826-}70

ãeafroSãoJogo

CE

827-}70

Forte São José

RJ

Rio de Janeiro

Sobram

828-}70

Casa à Praça do Erário, atual Correio

PB

João Pessoa

829-}70

Acervo do Museu de Arte Contemporânea

SP

São Paulo

830-T-70

Castelo da Baronesa ICasa à Av. Domingos de Almeida)

RS

Pelotas

831-}70

Igreja de N. Srü.da Conceição

PE

ltamaracá

832-T-70

Remanescentes da Fazenda Pombas.

onde nasceu Tiradentes

MG

833-}71

Conjunto arquitetânicoe paisagístico da Praça Getúlio Vergas

RJ

834-}71

Igreja de N. SP. da Conceição

MG

835-T-71

Igreja de Santo Antõnio

PE

B36-T.71

igreja do Bom Jesus dos Martírios

PE

837-}71

Casa à Praça Dr. Jefferson, 13

MG

B38-T-71

Fazendado Pocinho

RJ

839-}71

Igreja Matriz de São José

MG

MO-T-71

Solar da Barão de Vila Flor

RJ

841-}71

Palácio Louro Sodré

FU

Belém

M2-T-71

Caverna do Alambari, Fazenda Sãa Luas

SP

Bananal

M3-T-71

Conjunto arquitetõnicoe paisagístico de Cachoeira

BA

Cachoeira

Ba-T-71

Casada Fazendado Pau Grande

RJ

Vassouras

M5-}71

Imagem de São Francisco de Paula

MG

Ritápolis

1971

Adotou-se a seguinte convenção por tipologia gráfica: negrito

NovaFriburgo CoutoMagalhães Tracunhaém Recife Campanha Vassouras/ Barrado Piraí Serra

São Fidélis

Mariana

tombadositálico - arquivados

redondo em estudos. Foram assinalados em negrito os bens cujo tombamento foi homologado até 2007, conforme listagem fornecidapela Copedoc/lphan,datada de 4 de março de 2008

l

Ng Processo

Nomedo Bem

Casa da Fazenda Rio de São João

M7-}71

UF

Localidade

MG

Bom Jesus do Amparo

Ne Processo

Nomedo Bem

Localidade

871-}73

Faculdadede Direito da UFRJ

RJ

872-T.73

EngenhoMorenos

PE

Igreja da antiga Conventode

Conjunto arquitetõnico e paisagístico de Lençóis

BA

Lençóis

873-T-73

Conjuntoarquitetõnico e paisagísticode Porto Feliz

São Francisco

ES

SP

PortoFeliz

874-}73

Igreja de N. Se. do Pilar

SP

849-}71

Casa no Distritode GatasAltas

MG

Conselheiro Lafaiete

875-}73

Conjuntoarquitetõnicoe urbanístico

850-T71

Igreja Matriz de Sant'Ana jfachadas)

CE

851-}71

Casa à Praça José Feliciano, 9

GO

M8-}71

Igreja Matriz de N. SP. da Conceição

Paudo Alferes/

RJ

Vassouras

853-}72 854-}72 855-}72 856-}72 857-F72

Casa à Rua Mayrink Verga, 9

Casa à Rua da Quítanda,61

RJ

Igreja Matriz de São Sebastião

RJ

Casa Frei RogéHa- Fórum

Riode Janeiro Riode Janeiro

RJ

CaboSantoAgostinho

PE

Recife

Capelade São Pedra

PE

Pajeú

877-}73

Igreja Matriz de Vila Bela e

Porto União

Casa onde nasceu o marechal Artur

da Costae Sirva

Palácio dos Capitães Generais

MT

878-}73

LagoaRodrigo de Freiras

RJ

Rio de Janeiro

879-}73

Casa de Câmara e Cadeia

CE

Aracati

880-T-73

Conjunto arquitetõnicoda Praça da

RJ

Wla Bela

NovaEra

Matriz e Museu de Arte e História

MG

881-T-73

Casa da Fazenda Santa Mânica

RJ

882-}73

Igreja Matiz do Desterroe Igreja do Rosário

MG

883-}73

Mercadode São José

PE

Recife

Niterói

sc

Vitória

RibeirãoPreto

876-T-73

1972 852-T-72

Morenos

das áreas da Bahia de Suape e do

lguatu Pirenópolis

Rio de Janeiro

Taquaíi

Valença Desemboque

858-}72

AntigaEstaçãoFerroviária

PB

Campina Grande

859-T-72

Igreja Matriz de Santo Antõnio

MG

Alvorada de Minas

884-T-73

Museudo Colono

RJ

Petrópolis

860-T-72

Conjunto arquitetõnico da Av. Rio Branco

RJ

Riode Janeiro

B85-T-73

CapelaerigidaporAnhanguera

MG

Uberlândia

886-T-73

TeatroApoio

861-T-72

AntigaFaculdadede Filosofia, Ciências e Letras (Casa à Praça

Terreirode Jesus) 862.T-72

Liceude Artes e Ofícios ICasa à Praça da República)

BA

PE

Casa de João Niderauer Sobrinho

RS

888-}73

ForteJunqueira

MT

Corumbá

889-}73

CemitéHoda IrmandadeN. Sr. Passos

SP

Guaratinguetá

890-T.73

Solar da baronesa de Muriaé

RJ

São Gonçalo

B91-T-73

Conjunto arquitetõnicode Rio de Contas

BA

Conselheiro

892-T-73

Casa da Fazenda Quebra de Canoas

MG

B93-T-73

Casa onde morou o Barão do

Recife

PE

Assembléia Legislativa(antigo edifício da AssembléiaProvincial)

CE

BM-T-72

Casa e capela da Fazenda da Luz

RJ

865-T.72

Casa da Fazenda dos Macacos

MG

863-T-72

(Casa Rua do Apoio, 121)

887-}73

Salvador

Fortaleza

Lafaiete 866-T-72

Igreja do Divino Espírito Santo

PE

Recife

B67-T-72

Coieçãode AbeiardoRadrigues

PE

Recife

868-}72

Pinturas de Benedito Calixto que estão no Palácio Episcopal

SP

Rio Branco crua Westphalen,2791

SantaMana

Campos Rio de Contas

PonteNova Petrópolis

1974

São Cardos

8«.T.74

Sobrado e respectivo terreno em que

em 1845,se hospedou d. Pedra ll

1973 869-T-73

Morros do Rio de Janeiro (7)

RJ

870-T-73

Igreja Matriz de N. Slü. da Concepção

MG

260

RJ

Recife

Rio de Janeiro Prados

O PATRIAÕNIO [A PROCESSO

895-T-74

RS

São Gabriel

BA

Cachoeira

Lavabo em mármore português

IConventode SantoAntõnio do Paraguaçu)

ANEXO V: PROCESSOS DE TOIKBAAENTOABERTOSDE 1.1.1970 A 14.3.1990

261

l

N2 Processo

896-}74

Nomedo Bem

UF

Localidade

BA

Salvador

925-}75

AntigaFaculdade de Medicina da Bahia l(Casa à Praça Terreiro de Jesus)

Ne Processo

Nomedo Bem

Casas à Praça Cel. Pedra Osório, 2

Pelotas

BA

Alcobaça

de Setembro)

RS

Rio Grande

PE

Igreja Matriz de S. Bemardo

927-T-75

Cine-teatro (antigo Teatro 7

897-T-74

Solardos Garcez Conde viveuEuclidesda Cunha)

RJ

São Fidélis

898-T-74

Museus Castra Maia e respectivos acervos

RJ

Rio de Janeiro

928-}75

899-}74

Casaà RuaPresidenteDomiciano. 195

RJ

Niterói

929-}75

Casa-grandedo Engenhode Lajes Casa

Farmácia Brita.9 (Casaà RuaLeaisPiedade, 2)

Salvador

930-T-75

Remanescentes da Fortaleza de

BA

901-T-74

Igreja de N. Slü.do Rosário

MG

Rio Preto

902-T-74

Conjunto de nove imóveis

RJ

Maré Batatais

900-T.74

Santo Antõnio Conjuntoarquitetõnico de Luziânia

GO

Praia Baía da Traição

PB

933-}75

Embaixadada ltálía

SP

904-}74

jlgrejado BomJesus) Casado Engenholtapuá

PB

São Migue do Taipu

905-T-74

Diverys monumentos

MG

TrêsPontas

906-}74

Casa 'Loja MaçónicaConciliação'

PE

907-T.74

Chácarado Hnoco

MG

908-}74

Peças da coieção Octales Marcondes

SP

909-}74

Casa da Fazenda Ponte Alta

SP

Redenção da Serra

1976

910-T-74

Casa da Fazenda da Concepção

SP

Paraibuna

911-T-74

Igreja Matriz

SP

912-}74

Casade Pedra

RJ

Igrejinha

913.T-74

Casa do Sítio Umbuzeíro

CE

Aiuaba

914-}74

AntigaAlfândega(Prédio à Rua Conselheiro Mafra)

São Pauta

Cona

sc

MA

932-}75

14 quadros de Portinari

Caeté

MG

931-T-75

903-}74

Recife

6, 8

RS

926-T-75

9%-T-75 93&T-75

Ribeirão Cataguazes

São Luís Luziânia

Baíada Traição

crua das Laranjeiras,154)

RJ

Riode Janeiro

Embaixadada Argentina IPraia de Botafogo,228)

RJ

Riode Janeiro

936-}75

PaçoMunicipal Sobrado

BA

937-}75

Casa do Padre Belchior

MG

Pitangui

938-T-75

Casado Aleijadinho

MG

Sabará

93$}76

Grutas e lapas do AHzona

MG

940-}76

Casa à Rua Oswaldo Cruz. 782

MA

941-T-76

Casasde três fazendas (Mantiqueira

Inhambepe

RJ

Porciúncula

LagoaSanta Sãa Luas

Machadinha e Matode Pipa)

