Trindade E Reino De Deus.cap.0.pdf

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Uma eontiribuição parael

Trindade e Reino de Deus, sem perder-se nos atrativos dogmáticos c sistemáticos da teologia trinitária tradicional, apresena uma proposta " inovadora para o estudo da Trindade, segundo um "sistema *aberto" de reflexão teológica. Pressupõe uni diálogo teológico intensivo com o passado e com o presente. Essa abertura estende-se igualmente a um enfoque superador do eurocentrismo e androcentrismo teoleigicos. trabalhando com conceitos novos como comunidade e liberdade. Teologia aberta SÓ pode nascer de uma comunidade de partilha mútua. da liberdade de ter com judio própria e de ter direito ao assentimento pessoal. O consenso portanto deve substituira coação e o diálogo, a imposição. Nessa CO munidade. todos têm direito a ser interlocutores, desde airadição com Atanasio e Agostinho. ou com • Schleiermacher e Lutem, até ,as diversas correu (es atuais de pensamento: os conceitos teológicos tradicionais são rMosáveis e abertos a nos-as interpretações. E uma vez que o presente enfoque não tem um cunho partieularista, mas universal, o diálogo abre-se ao ecumenismo. inclusive oferecendo propostas e apostando na SupC1":100 de cismas eclesiais e teológicos lixados desde séculos. Assim, estas contribuições para a teologia trinitária esboçam um caminho de reflexão e diálogo teológico acessível aos que querem se aproxiniar da afeição intima que mantêm entre si as três pessoas da Trindade e a profunda unidade que as une. EPG

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TRINDADE E REINO DE DEUS

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Trn ..4t1 A 19 1 P 0 20 .1"à EDITORA VOZES

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Moltmann, Jürgen Trindade e Reino de Deus : uma contribuição para a teologia / Jürgen Moltmann ; tradução de Ivo ivlartinazzo / revisão da tradução Enio Paulo Giachini.— Petrópolis, RJ : Vozes, 2000. Titulo original: Trinitãt und Reich Gottes. Bibliografia. ISBN 85.326,231.8-2 1. Reino de Deus 2. Trindade I. Titulo.

CDD-231.044

00-0368 Índices para catálogo sistemático: 1. Trindade : Teologia dogmática cristã 231.044



Jürgen Moltmann

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TRINDADE E REINO DE DEUS

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Uma contribuição para a teologia Tradução de Ivo Martazzo m

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Serotnario Teu:egico Presbiteriano do R1/2 de Janeiro BIBLIOTECA I

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VOZES Palitas 2000

(D 1980, Chr. Kaiser / Gütersloher Verlagshaus, Gütersloh Titulo original alemão: Irinitat und Reich Gottes Direitos de publicação em língua portuguesa: Editora Vozes Ltda. Rua Frei Luís, 100 25689-900 Petrópolis, RJ Internet: http://www.vozes.cormbr Brasil

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora.. Revisão da tradução e editoração de Enio Paulo Giachini

ISBN 85.326.2318-2

Este livro foi composto e impresso pela Editora Vozes Ltda. - Rua Ereituís, 100. Perrópolis - RJ - Brasil - CEP 25689-900 - Caixa Postal 90023 Tel.: (0xx24) 237-5112 - Fax: (0xx24) 231-4676.

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Com agradecimento e em comunhão fraterna, dedico este livro à Academia de Teologia Reformada do Colégio Ráday de Budapest e ao Collegium Doctorum Ecclesiae Reformatae in Hungaria.

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Sumário

Prefácio, 11 1— A TEOLOGIA TRINITÁRIA HOJE, 17 S I. Volta ao pensamento trinitário, 18 1 - Acesso pelo caminho da experiência?, 18 2 — Acesso pelo caminho da práxis?, 21 5 2. No caminho do Deus uno e trino, 24 1 - Deus como substância suprema, 25 2 — Deus como sujeito absoluto, 27 3 —O Deus uno e trino, 30 II — A PAIXÃO DE DEUS, 35 5 1. Apatia ou paixão de Deus?, 35 5 2. O "pathos de Deus", 39 53: O "eterno sacrifício do amor", 44 § 4. A "aflição de Deus", 50 5 5. A "tragédia em Deus", 56 5 6. Deus e o sofrimento, 61 5 7. A liberdade de Deus, 66 5 8. Deus é amor, 70

