Dutra & Stranz, 2003

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In RONCHI, L.H. & COELHO, O.G.W. (org.) Tecnologia diagnóstico e planejamento ambiental. Ed. UNISINOS, São Leopoldo. pp. 293-351

História das Araucariaceae: a contribuição dos fósseis para o entendimento das adaptações modernas da família no Hemisfério Sul, com vistas a seu manejo e conservação Tânia Lindner Dutra & Anamaria Stranz

RESUMO .......................................................................................................................................................2 INTRODUÇÃO...........................................................................................................................................3 A DISTRIBUIÇÃO MODERNA DE ARAUCARIACEAE ........................................................................................4 ECOLOGIA DAS CONÍFERAS AUSTRAIS ..........................................................................................................8 Que elementos diagnósticos devem ser procurados no registro quando se deseja acompanhar a evolução do grupo?..............................................................................................................................10 A paleogeografia e a história das Araucariaceae ..............................................................................11 Triássico Superior .................................................................................................................................12 Jurássico................................................................................................................................................14 Cretáceo ................................................................................................................................................15 Terciário ................................................................................................................................................21 Paleoceno ..............................................................................................................................................21 Eoceno ...................................................................................................................................................22 Oligoceno ..............................................................................................................................................24 Mioceno .................................................................................................................................................25 Plioceno.................................................................................................................................................25 Quaternário ...........................................................................................................................................26 Conclusão .............................................................................................................................................28 Referência Bibliográficas ....................................................................................................................29 __________________________________________

História das Araucariaceae: a contribuição dos fósseis para o entendimento das adaptações modernas da família no Hemisfério Sul, com vistas a seu manejo e conservação1 Tânia Lindner Dutra & Anamaria Stranz Resumo O registro fóssil de Araucariaceae é acompanhado na busca de elementos que permitam avaliar sua reação às profundas mudanças paleoclimáticas e paleogeográficas ocorridas no passado geológico como um modo de compreender suas modernas adaptações e a distribuição disjunta de suas florestas. Os primeiros fósseis de coníferas datam do final do Triássico e estão distribuídos em várias partes do Gondwana, embora limitados às paleolatitudes de 30oS e 50oS. Aqueles, capazes de ser associada a Araucariaceae mostram uma mescla de caracteres encontrados em distintos grupos modernos e confirmam para esse momento, o primeiro grande pico de aumento de diversidade dessas gimnospermas. No Jurássico já estão estabelecidas no Gondwana e, a partir daí, irão gradativamente conquistar as terras setentrionais, um processo que irá se estender até a parte basal do Terciário, mesmo após a chegada das angiospermas. Sua restrição moderna ao Hemisfério Sul é aqui considerada uma conseqüência das grandes mudanças de caráter tectônico, climático e ambiental, que ocorreram a partir da metade do Terciário (Oligoceno Inferior), quando gradualmente o Hemisfério Norte é coberto pelo gelo, e como uma resposta às modificações na circulação atmosférica e oceânica resultantes da separação da Antártica dos outros continentes austrais. As estratégias que foram adotadas com vistas à sua sobrevivência são atualmente mantidas e sua análise é útil para a compreensão de seus requisitos pretéritos e das mudanças ocorridas. O registro fóssil demonstra ainda que, até o Jurássico, as secções Bunya (Hemisfério Sul) e Eutacta (no norte) eram dominantes e que os gêneros Agathis e Wollemia surgem apenas no Cretáceo. Estes aspectos contrastam em parte com o que tem sido proposto nas análises filogenéticas e cladísticas da família e seus agrupamentos. A grande expansão numérica e espacial conseguida durante o Mesozóico irá interromperse no final do Terciário, quando apenas os membros de Eutacta demonstram estar preparados para os novos climas e a geografia que se estabeleceu na parte oriental do Hemisfério Sul.

Abstract The fossil record of Araucariaceae is accompanied during the changes in past geography and climates, with the aim of contribute in the understanding of modern disjunct distribution of the family. Registered since the Triassic in many parts of the Gondwana (between paleolatitudes 30oS and 50oS), with pollen and distinct morphogenera (Araucariaxylon, Brachyphyllum, Araucarites) that exhibit a mix of characters today found in distinct members of the family, the group corroborate this time like that for the first moment of great diversity (heyday). In the Jurassic times unequivocally they are established. The fossil record since then allows to pursuit their presence in Gondwana and their distribution in both hemispheres by the end of Cretaceous and Lower Tertiary and how they answer to the arriving of angiosperms. Their nowadays restriction to Southern Hemisphere is here proposed like a consequence of the great tectonic, climatic and environmental changes occurred during the middle of Tertiary, more drastic in the north, and like a answer to the changes in the atmospheric and ocean circulation patterns with the Antarctic drift apart from the other continents. The strategies adopted to survive are now maintained and to look it are useful to understand the past environmental requirements and distribution. The fossil record and paleofloristic distribution also shows a dominance of Bunya (Southern Hemisphere) and Eutacta (in the north) sections of Araucaria genus in the Jurassic and the emergence of Agathis and Wollemia in Cretaceous time. Those aspects contrast in part with the recent cladistic groupment proposed to the family. The great spatial and numerical expansion of the family during the Mesozoic will be retracted in the Tertiary, when members of 1 DUTRA, T.L. & STRANZ, A. (2003) História das Araucariaceae: a contribuição dos fósseis para o entendimento das adaptações modernas da família no Hemisfério Sul, com vistas a seu manejo e conservação. IN: Luiz Henrique Ronchi (Org.) Tecnologia, Diagnóstico e Planejamento, Editora UNISINOS, São Leopoldo. Vol. 1 (in press)

Eutacta emerge like the more prepared to the new climate and geographic conditions of the eastern South Hemisphere lands.

INTRODUÇÃO A importância das Araucariaceae para o estudo e a compreensão da vegetação do Hemisfério Sul é bastante clara. A preferência dessas coníferas pelas costas submetidas a clima oceânico tornou-as intimamente ligadas à cultura humana, encantando alguns por sua fisionomia exclusiva e despertando a cobiça de outros por sua valiosa madeira. Esta relação se estabelece desde que os homens primitivos começaram a habitar a Australásia e as Américas, e a historiografia mostra que, pelo menos desde cerca de 1.500 anos atrás, caçadores-coletores utilizaram suas sementes na alimentação (Cabral 2001, Schmitz e Basile-Becker 1991). Populações indígenas mais recentes (cainguanges no Brasil, mapuches no Chile e Argentina e maoris na Australásia) mantiveram essas ligações, habitando e protegendo suas florestas, utilizando-as como moradia e retirando daí o alimento. No século XVIII, a leitura dos clássicos gregos incentivou os naturalistas e exploradores europeus em suas navegações pelas míticas terras do Hemisfério Sul, permitindo os primeiros contatos com sua flora. Conta Gray (1994) que o capitão James Cook só aportou às costas da Nova Caledônia em sua primeira expedição pelo Pacífico (1768-1771) pela insistência dos botânicos David Solander e Joseph Banks, fascinados pela peculiar aparência da Araucaria columnaris (G. Forst.) Hook. Um século mais tarde, quando da chegada ao Novo Mundo, os colonizadores empregariam sua madeira na construção de casas e como atividade exploratória. As araucárias iriam se tornar as coníferas mais importantes economicamente na América do Sul e uma das mais destacadas na Australásia, ocasionando uma devastação ainda mais pronunciada de suas matas (Shimizu e Oliveira 1983, Veblen et al. 1995). No Brasil, entre 1958 e 1987, chegaram a constituir 90% da exportação madeireira e o segundo maior bem nessa atividade logo após o café. A presença de Araucaria angustifolia Bert. (O.) Kuntze na vegetação brasileira sempre chamou a atenção dos estudiosos por suas ligações andinas ou antárticas, estranhas ao caráter tropical dominante. Para Rambo (1951), dava à flora do sul do Brasil um caráter “misto”, enquanto outros a consideraram o “problema mais obscuro da vegetação” (Hueck 1972 e 1978, Leite e Klein 1990, Leite 1994). A necessidade de compreender essa distribuição norteou as primeiras abordagens com caráter mais científico e que se seguiram aos trabalhos pioneiros e naturalísticos de Saint-Hilaire (1820-1821), Martius (1906), Lindman (1906) e, a partir de 1931, da notável contribuição do Pe. Balduíno Rambo. Os estudos podem ser subdividos em três fases, segundo o enfoque e o tempo que representam. A primeira dessas fases inicia entre as décadas de 1930 e 1950 e coincide com o período mais intenso da exploração da madeira (Krug 1964, Maack 1968). As pesquisas buscavam avaliar a extensão territorial das áreas ocupadas pelo pinheiro e já manifestavam a preocupação por seu corte indiscriminado (Laboriau e Mattos Fo 1948, Aubréville 1949, Rambo 1956, Klein 1960, Hueck 1961 e 1978, Reitz e Klein 1966). Abriram espaço para as abordagens sistemáticas e ecológicas, que iriam se efetivar décadas mais tarde (Backes 1973 e 1983, Ferreira e Irgang 1979, Cozzo 1980), e para as primeiras iniciativas, nem todas efetivas e funcionais, da criação de áreas protegidas e de manejo nacionais (e.g. Florestas Nacionais, de uso direto e Parques Nacionais, de proteção integral) e estaduais (Garcia et al. 1978, Salomão 1997). Órgãos públicos, com vistas a favorecer a restauração dessas florestas, também foram criados (Instituto Nacional do Pinho, em 1940, e Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal). Apesar disso, nos anos 1970, o ritmo de desmatamento no sul do Brasil era de aproximadamente 80.000 ha/ano (Gantzel 1982). A segunda fase é caracterizada pelas tentativas de realizar um mapeamento sistemático, a criação de bancos de sementes e para experimentos com crescimento. Coube prioritariamente aos engenheiros florestais (Garcia et al. 1978, Soares 1979 e 1980, Shimizu e Oliveira 1983, Seitz 1986, Teixeira et al. 1986, Carvalho 1994, Guerra e Reis 1999) e permitiu avaliar que dos aproximadamente 20 milhões de hectares (182.295,00 km2 ou 35% da vegetação do sul do Brasil) cobertos pela mata de pinheiros até a década de 1930 (Hueck 1972, Seitz 1982, Mattos 1994) restava nas décadas de 1980-1990 uma proporção variável entre 2,8% (Seitz 1986) e 10% (Leite e Klein 1990). Na Nova Zelândia e Austrália esse índice é similar (5%) e o principal fator para sua redução teria sido o fogo induzido pelo homem (Enright e Ogden 1995).

No Chile, as florestas remanescentes de A. araucana estendem-se atualmente sobre 253.715 hectares, dos quais 122.679 ha (48,4%) se encontram em Parques Nacionais (Mujica 2003). Na Argentina, Rechene e Bava (2003), por meio de mapeamento por fotos aéreas, encontraram 40% de florestas originais ainda intactas, atribuindo como fatores de degradação dessas florestas à exploração florestal, aos incêndios e ao uso pastoril. A produção mais recente e característica da terceira fase foi incentivada pela constatação de que os danos causados haviam sido tão profundos, que, se medidas urgentes e novas metodologias não fossem empregadas, talvez não pudessem mais ser revertidos. Divide-se entre aqueles que sugerem procedimentos para sua conservação (Richter 1998, SOS Mata Atlântica 2001, Rio Grande do Sul 2002) e os que abordam sua ecologia, paleoecologia (Enright e Hill 1995, Fernandes e Backes 1998, Kershaw e Wagstaff 2001) e fitogeografia da América do Sul (Bolzon e Marchiori 2002, Parodi 2002, Leite 2002, Roderjan et al. 2002, Mujica 2003, Rechene e Bava 2003). Em termos práticos tem servido de estímulo para a proposição de novas áreas de preservação (Parques Nacionais da Serra Geral e Aparados da Serra, criados no Rio Grande do Sul, em 1992), embasados no fato de que pinheiro seria um de taxa em vias de extinção (Carvalho 1994, Richter 1998) ou vulnerável (Portaria Instituto Brasileiro do Meio Ambiente - IBAMA, n.º 37-N, de 3 de abril de 1992, Hilton-Taylor 2000). As novas técnicas de abordagem marcam este último período, tais como o uso de imagens de satélite em conjunto com criação de sistemas de informações geográficas, além do seqüenciamento gênico. O primeiro já produziu alguns resultados práticos na avaliação das áreas remanescentes e seu comportamento espacial (Gantzel 1982, Ducati et al. 1999, Stranz et al. 2000 e 2001, Diverio et al. 2001 e 2002). Sugerem para o sul do Brasil uma retomada dos espaços, favorecida pelo clima e pelas medidas restritivas ao corte. A análise molecular, buscando estabelecer as relações filogenéticas entre os representantes modernos e o comportamento genético da população, com vistas à recuperação da biodiversidade, também como veremos, já forneceu seus primeiros resultados (Setoguchi et al. 1998, Auler 2000, Graham et al. 2002). Em que pese essa nova postura e as contribuições daí advindas, muitos aspectos permanecem, contudo, duvidosos. Não se conhece, por exemplo, as verdadeiras causas de sua moderna distribuição disjunta na América do Sul e Australásia (Dutra et al. 1999, Platt 2002), e muito ainda há que descobrir a respeito dos inúmeros parâmetros ambientais que governam seu desenvolvimento. Ao analisar sua história pretérita e o contexto onde viveram (paleoflorística), almeja-se aqui fornecer novos elementos que possam contribuir à resolução de alguns desses aspectos e tornar sua presença em nossa flora “menos problemática e obscura”. O registro fóssil é acompanhado desde o aparecimento das primeiras formas relacionadas com a família Araucariaceae, e evidências sobre como enfrentaram as grandes mudanças paleogeográficas e paleoclimáticas são apresentadas à discussão, incluindo os novos dados provenientes das pesquisas brasileiras na Antártica e no sul do Brasil. A distribuição moderna de Araucariaceae A família Araucariaceae possui hoje uma distribuição dominantemente austral e que contrasta aquela mais ampla que possuía durante o Mesozóico. Esta deve ter sido a razão para que muitos pesquisadores a considerassem um grupo relictual, argumento de difícil sustentação quando se observa seu comportamento na Australásia e, em especial, na Nova Caledônia, onde hoje vivem 13 de suas 19 espécies (De Laubenfels 1972, Veillon 1980). Enright et al. (1999) sugerem que a grande concentração de espécies nestas áreas é uma boa evidência de que aí estão as condições adequadas para a sua sobrevivência. A maior parte dos representantes modernos vive em florestas úmidas (rain forests) de locais submetidos a um clima mesotérmico subtropical ou temperado (Strahler e Strahler 1989, Nimer 1990) e próximo, mas não ao nível do mar. As exceções são a forma andina Araucaria araucana (Mol.) Koch., da América do Sul, que suporta invernos secos e frios, e as que vivem em solos calcários do litoral da Nova Caledônia, A. columnaris (G. Forst) Hook e A. nemerosa K. (Veblen et al. 1995). Sua distribuição sugere um comportamento vicariante e governado pela separação dos continentes que formavam o Gondwana. Dos três gêneros que compõem a família moderna, Wollemia é representado por uma única espécie, W. nobilis Jones, Hill & Allen (Jones et al. 1995), e exclusivo do sudeste da Austrália. Agathis apresenta 20 espécies e é exclusivo da Australásia e ilha norte da Nova Zelândia, e Araucaria é o mais abundante, diversificado e com maior amplitude geográfica (Figura 1). Araucaria contém 4 secções: Columbea (ou Araucaria de Setoguchi et al. 1998), exclusiva da América do Sul e com duas espécies (A. angustifolia e A. araucana); Bunya, restrita a Austrália e

representada pela espécie A. bidwilli; Intermedia, também com uma única espécie, A. hunsteinii da Nova Guiné, e Eutacta, que possui o maior número de espécies (15) e a mais ampla distribuição geográfica, mas limitada ao setor oriental (Nova Guiné, Austrália, ilhas Norfolk e Nova Caledônia).

