BRASIL: O QUE POPULISMO? O termo populismo é utilizado para designar um conjunto de movimentos políticos que se propuseram colocar, no centro de toda ação política, o povo enquanto massa em oposição aos (ou ao lado dos) mecanismos de representação próprios da democracia representativa. Exemplos típicos são o populismo russo do final do século XIX, que visava transferir o poder político às comunas camponesas por meio de uma reforma agrária radical ("partilha negra"), e o populismo americano dos EUA da mesma época, que propunha o incentivo à pequena agricultura pela prática de uma política monetária que favorecesse a expansão da base monetária e o crédito (bimetalismo). Historicamente, no entanto, o termo populismo acabou por ser mais identificado com certos fenômenos políticos típicos da América Latina, principalmente a partir dos anos 1930, estando associado à industrialização, à urbanização e à dissolução das estruturas políticas oligárquicas, que concentravam firmemente o poder político na mão de aristocracias rurais. Daí a gênese do populismo, no Brasil, estar ligada à Revolução de 1930, que derrubou a República Velha oligárquica, colocando no poder Getulio Vargas, que viria a ser a figura central da política brasileira até seu suicídio em 1954. Características A política populista caracteriza-se por um "modo" de exercício do poder, através de uma combinação de plebeísmo, autoritarismo e dominação carismática. Sua característica básica é o contato direto entre as massas urbanas e o líder carismático (caudilho), supostamente sem a intermediação de partidos ou corporações. Para ser eleito e governar, o líder populista procura estabelecer um vínculo emocional (e não racional) com o "povo". Isso implica num sistema de políticas ou métodos para o aliciamento das classes sociais de menor poder aquisitivo, além da classe média urbana, como forma de angariar votos e prestígio (legitimidade para si) através da simpatia daquelas. Esse pode ser considerado o mecanismo mais representativo desse modo de governar. Desde suas origens, o populismo foi encarado com desconfiança pelas correntes políticas mais ideológicas da tanto da Esquerda quanto da Direita. Esta última (como representada, por exemplo, pelo antivarguismo da UDN brasileira, ou pelo antiperonismo da União Cívica Radical/UCR Argentina) sempre apontou para os aspectos plebeus, as práticas vulgares e as atitudes "demagógicas" (concessão irresponsável de benefícios sociais e gastos públicos) que a prática populista comportava; a Esquerda, especialmente a comunista, apontava para o caráter reacionário e desmobilizador das benesses populistas, que se contrapunha às lutas organizadas da classe operária e fazia tudo depender da vontade despótica de um caudilho bonapartista. Na América Latina, o populismo foi um poderoso mecanismo de integração das massas populares à vida política, favorecendo o desenvolvimento econômico e social, mas dentro de uma moldura estritamente burguesa em que essa integração foi "subordinada", colocando-se a figura de um líder carismático e mais ou menos autoritário como tampão entre as massas e o aparelho de Estado. Ideologias O populismo é uma expressão política que encontra representantes tanto na Esquerda quanto na Direita. Governantes populistas como Vargas, Perón e Lázaro Cárdenas realizaram políticas nacionalistas de substituição de importações, estatização de certas atividades econômicas, imposição de restrições ao capital estrangeiro e concessão de direitos sociais. No entanto, os regimes populistas freqüentemente dedicaram-se à repressão policial dos movimentos de Esquerda e sempre realizaram sua ação reformista dentro de um quadro puramente capitalista. Essa forma de governo tendeu também a retirar da própria burguesia nativa sua capacidade de ação política autônoma, na medida em que toda ação política é referida à pessoa do líder populista, que se coloca idealmente acima de todas as classes. Ideologicamente, o populismo não é necessariamente de "Esquerda", no sentido de que seu alvo não são apenas as massas destituídas; há políticos populistas de Direita – como os políticos paulistas Adhemar de Barros e Paulo Maluf – que têm como alvo de sua ação política a exploração das carências dos extratos mais baixos (ou menos organizados) da população urbana, com os quais estabelecem uma relação empática baseada na defesa de políticas autoritárias de "moral e bons costumes" e/ou "Lei e Ordem". Alegam alguns que o maior representante do populismo de Direita no Brasil talvez haja sido o presidente Jânio Quadros.
