110 IMPEDIMENTO, PERTURBAÇÃO OU FRAUDE DE CONCORRÊNCIA
_____________________________ 110.1
CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS
DO CRIME O art. 335 do Código Penal foi derrogado pelas normas dos arts. 93 e 95 da Lei nº 8.666/93, a Lei de Licitações, vigorando exclusivamente em relação à venda em hasta pública. Tratando-se de licitações, aplicam-se as normas dos arts. 93 e 95. Assim, o tipo do art. 335 deve ser assim compreendido: “Impedir, perturbar ou fraudar venda em hasta pública, promovida pela administração federal, estadual ou municipal, ou por entidade paraestatal; afastar ou procurar afastar concorrente ou licitante, por meio de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem.” A pena é detenção, de seis meses a dois anos, ou multa, além da pena correspondente à violência. O tipo do art. 93: “impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório”. A pena: detenção, de seis meses a dois anos, e multa. O tipo penal do art. 95: “afastar ou procurar afastar licitante, por meio de violência, grave ameaça ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo”. A pena é detenção, de dois a quatro anos, e multa, além da pena correspondente à violência. O bem jurídico protegido é a Administração Pública, a probidade, a moralidade e a seriedade dos seus procedimentos licitatórios ou das vendas em hasta pública. Sujeito ativo é qualquer pessoa. Sujeito passivo é o Estado e o licitante que sofrer prejuízo.
2 – Direito Penal III – Ney Moura Teles
110.2
TIPICIDADE
110.2.1
Impedimento, perturbação ou fraude de concorrência
O art. 93 incrimina as seguintes condutas: “impedir, perturbar ou fraudar” a realização de ato de procedimento licitatório. Impedir é não deixar que ocorra, é obstar desde o início, não permitindo que comece o ato. Perturbar é atrapalhar, conturbar, criar dificuldades, obstáculos, empecilhos. Fraudar é fazer surgir o erro ou engodo na realização do ato. As condutas dizem respeito a qualquer ato de procedimento licitatório promovido pela Administração Pública federal, estadual ou municipal, nos termos do que dispõe a Lei nº 8.666/93. Licitação é a disputa entre pessoas, físicas ou jurídicas, para a contratação de alienação e aquisição de bens ou a realização de obras ou serviços de interesse público. As mesmas condutas são incriminadas pelo art. 335 do Código Penal tendo como objeto a venda em hasta pública promovida pela Administração Pública, em qualquer dos níveis, federal, estadual ou municipal. A venda em hasta pública se faz através de leilão ou praça. O leilão feito por particulares não é alcançado pela norma. Crime doloso. O agente deve estar consciente de que impede, perturba ou frauda o ato do procedimento ou a venda em hasta pública, agindo com vontade livre, sem qualquer outra finalidade especial. Consuma-se no instante em que o ato da licitação ou a venda em hasta pública não se realiza, sofre a perturbação ou é fraudado. A tentativa é possível em qualquer das modalidades típicas.
110.2.2
Afastamento de licitante
O art. 95 da Lei nº 8.666/93 tipifica a conduta de quem afasta ou procura afastar licitante do procedimento licitatório. Afastar significa excluir, fazer com que o licitante deixe de participar da licitação ou dela se retire. Procurar afastar é tentar afastar. É a tentativa elevada a categoria de delito autônomo. Deve o agente atuar com o emprego de violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem. Violência é a força física, são as vias de fato ou as lesões
Impedimento, Perturbação ou Fraude de Concorrência - 3 corporais. A grave ameaça é a promessa da causação de um mal grave. Fraude é o engano, o engodo. É induzir ou manter o licitante numa situação de erro. O último meio de execução do delito é através do oferecimento de vantagem de qualquer natureza, moral ou patrimonial. As mesmas condutas são incriminadas no art. 335 do Código Penal quando o agente afasta ou procura afastar a pessoa do procedimento da venda em hasta pública. O crime é doloso. O agente deve realizar a conduta com consciência e vontade livre de afastar o licitante do procedimento licitatório ou da venda em hasta pública, sem qualquer outra finalidade especial. A consumação ocorre no momento em que o agente emprega a violência ou profere a grave ameaça, utiliza da fraude ou oferece a vantagem, independentemente do afastamento do licitante. A tentativa – punida com a mesma pena do crime consumado – ocorre quando o agente não consegue empregar a violência, a grave ameaça ou a fraude ou, também, por circunstâncias alheias à sua vontade, não chega ao conhecimento do licitante a oferta da vantagem. Quando o agente emprega violência será apenado não só pelo crime contra a administração mas também pelo delito contra a pessoa – lesão corporal, leve, grave ou gravíssima, homicídio ou tentativa.
110.2.3
Abstenção do licitante
O parágrafo único do art. 335 do Código Penal e o parágrafo único do art. 95 da Lei nº 8.666/93 contêm normas incriminadoras que se ajustam à conduta do licitante que, em razão da vantagem oferecida, abstém-se de concorrer ou licitar. Delito próprio do licitante. Crime omissivo puro, o licitante cede à oferta de vantagem, deixando de participar da licitação. Quando o licitante não participa em virtude de violência, grave ameaça ou fraude, não comete qualquer delito. Deve o agente atuar dolosamente, consciente de que deixa de licitar ou concorrer em razão da vantagem oferecida, omitindo-se por sua livre vontade. A consumação ocorre no momento em que o licitante deixa de participar, retirando sua proposta ou deixando de apresentar documentos exigidos, enfim, afastando-se, de
4 – Direito Penal III – Ney Moura Teles qualquer modo, da concorrência. A tentativa é inadmissível, porque se trata de crime omissivo puro.
110.3
AÇÃO PENAL
A ação penal é de iniciativa pública incondicionada. A suspensão condicional do processo penal só é possível nas formas típicas do art. 93 da Lei nº 8.666/93 e da primeira parte do art. 335 do Código Penal, isto é, não se aplica ao delito de afastamento de licitante e da abstenção de licitante.