Figura 1 – Distribuição geográfica e número de espécies dos gêneros modernos de Araucariaceae. Para Kershaw e Wagstaff (2001), a abrangência espacial desta última secção poderia representar uma maior antiguidade no registro geológico. Este argumento não encontra, contudo, sustentação nem entre os caracteres presentes nos primeiros fósseis, nem como mecanismo evolutivo esperado diante das grandes mudanças ambientais porque passou o planeta ao longo de sua história mesozóica. Parece refletir melhor sua adaptação às novas condições ambientais e paleogeográficas impostas pela separação dos continentes. As propostas filogenéticas e de agrupamento das formas modernas apresentadas por Setoguchi et al. (1998) e Graham et al. (2002), baseadas no seqüenciamento gênico de bases do gene rbcL do DNA dos cloroplastos, também mostram, ao lado de muitos aspectos interessantes, algumas divergências em relação aos dados do registro. Os primeiros analisaram material genético de 29 formas modernas da família e, associando caracteres anatômicos, como o número de cotilédones e a posição dos cones masculino e feminino, propuseram o cladograma reproduzido na Figura 2. Sugere uma origem monofilética para a família, a consistência das secções modernas de Araucaria e uma maior proximidade entre Bunya, Intermedia e Columbea entre si do que com Eutacta (caracterizada por cones masculinos terminais e a orientação oblíqua ou perpendicular dos estômatos na folha). Atesta ainda a relação entre as duas formas americanas (A. angustifolia e A. araucana) e de Agathis ovata com os representantes de Araucaria da Nova Caledônia. Estes mostram grande proximidade e refletem a rápida irradiação adaptativa às novas condições edáficas surgidas após o final do Eoceno naquele local. Derivados da alteração de rochas ultramáficas, os solos deram origem a uma paisagem esclerofílica e heliófita (maquis), onde os pinheiros se distribuem desde os 100 até os 900 metros de altitude (Jaffré 1995).

Figura 2 – Proposta filogenética para Araucariaceae Henkel & W. Hochst. 1865, modificada a partir dos dados apresentados por Setoguchi et al. (1998).

Discorda, contudo, dos dados do registro fóssil que analisaremos a seguir, ao mostrar Wollemia como um taxa basal e seguido de Agathis, ambos dotados de características vegetativas e reprodutivas ausentes entre os fósseis mais antigos. A identificação de Wollemia nas florestas de Eucaliptus do leste da Austrália é, no entanto, muito recente e ainda não foi acompanhada de uma revisão mais profunda no documentário fóssil. De qualquer modo, mostra estruturas distintas daquelas conhecidas para as primeiras formas no registro. Por outro lado, Araucaria sect. Bunya, cujas características se manifestam desde cedo no registro, são sugeridas nessa proposta cladística como formas derivadas. É visível, portanto, que as relações filogenéticas acima do nível específico ainda se mantêm pouco claras (Codrington et al. 2002). No Brasil, um trabalho com esse caráter foi realizado por Auler (2000), utilizando formas de A. angustifolia em populações de Santa Catarina, e serviu para, através da distribuição de alelos nas enzimas, indicar uma maior variabilidade intra do que interespecífica e como alerta para os perigos que a fragmentação das matas pode causar na freqüência e dinâmica dos alelos. Para o pinheiro brasileiro (A. angustifolia), a maior parte dos autores aponta uma distribuição entre as longitudes de 45oW e 55oW e entre os paralelos 20oS e 29oS. Apesar disso, alguns estudiosos sugeriram uma maior amplitude latitudinal (15o a 30oS, para Martius 1924 e Rambo 1956), mais de acordo com os novos estudos aqui analisados. Além das áreas do sul do Brasil, aparece ainda no nordeste da Província de Misiones, Argentina (Figura 3), onde se desenvolve a cerca de 800 metros de altitude, em uma pequena área, cujo limite sul é a cidade de San Pedro e coincidente com os declives orientais dos rios que descem da Serra Central da Província (Ragonese e Castiglione 1946, Cabrera 1951, Parodi 2002). Sua suposta presença no Paraguai não foi confirmada posteriormente (Hueck 1961 e 1972 e Mattos 1994). A. angustifolia caracteriza a Floresta Ombrófila Mista ou com Araucária (Klein 1960, Carvalho 1994, Mattos 1994, Rizzini 1997, Teixeira et al. 1986, Veloso et al. 1991, Leite 2002), uma formação de climas muito úmidos e que associa elementos tropicais afro-brasileiros a tipos temperados, de origem austral (352 espécies, segundo Leite 2002). Segundo Cabrera e Willink (1980), o Distrito dos Pinhais insere-se na Província Florística Paranaense, a mais diversificada do Domínio Amazônico. A Reserva da Biosfera incluiu-a recentemente no Bioma da Mata ou Floresta Atlântica (Chiappetti 2001), um enfoque que não tem apoio nos requisitos ecológicos, de fisionomia e de relação entre os elementos, mas justificável diante das intenções protecionistas e dos aspectos climáticos mais globais que condicionam seu crescimento. Nas áreas típicas de ocorrência no Brasil (especialmente Paraná e Santa Catarina), costuma formar uma cobertura contínua (pelo menos esta era a situação até o início de seu intenso desmatamento), intercalada apenas por manchas de campos, sobre o Planalto composto de rochas ígneas (basaltos e riodacitos, segundo MME/DNPM 1989). Constituía o elemento dominante e, muitas vezes, o mais abundante no dossel, o que conferia uma fisionomia própria às formações. Podem ocorrer ainda, na borda sul e leste dos canyons que margeiam as elevações (Formação Montana de Leite e Klein 1990 e Leite 2002), nos vales que daí descem, onde se alinham acompanhando os sistemas de drenagem, sujeitos a inundações ocasionais (Formação Aluvial) e em “capões” ou fragmentos de mata, na parte mais elevada do planalto coberta por campos de altitude, onde ocupam as porções protegidas das nascentes dos rios (Formação Altomontana). Nas áreas mais baixas de savana podem aparecer como indivíduos isolados e, em geral, mais jovens. Esta última paisagem é a dominante no Rio Grande do Sul e considerada relíquia de climas anteriores mais secos (James 1942, Hueck 1952, Rambo 1956, Hueck 1961, Leite 2002, Quadros e Pillar 2002, Marchiori 2002), um aspecto que concorda com os espectros polínicos quaternários disponíveis (Lorscheiter 1983, Behling 1997 e Behling et al. 2002). Essa distribuição sugere uma variação altitudinal, confirmada pelos estudos realizados. Em áreas mais ao norte (Minas Gerais, Serra do Caparaó, limite com o Espírito Santo, Itatiaia, Serra da Mantiqueira e dos Órgãos, no Rio de Janeiro e em São Paulo), crescem entre 1.400 e 1.800 metros, ocasionalmente a 2.000 metros, representando o limite altitudinal da floresta e compensando a menor latitude (Parodi 2002). No Rio Grande do Sul, inversamente, são registrados em faixas mais baixas de altitude (Veloso et al. 1991, Leite e Klein 1990, Backes 1999 e Leite 2002), aparecendo como fragmentos mais restritos de floresta entre as áreas da savana parque de média altitude (300–400 metros), tanto em São Martinho e Tenente Portela, no centro-norte (Mattos 1972, Teixeira et al. 1986), como em formações submontanas disjuntas, abaixo dos 30oS, sobre áreas do Escudo Sul-riograndense (Figura 3), noticiadas por Leite (2000) e De Lima et al. (2002). Também o embasamento aí é distinto das áreas do Planalto, sendo composto por

rochas ígneas do tipo gnaisse, de idade Proterozóico (Chemale Jr. 2000, Porcher e Lopes 2000). Esta última área nem sempre foi reconhecida como natural para o crescimento do pinheiro (Garcia et al. 1978, Guerra e Reis 1999) e não havia sido indicada na obra de Rambo (1956) que, além disso, limitou o crescimento das matas a um mínimo de 500 metros de altitude. Alguns pesquisadores, contudo, apóiam seu caráter espontâneo (Leite e Klein 1990, Leite 2002, Mauhs 2002). Embora ainda não existam dados suficientes para confirmar seu caráter nativo, a análise fitossociológica preliminar e as condições edáficas (solos ácidos) e climáticas mostram muitos aspectos similares aos presentes no Planalto (De Lima et al. 2002).

Figura 3 - Distribuição de A. angustifolia a partir do levantamento de Hueck (1952), Teixeira et al. (1986) e Mattos (1994). As áreas em cinza mais claro, ao sul, embora não sejam consenso entre os botânicos, são propostas como naturais por Hueck (1953), De Lima et al. (2002) e Leite (2002) quanto a seu caráter espontâneo.

Para Hueck (1941) e Maack (1968), os pinheiros poderiam se desenvolver naturalmente em vales protegidos pela concentração do frio e da umidade, fazendo com que seu limite inferior de ocorrência baixasse até 200 metros no sul e 700 metros em São Paulo e Minas Gerais. Pitcher (1975) e Gurgel Fo e Pisani (1975) examinaram ocorrências em áreas entre 250 e 198 metros de altitude em Lauro Müller, Santa Catarina, também considerando-as como naturais (Leite 2002). Para Leite e Klein (1990), formações desse tipo, similares também aos “capões” do Planalto, seriam um bom retrato dos processos ocorridos logo após as fases de frio e seca do Quaternário, quando a partir dos vales e de corpos fragmentados de floresta gradativamente coalesceriam formando corpos mais contínuos. A única outra espécie americana, A. araucana, distribui-se entre as latitudes de 37o30’S e 39o48' S (Zona de Araucana), coincidindo em parte, no Chile, com as Florestas Valdivianas (Hoffmann 1994, Rechene e Bava 2003). Apresenta uma distribuição disjunta em dois núcleos principais (Figura 4). O primeiro e mais contínuo abrange ambos os lados da Cordilheira dos Andes e desenvolve-se, como esperado, sobre solos derivados do vulcanismo. O segundo consiste de dois pequenos fragmentos de mata junto à Cordilheira de Nahuelbuta, próximo ao Oceano Pacífico, formada por rochas graníticas, metamórficas (Armesto et al. 1995) e sedimentares (Peralta 1980), que originam solos arenosos, bem drenados e ácidos. As altitudes variam entre os 1.800 a 1.400 metros no norte e 600 metros no sul, para ambas as ocorrências. A pluviosidade varia entre os 1.500 mm e 3.000 mm/m/ano, na costa, com máximos de 5.000 Figura 4 - Distribuição de A. araucana no Chile e mm/m/ano. Tipos variados de Nothofagus são seus Argentina, a partir de dados de Armesto et al. (1995) e Hoffman (1994). acompanhantes preferenciais (Veblen et al. 1995).

Ecologia das coníferas austrais As coníferas compartilham atributos ecofisiológicos que as distinguem das plantas com flores (Kershaw e McGlone 1995) e de outros grupos de gimnospermas. Suas folhas pequenas e endurecidas e os caules menos eficientes no transporte dos fluidos e soluções, já que possuem apenas traqueídeos, limitam e retardam seu crescimento e o desenvolvimento das sementes e plântulas. As folhas são também menos vascularizadas e limitadas quanto às possibilidades de variar em forma e tamanho, o que pode ser a causa de sua menor tolerância aos locais sombreados. A menor eficiência fisiológica é, contudo, compensada pelo caráter perene e longevo dos indivíduos, garantindo o tamanho e porte expressivo e uma maior resistência às condições adversas. As formas do Hemisfério Sul têm sua regeneração restringida em solos muito férteis e úmidos e em zonas de clima quente, onde as pteridófitas e angiospermas são favorecidas (exceção feita a alguns tipos de Podocarpus). Assim podem viver em locais caracterizados por grande perturbação ambiental e solos instáveis (Ogden e Stewart 1995), lixiviados, secos ou congelados e mais empobrecidos em nutrientes, onde a possibilidade de desenvolvimento do estrato superior da floresta de angiospermas seja reduzida, garantindo-lhes a luz (Rogers 1954, Klein 1960, Backes 1973, Ferri 1980, Bond 1989). Cestaro (1988) aponta uma redução de 94% da luminosidade no interior da mata de pinheiros no sul do Brasil em relação às áreas de campo. Araucaria araucana, A. hunsteinii, Agathis australis e algumas Cupressaceae e Taxaceae, por exemplo, costumam formar conjuntos densos após perturbações pelo fogo, deslizamentos, enxurradas e erupções vulcânicas (Enright e Ogden 1995). Veblen et al. (1995), chamam a atenção para a coincidência entre a distribuição moderna de A. araucana e as áreas submetidas a vulcanismo ativo, onde seria a primeira colonizadora das tefras, junto com Nothofagus antarctica. Rechene e Bava (2003) por meio de estudos silvícolas para A. araucana na Argentina, também descrevem os solos provenientes da alteração de cinzas vulcânicas como sendo a litologia preferencial para a distribuição da espécie. As cinzas sofrem um processo de erosão, que dá lugar a argilas de diferentes características (alofanização), que aumentam a capacidade de retenção de umidade e compostos orgânicos. Estas características permitem o desenvolvimento da floresta, mesmo quando ocorre um verão com déficit hídrico. É importante apontar que essas condições instáveis não devem ser encaradas como “ótimas” para seu crescimento, mas apenas o que lhes restou, por oferecer menor grau de competitividade. Esta é provavelmente também a razão porque a maioria dos autores atribui um comportamento pioneiro para A. angustifolia nas sucessões (Rambo 1956 pg. 267, Klein 1963, Reitz e Klein 1966, Rizzini 1997, Leite 2002), após uma primeira consideração de que seria uma espécie sere ou intermediária (Rogers 1954, Soares 1990). Os aspectos que veremos a seguir e seu comportamento no passado sugerem a primeira dessas categorias como a mais coerente. Para Rizzini (1997), as características heliófitas de A. angustifolia, uma das razões apontadas para seu comportamento pioneiro, estariam demonstradas em suas folhas esclerofíticas, de cutículas espessas, estômatos aprofundados na epiderme e abundante esclerênquima. Embora estes parâmetros pudessem demonstrar também uma resposta à restrição hídrica, como ocorre em outros vegetais, tal hipótese seria incongruente com as áreas permanentemente úmidas onde atualmente cresce o pinheiro brasileiro. A intolerância do pinheiro aos locais com déficit hídrico foi apontada igualmente por Golfari (1963) e encontra suporte na presença de folhas perenes e no grande número de estômatos identificados por Stockey e Ko (1986) e Dutra e Stranz (2000). Estes aspectos tendem a apoiar, portanto, a heliofilia das folhas como um caráter relacionado a seu comportamento pioneiro. Segundo Inoue et al. (1979), apenas excepcionalmente as araucárias poderiam tolerar a falta de luz nas fases iniciais, mas teriam seu crescimento retardado. Apesar disso, trabalhos recentes de Duarte e Dillenburg (2000) e Duarte et al. (2002) têm contestado a necessidade da luz nas fases iniciais e sua condição de planta pioneira. Os experimentos feitos mostram, no entanto, que os vários graus de sua tolerância à sombra só foram observados em áreas de replantio e em condições de laboratório, não tendo sido registrados em matas naturais. Entre os aspectos apontados pelas autoras como antagônicos a seu possível caráter pioneiro, alguns estão realmente presentes em A. angustifolia (índices elevados de fotossíntese), enquanto outros são mais característicos das angiospermas (vida curta e alta taxa de substituição das folhas). De qualquer modo, destaca-se entre as conclusões obtidas a possibilidade de que

