Vila dos meus amores Acendo um cigarro antes de passar sonâmbulo pelo mercado de corpos. Observo os homens sedentos em busca do prazer barato, querendo disputar a atenção de mulheres despidas de roupas e pudores, com covas à mostra e falso sorriso no canto da boca enfumaçada de cigarro barato. Alguns jovens atravessam as vielas mexendo com as meninas. Hormônios em ebulição usados de maneira incorreta. Os bêbados continuam mais bêbados derrubando doses de cachaça vagabunda. E ainda há um vendedor de flores, que tenta arrancar uma pitada de romantismo de um grupo de engravatados, a maioria com aliança no dedo, mas sem a mínima preocupação com a companheira. Tenho dificuldades para achar um lugar sem aquelas máquinas musicais que machucam meus ouvidos. Em um bar, uma senhora sorri pra mim. Os anos de labuta estampados em rugas e flacidez. A roupa batida e fétida do excesso de trabalho. Ela me pede um cigarro. Acendo o último do maço e continuo meu passeio. As pobrezas das boates ilustradas nas lâmpadas vermelhas fazem contraste com algumas belas moças. Uma delas me chama a atenção. Não pelo belo corpo, de coxas firmes e seios fartos. Não pelos olhos claros que me refletem. Não pela longa cabeleira negra que escorre pelas costas. Não pelo vermelho intenso de seu batom. Não por sua pele morena bronzeada de sol. Não pelo seu brilhante sorriso. Chamou-me atenção por estar sentada no colo de um senhor que deve ter a minha idade. Como desejei estar ali naquele momento. Suas mãos deslizavam suave pelos cabelos gris de um homem eufórico! Ele poderia ser o pai dela. E eu também, mas era a última coisa que eu desejaria. Observei a troca de carinhos mútuos até o momento em que ela o puxou pela mão e o levou para o quarto. O tempo demorava a passar. Fechei meus olhos e imaginei-me ocupando o seu lugar. O mundo virou do avesso. Resolvi ir embora. Não queria ver o rosto de felicidade dele e nem dela. Ela poderia ser minha filha... E eu me apaixonei por ela...