PALEOFLORISTICS OF ARAUCARIACEAE1 DUTRA, T.L., STRANZ, A. Exact and Technological Sciences Center, Post Graduation Program in Geology Laboratory History of the Live and of the Earth - LaViGæ Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS Av. Unisinos, 950-93022- São Leopoldo, RS, BRAZIL
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ABSTRACT The fossil record of ARAUCARIACEAE is discussed with the contribution of Antarctic Peninsula paleoassemblages and accompanied during the changes in past geography and climates, with the aim of contribute in the understanding of modern disjunct distribution. The family is accompanied since the Upper Triassic, when the first related macrofossils appears in South America (Southernmost Brazil and Mendoza, Argentina), southern United States (New Mexico) and India, in areas that have in common their location in the limit of the dry and humid climate belts. Those putative elements show a mix of morphological characteristics present today in distinct modern groups of conifer and with problematic affinities. The modern affinities, stablished during the Jurassic, allow to pursuit their broad and bi-hemispheric distribution in the end of Cretaceous, with section Bunya dominating the southern part of Pangea and Eutacta in the north. This is also the moment of the appearing of Agathis and Wollemia at southeastern land masses. Those aspects contrast in part with the recent cladistic groupment proposed to the family. The modern restriction to Southern Hemisphere is here proposed like a consequence of the great tectonic, climatic and environmental changes occurred during the end of Tertiary, with the definitive Antarctic drift apart from the other continental masses. KEY WORDS Araucariaceae, paleofloristic, paleogeography, paleoclimatology, Araucaria spp.
INTRODUCTION The importance of ARAUCARIACEAE for who are involved in the study of past and modern austral vegetation is very clear. In Southern Brazil its presence, like a supposed Antarctic or Andean contribution in the subtropical rainforest formations (“Floresta Ombrófila Mista” with A. angustifolia) is considered “the most obscure problem in Brazilian vegetation” (Leite, 1995) and focus of long discussions (Rambo 1951, Reitz & Klein 1966). The profitable work made about the ecology, origin and diversification of the southern conifers by the Southern Hemisphere botanical and paleobotanical researchers (Enright & Hill 1995) and the recent work of Kershaw and Wagstaff (2001) was an effective contribution to this problem. The aim of this work is complement those data with the information come from the Antarctic Peninsula fossil assemblages and discuss the implications of new macrofossils found in the Triassic of the southern Brazil (Dutra & Crisafulli 2002, Dutra et al. 2002). Those rests complement the knowing petrified forests with secondary woods of Araucarioxylon type from South America (Brea 1997, Guerra-Sommer et al. 2000) and those from India (Florin 1963, Benton 1993), Southern Africa (Bamford 1998) and United States (Ash 1972 e Dilcher e Taylor 1980) and indicates the medium latitudes of Pangea like a place for the dispersion of this group of conifers and where must be looking for its center of origin. Today another time restricted to Southern Hemisphere lands, after a long time of broad and bihemispheric distribution in the Cretaceous and Lower Tertiary times, they are linked to tectonically active regions, in areas with mesotermic and humid oceanic climates, the family could be an useful tool to paleoenvironmental and paleogeographic reconstructions. 1
Work partially support from CIRM (Comissão Interministerial para os Recursos do Mar) and
CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico)
THE MODERN STATUS OF THE FAMILY A família Araucariaceae é representada atualmente pelos gêneros Wollemia, com uma única espécie (W. nobilis Jones, Hill & Allen, 1995), Agathis, com 20 espécies e Araucaria, mais abundante e com maior amplitude geográfica (Figura 1). O último é subdividido em 4 secções: Columbea (ou Araucaria de Setoguchi et al. 1998), com as espécies A. angustifolia e A. araucana, exclusiva da América do Sul; Bunya restrita a Austrália e representada por A. bidwilli; Intermedia da Nova Guiné, com a espécie A. hunsteinii e, Eutacta, de ampla distribuição geográfica, mas limitada ao setor oriental (Nova Guiné, Austrália, ilhas Norfolk e Nova Caledônia) e com o maior número de taxa (15).
Figura 1 – Distribuição geográfica e número de espécies dos modernos gêneros de Araucariaceae (dados compilados de Enright & Hill 1995, Kershaw e Waggstaff 2001 e Setoguchi et al. 1998). Setoguchi et al. (1998) e Graham et al. (2002) propuseram recentemente para a família um esquema filogenético baseado no seqüênciamento gênico de bases do gene rbcL do DNA dos cloroplastos (Figura 2). Entre outros aspectos, o modelo propõe uma origem monofilética, a consistência das secções modernas de Araucaria e a maior proximidade de Bunya, Intermedia e Columbea entre si que com Eutacta, onde os cones masculinos são terminais e a orientação dos estômatos na folha é oblíqua ou perpendicular. Corrobora ainda, a relação estreita entre as formas americanas da secção Columbea (= Araucaria). O cladograma proposto discorda, no entanto, dos dados do registro fóssil, que analisaremos a seguir, ao propor Wollemia como um taxa basal, seguido de Agathis, ambas formas ausentes entre os elementos mais antigos conhecidos entre os fósseis. Por outro lado, Araucaria sect. Bunya, cujos caracteres se manifestam desde cedo, é sugerida como uma forma derivada. É visível, portanto, que as relações filogenéticas acima do nível específico, ainda Figura 2 – Proposta filogenética para Araucariaceae se mantém pouco claras, como sugerem Henkel & W. Hochst. 1865, modificada igualmente Codrington et al. (2002). de Setoguchi et al (1998).
ECOLOGICAL PARAMETERS OF MODERN CONIFER GROUPS As coníferas compartilham atributos ecofisiológicos que as distinguem das plantas com flores e de outros grupos de gimnospermas (Kershaw e McGlone 1995). Suas folhas pequenas, endurecidas e menos vascularizadas, limitam sua possibilidade de variar significativamente em forma, tamanho e textura, o que acaba por reduzir sua tolerância aos locais de luz reduzida, especialmente nas fases iniciais do crescimento (Inoue et al. 1979, Backes 1983, 1999). Os caules, dotados apenas de traqueídeos, são menos eficientes no transporte dos fluídos, retardando seu crescimento e o desenvolvimento das sementes e plântulas (Taylor e Taylor 1993). Esta menor eficiência é, contudo, compensada, pelo caráter perene de suas expansões aéreas e o porte expressivo dos caules, o que lhes garante maior resistência às condições adversas e no aproveitamento dos nutrientes. Este conjunto de características permite incluí-las entre as plantas ditas “econômicas ou avarentas” (hoarders ou savers) de Boersma et al. (1991), ou seja, as que são capazes de ocupar solos menos favoráveis, por utilizarem eficientemente as fontes energéticas disponíveis. Para Schmithüsen (1966), sob condições impróprias, suas florestas se fragmentam em corpos menores e, quando as condições adequadas retornam, como hoje na América do Sul e desde o último glacial, reconquistam os espaços. Esta regeneração pode ser limitada em locais dotados de solos muito férteis e úmidos ou em zonas de clima quente, pela competição com as matas de angiospermas, mais adaptadas e menos exigentes. Como resposta a estes fatores em algum momento de sua história geológica adotaram uma vida preferencial, mantida até os dias de hoje, em locais caracterizados por grande perturbação ambiental e solos instáveis (Ogden e Stewart 1995), lixiviados, secos ou congelados e mais pobres, onde o desenvolvimento daquelas é reduzido (Bond 1989). Para Enright e Ogden (1995), as coníferas possuem grande capacidade de resistir a deslizamentos, enxurradas e erupções vulcânicas, especialmente as Araucariaceae (Araucaria araucana, A. hunsteinii, e Agathis australis), Cupressaceae e Taxaceae. Também o caráter heliófito visto, pode resultar de episódios ocorridos durante sua evolução. Como veremos, a mescla de elementos aparentemente antagônicos que exibem modernamente (esclerofilia e abundantes estômatos, por exemplo) não é um aspecto raro entre os vegetais e pode refletir a associação de caracteres primitivos, que a planta não teve plasticidade genética para suprimir, a outros adquiridos posteriormente. Segundo Rizzini (1997, p. 283), os esclerofilos heliófitos e as coníferas em geral, são as plantas com menor plasticidade. O registro fóssil sugere que as Araucariaceae possuíam desde seu aparecimento no Mesozóico, folhas pequenas e de cutículas espessas, que deviam garantir-lhes a sobrevivência nos ambientes amplos e bem iluminados característicos daquele período. Com o advento das angiospermas, novas adaptações devem ter surgido, como, por exemplo, a presença de grande número de estômatos, úteis à vida nas latitudes e altitudes mais altas, em geral dotadas de maior umidade e/ou menos luz. O fato de a preservação de cutículas ainda ser rara no registro impede no momento a correta avaliação destes elementos. THE FOSSIL RECORD OF ARAUCARIACEAE Diagnostic Featuresto be looking for O reconhecimento das mais antigas formas de Araucariaceae no registro é dificultado pelo grande número de formas registradas a partir do final do Paleozóico e onde a mistura, em um único indivíduo, de caracteres hoje encontrados em diferentes grupos de coníferas é comum (Meyen 1987, Miller 1988, Taylor e Taylor 1993). Além disto, em níveis do início do Triássico, é comum sua associação com partes vegetativas de pteridospermas (Herbst 1966). Um outro fator complicador é a desarticulação dos diferentes órgãos vegetais entre os fósseis, fruto dos processos tafonômicos. Por isto, quando se deseja perseguir sua trajetória ao longo do tempo, é importante conhecer quais são os elementos que caracterizam cada uma de suas partes, terreno em que o estudo de tipos modernos é excelente ferramenta. Os seguintes elementos devem ser considerados para avaliar a presença de Araucariaceae no registro, alguns mais diagnósticos que outros: a) xilema secundário picnoxílico e com pontuações areoladas (bordered pits) hexagonais unisseriais, raramente bisseriais, dispostas de forma alterna nas paredes radiais dos traqueídeos (pontuação araucarióide), ausência de canais resiníferos, espessamentos espiralados e parênquima axial (Stewart
