Volume 02 - 21

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21 SEQUESTRO E CÁRCERE PRIVADO

_____________________________ 21.1 CONCEITO, OBJETIVIDADE JURÍDICA E SUJEITOS DO CRIME A descrição típica encontra-se no art. 148 do Código Penal: “privar alguém de sua liberdade, mediante seqüestro ou cárcere privado”. A pena é reclusão de um a três anos. O bem jurídico tutelado é a liberdade física da pessoa, a sua liberdade de locomoção, o direito de ir, de vir e de ficar. É o direito que todos têm de se movimentar ou de se abster de movimento no espaço. Crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa, que será o sujeito ativo, salvo o funcionário público, que responderá pelo crime do art. 322 ou o do art. 350 do Código Penal, ou um previsto na Lei nº 4.898, de 1965. Sujeito passivo do crime é qualquer pessoa, inclusive os inimputáveis, crianças, enfermos e deficientes físicos.

21.2 TIPICIDADE O caput do art. 148 descreve duas formas típicas simples, e os §§ 1º e 2º as formas qualificadas. A primeira forma típica consiste na privação da liberdade mediante seqüestro, a segunda, mediante cárcere privado.

21.2.1 Conduta O núcleo do tipo é o verbo privar, empregado no sentido de suprimir, tirar, impedir, coarctar a liberdade da vítima.

2 – Direito Penal II – Ney Moura Teles Há duas maneiras de realização da conduta: seqüestrando a pessoa ou mantendo-a em cárcere privado. O seqüestro só se realiza mediante comissão, mas a manutenção da vítima em cárcere privado pode dar-se mediante omissão, quando o agente deixa de colocar em liberdade a vítima que se encontra sob sua guarda para fins de tratamento.

21.2.2 Elementos objetivos Priva a vítima de liberdade mediante seqüestro o agente que a retira do local onde se encontra e a conduz para outro lugar, onde a mantém presa. A vítima é tirada e transportada para outro lugar, vulgarmente denominado cativeiro. Os meios empregados pelo agente podem ser violentos ou não, astuciosos ou não. Há cárcere privado quando a vítima é retida no lugar onde já se acha, sendo impedida de dele sair, o que o agente poderá conseguir utilizando-se de qualquer artifício, inclusive o emprego de violência ou de qualquer recurso que constrinja a liberdade de locomoção da vítima. O consentimento válido da vítima exclui a tipicidade do fato, uma vez que seu dissentimento é elementar do crime. Não em relação aos que, por sua incapacidade pessoal, como as crianças de pouca idade e os inimputáveis, não podem consentir.

21.2.3 Elemento subjetivo O dolo é essencial. Consciência da conduta e vontade de realizá-la para privar a vítima de sua liberdade de ir e vir. Não há nenhum outro elemento subjetivo, a não ser o dolo de seqüestrar ou de manter a vítima em cárcere privado. O fim é unicamente o de violar a liberdade de locomoção. Se o pai mantém o filho menor em casa impedindo-o de sair por um certo período, como corretivo, a tipicidade é excluída pelo princípio da adequação social e não pela ausência de dolo. Há quem diga que, nesse caso, o fim não é o de privá-lo de sua liberdade, mas de corrigi-lo, todavia, o dolo existe e é a vontade de atacar a liberdade de locomoção embora com finalidade corretiva. Claro que tal castigo deve ser imposto dentro dos limites da razoabilidade, não podendo haver excesso que – inadequado e rejeitado socialmente – caracterizaria o crime.

Sequestro e Cárcere Privado - 3 Não é prevista a modalidade culposa.

21.2.4 Consumação e tentativa É crime permanente. Sua consumação, que ocorre no momento em que a vítima é privada de sua liberdade, perpetua-se no tempo enquanto durar a privação ou restrição da liberdade. A tentativa é possível, na forma comissiva. Se o agente é interrompido no momento em que retira a vítima do lugar de onde se encontrava, para levá-la ao cativeiro, há apenas tentativa de seqüestro. Na forma omissiva a tentativa é impossível porque no exato momento em que o agente deixa a vítima retida no lugar onde se encontrava, impedindo a sua saída, o crime já terá se consumado.

