A Máquina De Ler Pensamentos

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  • May 2020
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A Máquina De Ler Pensamentos Olá, meu amigo! O que vou lhe contar agora trata-se de um segredo industrial, espero que não conte a ninguém, por favor! Fui chamado por um empresa em que um amigo trabalha, para testar um novo produto eletrônico, um tele-decodificador neural; ou seja, um aparelhinho que lê pensamentos a distância. Eu deveria testar este produto onde eu quisesse, teria uma tarde para comprovar a sua eficiência, e seus possíveis efeitos colaterais em quem o usa. Depois de muito pensar em ir a Igrejas, para comprovar a fé de quem prega, lojas de shopping, para ver se acreditam naquilo que vendem, e até em uma sessão do Plenário, para ver o tamanho das mentiras em que acreditamos, decidi ir a uma academia de ginástica. Lá, eu pude ficar por detrás de uma vidraça, de onde eu conseguia ver aquele amplo salão, onde eu via os equipamentos de força (não sei se é assim que se chama), aqueles em que se levanta pesos com os braços e as pernas; via o setor em que eles podiam fazer uma espécie de alongamento, e a parte maior, que era para exercícios aeróbicos. Ainda não havia testado o aparelho, e com os dois eletrodos ligados em minha nuca, como dois curativos, liguei a pequena caixinha, do tamanho de um maço de cigarros, que estava em meu bolso. Olhei fixamente para a testa (funciona também com a nuca) da primeira pessoa a ser ‘scaneada’. O que se seguiu foi um dos momentos mais emocionantes da minha vida: vieram à minha mente números de telefone, eram uns cinco, aquele homem, de uns quarenta anos de idade estava tentando se lembrar o número de telefone de alguém! Desviei meu olhar para o chão e quase gritei de alegria! Consegui ler o pensamentos de outra pessoa!!! Olhei para uma mulher, de trinta anos, talvez, que era muito bonita e tinha um corpo bem modelado. De repente, veio a imagem daquela mesma mulher, só que com uns vinte quilos a mais. Olhei para os seus olhos pelo espelho e notei que ela estava olhando para seu próprio corpo no espelho… Ela se via com vinte quilos a mais! Continuei lendo. Ela via suas coxas com celulites, seus seios muitos maiores e caídos, seu rosto com rugas que não existiam, pois eu a vira de perto na entrada, e era muito bonita; depois veio a imagem de uma mulher, parecia uma amiga, e então a amiga entrando numa clínica de plástica. Ela queria fazer uma plástica? Mas que absurdo! Ela se achava gorda, caída, e velha! Eu estava meio confuso, uma mulher como aquela, seria considerada bonita por qualquer homem que conheço! Olhei para um senhor de uns sessenta anos, que apesar da aparência, seguia bem o ritmo dos exerícios. Ele estava calmo, aparentemente só pensava no exercício e em sua respiração. De vez em quando pensava em alguém, vinha a imagem de uma mulher bonita, com um sorriso tranquilo nos lábios. Era a senhora que estava ao seu lado! Ela era sua esposa, e ele a via como tendo uns trinta anos menos! Para ele, sua esposa não era alguém de sessenta. Olhei para ela e vi exatamente a mesma coisa! Os dois se amavam, e a imagem que um fazia do outro era de alguém muito bonito, que transmitia alegria, calma… De repente, por alguns minutos, perdi a vontade de ‘ler’ as outras pessoas! Para aqueles dois, o salão de ginástica era grande e mais iluminado, e só tinham atenção para eles dois e para os dois professores de ginástica. Fui para um rapaz de uns dezoito anos, alto e gordinho. Ele estava meio desajeitado, mas se esforçava muito. Em sua mente, consegui ver uma imagem muito triste: um homem jovem, uns quarenta anos, gordo e grande como o próprio rapaz, num caixão, em seu velório. Fiquei observando por um bom tempo, mas ele estava fixado só neste pensamento, com uma força tão grande que só consegui perceber a identidade do homem no caixão quando ele se lembrou de um almoço com a família, onde aquele homem do velório respondia, animado a uma das pessoas da mesa que iria viver até os noventa anos de idade, que era forte como um touro e que seu coração era como uma máquina, nunca pararia de repente. Dizia que até o último dia de sua vida comeria e beberia tudo o que quisesse, pois sentia-se forte, até porque agora fumava ‘apenas’ um maço de cigarros por dia. Era um almoço de Natal. Ele tinha morrido há menos de dois meses! Era o pai do rapaz que estava em minha frente, ofegante, procurando se mover como se uma sentença de morte pudesse ser revogada. Não descobri se tal sentença seria a dele próprio, ou a morte prematura do pai… Eu estava um pouco triste. Resolvi mudar um pouco o enfoque. Mirei um rapaz alto e muito forte, com músculos bem formados, que estava num equipamento em que se usa as pernas. Ele estava pensando em atores de cinema, em modelos fotográficos, homens bonitos e sinônimos de beleza moderna. Ele queria

