Pacheco Da Ponte Educador

  • December 2019
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Pacheco, da Ponte, educador

A improvável figura de um homem franzino, com o característico sotaque lusitano que prazerosamente soa aos nossos ouvidos brasileiros com um misto de alegre sonoridade e picardia, esconde o responsável por uma experiência pedagógica inédita, objeto de estudos acadêmicos e de aplausos provenientes dos mais respeitados estudiosos do assunto.

Este lépido portuguesinho, com seus olhos que, de tão irrequietos, chegam ao estrabismo assumido, aparenta bem menos anos dos que os já vividos intensamente.

Não se peja em falar de seu passado de menino pobre numa pequena aldeia portuguesa, da infância sofrida em meio a um ambiente de favela com a violência sempre presente. Adolescente, se viu convocado pela ditadura salazarista para lutar em terras africanas, de lá voltando como um conscrito que se viu obrigado a viver na

clandestinidade, com a vida em risco a cada minuto, até que desabrochassem as flores da revolução. Emociona saber que aquele homem culto e letrado, que está à sua frente, formou-se à custa da leitura de livros proibidos pela ditadura, que lhe chegavam às mãos, trazidos por companheiros refugiados ou exilados (à socapa, como ele diria com a naturalidade que só os lusitanos emprestam a estes termos até meio estranhos para nós outros, cá da província). Depois de tudo, a aventura maior, a de ensinar. Ele não gosta quando relacionam com o seu passado o resultado de sua vivência educacional. Mas é inevitável pensar em tudo isso quando se trava contato com aquele português, o José Pacheco, o idealizador maior da Escola da Ponte. Se você por acaso não ouviu falar deste lugar, a Ponte, como é conhecido, imagine uma escola com uma só e enorme sala de aula, sem divisões, sem carteiras escolares, reunindo crianças e adolescentes que cursam da 1ª à 8ª séries, todos juntos, trabalhando em grupo, cada um passando para o outro os seus conhecimentos e habilidades. E os professores? Ah, os professores se limitam a estimular a pesquisa, o aprendizado individual e em equipe, de maneira que todos adquiram conhecimentos segundo sua faixa de desenvolvimento intelectual. Isto mesmo, sem aulas com tempo marcado, sem intervalos prédefinidos, sem provas de avaliação. Esta Escola (é o caso de usar, mesmo, a inicial maiúscula) não é apenas uma experiência. É uma realidade. E, o que é de pasmar: trata-se de uma escola pública, que funciona sob os auspícios do governo português e dentro das regras estabelecidas na legislação oficial para todo o sistema de ensino público, com o jeitinho quase “brasileiro” que o Pacheco sempre encontra para acomodar os seus métodos. Por falar em métodos, perguntado a respeito da sua inclinação quanto às diferentes propostas pedagógicas, com sua maneira característica, diz ele: “o melhor método é o que funciona”. Admite que as idéias anarquistas não lhe sejam totalmente indiferentes.

Fala com convicção e com autoridade a respeito de todos eles – Koszac, Wigotsky, Steiner, Piaget, Montessori, Pestallozzi e por aí vai. Lembra que de todos os grandes vultos da Pedagogia, apenas Freinet era, propriamente, um educador. Faz questão de ressaltar que recomenda aos seus colegas professores que estudem, sim, os grandes mestres da pedagogia, mas que o façam lendo também sua biografia, porque a compreensão do contexto social em que se desenvolvem as idéias é muito importante. E que, por conseqüência, para ensinar, não se pode desvincular a atividade pedagógica do meio social em que se inserem os educandos. Não esconde um carinho todo especial para com o nosso Paulo Freire, que admira muito, o que se percebe em muitos dos pontos de sua fala e no apreço que demonstra para com as coisas do Brasil. Depois de algum tempo ouvindo Pacheco, não surpreende que, com seu método (ou sua falta de) e sua dinâmica de educar para a vida, depois de passar pela Ponte as crianças saídas de estratos sociais menos favorecidos acabam por lograr acesso aos bancos universitários mais disputados em terras lusitanas. Segundo Rubem Alves, a

Escola da Ponte nos dá uma lição social: “todos partilhamos de um mesmo mundo. Pequenos e grandes são companheiros numa mesma aventura. Todos se ajudam. Não há competição. Há cooperação. Ao ritmo da vida: os saberes da vida não seguem programas” (crônica publicada no jornal Correio Popular, de Campinas, em 18/6/2000).

A história de José Pacheco é uma história de resistência, de resiliência, como ele mesmo diz, a demonstrar que na vida é preciso insistir com nossas idéias e nossos princípios. Em março de 2006, José Pacheco esteve em Santos, falando para os alunos do primeiro curso de Pedagogia Espírita, criado e coordenado por Dora Incontri, na Unisanta. Este perfil do educador português - publicado na revista

UNIVERSO ESPÍRITA, foi redigido a partir daquele encontro e da participação do educador português no II Congresso Nacional de Pedagogia Espírita, realizado em setembro daquele ano.

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