RJ

942-T-76

Arraial Novo do Bom Jesus

PE

Recife

Florianópolis

U3-}76

Forte N. Srü. da Conceição

sc

Florianópolis

Franca

944-}76

Prédio da Estação da Luz e

Macas

915-}74

Igreja Matriz

SP

916-}74

RJ

PinacotecaEstadual

SP

São Paulo

917.}74

Fazenda da Engenho Novo ForteCoimbrã

MT

Corumbá

945-}76

Igreja de N. SP. da Paz

RJ

Rio de Janeiro

918-}74

Casa do Engenho Camaragibe

PE

SãoLourenço da Mata

946-T-76

Escala Tiradentes

RJ

Rio de Janeiro

947-T.76

Ruínas do Fode em Arraial

São Gonçalo

das Tesouras

GO

948-T-76

Casa da Antigo Fórum

BA

949-}76

IgrejaPositivistado Brasil

RJ

950-}76

Capela de N. Srü.do Rosário da

1975 919-T-75

Reservatóriode água(Laranjeiras)

RJ

Riode Janeiro Riode Janeiro

920-T-75

Capela N. Sls. da Piedade

RJ

921-T-75

Casa"Estaçãodo Brum'

PE

Recife

922-T-75

Igreja do Terço

PE

Recite

923-T-75

Igreja de São José do Ribamar

PE

Recife

924-}75

EscolaJútiaKubiíschek

DF

Brasília

262

O PATRIAõNIO [A

PROCESSO

ErmidaSanta EHgênia

MG

Casa do Museu Prof. ZoroastroArtiaga

GO

Mozarlândia Caetité

Rio de Janeiro Sabará

1977 951-T-77

ANEXO V: PROCESSOS Dt TOÁBAAeNTO ABERTOS Dt 1.1.1970A 14.3.1990

Goiânia

263

Ne Processo

952-}77 953-}77

Nomedo Bem

Casa onde morou o Duque de Cabias

955-T.77

956-T-77

RJ

Rio de Janeiro

Rio de Janeiro

RJ

PHmeiraFábHca de Laticínlos no

Norte do Brasil

RJ

Riode Janeiro

Sabre de honra do Gal. Osório IMarquêsde Herval) Quartelda Polícia Militar

RJ

Rio de Janeiro

ICasa à Praça Heliodoro Balbi)

957-}77

Localidade

Pavilhão de aulas da Escola de EnfermagemAna Neri ICasa à R. Afonso Cavalcanti, 275)

9M.}77

UF

Igrejade N. SP. do Amparo

958-}77

Igrejade São João

959-}77

Cemitério (onde repousam os restos mortais dos heróis

AM

Manaus

PE

Olinda

PE

Olinda

da Retiradada Laguna)

MG

960-}77

Igreja de Santo Antõnio dos índios

BA

961-}77

Estaçãofenoviáda

SP

Aratuipe CachoeiraPaulista

962-}77

Casa que pertenceu ao Visconde RJ

Rio de Janeiro

963.}77

de itamaraty CemitéHod. Francisca

sc

Joinville

964-}77

Área onde se desenvolveu a Batalha 'Monte das Tabocas"(3.8.1645}

PE

Vitóriade Santo Antão

965-F77

AntigoPaço Municipal

PI

966-}77

Marco Jauru

MT

Parnaguá

968-}78

Conjunto arquitetõnico e urbanístico da cidade de lcó

CE



969-T.78

Conjunto arquitetõnico e urbanístico da cidade de Aracati

CE

Aracati

Faculdadede Direito

PE

Recife

Rio de Janeiro

Hospital São Francisco de Assim

RJ

Rio de Janeiro

979-T-78

Grutas Azul e N. Srl. de Aparecida

MT

980-T-78

Gruta do Rei do Mato

MG

981-}78

Igreja de N. SP. dos Remédios

Igreja de N. Srü. da Penha

MG

972-T-78

Solar do Conde de Subaé

BA

Conjunto arquitetõnico, urbanístico e paisagísticoda Ilha de ltaparica

Passos

Bonito

Femando

de Noronha 982-F78

Prédio da antiga Ministério

da Agdcuitura

RJ

Rio de Janeiro

983-T-78

Asilo d. Pedra ll

BA

Salvador

984-}78

Casa dos Carvalhos

BA

Salvador

985-178

VilaLoura ÍCasa à Rua Raul Leite, 68}

BA

Salvador

986-F78

Casas à Rua Gonçalves Leda. 5, 5-A, 5-B, 7 e ll

RJ

Rio de Janeiro

987-}78

Ponte Seca

RS

988-}78

Solar Amado Bahia

BA

Bagé Salvador

Imagemde Santa Teresade Axila, um retábulo e um espelho

RJ

Rio de Janeiro

990-T-78

Ruínasjesuíticasdo Mocambinho ou de Pachoca

MG

Manga

991-}78

Igrejade N. SP. do Uvramento

PE

Recite

992-T-78

Casaà Praça Marquês de Monte Alegre

SP

Santos

993-T-78

Imagemde N. SÉ. da Escada

SP

Barueri

994-}78

AeroportoBartolomeude Gusmão e seu hangar

RJ

995-T.78

MuseuMaHanoProcópio(Prédio)

MG

Riode Janeiro Juiz de Fora

1979

996-}79

971-T-78

973-}78

RJ

Solar da Família Franklin Sampaio Petrópolis

Localidade

Cinemaids

Cáceres

RJ

Nomedo Bem

97&}78

989-T-78

ICasa à Praça Rui garbosa, 55)

970-T-78

977-}78

MonteAlegre

1978

967-}78

NeProcesso

Casa Paroquial, anexa à Igreja Matriz

de Santo Antõnio ICasaà PraçaIndependência, s/na)

PE

Recife

Santa Cruz de

997-T-79

Prédioda antigaCasade Câmara e Cadeia

BA

Cabrália

998-T-79

Igreja Matrizde N. Slü. da Conceição

BA

Santa Cruz de

SantoAmara

Cabrália

BA

ltaparica 999-T-79

Capelado CemitérioPúblico

CE

BA

Mucugê

1000-T-79

Acervo do Palácio dos Bandeirantes

SP

São Paulo

975-}78

Conjuntoarquitetõnico e urbanístico de Mucugê Hotel Colonial

BA

Salvador

1001 -}79

Casade Euclidesda Cunha

976-}78

Prédio da Cia. Docas de Santos

RJ

CE

Camocim

974-}78

264

Rlo de Janeiro

O PATRIAÕNIO [Á

PROCESSO

Pinto Madfns (aviador)

ANEXO V: PROCESSOS Dt TOÁBAA[NTO ABERTOS De 1.1.1970 A 14.3.1990

Quixeramobim

265

Ne Processo

Nomedo Bem

IOO&T-79

Igrejade N. Sls. da Lapa Cine-teatro

1004-}79

Igreja de Sant'Ana

1002-T-79

1005-}79

UF

Localidade

Campos

Macaé

Antigo alojamento da Westem

RJ

1007-}79

Casa à Rua Cónego Bittencoud,47

RJ

1008-T.79

MG

1009-T-79

Estaçãoferroviária ObservatórioNacional

101&F79

Casaonde funcionouo Fórum

MG

1011-}79

Conjuntoarquitetõnico de Conservatória

RJ

1012-T-79

Serra de São José

MG

1013-T-79

Conjuntourbano da Lapa e

1014-}79

Riode Janeiro Angrados Reis

Matozinhos

Valença

Tiradentes

Riode Janeiro

RJ

Lampião(Lapa),relógio alargoda Carioca) e luminárias(R. da Conceição, Senhordos Passos,Alfândega. Ouvidor e Praça XV e adjacências)

Riode Janeiro

RJ

t015-T-80

Duas quadras da Rua da Aurora

PE

1016-}80

Pinça Florfano(Cinelândial Sítio de Santo Antõnio da Alegria ou do Físico

RJ

MA

São Luís

Sede da Fazenda Pinheiro

RJ

Pinheiral

1017-}80

1018}80 1019-}80

Palácioda Justiça

1020-T-80

Teatro Municipal José de Alentar

1021-}80

ICasaà Rua XV de Novembro) Acervo paisagístico de Santa Cruzde Cabrália

1022-}80

1027-T-80

Conjunto arquitetõnico à Av. Nazareth

Fn

Belém

1028-T40

Forte de Óxidos e Fode Serra FU

Óbidos

m.

Belém

da Escama 1029-T.80

Manaus

RJ

Niterói

Santa Cruz de

1030-T-80

autor de Madfn Pleno) 1023-T40

Prolongamento do conjuntoVer-o-Peso

PA

Cabrália

Santanado Livramento

m

Belém

1031-T-80

Colégio Pedra ll

RJ

Rio de Janeiro

1032-T-80

Casa da Fazenda Rio Novo

RJ

Paraíbado Sul

1033-T-80

Igreja de Santo Antõnio

MG

10%-T-80

Pantheondo Mal. Floriano Pelxoto ICemitérioSão Joga Batista)