Enquanto ideologia, o populismo não está ligado obrigatoriamente a políticas econômicas de tipo nacionalista: na América Latina dos anos 1990, governantes populistas como o argentino Carlos Menem, por exemplo, combinaram políticas neoliberais de desregulamentação e desnacionalização com uma política social assistencialista herdada do populismo mais tradicional dos anos 1930 – no caso de Menem, do peronismo – naquilo em que tais políticas não entravam em conflito com as práticas neoliberais. O mesmo pode ser dito de outros governantes da época, como Alberto Fujimori. Exemplo máximo do populismo no Brasil, Getúlio Vargas subiu ao poder através de golpe de Estado nos anos 30 (Era Vargas de 1930 até 1945), elegendo-se democraticamente presidente em 1951 e governando até suicidar-se em 1954. Apelidado de "pai dos pobres", sua popularidade entre as massas é atribuída a sua liderança carismática e a seu empenho na aprovação de reformas trabalhistas que favoreceram o operariado. Entretanto, alguns alegam que suas medidas apenas minaram o poder dos sindicatos e de seus líderes, tornando-os dependentes do Estado. Entre os líderes políticos comumente classificados como populistas, destacam-se Getúlio Vargas, Juan Domingo Perón, Lázaro Cárdenas, Victor Paz Estenssoro, Leonel Brizola, Anthony Garotinho, Abdalá Bucaram, Evo Morales, Hugo Chávez, Rafael Correa, Álvaro Noboa, Ollanta Humala, Paulo Maluf, Luis Inácio Lula da Silva. O Regime Liberal Populista Em 1945, a queda de Getúlio Vargas foi seguida pela reestruturação do regime democrático no Brasil. Naquele mesmo ano, os cidadãos brasileiros voltaram às urnas para escolherem o seu próximo presidente. No entanto, as grandes transformações sociais e econômicas vividas na América Latina, a partir da década de 1930, trouxeram à tona uma diversidade de movimentos políticos e ideologias que ocasionaram maiores tensões ao cenário político brasileiro. O nacionalismo, os partidos comunistas, os grupos liberais fizeram do jogo político nacional uma delicada teia de interesses e alianças. Ao mesmo tempo, os processos de industrialização e urbanização fizeram com que os centros de disputa pelo poder saíssem das mãos das antigas e conservadoras elites agrárias e se “despedaçasse” entre profissionais liberais, operários, militares, funcionários públicos... No entanto, essa pluralidade de grupos e ideologias viveu ao lado de lideranças políticas arrebatadoras. Foi nesse momento que alguns políticos buscaram o apoio dos diferentes setores de uma sociedade em pleno processo de modernização. O carisma, os discursos melodramáticos e o uso da propaganda massiva produziram ícones da política que, ainda hoje, inspiram os hábitos e comportamentos das lideranças políticas. Os estudiosos dessa época definiram tal período histórico como o auge do populismo no Brasil. Sob o aspecto teórico, o governante populista fundamentava seu discurso em projetos de inclusão social que, em sua aparência, legitimavam a crença na construção de uma nação promissora. Definindo seus aliados como imprescindíveis ao progresso nacional, o populismo saudava valores e idéias que colocavam o “grande líder” como porta-voz das massas. Suas ações não mais demonstravam sua natureza individual, mas transformavam-no em “homem do progresso”, “defensor da nação” ou “representante do povo”. Construía-se a imagem do indivíduo que desaparecia em prol de causas coletivas. O primeiro líder populista a ter grande destaque no Brasil foi Getúlio Vargas (19301945/ 1951-1954) que, por meio de amplas alianças e o controle dos meios de comunicação, se transformou em uma grande unanimidade política. Seu discurso nacionalista e a concentração de poderes políticos lhe ofereceram uma longa carreira presidencial. Como exemplo da pluralidade de idéias desse período, podemos notar que Vargas conseguia, ao mesmo tempo, ser considerado o “pai dos pobres” e a “mãe dos ricos”. Esses slogans expressavam com clareza como o apelo popular tornou-se instrumento indispensável para construção de uma promissora carreira política. Jânio Quadros (1961), durante sua campanha presidencial, abraçava desconhecidos e comia com seus eleitores. Chegando ao poder elegeu a vassoura como símbolo de um governo que “varreria” a corrupção do país. Suas medidas oficiais causavam muita polêmica. Moralista, Jânio Quadros proibiu as rinhas de galo e o uso de biquíni em desfiles de moda. Ao renunciar, alegou a presença de “forças terríveis” que ameaçaram seu mandato.