outros fatores governem sua germinação e regeneração e que devem ser considerados nos projetos de replantio. Também os bosques de A. araucana mostram que a disponibilidade de luz e as áreas abertas são condição favorável para seu desenvolvimento. Em ambientes mais mésicos, onde se forma um dossel mais denso, gradativamente reduz-se a poucos indivíduos e acaba por ser substituída na sucessão (Veblen et al. 1995). Em um experimento realizado em uma área de 41.000 hectares de bosque puro de A. araucana na Argentina, onde a cobertura do dossel superior alcançava 89%, ocorreu a regeneração de 7.500 indivíduos por hectare, distribuídos em todas as classes de altura e cobrindo a área de maneira homogênea. Assim, a ampla cobertura não influenciou o estabelecimento de novos indivíduos (Rechene e Bava 2003). Essa particularidade das coníferas tem profunda implicação evolutiva. Como veremos neste trabalho é apontado também por Rizzini (1997), a mescla de caracteres aparentemente antagônicos (esclerofilia e bons teores de umidade no ambiente) não é tão rara entre os vegetais, podendo refletir a manutenção de caracteres primitivos, que a planta não teve plasticidade genética para suprimir. Os esclerófilos heliófitos e as coníferas em geral são, coincidentemente, as plantas com menor plasticidade (Rizzini 1997, p. 283). Já as plantas com flores podem alterar rapidamente a fisionomia dos caules e folhas, mesmo em um único indivíduo, adaptando-se melhor a novos condicionantes ambientais. Esta é inclusive a razão por que apenas as últimas são utilizadas pelos paleobotânicos quando desejam informações paleocológicas (Webb 1959, Dolph e Dilcher 1980). Nas araucárias, as cutículas espessas das folhas e o aprofundamento dos estômatos poderiam representar caracteres putativos, adquiridos como resposta aos grandes espaços bem iluminados do Mesozóico. A partir do advento das angiospermas, no limite Juro-Cretáceo, teriam se associado a novas adaptações, como, por exemplo, o grande número de estômatos, úteis à vida nas latitudes e altitudes mais altas, em geral dotadas de maior umidade. A falta de cutículas preservadas em fósseis do Mesozóico, impede, contudo, no momento, a correta avaliação desses elementos. A vida longa e as folhas perenes e esclerófilas incluem as coníferas no grupo das plantas ditas “econômicas ou avarentas” (hoarders ou savers) de Boersma et al. (1991), ou seja, que fazem uso eficiente dos nutrientes e, portanto, capazes de ocupar solos menos favoráveis. Vitousek (1982) demonstrou em florestas de coníferas do Hemisfério Norte um consumo mais rápido do nitrogênio, testado igualmente em florestas austrais (Armesto et al. 1995). Segundo Schmithüsen (1966), quando as condições se tornam impróprias, as formações com pinheiros respondem fragmentando-se. Quando retornam as condições adequadas, como hoje ocorre na América do Sul e desde o último glacial, reconquistam os espaços. Outro aspecto importante diz respeito ao comportamento das coníferas diante das queimadas. O alto teor de compostos voláteis em suas folhas provoca sua rápida combustão e pode eliminar grandes áreas de florestas. Além disso, ao contrário das formas setentrionais, os tipos austrais não possuem boa capacidade de regeneração, exceto talvez os indivíduos já bem desenvolvidos, cujo córtex espesso age como proteção e permite a regeneração por meio de ramos epicórmicos (Rogers 1954, Veblen et al. 1995). Para Nitma (1968) e Quadros e Pillar (2002), o curto tempo de vida da semente nos ramos não garantiria aos pinheiros, especialmente às formas jovens, defesa diante das queimadas. Entretanto, o uso de queimadas chegou a ser defendido por alguns pesquisadores (p. ex., Soares 1980 e 1990) como forma de patrocinar a abertura de espaços para sua propagação. Para A. angustifolia em síntese, os seguintes requisitos ecológicos e ambientais, além dos já comentados em termos de altitude e latitude, parecem ser importantes, por garantir um clima mesotérmico superúmido e uniforme, sem estação seca: 1) índices pluviométricos elevados, variáveis segundo os autores, entre 1.250 a 2.200 mm/média anual, nunca inferiores a 1.000 mm de média anual (Huek 1972, Nimer 1990, Rizzini 1997); 2) temperaturas amenas, com médias anuais entre 10 e 15oC; 3) mínimas absolutas de – 8oC, média do mês mais frio entre 8 e 14oC e com geadas entre 20-30 dias ao ano e neve nos estados do Sul em não mais do que um dia por ano (Nimer 1990, Backes 1999); 4) médias do mês mais quente, entre 18 e 23oC (Golfari 1963, Monteiro e Speltz 1980, Shimizu e Oliveira 1983, Nimer 1990, Diverio et al. 2000); 5) solos pouco espessos e ácidos, com horizontes húmicos também delgados (20 cm em média), argilosos, ricos em alumínio trocável (álicos) e com índices de pH entre 4,2 e 5,5 (Hueck 1961 e 1972, Backes 1983, Jarenkow 1985, Diverio et al. 2001 e 2002). Os primeiros dois parâmetros caracterizam o clima como do tipo Cfa (e Cfb, em áreas elevadas) no sistema de Köppen, típico do sul do Brasil e da Província de Misiones na Argentina (Golfari 1963, Quadros e Pillar 2002). A alta pluviosidade resulta, entre outros fatores, do confronto entre as massas de ar frio polar e as aquecidas da Zona de Convergência Intertropical (ICZ ou ZCAS de Sanches e Silva Dias 1996). A

distribuição preferencial das florestas sobre as áreas montanhosas da margem do Atlântico, que atuam represando as correntes de ar úmido do oceano, é, portanto, também coerente. Essas observações são úteis no sentido de desmistificar a imagem das Araucariaceae como indicadoras de frio, em parte incutida pela iconografia divulgada a partir das formas setentrionais. Estas coníferas são, pelo contrário, termofílicas, um caráter testável também no lado australiano da distribuição. A significativa produtividade primária (7.2 a 6.4 t/ha/ano, conforme os locais) e a expressiva produção de folhedo total (mais da metade do material da mata), apesar de sua difícil decomposição (cerca de 500 dias), apóiam a caracterização de seus biomas como subtropicais (Britez et al. 1992, Backes et al. 2000). Neste aspecto, apenas A. araucana entre as formas modernas mostra um comportamento distinto. Suporta condições mais contrastantes de umidade, com teores que variam grandememente entre as áreas do leste (com até 4.000 mm/média/ano) e do oeste da Cordilheira dos Andes (1.100 mm/média/ano), verões secos e invernos com solos congelados (Veblen et al. 1995). A umidade aí presente resulta do sistema de contralíseos (alíseos de oeste), que influem sobre as latitudes temperadas do globo. Que elementos diagnósticos devem ser procurados no registro quando se deseja acompanhar a evolução do grupo? Os estudiosos são unânimes em apontar que a maior dificuldade em identificar o momento de origem das primeiras Araucariaceae é reconhecer, entre os fósseis, os caracteres morfológicos que demonstram reais afinidades com a família (Meyen 1987, Taylor e Taylor 1993). Do estoque de coníferas que ultrapassou o limite Permiano–Triássico, mesclando morfologias presentes em diferentes grupos modernos, quais conteriam as feições diagnósticas capazes de identificar o(s) ancestral(is)? Diante do caráter fragmentário dos elementos no registro, como diagnosticar suas reais afinidades? Durante as fases que antecedem o seu recobrimento pelos sedimentos, as plantas, muitas vezes, perdem suas conexões orgânicas e, assim, dificultam uma atribuição taxonômica segura de seus fósseis (Taylor e Taylor 1983, Stewart 1987). Conhecer as características de cada uma das partes de uma conífera é, por isso, importante e, neste aspecto, as formas modernas são a ferramenta utilizada. A natural resistência da madeira faz com que os lenhos sejam um dos elementos mais comuns no registro. Em grande parte deles, no entanto, preservam-se apenas as feições do xilema secundário, razão por que, quando “caracteres araucarióides” estão presentes, são atribuídos apenas a morfogêneros, tais como Dadoxylon Endlicher e Araucarioxylon Kraus (recentemente incluídos em Agathoxylon por Bamford e Philippe 2001). Muitas vezes, e em especial em sedimentitos do início do Mesozóico, podem estar ainda associados a partes vegetativas de pteridospermas (Herbst 1966) ou compartilhar caracteres com outros grupos de coníferas, dificultando ainda mais sua identificação. É importante, por isso, saber que em formas modernas da família o xilema secundário é picnoxílico, com pontuações areoladas (bordered pits) hexagonais e unisseriais, raramente bisseriais, dispostas de forma alternada nas paredes radiais dos traqueídeos (pontuação araucarióide), sem canais resiníferos, com espessamentos espiralados e parênquima axial (Stewart 1987, Marchiori 1996). Duas ou mais séries de pontuações poligonais podem estar presentes (Taylor e Taylor 1993, Meyen 1987). Nas folhas e ramos, o arranjo helicoidal e a disposição verticilada têm sido, respectivamente, considerados diagnósticos, embora possam aparecer em outras gimnospermas (Stewart 1987, Meyen 1987). A forma das folhas é variável e igualmente pode ser compartilhada. A constatação de que em araucárias modernas folhas distintas possam estar presentes mesmo em um único ramo (como em A. heterophylla) ou em ramos jovens e adultos de uma mesma espécie acabou por conduzir a propostas complexas de classificação (Harris 1979). Stewart (1987), buscando simplificar a abordagem, propõe distingui-las entre os fósseis em dois tipos principais: o braquifílico, para as pequenas, tetragonais e falcadas, quando são atribuídas ao morfogênero Brachyphyllum (como em B. mamillare Brongniart 1828), e o linearfílico, para as de forma alongada e aplainadas, subsésseis, em geral designadas a Pagiophyllum. Esta afinidade originou, por seu turno, novos conflitos, já que alguns paleobotânicos incluem Brachyphyllum ora nas Cheirolepidiaceae, uma família extinta de coníferas (Meyen 1987), ora em Podocarpaceae ou Taxodiaceae (Del Fueyo 1991). Convencionou-se, contudo, que, a partir do final do Mesozóico, relações com os gêneros modernos já podem ser estabelecidas. De qualquer modo, na ausência de cutículas (preservadas nas compressões e mumificações) ou de estruturas reprodutivas, é muito difícil separar os diferentes grupos de coníferas entre os fósseis (Meyen 1987). Lamentavelmente, contudo, esta é uma condição rara num grupo cuja história sempre foi mais distante dos corpos d' água e ligada a ambientes continentais oxidantes. Somente a partir do Terciário, com