RJ

Rio de Janeiro

1035-T-80

Figueirada Rua Falto

RJ

Rio de Janeiro

1036-T-80

RS

PortoAlegre

1037-T-80

Prédio dos Correios e Telégrafos IPraçaBarãodo Rio Branco) Instituto OswaldoCruz

RJ

Rio de Janeiro

1038-T-80

Casa-grande da Fazenda Cachoeira

de Taepe

MG

PalacetePinho

PA

Belém

102&T-80

Conjuntoarquitetânicono entorno do MercadoVer.o-Peso

PA

Belém

O PATRIAON10 EA PROCESSO

Ouro Branco

Surubim

Coleção de ex-votos do Santuário do

Bom Jesus do Matosinhos

MG

1040-T-80

Igreja do Senhordo Bonüm

RJ

1041-T-80

Antigaestaçãoferroviária

Congonhasdo Campo ltaboraí

de Guaratinguetá

SP

Guaratinguetá

Campodo Jiquiá

PE

Recife

1043-T-81

Igrejade N. Sle.das Mercês

CE

Arapari

IOM-T-81

EstaçãoferroviáHa

RJ

ltaguaí

1045-T-81

Casaà RuaAlexandreMoura, 23 a 29

RJ

Niterói

1046-T-81

Igreja Matrizde Saquarema

RJ

Saquarema

1047-T-81

Pórtico central e armazénsdo Cais do Porto

RS

PortoAlegre

1048-T-81

Capela de São Jogo

ES

Carapinada Serra

1049-T-81

Morro O Frade e A Freira

ES

ltapemirim

1050-}81

Aldeiados índiosTapirapés

GO

Banana

1042-T-80

1981

Belém

1024-}80

266

Conjuntoarquitetõnicoda Rua biqueira Mendese Largo do Carmo

262 e 266 (antiga residênciado RS

Conjuntoarquitetõnicoe paisagísticodo Largo das Mercêse sua área de entomo

Rio de Janeiro

Casaà Rua RivadáviaCorreia, poetaargentinoJosé Hemandez,

]

Recife

AM

BA

Conjunto arquitetõnico à Belém

1039-}80

1980

Localidade

FU

ltaguaí

Riode Janeiro

RJ

UF

Av. Governador José Malcher

Niterói

Conjuntoarquitetõnicoda Rua da Carioca

encostade Santa Teresa

1026-T-80

Santa Mana

Telegraph tOO&T-79

Nomedo Bem

ANEXOV: PROCESSOS DE TOABAA[NTO ABERTOSDE 1.1.1970 A 14.3.1990

267

Ne Processo

Nomedo Bem

UF

Localidade

Ne Processo

1079-T-83

Quinta das Magnólias(Casa Peru)

1080-T-83

Fazenda do Vauaçu(solar do padre Jogo

Conjunto arquitetânico de Angra dos Reis

RJ

1052-}81

Mercadoda carne e lojas adjacentes

CE

]05$T-81

Forte de Santa Bárbara

sc

FloHanópolis

1081-}83

1054-}81

Fábricade vinho de caju Tito Silva

PB

Jogo Pessoa

1051-T-81

Angrados Reis Aquiraz

1982 1055-T-82

Museu Rondon

Vilhena

RO

105G}82

Instalações de água potável

PR

Curitiba

1057-T-82

Antiga sede do DNOCS

CE

Fortaleza

1058-T-82

Casa à Rua da Aurora. onde nasceu Manuel Bandeira

PE

Fábrica Baniu Santuáriodo MonteSanto

RJ

1061 -}82

Casa em que residiu Canos Oswald

RJ

Rio de Janeiro

1062-}82

Fazenda de Sant'Ana

FU

Ilha de Marajó

1063-}82

Cadeia Velha

CE

Limoeirodo Norte

1059-T-82

1060-T-82

Recife

MonteSanto

1064-T42

Caixas-d'água

RJ

Pelotas

1065-T-82

Casade Plácidode Castra

AC

1066-T.82

Vila de Porto Acre

AC

Xapuri Rio Branco

1067-T-82

Terreiroda CasaBranca

BA

Salvador

1068-T-82

Sistema de bondes de Santa Teresa

RJ

Rio de Janeiro

1069-T-82

Serrada Barriga IQuilombo dos Palmares)

AL

1070-T-82

1071-T-82

PE

Recife

Fn

Belém

1072-T-82

Farol de Mucuripe

1073-T-82

ImprensaOHciale Clube Monte Líbano

CE

Fortaleza

FU

Caixa-d'água

RS

Rio Grande

1075-T42

Palácio das Laranjeiras

RJ

Rio de Janeiro

1983 1076-T-83

Conjunto de 10 imagens missioneiras

RS

1077-T-83

Forte de São Francisco ou do Queijo

PE

1078-T-83

268

Monumentodo Imigrante Açude do Cedro

CE

Quixadá

1083-T-83

Casa onde nasceu Vital Brasii

MG

Campanha

Prédio High Ufe crua Sarro .4ma/o. 2aU

São Luís Gonzaga Olinda

10M-}83

Conjuntohabitacionaloperário

PE

Goiana

Conjunto habitacional "Av. Modelo'

RJ

Riode Janeiro

1086-T-83

Máquina a vapor 'Mana Fumaça'

MG

AntõnioCardos

1087-T-83

Igreja Matriz de Santo Antõnio

MG

ltaverava

1088-}83

Sobrado do padre Taborda e ltaverava

casario fronteiro

MG

1089-F83

Prédioda PrefeituraMunicipal

RS

109&T-83

Caixa de Sacoríos d. Pedra V

RJ

Rio de Janeiro

1091-T-83

Igrejade N. SF. dos Navegantes

FU

São Caetanode

1092-T-83

Igreja Matrizde N. Slü dos Navegantes

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

Lajeado

Odivelas

109$T.83

RS

São José do Norte

Centro histórico de Salvador jre-ratiãcação)

BA

Salvador

1094-T-83

Estádio Mário Filho(Maracanã}

RJ

Rio de Janeiro

1095-}83

IgrejaMatriz de N. Srü.da Conceição

AL

MarechalDeodoro

de Minase estaçãoferroviária

MG

RibeirãoVermelho

1097-}83

Conjuntoarquítetõnicoe urbanístico da cidadede Paranaguá

PR

1098-T-83

Estradade Ferro Paranaguá-Curitiba

PR

1099-}83 1100-T-83

HospitalJuscelinoKubitscheck de Oliveira(HJKO) Prédio da ABI

RJ

Rio de Janeiro

1101-T-83

Ginásio Pernambucano

PE

Recife

t102-T-83

Pantanal Sul-mato-grossense

MS

1103-F83

Ilha do Bananas(oude Sana'Ana) AcervoferroviáHoda E. F.

GO

Perus-Pirapora

SP

Casaque pertenceuao cel. Malveiras

CE

1096-T-83

1104-F83

1105-T-83

Rio de Janeiro

Caxiasdo Su

1085-}83

Belém

107&T-82

PonteNova

1082-T-83

Conjuntoarquitetõnico dos bairros

da CidadeVelhae Campina

Teresópolis

RS

Canis da Pinça da Convenção,

125,131,153

RJ

Localidade

MG

União

dos Palmares

UF

do Monte-Antigos

Rlo de Janeiro

BA

Nomedo Bem

Trechoda antiga E. F. Oeste

ANEXOV: PROCESSOS DE TOABAÁENTO ABERTOS Dt 1.1.1970 A 14.3.1990

DF

Paranaguá

Brasília

Limoeirodo Norte

269

Nomedo Bem

110G}83

Casarãoonde se hospedou d. Pedral

UF

Localidade

RS

São José do Norte

1107-143

Colégio Estadual Pães de Carvalho

PA

Belém

1108-T.83

Oufefrode Santa Cafarfna(Castelo)

SP

Santos

Hotel do Parque São Clemente

Nova FHburgo Rio de Janeiro

'RJ

Conjunto Residencial ParqueGuinle

RJ

1111-T:M

Vla Opeüria

AL

1112-FM

Embanaçõesa vapor do Rio São Fmncisco

MG

Pirapora

Casa Presser

RS

Nova :Hamburgo

1110-FM

1113-T.@ 1114-T-M

1115-FM

lll&FM

Casa 'H Sofria'

Presépiodo Pipiripau

Santa Mana

RS

MG

Conjunto arquitetõnico, urbanístico e paisagístico da cidade de Natividade

PR

Belo:Horizonte

Natividade

São Paulo CampoLargo

Coleçãode Lasar Segall

1119-}84

Engenho do Mate (Museu do Mate)

PR

Teatro São João

PR

1121-}84

Casa à Rua Santa Cruz(Warchavchik)

SP

1122-T-M

Centro Histórico de Laguna

sc

Casa do Senador Canedo

Curitiba

TO

lll$tM

1123-T.@

Lapa São Paulo Laguna

GO

Boa Vista de Golas

1124-}84

Casarãodo Chá

SP

Mogi das Cruzes

1125-T-M

Túmutado » barão de Guaratiba

RJ

Rio de Janeiro

1126-T-M

Museude Biologia ES

SantaTeresa

Prof. Mello Leitão' 1127-T-M

U

Localidade

113-FM

ConjuntoarquRetânico, urbanístico e paisagístico de São Gonçalo do Rio dasPedras

MG

1135-T.@

Conjuntoarquitetõnicodo DistHto de SantoAntõnioLisboa

sc

Florianópolis

sc sc

Flolianópolis

1136-T-85

CasaRuralda Costeirada Ribeira

1137-T-85

Ponte Hercílio Luz

1138-T-85

Palácio Cruze Souza

Serra

Caixa-d'água IReservatóriode Moca)

AM

Manaus

1128-}84

Forte São Diogo

BA

Salvador

1129-FM 1130-T-84

Coleçõesarqueológicas pe. João Alfredo Rohr Acervodo IHGB

1131 -T34

DF/SC

Florianópolís

Mercado Público

sc sc

Florianópolis

1139.T-85 1140-T-85

Casaà RuaBenfica,251

PE

Recife

1141-}85

Escola Rural e Casa do Professor

IPalácio Rosado)

SP

1120-T44

DêlmlroGouveia

Museu Paranaense jantigo Paço Munidpal)

1117-FM

Nomedo Bem

1985

1984 1109.T-M

NQProcesso

Florianópolis

sc

Tlmbó

Lassance

1142-T-85

Casa de Saúde Carlos Chagas

MG

114&T-85

Antigaestaçãoferroviária

MG

Lassance

llM-T-85

Fábrica Santa Amélia

MA

São Luís

114$T-85

Casarãode madeira RS

AntõnloPrado

114&}85

Prédio da Light

RJ

Rio de Janeiro

1147-T45

Casa à Av. dos Imigrantes, 307

RS

AntõnioPrado

114&T45

Lagoa do Abaeté

BA

114$T-85

Pintura rupestre

BA

Centrale Uibaí

Painel de gravações rupestres

MT

CoronelPonte

BA

Salvador

Iria

1150-T-85 1151-T-85

Gustavo Sampaio, 34)