Outro famoso governo populista foi o de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Prometendo realizar “cinqüenta anos de progresso em cinco anos de governo”, JK ficou afamado pela construção de um país moderno. Abrindo portas para as indústrias multinacionais estrangeiras, elevou o padrão de consumo e conforto das populações urbanas com a introdução de aparelhos eletrodomésticos e dos primeiros carros populares. Além disso, o ousado e dispendioso projeto de construção da nova capital, Brasília, fez com que o empreendedorismo fosse a marca maior de sua administração. Mesmo dando a idéia de que os líderes populistas fossem “irresistíveis” não podemos deixar de dizer que certos grupos políticos também fizeram forte oposição a esses líderes nacionais. O crescimento populacional brasileiro e a abertura dos novos desafios conviviam com a polarização da política internacional, que dividiu as nações do mundo entre o capitalismo e o comunismo. Desta forma, grupos ultra-conservadores e setores de esquerda encontravamse em pontos longínquos do cenário conciliador do fenômeno populista brasileiro. “Comunas” e “reaças” eram representantes de uma tensão política que colocou, nesse mesmo período, a democracia em xeque. A ascensão da Revolução Cubana, em 1959, trouxe medo e esperança a diferentes grupos da nossa sociedade. Ao mesmo tempo, grupos militares instituíram a urgência de uma intervenção política que impedisse a formação de um governo socialista no Brasil. Viveu-se em uma economia que sabia muito bem promover a prosperidade e aumentar a miséria. Foi nesse momento que, durante o Governo de João Goulart (1961-1964), os movimentos pró e anti-revolucionários eclodiram no país. A urgência de reformas sociais viveu em conflito com o interesse do capital internacional. Em um cenário tenso e cercado de contradições, os militares chegaram ao poder instaurando um governo ferrenhamente centralizador. Em 1964, o estado de direitos perdeu forças sem ao menos confirmar se vivemos, de fato, uma democracia. EXERCÍCIOS 01. (UNIFESP) O período da chamada "redemocratização" brasileira (1945-1964) contou com: a) Eleições diretas para presidente e elaboração de nova Constituição. b) Alternância política na Presidência e intensa radicalização ideológica. c) Supressão de direitos políticos dos adversários do regime e ampla liberdade de imprensa. d) Inexistência de mobilizações de massa e fragilidade do poder judiciário. e) Pluralidade de organização sindical e plena liberdade de organização partidária. 02. (UERJ) Juscelino Kubitschek e Emílio G. Médici são duas figuras representativas das décadas de 1950 e 1970. Essas duas décadas correspondem, respectivamente, aos seguintes contextos políticos no Brasil: a) estatismo e liberalismo b) privatismo e populismo c) agrarismo e caudilhismo d) desenvolvimentismo e autoritarismo e) neoliberalismo e progressismo 03. (MACKENZIE) O governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1950) foi influenciado pelos acontecimentos internacionais que marcaram o pós-guerra. A política econômica adotada em seu governo tinha como principal objetivo a) o aumento da intervenção do Estado, que passou a controlar as importações, diminuindo as tarifas alfandegárias. b) a manutenção de uma política de confisco para combater a inflação que, entretanto, não prejudicou os ajustes salariais dos trabalhadores. c) a liberalização do câmbio, aumentando as importações de produtos supérfluos, sem adotar uma política de seleção nas importações. d) a adoção de uma política liberal e nacionalista, favorável aos negócios das empresas nacionais. e) a manutenção das condições favoráveis à acumulação de capital, por meio de uma política social democrática e nacionalista. 04. (IBMEC-SP) "No pós-guerra, o entendimento do nacionalismo é extremamente complicado pela avaliação de seus sentidos no momento de acelerada mudança histórica. Os Aliados
derrotaram exatamente os nacionalismos racistas e imperialistas do nazi-fascismo. O termo é marcado, conota práticas desumanas derrotadas pela civilização (...). Contudo, é também no imediato pós-guerra, que o termo reaparece referindo-se à descolonização, às novas nacionalidades e às práticas defensivas de economias fragilizadas." (Trecho retirado de Guimarães, César. Vargas e Kubitschek: a longa distância entre a Petrobras e Brasília. In: "República no Catete". Rio de Janeiro: Museu da República, 2001, pág. 160)
