Literatura Brasileira • Literatura: refere-se à arte, à estética. • Brasileira: refere-se a um recorte espacial (no caso, um país).
BRASIL COLÔNIA – CRONOLOGIA HISTÓRICA 1500: Chegada da frota de Pedro Álvares Cabral, representando a Coroa Portuguesa. / Carta de Pero Vaz de Caminha. 1501: Primeira expedição exploradora. 1515 / 1516: Tem início o reconhecimento da costa do “Brasil”. Cristóvão Jacques funda uma feitoria em Pernambuco. 1530: Martim Afonso de Souza chega ao Brasil, para colonizá-lo. 1534: Fundação da vila de São Vicente. / Início das capitanias hereditárias.
1548: Primeira grande leva de escravos negros. 1549: Chegada do padre Manoel da Nóbrega. 1550: Hans Städen no Brasil (retorna à Europa em 1555). 1553: Chegada do padre José de Anchieta. 1555: Jean de Léry no Brasil. 1565: Estácio de Sá funda a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. 1580: O Brasil passa ao domínio espanhol.
CRONOLOGIA DOS FATOS CULTURAIS 1500: Carta de Caminha. 1530: Diário de Navegação, de Pero Lopes de Souza. 1557: Diálogo da Conversão do Gentio, de Manoel da Nóbrega. 1576: História da Província de Santa Cruz, de Pero de Magalhães Gandavo. 1578: Viagem à Terra do Brasil, de Jean de Léry. 1583: Encenação do auto Na Festa de São Lourenço, de José de Anchieta. 1587: Tratado Descritivo do Brasil, de Gabriel Soares de Souza. 1595: Arte de gramática da língua mais usada na costa do Brasil. 1601: Prosopopéia, de Bento Teixeira.
Literatura de Informação & Jesuítica Características: - Visão européia sobre o mundo novo. - Utilização de formas padronizadas: relatos, diários, cartas, autos, poemas... -Predomínio das funções referenciais, metalingüísticas e conativas.
Alguns historiadores apontam o interesse desses textos devido aos seguintes aspectos: g) por documentar o contexto histórico e cultural específico em que a literatura brasileira surgiu; h) manifestações de criatividade e pelo cuidado estilístico; i) por apresentar a origem de características predominantes nas primeiras escolas literárias brasileiras, o Barroco e o Arcadismo; j) por servir de inspiração à literatura brasileira de épocas posteriores. (Olivieri & Villa, 1999, p. 09-10) Antigüidade
Idade Média
Idade Moderna
Idade
Li tera tu ra Informa ti va: descrição * exaltação da terra * visão edênica “Carta de Achamento do Brasil” (Caminha) “Diálogos das Grandezas do Brasil” (Ambrósio Fernandes Brandão) “Tratado da Terra do Brasil” (Pero de Magalhães Gândavo) OUTROS AUTORES: Antonil; Hans Städen; Jean de Lery; André de Thevet
“Carta de Achamento do Brasil” Pero Vaz de Caminha / Porto (1450?) – Calecute (1500). • O cargo de “escrivão da armada (...) revela prestígio e confiança junto à corte” (Olivieri & Villa, 1999, p. 17) • Morreu em meio a um conflito armado, na Índia, em dezembro de 1500. • A “Carta” tem por objetivo informar ao rei D. Manuel I a chegada às novas terras. • Trata-se de uma narrativa documental, linear, objetiva e que expressa a visão mercantilista dos exploradores portugueses. • Exaltação da terra (visão edênica); missionarismo cristão. • Publicada no Brasil pela primeira vez em 1817, pelo padre Manuel Aires do Casal.
“Carta de Achamento do Brasil” (Pero Vaz de Caminha) Senhor, posto que o Capitão-mor desta Vossa frota, e assim os outros capitães escrevam a Vossa Alteza a notícia do achamento desta Vossa terra nova, que se agora nesta navegação achou, não deixarei de também dar disso minha conta a Vossa Alteza, assim como eu melhor puder, ainda que -- para o
Pardos, nus, sem coisa alguma que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos, e suas setas. Vinham todos rijamente em direção ao batel. E Nicolau Coelho lhes fez sinal que pousassem os arcos. E eles os depuseram. Mas não pôde deles haver fala nem entendimento que aproveitasse, por o mar quebrar na costa. Somente arremessou-lhe um barrete vermelho e uma carapuça de linho que levava na cabeça, e um sombreiro preto. E um deles lhe arremessou um sombreiro de penas de ave, compridas, com uma copazinha de penas vermelhas e pardas, como de papagaio. E outro lhe deu um ramal grande de continhas brancas, miúdas que querem parecer de aljôfar, as quais peças creio que o Capitão manda a Vossa Alteza.