o aumento da umidade, restos de epiderme puderam ser resgatados das cutículas e permitiram uma afinidade mais segura com as Araucariaceae. Em sua análise, é importante que se possa dispor de uma boa revisão dos caracteres estomáticos e morfológicos das formas modernas, como os realizados por Stockey e Ko (1986) e Page (1980), que distinguiram, respectivamente, Araucaria (e suas secções) e Agathis. Complementaram os estudos anteriores de Cookson e Duigan (1951), Stockey e Taylor (1978a, 1978b e 1981) e Stockey (1982) e monstraram que esses gêneros caracterizam-se por folhas sem ornamentação na epiderme (papilas ou anéis de Florin). No primeiro, os complexos estomáticos são numerosos e visíveis mesmo a olho nu, aprofundados na epiderme e dispostos em fileiras descontínuas (Dutra e Stranz 2000), menos freqüentemente em bandas (o que pode ocorrer na secção Eutacta) e em ambas as faces da folha adulta (as jovens são hipoestomáticas), um caráter que dividem com Wollemia (Jones et al. 1995). Agathis é hipoestomática. Folhas grandes e com numerosas veias paralelas, sem divisões dicotômicas, distribuídas da base ao ápice, são também exclusivas de Agathis e das secções Bunya e Columbea (A. angustifolia e A. araucana) do gênero Araucaria (Meyen 1987). A venação, pouco visível nas formas vivas, torna-se destacada com a morte e o ressecamento (Dutra e Stranz 2000). As secções Bunya, Columbea e Intermedia ainda possuem em comum a orientação dos complexos estomáticos paralela ao bordo da folha e uma cutícula espessa sobre as células subsidiárias (geralmente em número de quatro), de contorno oval ou arredondado. Em Eutacta, costumam dispor-se ortogonalmente à margem (Stockey e Ko 1986). As estruturas reprodutivas das Araucariaceae são incluídas no morfogênero Araucarites e constituem um valioso elemento diagnóstico. Caracterizam-se por escamas ovulíferas com uma forma típica de cunha e base alargada. Os cones masculinos são alongados e cilíndricos, com numerosos microesporófilos semelhantes a brácteas e cerca de 12 sacos polínicos invertidos. Os femininos são grandes e de forma globosa ou ovóide (Reitz e Klein 1966, Mattos 1994). Em Araucaria, uma única semente (o óvulo é invertido) está embebida em uma escama pequena e abaxial, por sua vez fundida a uma bráctea lenhosa (conjunto bráctea-escama), mas que mantém a extremidade livre (lígula). Cada semente possui quatro cotilédones, formando um par duplo (Silba 1986, Taylor e Taylor 1993). O material polínico permite identificar entre os fósseis apenas a presença da família. Em geral, é associado aos gêneros Araucariacites Cookson (A. australis Cookson 1947 ex Couper), Inaperturopollenites (I. reidi de Jersey) e Callialasporites Sukh Dev. (Batten e Dutta 1997). A morfologia do grão de pólen é comum a de outras coníferas (Cupressaceae, Taxaceae, Taxodiaceae, algumas Pinaceae e Podocarpaceae, segundo Zamuner et al. 2001), o que os torna menos úteis na identificação das formas no registro (Meyen 1987, Hill 1994). Porém, quando são o único elemento presente, como em níveis de plataforma marinha rasa, encorajam seu estudo mais profundo. Alguns palinólogos consideram que, diante da preservação da ultra-estrutura da exina e de sua comparação com as formas modernas, atribuições mais seguras são possíveis. Para Batten e Dutta (1997), nestas situações Araucariacites e Callialasporites exibem maior similaridade com as Araucariaceae. Os grãos caracterizam-se por seu aspecto simples e pelos diminutos sacos polínicos. Araucariacites possui ora forma esférica, com sexina e nexina unidas (A. australis), ora triangular e com as duas camadas separadas. Neste último caso, a sexina é pregueada e enrugada e, às vezes, com aparência trilobada, um caráter comum com Callialasporites (Batten e Dutta 1997). Os dois tipos de pólen já foram, no entanto, encontrados associados a cones masculinos de Brachyphyllum mamillare no Jurássico Médio de Yorkshire, Inglaterra. A paleogeografia e a história das Araucariaceae A evolução das plantas representa nada menos que a natural e necessária conseqüência de sua história através do tempo geológico Balduíno Rambo, S.J., 1958

A história das Araucariacea, o grupo mais primitivo de coníferas ainda vivas, inicia logo após a maior das extinções presenciada pelo planeta no limite entre as eras paleozóica e mesozóica. No intervalo que vai do final do Permiano ao topo do Triássico inferior, as condições ambientais nos dois extremos do Gondwana, foram muito distintas. Enquanto no setor oriental, Austrália e Índia lentamente passaram de subtropicais para temperadas frias, no lado ocidental (norte da América do Sul e África Ocidental) os ambientes permaneceram dentro do âmbito das latitudes subtropicais (Scotese 1998).

Daí em diante até o final do Cretáceo, climas subtropicais e tropicais com médias próximas dos 30oC, irão caracterizar amplas áreas do Gondwana e influenciar profundamente a vida das araucárias. A América do Sul, num movimento preferencial para oeste, não mudará sua posição mais do que 20o de latitude durante cerca de 300 milhões de anos. Graças a esta geografia, o clima global se manterá homogeneamente aquecido durante um extenso período de tempo, só interrompido por um curto e pouco drástico intervalo de frio (Ice House) no limite Juro-Cretáceo, com as temperaturas atingindo pouco menos de 20oC, e por um segundo momento, mais extremo (médias de 10oC), no Terciário Superior. Triássico Superior O Triássico foi o momento de máxima união dos continentes para formar o Pangea. Para Parrish (1993), o regime climático que governava a maior parte do globo na época devia ser do tipo megamonzonal e megaestacional, baseando-se para isso na Ásia moderna, igualmente uma grande massa continental. Uma ampla faixa equatorial de calor (e seca), além disso, fazia com que o confronto entre os centros de alta e baixa pressão, hoje atuantes nas latitudes médias, estivesse deslocado cerca de 15o mais para sul e, nos pólos, não houvesse condições para a formação de uma calota espessa de gelo (Figura 5). Na área correspondente ao sul do Brasil, norte da Argentina e Índia e na África do Sul, situada no limite entre a faixa tropical e a temperada, os contrastes climáticos eram grandes ao longo do ano, ora com influência de climas continentais secos, ora dos anticlones do Paleo-Pacífico, que traziam grande quantidade de chuva e o retorno da vida. Os sistemas fluviais de grande expressão presentes no registro geológico da epóca, capazes de carregar grandes troncos, são um bom documento desses processos. É nesse cenário que surgem as primeiras coníferas de grande porte e com afinidade com os grupos modernos. Serão tão importantes durante o Mesozóico quanto foram os dinossauros, seus acompanhantes. Entre elas, as Araucariaceae e Podocarpaceae tiveram uma distribuição preferencial no sul desde o início de sua trajetória e uma origem entre as Glossopteridales, que haviam dominado o Gondwana durante o Permiano (White 1990). Para McLoughlin et al. (1998), o decréscimo das glossopterídeas e sua substituição pelo conjunto Peltastermales-Licófitas-Corystospermas ou por floras dominadas por coníferas, teriam sido sincrônicos ao longo do Gondwana, contrastando com o diacronismo de substituição das camadas de carvão pelas de coloração vermelha (red-beds), que ocorreu em diferentes momentos, entre o final do Permiano e o Triássico Médio, em cada um dos continentes. Segundo Meyen (1987), a vegetação do final do Triássico se parece mais com aquela que caracterizará a base do Jurássico e se caracterizou pelo desaparecimento das floras de Voltzia e Pleuromeia.

Figura 5 – Mapa paleoclimático do Triássico Superior obtido a partir de depósitos climaticamente sensíveis (modificado de Scotese 2001) e a posição do sul do Brasil na época (círculo). Novas informações sobre as faunas e floras do final do Triássico permitem acompanhar a chegada de formas primitivas de Araucariaceae ao Gondwana e a Laurásia (Figura 6A), além de auxiliar na determinação das reais afinidades com a família moderna. Os restos de lenho, ramo e polens exibem um espectro de variação que se insere entre o esperado para a família e, ao mesmo tempo, refletem o aumento de diversidade das gimnospermas após a extinção do Permiano–Triássico, como proposto por Anderson e Anderson (1998a e 1998b).

Na América do Norte foram reconhecidas pioneiramente por Ash (1972) e Dilcher e Taylor (1980). Distribuem-se entre lenhos de Araucarioxylon e ramos de Pagiophyllum e Brachyphyllum, identificados no leste do Arizona (Petrified Forest National Park, Formação Chinle), na Pensilvannia e no oeste do Novo México (Zona de Dinophyton, do Carniano Superior). No Hemisfério Sul, os restos de lenho identificados no Brasil (Rio Grande do Sul) são os posicionados nas menores paleolatitudes. Atribuídos igualmente a Araucarioxylon, por seu número e tamanho expressivo (cerca de 1 m de diâmetro), constituem também uma verdadeira “floresta petrificada”. São encontrados próximo às cidades de Mata e São Pedro do Sul (Minello 1994, Bolzón 1995a e 1995b, Guerra Sommer et al. 1998 e 2000), mas raras vezes nos níveis de conglomerados fluviais onde se acredita tenham sido preservados. Os níveis foram atribuídos à Formação Caturrita (Faccini 2000), Seqüência Deposicional II (Scherer et al. 2000) ou ao topo da Superseqüência Santa Maria (Zerfass et al. 2003), o que lhes confere uma idade Neotriássica (Noriano–Rético?). Em camadas próximas, mas representativas de fácies distintas e, provavelmente, um pouco mais antigas, um rico material fóssil foi recentemente identificado na forma de ramos com folhas (do Complexo Brachyphyllum-Pagiophyllum), lenhos autóctones (Kaoxylon zalesskyi) e prováveis estruturas reprodutivas (cones e escamas ovulíferas) ainda não determinadas (Dutra e Crisafulli 2002, Dutra et al. 2002b). Permitiu a reconstituição de indivíduos de porte arbustivo, que viviam junto a áreas sazonalmente inundadas de planícies de inundação e lagos, associados aos sistemas fluviais. Junto foram encontrados dinossauros primitivos, protomamíferos, lagartos e conchostráceos, que apóiam a idade Triássico Superior. Esta flora se sobrepõe tanto aos níveis ricos em Flora de Dicroidium, quanto aqueles que contém a maior parte dos répteis tecodontes e mamaliformes (Membro Alemoa de Andreis et al. 1980, topo da Seqüência II de Faccini et al. 1995 e Scherer et al. 2000). Na Argentina, Araucarioxylon protoaraucana Brea, 1997 é registrado na Bacia Cuyana (Formação Potrerillos), em Mendoza. Os lenhos foram encontrados em posição de vida e sua descoberta ocorreu durante as viagens de Darwin pela América em 1846 (Brea 1997). As estruturas anatômicas mostram afinidade com as secções Columbea e Eutacta (A. cunninghamii e A. muelleri). Sua associação com a Biozona MBC de Morel et al. (2001), de idade Noriano (base do Triássico Superior ou topo do Triássico Médio), faz desses restos os mais antigos, onde características de afinidade com as Araucariaceae são visíveis. Alguns outros tipos, também identificados nas bacias argentinas, compartilham caracteres primitivos araucarióides e abietinóides (Araucarioxylon sp. A, Protocircoporoxylon, Protojuniperoxylon ischigualastensis), levando a inclui-los na família Protopinaceae Kraüsel 1949 (Zamuner 1992). Para Zamuner et al. (2001), seriam precursores das Podocarpaceae, Araucariaceae, Cupressaceae e Taxaceae. Provêm, em grande parte, da Formação Ischigualasto (Biozona BNP de Morel et al. 2001, base do Triássico Superior), onde também foi identificado Rhexoxylon piatnitzkyi, lenho associado com Pteridospermas (Corystospermas), forma presente também no Rio Grande do Sul (R. brasiliensis Herbst e Lutz), embora não se conheçam exatamente os níveis de onde se originaram. As coníferas irão superar as Corystospermas nas bacias argentinas como formadoras do estrato superior dos bosques, na parte mais alta do Triássico Superior (Formação Passo Flores, Biozona DLM). É nesse momento também que os bosques perenes são substituídos por aqueles de caráter caducifólio, sugerindo períodos de seca mais destacados (Artabe et al. 2001). Em várias partes do território argentino, lenhos de grandes dimensões aparecem associados a sedimentitos vermelhos no topo do Triássico, como, por exemplo, na Formação Los Colorados (Stipanicic e Bonaparte 1979). Entre os polens domina, contudo, Classopolis associado a família Cheirolepidiaceae, junto com outros grãos característicos da Zona Foveosporitres morotonensis, do Noriano Superior–Rético da Austrália e Nova Zelândia (Zavattieri 2001). Na África do Sul (Namíbia), Araucarioxylon aparece associado a Podocarpoxylon e Prototaxylon em várias localidades do Triássico, em camadas dos grupos Ecca e Beaufort inferior (Bamford 1998). Na Índia, os restos são igualmente significativos por sua antigüidade (Noriano) e por conter estruturas reprodutivas associadas, atribuídas a Araucarites parsonerensis Lele 1955 e A. indica Lele 1962 (Florin 1963, Benton 1993). Na Austrália, os macrofósseis são raros, mas Araucariacites é registrado entre os palinomorfos da região de Queensland, na parte nordeste do continente (Figura 6A). O fato de hoje em dia abrigar os três gêneros modernos de Araucariaceae fez Kershaw e Wagstaff (2001) sugerirem o Gondwana Oriental como o centro de origem do grupo. Apesar do significado desta constatação, deve ser encarada com precauções. A localização do sul do Brasil, Índia e África do Sul em latitudes mais baixas na época e o caráter dominantemente subaéreo das exposições (camadas vermelhas) não favoreciam a preservação dos

palinomorfos nesses continentes. A Austrália, por outro lado, ocupava uma posição ortogonalmente oposta à atual, estando submetida a um clima temperado e úmido pela proximidade com o Paleo-Pacífico, favorecendo a preservação dos grãos (Holmes 1998). Dois tipos principais de palinofloras são reconhecidos para o Triássico Médio e Superior da Austrália (De Jersey e McKellar 1981): a “Microflora Onslow”, de caráter temperado quente e com elementos europeus das baixas latitudes (Tethys), e a “Microflora Ipswich”, de menor diversidade e dominada por tipos bissacados simples, monossulcados e esporos de pteridófitas exclusivamente gondwânicos, que informava sobre condições de maior frio e umidade. As duas assembléias eram limitadas pela paleolatitude de 45oS, o que levou Foster et al. (1994) a incluir as plantas produtoras destes palinomorfos em duas províncias paleoflorísticas. A partir disso, os locais onde foram identificados os restos de polens de Queensland contendo Araucariacites inseriam-se numa condição “Mista OnslowIpswich”. Correspondentemente, as áreas do Sul do Brasil situavam-se no âmbito dessa flora mista, enquanto as floras das bacias argentinas cresciam dentro da área da “Microflora ou Província Florística de Ipswich” (Zamuner et al. 2001). Finalmente, também na Antártica e em áreas próximas da Austrália, foram identificados lenhos triássicos. Originam-se de espessos arenitos com estratificação cruzada, sugestivos da presença de rios entrelaçados (braided), que foram incluídos no Membro MacKelvey (Grupo Amery) das montanhas Prince Charles. São o melhor documento para demonstrar a rápida diversificação das coníferas durante o Noriano (Meyer-Berthaud et al. 1993, McLoughlin et al. 1998). Restos de coristospermas, fetos, licófitas, esfenófitas e algas completam a assembléia. O levantamento visto para as ocorrências do Neotriássico corrobora a proposta de Anderson e Anderson (1998a) de que aí teria ocorrido o primeiro pulso de diversidade (heyday) das coníferas. Mostra que, nesse momento, o grupo seria composto por 25 ordens (contra as 6 atuais) e 34 famílias (14 modernas). Para os pesquisadores, em algum local entre as latitudes 30oS e 60oS do Gondwana, estaria a mais importante área de diversidade faunística e florística (hot spot) já registrada no globo. Os depósitos de carvão da época mostram que coincidem com o limite ou estão dentro da faixa de clima temperado quente e dos cinturões verdes que bordejavam as áreas mais secas do interior do Pangea (Figura 5). Jurássico As condições estacionais surgidas no final do Triássico serão mantidas por algum tempo. Ao longo do período, contudo, o calor irá aumentar e a umidade reduzir-se ainda mais, numa ampla faixa que se estende até os 50o sul e norte, produzindo uma homogeneização das floras (Meyen 1987). O nível dos mares acompanha esse processo, avançando gradativamente sobre os continentes e atingindo seu clímax até o final do período (Kershaw e Wagstaff 2001). Em parte, este último processo serviu para amenizar os efeitos da seca, pelo menos na borda dos continentes (Figura 6B). Restos com afinidades com as Araucariaceae irão se tornar cada vez mais abundantes nas assembléias palinológicas, atestando a expansão espacial do grupo, graças à presença das terras contínuas do Pangea. Rapidamente espalham-se por ambos os hemisférios, embora ainda dominem no sul. Escamas ovulíferas e lenhos, mais certamente associados à família, e especialmente ao gênero Araucaria (secção Bunya, mas também com Eutacta), tornam-se abundantes (Stockey 1982, Stewart 1987, Meyen 1987, Miller 1988, Hill e Brodribb 1999). A presença de um segundo gênero é sugerida por Hill (1994). Estudos da ultra-estrutura da exina dos polens no oeste da Europa (Kimmeridgiano-Volgiano basal) apóiam a associação de Araucariacites australis, Callialasporites dampieri, C. trilobatus e C. turbatus com as Araucariaceae (Batten e Dutta 1997). Em toda a extensão da América do Sul, chegando até a Península Antártica, o calor e o declínio das Dicroidium fizeram com que os ambientes fossem invadidos por elementos equatoriais, como Bennetitales e pteridófitas (Dutra e Jasper 1993, Morel et al. 1994). Na Bacia de Neuquén, na Argentina (paleolatitudes de 40oS), uma microflora do Jurássico Inferior (pré-Toarciano Superior) mostra o domínio de Classopollis, uma forma em geral associada aos climas aquecidos. É acompanhado por Araucariacites pergranulatus Volkheimer 1968 (inaperturado), inaperturados sacados (Podocarpites, Allisporites, Microcarchryidites, entre outros) e pteridófitas (esporos triletes e monoletes). O intervalo correspondente à Formação Pedra Pintada registra um contexto vulcânico, sujeito a períodos de evaporação em uma área costeira marinha (Arguijo et al. 1982). Nesta mesma unidade e em Alicurá, os restos de folha de Araucarites phillipsi constituem as formas mais comuns (Herbst 1966, Arrondo e Petriella 1980).