1987, Marchiori 1996). Duas ou mais séries de pontuações poligonais podem estar presentes (Taylor e Taylor 1993, Meyen 1987). Lenhos com estas características, atribuídos aos morfogêneros Dadoxylon Endlicher e Araucarioxylon Kraus, recentemente foram agrupados em Agathoxylon, por Bamford e Philippe (2001). Na ausência de outros elementos, permitem apenas incluí-los em nível da família; b) folhas de arranjo helicoidal e com numerosas veias paralelas, sem divisões dicotômicas e distribuídas da base ao ápice e ramos de disposição verticilada, seriam característicos da família (Meyen 1987), embora não exclusivos (Stewart 1987). Além disso, as folhas podem variar em forma e tamanho, mesmo em um único ramo (A. heterophylla) ou em ramos jovens e adultos. Assim, somente na presença de cutículas preservadas, permitem uma aproximação confiável e aí, pode tentativamente se chegar ao gênero (Stockey e Taylor 1978a, 1978b, 1981, Stockey 1982, Stockey e Ko 1986, Backes 1973, Dutra e Stranz 2000). Para Araucaria estes estudos atualísticos determinaram a ausência de ornamentação (papilas ou anéis de Florin), a presença de muitos complexos estomáticos, dispostos em fileiras descontínuas (menos freqüentemente em bandas e dispostos ortogonalmente à margem, como na secção Eutacta) e aprofundados na epiderme. As secções Bunya, Columbea e Intermedia, possuem em comum a orientação dos complexos estomáticos paralela ao bordo da folha e uma espessa cutícula sobre as células subsidiárias (em geral em número de 4), de contorno oval ou arredondado. Araucaria e Wollemia possuem folhas anfiestomáticas e Agathis é hipoestomática. Quando apenas impressões são disponíveis, existem muitas abordagens e classificações. Stewart (1987) propõem uma simplificação e a adoção de dois tipos principais de formas, o braquifílico para folhas pequenas, tetragonais e falcadas (originando a morfogênero Brachyphyllum) e o linearfílico, para as de forma alongada e aplainadas, subsésseis (atribuídas a Pagiophyllum). Alguns autores, no entanto, associam o primeiro destes morfogêneros igualmente com as Cheirolepidiaceae, Podocarpaceae ou Taxodiaceae (Meyen 1987, Del Fueyo 1991). Convencionou-se ainda que, a partir do final do Mesozóico, já podem ser estabelecidas relações com os gêneros modernos. Folhas grandes são hoje exclusivas de Agathis e das secções Bunya e Columbea do gênero Araucaria. c) as estruturas reprodutivas constituem o mais valioso elemento diagnóstico da presença da família no registro. Caracterizam-se por escamas ovulíferas com uma forma típica de cunha e base alargada, incluídas no morfogênero Araucarites. Os cones masculinos são alongados e cilíndricos, com numerosos microesporófilos semelhantes a brácteas e cerca de 12 sacos polínicos invertidos. Os femininos são grandes e de forma globosa ou ovóide (Reitz e Klein 1966, Mattos 1994). Em Araucaria, uma única semente com óvulo invertido, está mergulhada na escama pequena e abaxial e fundida a uma bráctea lenhosa, mas mantendo a extremidade livre (lígula). d) os polens caracterizam-se por seu aspecto simples, com sacos polínicos pouco desenvolvidos, morfologia igualmente compartilhada com outras famílias de coníferas, tais como Cupressaceae, Taxaceae, Taxodiaceae, algumas Pinaceae e Podocarpaceae e, portanto, pouco diagnóstica (Zamuner et al. 2001). Araucariacites Cookson possui, ora forma esférica e com sexina e nexina unidas, ora triangular, com as duas camadas separadas. Neste último caso a sexina é preguada e enrugada e, às vezes, com aparência trilobada, um caráter que divide com Callialasporites (Batten e Dutta 1997). Junto com Inaperturopollenites, estes elementos, especialmente os dois primeiros, constituem o registro da família Araucariaceae. The history of Araucariaceae A história das Araucariaceas, o grupo mais primitivo de coniferas ainda vivas, inicia logo após a maior das extinções já vistas pelo planeta, no limite entre o Paleozóico e o Mesozóico. Entre o final do Permiano e o Triássico Superior, as condições ambientais nos dois extremos do Gondwana foram muito distintas. Enquanto Austrália e Índia lentamente passaram de condições subtropicais para temperadas frias, no lado ocidental (norte da América do Sul e África Ocidental) os ambientes permaneceram dentro do âmbito das latitudes subtropicais (Scotese 1998). Daí em diante e até o final do Cretáceo, climas subtropicais e tropicais, com médias próximas dos 30oC, irão caracterizar a maior parte dos ambientes no Hemisfério Sul e influenciar profundamente a vida das araucárias. A América do Sul, que irá manter um movimento preferencial para oeste, não alterará sua posição mais do que 20o de latitude, durante cerca de 300 milhões de anos. Graças a esta geografia, o clima global manter-se-á homogeneamente aquecido durante um extenso período de tempo, interrompido apenas por um curto e pouco drástico intervalo de frio (Ice House) no limite Juro-Cretáceo (temperaturas médias de pouco menos de 20oC) e, um segundo momento, mais extremo (médias de 10oC), no Terciário Superior.
1. Triássico Superior O final do Triássico se caracterizou, graças ao momento de máxima união do Pangea, por climas em geral quentes e do tipo megamonzonal e megaestacional (Parrish 1993). Uma faixa equatorial de calor e seca bastante ampla deslocava a área de confronto dos centros de alta e baixa pressão, hoje atuantes nas latitudes médias, cerca de 15o para sul e fazia com que, mesmo nos polos, não se formassem coberturas de gelo muito espessas (Figura 3). As áreas que compunham o que hoje corresponde ao sul do Brasil, norte da Argentina, Índia Central e África do Sul, situavam-se no limite entre as faixas tropicais áridas e temperadas quentes, fazendo com que os contrastes anuais de temperatura e umidade fossem grandes. Alternavam-se climas continentais secos com úmidos, resultantes dos anticlones do Paleo-Pacífico. Sistemas fluviais de grande expressão são registrados para este momento nestas regiões e em outras partes do globo.
Figura 3 – Mapa paleoclimático do Triássico superior (modificado de Scotese 2001) e a posição do sul do Brasil na época (círculo).
Neste cenário surgem as primeiras coníferas de grande porte e com afinidade com os grupos modernos. Serão tão importantes durante o Mesozóico, quanto os dinossauros, seus acompanhantes. Entre as formas do registro, alguns elementos já sugerem sua afinidade com Araucariaceae e Podocarpaceae primitivas. Segundo McLoughlin et al. (1998) o decréscimo das Glossopteridales e sua substituição pelo conjunto Peltastermales-Licófitas-Corystospermas e pelas floras dominadas por coníferas, teria sido sincrônico ao longo do Gondawana, contrastando com o diacronismo da substituição das camadas de carvão pelas red-beds, ocorrida em diferentes momentos, entre o final do Permiano e o Triássico médio. Meyen (1987) considera que a vegetação do final do Triássico mostra mais pontos em comum com as da base do Jurássico, do que com as que haviam dominado o Triássico. O desaparecimento das floras de Voltzia e Pleuromeia seria seu aspecto mais característico. Recentes achados de fauna e flora vieram adicionar novos elementos para a avaliação do momento de chegada das primeiras formas de Araucariaceae ao Gondwana e a Laurásia (Figura 4A), além de auxiliar na determinação de suas reais afinidades com as formas modernas. Restos de lenho, ramo e polens cujo espectro de variação se insere no esperado para a família e, ao mesmo tempo, indicativos do aumento de diversidade das gimnospermas após a extinção do Permiano–Triássico, como proposto por Anderson e Anderson (1998a e 1998b), são a partir daí documentados. Foram reconhecidos inicialmente por Ash (1972) e Dilcher e Taylor (1980) para a América do Norte. As formas distribuem-se entre lenhos (Araucarioxylon) e ramos (Pagiophyllum e Brachyphyllum) identificados no leste do Arizona (Petrified Forest National Park, Formação Chinle), Pensilvannia e parte oriental do Novo México (Zona de Dinophyton, do Carniano Superior). No Hemisfério Sul, os restos de lenho do sul do Brasil são os posicionados nas menores paleolatitudes. Atribuídos igualmente a Araucarioxylon, por seu número e tamanho expressivo (cerca de 1 m de diâmetro) constituem também uma verdadeira “floresta petrificada” (Minello 1994, Bolzón 1995a e 1995b, Guerra Sommer et al. 1998 e 2000) mas, raras vezes, foram identificados nos níveis de conglomerados fluviais onde se acredita tenham sido preservados. Os níveis foram incluídos na Formação Caturrita (Faccini 2000) ou Seqüência Deposicional II (Scherer et al. 2000), topo da Seqüência Santa Maria 2 de Zerfass et al., 2003), o que lhes confere uma idade Neotriássica (Noriano–Rético?). Em camadas próximas, mas representativas de fácies distintas e, provavelmente, um pouco mais antigas, um rico material fóssil foi recentemente identificado, na forma de ramos com folhas (do Complexo Brachyphyllum-Pagiophyllum), lenhos autóctones (Kaoxylon zalesskyi) e prováveis estruturas reprodutivas