Áreade Lobato(subúrbio ondepela primeira vez jorrou petróleo no Brasil}

1152-}85

Salvador

Terras de ocupação imemoHal dos grupos üibais remanescentes das grandes nações indígenas do Bmsil

1153-T-85

Casa à Rua Bahia, 1.126 (Warchavchik)

SP

São Paulo

llM-T-85

Casa à Rua ltápolis, 961 (Warchavchik)

SP

São Paulo

1155-T-85

Conjuntoarquitetõnico onde funcionou a Vinícola Luiz Antunes

RS

Caxiasdo Sul

t156-T35

Lagoa da Granja do Comari

RJ

1157-T-85

Grutade N. Srü.da Lapa

MG

1158-T-85

Arquiva dwumental, fotagrá$ca e jomaiíslico(Correio do Povo) da C;a. Ca/das Júnior

RS

Engenho Corredor (rosé Lins do Rego)

PB

Teresópolis Ouro Preto

RJ

Rio de Janeiro

Sítio Santo Antõnio da Bica

RJ

Rio de Janeiro

1159-T-85

1132-T-84

Chafariz da Praça Mahatma Gandh

RJ

Rio de Janeiro

116&T45

Parque memorial da imigração polonesa

PR

CuHtiba

1133-T44

Igreja capela N. Sr-. da Conceição

PE

1161-T.85

Igreja Matriz de Paranguaba

CE

Fortaleza

270

Recife

O PATRIAõNIO eÁ PROCESSO

ANEXOV: PROCESSOS De TOABAA[NTOABERTOSDE 1.1.1970 A 14.3.1990

PortoAlegre Pilar

271

NeProcesso

1162-T-85

1163-}85

Nomedo Bem

Imagem de Santana de Ouro Preto Centro histórico e paisagístico de São Francisco do Sul

UF

Povoadoda

MG

sc

1188-T-86

São Francisco do Sul

Serrado Mar

1165-T-85

Ponte do Imperador

RS

lvoti

1166-T-85

Ponte da Rede Ferroviária Federal

sc

Blumenau

1167-}85

Conjuntoarquitetõnicoe paisagístico da Praçada República

PE

Recite

antigo bairro do Recite e Cais Apoio

PE

Recife

1169-T-85

Sobrado dos Andradas

MG

1170-T-85

Igreja de São Sebastião

BA

1171-T-85

Pintura de Vector Meireles

sc

FloHanópolis

1172-}85

Casaâ Rua Valparaíso,86 Rio de Janeiro Rio de Janeiro

SP/PR

jque teria pertencido ao

mal. Deodoroda Fonsecal

RJ

1174-T-85

FábHcade tecidos São Luiz

SP

ltu

1175-T-85

Conjuntoarquitetânicoà Rua Barão de São Borla e à Rua Soledade

PE

Reclfe

1176-}85

Pinturas do padre Jesuíno do

São Pauloe ltu

MonteCarmelo

SP

1177-T-85

Fábricade papel Bahia

BA

1178-T-85

Anffgaestaçãolerrovfárla

MG

1179-F85

Mercadomunicipal

AM

1180-T-85

Conjunto arquitetõnico, urbanístico e paisagístico de Cuiabá

MT

1181-}85

1182-T-85

1183-T-85 1184-T-85

1185-}85 1186-T-85

1187-}85

272

MG

Gruta do TamboHI

MG

1190-}86

TeatroMunicipal

SP

1191-T-86

Capela de N. Srü. da Boa Morte

MG

Barbacena

1192-}86

Conjunto arquitetõnico e paisagístico do Porto de Manaus

AM

Manaus

1193-T-86

Arapiraca

Estátua equestre de d. Pedra l

Salvador São Jogo Nepomuceno

PB

João Pessoa

1194-F86

PalácioMaçónicodo Lavradio

RJ

Rio de Janeiro

1195-T-86

Casa de Carlos Oswald

RJ

1196-T-86

Segmento da Serrade SãoTomodas Letras

MG

1197-T-86

Casa â AK Sele de Setembro, 200

RJ

1198-T-86

Solar Games Leitão (sede do SP

GáveaGolf e CountryClub

RJ

Rio de Janeiro

1200-T-86

FazendaLordelo IMarquêsdo Paraná)

RJ

Três Rios

1201-T-86

Conjunto arquitetõnico, urbanístico e paisagístico de Penedo

AL

Penedo

1202-T-86

EngenhoCentral (segmentodo Pireneus)

MA

1203-T-86

Serrade Plrenópolis

GO

Pirenópolis

1204-T-86

MG

Além-Paraíba

120&}86

Estaçãoferroviária Casa à Rua N. Srü.da Glória

MG

Mariana

1206-}86

Pavilhão Luiz Nunes

PE

Igreja de N. Srü. do Rosário e São Benedito

GO

Luziânia

SE

Aracaju

1207-T-86

Conjuntoarquitetõnicodo casario do Portode Corumbá

MS

Corumbá

1208-T-86

Fazendado Conde de Pinhal

SP

São Carlos

Placa de ouro jhomenagema Rui Barbosa)

cantiga Casa de Detenção)

PE

sc

Blumenau

1210-}86

Obrado Berço

RJ

MG

Hradentes

1211-T-86

Conjunto arquitetõnica de

N. SF.do Ó 1212-T-86

Brasília

O PATRIAÕNIOEA PROCESSO

Pindaré-Miram

Recife

Casa de Cultura

b

Rio de Janeiro

Jacareí

Antigoprédioda deiegacia do MinistéHo da Fazenda

1209-T-86

DF

Niterói

1199-T-86

Pirenópolis

RJ

Petrópolis São Tomo das Letras

Museude Antropologiado Valedo Paraíba)

GO

Estaçãoferroviária São Jogo del-Rei Hotel CopacabanaPalace

Parque estadual do Cabo Branco

Manaus

Cuiabá

São João da Boa Vista

e da Ponta Seixas

Conjunto arquitetõnico, urbanístico e paisagístico de Pirenópolis

Ponte metálicada Rede FerroviáriaFederal sobre o rio ltajaí-açu

Água Comprida Unaí

Prédio e sede da

FazendaMelancias

Barbacena

1173-T-85

Localidade

1189-T-86

Conjuntoarquitetõnicoe paisagísticodo

RJ

UF

1986

Chapada

1164-T-85

1168-T-85

Nomedo Bem

Localidade

Recife

Rio de Janeiro

PE

Paulista

GO

Formosa

Complexo arqueológico

Lapada Pedra

ANEXO V: PROCESSOS De TOABAAÉNTO ABERTOS DE1.1.1970A 14.3.1990

273

NQProcesso

1213-T-86

1214-}86

Nomedo Bem

Área central da Praça XV e imediações

1216-T-86

Localidade

Riode Janeiro

RJ

CE

lpueiras

Conjuntoarquitetõnico, urbanístico e paisagísticodo DistHto de Ribeirãoda Ilha

sc

Florianópolis

Sítio arqueológicoDuna Grande

N

Niterói

SP

Conjuntoarquitetõnicoe paisagístico do Hotel Quitandinha

RJ

Petrópolis

1219.T-86

PonteMarechalHermes

MG

Pirapora

1220-T-86

Estrada de Ferro Madeira-Mamoré

RO

1221-T-86

Capelade N. SP. da Boa Viagem do Pasmada

1218-T-86

1222-T-86

1223-T46

Processo

Prédiodo ColégioEstadual "Cuboà Ciência'

Nomedo Bem

São Paulo

PE

lgarassu

SP

Campinas

Conjunto arquitetõnico e paisagístico do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos

MG

1224-T-86

Casade Câmarae Cadeia

PE

1225-T-86

FazendaCapãoAlto

PR

Castra

RJ

Rio de Janeiro

1236-}87

Acervodo Seípro SewiçoFederal de Processamento de Dados

RJ

Rio de Janeiro

RJ

Rio de Janeiro

1237-T-87

Aceno do antigo BNH -

1238-T-87

Acervo do Museu de Arte e

História'Rosa Mana'

1226-}87

MG

BeloVale

1240-T-87

junto à Fazendada Boa Esperança Vila das Ferradas

BA

ltabuna

1241-T-87

FazendaSãoJosé

SP

ManteitoLobato

ISiüodo PimpauAma lo} 1242-}87

Vila operária em Fernão Velho

AL

1243-T-87

Fazenda Santa Cruz

MA

1244-F87

Casa à Rua 24 de Maio. 22

RJ

1245-T-87

Vivendade Apipucos

PE

1246.T-87

Gruta da LagoaRica

MG

Paracatu

1247-}87

Gruta da Igrejinha

MG

Ouro Preto

1248-T-87

Conjunto arquitetõnico e urbanístico de Antõnio Prado

RS

AntõnioPrado

1249-T-87

1227-}87 1228-T-87

NovaXavantina

Museuao ar livre de Odeans

e seuanHO

sc

Orleans

Sítio arqueológicona FazendaLajes

GO

Niquelândia

Conjuntopaisagístico da Praçados Melros. inclusiveseu coreto

RJ

Cantagalo

Prédiodo Fórum

RJ

Cantagalo

1231-T-87

Prédioda Câmara Municipa

RJ l

Cantagalo

1232-T-87

Fazendado Gavião

RJ

Cantagalo

1233-T-87

Conjuntoarquitetõnicoe paisagísticode Paquetá

RJ

Paquete

1229-T-87

1230-T-87

1234-T-87

274

Gruta Tocada Esperança

Buriti

Rio de Janeiro Recife

PE

Paulista

JardinsAméHca, Europa,Paulista, São Paulo

Igreja da Ordem Terceira do

Carmoe seu acervo MT

Maceió

Igreja Matriz N. SFa.dos Prazeres

e EngenhoMaranguape 1250-T-87

CasaVelhada SUDECOdo CentroOeste

Amcaju

Conjunto arquitetõnico e paisagístico

1251-T-87 SupeHntendência de Desenvolvimento

SE

1239-}87

Paulistano

1987

Localidade

Aceno da Uayd Brasileiro

Piranga

BrejoMadre de Deus

UF

1235-T87

BancoNacionalde Habitação

Aceno histórico e documental do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidadede São Pauta