Nesta mesma bacia, em níveis do Jurássico Médio (Formação Lajas), expostos mais ao sul, a microflora será caracterizada por Araucariacites australis e Inaperturopollenites spp. Embora raros, estão presentes ao longo de toda a seqüência, representativa de um sistema transgressivo (com cefalópodos amonóides), ambientes de plataforma rasa e intervalos de mar alto, com lobos deltaicos. Cheirolepidiaceae e Podocarpaceae dominam a assembléia, seguidas de Pteridospermopsida e Cycadaceae. Incluídos na Zona Callialasporites dampieri, indicam condições mesotérmicas e grande umidade estacional (Martínez 2002). Permanecerão aí até o final do período, como é atestado pela presença de Brachyphyllum ramosum e Araucarites sp. em Mina de La Perla (Formação Lotena). Abaixo dos 45oS e ainda para a parte média do Jurássico, restos de lenho petrificado de grande porte (Araucarioxylon) e ramos com folhas (Araucarites santaecrucis Calder 1953) foram identificados na Formação La Matilde, Província de Santa Cruz (Frenguelli 1933, Leanza 1948). Na Patagônia argentina nessa época, foram preservados seus mais belos fósseis. Provenientes da Formação Cerro Quadrado, consistem de cones petrificados com sementes contendo embriões em vários estágios de desenvolvimento, inclusive com primórdios de raízes. A ocorrência conjunta de escamas ovulíferas (Araucarites) atesta o caráter autóctone da deposição. Foram associados a Araucaria mirabilis e, pela presença de dois cotilédones na semente, à secção Bunya (Stockey 1975, 1978, 1994, Stockey e Taylor 1978b). No lado chileno, os bosques eram compostos também por Araucariaceae, com ramos de Brachyphyllum e Araucaria, acompanhados de Cycadaceae e Podocarpaceae (Engelhardt 1891). Para Del Fueyo (1991), a variedade dos achados e o caráter autóctone indicam que essa porção austral da América deve ter sido um importante centro de diversificação para a família e para o gênero (Figura 6B). O registro se estende a Antártica (Araucarites), Nova Zelândia (Araucarites e Araucarioxylon), Austrália (formas relacionadas com Agathis, acompanhadas de Podocarpaceae, indicando maior umidade), Índia (Araucarites) e África (Araucarites africana), segundo White (1990) e Vakhrameev (1991). Esta última forma, contudo, proveniente da região de Mali (Krasilov 1978), é considerada de afinidades duvidosas pela ocorrência de papilas e células T, mais características de Cheirolepidiaceae (Stockey e Ko 1986). No Hemisfério Norte, os fósseis correspondem à parte média do Jurássico e provêm de Yorkshire, Inglaterra. Consistem de sementes, cones com polens e escamas ovulíferas (Araucarites phillipsi), associados a ramos de Brachyphyllum mamillare, relacionados à secção Eutacta (Kendall 1949, Harris 1979, Stockey 1980a, 1980b, 1982, Hill 1994). Sugerem um ambiente costeiro em região equatorial, sem formação de carvão, mas com uma rica flora (200 gêneros) dominada por Cheirolepidiaceae (Classopollis), Peltaspermales, coníferas Taxodiaceae e Podozamites. Nos Estados Unidos, restos de Araucariaceae aparecem em Potomac, associados a Cycas. Desse modo, o documentário confirma o gênero Araucaria e as secções Bunya e Eutacta como já bem estabelecidos no Jurássico. Para Stockey (1982), a secção Columbea teria se originado nesse momento, a partir de formas da secção Bunya. Esse registro traz a primeira das contradições às propostas filogenéticas disponíveis que, como vimos (Figura 2), sugerem Wollemia como um tipo primevo e uma separação inicial de Agathis e Araucaria. Embora, no momento, possa refletir apenas a necessidade de uma melhor revisão dos tipos fósseis, diante do achado ainda muito recente de formas vivas do primeiro gênero, permanece o fato de que os tipos polínicos mais antigos, com características de Wollemia e Agathis, só serão registrados no Cretáceo. Cretáceo A partir do final do Jurássico, as Araucariaceae irão manter as áreas conquistadas e a ligação com os cinturões de clima temperado quente. Ao mesmo tempo ampliam sua distribuição para sul e norte, chegando até as latitudes altas do sul (60oS) e aos locais submetidos ao calor e à aridez dos trópicos (Figura 6C). Aí deviam habitar as áreas mais elevadas próximas às bacias, como uma resposta à chegada das angiospermas, como vegetação ripária, às áreas costeiras e mais baixas (Crane e Lidgard 1989, Taylor e Taylor 1993, Hill 2000, Dutra e Stranz 2002). Essa adaptação, que de certo modo é mantida pela maior parte do grupo até os dias de hoje, é inferida por sua presença pouco expressiva nas assembléias polínicas, o que sugere um crescimento um pouco afastado dos ambientes de deposição (Ruiz e Quattrochio 1993). Com efeito, a análise das litologias associadas comprova uma ligação preferencial das coníferas para esse momento com áreas submetidas a vulcanismo e tectonismo ativo e a proximidade com os mares e

A

B

Figura 6 – Paleogeografia e o registro de coníferas relacionadas com Araucariaceae durante o Mesozóico. As formas com ramos distribuídos desde a base representam tipos primitivos da família, cujas afinidades com as formas modernas não puderam até o momento ser completamente estabelecidas. As linhas tracejadas correspondem aos limites da faixa de aridez. A –Triássico Superior; B – Jurássico Inferior e Médio; C – Cretáceo Inferior e Médio. Fonte bibliográfica dos dados no texto.

C

oceanos recém-surgidos pela separação dos continentes, capazes de amenizar a seca. Embora afetadas numericamente não reduziram sua diversidade, o que confirma o sucesso destas novas adaptações (Regal 1977). Outros grupos (Cycadales, Bennetitalles, Gynkgoales e Ephedrales), mais especializadas para a vida nas áreas baixas das latitudes tropicais, sentiram profundamente os efeitos destas mudanças e muitas irão extinguir até o final do Cretáceo. Nas latitudes altas, onde as plantas com flores só chegariam um pouco mais tarde (Drinnan e Crane 1990), puderam manter por mais tempo sua abundância. Macrofósseis do Cretáceo Inferior (Albiano e Aptiano) aparecem em depósitos da Austrália e do Brasil (Formação Santana, Bacia do Araripe, Ceará), com restos de folhas com características da secção Columbea (Hill e Brodribb 1999, Dutra e Stranz 2000). A riquíssima assembléia de plantas do Nordeste brasileiro, além das Gnetaceae e Ephedraceae (e prováveis angiospermas primitivas), reúne folhas de Araucaria cartellei Duarte 1993, ramos do tipo Brachyphyllum, escamas ovulíferas isoladas e cones (Duarte 1993, Dutra et al. 2002a). Na Europa ocidental e meridional, a situação é similar. A primeira concentra polens de Araucariacites e Callialasporites, acompanhados de formas relacionadas com Gnetales e Cycadales. No sul, associam-se a Classopollis (Cheirolepidiaceae) e Dicheiropollis (forma tropical característica da província WASA). A partir do Barremiano, Araucariacites chega ao norte da Europa, acompanhado de Cycadaceae e Ephedrites/Gnetaceopollenites, indicativos de clima árido (Batten 1984). Estruturas reprodutivas identificadas na Europa (Araucarites toucasi Saporta 1879), Ásia Oriental (Rússia Oriental, Mongólia, Japão), Canadá e Estados Unidos (A. obtusifolia Font, A. podocarpoides Font. e A. zamioides Font.) indicam que Araucaria, sect. Bunya e Eutacta (Batten 1984, Stewart 1987, Stockey et al. 1990, Vakhrameev 1991, Duarte 1993, Spicer et al. 2002), associada a formas duvidosas de Agathis (Hill e Brodribb 1999), também conquistaram as áreas setentrionais. Estes achados apóiam a existência, para o Neocomiano do Hemisfério Norte, dos dois reinos florísticos propostos por Vakhrameev (1991): o Sibério–Canadiano de climas temperados e o Indo-Europeu de características tropicais e subtropicais. Confirmam, além disso, a presença de uma faixa de aridez que se estendia por todo o norte do Gondwana. No norte da África, onde foram registrados Araucariacites australis e A. balinkaensis (Kedves 1994), e na Índia, onde se associam a Nipania, uma Pentoxylalles, apesar do gradativo isolamento desses continentes, as Araucariaceae permanecerão até o Maastrichtiano (White 1990). No sul da África, ramos com estruturas reprodutivas e lenhos foram registrados para o Berriasiano (White 1990, Vakhrameev 1991). Estes dados demonstram a presença da família nesses dois continentes do sul, onde hoje não são mais registradas e o papel exercido pela Antártica na manutenção de rotas de passagem entre a América do Sul e a Australásia. Na América do Sul, uma assembléia registrada em latitudes de cerca de 35oS atesta até onde se estendiam as condições de seca e a faixa de climas tropicais no período. No Uruguai, as formações Migues e Castellanos (Aptiano-Albiano) contêm Araucariacites e Classopollis, acompanhados de Gnetaceae, Cycadaceae e angiospermas primitivas, preservadas em ambientes lacustres e de canais fluviais (Campos 1998). A composição da palinoflora sugere um clima quente e seco e uma paisagem similar àquela proposta para a Bacia do Araripe no nordeste do Brasil. Além de testemunhar a uniformidade climática que marcava a parte setentrional dessa massa de terra, sugere que logo abaixo disso devia estar o limite entre as zonas áridas e úmidas (Figura 5). Nas bacias argentinas de Neuquén e Santa Cruz, durante o Barremiano (Formação La Amarga), Barremiano-Aptiano (Formação Rincón) e Berriasiano (Formação Vaca Muerta, em Mallin Quemado), as Cheirolepidiaceae (Classopollis) e Gnetaceae (Equisetosporites), indicativas de calor, ainda aparecem, mas em menores proporções. Araucariacites australis, Balmeiopsis limbatus e Callialasporites e Cyclusphaera psalilata, todas formas de pólen associadas com Araucariaceae, unem-se a Alisporites e Cycadopites spp. (Cycadaceae), Podocarpites spp. (Podocarpaceae), pteridófitas e algas (Quatrocchio e Volkheimer 1985, Prámparo e Volkheimer 2002), indicando condições mais úmidas (Ruiz e Quattrochio 1994). Na Formação Baqueró (Aptiano?), Província de Santa Cruz, estão as melhores assembléias e preservações, com restos de Araucariaceae sendo registrados nos micro e macrofósseis e, nestes, com as conexões orgânicas originais. Del Fueyo (1991) descreveu o gênero Nothopehuen brevis, com cones, troncos e folhas do tipo Brachyphyllum, acompanhados de escamas ovulíferas (Araucarites baqueroensis e Araucarites minimus) e polens isolados (Callialasporites) ou ainda incluídos nos estróbilos (Araucariacites). As formas de Araucariacites, descritas por Archangelsky (1994), permitiram o exame ultramicroscópico e mostram o caráter granular da sexina, a presença de pilares de esporopolenina e nexina lamelar. O estudo da anatomia da epiderme permitiu associar esses fósseis à secção Eutacta de Araucaria (Del Fueyo 1991,

