Pretextos Marjnaus

  • November 2019
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  • Words: 1,562
  • Pages: 38
w i l t o n c a r d o s o

aviso aos marjnautas esta página expirou quando o poeta espirrou em seu zênite zen (auge transcen dente) ninguém (nenhum leitor) leitor marjnauta a espiou

quero um texto claro preciso de água límpida doce didática quase matemática lógica metros ritos incisivos sobre a carne das palavras reduzidas a osso e oco cubos e axiomas sem eco

e depois de toda essa assepsia injetar algumas gotas de anexato o mínimo milímetro preciso para ante tanta limpidez desse deserto estontear todas as rotas corpo repleto

suas

ela lendo me lembra a avó que será a vó da lenda de sempre a linda vó das vozes todas dos meninos todos de todos os cantos

como se fosse um falso como se a voz a linha fosse um fio sem fim sem meada enleada em seu tecer como se fosse par um parecer de voz em voz de vez em vez me vem a voz talvez tal vez venha de muito longe embora apenas perto a vejo figura do meu ou vido vida vidra a voz desfigurada por mim por quem produz ida?

narciso se vê na f(r)onte na f(r)onte de todos os mitos narciso se transforma

errar a gramática errar a rima errar a raiva errar com raiva e força (e riso) errar tudo e tanto até o (de) sempre ser o último espanto até que reste apenas penas de um vôo errante

ER

R

Á T IC

A

nas margens dos netgócios

a música vital transcorre na arritmia da viola incontrolável e sua báquica melodia embriaga as razões na harmonia do caos

hoje amanheceu tão fresco não a manhã nem o ar nem esta brisa em mim tão leve amanheceu o dia em mim como há muito não fazia soprou uma brisa breve no meu pensamento fez-me esquecer de pensar esquecer do dia duro por vir esquecer de mim tão leve eu estive esta manhã a alma tão calma tão nova tão alva quase não havia como em menino tudo era descoberta e magia tão fresco amanheceu-me o dia

oração da volta do supermercado carro trânsito compras serviço amanhã dívidas ontem são baco e santo orfeu protegei-me para que eu nunca perca o poder de perder-me num pôr de sol como este

não ter que ler não ter que fazer não ter que ver se vai dar ou faltar não comedir nem se angustiar augusto o dia em que como você velho não ter que ter

e agora zé literatura acabou contracultura é a favor utopia rodou pé na estrada é turismo ismo nenhum sobrou todo sonho so çobrou e agora zé droga é mercado marginal é orga nizado toda rima é suspeita de conspirar com uma cifra cisma alguma vai dar n’algum cisma e agora zé que fazer do que resta da festa que que eu faço com o agora

palmo a palmo o espaço digital izado as margens sempre mais estreitas tornar-se mais rar efeito vazar pelos poros das mar gens tornar-se mais mar jnau

ex-littera a metáfora desaforada o poema sem tema a tradição travestida a decadência da transcendência o resto dos mestres o simulacro sublime o todo didático do texto avali(z)ado a fábrica têxtil toda avariada

a coisa é feita de ruídos puídos ou recém nascidos doloridos ou não não importam muito os idos desde que bem imbricados os ruídos é um ofício difícil precisa estar concentrado até o último lance de dados os neurônios todos ligados por outro lado é extrema mente fácil basta estar distraído (como dizia o leminski) pra (ou)vir um bom ruído a gente faz o que pode alguma vez vai bem na maior parte se fode

leve como pluma na penumbra do sentido que se atreve insinuar desentendido nenhum papel me cabe vácuo virtual sou breve

o poema mais leve que uma pluma nem um tema que o queira mais profundo teorema menos denso que a espuma de uma onda tenso como o grito de uma corda (no espaço de um lapso) lema algum leva este pre texto ao abismo do sentido um risco ronda este dizer se tornar menos que isto traço ao infinito do não dito suma

não declame poemas nem os cante no máximo sussurre-os eles odeiam cordas vocais amam somente o som silente atravessando a mente

UMA

LUZ

QUASE

NULA

UMA

VOZ

QUASE

MUDA

QUASE

NADA

UM

POEMA

em silêncio dança no silêncio dança do silêncio

o circo imperial das togas apresenta!

sal-dades

fala da palestrante a mulher do senador hermenegildo de moraes na época das frutas abria os portões da sua casa para que o povo desfrutasse da quantidade de frutas que vocêtinha dentro daquela casa!

