LITERATURA POPULAR
Uma rica e variada literatura popular foi legada pela tradição açoriana, expressa tanto na forma oral, comum a todos os povos, quanto na forma escrita, menos frequente. Em suas formas escritas, a literatura popular da Ilha de Santa Catarina apresenta as “Quadrinhas”, manifestação extremamente comum em regiões as mais diversas, e o “Pão-por-Deus”, género trazido dos Açores e aqui modificado. Como literatura oral, ela se compõe de provérbios e expressões típicas, das advinhas e orações, das lendas e das cantigas. A literatura popular pode ser considerada como o componente mais verdadeiro de uma identidade cultural, por incorporar a quase totalidade das demais manifestações do “fazer popular” e por expressar plenamente o modo de viver, pensar, sentir e agir de um povo. A literatura manifesta a filosofia de quem a faz, as suas crenças e costumes, a sua técnica e a sua ciência.
Expressões Escritas e Orais Pão-por-Deus A arte do papel recortado remonta, nos Açores, ao século XVII, provavelmente vinda da Europa continental, e deu origem ao chamado Pão-por-Deus. As peças de papel passaram a ser usadas para escrever versos, feitos por crianças, os quais apresentavam pedidos de doces e guloseimas e, tradicionalmente, eram entregues aos destinatários no dia de Todos os Santos. Trazido para Santa Catarina, o Pão-por-Deus sofreu modificações importantes. Os recortes se cristalizaram na forma específica do coração, e o conteúdo dos versos passou a ser essencialmente romântico, eqüivalendo a declarações de amor. Claro está, que o Pão-por-Deus local já não era feito por crianças, e sim, por rapazes e, especialmente, moças. No centro do papel decorado era escrito uma ou duas quadras. Algumas delas se tornavam bastante comuns, sendo repetidas ou imitadas.
Provérbios Os provérbios ou ditados, como se costumava chamá-los na região, eram contados por nativos, em cuja linguagem cotidiana se incorporavam. Eles expressavam uma sabedoria popular adquirida ao longo de muitas gerações. Selecionamos alguns, repetidos com mais freqüência, para apresentá-los: • • • •
A formiga quando quer se perder cria asas. A língua serve de chicote para o rabo. Pedra que muito rola não cria limo. Esticam-se as pernas conforme a manta.
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Quando o gato sai, os ratos dançam. A pior cunha é a do mesmo pau. Todo burro come palha; o problema é saber dá-la. Águas passadas não movem moinhos. A missa se espera na porta da igreja. O que o diabo dá, o diabo leva. A porta da rua é a serventia da casa. Dia de muito é véspera de nada. Gato com fome come até sabão. Honra e proveito não cabem no mesmo balaio. Do burro se espera o coice. Há sempre um chinelo velho para um pé torto. Árvore ruim não dá boa sombra.
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Dois bicudos não se beijam.
Expressões Típicas São enunciações de pensamento feitas com recurso à linguagem figurada. Designam algumas situações, atitudes e idiossincrasias e acham-se perfeitamente incorporadas ao modo de falar. Trouxemos para vocês alguns exemplos: • • • • • • • • • • •
(Tirar) "a barriga da miséria" (expressa uma oportunidade extraordinária de satisfazer necessidades). "Safar a onça" (significa escapar de um perigo). Bêbado "que nem uma cabra" (indicação superlativa de embriaguez). (Estar) "picada de cobra" (significa estar grávida), (Acender) "uma vela a Deus e outra ao diabo" (expressa hipocrisia). (Entrar) "para a irmandade dos pés-juntos" (significa morrer). "Botar os cachorros em cima" (designa reprovação veemente). "Tirar o pai da forca" (indica muita pressa). "Comer da banda podre" (expressa situação de pobreza ou miséria). "Andar na fiúza" (significa viver as custas de outros). "Bananeira que já deu cacho" (indica esterilidade ou perda de capacidade).
A literatura açoriana ainda se expressa sob variadas outras formas: quadrinhas, pequeno poema restrito a um quarteto, advinhas, além das benzeduras e orações, vistas como subgénero literário, entre outras. (Caderno de Cultura e Educação - Roteiro de Manifestações Culturais do Município de Florianópolis - 1995)