Archangelsky et al. 1995). Mostram, contudo, papilas, um caráter mais típico das Cycadaceae do que de Araucaria moderna, segundo Stockey e Ko (1986). Níveis contemporâneos na área de Bajo Grande contêm numerosas escamas ovulíferas, atribuídas a Araucarites baqueroense (Archangelsky 1966), folhas de Brachyphyllum baqueroense e cutículas de cicadáceas (Pseudoctenis ornata). Estão incluídos nas fácies de planícies de inundação de um sistema de rios braided, submetido a ocasionais quedas de cinzas (Archangelsky et al. 1995). Outros restos da mesma idade em Ticó forneceram quatro formas de folhas de Brachyphyllum (B. bretti, B. mucronatum, B. mirandai e B. irregulare), mas com dimensões e disposição dos estômatos distintas dos primeiros. As impressões de folhas atribuídas a Araucaria grandifolia por Feruglio (1951) provêm dessa mesma bacia (Archangelsky 1966, Baldoni e Archangelsky 1983). No lado oposto do Gondwana, as formas de Eutacta chegam a Nova Zelândia (Stockey 1982, Hill 1994) e, entre os macrofósseis, pela primeira vez existem registros seguros da presença da secção Intermedia pelas características epidérmicas de Araucarites haastii (White 1994, Hill 1994). Pole (1995) também cita a presença de folhas de Araucaria para o Neocretáceo de Otago. Na Austrália, o registro de idade Albiano e em áreas do sudeste (Bacias Laura, Otway e Eromanga) mostra a presença de ramos de Brachyphyllum (White 1990) e maior afinidade com Eutacta (Drinnan e Chambers 1986, Florin 1963, Stockey 1982, Hill 1995). Para Hill (1994), o gênero forma Podozomites, bastante freqüente nesse continente, poderia estar relacionado com Agathis. Na Bacia Gippsland, formada durante a separação Austrália-Antártica no início do Cretáceo, as macrofitocenoses mostram o domínio das coníferas (Flora Pagiophyllum-Reinitsia), com abundantes ramos e folhas de Pagiophyllum, Elatocladus, Brachyphyllum e pteridospermas (Tosolini et al. 1998). Os sedimentitos de idade Barremiano-Aptiano sugerem ambientes fluviais de grande energia, que, gradativamente, dão lugar à fácies de canais, com rompimento dos levees e planícies de inundação. O tamanho pequeno das folhas, quando comparadas às de outras assembléias da mesma época, indica que as temperaturas eram menores nesse setor do Gondwana, situado, provavelmente, a mais de 70oS. Ao longo do Cretáceo, pelo sul da Austrália (Dettmann 1994, Vakhrameev 1991) e, como vimos, provavelmente também através da América do Sul, chegam até a Península Antártica (Figura 8A). A microflora desse último continente mostra a presença de Araucaricites australis Cookson 1947, associado em alguns locais a folhas de Brachyphyllum irregulare Archangelsky 1966, a mesma forma identificada no início do Cretáceo na Bacia de Santa Cruz. Podozamites, Podocarpaceae, angiospermas primitivas e Nothofagus também estão presentes (White 1994, Dutra 1997). A presença conjunta de Balmeiopsis limbata (Balme) Archangelsky, 1979 permite precisar a idade, já que é fóssil-índice do Neobarremiano–Conaciano para todo o Gondwana (Dettmann 1989), tendo sido identificado igualmente em furos de sondagem (Furo 361 do Deep Sea Drilling Project) na costa sudoeste da África (Zavada 1992). Embora associado a Podocarpaceae por Archangelsky (1966), alguns autores defendem sua associação com as Araucariaceae, como, por exemplo, Batten e Dutta (1997). As angiospermas irão chegar na península um pouco depois, no Albiano Superior (Cantrill e Nichols 1996). Para Dettmann (1989), as formas modernas de araucária e podocarpáceas, que hoje vivem em condições temperadas quentes, junto com angiospermas, tais como Proteaceae, Winteraceae, Ilex, Gunnera, Myrtaceae e algumas criptógamas, teriam tido sua origem na Antártica no final do Cretáceo. A composição das paleofloras do norte da Península Antártica para o final do Cretáceo, especialmente para o Terciário basal (Dutra 1997, Dutra 2001), atesta positivamente essa proposição ou pelo menos indica que utilizaram essas terras austrais como rotas de dispersão através das áreas emersas da Província Weddellinana (Figura 7). A chegada ao Ártico (72oN de latitude) no Cretáceo médio pode ter ocorrido através da Índia e/ou Ásia Oriental, onde já existiam desde o final do Jurássico, e está registrada no nordeste da Rússia (Spicer et al. 2002). A paleoflora já mostra um domínio de angiospermas e sugere um crescimento sob temperaturas médias anuais de cerca de 13oC (5oC nos meses mais frios). As litologias demonstram a presença de vulcões próximos e um contexto fluvial, com os rios sujeitos a extravasamento periódico. As araucárias caracterizam as fácies de canal e de planícies de inundações e estão representadas por cones femininos e masculinos (Araucarites), conectados a ramos não-espiralados, distintos das formas modernas. Atribuídos a Araucarites anadyrensis Krysht, provêm dos níveis finais da sucessão, onde surgem evidências de ressecamento. Para o Cretáceo Superior, a grande novidade evolutiva é o aparecimento de Wollemia. O gênero é registrado no Turoniano do sudeste da Austrália, numa área que coincide com a de seu crescimento moderno (Macphail et al. 1991). Logo depois surge também na Antártica e Nova Zelândia (Kershaw e Wagstaff 2001).

No continente australiano, Araucaria e as Podocarpaceae primitivas irão declinar na parte final do Cretáceo, aparentemente pela chegada das angiospermas, especialmente de Nothofagus (Dettmann 1989). No Japão, o achado de folhas e órgãos reprodutivos levou Oshawa et al. (1995) a propor uma nova secção, Yezonia, para o gênero Araucaria, englobando apenas formas fósseis, cujas características se aproximam de A. vulgaris moderna. Esta secção não tem sido considerada em trabalhos mais recentes. O limite Cretáceo-Terciário e seus eventos de extinção estão bem documentados nas bacias argentinas e permitem acompanhar o comportamento das floras, em especial das plantas com flores. A presente revisão apóia a proposta de Meyen (1987) de que as plantas ultrapassaram esse momento sem sofrer grandes perdas ou alterar sua composição. Abaixo das paleolatitudes de 41oS e abrangendo a América do Sul meridional e a Península Antártica, as Araucariaceae comporão assembléias muito similares. Exibem, no entanto, o diacronismo de ocorrência, que foi sugerido por Askin (1989). Enquanto grupos de angiospermas mais adaptadas ao frio, especialmente Nothofagus, são precocemente registrados na Península, em relação à América, as araucárias têm um comportamento inverso, chegando às altas latitudes e aparecendo na macroflora após o final do Mesozóico, quando se encerra o pequeno intervalo de frio que caracterizou o final do Cretáceo Superior nessas latitudes (Dutra 1997 e 2000a, Dutra e Stranz 1999, Dutra e Batten 2000). Um pouco antes (Maastrichtiano), o globo passava por um período de nível de mar alto e, em Mendoza (36oS), uma microflora indicativa da proximidade de corpos de água é registrada. Proveniente da Formação Loncoche, denuncia a presença de abundantes briófitas e pteridófitas (Dicksoniaceae e Cyatheaceae), associadas a raras Ephedraceae, Podocarpaceae, Araucariaceae (Araucariacites australis, Callialasporites trilobatus) e Cheirolepidiaceae (Classopollis) e às angiospermas Nothofagaceae (Nothofagidites rocaensis), Proteaceae, Gunneraceae, Proteaceae, Olacaceae e Liliaceae/Iridaceae. Para Papú (2000), viviam sob clima subtropical a temperado úmido, com uma estação seca, e as coníferas deviam estar associadas às áreas altas. Ambientes lacustres e rios meandrantes dariam lugar lateralmente a pântanos costeiros e planícies de inundação. A. australis é igualmente registrado a oeste de Chubut (Paso del Sapo), segundo Baldoni e Askin (1993). O final do Cretáceo será caracterizado pelo provincianismo das floras e por uma acentuada diversificação das coníferas no Hemisfério Sul (Meyen 1987, Upchurch 1989). Nas latitudes acima de 40oS, contudo, o episódio de frio já comentado provocou uma momentânea redução de Araucariaceae, apoiando seu caráter mais termofílico. Terciário Em vários setores do Gondwana, o início do Terciário será marcado por um novo incremento no registro tanto entre os polens, como nos macrofósseis. Os três gêneros modernos da família já estão estabelecidos nesse momento. Wollemia e Agathis irão manter-se como formas exclusivas para o Gondwana oriental.

Figura 7 - Província Weddeliana de Case (1998)

Paleoceno A abertura do Atlântico irá individualizar no Gondwana um setor oriental e um ocidental, mantidos ligados, contudo, através da costa da Antártica, o que garantia as rotas de passagem entre a Australásia e a América do Sul. Araucaria sect. Columbea mostrará a distribuição mais ampla, sendo encontrada desde a Austrália (A. balcombensis de Hill 1994), passando pela Antártica (A. imponens Dusén 1908 e escamas ovulíferas na Península, registradas por Dutra 1997) e chegando à América do Sul, onde Araucaria nathorstii Dusén (Menendez e Caccavari 1966) foi considerada por Stockey e Ko (1986) como indubitavelmente ligada à espécie A. araucana. É registrada ainda nas ilhas Kerguelen em uma época não bem determinada do Terciário, demostrando a ligação pretérita desse arquipélago com a periferia da Antártica (Cookson 1947).

Também Eutacta, hoje restrita ao setor oriental, é encontrada em todo o território austral-antártico durante o Terciário (Florin 1940, Hill 1994). A morfologia da epiderme de Araucaria lignitici (Cookson e Duigan 1951) do sudeste da Austrália confirma sua afinidade com essa secção (Stockey e Ko 1986). A presença na Antártica sugere fortemente a participação das áreas periféricas deste continente na dispersão desses elementos (Hill 1994). O gênero Agathis é registrado no sul da Austrália por Macphail et al. (1991) e White (1994), acompanhado de Araucaria e de Podocarpaceae. No limite com o Eoceno, o aumento global das temperaturas promove uma nova migração das coníferas para o sul (Meyen 1987), testemunhado pela ausência das Araucariaceae em depósitos situados acima de 30oS na América do Sul e seu incremento no registro das bacias de Neuquén, Patagônia e Península Antártica. Na Patagônia, Araucaria araucoensis Engelhardt associa-se a Nothofagus, Podocarpáceas, Cycadaceae e angiospermas subtropicais, tais como Casuarina, Cupania, Beauprea, Myrtaceae, Santalum, Nypa e Banksia (Berry 1924). Na Península Antártica, os palinomorfos Araucariacites, Podocarpites e Phyllocladidites ocorrem em níveis correlacionáveis aos portadores de uma macroflora composta por elementos com folhas grandes (Nothofagus com folhas de até 12 cm de comprimento), lauráceas (Nectandra spp.), Elaeocarpaceae, Sapindaceae, tipos similares às modernas Monimiaceae e Rhamnaceae e Myrtaceae de ambas as secções modernas (Dutra 1997, 2000b, 2001). Podocarpaceae e Cupressaceae são as coníferas dominantes, e as Araucariaceae aparecem pela primeira vez na macroflora (Dutra 1997, Boardman 2003). Para Meyen (1987) essas assembléias sugerem florestas úmidas, que viviam sob um clima uniforme, quente e úmido do tipo subtropical a temperado quente e que se estenderão por grande parte do Eoceno. Eoceno A ligação por terra entre as duas Américas e a presença de extensas áreas planas fará com que elementos austrais invadam o sul dos Estados Unidos e permaneçam aí até o Mioceno, quando as rotas se invertem e elementos setentrionais migram para o sul (Meyen 1987). Áreas elevadas criadas pela Orogenia Laramiana e o início do soerguimento dos Andes propiciam a formação de zonas de sombra de chuva (rain shadow) e o aparecimento das primeiras paisagens de savana no flanco oriental do continente americano. Em ambos os lados da Península Antártica, as coníferas irão se tornar ainda mais abundantes com muitos e variados tipos de Podocarpaceae (Podocarpus, Phyllocladus, Dacrydium, Microcachrys), Cupressaceae e Araucaria sect. Columbea e Eutacta (Vakhrameev 1991, Dutra 1997, Boardman 2003), associadas a Nothofagus de folhas grandes e afinidades termofílicas, Winteraceae, Proteaceae (Grevillea, Banksia e Beauprea) e pteridófitas arborescentes do grupo das Cyatheaceae e Lophosoriaceae (Meyen 1987, Case 1988, Dutra 1997 e 2000b). Para o continente, Pole et al., (2000) descrevem os restos mais austrais de folhas de Araucaria (e os mais antigos na área) em blocos “ex situ” coletados a 78oS de latitude, acompanhados de folhas e sementes de Nothofagus. Nas latitudes médias, as Araucariaceae são as coníferas dominantes nas bacias argentinas, acompanhadas de Podocarpaceae e angiospermas. A Flora do Rio Pichileufú, na Província de Rio Negro (Berry 1938, Romero e Arguijo 1981), evidencia, além disso, muitas pteridófitas, Cycadaceae, Ginkgo, Cupressaceae, Podocarpus e angiospermas de famílias similares às que hoje acompanham Araucaria nas floras do sul do Brasil (Anacardiaceae, Bignoniaceae, Flacourtiaceae, Euphorbiaceae, Lauraceae, Myrtaceae, Sapindaceae, Winteraceae, etc.), sugerindo um clima subtropical. As Araucariaceae (Araucariacites australis), Cupressaceae e Podocarpaceae compõem também parte da variada microflora da Formação Rio Turbio, em Santa Cruz, um pouco mais ao sul (Romero 1977, Barreda 1997). Mesclam-se a formas setentrionais (tropicais e neotropicais) sugestivas de climas quentes e úmidos e ambientes costeiros, tais como palmeiras, Myrtaceae, Anacardiaceae, Symplocaceae, gramíneas, Chenopidiaceae, lianas, trepadeiras e pteridófitas epifíticas, e a grupos austral-antárticos, como Nothofagus, Saxegothopsis, Embotriophyllum e Rhoophyllum, originando floras “mistas” muito diversificadas.

A

B

C

Figura 8 - Distribuição paleogeográfica das Araucariaceae. A - Cretáceo-Terciário; B - Eoceno; C - Oligoceno-Mioceno quando a Antártica é coberta pelo gelo. As linhas tracejadas representam o limite das faixas de aridez (Fonte dos dados do registro no texto).