(cones e escamas ovulíferas) ainda não determinadas (Dutra e Crisafulli 2002, Dutra et al. 2002b). Permitiu a reconstituição de indivíduos de porte arbustivo, que viviam junto a áreas sazonalmente inundadas de planícies de inundação e lagos, associados aos sistemas fluviais. Junto foram encontrados dinossauros primitivos, proto-mamíferos, lagartos e conchostráceos que apoiam a idade Triássico superior. Esta flora se sobrepõe tanto aos níveis ricos em Flora de Dicroidium, quanto aqueles que contém a maior parte dos répteis tecodontes e mamaliformes (Membro Alemoa de Andreis et al. 1980, topo da Seqüência II de Faccini et al. 1995 e Scherer et al. 2000, Zerfas et al., 2003). Na Argentina, Araucarioxylon protoaraucana é registrado na Bacia Cuyana (Formação Potrerillos), em Mendoza (Brea, 1997). As estruturas anatômicas mostram afinidade com as secções Columbea e Eutacta (A. cunninghamii e A. muelleri). Sua associação com a Biozona MBC de Morel et al. (2001), de idade Noriano (base do Triássico Superior ou topo do Triássico Médio) faz destes restos os mais antigos, onde características de afinidade com as Araucariaceae podem ser identificadas. Alguns outros tipos, também identificados nas bacias argentinas, compartilham caracteres primitivos araucarióides e abietinóides (Araucarioxylon sp. A, Protocircoporoxylon, Protojuniperoxylon ischigualastensis), levando a incluí-los na família Protopinaceae Kraüsel 1949 (Zamuner 1992). Para Zamuner et al. (2001), seriam precursores das Podocarpaceae, Araucariaceae, Cupressaceae e Taxaceae. A maior parte provém da Formação Ischigualasto (Biozona BNP de Morel et al. 2001, base do Triássico Superior), onde também foi identificado Rhexoxylon piatnitzkyi, lenho associado com Pteridospermas (Corystospermas) e forma igualmente presente no Rio Grande do Sul (R. brasiliensis Herbst e Lutz), embora não se conheçam exatamente os níveis de onde se originaram. As coníferas irão superar as Corystospermas nas bacias argentinas e como formadoras do estrato superior dos bosques, na parte mais alta do Triássico Superior (Formação Passo Flores, Biozona DLM). É neste momento também que os bosques perenes são substituídos por aqueles de caráter caducifolio, sugerindo períodos de seca mais destacados (Artabe et al. 2001). Em várias partes do território argentino lenhos de grandes dimensões aparecem associados a sedimentitos vermelhos no topo do Triássico como, por exemplo, na Formação Los Colorados (Stipanicic e Bonaparte 1979). Entre os polens domina, contudo, Classopolis associado a família Cheirolepidiaceae, junto com outros grãos característicos da Zona Foveosporitres morotonensis, do Noriano Superior–Rético da Austrália e Nova Zelândia (Zavattieri 2001). Nenhuma forma de Araucariacites foi registrada na microflora das bacias argentinas. Na África do Sul (Namíbia), Araucarioxylon aparece associado a Podocarpoxylon e Prototaxylon em várias localidades do Triássico, em camadas dos grupos Ecca e Beaufort inferior (Bamford 1998). Na Índia os restos são igualmente significativos por sua antiguidade (Noriano) e por conter estruturas reprodutivas associadas, atribuídas a Araucarites parsonerensis Lele 1955 e A. indica Lele 1962 (Florin 1961, Benton 1993). Na Austrália os macrofósseis são raros, mas o pólen Araucariacites é registrado na região de Queensland, na parte nordeste do continente (Figura 4A). Dois tipos principais de palinofloras são reconhecidos para o Triássico Médio e Superior da Austrália (De Jersey e McKellar 1981): a “Microflora Onslow”, de caráter temperado quente e com elementos europeus das baixas latitudes (Tethys) e a “Microflora Ipswich”, de menor diversidade e dominada por tipos bissacados simples, monosulcados e esporos de pteridófitas exclusivamente gondwânicos, que informava sobre condições de maior frio e umidade. As duas assembléias eram limitadas pela paleolatitude de 45oS, o que levou Foster et al. (1994) a incluir as plantas produtoras destes palinomorfos, em duas províncias paleoflorísticas. A partir disto, os locais onde foram identificados os restos de polens de Queensland contendo Araucariacites inseriam-se numa condição “Mista Onslow-Ipswich”. Correspondentemente, as áreas do Sul do Brasil situavam-se no âmbito desta flora mista, enquanto as floras das bacias argentinas cresciam dentro da área da “Microflora ou Província Florística de Ipswich” (Zamuner et al. 2001). Finalmente, também na Antártica e em áreas próximas a Austrália, foram identificados lenhos triássicos. Originam-se de espessos arenitos com estratificação cruzada, sugestivos da presença de rios entrelaçados (braided), que foram incluídos no Membro MacKelvey (Grupo Amery) das Montanhas Prince Charles. São o melhor documento para demonstrar a rápida diversificação das coníferas durante o Noriano (Meyer-Berthaud et al. 1993, McLoughlin et al. 1998). Restos de coristospermas, fetos, licófitas, esfenófitas e algas completam a assembléia. O levantamento visto para as ocorrências do Neotriássico corrobora a proposta de Anderson e Anderson (1998a) de que aí teria ocorrido o primeiro pulso de diversidade (heyday) das coníferas. Neste momento o grupo seria composto por 25 ordens (contra as 6 atuais) e 34 famílias (14 modernas). Para os pesquisadores, em algum local entre as latitudes 30oS e 60oS do Gondwana, estaria a mais importante área
de diversidade faunística e florística (hot spot) já registrada no globo. Os depósitos de carvão da época mostram que coincidem com o limite, ou estão dentro da faixa de clima temperado quente e dos cinturões verdes, que bordejavam as áreas mais secas do interior do Pangea . 2. Jurássico As condições estacionais serão mantidas por algum tempo. Ao longo do período, contudo, o calor irá aumentar e a umidade reduzir-se ainda mais, numa ampla faixa que se estende até os 50o sul e norte, produzindo uma homogeneização das floras (Meyen 1987). O nível dos mares acompanha este processo, avançando gradativamente sobre os continentes e atingindo seu clímax até o final do período (Kershaw e Wagstaff 2001). Em parte, este último processo serviu para amenizar os efeitos da seca, pelo menos na borda dos continentes (Figura 4B). Restos com afinidades com as Araucariaceae irão se tornar cada vez mais abundantes nas assembléias palinológicas, atestando a expansão espacial do grupo, graças a presença das terras contínuas do Pangea. Rapidamente espalham-se por ambos os hemisférios, embora ainda dominem no sul. Escamas ovulíferas e lenhos, mais certamente associados à família, e especialmente, ao gênero Araucaria (secção Bunya, mas também com Eutacta), tornam-se abundantes (Stockey 1982, Stewart 1987, Meyen 1987, Miller 1988, Hill e Brodribb 1999). A presença de um segundo gênero é sugerida por Hill (1994). Estudos da ultraestrutura da exina dos polens no oeste da Europa (Kimmeridgiano-Volgiano basal), apoiam a associação de Araucariacites australis, Callialasporites dampieri, C. trilobatus e C. turbatus com as Araucariaceae (Batten e Dutta 1997). Em toda a extensão da América do Sul, chegando até a Península Antártica, o calor e o declínio das Dicroidium, fez com que os ambientes fossem invadidos por elementos equatoriais, como Bennetitales e pteridófitas (Dutra e Jasper 1993, Morel et al. 1994). Na Bacia de Neuquén, na Argentina (paleolatitudes de 40 oS), uma microflora do Jurássico inferior (pré-Toarciano superior) mostra o domínio de Classopollis, uma forma em geral associada aos climas aquecidos. É acompanhado por Araucariacites pergranulatus Volkheimer 1968 (inaperturado), inaperturados sacados (Podocarpites, Allisporites, Microcarchryidites, entre outros) e pteridófitas (esporos triletes e monoletes). O intervalo correspondente a Formação Pedra Pintada e registra um contexto vulcânico, sujeito a períodos de evaporação em uma área costeira marinha (Arguijo et al. 1982). Nesta mesma unidade e em Alicurá, os restos de folha de Araucarites phillipsi constituem as formas mais comuns (Herbst 1966, Arrondo e Petriella 1980). Nesta mesma bacia, em níveis do Jurássico médio (Formação Lajas), expostos mais ao sul, a microflora será caracterizada por Araucariacites australis e Inaperturopollenites spp. Embora raros, estão presentes ao longo de toda a seqüência, representativa de um sistema transgressivo (com cefalópodos amonóides), ambientes de plataforma rasa e intervalos de mar alto, com lobos deltaícos. Cheirolepidiaceae e Podocarpaceae dominam a assembléia, seguidas de Pteridospermopsida e Cycadaceae. Incluídos na Zona Callialasporites dampieri, indicam condições mesotérmicas e grande umidade estacional (Martínez 2002). Permanecerão aí até o final do período, como é atestado pela presença de Brachyphyllum ramosum e Araucarites sp. em Mina de La Perla (Formação Lotena). Abaixo dos 45 oS e ainda para a parte média do Jurássico, restos de lenho petrificado de grande porte (Araucarioxylon) e ramos com folhas (Araucarites santaecrucis Calder 1953) foram identificados na Formação La Matilde, Província de Santa Cruz (Frenguelli 1933, Leanza 1948). Na Patagônia argentina nesta época foram preservados seus mais belos fósseis. Provenientes da Formação Cerro Quadrado, consistem de cones petrificados com sementes contendo embriões em vários estágios de desenvolvimento, inclusive com primórdios de raízes. A ocorrência conjunta de escamas ovulíferas (Araucarites) atesta o caráter autóctone da deposição. Foram associados a Araucaria mirabilis e, pela presença de dois cotilédones na semente, à secção Bunya (Stockey 1975, 1978, 1994, Stockey e Taylor 1978b). No lado chileno, os bosques eram compostos também por Araucariaceae, com ramos de Brachyphyllum e Araucaria, acompanhados de Cycadaceae e Podocarpaceae (Engelhardt 1891). Para Del Fueyo (1991), a variedade dos achados e o caráter autóctone, indicam que esta porção austral da América deve ter sido um importante centro de diversificação para a família e para o gênero (Figura 4B). O registro se estende a Antártica (Araucarites), Nova Zelândia (Araucarites e Araucarioxylon), Austrália (formas relacionadas com Agathis, acompanhadas de Podocarpaceae, indicando maior umidade), Índia (Araucarites) e África (Araucarites africana), segundo White (1990). Esta última forma, contudo,