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III - A HISTÓRIA DO FILHO, 75 5 1. Hermenêutica trinitária, 75 5 2. O envio do Filho, 79 1 — O batismo e o chamado de Jesus, 79 2 — O envio do Filho, 85 3 — A configuração da Trindade, 87 53. A entrega do Filho, 88 1 — A paixão de Jesus, 88 2— A entrega do Filho, 93

5 4. A exaltação do Filho, 96 1 — A ressurreição de Jesus dos mortos, 96 2 — A revelação do Filho, 98 3 — O envio dO;Espírito criador por meio do Filho, 101

5 5. O futuro do Filho, 103 5 6. As modificações da Trindade aberta, 106 IV — O MUNDO DA TRINDADE, 109 5 1. O evento da salvação e a fé na criação, 111 A experiência do êxodo e a esperança messiânica, 111 A fé em Cristo e a experiência do Espírito, 113 5 2. A criação do Pai, 116 1 — A "contingentia mundi", 116 2— A autolimitação divina, 119 3 — A criação' trinitária, 122 5 3. A encarnação do Filho, 124 1 — "Cur Deus homo?", 124 2— A "kenosis" de Deus, 128 3 — O Filho unigênito, o irmão primogênito, 130 4 — Encarnação trinitária, 131 5 4. A transfiguração do Espírito, 132 1 — A ressurreição e a infusão do Espírito, 132 2 — O início da glória, 134 3 — O Espírito como sujeito, 135 4 — Glorificação trinitária, 136 V— O MISTÉRIO DA TRINDADE, 139 5 1. Crítica do monoteísmo cristão, 139 1— Monoteísmo e monarquia, 139 2 — Cristianismo monoteísta: Ano, 142 3 — Monoteísmo cristão: Sabélio, 144 4 — Fundamentação da doutrina trinitária: Tertuliano, 147 5 — Monarquia trinitária: Karl Barth, 149 6 — Tríplice autocomunicação: Karl Rahner, 155 7 — Qual a unidade de Deus?, 159 5 2. A Trindade doxológica, 161 1 — Economia e doxologia da salvação, 161 2 — A experiência histórica da salvação, 164 3 — A relação entre a Trindade imanente e a Trindade econômica, 167

5 3. A Trindade imanente, 170 1 — A constituição da Trindade, 171 a) Quem é o Pai?, 171 14 Quem é o Filho?, 174 c) Quem é o Espírito Santo?, 176 2 — A vida da Trindade, 178 a) Pessoa e relação, 178 141(Pericorese" e transfiguração, 182 3 — A unidade da Trindade, 184

5 4. O Espírito Santo procede do Pai "e do Filho"?, 185 1 — O estado da nova discussão sobre o "Filioque", 185 2— Texto do Credo e as interpretações teológicas, 187 3 — A procedência do Espírito a partir do Pai do Filho, 188 4— O que o Espírito Santo recebe do Filho, 191

5 5. O principio trinitário da unicidade, 193 VI — O REINO DA LIBERDADE, 197 5 1. Crítica do monoteísmo político e clerical, 197 1 — Monoteísmo político, 198 2 — Monoteísmo clerical, 205

5 2. A doutrina trinitária do reino, 208 1 — A doutrina do reino segundo Joaquim de Fiore, 208 2 — Doutrina trinitária do reino, 213 5 3. Doutrina trinitária da liberdade, 216 1 — Formas da liberdade humana, 217 2 — Trindade e liberdade, 221 3 — A liberdade no reino de Deus uno e trino, 221