quando, ainda criança, me deparei com aquele livro misto de causos e exaltação dos grandes vultos morrinhenses (intelectuais, políticos, artísticos), cujo título MORRINHOS: DE CAPELA A CIDADE DOS POMARES pensei significar (por um desses equívocos que só as crianças podem cometer com sua prodigiosa imaginação) : MORRINHOS DE CAPELA: A CIDADE DOS POMARES então algo surrealista – uma cidade travestida de capela, carregando uma carapaça/capela – emergiu do texto... foi a melhor leitura que fiz do livro, até hoje benditos sejam

erros meninos

neste livro um soneto lírio parnaso florido em pleno pós-guerra de guilherme xavier poeta-doutor quando a língua de bilac já era dada como morta e enterrada: Meu coração é uma cidade antiga, De casas brancas e compridos muros, Com pomares amplíssimos, escuros, E gente simples de feição amiga. Seus habitantes não são todos puros, Talvez entre eles haja alguma intriga. Mas a harmonia geralmente abriga, E ajunta, rindo-se, os rivais mais duros. Sua alegria buliçosa e clara Esconde mágoas que ninguém suspeita Nem descobrir impertinente ousara. E julga-se feliz, pois, sem vaidade, Confunde na modéstia mais perfeita, Tranqüilidade com felicidade.

é consenso considerar o parnasianismo um período literário muito renitente no caso do brasil (vide candido e bosi) é preciso dizer que o parnaso foi mais (muito muito mais) algo como um estado de espírito artístico-intelectual (uma economia mental) coisa de doutores e damas entre togas e cetins diga-se também (na companhia de bandeira) que o parnaso não deixou de ser uma continuação (mais contida) de seu suposto desafeto o romantismo – que por estas bandas é muito diferente de seu congênere europeu digamos então que impregnou o brasil fim de séc XIX um estado de espírito: romântico-parnasiano

melhor que “período”, “estado de espírito” ou “economia mental” digamos que houve uma atmosfera: ATMOSFERA ROMÂNTICO-PARNASIANA (ARP) uma atmosfera é espacial, um período é temporal ela se dissipa, ele é superado ela é mais palpável (respirável) que um estado de espírito a ARP começou a se dissipar no brasil a partir de uma pequena explosão de luzes e ruídos, ocorrida na são paulo de 20, chamada modernismo: outra atmosfera se criava e se expandia contra as ondas bolorentas da antiga ARP mas sua dissipação foi muito mais lenta e custosa nos rincões mais remotos do país em plena década de 70 uma pessoa de faro mais fino podia sentir a persistência da ARP em lugares ermos como, por exemplo, na Cidade dos Pomares!

mas uma província tem duas bandas imbricadas

duas atmosferas

a dos doutores damas e coronéis ARP freudiana perturbada complexo de inferioridade inconformada por não ser centro faz de tudo para que pelo menos em seu pequeno mundo haja quem seja umbigo haja quem seja mudo haja quem seja tudo haja quem nunca aja a outra banda-atmosfera a da gentalha analfabeta dos meninos e dos velhos bicho mato tapera (vide drummond e rosa e ramos e barros) toda tosca sem pertences nem complexos ubiqüidade desumbigada alguns a chamam sertão (mar) essa é toda margem

e pra complicar como estão imbricadas uma entra na outra de modo que a gentalha respira ARP e togas e cetins se impregnam de sertão nos dias de festa (de banda e discurso) vê-se bem como o povo respira e aspira a ARP embora casa grande e móveis coloniais com aquele ar de calma e fixidez amados pelo parnaso aquele ambiente aconchegante só pode ser pra uns poucos a custa do suor e do sangue de muitos na lida dura do campo que a gentalha tem de cumprir dia após dia pra sinhazinha ler no seu aconchego os seus romances românticos entre móveis coloniais e gatos perfumados encantando os poetas parnasianos que a chamarão de ninfa em seus virtuosos sonetos

mas tudo tudo isto hoje são apenas lembranças de quem não viveu aquela atmosfera em seu esplendor e apenas passou menino pela cidade dos pomares quando restavam quase dissipados uns cheiros de ARP e restam ainda umas saudades doentias de velho daqueles móveis de jacarandá e peroba rosa nos quais quando se fecha os olhos vê-se ainda a donzela trêmula de amor sem objeto devorando seus folhetins umas saudades que são apenas mais uns cacos em meio aos fragmentos de agora outra atmosfera esta nem ARP nem sertão nem mesmo modernista cheia de máquinas mínimas e cálculos enormes

benedito ventura que (nesta vida) só foi velho e menino afável e bonachão com aquele ar de bobão mas só pra quem não olha nos olhos perdidos de sertão poeta da província um pouco douto outro caipira-caipora respirador de dois ares cheio de vícios e ofícios tribunas e altares mas também de sóis de luares taperas e margens como deixaria mestre bené

de ser o que é?

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