proveniente da região de Mali (Krasilov 1978), é considerada de afinidades duvidosas, pela ocorrência de papilas e células T, mais características de Cheirolepidiaceae (Stockey e Ko 1986). No Hemisfério Norte os fósseis correspondem a parte média do Jurássico e provém de Yorkshire, Inglaterra. Consistem de sementes, cones com polens e escamas ovulíferas (Araucarites phillipsi), associados a ramos de Brachyphyllum mamillare, relacionados a secção Eutacta (Kendall 1949, Harris 1979, Stockey 1980a, 1980b, 1982, Hill 1994). Sugerem um ambiente costeiro em região equatorial, sem formação de carvão, mas com uma rica flora (200 gêneros) dominada por Cheirolepidiaceae (Classopollis), Peltaspermales, coníferas Taxodiaceae e Podozamites. Nos Estados Unidos, restos de Araucariaceae aparecem em Potomac, associados a Cycas. Deste modo, o documentário confirma o gênero Araucaria e as secções Bunya e Eutacta como já bem estabelecidos no Jurássico. Para Stockey (1982), a secção Columbea teria se originado neste momento, a partir de formas da secção Bunya. Aí está uma das primeiras contradições em relação a proposta filogenética de Setoguchi et al.(1998), que sugere Wollemia como tipo primevo e uma separação inicial de Agathis e Araucaria. 3. Cretáceo As Araucariaceae irão manter as áreas conquistadas e a ligação com os cinturões de clima temperado quente. Ao mesmo tempo ampliam sua distribuição para sul e norte, chegando até as latitudes altas do sul (60oS) e aos locais submetidos a calor e a aridez dos trópicos (Figura 4C). Deviam habitar as áreas mais elevadas próximas às bacias, como uma resposta à chegada das angiospermas, como vegetação ripária em áreas costeiras e mais baixas (Crane e Lidgard 1989, Taylor e Taylor 1993, Hill 2000, Dutra e Stranz 2002). Esta adaptação, que de certo modo é mantida pela maior parte do grupo até os dias de hoje, é inferida por sua presença pouco expressiva nas assembléias polínicas, o que sugere um crescimento um pouco afastado dos ambientes de deposição (Ruiz e Quattrochio 1993). Com efeito, a análise das litologias associadas comprova uma ligação preferencial das coníferas para este momento com áreas submetidas a vulcanismo e tectonismo ativo e a proximidade com os mares e oceanos recém surgidos pela separação dos continentes, capazes de amenizar a seca. Embora afetadas numericamente não reduziram sua diversidade, o que confirma o sucesso destas novas adaptações (Regal 1977). Outros grupos (Cycadales, Bennetitalles, Gynkgoales e Ephedrales), mais especializadas para a vida nas áreas baixas das latitudes tropicais, sentiram profundamente os efeitos destas mudanças e muitas irão extinguir até o final do Cretáceo. Nas latitudes altas onde as plantas com flores só chegariam um pouco mais tarde (Drinnan e Crane 1990), puderam manter por mais tempo sua abundância. Macrofósseis do Cretáceo Inferior (Albiano e Aptiano) aparecem em depósitos da Austrália e do Brasil (Formação Santana, Bacia do Araripe, Ceará), com restos de folha com características da secção Columbea (Hill e Brodribb 1999, Dutra e Stranz 2000). A riquíssima assembléia de plantas do nordeste brasileiro, além das Gnetaceae e Ephedraceae (e prováveis angiospermas primitivas), reúne folhas de Araucaria cartellei Duarte 1993, ramos do tipo Brachyphyllum, escamas ovulíferas isoladas e cones (Duarte 1993, Dutra et al. 2002a). Na Europa ocidental e meridional a situação é similar. A primeira concentra polens de Araucariacites e Callialasporites, acompanhados de formas relacionadas com Gnetales e Cycadales. No sul, associam-se a Classopollis (Cheirolepidiaceae) e Dicheiropollis (forma tropical característica da província WASA). A partir do Barremiano, Araucariacites chega ao norte da Europa, acompanhado de Cycadaceae e Ephedrites/Gnetaceopollenites, indicativos de clima árido (Batten 1984). Estruturas reprodutivas identificadas na Europa (Araucarites toucasi Saporta 1879), Ásia oriental (Rússia Oriental, Mongólia, Japão), Canadá e Estados Unidos (A. obtusifolia Font, A. podocarpoides Font. e A. zamioides Font.), indicam que Araucaria, sect. Bunya e Eutacta (Batten 1984, Stewart 1987, Stockey et al. 1990, Vakhrameev 1991, Duarte 1993, Spicer et al. 2002), associada a formas duvidosas de Agathis (Hill e Brodribb 1999) também conquistaram as áreas setentrionais.
A
B
Figura 4 – Paleogeografia e o registro de coníferas relacionadas com Araucariaceae durante o Mesozóico. As formas com ramos distribuídos desde a base representam tipos primitivos da família, cujas afinidades com as formas modernas não puderam até o momento ser completamente estabelecidas. As linhas tracejadas correspondem aos limites da faixa de aridez. A –Triássico superior; B – Jurássico inferior e médio; C – Cretáceo inferior e medio. Fonte bibliográfica dos dados no texto.
C
Estes achados apoiam a existência, para o Neocomiano do Hemisfério Norte, dos dois reinos florísticos propostos por Vakhrameev (1991), o Sibério–Canadiano de climas temperados e o Indo-Europeu, de características tropicais e subtropicais. Confirmam, além disto, a presença de uma faixa de aridez que se estendia por todo o norte do Gondwana. No norte da África, são registrados Araucariacites australis e A. balinkaensis (Kedves 1994) e na Índia, onde se associam a Nipania, uma Pentoxylalles, as Araucariaceae permanecerão até o Maastrichtiano, (White 1990). No sul da África, ramos com estruturas reprodutivas e lenhos foram registrados para o Berriasiano (White 1990, Vakhrameev 1991). Estes dados demonstram a presença da família em dois continentes onde hoje não são mais registradas e o papel exercido pela Antártica na manutenção de rotas de passagem entre a América do Sul e a Australásia. Na América do Sul, uma assembléia registrada em latitudes de cerca de 35o S, atesta até onde se estendiam às condições de seca e a faixa de climas tropicais no período. No Uruguai, as formações Migues e Castellanos (Aptiano-Albiano) contêm Araucariacites e Classopollis, acompanhados de Gnetaceae, Cycadaceae e angiospermas primitivas, preservadas em ambientes lacustres e de canais fluviais (Campos 1998). A composição da palinoflora sugere um clima quente e seco e uma paisagem similar àquela proposta para a Bacia do Araripe, no nordeste do Brasil. Além de testemunhar a uniformidade climática que marcava a parte setentrional desta massa de terra, sugere que logo abaixo disto, devia estar o limite entre as zonas áridas e úmidas. Nas bacias argentinas de Neuquén e Santa Cruz, durante o Barremiano (Formação La Amarga), Barremiano-Aptiano (Formação Rincón) e Berriasiano (Formação Vaca Muerta, em Mallin Quemado), as Cheirolepidiaceae (Classopollis) e Gnetaceae (Equisetosporites), indicativas de calor ainda aparecem, mas em menores proporções. Araucariacites australis, Balmeiopsis limbatus e Callialasporites e Cyclusphaera psalilata, todas formas de pólen associadas com Araucariaceae, unem-se a Alisporites e Cycadopites spp. (Cycadaceae), Podocarpites spp. (Podocarpaceae), pteridófitas e algas (Quatrocchio e Volkheimer 1985, Prámparo e Volkheimer 2002), indicando condições mais úmidas (Ruiz e Quattrochio 1994). Na Formação Baqueró (Aptiano?), Província de Santa Cruz, estão as melhores assembléias e preservações, com restos de Araucariaceae sendo registrados nos micro e macrofósseis e, nestes, com as conexões orgânicas originais. Del Fueyo (1991) descreveu o gênero Nothopehuen brevis, com cones, troncos e folhas do tipo Brachyphyllum, acompanhados de escamas ovulíferas (Araucarites baqueroensis e Araucarites minimus) e polens isolados (Callialasporites) ou ainda incluídos nos estróbilos (Araucariacites). As formas de Araucariacites descritas por Archangelsky (1994) permitiram o exame ultramicroscópico e mostram o caráter granular da sexina, a presença de pilares de esporopolenina e nexina lamelar. O estudo da anatomia da epiderme permitiu associar estes fósseis com a secção Eutacta de Araucaria (Del Fueyo 1991, Archangelsky et al. 1995). Mostram, contudo, papilas, um caráter mais típico das Cycadaceae, que de Araucaria moderna, segundo Stockey e Ko (1986). Níveis contemporâneos na área de Bajo Grande contêm numerosas escamas ovulíferas atribuídas a Araucarites baqueroense (Archangelsky 1966), folhas de Brachyphyllum baqueroense e cutículas de cicadáceas (Pseudoctenis ornata). Estão incluídos nas fácies de planícies de inundação de um sistema de rios braided, submetido a ocasionais quedas de cinzas (Archangelsky et al. 1995). Outros restos de mesma idade em Ticó forneceram quatro formas de folhas de Brachyphyllum (B. bretti, B. mucronatum, B. mirandai e B. irregulare), mas com dimensões e disposição dos estômatos distintas dos primeiros. As impressões de folhas atribuídas a Araucaria grandifolia por Feruglio (1951) provêm desta mesma bacia (Archangelsky 1966, Baldoni e Archangelsky 1983). No lado oposto do Gondwana, as formas de Eutacta chegam a Nova Zelândia, (Stockey 1982, Hill 1994) e, entre os macrofósseis, pela primeira vez existem registros seguros da presença da secção Intermedia, pelas características epidérmicas de Araucarites haastii (White 1994, Hill 1994). Pole (1995) também cita a presença de folhas de Araucaria para o Neocretáceo de Otago. Na Austrália o registro de idade Albiano e em áreas do sudeste (Bacias Laura, Otway e Eromanga) mostra a presença de ramos de Brachyphyllum (White 1990) e maior afinidade com Eutacta (Drinnan e Chambers 1986, Florin 1963, Stockey 1982, Hill 1995). Para Hill (1994) o gênero forma Podozomites, bastante freqüente neste continente, poderia estar relacionado com Agathis. Na Bacia Gippsland, formada durante a separação Austrália-Antártica no início do Cretáceo, as macrofitocenoses mostram o domínio das coníferas (Flora Pagiophyllum-Reinitsia), com abundantes ramos e folhas de Pagiophyllum, Elatocladus, Brachyphyllum e pteridospermas (Tosolini et al. 1998). Os sedimentitos