t217-T-86

Ne

Igreja Matriz de São

Gonçalodos Cacos 1215-T-86

UF

1252-T-87

Vila ferroviáriade Paranapiacaba

1253-T-87

SerraDourada

1254-T-87

Orla marítima do Município do

Rio de Janeiro 1255-T-87

Igrejade São Lourenço

1256-T-87

Aldeiade Arcozelo

1257-T-87 1258-T-87

Igreja N. Slg.dos Remédios Vila da Estrelae Vila InhomiHm

1259-T-87

Reservas paleobotânicas

Santos

SantoAndré Goiás

Rio de Janeiro Goiana

Paudo Alferes lbitlara Magé

Mata

1988

Centra

O PATRIÁONIO [A

PROCESSO

1260-T-88

Acervomóvelda Light

ANEXOV: PROCESSOS Dt TOABAA[NTOABERTOS De 1.].1970 A 14.3.1990

Rio de Janeiro

275

Ne Processo

1261-T48

1262-T48

Nomedo Bem

UF

Localidade

municípiode Paranaguá

PR

Paranaguá

PalaceteArgentina

RS

PortoAlegre

AntigaCadelaPública

CE

12M-}88

Igrejade Santa Eõgênia

GO

Niquelândia

1265-T-88

Casa à Rua Ana Jesuíno, 8

RJ

Vassouras

1266-T-88

Sobradoázima Canalha cantigasede do governocivil e militarda Província)

MA

1267-T-88

Mata de Maranguape

PE

1268T-88

Cine-teatroRlo Branco

SP

1269-T-88

Igreja de N. Srü.de França

GO

lbiapina

Recife Aracaju

Corumbá

Acervode bens móveisque pertenceramà capelade N. SP. da Ajudada Fazenda

1290-T-89

Igreja de N. SP. do Rosário

MG

1291-T-89

Serrade São Domingos

MG

Poçosde Caldas

1292-T-89

Igreja de N. Srg.do Rosário

MG

LagoaSanta

1293-T-89

Igreja de N. SP. dos Remédios

TO

Arraias

1294-F89

Reservaarqueológica Arraias

Igreja Matriz do S. Sacramento Cemitério de escravos

Araxá

1297-}89

1278-T-88

Cine 9 de Abril

RJ

VoltaRedonda

1279.T48

Estúdiosda Rádio Nacional

RJ

Rio de Janeiro

1280-T-88

AntigoPrédiodo Supremo THbunalFederal

RJ

Rio de Janeiro

Campos

MG

1300-}89

Ponte Jogo Luiz Ferreira

PI

1301-T-89

Cavernas da Serra Bodoquena

MG

1302-T-89

Conjunto arquitetõnico e paisagístico de

Rio de Janeiro

Belém

SantaLuzia Carmodo Cachoeira Teresina

Bodoquena

RJ

Arraial do Cabo

do Brasil

RJ

Rio de Janeiro

1304-T-90

QuilomboVão do Moleque

GO

1305-T-90

Plano Piloto

DF

Arraial do Cabo 1990 1303-T-90

Espelho d'água e contorno da

PA

IFazenda da Chamusca)

Paracatu

Presídio do Instituto do

RJ

Pains

1299-T-89

Goiânia

RJ

Prédio do Instituto de Resseguros

Cavalcante Brasília

Casa de Anastácio Alces Braça

('0 Saranhão')

CE

ltapipoca

Conjuntoarquitetõnlcoda Praça Cruz Vermelha

RJ

Rio de Janeiro

Grutade Angicos onde moveu Lampião

276

Salvador

MG

Nortedo Estado

12M-T-88

BA

1298-T-89

Palhaça

1283-T-88

Laranjeiras

Parquee Fonte do Queimado

Tomazina

ltaberaba

1282.T-88

PE

1289-T-89

PE

sc

Baía de Guanabara

Conjunto arquitetõnico e urbanístico de Laranjeiras

IgrejaMatiz ParqueZoobotânico do Museu Paraense EmílioGoeldi

BA

1281-T-88

Riode Janeiro

1288-T-89

1296-T-89

Enseadado Brita

1277-T-88

RJ

São Félix

lguape

Cruzeiro

MG

RJ

Rio de Janeiro

São Francisco do Conde

1273-T-88

Capelade São Sebastião

RJ

BA

1272-T-88

MG

1287-T-89

Conjuntoarquitetõnlco,urbanístico e paisagísticode São Fénix InstitutoNacionalde Educação de Surdos

TO

SP

Conjuntocomplexo hidromineraldo Barreiro

Centraldo Brasil 1286-T-89

Imperial EscolaAgrícola da Bahia

Bairro Jlpovura (Katsura)

GO

Edifício d. Pedra ll e Estação

'Chapada dos Negros'

1271-T-88

1276-T-88

Localidade

1295-T-89

Pombal (Fazenda Ouro Final

1275-T-88

UF

São João del-Rei

MG

Igreja de N. St«.de Aparecida

1285-T-89

Viana

de Goiás

1274.T-88

Nomedo Bem

1989

Conjuntocentro histórico do

1263-T-88

1270.T-88

NQProcesso

SE

Canindé

O PATRIÁONIO eÁ PROCESSO

ANEXOV: PROCESSOS Dt TOABAA[NTOABERTOS De 1.1.1970 A 14.3.1990

277

ANEXO VI PROCESSOS Dt

ABERTOS Dt

Na Processo

TOABAA[NTO

1990 A 2008*

Nome do Bem

1306-T-90

Casarão Malburg

1 307-T-90

Conjunto paisagístico natural e arquitetõnico formado pelas praias do Arpoador,

Diaboe do Inferno, e pelo Forte de Copa-

UF

Localidade

sc l i-,j, RJ

Rio de Janeiro

RJ l

Rio de Janeiro

do centro histórico

PR

Lapa

1310 .T-90

Acervo integrante do Museu Villa-Lobos

RJ

Rio de Janeiro

1311 T-90

Áreas urbanas de Belterra e Fordlândia

PA

Aveiro

1312 T-90

Áreas urbanas de Belterra e Fordlândia

PA

Santarém

1313 .T-90

Igreja N. Sr'. Mãe dos Homens

AL

1314. T-90

RJ

Coqueiro Seco Rio de Janeiro

1315 ,T-90

Casa em Botafogo Pontes de ferro sobre o rio Engano

SP

Indaial

1316 .T-90

Casa da fazenda Taquaral

SP

Campinas Belém

CE

Fortaleza

1319 .T-91

Bosque Rodrigues Alves Dunas Dois aviões Catalina

PA

PA

Belém

1319 .T-91

Dois aviões Catalina

RJ

Rio de Janeiro

1320 .T-92

Palácio Tiradentes

RJ

Rio de Janeiro

1321 .T-92

Instituto de Psiquiatria no campus da Praia Vermelha da UFRJ

RJ

Rio de Janeiro

cabana, atual Museu Histórico do Exército 1308-T-90

Conjunto paisagístico natural formado

pela área da Prainha,Recreio dos Bandeirantes e Grumari 1309-T-90

1317 .T-90 1318 .T-90

Conjunto arquitetõnico e paisagístico

PI

1322-T-92

Parque Nacional da Serra da Capivara

1323-T-92

Sítios Tainhanteçu e Pequiza

MT

1324-T-92

Igreja de N. Sra. de Nazaré

PA

São Raimundo Nonato

Comodoroe Vila Bela da Santíssima Trindade Belém

Adorou-se a seguinte convenção por tipologia gráfica: negrito - tombados itálico arquivado; redondo em estudos. Foram assinalados em negrito os bens cujo tombamento foi homologada

até 2007. conforme listagem fornecida pela Copedoc/lphan. datada de 4 de março de 2008

Ne Processo

1325-T-93

t 326-T-93

327-T-93

1328-T-93 1329-T-93

Nome do Bem

UF

Localidade

Edifício Central da Universidade Federal do Paraná

Curitiba Gurinhatã

Igreja de Sãa Jerõnimo Cine-teatroCentral

Juiz de Fora

Casa da antiga agência do Banco do Brasii

Três Corações

Quilombos Oriximiná

Oriximiná

Ponte ferroviária

Quixeramobim

1355-T-95

Casa da antiga Escola de Veterinária

ChapadaDlamantina

Palmeiras

Corveta {guatemi

Belém

Casa dafazenda Registro Velho

Barbacena

Farol de Salinas

Salinópolis

1360-T-95

Lago do Pedalinho

Salinópolis

1361-T-95

Faixa iitorânea das praias de

t362-T-95

Maçarico e Atalaia Chácara da Floresta

1 363-T-95

Prédio da Escola de Equitação do Exército

Rio de Janeiro

1364-T-95

Casa no Rio Comprido

Rio de Janeiro

1330-T-93

Gruta existente no Serrote dos Morrinhos

Santa Quitéria

1358-T-95

1331-T-93

Casa do Colégio Nossa Senhora das Dores

Mirante da Av. Sete de Setembro. trecho da Ladeira da Barra

1334-T-94 1335-T-94 1336-T-94 1337-T-94

1

Buritizeiro BA

Salvador

PA

Belém

Coleção Abelardo Santos Casa onde morou e morreu Padre Cícero (Museu Padre Cícero)