GÂNDAVO, Pero de Magalhães – 1) Tratado da Terra do Brasil (circa 1570); 2) História da Província de Santa Cruz (1576), Belo Horizonte, Ed. Itatiaia, 1980. Trecho: CAPÍTULO
V: DAS PLANTAS, MANTIMENTOS E FRUITAS QUE HA NESTA PROVINCIA
Primeiramente tratarei da planta e raiz de que os moradores fazem seus mantimentos que la comem em logar de pão. A raiz se chama mandioca e a planta de que se gera he de altura de hum homem pouco mais ou menos. Esta planta nam he muito grossa, e tem muitos nós: quando a querem plantar em alguma roça cortão-na e fazem-na em pedacos, os quaes metem debaixo da terra, depois de cultivada, como
Li te ratu ra dos Je su ítas (1534: fundação da Companhia de Jesus, por Inácio de Loyola)
influência das formas medievais * fins pedagógicos * Poesia * Teatro PRINCIPAIS AUTORES: José de Anchieta (1534-1597) Manuel de Nóbrega (1517-1570)
José de ANCHIETA (Tenerife, 1534 – Espírito Santo/BR, 1597) • padre da Companhia de Jesus, fundada em 1534 por Inácio de Loyola (1491-1556, canonizado em 1622). Os jesuítas tinham por característica a abnegação, a disciplina e a diplomacia no trato com os nativos. • Chega ao Brasil em 1553. •Segundo Bosi (1997) • sua produção dramatúrgica (Autos) tem caráter catequizante, sendo que sua produção poética revela “poemas que valem em si mesmos como estruturas literárias” (p. 19).
• caracterizam sua poética o tom de esperança, a alegria, o amor divino. • o auto “Na Festa de São Lourenço”, representado em Niterói (1583), é considerado seu drama mais importante. Escrito em Tupi (a maior parte), Espanhol e Português. Seu conteúdo é formado por “cenas nativas, lutas contra os franceses, corridas (...) e fragmentos de prédica mística” que “visam a converter o recreando” (p. 23).
POEMA DA VIRGEM (José de Anchieta) COMPAIXÃO DA VIRGEM NA MORTE DO FILHO 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16.
Por que ao profundo sono, alma, tu te abandonas, e em pesado dormir, tão fundo assim ressonas? Não te move a aflição dessa mãe toda em pranto, que a morte tão cruel do filho chora tanto? O seio que de dor amargado esmorece, ao ver, ali presente, as chagas que padece? Onde a vista pousar, tudo o que é de Jesus, ocorre ao teu olhar vertendo sangue a flux. Olha como, prostrado ante a face do Pai, todo o sangue em suor do corpo se lhe esvai. Olha como a ladrão essas bárbaras hordas pisam-no e lhe retêm o colo e mãos com cordas. Olha, perante Anás, como duro soldado o esbofeteia mau, com punho bem cerrado. Vê como, ante Caifás, em humildes meneios, agüenta opróbrios mil, punhos, escarros feios.
A A B B C C D D
AUTO DE SÃO LOURENÇO José de Anchieta TEMA Após a cena do martírio de São Lourenço, Guaixará chama Aimbirê e Saravaia para ajudarem a perverter a aldeia. São Lourenço a defende, São Sebastião prende os demônios. Um anjo manda-os sufocarem Décio e Valeriano. Quatro companheiros acorrem para auxiliar os demônios. Os imperadores recordam façanhas, quando Aimbirê se aproxima. O calor que se desprende dele abrasa os imperadores, que suplicam a morte. O Anjo, o Temor de Deus, e o Amor de Deus aconselham a caridade, contrição e confiança em São Lourenço. Faz-se o enterro do santo. Meninos índios dançam.
