Montenegro cabe na Europa? Esperando se integrar à UE, 55,4% dos montenegrinos votaram pela separação da Sérvia. Resta saber se a comunidade quer novos sócios Por Cláudio Camargo
Um divórcio há muito esperado finalmente se consumou no domingo 21, quando 55,4% dos eleitores da minúscula república de Montenegro (650 mil habitantes) decidiram que seu país deveria se separar da Sérvia. Apesar de controversa, foi uma separação amigável, ao contrário da tragédia de 1992, quando a Croácia e logo depois a Bósnia-Herzegóvina se declararam independentes da Iugoslávia – então uma federação de seis repúblicas (Sérvia, Croácia, Eslovênia, Bósnia-Herzegóvina, Macedônia e Montenegro). Na época, a Sérvia reagiu violentamente e o resultado foi uma guerra civil que sangrou no coração da Europa, provocou 250 mil mortes, reavivou os horrores do Holocausto, mas não impediu que a Iugoslávia entrasse em coma. Assim, o “divórcio não-litigioso” dos montenegrinos foi o último prego no caixão da federação iugoslava, que desde 2003 estava reduzida a Sérvia e Montenegro. O mais novo país – que já adota o euro como moeda – pretende apressar sua entrada no seleto clube da União Européia. Mas pelo menos nos campos de futebol europeus essa separação ainda vai ter de esperar: a aguerrida seleção da Sérvia e Montenegro disputará a Copa do Mundo na Alemanha como um único país. Pela última vez.
A união entre montenegrinos e sérvios ia mal desde os tempos do dirigente nacionalista sérvio Slobodan Milosevic (1987-2000), o instigador da “Grande Sérvia”, que morreu este ano em Haia (Holanda) enquanto aguardava julgamento pelos crimes cometidos pelos sérvios durante as guerras nos Bálcãs nos anos 90. A resistência de Belgrado em entregar ao Tribunal Penal de Haia o comandante dos sérvios da Bósnia, Ratko Mladic, levou a União Européia a suspender as negociações com Sérvia e Montenegro para a entrada de ambos na União Européia. Livre de seu par incômodo, Montenegro espera agora retomar as negociações. O caminho não será nada fácil. Os europeus temem que o exemplo montenegrino possa repercutir na província de Kosovo, onde 90% da população é albanesa. Legalmente pertencente à Sérvia, Kosovo está sob o controle da ONU, mas os habitantes não vêem a hora de seguir o exemplo montenegrino. Segundo o jornal francês Le Monde, a comunidade internacional sabe que não pode obrigar um povo a viver sob um Estado que ele não quer. “A autodeterminação é um princípio louvável, mas não é isenta de perigos. Aplicada ao pé da letra, corre o risco de balcanizar (fragmentar) a região, ameaçando o frágil equilíbrio entre sérvios, bósnios, croatas e albaneses”, diz o jornal. Para evitar que as animosidades se transformem em conflitos abertos, a UE dispõe de um meio de pressão: a perspectiva de adesão à sua comunidade. Mas como os micro-Estados nascentes dificilmente preencherão os critérios para essa adesão, os governos europeus se tornam contrários ao alargamento da UE. “É a quadratura do círculo”, conclui o Le Monde.