Prefácio

Progredir significa começar sempre de novo. Isso também se aplica ao trabalho teológico. A teologia da esperança, 1964, O Deus crucificado, 1972, Igreja na força do Espírito, 1975, pelo seu estilo e conteúdo, foram obras escritas programaticamente. Prevaleceu, com efeito, a idéia de, a partir de uni ponto, entender de modo renovado todo o edifício da teologia. Diante disso, proponho-me agora apresentar uma série de contribuições sistemáticas para a teologia, que se afastam em muitos aspectos daqueles livros: pretendo assim abordar, em uma determinada seqüência sistemática, as correlações existentes entre os mais importantes conceitos e doutrinas da teologia cristã. Com a expressão contribuições para a teologia, queremos significar também que não temos em mira nenhum sistema e nenhuma dogmática. Qualquer "summa" teológica consistente, qualquer sistema teológico, reivindica a totalidade, a perfeita organicidade e a coerência universal: De princípio, deve-se poder dizer algo sobre o todo e sobre cada parte. Todos os seus enunciados devem ser isentos de contradições a ajustar-se mutuamente. A arquitetura deve ser "como saída de uma fundição, inteiriça". Todo sistema teórico, inclusive o teológico, ostenta por isso ao menos um certo atrativo estético. Mas nisso reside também o seu poder de sedução: os sistemas poupam a muitos leitores, e certamente aos deslumbrados, o pensamento crítico pessoal e uma decisão independente e responsável, porque não se apresentam para serem discutidos. Resisti por isso à tentação de desenvolver um "sistema" teológico, mesmo que fosse um "sistema aberto". A própria concepção da dogmática, familiar e consolidada, despertou hesitações em mim. Na linguagem política de César Augusto, "dogma" significava decreto (Lc 2,1). Um decreto não pode ser discutido criticamente e acima de tudo não pode ser negado; se necessário, é aplicado pela força. Evidentemente, o conceito teológico do dogma e da dogmática está muito longe desta postura. Todavia, ele envolve também o sabor, e muitas vezes também o gesto positivo de uma sentença definitiva, que não admite réplica. Mesmo quando não é fruto de dogmatismo, o pensamento dogmático se expressa na teologia com clara preferência pelas teses; teses, porêm, não colocadas em discussão, mas sim como enunciados que postulam ou a concordância ou a rejeição, nunca um pensamento independente e a responsabilidade. pessoal. Induzem o ouvinte a pensar segundo elas, não segundo seu pensamento próprio.

Nas contribuições, o autor não pretende ignorar os condicionamentos e as limitações do seu ponto de partida, bem como a relatividade do mundo em que vive. Não poderia ter a intenção de dizer tudo, nem de abarcar todo universo da teologia; entende muito mais que o universo que aborda é apenas parte de um todo maior. Assim, não tem condições de dizer o que é exatamente válido para cada um, ou para cada tempo e lugar. Ele deseja, por outro lado, colocar-se a si próprio, bem como o seu tempo e seu lugar, no coração de uma comunidade teológica cada vez maior. Isso representa para ele o afastamento crítico da auto-referenciação ingênua do pensamento. Com certeza, ele é europeu; mas a teologia européia deve deixar de ser apresentada eurocentricamente. Com certeza, ele é um homem; mas a teologia deve deixar de ser apresentada androcentricamente. Com certeza, ele vive no "Primeiro Mundo"; mas a teologia que desenvolve não pode ser o reflexo dos pontos de vista dos dominadores. Ele deseja, acima de tudo, contribuir para que a voz dos oprimidos seja ouvida. O conceito de "contribuições para a teologia" visa indicar a suspensão do absolutismo tácito e preconcebido das idéias particulares de um contexto. Move-nos a implícita convicção de que a verdade, encarada humanamente, da-se em um diálogo aberto. Comunidade e liberdade são..os componentes humanos do reconhecimento da verdade, da verdade de Deus: Trata-se aí da comunidade de partilha mútua e"da simpatia unificadora. Trata-se do direito à liberdade de ter convicção própria e do direito ao assentimento pessoal. Essa comunidade de homens livres, sem privilégios e sem agravos, pode ser designada como o corpo terrestre da verdade. Em contrapartida, isso significa também que somente a verdade pode ser a alma de uma tal comunidade humana livre. O sistema teológico e a dogmática afirmativa dificilmente expressam esse aspecto da verdade. Eles coagem, quando pode ser esperado e concedido um assentimento livre. Permitem pouco espaço ao espírito próprio para fantasias criativas. Não dão tempo para as decisões pessoais. Somente por intermédio de um diálogo livre é que a verdade pode ser aceita, a partir do único fundamento que lhe é adequado, podendo então brilhar autenticamente como verdade. Ela promove o consenso, a partir do qual é possível' a mudança, sem recurso à coação. No diálogo a verdade deixa o homem livre para ter as suas

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O conceito de "contribuições para a teologia", aqui adotado em relação ao conteúdo e ao estilo, tem por objetivo evitar a sedução do sistema teológico e a pressão da tese dogmática; por outro lado, todavia, não deve ser encarado como um projeto puramente retórico. Trata-sede uma sucessão de idéias, cujo plano lógico se desdobrará por si próprio no desenvolver-se da exposição. Estas "contribuições para a teologia" pressupõem um diálogo teológico intensivo com o passado e com o presente. Nessa conversação, elas participam de modo critico, com acréscimo inclusive de proposições pessoais, desejando com isso preparar também o caminho para um diálogo teológico futuro, ainda mais intensivo e mais amplo.