ficar como eles. Mas me assustei quando em seus pensamentos surgiu a minha imagem, vestido como eu estava. Ele está olhando para mim! Eu estava ‘lendo’ sua mente através de sua testa, e não notei que ele estava me vendo. Mas não desviei, e continuei captando suas ondas cerebrais, sem que ele percebesse. Ele estava curioso pelo o porquê eu estava olhando-o. Então pensou em vir conversar comigo depois dos exercícios. Pensou que poderia me chamar para ir ao seu apartamento, esta noite… Essa não! Desviei meu olhar na hora! Ele achou que… Mas como? Um cara como aquele, bonito, pode ter a mulher que quiser! Ele não parece… Olhei para uma garota, de uns dezesseis, muito bonita, que tinha a expressão preocupada. Ela pensava em chocolate. Mas pensava em chocolate com culpa. Ela estava fugindo do chocolate! Estava meio descontrolada, o ambiente da sala de aeróbica estava pequeno, ela sentia muito calor, ela dava muita atenção às garotas em volta, pensava se elas também tinham problema com comida. Veio a cena do último final de semana, onde ela comera bolo de aniversário. Em sua mente, apareceu um bolo imenso, veio o cheiro dos morangos, a consistência do creme, as cerejas mais maravilhosas que já comera… Na festa, não havia mais pessoas, apenas vultos, nenhuma bebida, só aquele bolo delicioso. Então ela começou a se sentir muito triste e começou a chorar… A vontade de comer chocolate aumentou muito! Então, de repente ela parou de fazer os movimentos que todos faziam e foi para o vestiário, com apenas uma idéia: ir àquela confeitaria do outro lado da rua e comer um pedaço de torta de chocolate, pois estava muito nervosa… Era um círculo, comia porque ficava nervosa e gostava, ficava nervosa pelos efeitos em seu corpo, e comia por ansiedade… Mirei a professora (que ajudava o professor) de ginástica. Em sua cabeça vinham alguns números, das vezes que alguns exercícios deveriam ser repetidos. Ela olhava para alguns alunos, como o gordinho, ou o casal de velhos, e julgava se deveria mudar para outro movimento, pois eram os mais fracos da turma. Mas ela parou os olhos em uma garota. Nossa, ela pensou coisas sobre esta garota que talvez nem um homem pensaria! Ela estava desejando aquela garota com uma força de concentração muito grande! Eu nunca imaginaria isto, vendo esta mulher na rua… Havia um rapaz atrás de todos, que fazia todos os exercícios de forma desajeitada e com má vontade. Ele pensava nas mulheres do local. A professora era seu alvo principal, observava seus movimentos com muita atenção. Sua mente era apenas uma mescla de movimentos das mulheres que via ali no salão, com imagens eróticas derivadas destes movimentos e posições. Ele não tinha nenhum interesse na parte aeróbica da atividade, só dava atenção aos cabelos, às roupas, aos movimentos, aos corpos das mulheres que estavam ali. Em sua mente, não havia homem algum no salão, além dele mesmo. Tampouco pensava em conquistar alguma delas, só estava ali para olhá-las, para desejá-las. Decidi acabar com aquilo. Não estava fazendo bem para mim. O que esperava ver, os motivos pelos quais as pessoas vão a uma academia de ginástica, me surpreenderam, me chocaram, tanto que a excitação que senti por um equipamento que lê os pensamentos das pessoas, acabou. Temos uma tecnologia fantástica, mas os ‘pequenos problemas dos outros’ (claro, nem sempre problemas), para nós parecem pequenos, assim como os nossos são pequenos aos outros. Desliguei o leitor de pensamentos, não fazia sentido.Só aprendi que a distância daquilo que esperamos, para o que realmente é, pode ser muito grande.

Jorge 040201

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