de idade Barremiano-Aptiano sugerem ambientes fluviais de grande energia que, gradativamente, dão lugar à fácies de canais, com rompimento dos levees e planícies de inundação. O tamanho pequeno das folhas, quando comparadas as de outras assembléias da mesma época, indica que as temperaturas eram menores neste setor do Gondwana situado, provavelmente, a mais de 70 oS. Ao longo do Cretáceo, pelo sul da Austrália (Dettmann 1994, Vakhrameev 1991) e, como vimos, provavelmente também, através da América do Sul, chegam até a Península Antártica (Figura 5A). A microflora deste último continente mostra a presença de Araucaricites australis Cookson 1947, associado em alguns locais, a folhas de Brachyphyllum irregulare Archangelsky 1966, a mesma forma identificada para o início do Cretáceo na Bacia de Santa Cruz. Podozamites, Podocarpaceae, angiospermas primitivas e Nothofagus também estão presentes (White 1994, Dutra 1997). A presença conjunta de Balmeiopsis limbata (Balme) Archangelsky, 1979 permite precisar a idade, já que é fóssil índice do Neobarremiano–Conaciano para todo o Gondwana (Dettmann 1989), tendo sido identificado igualmente em furos de sondagem (Furo 361 do Deep Sea Drilling Project) na costa sudoeste da África (Zavada 1992). Embora associado a Podocarpaceae por Archangelsky (1966), alguns autores defendem sua associação com as Araucariaceae como, por exemplo, Batten e Dutta (1997). As angiospermas irão chegar na Península um pouco depois, no Albiano Superior (Cantrill e Nichols 1996). Para Dettmann (1989) as formas modernas de araucária e podocarpáceas que hoje vivem em condições temperadas quentes, junto com angiospermas, tais como, Proteaceae, Winteraceae, Ilex, Gunnera, Myrtaceae e, algumas criptógamas, teriam tido sua origem na Antártica no final do Cretáceo. A composição das paleofloras do norte da Península Antártica para o final do Cretáceo, e especialmente para o Terciário basal (Dutra 1997, Dutra 2001), atesta positivamente esta proposição ou, pelo menos indica, que utilizaram estas terras austrais como rotas de dispersão através das áreas emersas da Província Weddellinana. A chegada ao Ártico (72 oN de latitude) no Cretáceo médio pode ter ocorrido através da Índia e/ou Ásia oriental onde já existiam desde o final do Jurássico e está registrada no nordeste da Rússia (Spicer et al. 2002). A paleoflora já mostra um domínio de angiospermas e sugere um crescimento sob temperaturas médias anuais de cerca de 13oC (5 oC nos meses mais frios). As litologias demonstram a presença de vulcões próximos e um contexto fluvial, com os rios sujeitos a extravasamento periódico. As Araucárias caracterizam as fácies de canal e de planícies de inundações e estão representadas por cones femininos e masculinos (Araucarites), conectadas a ramos não espiralados, distintos das formas modernas. Atribuídos a Araucarites anadyrensis Krysht provém dos níveis finais da sucessão, onde surgem evidências de ressecamento. Para o Cretáceo Superior, a grande novidade evolutiva é o aparecimento de Wollemia. O gênero é registrado no Turoniano do sudeste da Austrália, numa área que coincide com a de seu crescimento moderno (Macphail et al. 1991). Logo depois surge também na Antártica e Nova Zelândia (Kershaw e Wagstaff 2001). No continente australiano Araucaria e as Podocarpaceae primitivas irão declinar na parte final do Cretáceo, aparentemente pela chegada das angiospermas, especialmente de Nothofagus (Dettmann 1989). No Japão, o achado de folhas e órgãos reprodutivos levou Oshawa et al. (1995), a propor uma nova secção, Yezonia, para o gênero Araucaria, englobando apenas formas fósseis cujas características se aproximassem de A. vulgaris moderna. Esta secção não tem sido considerada em trabalhos mais recentes. O limite Cretáceo-Terciário e seus eventos de extinção estão bem documentados nas bacias argentinas e permitem acompanhar o comportamento das floras, em especial, das plantas com flores. A presente revisão apoia a proposta de Meyen (1987) de que as plantas ultrapassaram este momento sem sofrer grandes perdas ou alterar sua composição. Abaixo das paleolatitudes de 41 oS e abrangendo a América do Sul meridional e Península Antártica, as Araucariaceae comporão assembléias muito similares. Exibem, no entanto, o diacronismo de ocorrência que foi sugerido por Askin (1989). Enquanto grupos de angiospermas mais adaptadas ao frio, especialmente Nothofagus, são precocemente registrados na Península, em relação a América, as Araucárias tem um comportamento inverso, chegando às altas latitudes e aparecendo na macroflora, após o final do Mesozóico, quando se encerra o pequeno intervalo de frio que caracterizou o final do Cretáceo Superior nestas latitudes (Dutra 1997 e 2000a, Dutra e Stranz 1999, Dutra e Batten 2000). Um pouco antes (Maastrichtiano) o globo passava por um período de nível de mar alto e, em Mendoza (36oS), uma microflora indicativa da proximidade de corpos de água é registrada. Proveniente da Formação Loncoche, denuncia a presença de abundantes briófitas e pteridófitas (Dicksoniaceae e Cyatheaceae), associadas a raras Ephedraceae, Podocarpaceae, Araucariaceae (Araucariacites australis, Callialasporites trilobatus) e Cheirolepidiaceae (Classopollis) e as angiospermas Nothofagaceae (Nothofagidites rocaensis), Proteaceae, Gunneraceae, Proteaceae, Olacaceae e Liliaceae/Iridaceae. Para Papú
(2000) viviam sob clima sub-tropical a temperado úmido, com uma estação seca, e as coníferas deviam estar associadas às áreas altas. Ambientes lacustres e rios meandrantes dariam lugar lateralmente a pântanos costeiros e planícies de inundação. A. australis é igualmente registrado a oeste de Chubut (Paso del Sapo), segundo Baldoni e Askin (1993). O final do Cretáceo será caracterizado pelo provincianismo das floras e por uma acentuada diversificação das coníferas no Hemisfério Sul (Meyen 1987, Upchurch 1989). Nas latitudes acima de 40oS, contudo, o episódio de frio já comentado, provocou uma momentânea redução de Araucariaceae, apoiando seu caráter mais termofílico. 4. Terciário Em vários setores do Gondwana o início do Terciário será marcado por um novo incremento no registro, tanto entre os polens, como nos macrofósseis. Os três gêneros modernos da família já estão estabelecidos neste momento. Wollemia e Agathis irão manter-se como formas exclusivas para o Gondwana oriental. Paleoceno A abertura do Atlântico irá individualizar no Gondwana, um setor oriental e um ocidental, mantidos ligados, contudo, através da costa da Antártica, o que garantia as rotas de passagem entre a Australásia e a América do Sul. Araucaria sect. Columbea mostrará a distribuição mais ampla, sendo encontrada desde a Austrália (A. balcombensis de Hill 1994), passando pela Antártica (A. imponens Dusén 1908 e escamas ovulíferas na Península, registradas por Dutra 1997) e chegando a América do Sul, onde Araucaria nathorstii Dusén (Menendez e Caccavari 1966), foi considerada por Stockey e Ko (1986) como indubitavelmente ligada à espécie A. araucana. É registrada ainda nas ilhas Kerguelen em uma época não bem determinada do Terciário, demostrando a ligação pretérita deste arquipélago com a periferia da Antártica (Cookson 1947). Também Eutacta, hoje restrita ao setor oriental, é encontrada em todo o território austral-antártico durante o Terciário (Florin 1940, Hill 1994). A morfologia da epiderme de Araucaria lignitici (Cookson e Duigan 1951) do sudeste da Austrália, confirma sua afinidade com esta secção (Stockey e Ko 1986). A presença na Antártica sugere fortemente a participação das áreas periféricas deste continente na dispersão destes elementos (Hill 1994). O gênero Agathis é registrado no sul da Austrália por Macphail et al. (1991) e White (1994), acompanhado de Araucaria e de Podocarpaceae. No limite com o Eoceno, o aumento global das temperaturas promove uma nova migração das coníferas para sul (Meyen 1987), testemunhado pela ausência das Araucariaceae em depósitos situados acima de 30oS na América do Sul e seu incremento no registro das bacias de Neuquén, Patagônia e Península Antártica. Na Patagônia, Araucaria araucoensis Engelhardt associa-se a Nothofagus, Podocarpáceas, Cycadaceae e angiospermas subtropicais, tais como Casuarina, Cupania, Beauprea, Myrtaceae, Santalum, Nypa e Banksia (Berry 1924). Na Península Antártica, os palinomorfos Araucariacites, Podocarpites e Phyllocladidites ocorrem em níveis correlacionáveis aos portadores de uma macroflora composta por elementos com folhas grandes (Nothofagus com folhas de até 12 cm de comprimento), lauráceas (Nectandra spp.), Elaeocarpaceae, Sapindaceae, tipos similares às modernas Monimiaceae e Rhamnaceae e, Myrtaceae de ambas as secções modernas (Dutra 1997, 2000b, 2001). Podocarpaceae e Cupressaceae são as coníferas dominantes e as Araucariaceae aparecem pela primeira vez na macroflora (Dutra 1997, Boardman 2003). Para Meyen (1987) estas assembléias sugerem florestas úmidas que viviam sob um clima uniforme, quente e úmido do tipo subtropical a temperado quente e que se estenderá por grande parte do Eoceno. Eoceno A ligação por terra entre as duas Américas e a presença de extensas áreas planas fará com que elementos austrais invadam o sul dos Estados Unidos e permaneçam aí até o Mioceno, quando as rotas se invertem e elementos setentrionais migram para o sul (Meyen 1987).