Na Austrália, a base do Eoceno é igualmente marcada por um grande influxo de Araucariaceae nas assembléias polínicas, graças principalmente à presença de Wollemia e Agathis (Meyen 1987, Macphail et al. 1991). Associam-se a uma igual diversidade de tipos angiospérmicos, indicativos de florestas úmidas. Araucaria sect. Eutacta (3 spp.) foi identificada também no Eoceno Inferior da Tasmânia (Carpenter 1991), com Cupressaceae e Podocarpaceae. As floras “mistas” ou “de mescla” de Romero (1978) ou as Mixed Flora dos australianos (Schmithüssen 1966) irão caracterizar, portanto, o Eoceno nas latitudes abaixo dos 40oS e em ambos os lados do Gondwana, estendendo-se até a Nova Guiné e Nova Zelândia (Pole 1994a e 1994b). Seu caráter misto vem da reunião de taxa de diferentes origens e condicionamento climático, com Cochlospermum e Zamia (subtropicais) e Drimys, Podocarpaceae, Cupressaceae, Laurelia, Myrcia e Lomatia (subantárticos). Sua semelhança com as florestas mistas de pinheiros no sul do Brasil (Rambo 1951) e o caráter relictual desse bioma e das floras neozelandesas e de Valdívia no Chile não parece ser, portanto, uma simples coincidência, mas sugere uma origem comum para muitos de seus elementos. No Hemisfério Norte, uma última assembléia, identificada no Eoceno Superior da Alemanha (Figura 8B), mostra Araucariaceae associadas com briófitas, pteridófitas, Pinaceae e angiospermas de folhas grandes, coriáceas e margens inteiras (Myrtaceae, Juglundaceae, Ericaceae, Euphorbiaceae, Betulaceae, Ulmaceae e palmeiras), indicando igualmente um clima quente e úmido, subtropical (Knobloch e Konzaliová 1998). No sul, a tafoflora do Rio de Las Minas, na Terra do Fogo (abaixo dos 50oS), com idade no limite Eoceno–Oligoceno, ainda contém algumas araucárias entre os macrofósseis (A. nathorsti, com ligações com A. araucana). Mas as raras Podocarpaceae, Nothofagus e Proteaceae já sugerem os climas temperados frios, que daí em diante se instalariam (Dusén 1908, Meyen 1987). Oligoceno É o momento da separação definitiva entre Antártica e Austrália, o que irá modificar a circulação oceânica no sul, resfriar as águas e prenunciar a Corrente Circum-Antártica (Figura 8B). No extremo sul das Américas, as última massas de terra que ainda mantém as antigas ligações gondwânicas, também iniciam os esforços que irão promover seu desligamento da Península Antártica (Lawer et al. 1985, Cunhingham et al. 1995). A gradativa interrupção das rotas de passagem faz com que as floras da península tornem-se empobrecidas, com poucos elementos de folhas micrófilas e de margens denteadas e que, até o final do Oligoceno, irão desaparecer. As coníferas estarão ausentes entre os macrofósseis, mas permanecem no registro polínico (Dutra 1997 e 2001). Nas médias latitudes, as condições climáticas tornam-se instáveis e marcadas por seca estacional, reduzindo igualmente a diversidade das Araucariaceae (Figura 8C). Nos trópicos, as florestas serão substituídas pelas áreas de savana e, mais tarde, darão lugar a formações xeromórficas, com Ephedraceae, Artemisia, Chenopodiaceae e Tamaricaceae (Meyen 1987). O soerguimento dos Andes aumentará ainda mais a aridez. Embora as condições melhorem ao longo do período, um novo intervalo de frio, no limite com o Mioceno magnificará as mudanças paleoflorísticas e das faunas. Em Santa Cruz e Chubut, na Argentina, a palinoflora mostra a composição das matas. Araucaria associa-se a Podocarpaceae, Myrtaceae, Proteaceae, Winteraceae, Nothofagaceae e fetos arborescentes (Cyatheaceae e Lophosoria quadripinata), sugerindo bosques úmidos. A presença associada de Nyssaceae e Sapindaceae apóia condições temperadas quentes. Segundo Barreda (1997), essa mistura de formas indicativas de frio e calor indicaria a presença de áreas altas a oeste e múltiplos ambientes, em muito semelhantes aos que já vinham caracterizando previamente as áreas da Península Antártica, submetidas precocemente ao tectonismo. As floras da América austral se parecem neste momento com as que existiam no Paleoceno e Eoceno da Antártica (Dutra 2001). O registro atesta que as Palmaceae, Onagraceae, Halogariaceae, Gunneraceae, Salicaceae e Escallonia cresciam em torno dos corpos lacustres, Malvaceae nos marismas e Chenopodiaceae, Ephedra, Restionaceae e Sparganiaceae junto aos pântanos. As áreas elevadas mais distantes seriam cobertas por matas de Araucária e outras coníferas. Estes dados discordam do proposto por Troncoso e Romero (1998), que sugerem a adaptação das araucárias às áreas altas, como tendo ocorrido somente no Quaternário. Na Austrália, o deslocamento do continente para latitudes mais baixas irá magnificar os efeitos da seca. Agathis irá sentir profundamente essas mudanças, diminuindo sua representação na microflora até desaparecer no sul (Hill e Brodribb 1999). Já Araucaria tem um incremento e coincide com áreas instáveis

(Hill 1990). Formas de Columbea (A. hastiensis) ainda ocorrem na Tasmânia, e Eutacta mostra uma variação e quantidade comparável a que hoje possui na Nova Caledônia, indicando climas semelhantes para a época (Carpenter et al. 1994). Na Nova Zelândia, associam-se a Nothofagus (White 1994). Mioceno A colisão da Índia com o sul da Eurásia, no início do período, provoca o fechamento do Mar de Tethys, o isolamento definitivo entre o Pacífico e o Atlântico e o soerguimento dos Alpes Europeus e da Cordilheira do Himalaia. Um cinturão de aridez, como conseqüência, irá marcar os ambientes no interior da Ásia. Na parte média do período, o globo será marcado por climas mais amenos. Um novo intervalo de frio intenso, o mais drástico em todo o Terciário, marcará o final do período, originando grandes extensões de terras geladas no Hemisfério Norte (Scotese 2000). Provocará um pronunciado rebaixamento do nível dos mares, que, ao mesmo tempo que isola o Mediterrâneo e o Atlântico, unirá muitas massas de terra que ficam emersas (Ásia Oriental, América do Norte e do Sul), criando inúmeras rotas de passagem, aproveitadas, inclusive, pelas formas humanas primitivas. A ligação pela América Central, interrompida desde a parte média do Mesozóico, será refeita e permitirá movimentos migratórios e de dispersão de grande efeito sobre a vida (Meyen 1987). As Matas com Araucária sentirão os efeitos da seca e reduzem-se ou ficam confinadas às latitudes austrais. Em muitas partes do mundo, as florestas úmidas serão substituídas pelas paisagens abertas (savanas, pradarias e estepes), causando extinção ou mudança em muitos grupos de mamíferos. Na Austrália, com grande parte de seu território já contido em latitudes tropicais pelo gradativo afastamento da Antártica, os grupos de coníferas que sobreviveram migram do sul para o norte (Bowler 1982, White 1990 e 1994, Kersahw et al. 1991). Surgem as primeiras evidências da presença de fogo. Agathis aparece no sudeste (Latrobe Valley), na parte basal do período (Carpenter e Pole 1995), e em depósitos de carvão do sul, junto com Dacrycarpus, Lauraceae, Myrtaceae, Cunoniaceae e Proteaceae (Hill 1994). Gradativamente será substituída por Araucaria sect. Eutacta (Kersahw e Wagstaff 2001), uma forma abundante tanto nos macro como nos microfósseis do sul da Austrália e Tasmânia, acompanhada de Cupressaceae, Podocarpaceae e angiospermas de folhas pequenas. Nothofagus de folhas micrófilas e com margens inteiras, já muito semelhantes às dos modernos representantes, domina as assembléias. O conjunto indica umidade e frio (White 1994, Macphail et al. 1994, Hill 1994). Na América do Sul, o registro de Araucaria só é conhecido para as bacias da Argentina, desde Mendoza (32oS) até Santa Fé, mais ao norte (Anzótegui e Garrala 1986). As paleoassembléias sugerem a presença de florestas compostas por muitas coníferas, acompanhadas de pteridófitas (Dicksonia), Ilex, Lithrea brasilensis (Anacardiaceae), Ericaceae e gramíneas, que cresciam entre as elevações iniciais que originaram os Andes e os numerosos ambientes costeiros criados pelo nível de mar alto, que caracterizou o Mioceno médio. Essas formações florestais devem ter tido um importante papel na moderna distribuição de Araucariaceae na América do Sul. Podem estar aí os elementos que permitiram ao gênero sobreviver aos episódios de frio e originar as populações disjuntas de A. araucana e A. angustifolia. As Sierras de Córdoba dividem ainda hoje as áreas do oeste argentino e Chile Central e o sul do Brasil e podem ter sido um dos refúgios utilizados durante as fases de menor umidade e frio que se seguiriam até o final do período. A reconquista dos ambientes pode ter ocorrido através das paisagens de campo recém-formadas e dos grandes sistemas fluviais, quando do retorno das chuvas e do calor no início do Plioceno. A avaliação desse processo é dificultada, no entanto, pela escassa presença de níveis com fósseis em território brasileiro. Plioceno O início do período é caracterizado por climas favoráveis e umidade e, nas Américas, pela migração de taxas setentrionais para o sul, originando o Reino Neotropical. Juglans, Alnus, Quercus, Berberidaceae, Caprifoliaceae, Myricaceae e Rosaceae aparecem na Venezuela e Colômbia (Meyen 1987). O calor irá provocar uma nova elevação do nível dos mares. Na Argentina, assembléias polínicas em Bahia Blanca, no litoral, atestam a presença de 22 espécies de fungos, acritarcas e dinoflagelados, Nothofagus tipo dombeyi, gramíneas e compostas. A única gimnosperma é Ephedra. No espectro de distribuição temporal, o declínio das florestas para o topo coincide com o aumento das gramíneas (Guerstein e Quattrocchio 1984). Condições semelhantes são sugeridas para a

Província de Buenos Aires, onde, no final do Terciário, os estratos arbóreos eram compostos apenas por Myrtaceae, Dacrydium e Podocarpus (Fm. Chasicó). Definitivamente isolada e coberta pelo gelo, a Antártica mantém, no entanto, algumas florestas empobrecidas de Nothofagus e Podocarpaceae em vales protegidos nas montanhas Transantárticas (Askin e Markgraf 1986, Calrquist 1987). Na Austrália, as coníferas se mantêm entre os polens, especialmente nos depósitos de zonas costeiras ou subcosteiras da parte oriental, atingindo sua maior expressão conhecida para o Cenozóico (Kersahw e Wagstaff 2001). Quaternário As oscilações climáticas que marcaram o final do Terciário irão se manter no Quaternário, embora com intervalos de frio menos duradouros e pronunciados. Para seu acompanhamento, as Araucariaceae serão extremamente úteis, graças à já vista sensibilidade e resistência à instabilidade. É nesse momento que se estabelece a maior afinidade dessas coníferas, com as áreas do Gondwana Oriental (Australásia) e sua gradativa redução na América. Na Austrália, mantém taxas baixas, mas constantes, de presença entre os polens das áreas do sudeste durante todo o Pleistoceno (Kersahw e Wagstaff 2001). No norte, aparece entre os elementos das florestas úmidas, dominadas por angiospermas dos interglaciais chuvosos, mas se mantém quando o frio e a seca criam as paisagens mais abertas (White 1994, Hope e Pask 1998), só declinando no sul no início do Holoceno. O decréscimo dos ambientes florestados foi inicialmente atribuído à presença do homem, que teria chegado a Austrália e Nova Zelândia há cerca de 1.000 anos. Dados de furos de sondagem na margem oceânica (ODP 820), no entanto, apontam uma eliminação gradativa, iniciada muito antes, em 250.000 AP, quando são registrados os primeiros sinais de fogo. Para as Araucariaceae, o primeiro sinal de declínio na diversidade teria ocorrido em 130.000 AP e posteriormente em 35.000, coincidente com a glaciação. A seca nesses intervalos teria incentivado o fogo e o avanço das matas de Eucalyptus. Para Kershaw e Wagstaff (2001), as oscilações do El Niño (ENSO), expresso como fases de seca na Australásia, podem estar envolvidas. Clement et al. (1999) afirmam que, embora observáveis em períodos de poucos anos, essas oscilações possuem também um efeito amplo em escalas de milhares de anos. Este panorama desfavorável pode ter sido a causa do desaparecimento de Araucaria nas latitudes mais altas da Austrrália e na Nova Zelândia (Kersahw e McGlone 1995). Na América do Sul, os bons índices de umidade na costa do Atlântico resultam da soma de uma série de fatores. A maior influência é dos ventos quentes e úmidos que sopram de noroeste (Zona de Convergência do Atlântico Sul - ZCAS ou Zona de Convergência Intertropical - ICZ) e seu choque com as frentes frias da Antártica (Behling et al. 2000), mas também atuam aí a umidade trazida pelo sistema de ventos alíseos (Easterlies) e, mais localmente, a produzida pelas brisas oceânicas. As áreas de seca do interior do continente seriam, por seu turno, resultantes do papel exercido pela Cordilheira dos Andes, como barreira para os ventos do oeste, formando um X de aridez que começa na Patagônia, a leste, e estende-se pelo Brasil, a oeste (Villagrán 1983). Esse conjunto de fatores ainda não é bem compreendido quanto a seu papel individual. Acima dos 30oS influencia a presença da Floresta Ombrófila Mista com A. angustifolia (e da Mata Atlântica) na costa leste, produzindo ambientes caracterizados por umidade uniforme ao longo do ano e temperaturas que raramente caem abaixo de 0oC. Abaixo dos 30oS e a oeste, deve ser a causa do desenvolvimento das florestas Valdivianas e as com A. araucana, pela umidade trazida pelos contra-alíseos (Westerlies). Parte da distribuição desta última, contudo, se estende até a face oriental da Cordilheira dos Andes, em zona de sombra de chuva e, portanto, mais seca e fria (Figura 4), tornando-a o único representante moderno do gênero a crescer em regiões similares às que existiam ao longo do Mesozóico e no final do Terciário. É exclusiva também na capacidade de suportar solos congelados, sugerindo que adaptações prévias à seca podem estar sendo utilizadas hoje para enfrentar o rigor invernal. O registro do Quaternário brasileiro, apesar de proveniente de localidades esparsas, permite acompanhar a resposta das Araucárias às modificações do clima durante os últimos 50.000 anos. O registro na Amazônia inicia há cerca de 40.000 anos e as amostras (Lagoa das Patas, Lagoa da Curuça, Lago Crispim, Bragança Peninsula, Rio Curuá e Lago Calado) demonstram que Araucaria está ausente, mas que formas de Podocarpus viveram aí até 6.000 AP (uma espécie ainda vive nas montanhas de Roraima). O avanço das florestas de angiospermas nas áreas baixas ocorre durante os intervalos de frio (Colinvaux et al. 1996a, Behling 2002a e 2002b). Em Tocantins (Lagoa da Confusão), onde hoje está o limite entre a Floresta Amazônica e o Cerrado, o registro recua até 30.000 AP e, para esse momento, uma vegetação aberta indicativa de clima seco.