No Brasil, o tema apresentado pelo texto foi caracterizado: a) Pelas discussões entre os integralistas e a Aliança Nacional Libertadora, cujos resultados foram favoráveis a Vargas, notadamente simpático ao fascismo. b) Pelo estímulo às revoltas nacionalistas e separatistas que ocorreram durante a década de 50, todas elas influenciadas pelo movimento de autodeterminação dos povos. c) Pela entrada maciça de investimentos estrangeiros voltados à promoção da agricultura do café, estimulando a defesa do preço do produto pela intervenção estatal. d) Pelo embate entre dois projetos de desenvolvimento, sendo um deles defensor da entrada de capitais estrangeiros e outro do intervencionismo do Estado. e) Pelos enfrentamentos entre os comunistas, favoráveis à criação da Petrobras, e os nacionalistas, contrários à nova estatal criada durante o governo de Getúlio Vargas. 05. (FATEC) Considere o texto. A posse de João Goulart na presidência significava a volta do esquema populista, em um contexto de mobilizações e pressões sociais muito maiores do que no período Vargas. Os ideólogos do governo e os dirigentes sindicais trataram de fortalecer o esquema. (...) O Estado seria o eixo articulador dessa aliança, cuja ideologia básica era o nacionalismo e as reformas sociopolíticas denominadas de reformas de base. (FAUSTO, Boris. "História do Brasil". São Paulo: Edusp/FDE, 1996. p. 447)
As reformas de base a que o texto se refere tinham como objetivo, entre outros, a) garantir o acesso de trabalhadores do campo à propriedade, atendendo a parte das reivindicações de sindicatos rurais. b) realizar uma ampla reforma tributária, ampliando as taxas de juros dos bancos privados nacionais e internacionais. c) vender aos trustes e cartéis internacionais algumas empresas nacionais como forma de obter receita para o Estado Brasileiro. d) conceder aos fazendeiros os títulos de propriedade de terras que estavam ocupadas há muito tempo pelos posseiros. e) mudar a legislação eleitoral com o objetivo de restringir a candidatura dos analfabetos aos cargos do poder executivo. 06. (CEFET-SP) Todas as alternativas a seguir referem-se a transformações ocorridas no Brasil a partir dos anos 50, EXCETO: a) O governo de Juscelino Kubitscheck, cujo lema era "50 anos em 5", tinha como objetivo modernizar o Brasil, dotando-o de indústrias de base e de bens de consumo. b) No período iniciado pelo golpe de 1964, a partir do segundo governo - do General Costa e Silva (1967-1969) -, cessaram no país as manifestações públicas contra a ditadura militar. Manifestações questionando a ordem vigente eram comuns apenas na Europa e nos EUA e tiveram seu auge em maio de 1968. c) A partir dos anos 50, a sociedade brasileira adquire uma feição urbana, movida pela ideologia do desenvolvimento e pela associação com capitais externos, com a instalação de um novo parque industrial. d) Em 1950, respirava-se um clima de otimismo raramente visto no Brasil: Getúlio Vargas voltara ao poder, fora construído o Maracanã e o Brasil tinha a possibilidade real de ganhar, pela primeira vez, a Copa do mundo de futebol. e) No período do "milagre brasileiro" (1969-73), o governo militar não deu ênfase à solução de problemas sociais, preocupando-se mais em gerar desenvolvimento econômico. Tal política foi sintetizada pelo Ministro da Fazenda Delfim Neto na frase: "É necessário fazer o bolo crescer antes de dividi-lo". 07. (CEFET-MG) A charge a seguir foi publicada em maio de 1962, no jornal "Correio da Manhã".
A proposta dessa charge visa: a) sinalizar a necessidade de se implantar as reformas de base. b) vincular a prática governista aos ideais da esquerda revolucionária. c) apontar a possibilidade de o presidente restaurar um regime autoritário. d) apoiar as mudanças constitucionais propostas pela presidência da República. 08. (CEFET-MG) Em 1961, o presidente do Brasil, Jânio Quadros, concedeu a Ernesto "Che" Guevara a mais alta condecoração do Estado brasileiro, a Ordem do Mérito do Cruzeiro do Sul. Esse ato pode ser explicado como: a) apoio do governo brasileiro ao movimento de expansão do socialismo na América Latina. b) evidência do militarismo como política governamental no seu curto mandato presidencial. c) afirmação da política independente do Brasil diante da hegemonia estadunidense no continente. d) sinal da influência do vice-presidente João Goulart na elaboração da política econômica do governo brasileiro.
GABARITO 1. A 2. D 3. C 4. D 5. A 6. B 7. C 8. C