Áreas elevadas criadas pela Orogenia Laramiana e o início do soerguimento dos Andes, propiciam a formação de zonas de sombra de chuva (rain shadow) e o aparecimento das primeiras paisagens de savana, no flanco oriental do continente americano. Em ambos os lados da Península Antártica as coníferas irão se tornar ainda mais abundantes, com muitos e variados tipos de Podocarpaceae (Podocarpus, Phyllocladus, Dacrydium, Microcachrys), Cupressaceae e Araucaria sect. Columbea e Eutacta (Vakhrameev 1991, Dutra 1997, Boardman 2003), associadas a Nothofagus de folhas grandes e afinidades termofílicas, Winteraceae, Proteaceae (Grevillea, Banksia e Beauprea) e pteridófitas arborescentes do grupo das Cyatheaceae e Lophosoriaceae (Meyen 1987, Case 1988, Dutra 1997 e 2000b). Para o Continente, Pole et al., (2000) descrevem os restos mais austrais de folhas de Araucaria (e os mais antigos na área), em blocos “ex situ” coletados a 78 oS de latitude, acompanhados de folhas e sementes de Nothofagus. Nas latitudes médias as Araucariaceae são as coníferas dominantes nas bacias argentinas, acompanhadas de Podocarpaceae e angiospermas. A Flora do Rio Pichileufú, na Província de Rio Negro (Berry 1938, Romero e Arguijo 1981) evidencia, além disso, muitas pteridófitas, Cycadaceae, Ginkgo, Cupressaceae, Podocarpus e angiospermas de famílias similares as que hoje acompanham Araucaria nas floras do sul do Brasil (Anacardiaceae, Bignoniaceae, Flacourtiaceae, Euphorbiaceae, Lauraceae, Myrtaceae, Sapindaceae, Winteraceae, etc.), sugerindo um clima subtropical. As Araucariaceae (Araucariacites australis), Cupressaceae e Podocarpaceae compõem também parte da variada microflora da Formação Rio Turbio, em Santa Cruz, um pouco mais ao sul (Romero 1977, Barreda 1997). Mesclam-se a formas setentrionais (tropicais e neotropicais) sugestivas de climas quentes e úmidos e ambientes costeiros, tais como, palmeiras, Myrtaceae, Anacardiaceae, Symplocaceae, Gramíneas, Chenopidiaceae, lianas, trepadeiras e pteridófitas epifíticas e a grupos austral-antárticos, como Nothofagus, Saxegothopsis, Embotriophyllum e Rhoophyllum originando floras “mistas” muito diversificadas. Na Austrália, a base do Eoceno é igualmente marcada por um grande influxo de Araucariaceae nas assembléias polínicas, graças principalmente, à presença de Wollemia e Agathis (Meyen 1987, Macphail et al. 1991). Associam-se a uma igual diversidade de tipos angiospérmicos, indicativos de florestas úmidas. Araucaria sect. Eutacta (3 spp.) foi identificada também no Eoceno Inferior da Tasmania (Carpenter 1991), com Cupressaceae e Podocarpaceae. As floras “mistas” ou “de mescla” de Romero (1978) ou as Mixed Flora dos australianos (Schmithüssen 1966) irão caracterizar, portanto, o Eoceno, nas latitudes abaixo dos 40oS e em ambos os lados do Gondwana, estendendo-se até a Nova Guiné e Nova Zelândia (Pole 1994a e 1994b). Seu caráter misto vem da reunião de taxa de diferentes origens e condicionamento climático, com Cochlospermum e Zamia (subtropicais) e Drimys, Podocarpaceae, Cupressaceae, Laurelia, Myrcia e Lomatia (sub-antárticos). Sua semelhança com as florestas mistas de pinheiros no sul do Brasil (Rambo 1951) e o caráter relictual deste bioma e das floras neozelandesas e de Valdívia no Chile, não parece ser, portanto, uma simples coincidência, mas sugere uma origem comum para muitos de seus elementos. No Hemisfério Norte, uma última assembléia, identificada no Eoceno Superior da Alemanha, mostra Araucariaceae associadas com briófitas, pteridófitas, Pinaceae e angiospermas de folhas grandes, coriáceas e margens inteiras (Myrtaceae, Juglundaceae, Ericaceae, Euphorbiaceae, Betulaceae, Ulmaceae e palmeiras), indicando igualmente um clima quente e úmido, subtropical (Knobloch e Konzaliová 1998). No sul, a tafoflora de Rio de Las Minas, na Terra do Fogo (abaixo dos 50oS), com idade no limite Eoceno–Oligoceno, ainda contém algumas araucárias entre os macrofósseis (A. nathorsti, com ligações com A. araucana). Mas as raras Podocarpaceae, Nothofagus e Proteaceae já sugerem os climas temperados frios que daí em diante se instalariam (Dusén 1908, Meyen 1987). Oligoceno É o momento da definitiva separação entre Antártica e Austrália, o que irá modificar a circulação oceânica no sul, resfriar as águas e, prenunciar a Corrente Circum-Antártica. No extremo sul das Américas, as última massas de terra que ainda mantém as antigas ligações gondwânicas, também iniciam os esforços que irão promover seu desligamento da Península Antártica (Lawer et al. 1985, Cunhingham et al. 1995). A gradativa interrupção das rotas de passagem faz com que as floras da Península tornem-se empobrecidas, com poucos elementos de folhas microfilas e de margens denteadas e que, até o final do Oligoceno, irão desaparecer. As coníferas estarão ausentes entre os macrofósseis mas permanecem no registro polínico (Dutra 1997 e 2001).
A
B
C
Figura 5 - Distribuição paleogeográfica das Araucariaceae. A - Cretáceo-Terciário; B - Eoceno; C - Oligoceno-Mioceno quando a Antártica é coberta pelo gelo. As linhas tracejadas representam o limite das faixas de aridez (Fonte dos dados do registro no texto).
Nas médias latitudes as condições climáticas tornam-se instáveis e marcadas por seca estacional, reduzindo igualmente a diversidade das Araucariaceae (Figura 5C). Nos trópicos as florestas serão substituídas pelas áreas de savana e, mais tarde, darão lugar a formações xeromórficas, com Ephedraceae, Artemisia, Chenopodiaceae e Tamaricaceae (Meyen 1987). O soerguimento dos Andes aumentará ainda mais a aridez. Embora as condições melhorem ao longo do período, um novo intervalo de frio, no limite com o Mioceno, magnificará as mudanças paleoflorísticas e das faunas. Em Santa Cruz e Chubut, na Argentina, a palinoflora mostra a composição das matas. Araucaria associa-se a Podocarpaceae, Myrtaceae, Proteaceae, Winteraceae, Nothofagaceae e fetos arborescentes (Cyatheaceae e Lophosoria quadripinata), sugerindo bosques úmidos. A presença associada de Nyssaceae e Sapindaceae apoia condições temperadas quentes. Segundo Barreda (1997) esta mistura de formas indicativas de frio e calor indicaria a presença de áreas altas a oeste e múltiplos ambientes, em muito semelhantes aos que já vinham caracterizando previamente as áreas da Península Antártica, submetidas precocemente ao tectonismo. As floras da América austral neste momento se parecem com as que existiam no Paleoceno e Eoceno da Antártica (Dutra 2001). O registro atesta que as Palmaceae, Onagraceae, Halogariaceae, Gunneraceae, Salicaceae e Escallonia cresciam em torno dos corpos lacustres, Malvaceae nos marismas e Chenopodiaceae, Ephedra, Restionaceae e Sparganiaceae junto aos pântanos. As áreas elevadas mais distantes seriam cobertas por matas de Araucária e outras coníferas. Estes dados discordam do proposto por Troncoso e Romero (1998), que sugerem a adaptação das araucárias às áreas altas como tendo ocorrido somente no Quaternário. Na Austrália, o deslocamento do continente para latitudes mais baixas irá magnificar os efeitos da seca. Agathis irá sentir profundamente estas mudanças, diminuindo sua representação na microflora até desaparecer no sul (Hill e Brodribb 1999). Já Araucaria tem um incremento e coincide com áreas instáveis (Hill 1990). Formas de Columbea (A. hastiensis) ainda ocorrem na Tasmânia e Eutacta mostra uma variação e quantidade comparável a que hoje possui na Nova Caledônia, indicando climas semelhantes para a época (Carpenter et al. 1994). Na Nova Zelândia, associam-se a Nothofagus (White 1994). Mioceno A colisão da Índia com o sul da Eurásia, no início do período, provoca o fechamento do Mar de Tethys, o isolamento definitivo entre o Pacífico e o Atlântico e o soerguimento dos Alpes Europeus e da Cordilheira do Himalaia. Um cinturão de aridez, como conseqüência, irá marcar os ambientes no interior da Ásia. Na parte média do período, o globo será marcado por climas mais amenos. Um novo intervalo de frio intenso, o mais drástico em todo o Terciário, marcará o final do período, originando grandes extensões de terras geladas no Hemisfério Norte (Scotese 2000). Provocará um pronunciado rebaixamento do nível dos mares que, ao mesmo tempo que isola o Mediterrâneo e o Atlântico, unirá muitas massas de terra que ficam emersas (Ásia oriental, América do Norte e do Sul), criando inúmeras rotas de passagem, aproveitadas, inclusive, pelas formas humanas primitivas. A ligação pela América Central, interrompida desde a parte média do Mesozóico, será refeita e permitirá movimentos migratórios e de dispersão de grande efeito sobre a vida (Meyen 1987). As Matas com Araucária sentirão os efeitos da seca e reduzem-se ou ficam confinadas às latitudes austrais. Em muitas partes do mundo, as florestas úmidas serão substituídas pelas paisagens abertas (savanas, pradarias e estepes), causando extinção ou mudança em muitos grupos de mamíferos. Na Austrália, com grande parte de seu território já contido em latitudes tropicais pelo gradativo afastamento da Antártica, os grupos de coníferas que sobreviveram, migram do sul para o norte (Bowler 1982, White 1990 e 1994, Kersahw et al. 1991). Surgem as primeiras evidências da presença de fogo. Agathis aparece no sudeste (Latrobe Valley) na parte basal do período (Carpenter e Pole 1995) e em depósitos de carvão do sul, junto com Dacrycarpus, Lauraceae, Myrtaceae, Cunoniaceae e Proteaceae (Hill 1994). Gradativamente será substituída por Araucaria sect. Eutacta (Kersahw e Wagstaff 2001), uma forma abundante tanto nos macro, como nos microfósseis do sul da Austrália e Tasmânia, acompanhada de Cupressaceae, Podocarpaceae e angiospermas de folhas pequenas. Nothofagus de folhas microfilas e com margens inteiras, já muito semelhantes as dos modernos representantes, domina as assembléias. O conjunto indica umidade e frio (White 1994, Macphail et al. 1994, Hill 1994).