21.2.5 Formas qualificadas O § 1° do art. 148, com a redação dada pelas Leis n°s 10.741/2003 e 11.106/2005, prevê cinco circunstâncias qualificadoras do crime, impondo pena de reclusão de dois a cinco anos. O inciso I contempla a qualidade da vítima ser ascendente, descendente, cônjuge ou companheiro do agente ou ter mais de 60 anos. O inciso II trata do fato que se dá com a internação da vítima em casa de saúde ou hospital. Será qualificado ainda o crime quando o tempo da privação da liberdade superar 15 dias (inciso III) Também incidirá a qualificadora se a vítima é menor de 18 anos (inciso IV). A última qualificadora do § 1° encontra-se no inciso V e, diferentemente das anteriores que são objetivas, tem natureza subjetiva: “se o crime é praticado com fins libidinosos”. Ou seja, quando o agente priva a vítima de sua liberdade com a finalidade de praticar com ela atos libidinosos, incidindo ainda quando não os venha praticar. Basta a intenção. No § 2º, está contemplada a hipótese de ocorrência de resultado mais grave,

4 – Direito Penal II – Ney Moura Teles consistente em grave sofrimento físico ou mental imposto à vítima, em razão de maustratos que venha a receber ou da própria natureza da detenção a que é submetida. É forma qualificada pelo resultado, punida com reclusão de dois a oito anos. Certo é que, em qualquer situação de privação de liberdade, a vítima experimenta um sofrimento, uma aflição, por isso que a qualificadora incidirá apenas quando for grave, acentuado, seu sofrimento físico ou mental, o qual deverá ter sido causado por maus-tratos infligidos ou pelas condições em que permaneceu detida ou retida. Ambientes insalubres, com pouca aeração, a temperaturas inadequadas, com espaços reduzidos, úmidos ou sem iluminação são, por si sós, capazes de ocasionar grave sofrimento psíquico ou físico, autorizando o reconhecimento da qualificadora. Por maus tratos devem-se entender agressões físicas ou morais que, por si sós, não constituam crime autônomo. Havendo lesões corporais, leves, graves ou gravíssimas, ou qualquer outro crime contra a honra, constrangimento ilegal ou ameaça, haverá concurso material com o seqüestro ou cárcere privado.

21.2.6 Conflito aparente de normas O tipo de seqüestro é geral em relação ao tipo do crime de extorsão mediante seqüestro, do art. 159 do Código Penal, que contém, além dos elementos daquele, “o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate”. Havendo esse elemento subjetivo, o tipo especial afasta a incidência do tipo geral. Quando o agente restringe ou suprime a liberdade de pessoa que esteja sob sua autoridade, guarda ou vigilância para fins de educação, ensino, tratamento ou custódia, com finalidade corretiva ou disciplinar, o crime será o de maus tratos (art. 136, CP). Se o faz como aplicação de castigo pessoal, o crime será de tortura (art. 1º, II, da Lei nº 9.455/97). Se o agente retira recém-nascido do poder da mãe ou de quem tem sua guarda, levando-o para criá-lo como filho, o crime será o de subtração de incapazes, definido no art. 249 do Código Penal: “ subtrair menor de 18 (dezoito) anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial”. É que, nessa situação, o agente não priva o menor de sua liberdade. Se o fim não é o de criá-lo, mas de colocá-lo em lar substituto, o crime será o do art. 236 da Lei nº 8.069/90, o Estatuto da Criança e do

Sequestro e Cárcere Privado - 5 Adolescente. Se a privação da liberdade recai sobre criança ou adolescente, com sua apreensão sem ordem escrita da autoridade judiciária competente ou fora dos casos de estado de flagrância de ato infracional, incidirá o tipo do art. 230 do Estatuto da Criança e do Adolescente. O seqüestro ou cárcere privado cometido por inconformismo político ou para obter fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas constitui o crime definido no art. 20 da Lei nº 7.170/83, a Lei de Segurança Nacional. A restrição à liberdade de pessoa é causa de aumento do crime de roubo, conforme dispõe o § 2º, inciso V, do art. 157 do Código Penal, que manda aumentar a pena de um terço até metade, “se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo sua liberdade”.

21.3 ILICITUDE E CULPABILIDADE Pode estar em legítima defesa o agente que prende e mantém, em cárcere privado, doente mental perigoso que se encontrava prestes a agredir violentamente outras pessoas, e em estado de necessidade se o fim é o de evitar que o próprio doente cause lesões em si mesmo. De conseqüência, a culpabilidade pode ser excluída nas hipóteses correspondentes de erro sobre a existência das situações de fato que, se existentes, justificariam a conduta, nos termos do art. 20, § 1º, do Código Penal. Também possível o erro de proibição, que exclui a culpabilidade, quando o agente mantém menor retido em um quarto da casa, imaginando tratar-se do próprio filho merecedor de um castigo.

21.4 AÇÃO PENAL A ação penal é de iniciativa pública incondicionada, e nas formas típicas simples é possível a suspensão condicional do processo penal, consoante determina o art. 89 da Lei nº 9.099/95.

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