CE

Juazeirodo Norte

Prédio da Delegada da Receita Federal. antiga Alfândega

SE

Aracaju

Mata da Esperança

Ilhéus

1339-T-94

Mata Atlântica

RJ

Rio de Janeiro

1340-T-94

Terreiro Filhos de Obá

SE

Laranjeiras

1341-T-94

Conjunto arquitetânico e paisagístico MG

Belo Horizonte

1342-T-94

da Pampulha Centrohistórico

MG

Cataguazes

343-T-95

357-T-95

359-T-95

Salinópolis

Rio de Janeiro

Jardim Botânico

1

365-T-96

Conjunto de edificações da Companhia de Saneamento do Amazonas Cosama

1

366-T-96

Reserva arqueológica Sambaqu de Beirada

Saquarema

1367-T-96

Conjunto paisagístico da Serra dos Cristais

Diamantina

1368-T-96

Ruínas de um paiol, quartel e casa

Morrodo PaiInácio,rlo M ambos integrantes do Parque da

1

1333-T-94

Rio de Janeiro

do Exército

Brasília

Prédio da Fundação Educacional Caio Monteiro Fujam

Localidade

1354-T-95

Sede da Associação dos Combatentes do Brasil

1 332-T-93

UF

1353-T-95

1356-T-95

Nova Friburgo

Nome do Bem

Ne Processo

1 369-T-96

1370-T-96

Conjunto arquitetõnico e paisagístico fabril

São José do Campos

Vale do Catimbau Reserva a Casa onde nasceu Antõnlo Conselheiro

PE

Buíque

CE

Quixeramoblm Campinas

do administrador

BA

ltaparica

1371 -T-96

Catedral Metropolitana de Campinas

SP

RJ

Angra dos Reis

1372-T-96

Igreja romana - Capela do Taim

RS

Rio Grande

1345-T-95

Vila junto à Escola Naval Solar Barão de Suassuí

MG

ConselheiroLafaiete

1373-T-96

1346-T-95

Ruínas da cidade de Airão

AM

Novo Airão

Conjunto arquitetõnico e paisagístico do arquipélago de Fernando de Nortenha

PE

1347-T-95

Localidade de Jericoacoara

CE

Jijoca de Jericoacoara

Fernando de Nortenha

1348-T-95

à Conjuntode cia e jardins do Museu do lpiranga,e Parqueda

SãoPaulo

1375-T-96

1 349-T-95

Teatro Municipal

SãoPaulo

1376-T-96

1350-T-95

Conjunto cultural. histórico, artístico e ambienta

1344-T-95

1351-T-95 352-T-95

280

1374-T-96

Conjunto arquitetõnlco e paisagístico formado pelos fortes de Imbuhy e Rio Branco

Niterói

Casa

Nova Friburgo da Vila de

SantoAmara

Forte do Buraco

Grão Mago Recife

Quilombo do Flecha

Mirinza

O PATRIAÕNIO [Á

1377-T-96

PROCESSO

General Câmara

Conjunto paisagístico constituído por formações geomoífológicas em monolito, conhecidos como serrotes

ANEXO Vl: PROCESSOS DeTOABA#leNTO ABERTOS De 1990 A 2004

281

Nome do Bem

Na Processo

UF

Teatro Jogo Caetano

RJ

Rio de Janeiro

1379-T-97

Conjunto arquitetõnico e paisagístico

CE

Sobram

1380-T-97

Acervo remanescente da antiga Igreja de São Sebastião

1381-T-97

Conjunto paisagístico constituído pelo Largo da Carioca e adjacências Acervo do Museu do Trem. no Engenho de Dentro

1378-T-96

1382-T-97

RJ

Rio de Janeiro

RJ

Rio de Janeiro Rio de Janeiro

RJ

t383-T-97

Rio Mucugezinho, situado no Parque Nacional da Chapada Diamantina

BA

Lençóis

1384-T-97

Conjunto paisagístico da Ilha da Trindade

ES

Vitória

1385-T-97

Conjunto paisagístico do Parque Ecológico de Preservação Ambiental e Florestal Ulisses Guimarães

GO

Goiânia

1386-T-97

Conjunto arquitetõnico do Pedregulho conjunto residencial Prefeito Mendes de Moraes

RJ

Rio de Janeiro

1387-T-97

Conjunto paisagístico constituído peia aléla de figueiras-de-pagode

RJ

1388-T-97

Campo de Sant'Ana

RJ

1389-T-97

Conjunto paisagístico

RJ

1390-T-97

Setor histórico do cemitério de Catumbi

RJ

1391-T-97

Marco comemorativo do centenário

Armaçãode Búzios Rio de Janeiro

MG

Juiz de Fora

Coleções do Museu Histórico Nacional Coleções do Museu Nacional de Belas Artes

RJ

Rlo de Janeiro

RJ

Río de Janeiro

1394-T-97

Coleções do Museu Imperial

RJ

Petrópolis

1395-T-97

Coleções do Museu da Inconfidência

MG

Ouro Preto

Coleções do Museu da República

RJ

Rio de Janeiro

1393-T-97

1396-T-97 1397-T-97 1398-T-97

1399-T-97

1400-T-97

282

Conjunto arquitetõnico e paisagístico da cidade de Marechal Deodoro Área conhecida como Jamari dos Pretos, ocupada por comunidade remanescente de quilombo Área conhecida como Mocambo. ocupada por comunidade remanescente de quilombo Áreas conhecidas como Riacho de Sacutiaba e Sacutiaba, ocupadas por comunidade remanescente de quilombo

Marechal Deodoro

BA

Wanderley

1401-T-97

Área conhecida como Castainho, ocupada por comunidade remanescente de quilombo

PE

Garanhuns Canudos

1403-T-97

Vestígios do Arraial de Canudos Morro conhecido como Pedra da Galinha Choca

PE CE

Quixadá

1404-T-97

Prédio do Palácio Anchieta

ES

Vitória

1405-T-97

Dedode Deus

RJ

Guapimirim

1406-T-97

Antigo solar na Praça Tiradentes

RJ

Rio de Janeiro

1407-T-97

Prédio da Estação Júlio Prestes

SP

São p;aDIo

1408-T-97

Local onde funcionou a primeira sinagoga do Brasil: e das Américas, conhecida como.Zur lsrael (Pedra de lsrael)

Fi'E I' Recite

1409-T-98

Área conhecida como, Parto Coriâ, ocupada por comunidãdê rernanescmte de quilambo

MG

1402-T-97

1410-T-98

Área conhecida como, lvaporanduva, ocupada por comunidade remanescente de quilombo,. no, Vale. da Ribeira

1411-T-98

SP

Lemedo Prado

i

Eídorado

Conjunto arquitetâniêo, urbanística e paiêagísttca da cidade delgatu,

iüclusiveruíhas de pedras

BA

Andaraí

Seminário

CE

Grato

1413-F98

Sé catedral

CE

Grato

1414-T:9&

Casa da cadeia pública

CE

Crato

1415-T48

Prédio da estação ferroviária

CE

Crato

141 6-T-98

Conjunto arquÊtetõntco Prédio do: Cinema Paratodos

BA

Palmeiras

RJ

Rio de Janeiro

14t8-T-98

Igreja de Nossa Senhora da Concepção

CE

Parambu

141gT-98

Prédio do Cinema Metro Boavista

RJ

Rio de Janeiro

Área ocupada por comunidade remates cente de qullombo, conhecida como Campinho da Independência Remanescentes da Estrada Real na

RJ l

Parat

Chapada Diamantina

BA

1417-T-98

MA

Turiaçu

1420-T-98

SE

Porto da Folha

t421-T-98

BA

Localidade

Áreas conhecidas como Riacho de Sacutiaba e Sacutiaba, ocupadas por comunidade remanescente de quilombo

1412-T-98'

AL

UF

1400-T-97

Rio de Janeiro Riode Janeiro

de Juiz de Fora 1392-T-97

Nome do Bem

Na Processo

Localidade

Wanderley

O PATRIAÕNIO[A

PROCESSO

ANEXO Vl: PROCESSOSDll TOABAAlINTO ABERTOS Dt 1990 A 2004

283

Ne Processo

1422-T-98

Nome do Bem

Acervo de documentos e objetos de estudo do Imperador Pedra ll acautelados no Museu Nacional e no Museu Imperial

1424-T-98

Agarro do Museu Rodovfárfode Para/puna

1425-T-98

Pergaminhos da Torah - manuscritos lvriim. do acervo do Museu Nacional

da UFRJ 1426-T-98 1427-T-98

Ilha de Campeche Prédio do Cinema Oriente

1428-T-98

Remanescentes do antigo quilombo

doAmbrósio 1429-T-98

1430-T-98

Conjunto de edificações projetadas pelo arquiteto Oscar Niemeyer, incluindo o edifício do Detran