Na América do Sul o registro de Araucaria só é conhecido para as bacias da Argentina, desde Mendoza (32oS) até Santa Fé, mais ao norte (Anzótegui e Garrala 1986). As paleoassembléias sugerem a presença de florestas compostas por muitas coníferas, acompanhadas de pteridófitas (Dicksonia), Ilex, Lithrea brasilensis (Anacardiaceae), Ericaceae e Gramíneas, que cresciam entre as elevações iniciais que originaram os Andes e os numerosos ambientes costeiros criados pelo nível de mar alto que caracterizou o Mioceno médio. Estas formações florestais devem ter tido um importante papel na moderna distribuição de Araucariaceae na América do Sul. Podem estar aí os elementos que permitiram ao gênero sobreviver aos episódios de frio e originar as populações disjuntas de A. araucana e A. angustifolia. As Sierras de Córdoba dividem ainda hoje as áreas do oeste argentino e Chile Central e o sul do Brasil e podem ter sido um dos refúgios utilizados durante as fases de menor umidade e frio que se seguiriam até o final do período. A reconquista dos ambientes pode ter ocorrido através das paisagens de campo recém formadas e dos grandes sistemas fluviais, quando do retorno das chuvas e do calor, no início do Plioceno. A avaliação deste processo é dificultada, no entanto, pela escassa presença de níveis com fósseis em território brasileiro. Plioceno O início do período é caracterizado por climas favoráveis e umidade e, nas Américas, pela migração de taxas setentrionais para o sul, originando o Reino Neotropical. Juglans, Alnus, Quercus, Berberidaceae, Caprifoliaceae, Myricaceae e Rosaceae aparecem na Venezuela e Colombia (Meyen 1987). O calor irá provocar uma nova elevação do nível dos mares. Na Argentina, assembléias polínicas em Bahia Blanca, no litoral, atestam a presença de 22 espécies de fungos, acritarcas e dinoflagelados, Nothofagus tipo dombeyi, gramíneas e compostas. A única gimnosperma é Ephedra. No espectro de distribuição temporal, o declínio das florestas para o topo, coincide com o aumento das gramíneas (Guerstein e Quattrocchio 1984). Condições semelhantes são sugeridas para a Província de Buenos Aires onde, no final do Terciário, os estratos arbóreos eram compostos apenas por Myrtaceae, Dacrydium e Podocarpus (Fm. Chasicó). Definitivamente isolada e coberta pelo gelo, a Antártica mantém, no entanto, algumas florestas empobrecidas de Nothofagus e Podocarpaceae, em vales protegidos nas montanhas Transantárticas (Askin e Markgraf 1986, Calrquist 1987). Na Austrália as coníferas se mantêm entre os polens, especialmente nos depósitos de zonas costeiras ou sub-costeiras da parte oriental, atingindo sua maior expressão conhecida para o Cenozóico (Kersahw e Wagstaff 2001). Quaternário As oscilações climáticas que marcaram o final do Terciário irão se manter no Quaternário, embora com intervalos de frio menos duradouros e pronunciados. Para seu acompanhamento, as Araucariaceae serão extremamente úteis, graças a já vista sensibilidade e resistência à instabilidade. É neste momento que se estabelece a maior afinidade destas coníferas, com as áreas do Gondwana Oriental (Australásia) e sua gradativa redução na América. Na Austrália mantém taxas baixas, mas constantes, de presença entre os polens das áreas do sudeste durante todo o Pleistoceno (Kersahw e Wagstaff 2001). No norte, aparece entre os elementos das florestas úmidas dominadas por angiospermas dos interglaciais chuvosos, mas se mantém quando o frio e a seca cria as paisagens mais abertas (White 1994, Hope e Pask 1998), só declinando no sul no início do Holoceno. O decréscimo dos ambientes florestados foi inicialmente atribuído a presença do homem, que teria chegado a Austrália e Nova Zelândia há cerca de 1 000 anos. Dados de furos de sondagem na margem oceânica (ODP 820), no entanto, apontam uma eliminação gradativa, iniciada muito antes, em 250 000 AP, quando são registrados os primeiros sinais de fogo. Para as Araucariaceae, o primeiro sinal de declínio na diversidade teria ocorrido em 130 000 AP e posteriormente em 35 000, coincidente com a glaciação. A seca nestes intervalos teria incentivado o fogo e o avanço das matas de Eucalyptus. Para Kershaw e Wagstaff (2001), as oscilações do El Niño (ENSO), expresso como fases de seca na Australásia, podem estar envolvidas. Clement et al. (1999) afirmam que, embora observáveis em períodos de poucos anos, estas oscilações possuem também um efeito amplo, em escalas de milhares de anos. Este panorama desfavorável
pode ter sido a causa do desaparecimento de Araucaria nas latitudes mais altas da Austrrália e na Nova Zelândia (Kersahw e McGlone 1995). Na América do Sul, os bons índices de umidade na costa do Atlântico resultam da soma de uma série de fatores. A maior influência é dos ventos quentes e úmidos que sopram de noroeste (Zona de Convergência do Atlântico Sul - ZCAS ou Zona de Convergência Intertropical- ICZ) e seu choque com as frentes frias da Antártica (Behling et al. 2000), mas também atuam aí a umidade trazida pelo sistema de ventos alíseos (Easterlies) e, mais localmente, a produzida pelas brisas oceânicas. As áreas de seca do interior do continente seriam por seu turno, resultantes do papel exercido pela Cordilheira dos Andes, como barreira para os ventos de oeste, formando um X de aridez que começa na Patagönia, a leste e estende-se pelo Brasil, a oeste (Villagrán 1983). Este conjunto de fatores ainda não são bem compreendidos quanto a seu papel individual. Acima dos 30oS influenciam a presença da Floresta Ombrófila Mista com A. angustifolia (e da Mata Atlântica) na costa leste, produzindo ambientes caracterizados por umidade uniforme ao longo do ano e temperaturas que raramente caem abaixo de 0oC., Abaixo dos 30oS e a oeste, devem ser a causa do desenvolvimento das florestas Valdivianas e as com A. araucana, pela umidade trazida pelos contra-alíseos (Westerlies). Parte da distribuição desta última, contudo, se estende até a face oriental da Cordilheira dos Andes, em zona de sombra de chuva e, portanto, mais seca e fria (Figura 4), tornando-a o único representante moderno do gênero a crescer em regiões similares às que existiam ao longo do Mesozóico e no final do Terciário. É exclusiva também, na capacidade de suportar solos congelados, sugerindo que adaptações prévias à seca, podem estar sendo utilizadas hoje para enfrentar o rigor invernal. O registro do Quaternário brasileiro, apesar de proveniente de localidades esparsas, permite acompanhar a resposta das Araucárias às modificações do clima durante os últimos 50 000 anos. O registro na Amazônia inicia há cerca de 40 000 anos e as amostras (Lagoa das Patas, Lagoa da Curuça, Lago Crispim, Bragança Peninsula, Rio Curuá e Lago Calado) demonstram que Araucaria está ausente, mas que formas de Podocarpus viveram aí até 6 000 AP (uma espécie ainda vive nas montanhas de Roraima). O avanço das florestas de angiospermas nas áreas baixas ocorre durante os intervalos de frio (Colinvaux et al. 1996a, Behling 2002a e 2002b). Em Tocantins (Lagoa da Confusão), onde hoje está o limite entre a Floresta Amazônica e o Cerrado, o registro recua até 30 000 AP e, para este momento, uma vegetação aberta indicativa de clima seco. Gradativamente dá lugar a matas galeria e campos sujos (entre 27 e 14 000 AP). A melhora dos teores de umidade inicia há 5.500 anos e faz retornar a cobertura florestal (Behling 2002b). Testemunhos no Maranhão (Lagoa do Aquiri) mostram que a vegetação está presente no intervalo amostrado (entre 30 000 e 7 450 AP) e que foi capaz de acompanhar as variações do nível do mar e do clima. Nos períodos favoráveis compunha uma savana pantanosa com Ilex, Mauritia, Luehea, Araliaceae, Sapindaceae, Sterculiaceae, sem Araucaria (Behling e Da Costa 1997). As áreas do nordeste, hoje habitadas por palmeiras e florestas semi-deciduais, eram cobertas há cerca de 11 000 anos por uma mata pluvial densa (Zyziphus, Anacardiaceae, Apocinaceae, Bignoniaceae, Cassia, Euphorbiaceae, Melastomataceae, Mimosaceae, Myrtaceae, Sapindaceae e Tabebuia) e que incluía elementos de altitude, indicando um clima úmido e temperaturas menos aquecidas. Seráo substituídas por Mauritia e, logo após, pela chegada dos taxa de caatinga e cerrado. A aridez aumenta a 4 000 anos atrás (De Oliveira et al. 1999). Em Lago do Pires, Minas Gerais, os testemunhos mostram episódios de queimadas nos últimos 10 000 anos (Behling 1995) e, mais uma vez, a ausência de Araucaria. Esta irá aparecer pela primeira vez nos furos realizados em uma região elevada do sudeste (Catas Altas) e em Botucatú, São Paulo, hoje cobertas por matas semi-decíduas e cerrado. Entre 48 000 e 18 000 AP, o clima era frio e seco e a vegetação era formada por campos e matas galeria, similares aos que hoje existem no planalto Sul-riograndense (com Araucaria, Podocarpus, Drimys, Ilex e Symplocos), sujeitas a incêndios. Estes dados sugerem que as florestas migraram durante este período, caracterizado por quedas nas temperaturas (cerca de 5 a 7 o menores que as atuais), desde os 28 oS até os 20oS (Behling e Lichte 1997). Os primeiros sinais da atividade humana, com derrubada da floresta e culturas de milho e mandioca, iniciam aí, há cerca de 3 000 anos. Para as áreas centrais do Brasil, Ledru (2002) sugere a presença de Araucária há 40 000 atrás, seu desaparecimento durante o último glacial (entre 20.000–18.000 AP) e um retorno entre 16.000 e 10.000 anos AP, com freqüências variáveis até a reconquista dos ambientes. Atinge a distribuição moderna em 2 500 AP. Estudos em Goiânia (GO), Salitre (MG) e Rio Claro (SP), evidenciaram um clima quente e úmido para cerca de 30 000 anos atrás, seguido de um intervalo de seca e frio (17 000 a 14 000 anos) e o aparecimento de Araucária há 12 000 anos. O pinheiro desaparece em um intervalo subseqüente de seca e frio e ressurge no início do Holoceno, com o retorno da umidade (Ledru 1992 e 1993, Ledru et al. 1994).