Gradativamente dá lugar a matas galeria e campos sujos (entre 27 e 14.000 AP). A melhora dos teores de umidade inicia há 5.500 anos e faz retornar a cobertura florestal (Behling 2002b). Testemunhos no Maranhão (Lagoa do Aquiri) mostram que a vegetação está presente no intervalo amostrado (entre 30.000 e 7.450 AP) e que foi capaz de acompanhar as variações do nível do mar e do clima. Nos períodos favoráveis, compunha uma savana pantanosa com Ilex, Mauritia, Luehea, Araliaceae, Sapindaceae, Sterculiaceae, sem Araucaria (Behling e Da Costa 1997). As áreas do nordeste, hoje habitadas por palmeiras e florestas semideciduais, eram cobertas há cerca de 11.000 anos por uma mata pluvial densa (Zyziphus, Anacardiaceae, Apocinaceae, Bignoniaceae, Cassia, Euphorbiaceae, Melastomataceae, Mimosaceae, Myrtaceae, Sapindaceae e Tabebuia) e que incluía elementos de altitude, indicando um clima úmido e temperaturas menos aquecidas. Serão substituídas por Mauritia e, logo após, pela chegada dos taxa de caatinga e cerrado. A aridez aumenta 4.000 anos atrás (De Oliveira et al. 1999). Em Lago do Pires, Minas Gerais, os testemunhos mostram episódios de queimadas nos últimos 10.000 anos (Behling 1995) e, mais uma vez, a ausência de Araucaria. Esta irá aparecer pela primeira vez nos furos realizados em uma região elevada do sudeste (Catas Altas) e em Botucatu, São Paulo, hoje cobertas por matas semidecíduas e cerrado. Entre 48.000 e 18.000 AP, o clima era frio e seco e a vegetação era formada por campos e matas galeria, similares aos que hoje existem no planalto sul-riograndense (com Araucaria, Podocarpus, Drimys, Ilex e Symplocos), sujeitas a incêndios. Estes dados sugerem que as florestas migraram durante esse período, caracterizado por quedas nas temperaturas (cerca de 5 a 7o menores que as atuais), desde os 28oS até os 20oS (Behling e Lichte 1997). Os primeiros sinais da atividade humana, com derrubada da floresta e culturas de milho e mandioca, iniciam aí há cerca de 3.000 anos. Para as áreas centrais do Brasil, Ledru (2002) sugere a presença de Araucária há 40.000 anos, seu desaparecimento durante o último glacial (entre 20.000–18.000 AP) e um retorno entre 16.000 e 10.000 anos AP, com freqüências variáveis até a reconquista dos ambientes. Atinge a distribuição moderna em 2.500 AP. Estudos em Goiânia (GO), Salitre (MG) e Rio Claro (SP) evidenciaram um clima quente e úmido para cerca de 30.000 anos atrás, seguido de um intervalo de seca e frio (17.000 a 14.000 anos) e o aparecimento de Araucária há 12.000 anos. O pinheiro desaparece em um intervalo subseqüente de seca e frio e ressurge no início do Holoceno com o retorno da umidade (Ledru 1992 e 1993, Ledru et al. 1994). Durante o último glacial (Würm), os polens mostram a ausência de Araucária, tanto nas zonas elevadas de Campos do Jordão onde hoje cresce, como nas terras baixas voltadas para o Atlântico, uma condição que irá se manter mesmo no início do Holoceno quando voltam as temperaturas mais amenas. A presença de uma corrente de ar quente continental e tropical bloqueava a chegada das frentes frias do sul, diminuindo o índice pluviométrico (Behling 1993). As florestas só retomarão os espaços e se aproximam de sua distribuição moderna a partir dos últimos 3.000 anos, quando um intervalo de frio e umidade irá patrocinar o avanço dos pinheiros a partir das matas galeria (Behling 1995). No Paraná (Serra Campos Gerais), Araucaria só é registrada nos últimos mil anos, associada a Cyperaceae, Weinmannia, Alchornea e Myrsine e poucas Poaceae (Behling 1997b). Entre 15 e 11.000 AP, as baixas temperaturas provocaram que as áreas altas da costa, onde hoje vive a Araucária, fossem cobertas por campos. O pinheiro permanecerá restrito aos vales protegidos (como em Catas Altas). Behling (1997a) propõe que as florestas tropicais que hoje habitam o norte de Santa Catarina, com Arecaceae e Alchornea, já tiveram um caráter subtropical e indicativo de maior frio, com grande número de Myrtaceae. A Mata Atlântica (Atlantic rain forest) e a mata nebular deviam ser mais restritas e ausentes das áreas entre a Serra do Mar e a da Mantiqueira, onde hoje crescem. Entre 35.000 e 27.500 anos AP, áreas de campo e fragmentos de mata adaptados ao frio (sem Araucária) e turfeiras se desenvolviam na região (Behling e Negrelle 2001). Há 12.000 anos são substituídas por matas pouco diversificadas e, em 6.000 AP, com o aumento da umidade e a elevação do nível do mar, a Mata Atlântica se instala e aparecem Araucaria e Podocarpus (Behling 1997a). Para o limite Pleistoceno–Holoceno em Santa Catarina, amostras de turfeira retiradas de zonas elevadas evidenciaram igualmente uma paisagem dominada pelos campos e raras araucárias restritas aos vales, acompanhada de Drimys, Aquifoliaceae e Weinmannia (Behling 1993, Behling 1995a, Behling 1997a). A partir daí iniciam sua expansão, até que, há cerca de 1.000 anos estão plenamente desenvolvidas (1.500 anos AP, no Paraná). Behling (1997b) e Kersahw e Waggstaff (2001) não concordam com Colinvaux et al. (1996b) quando afirmam que as Araucariaceae teriam se expandido para o norte durante as fases glaciais, a não ser junto às drenagens dos locais protegidos e com bom suprimento de umidade.

O acompanhamento do registro quaternário apóia as propostas vistas no início deste trabalho sobre o caráter natural e relictual das amplas áreas de campo que hoje cobrem uma parte significativa do sul do Brasil e o caráter de expansão do pinheiro sobre essas áreas, em tempos imediatamente anteriores ao atual. Conclusão

As plantas, como a própria vida, estão sempre em movimento Balduíno Rambo, S.J., 1958

O exame do registro fóssil das modernas coníferas, entre elas as Araucariaceae, sugere qube as condições propícias para seu aparecimento criaram-se após a grande extinção do final do Permo-Triássico. A união dos continentes formando o Pangea propiciou o aparecimento de grandes cinturões de aridez, cercados por estreitas, mas importantes, áreas subtropicais, onde alguma condição de umidade existia, especialmente na borda dos continentes. As áreas elevadas recém-criadas propiciaram a diversificação dos nichos e o aparecimento de grandes sistemas fluviais, que patrocinaram o desenvolvimento do grupo, substituindo a flora de Dicroidium e outras pteridospermas, habitantes dos corpos d' água das terras baixas e planícies de inundação. A intensificação dos eventos tectônicos no início do Jurássico, criando ambientes instáveis e solos desnudados, continuou a favorecer as coníferas, cujo levantamento aqui realizado demonstra terem uma grande capacidade de adaptação ao estresse e aos solos finos, que normalmente resultam do rejuvenescimento do relevo. Assim, são exclusivas em unir aspectos encontrados em indivíduos c-estrategistas, denunciado por sua boa competitividade, tamanho grande e vida longa, àqueles de comportamento s-estrategista, com boa tolerância ao estresse ou pressão ambiental. Veblen (1982) caracterizou-as como indivíduos que utilizam uma estratágia de equilíbrio, onde sua longevidade garante a sobrevivência a longo prazo. Entre os gêneros modernos, Araucaria reúne o registro mais antigo, apesar de, como vimos, as propostas filogenéticas apontarem Wollemia como precedendo a diferenciação entre Agathis e Araucaria. O registro daquele gênero apenas em níveis posteriores ao Cretáceo e sua restrita distribuição moderna não parecem apoiar essa hipótese. Tipos com características das secções Eutacta e Bunya do gênero Araucaria estão entre os mais antigos fósseis, e, para muitos pesquisadores, as formas putativas mostrariam preferencialmente caracteres presentes em Bunya. Assim, a presença de dois cotilédones representaria o caráter ancestral, seguido de formas com quatro cotilédones. Já a posição terminal ou axial do cone masculino esteve presente, muitas vezes e de forma alternada, entre os fósseis da família. Após sua origem no início do Jurássico, Eustacta se distribui amplamente e em ambos os hemisférios, enquanto Bunya, abundante no Mesozóico e com um fraco registro no Terciário, se restringirá a uma única espécie moderna (A. bidwilli). Essa distribuição sugere a ausência de relações entre o estoque primitivo dessa secção e a forma viva atual. As outras duas secções, Columbea e Intermedia, também irão se expandir durante o Mesozóico, especialmente no lado americano do Gondwana. Agathis, cujo mais antigo registro conhecido data somente do final do Cretáceo, mostra também uma menor variação genética e morfológica, sugerindo que os processos de especiação nesse grupo sejam recentes e nas áreas do sudeste do Pacífico. A primeira fase de diversificação e especiação é interrompida no início do Cretáceo, quando incia a fragmentação do Gondwana e as angispermas aparecem como invasoras oportunistas dos ambientes costeiros e terras baixas. A resposta das coníferas austrais será uma maior especialização para a vida em zonas menos favoráveis (maior frio, seca ou solos menos próprios), o que lhes garantiu a diversidade, mas restringiu a quantidade e área de abrangência. No Cenozóico, um novo pico de irradiação ocorre no Eoceno, uma fase caracterizada por calor e chuvas abundantes, o que estende sua ocorrência até a Antártica. Data daí sua associação preferencial com as florestas pluviais, as áreas um pouco mais elevadas e a borda dos continentes submetida a clima oceânico. A grande diversidade de nichos resultantes da criação de novos continentes, cadeias de montanhas e oceanos propiciou o aparecimento de formações vegetais de caráter “misto”, termo igualmente empregado para seus biomas modernos, respectivamente por Rambo (1951) e Schmithüssen (1966). Embora afastadas no tempo por cerca de 40 milhões de anos, essas floras guardam grandes semelhanças. Hoje, os representantes de Araucariaceae distribuem-se em grande parte junto a áreas elevadas e bem iluminadas, submetidas a um tectonismo ativo e dotadas de solos de pequena espessura, litólicos e ácidos, em zonas de clima oceânico mesotérmico, das latitudes subtropicais a tropicais. Os sistemas de ventos alíseos e contra-alíseos e das frentes polares, aos quais se superimpõem os efeitos do El Niño e da Convergência do

Atlântico Sul, concentrando bons teores de umidade no sul do Brasil e oeste chileno, parecem ter grande efeito sobre sua distribuição na América do Sul. Para seu desenvolvimento são ainda importantes as costas voltadas para o oceano, onde os altos topográficos retêm a umidade, razão provável para sua grande diversidade moderna nas ilhas do Pacífico. A idéia subjacente à moderna fitogeografia, da associação das coníferas aos climas frios, não é válida, portanto, para as Araucariaceae, com exceção, talvez, da forma chilena A. araucana (Kershaw e Wagstaff 2001), de distribuição temperada. Os parâmetros vistos e a longa história geológica mostram o valor que as formas associadas à família possuem na avaliação do clima e da geografia pretéritas, tornando seu estudo especialmente valioso para geólogos e paleobotânicos. Mesmo quando sua resposta aos ambientes reflete um processo localizado e regional, se associada a outros parâmetros mais globais, permite o refinamento dos dados. Por outro lado, o exame do registro pode ser útil àqueles que almejam compreender seu moderno comportamento e garantir sua conservação. Mostra que possuíram sempre uma dinâmica própria e uma resposta aos momentos de desequilíbrio, refugiando-se nas áreas mais protegidas, onde sobreviveram a muitos eventos catastróficos. Garantida a proteção de seus biomas, serão capazes de manter-se e expandir reconquistando as áreas num constante processo de evolução sucessional, raramente atingindo um “clímax”, conceito hoje tão discutível. Sua marcada resiliência aos episódios catastróficos, aos efeitos das mudanças ambientais e às pragas induzidas por animais, que garantiram sua persistência no tempo, comprovam sua aptidão para projetos de restauração. Enquanto as plantas com flores, em que pese sua rápida recuperação posterior, sofrem com esses eventos, elas sobrevivem com custos mínimos e poderão continuar a coexistir, como no passado, com os distintos grupos de plantas e suas novidades evolutivas. Agradecimentos Ao Conselho Nacional de Pesquisas – CNPq e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio Grande do Sul – FAPERGS pelas cotas de bolsa. Ao PROANTAR pela oportunidade de coleta na Península Antártica e a UNISINOS pelo apoio à pesquisa e infraestrutura. A Cláudia Pandolfo Paz, nosso agradecimento por grande parte das ilustrações. Referência Bibliográficas Anderson, H.M., Anderson, J.M. 1998a. The heyday of the gimnosperms: was it to be found in the Late Triassic? In: Abstracts of Gondwana 10: Event Stratigraphy of Gondwana, Journal of African Earth Sciences, 27(1A): 5-6. Anderson, J.M., Anderson, H.M. 1998b. In search of the world’s richest flora: looking through the Late triassic Molteno window. In: Abstracts of Gonwana 10: Event Stratigraphy of Gondwana, Journal of African Earth Sciences, 27(1A): 6-7. Anzótegui, L.M., Garralla, S.S. 1986. Estudio Palinologico de la Formación Paraná (Mioceno Superior) (Pozo “Josefina”, Provincia de Santa Fe, Argentina). Facena, 6: 101-177. Archangelsky, S. 1966. New gimnosperms from the Ticó flora, Santa Cruz Province, Argentina. Bulletin of the British Museum (N.H.) Geology, 13(5): 259-295. Archangelsky, S. 1994. Comparative ultrastructure of three Early Cretaceous gymnosperm pollen grains: Araucariacites, Balmeiopsis and Callialasporites. Review of Paleobotany and Palynology, 83: 185-198. Archangelsky, A., Andreis, R.R., Archangelsky, S., Artabe, A. 1995. Cuticular characters adapted to volcanic stress in a new Cretaceous cycad leaf from Patagonia, Argentina. Considerations on the stratigraphy and depositional history of the Baquero Formation. Review of Paleobotany and Palynology, 89(3-4): 213–233. Armesto, J.J., Villagrán, C., Aravena, J.C., Pérz, C., Smith-Ramirez, C., Cortés, M., Hedin, L. 1995. Conifers forests of the Chilean Coastal Range. In: N.J Enright and R.S. Hill (eds.) Ecology of the Southern Conifers. Melbourne University Press, Melbourne, Austrália. 156–110. Arrondo, O.G., Petriella, B. 1980. Alicura, nueva localidad plantifera Liasica de la Província de Neuquen, Argentina. Ameghiniana 17: 200–215. Artabe, A.E., Morel, E.M., Spalletti, L.A. 2001. Paleoecologia das floras triásicas argentinas. In: A.E. Artabe, E.M. Morel e A.B. Zamuner (eds.) El Sistema Triásico en la Argentina. Fundación Museo de La Plata “Francisco Pascasio Moreno”, La Plata. 199-225.

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