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próprias opiniões e pensamentos. Pelo diálogo libertador, os mestres retornam ao seio da comunidade de irmãos e irmãs. Do discipulado nasce a amizade. A teologia cristã definharia até a morte, caso não permanecesse nesse constante diálogo, e não se relacionasse com uma comunidade que procura esse diálogo, a ele recorre, e já sempre o promove. Cabe ainda perguntar em que comunidade surgiram estas "contribuições para a teologia", e a que comunidade elas se dirigem? Sabidamente, a comunidade dos teólogos pode tornar-se muito restrita; e, ao par disso, cada teólogo constitui facilmente unia originalidade solitária. Todavia, se deixarmos um pouco de lado uma excessiva consideração pelas peculiaridades e casualidades da subjetividade individual, essa comunidade teológica pode estender-se largamente para além das fronteiras do tempo e do espaço. A comunidade, no seio da qual se esperam e são produzidos os trabalhos teológicos, lança as suas raízes na profundidade dos séculos transcorridos, até o tempo dos testemunhos bíblicos, pois a partir desses testemunhos surgiu na história um diálogo ininterrupto, inacabado e sempre perfectível. Existem problemas teológicos abertos, para os quais cada nova geração deve encontrar sua solução, para poder conviver com eles. Nenhuma concepção na história é definitiva ou está encerrada. Na história da teologia cristã, o caráter aberto de todos os conhecimentos e de todas as explicações é estrutural, pois pelo fato de estarem em aberto revelam a força da sua esperança escatológica no futuro. Se considerarmos mais de perto a questão da teologia e seus problemas, veremos que os distanciamentos históricos no tempo perdem importância, e que Atanásio, Agostinho, Lutero ou Schleiermacher são perfeitos interlocutores no diálogo teológico da atualidade. Devemos entender-nos com eles como se fossem nossos contemporâneos. Aquilo que chamamos "tradição" não é nenhum baú de verdades cristalizadas e utilizáveis, mas sim o diálogo teológico vivo, necessário e permanente, que mantemos com o passado, atravessando os tempos, e estendendo-se ao futuro comum. Mas a comunidade teológica, ao mesmo tempo, ultrapassa também as atuais fronteiras individuais de ordem confessional, cultural e política. Como quer mostrar o presente trabalho, a teologia cristã hoje deve desenvolver-se em uma comunidade ecumênica. Já não podemos mais limitar-nos ao diálogo com a tradição própria de cada um, sob o risco de ficarmos "limitados". Na medida do possível, é preciso que cada um tome conhecimento das outras tradições cristãs, e saiba oferecer a sua própria tradição como uma componente enriquecedora da comunidade maior e ecumênica. Dessa forma, como já dito, vemos que o nosso todo faz parte de um todo maior, e estamos em condições de, pelo reconhecimento dos nossos próprios limites, ultrapassá-los. Com isso estaremos começando a superar um pensamento auto-referido e particular.