UF

RJ

Rio de Janeiro/ Petrópolis

RJ

RJ

sc RJ MG

SP

Localidade

Riode Janeiro lbiá

1431-T-98

Capela de Nossa Senhora da Canceição

MG

Januária, Paracamb Carrancas

1432-T-98

Terreiro do Axé Opõ Afonjá

BA

Salvador

1433-T-98

Ruínas da ponte dos Dois Arcos

RS

Pelotas

1435-T-98

Estaçãoferroviária Prédio do Cinema Pathé

1436-T-98

Sítio histórico de São Jogo Marcos

1437-T-98

RJ

Níterói

1451-T-99

Conjunto arquitetõnico do Corredor da Vitória

BA

Salvador

1452-T-99

Complexo arqueológico Água Vermelha

SP

Ouroeste

Igreja matriz de Nossa Senhora da Assunção, inclusive a pintura do forro

CE

1454-T-99

Memorial Judaico

RJ

Viçosa do Ceará Vassouras

1455-T-99

Memorial Manoel Cargo

RJ

Vassouras

1456-T-99

Conjunto paisagístico da cachoeira da Fumaça

RJ

Resende

1457-T-99

Estação de hidroaviões

ES

Vitória

1458-T-99

Imagem de São José de Botas

RJ

Rio de Janeiro

1459-T-00

Terreiro do llê Opõ Ajagunã

BA

Laurode Freiras

1460-T-00

Casa grande e tulha da antiga Chácara do Paraíso das Campinas Velhas

SP

Campinas

Terreiro do llê Axé lba Ogum

BA

Salvador

1462-00

Canal artificial entre Macaé e Campos

RJ

Campos, Macaé Quissamã Carapebus

Conjunto arquitetõnico e paisagístico

1450-T-99

453-T-99

1461 -T-00

CampoGrande

do Príncipe

RJ

Rio Claro

1463-T-00

Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos

no bairroda Luz

SãoPaulo

SP

Eldorado

1464-T-00

Terreiro Casa das Minas Jeje

São Luas

1465-T-00

Igreja matriz de Nossa Senhorada

RS

1439-T-98

Sítio paleontológico Liberato Saturnino

SE

Porto Alegre Porto Redondo

1440-T-99

PontePaulo de Frontin, em Verá Cruz Casa da antiga Câmara do Grato,

RJ

Miguel Pereira

1441-T-99

CE

1442-T-99

onde funciona o Museu de Fósseis Asilo Santa lsabel

RJ

Grato Valença

1443-T-99

Parque municipal da Galheta

sc

Florianópolis

Casa na Tijuca

RJ

Riode Janeiro

Conjunto de edificações projetadas pelo arquiteto Oscar Niemeyer para o Centro Tecnológico da Aeronáutica

SP

1446-T-99

Casarão Sampaio

MG

Mário Campos

1447-T-99

Prédio da estação ferroviária

RS

Alegrete

Recinto de exposições agropecuárias

Paulode Lima Correa

Barretes

1467-T-00

Fazenda Montevidéu

Araras

1468-T-00

Conjunto urbano paisagístico voltado para a Praça da Alfândega e conjunto nas

da Praça

da Matriz 1469-T-00

Centrohistórico

1470-T-00

Sistemaviário, área e conjunto arquitetõnico da FazendaMonte Alegre e da Escola Agrícola Getúlio Varias

São José dos

O PATRIAONIO[A PROCESSO

Lima Duarte

Concepção de lbítipocae seu acervo 1466-T-00

Campos

284

Grato

RJ

Conjunto arquitetõnico da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

1445-T-99

Prédio e acervo da Casa de Memória Arnaldo Estêvão de Figueiredo Pavilhão Promotor lsmael Siriel pertencente ao Instituto Pena Vieira Ferreira Neto

Mairinque Rio de Janeiro

SP

1438-T-98

1444-T-99

Localidade

Sítio Caldeirão

São Paulo

MG

UF

1449-T-99

Riode Janeiro Florianópolís

Nome do Bem

1448-T-99

Comendador Levy Gasparian

Conjunto arqueológico e paisagístico do Vale do Peruaçu

1434-T-98

Na Processo

Incorporados à Faculdadede Medicina 1471-T-00

RS SP

PortoAlegro RibeirãoPreto

SP

Ribeirão Preto

BA

Salvador

Terreirodecandomblé llê lyá Omim Axé lyamassé

ANEXO Vl: PROC]]SSOS Dt TOABAA[NTO ABERTOS Dt 1990 A 2004

285

Nomedo Bem

Ne Processo

1472-T-OI

1473-T-OI

Bem móveis les do acervo históricode propriedade da CervejariaBrahma

UF

RJ

Rio de Janeiro

Aracaju

Conjunto arquitetõnico

Rio Tinto

1475-T-OI

Lagoa de Araruama

Araruama, lguaba Grande. São Pedra da Aldeia e Cabo

Fazenda Alto dos Bois

Angelândia

Igreja de Nossa Senhora do Desterro Estátua do Crista Redentor, no morro do Corcovado

Rio de Janeiro RJ

1479-T-OI

Vila Marzagão

MG

1480-T-OI

Edifício da antiga Repartição Central de polícia Terreiro de Alaketo

1478-T-OI

1481-T-OI 1482-T-OI 1483-T-OI 1484-T-OI

1485-T-OI

1499-T-02

lê Axé Oxumaré Centrohistórico

Maruim

Conjunto arquitetânico, urbanístico e paisagístico

Golada

MG

PB

João Pessoa

1502-T-02

Centro histórico e arquitetânico

SP

Santana de Pamaíba

1503-T-02

Igreja de São Sebastíãoem Planaltina Forte São Joaquím do Rio Branco Terreiro de culto aos ancestrais

DF RR

Distrito Federal Boa Vista

Omo llê Agbõula

BA

ltaparica

1506-T-03

Sistemade bondes de Santa Teresa

RJ

Rio de Janeiro

1507-T-03

Acervo do Museu de Imagens do RJ

Rio de Janeiro

1508-T-03

Sítio histórico e

AL

1509-T-03

TeatroCastroAlves

BA

Salvador

1510-T-03

Florestafóssil do Rio Poti

PI

Teresina

1511-T-03

Casa de Vidro. sede do Instituto

São Paulo

1514-T-03

Edifício da Bolsa Oficial do Café

Santos

TeatroOficina

São Paulo

1488-T-02

Museu de Arte Contemporânea

RJ

Niterói

1489-T-02

Conjunto histórico e urbanístico

PB

Areia

1490-T-02

Capela Crista Operário Residência cardlnalícia do Campo Grande

SP

São Paulo

515-T-04 1516-T-04

Cabo Frio

RJ

Valença São Paulo São Paulo

O PATRIÁÕNIOeA PROCESSO

Acervopaleontológico do Museu Paleontológico

da Universidade Regionaldo Cariri

CE

Santana do Cariri

1517-T-04

TerreiroTumbaJunçarada NaçãoAngola

BA

Salvado

1518-T-04

Casa onde residiu o ex-presidente da

151 9-T-04

República,VenceslauBrás GinásioSão José

1520-T-04

Salvador

RJ

SP

GO

Acervo histórico da Discoteca Oneyda Alvarenga, no Centro Cultural São Paulo, da Secretaria Municipal de Cultura

1487-T-02

Museu de Ade de São Paulo Masp: edifício e bens móveis integrados

Centrohistórico

Felixlândia

Rio de Janeiro

1495-T-02

1501-T-02

Pelotas

RJ

SP

Rio de Janeiro

1513-T-03

Casa na Estrada das Canoas

Sítio urbano do bairro do Pacaembu

Salvador

RJ

São Paulo

Salvador

1494-T-02

BA

Centrohistórico

Jundiaí

1493-T-02

Salvador

Lha Bo Bardi

BA

Contexto arquitetõnico, paisagístico e entorno da Fazenda Campos Novos Santa Casa de Misericórdia

Viçosa do Ceará

1512-T-03

SP

BA

Localidade

Acervoarquitetõnico e urbanístico aH(Hco

1504-T-02

Salvador

Igreja matriz de Nosso Senhor dos Passos

Imagem de Nossa Senhora da Piedade atribuída a Antõnio Francisco Lisboa o Aleijadinho

T

UF

1500-T-02

Rio de Janeiro

Terreiro de candomblé do Bate-Folha

286

Terreiro de candomblé

505-T-02

1486-T-OI

1492-T-02

t 498-T-02

Rio de Janeiro

Conjunto de edificações e bens móveis da Paulista de Estrada deFerro

1491-T-02

Conjuntohistóricoe ElevadorLacerda

Canoa de tolda Luzitânia, de propriedade

1474-T-OI

1477-T-OI

J

Nomedo Bem

1497-T-02

1496-T-02

da SociedadeSócio-ambiental do baixo São Francisco

1476-T-OI

Ng Processo

Localidade

f.,/

MG

ltajubá

MG

ubá ca

Sítio históricode caçaà baleia

BA

1521 -T-04

Sede da Fazenda Independência

ES

Mimoso do Sul

1522-T-05

Prédiodo Ministérioda Fazenda

RJ

Rio de Janeiro

1523-T-05

Terreiro Mokambo

Onze NguzoZa Nkisi Dandalunda Ye Tempo

BA

ANEXO Vl: PROCESSOSDE TOABÂÁeNTO ABERTOS DE 1990 A 2a04

287

Ng Processo

1524-T-05 1525-T-05 1526-T-05

Nome do Bem

Edifícios Rui Barbosa e Joaquim Nabuco (USP) Antiga sede da Fazenda Gama Mausoléu lcaro. localizado no Cemitério São João Batista

UF

N2 Processo

Localidade

{

BA

Salvador

1553-T-08

Centro histórico de Porto Nacional

TO

Porto Naciona

T554-T-08

Cidades do Piauí testemunhas da ocupação do interior do Brasil durante o século XVI Conjunto Histórico e Paisagístico de Parnaíba

Rio de Janeiro

Juiz de Fora

1555-T-08

t528-T-05

Igrejade N. S'. da Vitória

Salvador

1556-T-08

1529-T-06

Porongos, no município de Pinheiro Machado

Pinheiro Machado

1530-T-06

Complexo vulcânico de Nova lguaçu Terreirode candomblé Asé Nassó Oká llê Osun

Nova lguaçu

1531-T-06 1532-T-06 1533-T-06 1534-T-06

Cinema Rosário, no bairro de Ramos Terreiro Santo Antõnio dos Pobres lé Ogum Megegê Asé Baru Lepé Imóvel conhecido como Solar Abreu Vieira

1535-T-06

Sagihengo- área sagrada dos Povos Xingu

1536-T-06

Complexo histórico da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil

1540-T-07

Imagem de São Bonifácio, atualmente sob a g'farda do Pároco de Penalva Terrtliro Palácio de Ogum

1541-T-07 1542-T-07 1543-T-07

1544-T-07 1545-T-07

Conjunto arquitetõnlco. urbanístico e paisag.suco

Nova lguaçu Rio de Janeiro Duque de Caxias

e coleção Geyer

Lençóis

Cárceres

Niteról

Edificação sede do GRES Estação Primeira da Mangueira

Rio de Janeiro

1547-T-07

Feira de São Joaqulm

Salvado

1548-T-07

Edificações e núcleos urbanos e rurais relacionados com a imigração em Santa Catarina