Durante o último glacial (Würm), os polens mostram a ausência de Araucária, tanto nas zonas elevadas de Campos do Jordão onde hoje cresce, como nas terras baixas voltadas para o Atlântico, uma condição que irá se manter mesmo no início do Holoceno quando voltam as temperaturas mais amenas. A presença de uma corrente de ar quente continental e tropical bloqueava a chegada das frentes frias do sul diminuindo o índice pluviométrico (Behling 1993). As florestas só retomarão os espaços e se aproximam de sua distribuição moderna, a partir dos últimos 3.000 anos, quando um intervalo de frio e umidade irá patrocinar o avanço dos pinheiros a partir das matas galeria (Behling 1995). No Paraná (Serra Campos Gerais) Araucaria só é registrada nos últimos mil anos, associada a Cyperaceae, Weinmannia, Alchornea e Myrsine e poucas Poaceae (Behling 1997b). Entre 15 e 11 000 AP, as baixas temperaturas provocaram que as áreas altas da costa, onde hoje vive a Araucária, fossem cobertas por campos. O pinheiro permanecerá restrito aos vales protegidos (como em Catas Altas). Behling (1997a) propõem que as florestas tropicais que hoje habitam o norte de Santa Catarina, com Arecaceae e Alchornea, já tiveram um caráter subtropical e indicativo de maior frio, com grande número de Myrtaceae. A Mata Atlântica (Atlantic rain forest) e a mata nebular deviam ser mais restritas e ausentes das áreas entre a Serra do Mar e a da Mantiqueira onde hoje crescem. Entre 35.000 e 27.500 anos AP, áreas de campo e fragmentos de mata adaptados ao frio (sem Araucária) e turfeiras se desenvolviam na região (Behling e Negrelle 2001). Há 12 000 anos são substituídas por matas pouco diversificadas e em 6 000 AP, com o aumento da umidade e a elevação do nível do mar, a Mata Atlântica se instala e aparecem Araucaria e Podocarpus (Behling 1997a). Para o limite Pleistoceno–Holoceno em Santa Catarina, amostras de turfeira retiradas de zonas elevadas, evidenciaram igualmente uma paisagem dominada pelos campos e raras Araucárias restritas aos vales, acompanhada de Drimys, Aquifoliaceae e Weinmannia (Behling 1993, Behling 1995a, Behling 1997a). A partir daí iniciam sua expansão, até que, há cerca de 1 000 anos estão plenamente desenvolvidas (1 500 anos AP, no Paraná). Behling (1997b) e Kersahw e Waggstaff (2001) não concordam com Colinvaux et al. (1996b) quando afirmam que as Araucariaceae teriam se expandido para o norte durante as fases glaciais, a não ser junto às drenagens dos locais protegidos e com bom suprimento de umidade. O acompanhamento do registro quaternário apoia as propostas vistas no início deste trabalho, sobre o caráter natural e relictual das amplas áreas de campo que hoje cobrem uma parte significativa do sul do Brasil e o caráter de expansão do pinheiro sobre estas áreas, em tempos imediatamente anteriores ao atual. Conclusão O exame do registro fóssil das modernas coníferas, entre elas as Araucariaceae, sugere que as condições propícias para seu aparecimento criaram-se após a grande extinção do final do Permo-Triássico. A união dos continentes formando o Pangea propiciou o aparecimento de grandes cinturões de aridez, cercados por estreitas, mas importantes, áreas subtropicais, onde alguma condição de umidade existia, especialmente na borda dos continentes. As áreas elevadas recém criadas propiciaram a diversificação dos nichos e o aparecimento de grandes sistemas fluviais que patrocinaram o desenvolvimento do grupo, substituindo a flora de Dicroidium e outras pteridospermas, habitantes dos corpos d'água das terras baixas e planícies de inundação. A intensificação dos eventos tectônicos, no início do Jurássico, criando ambientes instáveis e solos desnudados, continuou a favorecer as coníferas, cujo levantamento aqui realizado demonstram ter uma grande capacidade de adaptação ao estresse e aos solos finos que normalmente resultam do rejuvenescimento do relevo. Assim, são exclusivas em unir aspectos encontrados em indivíduos cestrategistas, denunciado por sua boa competitividade, tamanho grande e vida longa, àqueles de comportamento s-estrategista, com boa tolerância ao estresse ou pressão ambiental. Veblen (1982) caracterizou-as como indivíduos que utilizam uma estratágia de equilíbrio, onde sua longevidade garante a sobrevivência a longo prazo. Entre os gêneros modernos, Araucaria reúne o registro mais antigo, apesar de como vimos, as propostas filogenéticas apontarem Wollemia como precedendo a diferenciação entre Agathis e Araucaria. O registro daquele gênero apenas em níveis posteriores ao Cretáceo e sua restrita distribuição moderna não parecem apoiar esta hipótese. Tipos com características das secções Eutacta e Bunya do gênero Araucaria estão entre os mais antigos fósseis, e, para muitos pesquisadores, as formas putativas mostrariam preferencialmente caracteres
presentes em Bunya. Assim, a presença de dois cotilédones representaria o caráter ancestral, seguido de formas com quatro cotilédones. Já a posição terminal ou axial do cone masculino, esteve presente muitas vezes e de forma alternada, entre os fósseis da família. Após sua origem no início do Jurássico, Eustacta se distribui amplamente e em ambos os hemisférios, enquanto Bunya, abundante no Mesozóico e com um fraco registro no Terciário, se restringirá a uma única espécie moderna (A. bidwilli). Esta distribuição sugere a ausência de relações entre o estoque primitivo desta secção e a forma viva atual. As outras duas secções, Columbea e Intermedia, também irão se expandir durante o Mesozóico, especialmente no lado americano do Gondwana. Agathis, cujo mais antigo registro conhecido data somente do final do Cretáceo, mostra também uma menor variação genética e morfológica, sugerindo que os processos de especiação neste grupo sejam recentes e nas áreas do sudeste do Pacífico. A primeira fase de diversificação e especiação é interrompida no início do Cretáceo, quando incia a fragmentação do Gondwana e as angispermas aparecem como invasoras oportunistas dos ambientes costeiros e terras baixas. A resposta das coníferas austrais será uma maior especialização para a vida em zonas menos favoráveis (maior frio, seca ou solos menos próprios) o que lhes garantiu a diversidade, mas restringiu a quantidade e área de abrangência. No Cenozóico, um novo pico de irradiação ocorre no Eoceno, uma fase caracterizada por calor e chuvas abundantes, o que estende sua ocorrência até a Antártica. Data daí sua associação preferencial com as florestas pluviais, as áreas um pouco mais elevadas e a borda dos continentes submetidas a clima oceânico. A grande diversidade de nichos resultantes da criação de novos continentes, cadeias de montanhas e oceanos propiciou o aparecimento de formações vegetais de caráter “misto”, termo igualmente empregado para seus biomas modernos, respectivamente por Rambo (1951) e Schmithüssen (1966). Embora afastadas no tempo por cerca de 40 milhões de anos, estas floras guardam grandes semelhanças. Hoje os representantes de Araucariaceae distribuem-se em grande parte junto a áreas elevadas e bem iluminadas, submetidas a um tectonismo ativo e dotadas de solos de pequena espessura, litólicos e ácidos, em zonas de clima oceânico mesotérmico, das latitudes sub-tropicais a tropicais. Os sistemas de ventos alíseos e contra-alíseos e das frentes polares, aos quais se superimpõem os efeitos do El Niño e da Convergência do Atlântico Sul, concentrando bons teores de umidade no sul do Brasil e oeste chileno, parece ter grande efeito sobre sua distribuição na América do Sul. Para seu desenvolvimento são ainda importantes as costas voltadas para o oceano, onde os altos topográficos retem a umidade, razão provável para sua grande diversidade moderna nas ilhas do Pacífico. A idéia subjacente à moderna fitogeografia, da associação das coníferas aos climas frios, não é válida, portanto, para as Araucariaceae, com excessão, talvez, da forma chilena A. araucana (Kershaw e Wagstaff 2001), de distribuição temperada. Os parâmetros vistos e a longa história geológica mostram o valor que as formas associadas à família possuem na avaliação do clima e da geografia pretéritas, tornando seu estudo especialmente valioso para geólogos e paleobotânicos. Mesmo quando sua resposta aos ambientes reflete um processo localizado e regional, se associada a outros parâmetros mais globais, permite o refinamento dos dados. Por outro lado, o exame do registro pode ser útil àqueles que almejam compreender seu moderno comportamento e garantir sua conservação. Mostra que possuíram sempre uma dinâmica própria e uma resposta aos momentos de desequilíbrio, refugiando-se nas áreas mais protegidas, onde sobreviveram a muitos eventos catastróficos. Garantida a proteção de seus biomas, serão capazes de manter-se e expandir reconquistando as áreas, num constante processo de evolução sucessional, raramente atingindo um “clímax”, conceito hoje tão discutível. Sua marcada resiliência aos episódios catastróficos, aos efeitos das mudanças ambientais e às pragas induzidas por animais, que garantiu sua persistência no tempo, comprovam sua aptidão para projetos de restauração. Enquanto as plantas com flores, em que pese sua rápida recuperação posterior, sofrem com estes eventos, elas sobrevivem com custos mínimos e poderão continuar a coexistir, como no passado, com os distintos grupos de plantas e suas novidades evolutivas. Referência Bibliográficas Anderson H.M., Anderson J.M. 1998a. The heyday of the gimnosperms: was it to be found in the Late Triassic? In Abstracts of Gonwana 10: Event Stratigraphy of Gondwana, Journal of African Earth Sciences, 27(1A): 5-6
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