PRIMEIRO (Cena do martírio de São Lourenço) Cantam: Por Jesus, meu salvador, Que morre por meus pecados, Nestas brasas morro assado Com fogo do meu amor Bom Jesus, quando te vejo Na cruz, por mim flagelado, Eu por ti vivo e
Pois teu sangue redentor Lavou minha culpa humana, Arda eu pois nesta chama Com fogo do teu amor. O fogo do forte amor, Ah, meu Deus!, com que me amas Mais me consome que as
• Características: Influência da ContraReforma (1545: Concílio de Trento) Cosmovisão que expressa o conflito Céu X Terra Culto do contraste: antítese Repetições e paralelismo Linguagem adornada, rica em figuras de linguagem => CULTISMO CONCEPTISMO: jogo de idéias e conceitos; retórica aprimorada. Antigüidade
Idade Média
Idade Moderna
Idade
• Barroco no Brasil: Bento Teixeira (15611600): Prosopopéia (1601) Gregório de Matos (1623/1636 -1696): poesia Lírica, Religiosa e Satírica. Padre Antônio Vieira (1608-1697): profecias, cartas e sermões Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711).
A Jesus Cristo Nosso Senhor Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado, Da vossa alta clemência me despido; Porque quanto mais tenho delinqüido, Vos tenho a perdoar mais empenhado.
CARACTERÍSTICAS
Se basta a vos irar tanto pecado, A abrandar-vos sobeja um só gemido: Que a mesma culpa, que vos há ofendido, Vos tem para o perdão lisonjeado.
Esquema rítmico:
Se uma ovelha perdida e já cobrada Glória tal e prazer tão repentino Vos deu, como afirmais na sacra história, Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, Cobrai-a; e não queirais, pastor divino, perder na vossa ovelha a vossa glória. (Gregório de Matos e Guerra. Coleção Afrânio Peixoto, 1923-1930)
Soneto Versos decassílabos
ABBA, ABBA, CDE, CDE Uso do conceptismo Antíteses
CONCEITOS HISTÓRICOS E LITERÁRIOS
Contra-Reforma[1] A Contra-Reforma foi um movimento da Igreja Católica no século XVI que surge como resposta às críticas dos humanistas e de diversos membros da Igreja e de importantes Ordens Religiosas, tais como os Franciscanos, Dominicanos e Agostinhos, que apelavam à moralidade e ao regresso à pureza e austeridade primitivas. Além disso, a Contra-Reforma surge também como resposta ao avanço da Reforma Protestante iniciada por Martinho Lutero. Este movimento assume assim uma vertente de Reforma Católica (que procura redefinir a Doutrina da Igreja e a disciplina do clero) e uma vertente de ContraReforma que procura combater e impedir o avanço do protestantismo. Os principais meios utilizados pela Igreja Católica para efectuar a sua Reforma foram a criação de novas ordens religiosas (destacando-se a Companhia de Jesus) e a realização do Concílio de Trento. As acções mais repressivas da Contra-Reforma foram conseguidas através da Inquisição e da censura (Index). [1] Dicionários Temáticos. Site: http://www.notapositiva.com/dicionario_historia/contrareforma.htm . Acesso em 12/08/2008.
Concílio de Trento Um Concílio consiste numa reunião geral dos representantes máximos da Igreja Católica. No caso do Concílio de Trento, presidido pelo Papa Paulo III, este iniciou-se em 1545 na cidade italiana de Trento, e teve como objetivo encontrar respostas para os problemas colocados pelos protestantes e pelos humanistas. Das conclusões saídas do Concílio de Trento destaca-se a centralização de poderes no Papa que passa a ser considerado como "Pastor Universal da Igreja" sendo-lhe atribuída toda a supremacia em matéria de dogmas e de disciplina. Por outro lado, foram estabelecidas diversas normas para evitar abusos e luxos do clero. Em suma, o Concílio de Trento conferiu à Igreja Católica um matiz mais centralizado e autoritário, constituindo uma importante ação reformadora afim de limitar os abusos e a degradação dos costumes e impedir o avanço do protestantismo.