Designamos como pensamento particular o pensamento que se caracteriza como isolado, circunscrito, por isso auto-suficiente, subsistindo timidamente por si só. Por reconhecer unicamente os próprios pressupostos e por satisfazer-se apenas com a confirmação dos seus próprios resultados, tal pensamento apresenta-se com a pretensão de absolutismo. O pensamento particular, na teologia cristã, é pensamento cismático. Ele pressupõe uma fragmentação confessional da Igreja e, por meio de "distinções doutrinais", voltadas para a controvérsia teológica, aprofunda as divisões. Tal absolutismo confessional foi posto em prática à época das divisões da Igreja e perdura ainda hoje. As distinções foram usadas para estabilizar a identidade própria e delimitada. Pensar ecumenicamente significa superar essa postura cismática — estamos a tal ponto acostumados com ela que muitos de nós já não a percebem mais — e empenhar-se na busca do pensamento da futura comunidade ecumênica. Em outras palavras, deixar de pensar contra os outros, mas sim com eles e para eles. Isso exige que se invista a própria identidade nessa futura comunidade ecumênica. Mas como passar de uma maneira de pensar particular e cismática a uma outra, universal e ecumênica? Pode-se encarar e interpretar os testemunhos teológicos da cristandade, segundo suas particularidades. Teremos então testemunhos teológicos ortodoxos, católicos, anglicanos, luteranos, e muitos outros. Mas pode-se também investigar e interpretar esses testemunhos no seu aspecto de universalidade. Então podem ser entendidos como testemunhos da Igreja una, e interpretados como tributários da teologia dessa Igreja Única de Cristo. Um texto pode sempre ter um cunho confessional; nesse caso importa reter apenas o que ele traz como contribuição para a verdade, válida para todos. A verdade é universal. Somente a mentira é particular. Considerando que hoje em dia a crescente comunidade ecumênica já deve ser entendida como o corpo terreno da verdade de Cristo, empenho-me, nestas contribuições para a teologia, no esforço de assimilar as tradições evangélicas e católicas, bem como as tradições ocidentais e orientais, procurando auscultá-las, confrontando-me a mim mesmo com elas de modo crítico e autocrítica O presente trabalho sobre a doutrina trinitária é consagrado particularmente à superação do cisma entre a Igreja Oriental e a Igreja Ocidental, que desde 1054 agrava tragicamente a vida da cristandade. Devo muitas das minhas idéias às conferências sobre a chamada "questão do Filioque", promovidas, por sugestão minha, pela entidade ecumênica Comissão Fé e Constituição, em 1978-1979. Entxe essas idéias, destaco em particular a esperança de uma solução desse problema e a superação do cisma. Além disso, dou ênfase especial ao intento de trazer o judaísmo e os testemunhos da fé bíblico-judaica a um diálogo com a fé bíblico-cristã. Com a ruptura entre cristianismo e judaísmo, teve início o primeiro cisma na história do reino de Deus. Mesmo que não nos seja ciado eliminar arbitrariamente esse primeiro cisma, podemos sempre superar os seus funestos efeitos, e chegar a uma 14

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comunidade de caminhos que, embora ainda separados, corram em paralelo. A isso nos levam os comuns laços e obrigações com a "Bíblia" e a comum esperança no "reino". já é tempo de estender o diálogo teológico da comunidade ecumênica ao diálogo teológico com Israel. Também os testemunhos da fé bíblico-judaica devem ser interpretados como testemunhos de uma comunidade que ultrapassa o âmbito do judaísmo, pois o povo de Deus é um só povo. As idéias fundamentais desta contribuição para uma teologia trinitária foram por mim debatidas, desde 1975, em muitas sociedades, conjuntamente com professores e doutorandos. Cabe, nesta altura, um agradecimento a todos os participantes desse trabalho conjunto. Tive ocasião de apresentar o esboço de alguns dos capítulos deste livro nas conferências de Warfietd, em outubro de 1979, no Seminário Teológico de Princeton, EUA. Sou grato pela concentração a que me obriguei, em decorrência desse convite. Por fim, desejo agradecer profundamente ao Sr. Dr. Michael Welker pelo seu acompanhamento crítico deste trabalho. Ao Sr. Siegfried Welling devo o maior reconhecimento pela tarefa exaustiva da revisão do presente livro. Como no caso de outros trabalhos teológicos, também agora, ao elaborar estes pensamentos de teologia trinitária, tenho sob os olhos uma imagem: o admirável ícone russo da Santíssima Trindade, de Andrei Rublev, do séc. XV Pela afeição íntima que nutrem entre si, as três pessoas mostram a profunda unidade que as liga mutuamente, fazendo delas um só. O cálice sobre a mesa aponta para sacrifício do Filho no Gólgota. Como o cálice está colocado no centro da mesa, à qual se assentam as três pessoas, assim a cruz do Filho, desde toda a eternidade, situa-se entre a unidade-trina. Aquele que reconhece a verdade desse quadro saberá entender que os homens só poderão corresponder ao amor de Deus, uno e trino, no seio daquela unidade mútua que decorre da entrega do Filho "por muitos". Ele compreenderá que os homens somente alcançarão a sua própria verdade mediante a afeição mútua e livre. Que este livro possa representar um convite para essa compreensão social da teologia trinitária. Tübingen, abril de 1980 Jürgen Moltmann

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