1549-T-07

Casa de Chibo Mendes e seu acervo

1550-T-07

junto da Obra do Arquiteto Oscar Niemeyer Edifício Caramuru

288

São Félix

Terreiro de Candomblé do Caia Sítio Charqueador Pelotense

Pelotas

T557-T-08

Conjunto da Estação Ferroviária de Teresina

Teresina

1558-T-08

Centro histórico de Natal

Natal

1559-T-08

Acervos arquitetõnico, artístico e documental da Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia

1560-T-08

Igreja de N. S'. de Lourdes

1561-T-08

Estabelecimentodas Fazendas Nacionais do Piauí: fábrica de manteiga e queijo e estabelecimento rural São Pedra de Alcântara

BA

Salvador

P

Teresina

PI

Campinas do Piauí Floriano

f562-T-08

Conjunto histórico e paisagístico de Piracuruca

P

Piracuruca

1563-T-08

Jardins de Burie Marx no Recite

PE

Recite

1564-T-08

Sítio histórico de Caiboaté

RS

São Gabriel

1565-T-08

Bens culturais da imigração japonesa no Vale do Ribeira

SP

Registro, lguape

1566-T-08

Acervo do Museu de Artes e Ofícios

MG

Belo Horizonte

1567-T-08

Vila Serra do Navio

AP

Serra do Navio

1 568-T-08

Núcleo urbano de Santa Teresa

RS

Santa Teresa

Rio de Janeiro

1546-T-07

1551-T-08

Parnaíba

CampoGrande

Coleção de obras da produção plástica de Walter Smetak, de propriedade do espólio de Walter Smetak Conjunto arquitetõnico Praça do Caminho Niemeyer

9

Localidade

Conjunto urbano e arquitetõníco da Cidade Baixa

Pátio Urina de Creosotageme Conjunto Arquitetõnico da Estação Francisco Bernardino

1527-T-05

UF

1552-T-08

São Paulo Distrito Federal

Nome do Bem

O PATRIAÕNIO [A

PROCESSO

ANEXO Vl: PROCESSOSDe TOIKBAAlINTO ABERTOS Dl1 1990 Â 2004

289

ANEXO Vll DECRETO N-3.551,

Dt 4 Dt AGOSTO Dt 2000

Institui o registro de bens culturais de naturezaimaterial que constituempatrimónio cultural brasileiro,cria o programa nacional do património imaterial e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPUBLICA, no uso da atribuiçãoque Ihe confereo Artigo 84, incisa IV, e tendo om vista o disposto no Artigo 14 da Lei n' 9.649, de

27 de maio de 1998, Decreta:

Art. I'. Fica instituído o Reglstro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que

constituem património cultural brasileiro.

$ 1'. Esse registrose fará em um dos seguinteslivros: 1 - Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e mo-

dos de fazer enraizados no cotidiano das comunidadesl 11- Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas

que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade,do

entretenimento e de outraspráticasda vida sociall 111- Livro de Registro das Formas de Exprossão, onde serão inscritas manifestaçõos literárias, musicais. plásticas, cênicas e lúdicasl IV - Livro de Regístro dos Lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, san-

tuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas $ 2'. A inscrição num dos livros de registro terá sempre como referência a continuidade histórica do bem e sua relevância nacional para a memória

a identidade e a formação da sociedade brasileira. $ 3'. Outros livros de registro poderão ser abertos para a Inscriçãode bens culturais de natureza imaterial que constituam património cultural brasileiro e não se enquadrem nos livros definidos no parágrafo primeiro deste artigo.

Parágrafo único. Caberá ao Conselho Consultivo do Património Cultural deter-

Art. 2'. São partes legítimas para provocar a instauração do processo de

minar a abertura, quando for o caso, de novo Livro de Registro, em

registro:

atendimentoao disposto nos termos do $ 3' do Artigo I' deste decreto.

1 - o Ministro de Estado da Cultural

- instituições vinculadas ao Ministério da Cultural 111 - Secretarias de Estado, de Município e do Distrito Federal;

Art. 6'. Ao Ministério da Cultura cabe assegurar ao bem registrado:

11

1 - documentaçãopor todos os meios técnicos admitidos, cabendo ao lphan manter banco de dados com o material produzido durante a instrução do

IV - sociedades ou associações civis.

processo.

Art. 3'. As propostas para registro, acompanhadas de sua documentação

11- ampla divulgação e promoção.

técnica, serão dirigidas ao Presidente do Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional - lphan, que as submeterá ao Conselho Consultivo do Património Cultural.

i

r

Art. 7'.l O lphan fará a reavaliaçãodos bens culturais registrados,pelo menos a cada dez anos, e a encaminhará ao Conselho Consultivo do Património Cultural

para decidir sobre a revalidaçãodo título de Património Cultural do Brasil.

$ 1'. A instrução dos processos de registro será supervisionada pelo lphan.

Parágrafoúnico. Negadaa revalidação,será mantido apenas o registro, como

$ 2'. A instrução constará de descrição pormenorizadado bem a ser regis-

referênciacultural de seu tempo.

trado. acompanhadada documentação correspondente. e deverá mencionar

todos os elementos que Ihe sejam culturalmente relevantes.

Art. 8'. Fica instituído, no âmbito do Ministério da Cultura, o Programa Nacio-

tério da Cultura, pelas unidades do lphan ou por entidade, pública ou pri-

nal do PatrimónioImaterial,visandoà implementaçãode políticaespecíficade inventário, referenciamentoe valorizaçãodesse património.

vada, que detenha conhecimentos específicos sobre a matéria, nos termos

Parágrafo único. O Ministério da Cultura estabelecerá, no prazo de noventa

do regulamento a ser expedido pelo Conselho Consultivo do Património

dias. as bases para o desenvolvimento do Programade que trata este

Cultural.

artigo.

$ 3'. A instruçãodos processospoderá ser feita por outros órgãos do Minis-

$ 4'. Ultimada a instrução, o lphan emitirá parecer acerca da proposta de

Art. 9'. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.

registro e enviará o processo ao Conselho Consultivo do Património Brasília. 4 de agosto de 20001 179' da Independência e 112' da República

Cultural, para deliberação.

Ferrando Henrique Cardoso

$ 5'. O parecor de que trata o parágrafo anterior será publicado no DIárIo

Francisco Weffort

O#cia/ da União, para eventuais manifestaçõessobre o registro, que deve-

rão ser apresentadas ao Conselho Consultivo do Património Cultural no prazo de até trinta dias, contados da data de publicação do parecer. Art. 4'. O processo de registro, já instruído com as eventuais manifestações

apresentadas, será levado à decisão do Conselho Consultivo do Património Cultural.

SBD/FFLCH/USP

Art, 5'. Em caso de decisão favorável do Conselho Consultivodo Património

Bib. Fiorestan Fernandes

Cultural,o bom será inscrito no livro correspondentee receberá o título de Património Cultural do Brasil.

Proa. /N.USP N.F.

292

O PATRIAÕNIO[A

Tombo:

3509G7

Aquisição: Reposição/

ANEXO Vll: D]]CR]ITO N' 3.551, D]1 4 Dt AGOSTO DÉ 2000

PROCESSO 'f

/ R$

5723684 39,00 26/5/2011

293

ANEXO Vlll BENS REGISTRADOS Dt

2002 A 2008

2002 Ofício das paneleiras de Goiabeiras IES)

Arte kusiwa: pintura corporal e arte gráfica wajãpi(AP) 2004 Círio de Nossa Senhorade Nazaré(PA) Samba de roda do Recôncavo Baiana IBA)

2005 Modo de fazer viola-de-cacho(MT. MS) Ofício das baianas de acarajé IBAI

Jongono Sudeste (RJ,SP,ES) 2006 Cachoeirade lauaretê:lugar sagrado dos povos indígenasdos rios Uaupés e Papuri IAMI

Feirade CaruaruIPE) 2007

Frevo(PEI Tambor de crioula IMA) Matrizes do samba no Rio de Janeiro: partido-alto, samba de terreiro e samba-enredo IRJ)

2008 Modo artesanal de fazer queijo-de-minas, nas regiões do Serro e das serras da Canastra

e do SalitreIMGI Roda de capoeira e ofício dos mestres de capoeira Modo de fazer renda irlandesa, tendo como referência este ofício em Divina Pastora ISE)

ANEXO IX BENSCULTURAIS [ NATURAISDO BRASIL INSCRITOS NA LISTA DO PATRIAÕNIOCULTURALMUNDIAL DA UN[SCO*

Cidade Histórica de Ouro Preto, MG (1980) C Centro Histórico da Cidade de Olinda, PE (1982) C Ruínas de São Miguel das Missões, RS (1984) C Centro Histórico de Salvador, BA (1985) C

Santuário de Bom Jesus do Matosinhos, Congonhas do Campo, MG 11985) c

Parque Nacional do lguaçu, PR (19861 /V

Brasília,DF (1987) C Parque Nacional da Serra da Capivara. PI (1991) C Centro Histórico de São Luas, MA (19971 C Costa do Descobrimento- reservas da Mata Atlântica, BA (1999) A/ Mata Atlântica - reservas do Sudeste, SP e PR (1999) A/ Centro Histórico da cidade de Diamantina, MG (1999) C Parque Nacional Jaú, AM (2000) N

Área de conservaçãodo Pantanal,MT e MS (2000) N Ilhas atlânticas brasileiras:as reservas de Fernando de Noronha e do atol das Rocas, PE e RN (2001) N Áreas protegidas do Cerrado: parques nacionais Chapada dos Veadeiros e Emas. GO (2001) N Centro Histórico da cidade de Golas. GO (2001) C

Até dezembrode 2008. A letra C indica bens culturaisl a letra N indica os naturais

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