Companhia de Jesus A Companhia de Jesus (também conhecida como Jesuítas), uma congregação religiosa fundada pelo espanhol Inácio de Loiola (futuro Santo Inácio de Loiola), teve a sua "regra" ("a obediência a Deus por intermédio dos seus superiores" aprovada pelo Papa Paulo III em 1540. Esta "regra" jesuíta associada ao fato do superior geral da congregação, escolhido através de eleição, depender diretamente da Santa Sé, tornava a Companhia de Jesus como uma espécie de exército religioso ao serviço do Papa. Detentores de uma forte preparação intelectual, os Jesuítas tiveram uma grande influência quer junto dos reis quer junto da população em geral. Ao longo dos séculos XVI e XVII praticamente possuíram o monopólio do ensino de nível secundário. Além do papel no ensino, os Jesuítas também tiveram um importantíssimo papel na evangelização das populações naturais das terras descobertas por portugueses e espanhóis e na reconversão dos países protestantes. No caso português, alguns dos Jesuítas que mais se destacaram no processo evangelizador foram S. Francisco Xavier na Índia, e os padres Manuel da Nóbrega e Antônio Vieira no Brasil.
Antítese Consiste na oposição de dois ou mais termos ou de duas expressões na mesma frase ou no mesmo parágrafo, expressando contrastes em construções geralmente simétricas. Ex.: prisão / liberdade; noite / dia; escuridão / claridade. Foi ao hospital buscar a VIDA e encontrou a MORTE. Repetições e Paralelismo Construções poéticas em que versos distintos mantêm certas semelhanças de construção.
CULTISMO: é também conhecido como “culteranismo” ou “gongorismo” e designa um processo construtivo que excede nas utilizações das figuras de linguagem, causando um rebuscamento formal, uma excessiva ornamentação estilística ou um preciosismo. Normalmente, os textos cultistas são extravagantes, herméticos.
CONCEPTISMO: deriva de “conceito”, idéia. Portanto, esse termo indica um jogo de idéias. Esse processo construtivo também é conhecido como “quevedismo”, por causa de escritor espanhol Quevedo. Resulta, finalmente, numa elaboração racional, numa retórica aprimorada, através de um jogo de conceitos. Quando analisamos um raciocínio, devemos perceber se ele foi estruturado em bases verdadeiras, um silogismo, ou se em bases falsas ou metafóricas, um sofisma.
Gregório de Matos Guerra Sua obra permaneceu praticamente inédita até o século XX, quando a ABL publicou (1923-1933) seis volumes, assim divididos: I- Poesia sacra; II- Poesia lírica; III- Poesia graciosa; IV e V- Poesia satírica; VI- Últimas.
A Jesus Cristo Nosso Senhor Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado, Da vossa alta clemência me despido; Porque quanto mais tenho delinqüido, Vos tenho a perdoar mais empenhado.
CARACTERÍSTICAS
Se basta a vos irar tanto pecado, A abrandar-vos sobeja um só gemido: Que a mesma culpa, que vos há ofendido, Vos tem para o perdão lisonjeado.
Esquema rítmico:
Se uma ovelha perdida e já cobrada Glória tal e prazer tão repentino Vos deu, como afirmais na sacra história, Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, Cobrai-a; e não queirais, pastor divino, perder na vossa ovelha a vossa glória. (Gregório de Matos e Guerra. Coleção Afrânio Peixoto, 1923-1930)
Soneto Versos decassílabos
ABBA, ABBA, CDE, CDE Uso do conceptismo Antíteses
A Jesus Cristo Nosso Senhor
Pe/quei,/ Se/nhor;/ mas/ não/ por/que/ hei/ pe/ca/do, Da/ vo/ssa al/ta/ cle/mên/cia/ me/ des/pi/do;
A B
Por/que/ quan/to/ mais/ te/nho/ de/lin/qüi/do, Vos/ te/nho a/ per/do/ar/ mais/ em/pe/nha/do.
B A
Se/ bas/ta a/ vo/s i/rar/ tan/to/ pe/ca/do, A a/bran/dar/-vos/ so/be/ja um/ só/ ge/mi/do: Que a/ mes/ma/ cul/pa/, que/ vo/s há o/fen/di/do, Vos/ tem/ pa/ra o/ per/dão/ li/son/je/a/do. A
A B B
Se uma ovelha perdida e já cobrada Glória tal e prazer tão repentino Vos deu, como afirmais na sacra história,
C D E
Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada, Cobrai-a; e não queirais, pastor divino, perder na vossa ovelha a vossa glória.
C D E
POESIA LÍRICA Inconstância dos bens do mundo Nasce o Sol, e não dura mais que um dia, Depois da Luz se segue a noite escura, Em tristes sombras morre a formosura, Em contínuas tristezas a alegria. Porém, se acaba o Sol, por que nascia? Se é tão formosa a Luz, por que não dura? Como a beleza assim se transfigura? Como o gosto da pena assim se fia? Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza, Na formosura não se dê constância, E na alegria sinta‑se tristeza. Começa o mundo enfim pela ignorância, E tem qualquer dos bens por natureza A firmeza somente na inconstância. * Exemplos de paralelismos.
Segunda Impaciência do Poeta Cresce o desejo, falta o sofrimento, Sofrendo morro, morro desejando, Por uma e outra parte estou penando Sem poder dar alívio a meu tormento. Se quero declarar meu pensamento, Está-me um gesto grave acobardando, E tenho por melhor morrer calando, Que fiar-me de um néscio atrevimento. Quem pretende alcançar, espera e cala Porque quem temerário se abalança, Muitas vezes o amor o desiguala. Pois se aquele que espera se alcança, Quero ter por melhor morrer sem fala, Que falando, perder toda esperança.
POESIA SATÍRICA Soneto
Soneto
A cada canto um grande conselheiro, Que nos quer governar cabana, e vinha, Não sabem governar sua cozinha, E podem governar o mundo inteiro.
Um soneto começo em vosso gabo; Contemos esta regra por primeira, Já lá vão duas, e esta é a terceira, Já este quartetinho está no cabo.
Em cada porta um freqüentado olheiro, Que a vida do vizinho, e da vizinha Pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha, Para a levar à Praça, e ao Terreiro.
Na quinta torce agora a porca o rabo: A sexta vá também desta maneira, na sétima entro já com grã canseira, E saio dos quartetos muito brabo.
Muitos Mulatos desavergonhados, Trazidos pelos pés os homens nobres, Posta nas palmas toda a picardia.
Agora nos tercetos que direi? Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais, Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Estupendas usuras nos mercados, Todos, os que não furtam, muito pobres, E eis aqui a cidade da Bahia.
Nesta vida um soneto já ditei, Se desta agora escapo, nunca mais; Louvado seja Deus, que o acabei.
Juízo anatômico dos achaques que padecia o corpo da República em todos os membros, e inteira definição do que em todos os tempos é a Bahia.
Que falta nesta cidade?... Verdade. Que mais por sua desonra?... Honra. Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha. O demo a viver se exponha, Por mais que a fama a exalta, Numa cidade onde falta Verdade, honra, vergonha. Quem a pôs neste socrócio?... Negócio. Quem causa tal perdição?... Ambição. E no meio desta loucura?... Usura. Notável desaventura De um povo néscio e sandeu, Que não sabe que o perdeu Negócio, ambição, usura. (...)
E que justiça a resguarda?... Bastarda. É grátis distribuída?... Vendida. Que tem, que a todos assusta?... Injusta. Valha-nos Deus, o que custa O que El-Rei nos dá de graça. Que anda a Justiça na praça Bastarda, vendida, injusta. (...) O açúcar já acabou?... Baixou. E o dinheiro se extinguiu?... Subiu. Logo já convalesceu?... Morreu. À Bahia aconteceu O que a um doente acontece: Cai na cama, e o mal cresce, Baixou, subiu, morreu. (...)
A Câmara não acode?... Não pode. Pois não tem todo o poder?... Não quer. É que o Governo a convence?... Não vence. Quem haverá que tal pense, Que uma câmara tão nobre, Por ver-se mísera e pobre, Não pode, não quer, não vence.
Gregório de Matos Guerra
REFERÊNCIAS •AGUIAR E SILVA, Vítor Manuel. Teoria da Literatura. Coimbra: Livraria Almedina, 1970. •BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 1997. •MAIA, João Domingues. Literatura: textos e técnicas. São Paulo: Ática, 1995. •OLIVIERI, Antônio Carlos & VILLA, Descobrimento. São Paulo: Ática, 1999.
Marco
Antônio
(org.).
Cronistas
do
•PROENÇA FILHO, Domício. Estilos de Época na Literatura. São Paulo: Ática, 1995. •Site Bibvirt. Em http://www.bibvirt.futuro.usp.br/textos . Acesso em 20 março de 2008. •Site Virtual Books On Line. Em http://virtualbooks.terra.com.br . Acesso em 10 de janeiro de 2007.